Fisioterapia preventiva no encurtamento muscular dos...

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1 Fisioterapia preventiva no encurtamento muscular dos isquiostibiais em crianças com diagnóstico de paralisia cerebral diparética espástica Michell Rodrigo Vieira Sales 1 [email protected] Orientadora: Dayane Priscila Maia Mejia 2 Pós-graduação em Fisioterapia Neurofuncional Faculdade de Tecnologia do Ipê-FAIPE / Bio Cursos Resumo A paralisia cerebral é atribuída a um grupo de distúrbios não progressivos decorrentes de lesão no cérebro em desenvolvimento. Por mais que a característica da lesão cerebral não ser progressiva os danos decorrentes à lesão podem evoluir quando não se tem um atendimento precoce e/ou preventivo. Dentre uma das complicações secundárias à lesão cerebral temos o encurtamento muscular em ísquiostibiais em consequência do grau de espasticidade e da falta de orientação dos responsáveis quanto ao manejo da criança. O fisioterapeuta atuando e orientando de maneira preventiva junto com uma equipe multidisciplinar visa buscar a melhor qualidade de vida para a criança que esteja acometida pela paralisia cerebral. O objetivo desse estudo é de identificar as principais causas do encurtamento muscular nos ísquiostibiais em crianças com diagnóstico de paralisia cerebral diparética espástica. Conclui-se que as intervenções fisioterapêuticas com exercícios de alongamento e fortalecimento, junto com o uso de medicações específicas para o combate da espasticidade e uso de órteses contribuirão para a prevenção do encurtamento muscular dos ísquiostibiais. A revisão bibliográfica de carácter exploratório foi o método utilizado nesta pesquisa. Palavras-chave: Paralisia Cerebral; Espasticidade; Fisioterapia 1. Introdução Na paralisia cerebral, dentre um dos tipos de classificação que pode se apresentar, temos a paralisia cerebral diparética espástica que se caracteriza pelo acometimento predominantemente em membros inferiores. Em virtude da elevada predisposição ao encurtamento muscular em membros inferiores que a lesão cerebral na criança pode acarretar o objetivo desse artigo é identificar as principais causas desse encurtamento muscular nos ísquiostibiais e propor recursos para que se possa atuar de maneira preventiva visando uma melhor qualidade de vida e evitar que as crianças desenvolvam deformidades e limitações físicas no decorrer da idade. 2. Fundamentação Teórica

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Fisioterapia preventiva no encurtamento muscular dos isquiostibiais

em crianças com diagnóstico de paralisia cerebral diparética espástica

Michell Rodrigo Vieira Sales1

[email protected]

Orientadora: Dayane Priscila Maia Mejia2

Pós-graduação em Fisioterapia Neurofuncional – Faculdade de Tecnologia do Ipê-FAIPE / Bio Cursos

Resumo

A paralisia cerebral é atribuída a um grupo de distúrbios não progressivos decorrentes de

lesão no cérebro em desenvolvimento. Por mais que a característica da lesão cerebral não

ser progressiva os danos decorrentes à lesão podem evoluir quando não se tem um

atendimento precoce e/ou preventivo. Dentre uma das complicações secundárias à lesão

cerebral temos o encurtamento muscular em ísquiostibiais em consequência do grau de

espasticidade e da falta de orientação dos responsáveis quanto ao manejo da criança. O

fisioterapeuta atuando e orientando de maneira preventiva junto com uma equipe

multidisciplinar visa buscar a melhor qualidade de vida para a criança que esteja acometida

pela paralisia cerebral. O objetivo desse estudo é de identificar as principais causas do

encurtamento muscular nos ísquiostibiais em crianças com diagnóstico de paralisia cerebral

diparética espástica. Conclui-se que as intervenções fisioterapêuticas com exercícios de

alongamento e fortalecimento, junto com o uso de medicações específicas para o combate da

espasticidade e uso de órteses contribuirão para a prevenção do encurtamento muscular dos

ísquiostibiais. A revisão bibliográfica de carácter exploratório foi o método utilizado nesta

pesquisa.

