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Alceu Amoroso Lima |Almeida Jnior | Ansio TeixeiraAparecida Joly Gouveia | Armanda lvaro Alberto | Azeredo Coutinho
Bertha Lutz | Ceclia Meireles | Celso Suckow da Fonseca | Darcy Ribeiro
Durmeval Trigueiro Mendes | Fernando de Azevedo | Florestan FernandesFrota Pessoa | Gilberto Freyre | Gustavo Capanema | Heitor Villa-Lobos
Helena Antipoff | Humberto Mauro | Jos Mrio Pires AzanhaJulio de Mesquita Filho | Loureno Filho | Manoel Bomfim
Manuel da Nbrega | Nsia Floresta | Paschoal Lemme | Paulo FreireRoquette-Pinto | Rui Barbosa | Sampaio Dria | Valnir Chagas
Alfred Binet | Andrs BelloAnton Makarenko | Antonio Gramsci
Bogdan Suchodolski | Carl Rogers | Clestin FreinetDomingo Sarmiento | douard Claparde | mile Durkheim
Frederic Skinner | Friedrich Frbel | Friedrich HegelGeorg Kerschensteiner | Henri Wallon | Ivan Illich
Jan Amos Comnio | Jean Piaget | Jean-Jacques RousseauJean-Ovide Decroly | Johann Herbart
Johann Pestalozzi | John Dewey | Jos Mart | Lev VygotskyMaria Montessori | Ortega y Gasset
Pedro Varela | Roger Cousinet | Sigmund Freud
Ministrio da Educao | Fundao Joaquim Nabuco
Coordenao executivaCarlos Alberto Ribeiro de Xavier e Isabela Cribari
Comisso tcnicaCarlos Alberto Ribeiro de Xavier (presidente)
Antonio Carlos Caruso Ronca, Atade Alves, Carmen Lcia Bueno Valle,Clio da Cunha, Jane Cristina da Silva, Jos Carlos Wanderley Dias de Freitas,
Justina Iva de Arajo Silva, Lcia Lodi, Maria de Lourdes de Albuquerque Fvero
Reviso de contedoCarlos Alberto Ribeiro de Xavier, Clio da Cunha, Jder de Medeiros Britto,
Jos Eustachio Romo, Larissa Vieira dos Santos, Suely Melo e Walter Garcia
Secretaria executivaAna Elizabete Negre iros Barroso
Conceio Silva
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Jos Silvrio Baia Horta
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Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)(Fundao Joaquim Nabuco. Biblioteca)
Horta, Jos Silvrio Baia.Gustavo Capanema / Jos Silvrio Baia Horta. Recife:
Fundao Joaquim Nabuco, Editora Massangana, 2010.160 p.: il. (Coleo Educadores)Inclui bibliografia.ISBN 978-85-7019-524-1
1. Capanema, Gustavo, 1900-1985. 2. Educao Brasil Histria. I. Ttulo.CDU 37(81)
ISBN 978-85-7019-524-1 2010 Coleo Educadores
MEC | Fundao Joaquim Nabuco/Editora Massangana
Esta publicao tem a cooperao da UNESCO no mbitodo Acordo de Cooperao Tcnica MEC/UNESCO, o qual tem o objetivo acontribuio para a formulao e implementao de polticas integradas de
melhoria da equidade e qualidade da educao em todos os nveis de ensino formale no formal. Os autores so responsveis pela escolha e apresentao dos fatos
contidos neste livro, bem como pelas opinies nele expressas, que no sonecessariamente as da UNESCO, nem comprometem a Organizao.
As indicaes de nomes e a apresentao do material ao longo desta publicaono implicam a manifestao de qualquer opinio por parte da UNESCO
a respeito da condio jurdica de qualquer pas, territrio, cidade, regioou de suas autoridades, tampouco da delimitao de suas fronteiras ou limites.
A reproduo deste volume, em qualquer meio, sem autorizao prvia,estar sujeita s penalidades da Lei n 9.610 de 19/02/98.
