Transformada Fracional de Fourier sobre GF(p 1(mod 4) · A vers~ao discreta da FrFT, denominada...

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Transformada Fracional de Fourier sobre GF(p), p 1 (mod 4) Juliano B. Lima Programa de P´os-Gradua¸ ao em Engenharia de Sistemas, POLI, UPE, 50750-470, Recife, PE E-mail: juliano [email protected], Ricardo M. Campello de Souza Departamento de Eletrˆonica e Sistemas, CTG, UFPE 50740-550, Recife, PE E-mail: [email protected]. Resumo: A contribui¸ c˜ao central deste trabalho´ e a defini¸c˜ ao da transformada fracional de Fou- rier sobre corpos finitos GF(p), em que p 1 (mod 4). Esta ferramenta ´ e introduzida a partir de conceitos de trigonometria de corpo finito e do estudo dos autovalores e autovetores da matriz da transformada de Fourier num corpo finito. Al´ em de apresentar um procedimento sistem´atico para constru¸ c˜aoda referidatransformada, neste trabalho, s˜aodescritas algumas de suas poss´ ıveis aplica¸ c˜oes. Palavras-chave: Transformada fracional de Fourier, corpos finitos, autovetores 1 Introdu¸c˜ ao A transformada fracional de Fourier (FrFT) ´ e uma generaliza¸c˜ ao da transformada de Fourier, que corresponde ao c´alculo de potˆ encias fracionais do operador transformada de Fourier e sua aplica¸c˜ ao a uma fun¸c˜ ao ou sinal [1]. Nas ´ ultimas d´ ecadas, a FrFT tem atra´ ıdo a aten¸c˜ ao pesquisadores em ´areas como ´ Optica, Teoria das Comunica¸c˜ oes, Criptografia, Processamento Digital de Sinais etc [9], [8], [13]. A vers˜ ao discreta da FrFT, denominada transformada discreta fracional de Fourier (DFrFT), possui grande importˆancia do ponto de vista computacional e sua defini¸c˜ ao segue diferentes abordagens [10]. Recentemente, transformadas fracionais de Fourier em corpos finitos tamb´ em foram defini- das [11], [7]. Em [7], particularmente, emprega-se uma abordagem que, de certa forma, corres- ponde `a extens˜ao para corpos finitos da ideia introduzida em [5], al´ em de se considerar conceitos pr´ oprios do novo cotexto. Neste artigo, a transformada de Fourier de corpo finito (GFrFT) proposta em [7] ´ e reconsiderada. A diferen¸ca fundamental ´ e que, no presente trabalho, s˜ao considerados corpos finitos GF(p), em que p 1(mod 4). Tal restri¸c˜ ao permite a defini¸c˜ ao de transformadas num´ ericas, isto ´ e, que realizam um mapeamento de GF(p) para GF(p), evitando corpos de extens˜ao. Isso torna mais simples os c´alculos e facilita o uso da GFrFT em aplica¸c˜ oes como cifragem de imagem e esquemas de comunica¸c˜ ao multiusu´ ario. Este trabalho ´ e dividido da seguinte forma: ap´os esta introdu¸c˜ ao, alguns conceitos relacio- nados `a trigonometria e `as transformadas de Fourierem corpos finitos s˜ao revisados na Se¸c˜ ao 2. NaSe¸c˜ ao3, adefini¸c˜ ao da transformada fracional de Fourier em corpos finitos ´ e apresentada. Na Se¸c˜ ao 4, algumas poss´ ıveisaplica¸c˜ oes da GFrFT s˜ao discutidas de forma preliminar. Na Se¸c˜ ao 5, s˜ao descritas as principais conclus˜oes deste artigo e mencionadas perspectivas para futuras investiga¸ oes. 647 ISSN 1984-8218

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Transformada Fracional de Fourier sobre GF(p), p ≡ 1 (mod 4)

Juliano B. LimaPrograma de Pos-Graduacao em Engenharia de Sistemas, POLI, UPE,

50750-470, Recife, PE

E-mail: juliano [email protected],

Ricardo M. Campello de SouzaDepartamento de Eletronica e Sistemas, CTG, UFPE

50740-550, Recife, PE

E-mail: [email protected].