Palavras-chave: Paralisia Cerebral; Espasticidade; Fisioterapia

1. Introdução

Na paralisia cerebral, dentre um dos tipos de classificação que pode se apresentar, temos a

paralisia cerebral diparética espástica que se caracteriza pelo acometimento

predominantemente em membros inferiores. Em virtude da elevada predisposição ao

encurtamento muscular em membros inferiores que a lesão cerebral na criança pode acarretar

o objetivo desse artigo é identificar as principais causas desse encurtamento muscular nos

ísquiostibiais e propor recursos para que se possa atuar de maneira preventiva visando uma

melhor qualidade de vida e evitar que as crianças desenvolvam deformidades e limitações

físicas no decorrer da idade.

2. Fundamentação Teórica

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Lesões congênitas ou adquiridas no período pré e perinatal são responsáveis pelas diferentes

alterações neurológicas sobre o sistema nervoso central. Dentre os agentes agressores temos a

deprivação de oxigênio ao feto, exposição ao monóxido de carbono, choque materno, parada

respiratória, drogas (superdosagem de medicamentos), infecções congênitas ( toxoplasmose,

rubéola, herpes, sífilis, HIV, e outros), e malformações do sistema nervoso central, dentre

outros.1

A encefalopatia hipóxico-isquêmica neonatal (EHIN) é a afecção neurológica mais comum no

período neonatal. Modelos experimentais demonstram claramente os efeitos deletérios da

hipóxia e da isquemia sobre o sistema nervoso central do recém nascido; entretanto, na prática

clínica, os fatores etiológicos e sua época de ocorrências nem sempre são de fácil

determinação.2

As alterações neuropatológicas da encefalopatia hipóxico-isquêmica variam com a idade,

natureza da lesão e tipo de intervenção, resultando em necrose neuronal seletiva, status

marmoratus, lesão cerebral parassagital, leucomalácia periventricular ou necrose isquêmica

cerebral focal e multifocal. A hipóxia pré-natal é responsável por 20% dos casos de

encefalopatia hipóxico-isquêmica do recém nascido; a perinatal, por 35% e a concomitância

de ambas, por mais 35% dos casos, ficando apenas 10% para a hipóxia pós-natal. No entanto

estudos recentes em animais não encontraram evidências de que a hipóxia, ocorrendo

unicamente durante o trabalho de parto, seja capaz de causar paralisia cerebral. O mais

provável é que a triagem da leucomalácia periventricular, que faz parte do quadro de

encefalopatia hipóxico-isquêmica seja pré e perinatal associadas. Conclui-se que os chamados

sinais resultantes da asfixia por ocasião do parto possam estar ocorrendo por uma soma da

hipóxia pré-natal e perinatal.3

Os bebês com atraso no desenvolvimento neuropsicomotor ou com paralisia cerebral já

diagnosticada, felizmente estão sendo encaminhados mais cedo aos centros de reabilitação,

possibilitando a intervenção precoce, ampliando as possibilidades de estimulação do sistema

nervoso central por meio das experiências sensorimotoras.12

Apesar da natureza da lesão cerebral não ter característica progressiva, os comprometimentos

e alterações musculoesqueléticas podem piorar com o passar do tempo caso não tenha

acompanhamento especializado por uma equipe multidisciplinar, já que deficiências

secundárias à lesão cerebral estão associadas, tais como, deficiência intelectual, visual,

auditiva, e problemas comportamentais. Lesões do sistema nervos central podem resultar em

uma variedade de comprometimentos primários que afetam os sistemas motor

(neuromuscular), sensorial, e cognitivo. Como exemplo de comprometimentos primário temos

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a paresia e espasticidade. E como comprometimentos secundários temos a mudança na

estrutura e função dos músculos, contraturas musculares e diminuição da amplitude articular.4

A paralisia ou paresia motora decorrente de lesão do sistema nervoso central é resultado da

dificuldade ou incapacidade do recrutamento voluntário da unidade motora por falha no

impulso excitatório central.

Classificação topográfica da paralisia cerebral:

Quadriplegia (tetraplegia): Envolvimento de todos os membros e do tronco. Os membros

superiores são tão ou mais afetados que os membros inferiores. Muitos são assimétricos

(um lado mais afetado).

Diplegia: Envolvimento dos membros, com membros superiores muito menos afetados do

que membros inferiores. Pode haver assimetria.