Editora MassanganaAvenida 17 de Agosto, 2187 | Casa Forte | Recife | PE | CEP 52061-540
www.fundaj .gov.br
Coleo EducadoresEdio-geralSidney Rocha
Coordenao editorialSelma Corra
Assessoria editor ialAntoni o Laurentino
Patrcia Lima
RevisoSygma Comunicao
IlustraesMiguel Falco
Foi feito depsito legalImpresso no Brasil
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SUMRIO
Apresentao, por Fernando Haddad, 7
Ensaio, por Jos Silvrio Baia Horta, 11De bacharel a interventor em Minas, 15
Defendendo o ensino primrio junto Unesco, 17Gustavo Capanema, ministro da Educao, 19
O termo cultura, 20A criao do Conselho Nacional de Cultura, 21
A figura do professor, 22
A disputa, 23A conspirao integralista, 26
O Instituto Nacional de Estudos Pedaggicos (Inep), 28A Universidade do Brasil, 28
A Escola Nacional de Educao Fsica e Desportos, 29
Os intelectuais e Capanema, 31O que foi a Comisso Nacional
do Ensino Primrio, 32Mudanas, 35
Ensino preparador da elite intelectual do pas, 37
Sociologia e religio e aLei Orgnica do Ensino Secundrio, 38
Uma aliana com a Igreja, 42Deixando o Ministrio, 46
Discurso de Capanema na
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comemorao do centenrio do Colgio Pedro II, 48Educao Moral e Cvica, 58
A formao de uma conscincia patritica, 60A dimenso esttica, 62
Planejamento da educao, 68O novo Conselho Nacional de Educao
Um plano quinquenal, 70
Relao com o meio estudantil, 76A UNE, 77
Gustavo Capanema Deputado Constituinte 1946, 83Gustavo Capanema relator do anteprojeto
da Lei de Diretrizes e Bases 1949, 88Gustavo Capanema atual, 98
Textos selecionados, 101
Instalao do Conselho Nacional de Educao, 102
Posse da diretoria do DCE da Universidade do Brasil, 107Comemorao do centenrio do Colgio Pedro II, 110
A misso do professor secundrio: educar para a ptria, 132Exposio de motivos da
Lei Orgnica do Ensino Secundrio, 135
Instalao do Senai, 139
Cronologia, 147
Bibliografia, 149
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O propsito de organizar uma coleo de livros sobre educa-
dores e pensadores da educao surgiu da necessidade de se colo-car disposio dos professores e dirigentes da educao de todo
o pas obras de qualidade para mostrar o que pensaram e fizeram
alguns dos principais expoentes da histria educacional, nos pla-nos nacional e internacional. A disseminao de conhecimentos
nessa rea, seguida de debates pblicos, constitui passo importantepara o amadurecimento de ideias e de alternativas com vistas ao
objetivo republicano de melhorar a qualidade das escolas e da
prtica pedaggica em nosso pas.Para concretizar esse propsito, o Ministrio da Educao insti-
tuiu Comisso Tcnica em 2006, composta por representantes doMEC, de instituies educacionais, de universidades e da Unesco
que, aps longas reunies, chegou a uma lista de trinta brasileiros etrinta estrangeiros, cuja escolha teve por critrios o reconhecimento
histrico e o alcance de suas reflexes e contribuies para o avano
da educao. No plano internacional, optou-se por aproveitar a co-leo Penseurs de lducation, organizada pelo International Bureau of
Education(IBE) da Unesco em Genebra, que rene alguns dos mai-ores pensadores da educao de todos os tempos e culturas.
Para garantir o xito e a qualidade deste ambicioso projetoeditorial, o MEC recorreu aos pesquisadores do Instituto Paulo
Freire e de diversas universidades, em condies de cumprir os
objetivos previstos pelo projeto.