Resumo: A contribuicao central deste trabalho e a definicao da transformada fracional de Fou-rier sobre corpos finitos GF(p), em que p ≡ 1(mod 4). Esta ferramenta e introduzida a partir deconceitos de trigonometria de corpo finito e do estudo dos autovalores e autovetores da matrizda transformada de Fourier num corpo finito. Alem de apresentar um procedimento sistematicopara construcao da referida transformada, neste trabalho, sao descritas algumas de suas possıveisaplicacoes.

Palavras-chave: Transformada fracional de Fourier, corpos finitos, autovetores

1 Introducao

A transformada fracional de Fourier (FrFT) e uma generalizacao da transformada de Fourier,que corresponde ao calculo de potencias fracionais do operador transformada de Fourier e suaaplicacao a uma funcao ou sinal [1]. Nas ultimas decadas, a FrFT tem atraıdo a atencaopesquisadores em areas como Optica, Teoria das Comunicacoes, Criptografia, ProcessamentoDigital de Sinais etc [9], [8], [13]. A versao discreta da FrFT, denominada transformada discretafracional de Fourier (DFrFT), possui grande importancia do ponto de vista computacional e suadefinicao segue diferentes abordagens [10].

Recentemente, transformadas fracionais de Fourier em corpos finitos tambem foram defini-das [11], [7]. Em [7], particularmente, emprega-se uma abordagem que, de certa forma, corres-ponde a extensao para corpos finitos da ideia introduzida em [5], alem de se considerar conceitosproprios do novo cotexto. Neste artigo, a transformada de Fourier de corpo finito (GFrFT)proposta em [7] e reconsiderada. A diferenca fundamental e que, no presente trabalho, saoconsiderados corpos finitos GF(p), em que p ≡ 1 (mod 4). Tal restricao permite a definicao detransformadas numericas, isto e, que realizam um mapeamento de GF(p) para GF(p), evitandocorpos de extensao. Isso torna mais simples os calculos e facilita o uso da GFrFT em aplicacoescomo cifragem de imagem e esquemas de comunicacao multiusuario.

Este trabalho e dividido da seguinte forma: apos esta introducao, alguns conceitos relacio-nados a trigonometria e as transformadas de Fourier em corpos finitos sao revisados na Secao 2.Na Secao 3, a definicao da transformada fracional de Fourier em corpos finitos e apresentada. NaSecao 4, algumas possıveis aplicacoes da GFrFT sao discutidas de forma preliminar. Na Secao5, sao descritas as principais conclusoes deste artigo e mencionadas perspectivas para futurasinvestigacoes.

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2 Preliminares

Nesta secao, e apresentada uma definicao para a funcao cosseno num corpo finito [4]. Umatransformada de Fourier de corpo finito e considerada e sua autoestrutura, cujo conhecimento efundamental para que se defina a GFrFT, e analisada.

Definicao 1 (Funcao cosseno de corpo finito) Seja ζ um elemento nao nulo de um corpofinito GF(p), p e um primo ımpar. A funcao trigonometrica cosseno de corpo finito relacionadaa ζ e calculada modulo p por

cosζ(x) :=ζx + ζ−x

2, (1)

x = 0, 1, . . . , ord(ζ), em que ord(ζ) corresponde a ordem multiplicativa de ζ.

Definicao 2 A transformada de Fourier de corpo finito (FFFT) de um vetor x = x[i], i =0, 1, . . . , N − 1, x[i] ∈ GF(p), e um vetor X = X[k], k = 0, 1, . . . , N − 1, X[k] ∈ GF(p),calculado modulo p por

X[k] =√N−1

N−1∑i=0

x[i]ζ−ki, (2)

em que ζ ∈ GF(p) e um elemento com ordem multiplicativa ord(ζ) = N . A transformada inversae dada por

x[i] =√N−1

N−1∑k=0

X[k]ζki, (3)

O fator de escala√N−1 e a escolha apropriada do elemento ζ tornam unitaria a FFFT [7].