Hemiplegia: Acometimento dos membros e do tronco em um dos lados.8

Classificação dos tipos de paralisia cerebral:

Paralisia Cerebral Espástica.

Paralisia Cerebral Atetoide (discinesia, distonia).

Paralisia Cerebral Atáxica.8

As principais características motoras da paralisia cerebral espástica são quanto ao tônus

(hipertonia), fraqueza muscular, posturas anormais, movimentos involuntários e deficiências

associadas.8

A espasticidade é caracterizada por uma hiperexcitabilidade de reflexos tônicos de

estiramento. Espasticidade e rigidez são características da hipertonia.4

Escala modificada de Ashworth para avaliação da espasticidade:

0 – nenhum aumento de tônus muscular;

1 – aumento discretono tônus muscular, manifestado por uma captura leve e liberação ou

por resistência mínima no final da amplitude do movimento quando a(s) parte(s) é movida

em flexão ou extensão;

1+ - aumento discreto no tônus muscular, manifestado por uma captura, seguido por uma

resistência mínima pela amplitude do movimento restante (menos da metade);

2 – aumento mais importante no tônus muscular, o movimento passivo é difícil;

3 – aumento considerável no tônus muscular, o movimento passivo é difícil;

4 – parte(s) afetada(s) rígida(s) em flexão ou extensão.5

Portanto a criança com paralisia cerebral diparética espástica apresenta fraqueza muscular e

espasticidade predominante em membros inferiores, com diferentes graus na capacidade

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motora funcional de acordo com o sistema de classificação da função motora grossa

(GMFCS).8

Nos últimos anos, uma escala que determina o nível de comprometimento motora da criança

com paralisia cerebral tem sido de grande valia para a avaliação e o prognóstico da marcha. A

classificação da função motora grossa (Gross Motor Function Calssification System –

GMFCS), é dividida em cinco níveis de habilidade12:

Nível I – A criança deambula sem restrições, apresentando limitações em atividades

motoras mais avançadas como correr e pular.

Nível II – A criança deambula sem auxílio, mas com limitações na marcha comunitária.

Quando comparadas às crianças do nível 1, apresentam limitações na facilidade com que

desempenham transições posturais, e na marcha fora de casa e comunidade. Têm

necessidade de apoio quando iniciam a marcha. Apresentam pior qualidade de

movimento. Têm menos habilidade para correr e pular.

Nível III – A criança deambula com apoio, com limitações na marcha fora de casa e na

comunidade. Sentam-se de forma independente e locomovem-se no chão (engatinhando).

Nível IV – A criança tem mobilidade limitada, necessita de cadeira de rodas para

locomoção fora de casa e na comunidade. Sentam-se somente com suporte e locomovem-

se apenas quando transportadas.

Nível V – A criança tem mobilidade gravemente limitada, mesmo com o uso de

tecnologia assistiva. São totalmente dependentes, inclusive no controle da postura

antigravitacional.

A imobilidade é uma das principais causas para o encurtamento muscular. Há uma tendência

para que os músculos espásticos se encurtem e tracionem articulações em padrões motores

anormais. A contratura muscular está relacionada às alterações no comprimento do músculo

ao passo que o enrijecimento das articulações está mais relacionado à privação do

movimento.8

O músculo espástico aparenta ser forte e seu antagonista fraco, porém não é isso o que ocorre.

É a tração intensa do músculo espástico encurtado que é forte. Depois que a espasticidade é

diminuída, revela-se a fraqueza do músculo. Como os antagonistas não conseguem contrapor

ao agonista espástico não ocorre o alongamento do músculo espástico. Com o tempo e o

desuso ou inatividade a espasticidade acarreta a fraqueza muscular tanto de agonista quanto

de antagonista. Longos períodos numa mesma postura leva a contraturas e deformidades.8