APRESENTAO
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Ao se iniciar a publicao da Coleo Educadores*, o MEC,em parceria com a Unesco e a Fundao Joaquim Nabuco, favo-
rece o aprofundamento das polticas educacionais no Brasil, comotambm contribui para a unio indissocivel entre a teoria e a pr-
tica, que o de que mais necessitamos nestes tempos de transio
para cenrios mais promissores. importante sublinhar que o lanamento desta Coleo coinci-
de com o 80 aniversrio de criao do Ministrio da Educao e
sugere reflexes oportunas. Ao tempo em que ele foi criado, emnovembro de 1930, a educao brasileira vivia um clima de espe-
ranas e expectativas alentadoras em decorrncia das mudanas quese operavam nos campos poltico, econmico e cultural. A divulga-
o doManifesto dos pioneirosem 1932, a fundao, em 1934, da Uni-versidade de So Paulo e da Universidade do Distrito Federal, em
1935, so alguns dos exemplos anunciadores de novos tempos tobem sintetizados por Fernando de Azevedo noManifesto dos pioneiros.
Todavia, a imposio ao pas da Constituio de 1937 e do
Estado Novo, haveria de interromper por vrios anos a luta auspiciosado movimento educacional dos anos 1920 e 1930 do sculo passa-
do, que s seria retomada com a redemocratizao do pas, em1945. Os anos que se seguiram, em clima de maior liberdade, possi-
bilitaram alguns avanos definitivos como as vrias campanhas edu-
cacionais nos anos 1950, a criao da Capes e do CNPq e a aprova-o, aps muitos embates, da primeira Lei de Diretrizes e Bases no
comeo da dcada de 1960. No entanto, as grandes esperanas easpiraes retrabalhadas e reavivadas nessa fase e to bem sintetiza-
das pelo Manifesto dos Educadores de 1959, tambm redigido por
Fernando de Azevedo, haveriam de ser novamente interrompidasem 1964 por uma nova ditadura de quase dois decnios.
* A relao completa dos educadores que integram a coleo encontra-se no incio deste
volume.
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Assim, pode-se dizer que, em certo sentido, o atual estgio daeducao brasileira representa uma retomada dos ideais dos mani-
festos de 1932 e de 1959, devidamente contextualizados com otempo presente. Estou certo de que o lanamento, em 2007, do
Plano de Desenvolvimento da Educao (PDE), como mecanis-
mo de estado para a implementao do Plano Nacional da Edu-cao comeou a resgatar muitos dos objetivos da poltica educa-
cional presentes em ambos os manifestos. Acredito que no ser
demais afirmar que o grande argumento doManifesto de 1932, cujareedio consta da presente Coleo, juntamente com oManifesto
de 1959, de impressionante atualidade: Na hierarquia dos pro-blemas de uma nao, nenhum sobreleva em importncia, ao da
educao. Esse lema inspira e d foras ao movimento de ideiase de aes a que hoje assistimos em todo o pas para fazer da
educao uma prioridade de estado.
Fernando HaddadMinistro de Estado da Educao
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GUSTAVO CAPANEMA(1900 - 1985)
Jos Silvrio Baia Horta
Introduo
Neste livro pretendemos analisar as atividades desenvolvidas
por Gustavo Capanema, inicialmente como ministro da Educa-
o e depois como constituinte e como deputado federal. Temoscomo ponto de partida um questionamento ao clebre texto de
Carlos Drummond de Andrade sobre Capanema, intitulado Ex-perincia de um intelectual no poder, escrito em 1941, no qual ele afirma:
a experincia do clrigo no poder foi vivida largamente por GustavoCapanema. Dez anos j escoados, lcito reconhecer que ele a viveu
com perfeita dignidade espiritual. A tentao de usar os meios gros-seiros do poder deve ser forte, primeira dificuldade que surja para ointelectual. Exatamente por que so novos para ele, esses meiospodem seduzi-lo (...) Comprazo-me em insistir na afirmao de queGustavo Capanema soube ser, na sua provncia natal, como estsendo em cenrio mais amplo, um intelectual no poder, sem asabdicaes, os desvios e as inibies que o poder, via de regra, impe
aos intelectuais.