A relacao entre x e X pode ser expressa pela equacao matricial

X = xF, (4)

em que F e a matriz de transformacao, cujo elemento na (k + 1)-esima linha e na (i+ 1)-esimacoluna e dado por Fk+1,i+1 =

√N−1ζ−ki. Os principais resultados relacionados aos autovalores

e aos autovetores de F, os quais desempenham um papel fundamental na definicao da GFrFT,sao apresentados a seguir [2].

Proposicao 1 A matriz F possui, no maximo, quatro autovalores distintos, 1,−1,√−1,−

√−1,

calculados em GF(p), cujas multiplicidades sao apresentadas na Tabela 1.

Tabela 1: Multiplicidades dos autovalores de F, a matriz da transformada de Fourier de corpofinito com dimensoes N ×N .

N Mult. 1 Mult. −1 Mult.√−1 Mult. −

√−1

4n n+ 1 n n− 1 n4n+ 1 n+ 1 n n n4n+ 2 n+ 1 n+ 1 n n4n+ 3 n+ 1 n+ 1 n n+ 1

Proposicao 2 Todo autovetor da matriz F possui simetria par ou simetria ımpar. Autovetorespares estao relacionados aos autovalores 1 ou −1; autovetores ımpares estao relacionados aosautovalores

√−1 ou −

√−1.

Neste ponto, observa-se que o fato de se estar considerando corpos finitos GF(p), em quep ≡ 1(mod4), garante que o numero

√−1, que aparece nas Proposicoes 1 e 2, pertence a GF(p).

O mesmo nao aconteceria se se estivesse utilizando p ≡ 3(mod 4); seria necessario recorrer aocorpo de extensao GF(p2).

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3 A Transformada Fracional de Fourier em Corpos Finitos

Conforme mencionado na introducao deste trabalho, a transformada fracional de Fourier cor-responde ao calculo de potencias (nao necessariamente inteiras) do operador transformada deFourier. No presente contexto, tal operador e representado pela matriz F. A matriz Fa, em quea e um numero racional, da GFrFT pode, portanto, ser obtida por meio da expansao espectral

Fa = VΛaVT . (5)

Na equacao acima, V e uma matriz cujas colunas sao autovetores pertencentes a um conjuntoortonormal de autovetores de F e Λ e uma matriz diagonal cujo elemento na i-esima linha e nai-esima coluna e um autovalor de F ao qual o autovetor na i-esima coluna de V esta associado;{·}T denota a operacao de transposicao.

Assim, para que se obtenha Fa, precisa-se, basicamente, obter o conjunto ortonormal deautovetores mencionado. No entanto, tal conjunto nao e unico, visto que os autovalores de Fsao degenerados (Proposicao 1). Isso torna necessario algum mecanismo que oriente a escolhadeste conjunto, a fim de evitar ambiguidades na definicao da GFrFT. O procedimento adotadoaqui segue aquele proposto em [5] e considera a matriz

S =

C0 1 0 . . . 11 C1 1 . . . 00 1 C2 . . . 0...

......

. . ....

1 0 0 . . . CN−1

, (6)

em que Cn = 2[cosζ(n)− 2] e ζ ∈ GF(p) e um elemento nao-nulo e com ord(ζ) = N , coincidentecom aquele usado para construir a matriz F. Mostra-se que as matrizes S e F comutam, o quesignifica que ambas possuem um conjunto ortonormal de autovetores em comum [7]. A obtencaopropriamente dita de tal conjunto faz uso da matriz

P = PT = P−1 =√2−1

√2 0 · · · 0 0 0 · · · 0

0 1 0 1...

. . .... . .

.

0 1 0 1

0 0 · · · 0√2 0 · · · 0

0 1 0 −1... . .

. .... . .