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É necessário prevenir a deformidade por meios de mobilização articular e alongamentos dos

músculos espásticos, bem como o fortalecimento de todos os envolvidos.8

O objetivo da fisioterapia na paralisia cerebral é melhorar a função e atrasar a cirurgia em

caso de rigidez articular. Em relação as técnicas mais adequadas para atingir estes objetivos

não há evidências científicas sobre o benefício do alongamento dos ísquiostibiais como uma

parte fundamental. O exercício de resistência aeróbica pode ajudar a aumentar a força dos

músculos dos membros inferiores, reduzir a energia necessária para caminhar e melhorar a

função motora grossa e autopercepção em alguns adolescentes com paralisia cerebral

diparética espástica.13

A diparesia espástica normalmente compromete as 3 principais articulações dos membros

inferiores, quadril, joelho e pés. O tratamento deve ser iniciado cedo para que sejam evitadas

às tendência de agravamento da espasticidade, retração muscular e contratura.1

O sucesso do processo de reabilitação baseia-se em um tripé composto pela avaliação

minuciosa do paciente como um todo, pela determinação de seu prognóstico global da forma

mais objetiva possível e pela ação de uma equipe multidisciplinar capacitada e entrosada, em

que a meta de cada um deve ser a meta de todos: levar o portador de paralisia cerebral ao

máximo de suas potencialidades remanescentes, proporcionando-lhe, sempre que possível,

uma vida útil e digna.12

A intervenção fisioterapêutica precoce ajuda a criança com diagnóstico de paralisia cerebral

diparética espástica a conseguir uma melhor performance motora, previne contraturas e

deformidades, e aumenta a propriocepção.1

Além dos recursos fisioterapêuticos de alongamento e estimulação muscular e de

posicionamento da criança no dia a dia, podemos associar outros recursos como órteses,

medicamentos e cirurgia.1

Diversas intervenções terapêuticas foram desenvolvidas para o manuseio do tônus muscular

anormal, incluindo tratamentos farmacológico, cirúrgico e físico. O tipo de tratamento

escolhido irá depender de diversos fatores, incluindo a distribuição, a gravidade, e a

cronicidade da espasticidade.5 Por exemplo, uma espasticidade mínima pode ser tratada por

meio de uma combinação de exercícios terapêuticos, splinting, órteses e medicamentos orais.

Por outro lado, a espasticidade grave pode necessitar de químiodenervação (bloqueios

nervoso ou injeção de toxina botulínica) e/ou cirurgia para reduzir a contratura e melhorar o

controle motor.5

A toxina botulínica-A funciona bloqueador da junção neuromuscular com objetivo de relaxar

músculos pontualmente. O mecanismo de ação consiste no bloqueio da liberação das

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vesículas de acetilcolina pré-sinápticas nas terminações nervosas colinérgicas sem destruí-las,

produzindo um músculo denervado. Observa-se um período de 24 a 72 horas entre a aplicação

e o início do efeito clinicamente observável.1

As preparações de toxina botulínica para uso terapêutico no mercado brasileiro são do tipo A,

denominadas onabotulino-toxina (100 unidades por frasco), abobotulino-toxina ( 500

unidades por frasco) e incobotulino-toxina (100 unidades por frasco). Elas são empregadas

em doses variáveis, conforme a massa muscular a ser injetada e o peso do paciente. As

formulações de 100 e 500 unidades não são equipotentes e deve fazer um ajuste de

compatibilidade de doses antes da aplicação.9 O uso de órteses na extremidade afetada pode

diminuir a ativação do músculo injetado com toxina botulínica e prolongar seu efeito.1

A deformidade em flexão de joelho frequentemente esta presente na paralisia cerebral, sendo

causada para compensar uma deformidade de pé equino e deformidade em flexão de quadril,

por espasticidade dos flexores de joelho, principalmente os isquiotibiais, ou funcional, para

mudar o centro de gravidade e alcançar o equilíbrio.10, 1, 11Essa deformidade pode ser

dinâmica ou fixa. A deformidade dinâmica só aparece quando a criança fica em pé ou anda;

se não for tratada, acaba por se transformar em fixa. Tanto em uma quanto em outra coexiste

encurtamento dos flexores de joelho, e, quanto maior for o encurtamento dos flexores, maior

será a tendência para a fixação da deformidade.10

A espasticidade dos ísquiostibiais, que produz uma flexão excessiva do joelho, é um problema

frequente em certos tipos de paralisia cerebral; manifesta-se como um padrão de marcha