Como contraponto, utilizamos o discurso pronunciado por
Gustavo Capanema no dia 20 de novembro de 1968, na Cmarados Deputados, em louvor de Francisco Campos, falecido no
princpio daquele ms. Disse Capanema,Francisco Campos, o grande morto que hoje pranteamos, merece bio-grafia. No falo de tantas das biografias que se escrevem a esmo, desin-teressadas da inteira verdade e quase sempre sem a preocupao doexemplo, isto , sem contedo moral, destitudas das lies contidasnas vidas exemplares. Falo das biografias escritas maneira de Plutarco.
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Poucos, sem dvida, so os que merecem biografia assim. FranciscoCampos est no nmero dos brasileiros que, fazendo jus s comemo-raes solenes ou aos monumentos de praa pblica, so sobretudodignos da autntica biografia, porque a sua vida foi a trajetria damentalidade superior, adversa ao diletantismo, mas resolutamenteaplicada, da viglia e do esforo cheios de estoicismo e sem remitncia,da coragem ao mesmo tempo lcida e audaciosa e do idealismo semingenuidade e sem destempero, mas objetivo e realista. A biografia deFrancisco Campos haver de ser tecida destes dois elementos: a carreira
jurdica e a carreira poltica, entrelaadas sempre, influindo uma sobre aoutra e nenhuma delas jamais abandonada.
Capanema, como poltico, no hesita em elogiar Campos, seuiniciador na vida poltica e em seguida seu adversrio ferrenho:
Drummond, como intelectual, no hesita em trazer para o seu campoCapanema, seu aliado poltico desde os tempos da Legio Mineira e
seu amigo, ao qual permaneceu leal at o fim. Capanema faz umaanlise intelectual do poltico, Drummond faz uma anlise poltica do
intelectual. Drummond fala de Capanema tal como ele gostaria que
Capanema fosse; Capanema traa uma biografia de Campos tal como
gostaria que um dia fosse traada a sua. Drummond apresenta a fi-gura de Capanema tal como ele a via e gostaria que todos vissem:Capanema apresenta a figura de Campos tal como gostaria que um
dia fosse apresentada a sua. Tero razo Drummond e Capanema? A
biografia de Campos permite dizer que Capanema no tinha razo.Quanto Drummond, esse trabalho pretende mostrar que ele tam-
bm no tinha razo. Para isso, analisamos a atuao de Capanemano campo da educao, em trs momentos: como ministro da Edu-
cao do governo Vargas, entre 1934 e 1945, como Constituinte, em1946 e como parlamentar, entre 1947 e 1957. Utilizamos como prin-
cipal fonte primria a documentao existente no Arquivo GustavoCapanema, no Centro de Pesquisa e Documentao Contemporneada Fundao Getlio Vargas, no Rio de Janeiro (CPDOC). Consul-
tamos tambm o Dirio Oficial da Unio, o Dirio do CongressoNacional, os Anais da Cmara dos Deputados, os Anais da Assembleia
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Nacional Constituinte de 1946 e o Dirio da Assembleia NacionalConstituinte de 1946.*
Dados biogrficos
Gustavo Capanema Filho nasceu em Pitangui (MG) no dia 10
de agosto de 1900. Filho de Gustavo Xavier da Silva Capanema ede Marcelina Jlia de Freitas Capanema, iniciou seus estudos em
Pitangui, transferindo-se em seguida para Belo Horizonte, tendo es-
tudado nos colgios Azeredo e Arnaldo e no Ginsio Mineiro. Suapassagem pelo colgio Arnaldo foi interrompida de forma brusca,
em novembro de 1916. Em carta ao seu pai, ele narra o acontecido:
Meu pai,
Logo que foi declarada a guerra entre o Brasil e a Alemanha, osestudantes daqui manifestaram o desejo do fechamento do colgioArnaldo que, como voc sabe, foi dirigido por padres alemes. Parachegar a esse intento espalharam diversos boletins, nos quais pedi-am aos pais que retirassem seus filhos do colgio quanto antes.Porm no foram ouvidos, pois o estabelecimento continuou a fun-
cionar regularmente. Em vista disso os acadmicos se dirigiram paral e obrigaram aos padres o fechamento imediato do colgio. Foiontem a uma e meia da tarde. Os alunos internos foram entreguesaos respectivos correspondentes. Alguns no os tm, entre os quaistambm eu. Fomos, pois, entregues ao senhor secretrio do interiorque nos colocou em uma penso familiar por conta do estado, atque os pais deliberem o que se deve fazer. (...) Tranquilize-se, poisestou bom de sade e entregue a boas pessoas. O que preciso aminha colocao, pois j necessrio estudar para no perder tempo.Confiemos em Deus e tenhamos coragem. Abenoe o seu filho.