0 1 0 −1

, (7)

que decompoe um vetor em suas componentes pares e ımpares. A transformacao de similaridade

PSP−1 =

[Ev 00 Od

](8)

produz as matrizes tridiagonais simetricas Ev e Od, com dimensoes⌊N2

⌋+ 1 e

⌊N−12

⌋, respec-

tivamente (⌊·⌋ denota a parte inteira do argumento). Todos os autovalores de cada uma dasmatrizes Ev e Od sao distintos [7]. A partir dos respectivos autovetores, constroi-se o unico con-junto ortnonormal de autovetores de S, que e tambem um conjunto ortonormal de autovetoresde F e que sera utilizado na construcao de V.

De modo mais especıfico, os autovetores pares de S sao obtidos por

v2k = P[eTk | 0 . . . 0

]T, k = 0, . . . ,

⌊N

2

⌋, (9)

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em que ek e um autovetor de Ev; os autovetores ımpares de S sao obtidos por

v2k+1 = P[0 . . . 0 | oTk

]T, k = 0, . . . ,

⌊N − 3

2

⌋, (10)

em que ok e um autovetor de Od. O autovetor na (i+1)-esima coluna de V deve estar associadoao autovalor (−

√−1)i, o (i+1)-esimo elemento ao longo da diagonal de Λ (i = 0, 1, . . . , N − 1).

Para N par, e preciso suprimir i = N − 1 (ou considerar nulo o respectivo autovetor) e incluiri = N . Tal ajuste se faz necessario em funcao das multiplicidades dos autovalores de F (videTabela 1). Os passos necessarios para a obtencao da expansao espectral de F, a qual possibilitao calculo de Fa, a matriz da GFrFT, sao resumidos na Tabela 2.

Tabela 2: Construcao da matriz da GFrFT com dimensoes N ×N .

1. Escolha de um elemento ζ ∈ GF(p), em que p ≡ 1(mod 4), tal que ord(ζ) = N ;

2. Construcao da matriz S de acordo com a Equacao (6);

3. Construcao da matriz P de acordo com a Equacao (7);

4. Obtencao das matrizes Ev e Od a partir da Equacao (8), e calculo dos seus autovalores;

5. Calculo dos autovetores e de Ev e dos autovetores o de Od;

6. Calculo dos autovetores v de S: os autovetores pares e ımpares sao calculados a partir dos auto-vetores e e o, respectivamente, de acordo com as Equacoes (9) e (10);

7. Construcao da matriz V, cujas colunas sao os autovetores v ordenados segundo os autovalorescorrespondentes presentes na matriz diagonal Λ;

8. Escolha do parametro racional a e calculo de Fa de acordo com a Equacao (5).

Exemplo 1 Consideremos, neste pequeno exemplo, a construcao de uma transformada fracionalde Fourier sobre GF(59833) utilizando ζ = 30719. A ordem de ζ e ord(ζ) = N = 6. Apos aconstrucao das matrizes S e P, por meio das Equacoes (6) e (7), sao obtidas as matrizes

Ev =

59831 23864 0 023864 59830 1 0

0 1 59828 238640 0 23864 59827

e Od =

[59828 1

1 59830

].

Os autovalores de Ev sao {17822, 29164, 30661, 42003} e os de Od sao {23860, 35965}. A partirdos autovetores de Ev e Od (o procedimento para obtencao desses autovetores e omitido), saoconstruıdos, por meio das Equacoes (9) e (10), os autovetores v da matriz F. Esses autovetoressao apresentados na Tabela 3, assim como os respectivos autovalores, na ordem em que eles saodispostos ao longo da diagonal da matriz Λ.