fletida.5

Acerca da prevenção/acompanhamento da evolução das contraturas, este tem sido um dos

principais focos de atuação da fisioterapia nas doenças neuromusculares. Apesar de haver

consenso no fato de que não há como prevenir o aparecimento de contraturas, um adequado

programa de ortetização (posicionamento adequado), e alongamentos sistemáticos,

especialmente naqueles grupos musculares em que a incidência de contraturas é mais

frequente, pode minimizar e retardar sua instalação.6

Uma órtese tornozelo-joelho-pé é um tipo de tala ou reforço que é usado para controlar o

tornozelo e o joelho. O propósito dessa órtese deve sempre ser muito precisamente descrito e

definido para que, ao se feito, seja fácil de verificar se ela está de acordo com a prescrição e

então avaliar as melhoras da função criança.7

O uso de moldes de gesso para inibição de reflexos é uma técnica que é definida por alguns

fisioterapeutas a fim de reduzir o grau de espasticidade dos músculos. Os moldes são usados

por períodos de até 3 semanas e durante esse tempo é dada uma reabilitação intensiva.7

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3. Metodologia

Este estudo caracteriza-se como revisão bibliográfica de carácter exploratório, realizada no

período de outubro de 2015 a março de 2016. A coleta de dados foi realizada na Biblioteca da

Faculdade UNIP e Biblioteca da Faculdade de Tecnologia do Ipê – FAIPE, ambas na cidade

de Manaus, bem como Biblioteca Virtual de Saúde (BVS), biblioteca eletrônica Scientific

Electronic Library Online (SciELO), Literatura Latino Americana e do Caribe em Ciências da

Saúde (Lilacs), revistas virtuais e base de dados em evidências em fisioterapia (PEDro).

Como estratégia de busca foram utilizadas palavras-chave como paralisia cerebral,

fisioterapia e espasticidade.

4. Resultados e Discussão

O tratamento fisioterapêutico nas alterações musculoesqueléticas em crianças com paralisia

cerebral, é muito abrangente pois as causas dessas alterações podem ser diversas

(espasticidade, encurtamento muscular, instabilidade articular, fraqueza muscular). Nas

crianças tetraparéticas, diparéticas e hemiparéticas, o tratamento também será diferenciado,

devendo-se sempre considerar a avaliação e o comportamento para cada criança em

particular.18

Um estudo feito em 51 crianças com paralisia cerebral espástica no período de 12 semanas,

sendo que 26 dessas crianças se submeteram ao tratamento de exercício de resistência

progressiva na marcha e as outras 25 receberam tratamento habitual. Notou-se uma melhora

significativa da força muscular em membros inferiores nas crianças que receberam o

tratamento de resistência progressiva, porém sem melhora da espasticidade.14

Crianças com diagnóstico de paralisia cerebral diplégica foram divididas em três grupos,

sendo que o primeiro grupo realizou tratamento sem uso de órtese, o segundo grupo foi usado

Theratogs (sistema de fitas) e o terceiro grupo foi submetido ao uso do theratogs e da órtese

tornozelo-pé. Foram encontradas diferenças significativas entre os grupos com melhora,

principalmente no terceiro grupo, na velocidade da marcha, cadência e comprimento do

passo.15

As órteses promoveram o desempenho de tarefas motoras da rotina diária de crianças com

paralisia cerebral. Onde 20 crianças incluídas nos níveis 1,2 e 3 da escala de classificação da

função motora grossa (GMFCS) foram avaliadas em suas funções com e sem órtese. Após 30

dias de adaptação e uso contínuo da órtese os resultados do estudo mostraram que o uso de