Como o conjunto de autovetores a ser empregado na expansao espectral de F deve ser ortonor-mal, os autovetores v precisam, ainda, ser normalizados antes de serem efetivamente utilizadosna construcao da matriz V presente na Equacao (5). Para isso, basta multiplicar cada um dessesautovetores pelo inverso de sua norma [7]. Com isso, tem-se todas as informacoes necessariaspara a obtencao da matriz Fa, para um valor especıfico de a. Fazendo a = 1/2, por exemplo,os elementos da diagonal de Λa sao {1, 30009, 53431, 6145, 59832, 6402}. Assim, a matriz F1/2

e dada por

F1/2 =

22866 53561 45264 35516 45264 5356153561 1365 51434 34065 21517 1320445264 51434 6964 54906 18804 2151735516 34065 54906 56463 54906 3406545264 21517 18804 54906 6964 5143453561 13204 21517 34065 51434 1365

.

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Tabela 3: Conjunto ortogonal de autovetores da matriz F (p = 59833, ζ = 30719, N = 6).

k Λk+1,k+1 = (−√−1)k vk

0 1 [ 1 45248 17234 7540 17234 45248 ]

1 −√−1 ≡ 53431 [ 0 11933 11932 0 47901 47900 ]

2 −1 ≡ 59832 [ 1 8912 59617 29601 59617 8912 ]

3√−1 ≡ 6402 [ 0 11931 11932 0 47901 47902 ]

4 1 [ 1 50919 53262 43808 53262 50919 ]

5 − −6 −1 ≡ 59832 [ 1 14583 49396 38701 49396 14583 ]

4 Aplicacoes

Nesta secao, sao apresentadas de forma preliminar duas sugestoes de aplicacoes para a transfor-mada fracional de Fourier de corpo finito. A primeira delas consiste na utilizacao dos autovetoresda GFrFT como sequencias sobre as quais e possıvel a transmissao de dados num esquema decomunicacao multiusuario [3]. A segunda proposta consiste na aplicacao da GFrFT para for-matacao (uniformizacao) de histogramas para cifragem de imagens digitais [6].

4.1 Comunicacao Multiusuario Baseada na GFrFT

A comunicacao multiusuario e um procedimento de grande importancia para o aproveitamentoracional dos recursos disponıveis nas redes de comunicacao modernas. Tecnicas como o CDMAimplementam tal procedimento utilizando sequencias de espalhamento sobre as quais cadausuario transmite seus dados [12]. Apos a interferencia mutua que essas sequencias sofremno canal de comunicacao, elas podem ser separadas (recuperadas) num receptor por meio de umcalculo de correlacao. O que permite essa separacao e, basicamente, a ortogonalidade entre assequencias. Tal propriedade e tambem verificada entre os autovetores da matriz da GFrFT.

Diante disso, pode-se construir um esquema de comunicacao multiusuario associando a cadausuario um autovalor distinto de uma GFrFT. Cada usuario transmite seus dados sobre autove-tores pertencentes ao subespaco vetorial associado, os quais sao gerados pelo produto de cadaautovetor obtido na expansao espectral descrita na Secao 3 por fatores de escala. Apos interferi-rem num canal somador aditivo sobre o corpo considerado, as sequencias enviadas pelos diversosusuarios sao separadas por meio do calculo de uma correlacao ou solucionando um sistema deequacoes. O exemplo a seguir ilustra este procedimento quando se tem apenas dois usuarios.

Exemplo 2 (Esquema com dois usuarios) Consideremos a GFrFT construıda no Exem-plo 1. Precisa-se apenas de dois autovalores distintos e, para isso, e suficiente fazer a = 1.Neste caso, a GFrFT se reduz a transformada de Fourier de corpo finito usual, o que sugere aescolha dos autovalores λ1 = 1 e λ2 = −1 ≡ 59832(mod59833). Se x1 e x2 forem autovetores as-sociados aos autovalores λ1 e λ2, respectivamente, e sobre os quais os usuarios 1 e 2 transmitemseus dados, ao se somarem, eles produzirao a sequencia y = x1+x2. Aplicando a transformadaa y, obtem-se yF = x1F + x2F = x1 − x2. Resolvendo o sistema composto pelas duas ultimasequacoes, recupera-se as sequencias x1 e x2 por x1 = (y + yF)/2 e x2 = (y − yF)/2.

A ideia descrita pode ser estendida para um numero maior de usuarios. Basta escolher valorespara o comprimento N e para o parametro a que garantam que o numero de autovalores distintosda matriz da transformada construıda e maior ou igual ao numero de usuarios simultaneos que sedeseja que o esquema suporte. Esquemas como esse, mas utilizando outras transformadas, temsido investigados. A maior vantagem de se utilizar a GFrFT e o fato de se ter que lidar apenascom valores inteiros na composicao e no processamento das sequencias dos usuarios. Isso torna

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(a)

0 50 100 150 200 2500

500

1000

1500

2000

2500

3000

(b)

(c)

0 50 100 150 200 2500

200

400

600

800

1000

1200

(d)

Figura 1: (a) Imagem original lena.bmp; (b) Histograma de lena.bmp; (c) Imagem com histo-grama formatado utilizando transformadas de corpo finito; (d) Histograma formatado.

as implementacoes mais rapidas e facilita a comparacao dos esquemas propostos com aquelesbaseados em tecnicas que empregam sequencias binarias.

4.2 Formatacao de Histogramas para Cifragem de Imagens Digitais

Com a crescente facilidade para distribuicao de informacao multimıdia nas redes de comunicacao,tecnicas que protejam imagens digitais contra manipulacoes nao autorizadas e garantam confi-dencialidade tem se tornado cada vez mais necessarias aos usuarios. Nesse contexto, os metodospara cifragem de imagens desempenham um importante papel. Para evitar ataques estatısticossobre uma imagem cifrada, e importante que a mesma tenha passado por uma etapa que tenhadescaracterizado o seu histograma original ou, idealmente, que o tenha tornado uniforme.

A formatacao de histogramas para cifragem de imagens digitais e feita, basicamente, peladivisao da imagem em blocos com dimensoes iguais as da transformada, a qual e aplicada demaneira recursiva. Utilizando a transformada inversa, recupera-se a imagem original. Comoforma de ilustrar os resultados conseguidos com este esquema, na Figura 1, apresentam-se aimagem em 256 nıveis de cinza lena.bmp e o seu histograma original, assim como a imagemlena.bmp apos a formatacao e o respectivo histograma; neste caso, foi utilizada uma transformadado cosseno de corpo finito. Testes objetivos atestam a distribuicao uniforme do histogramaformatado e a baixa correlacao entre pixels vizinhos [6].

A possibilidade adicional conseguida pelo uso da transformada fracional de Fourier de corpofinito neste processo consiste em empregar uma sequencia de valores para o parametro fracionala como uma chave secreta. Pode-se definir como chave o vetor a = (ai), i = 0, 1, . . . , an, cujoselementos sao valores que possam ser utilizados como parametros fracionais da transformada aser empregada. O i-esimo bloco da imagem original e, entao, processado pela transformada commatriz Fai e, a partir daı, a imagem cifrada e com histograma formatado e obtida.

5 Conclusoes

Neste artigo, foi apresentado um procedimento sistematico para construcao de transformadasfracionais de Fourier sobre corpos finitos GF(p), em que p ≡ 1(mod4). Diversos aspectos teoricos

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envolvidos na definicao da GFrFT foram abordados e sugestoes de aplicacoes da transformadaforam fornecidas. Atualmente, tem sido investigadas de forma mais completa as propriedades daGFrFT, assim como a sua efetiva aplicabilidade em contextos como os que foram mencionados,o que requer a consideracao de uma serie de fatores de ordem pratica. Outras transformadasfracionais em corpos finitos, como a do cosseno e a do seno, tambem tem sido caracterizadas.Relacoes das transformadas fracionais de corpo finito com grupos de matrizes e suas aplicacoesem Codigos Corretores de Erro e Criptografia sao outros topicos que se pretende investigar.

Agradecimentos

Esta pesquisa e desenvolvida com recursos da Fundacao de Amparo a Ciencia e Tecnologia doEstado de Pernambuco (FACEPE), Processo No APQ 1196-3.04/10.

Referencias

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