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órteses suropodálicas proporcionou benefícios tanto nos parâmetros qualitativos da marcha,

quanto no desempenho motor grosso de crianças com paralisia cerebral.20

Três estudos com toxina botulínica A elegíveis foram encontrados cada um com um pequeno

número de indivíduos. Eles eram de curto prazo, usado sessões individuais com

acompanhamento entre 4 a 26 semanas. Um dos estudos com 12 crianças com paralisia

cerebral espástica não encontrou melhoras significativas na marcha com o uso da toxina e de

placebo. Em outro estudo com 20 crianças com mesmo diagnóstico, comparou tratamentos

com uso de toxina botulínica A e uso de moldes, onde foram encontrados melhorias na

marcha, amplitude de movimento do tornozelo, tônus muscular e melhorias significativas

usando a medida de escala da função motora grossa. E o outro estudo realizou a análise da

marcha 3D sobre essas crianças capazes de cooperar e a flexão plantar máxima e flexão dorsal

máxima durante a caminhada foram encontrados em maior quantidade no grupo de toxina

botulínica A em comparação ao grupo de elenco.16

Um grupo de 46 crianças com diagnóstico de paralisia cerebral com idade média de 8 anos foi

dividido sendo que um dos grupos foi tratado com vários níveis de toxina botulínica A (BTX-

A) e reabilitação integral, e no outro grupo foi continuado apenas com fisioterapia usual por

um período de 18 a 30 semanas. O efeito do tratamento nas primeiras 24 semanas

proporcionou uma melhora significativamente maior do grupo controle entre 12 e 24 semanas

em relação ao grupo tratado com fisioterapia usual. A longo prazo foi notado uma melhoria

significativa dos resultados na função motora grossa (GMFCS).17

O tratamento fisioterápico tem como metas, em resumo, preparar para uma função, manter as

já existentes, ou aprimorar sua qualidade, através da adequação da espasticidade. Os

medicamentos mais utilizados no tratamento da espasticidade são o bacoflen, o diazepan,

dantrolene, a clonidina, a tizanidina, a clorpromazina, e também a morfina. Grande parte dos

medicamentos usados para o controle da espasticidade apresenta limitações de uso,

principalmente pela necessidade frequente de doses elevadas e/ou desenvolvimento de efeitos

colaterais incapacitantes.17

Com o objetivo de avaliar a influência do alongamento cirúrgico dos isquiostibiais e

transferência do reto femoral sobre o arco de movimento dos joelhos, 24 crianças com

diagnóstico de paralisia cerebral diparética espástica foram divididas em dois grupos.

Pacientes que foram submetidos à transferência do reto femoral para flexor do joelho sem o

concomitante alongamento dos isquiostibiais mediais formaram o grupo A, enquanto o grupo

B foi constituído por pacientes em que estes procedimentos foram combinados. Todos foram

submetidos à análise tridimensional da marcha antes e após os procedimentos cirúrgicos, com

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tempo de seguimento médio de 15,5 meses. Na amostra estudada, houve aumento

significativo do arco de movimento dos joelhos após a realização dos procedimentos

cirúrgicos, porém o alongamento dos isquiostibiais mediais não gerou aumento adicional.19

Entre julho de 2000 e abril de 2004, 19 pacientes com paralisia cerebral espástica bilateral que

necessitavam de apoio na marcha fizeram a combinação de alongamentos e cirurgia

multinível nos isquiostibiais. Através do exame físico com pontuação na escala de mobilidade

funcional, análise funcional da marcha, parâmetros estáticos (ângulo poplíteo, deformidade

em flexão do joelho) e parâmetros cinemáticos sagital do joelho (flexão do joelho no contato

inicial, flexão mínima do joelho durante a postura, média de flexão do joelho durante a

postura ereta), foram registrados para comparação de pré e pós-operatório. Foram encontradas

melhorias significativas nos resultados dos parâmetros estático e dinâmico que corresponde

melhoria na marcha e na mobilidade funcional, melhoria também de um nível na classificação

da função motora grossa (GMFCS). A relação entre o nível da função motora à deformidade

musculoesquelética e sua correção merece um estudo mais aprofundado.22

Para avaliar a eficácia do uso de esteira na intervenção fisioterapêutica sobre o

desenvolvimento motor em lactentes e crianças com menos de 6 anos de idade que estão em

risco de atraso neuromotor. Os dados disponíveis de 5 estudos com 139 crianças indicam que

a intervenção com o uso de esteira pode acelerar o desenvolvimento da marcha. Porém mais

pesquisas são necessárias para confirmar se o uso de esteiras pode realmente acelerar o

desenvolvimento da marcha em crianças com paralisia cerebral, e se este modelo de

intervenção tem um efeito sobre o coordenação motora grossa nos vários subgrupos de

crianças com risco de atraso no neurodesenvolvimento.21

Para comparar o uso de esteira com suporte parcial de peso na intervenção fisioterapêutica em

crianças com paralisia cerebral, 30 crianças com idade entre 6-18 anos e com classificação de

função motora grossa II e III participaram de um programa de intervenção com esteira comum

(grupo controle) e com esteira com suporte parcial de peso (grupo intervenção), durante 8

semanas, duas vezes por dia em um período de 30 minutos. Notou-se que em curto prazo a

melhora do grupo controle foi significativa, porém ao final das 8 semanas os ganhos de

velocidade de caminhada e os ganhos na função motora foram semelhantes. Portanto o uso de

esteiras com suporte parcial de peso não se demonstrou mais eficiente do que o uso de esteiras

comuns.23

O treinamento de vibração do corpo inteiro em crianças com paralisia cerebral diplégica pode

ser uma ferramenta útil para melhora de força muscular e equilíbrio. Segundo um estudo feito

com 30 crianças, sendo que 15 (grupo controle) participaram de um programa de fisioterapia

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tradicional e outras 15 (grupo experimental) recebeu treinamento de vibração de corpo inteiro

durante 3 meses com duração de 9 minutos por dia e 5 vezes por semana. Nas avaliações após

o tratamento foi utilizado o dinamômetro isocinético Biodex para avaliar o índice de

estabilidade e os resultados mostraram que o grupo experimental teve uma melhora

significativa quando comparado ao grupo controle, melhorias principalmente quanto ao

torque dos extensores do joelho.24

A estimulação elétrica combinado com o alongamento passivo demonstrou ser muito eficiente

no combate da espasticidade e no combate da contratura em membros inferiores de crianças

com paralisia cerebral. Onze crianças foram submetidas a um tratamento em que uma das

pernas afetadas recebia a intervenção experimental de estimulação elétrica combinado com

alongamento passivo por 30 minutos de estimulação elétrica no quadríceps durante 3 vezes

por semana e alongamento de isquiostibiais 5 vezes por semana, e a outra perna recebia uma

intervenção em que consistia apenas no alongamento passivo dos isquiostibiais. Como

avaliação da espasticidade foi usado a escala de Ashworth e para medida de extensão máxima

do joelho foi utilizado o goniômetro. Notou-se diminuição na escala de Ashworth e aumento

da extensão passiva do joelho.25

5. Conclusão

Neste estudo foi evidenciado que apesar da lesão na paralisia cerebral não ter característica

progressiva os seus comprometimentos secundários podem se agravar com o passar do tempo.

A fisioterapia preventiva juntamente com a equipe multidisciplinar, surgem para evitar ou

retardar o comprometimento motor gerando assim uma melhor qualidade de vida da criança e

dos pais ou responsáveis. A paralisia cerebral diparética espástica tem como característica

principal o acometimento predominante em membros inferiores e por muitas vezes

ocasionando o encurtamento dos músculos isquiostibiais com consequências, na postura, na

marcha e nas articulações, com deformidades em joelho e no pé. Estudos abordados aqui

demonstraram que os recursos fisioterapêuticos como cinesioterapia, fitas, órteses, esteira, e

juntamente com uma equipe multidisciplinar com interação medicamentosa e cirúrgica foram

significativamente eficientes na abordagem terapêutica de crianças com diagnóstico de

paralisia cerebral, contribuindo para o controle das desordens decorrentes à lesão cerebral.

Conclui-se que apesar dos resultados favoráveis deste estudo, se faz necessário a continuação

de pesquisas relacionadas ao assunto para que sejam aprofundados os conhecimentos e

comprovação da eficiência da fisioterapia preventiva em crianças com paralisia cerebral

diparética espástica.

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6. Referências

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São Paulo. 2ª ed. Atheneu, 2003.

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2012.

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São Paulo. Medbook, 2011.

5. SHUMWAY-COOK, Anne; WOOLLACOTT, Marjorie H. Controle motor: Teoria e

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interdisciplinar. S~åo Paulo. Guanabara Koogan, 2012.

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8. LEVITT, Sophie. Tratamento da paralisia cerebral e do atraso motor. São Paulo. 5ª

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