Gustavo Capanema ingressou em 1920 na Faculdade de
Direito de Minas Gerais. Durante seus estudos, juntou-se a algunscolegas, formando o grupo conhecido com os intelectuais da
*Agradecemos a Fabiana de Freitas Pinto pela pacincia e competncia com que digitou
o contedo dos documentos, alguns manuscritos, utilizados na elaborao desse livro
(Nota do autor).
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Rua da Bahia, por se reunirem, frequentemente nos fundos daLivraria Alves, situada nessa rua. Participavam do grupo, alm de
Capanema, Abgar Renault, Milton Campos, Pedro Aleixo, EmlioMoura, Carlos Drummond de Andrade, Joo Pinheiro Filho,
Martins de Almeida, Flvio de Melo Santos, Lus Camilo de Oli-
veira Netto, Negro de Lima, Pedro Nava, Mario Casasanta, JooAlfonsus, Cristvo Breyner, Alberto Campos e Heitor Augusti
de Sousa. Em crnica escrita em 1941, Carlos Drummond de
Andrade descreve o ambiente no qual se davam os encontros e osdebates do grupo:
Entre 1920 e 1930, a cidade de Belo Horizonte poderia ser resumidana rua da Baa. Essa rua tem a maior importncia para quem sedisponha a estudar a histria e as transformaes da fisionomia dacapital mineira. Por ela se vai Praa da Liberdade e ao Palcio domesmo nome. No Palcio est o governo de Minas, que no seminncia poltica, mas tambm eminncia topogrfica: situado noaltiplano da praa florida, ele domina a cidade e os homens em der-redor. A rua da Baa , pois, em Minas Gerais, o caminho que conduzao governo. Mas, no decnio acima indicado, a rua da Baa era ainda
alguma coisa mais, a saber, o crebro de Belo Horizonte. Ali se acha-va instalada certa livraria de duas portas, com livros didticos e cader-nos escolares arrumados displicentemente numa nica vitrine. Livra-ria escura e meio empoeirada, como toda boa livraria. Quem entrassenada observaria de extraordinrio nas altas prateleiras, cheias quaseque apenas de edies da casa. Mas, atingindo estreito corredor aolado da jaula da gerncia, perceberia vozes e gestos exaltados, trs ouquatro rapazes em torno de um senhor calvo e de culos reluzentes,que por sua vez gesticulava nervoso. (...) De vez em quando, umoutro homem pequenininho e silencioso brotava l do fundo, domais fundo e profundo daquele corredor sombrio, trazendo na mo
algumas brochuras, que tinham o poder mgico de fazer cessar odebate. Os jovens paravam de discutir e punham-se a disputar aspreciosidades bibliogrficas. Esses volumes no chegavam nunca afigurar na vitrine melanclica, pois o pequeno grupo do corredor osconfiscava sumariamente. E da leitura dessas pginas brotavam novosdebates, nas tardes e nas manhs dulcssimas de Belo Horizonte. (...)
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A esse grupo da Livraria Alves pertencia Gustavo Capanema. Erados mais antigos, pois fizera todo o curso de direito sombra da-quelas estantes. J bacharel, foi realizar a experincia da vida munici-pal, to marcante em sua biografia: advogou, lecionou, fez poltica nacidade mineira de Pitangui. Mas qualquer fria forense ou escolarfazia com que abalasse para Belo Horizonte, onde se reaglutinava aogrupo crtico da livraria. De todos, era talvez o mais terrvel consumi-dor de livros. Era tambm o mais asctico, e no participava do gostoque um ou outro frequentador ao recinto sagrado nutria pelas pere-
grinaes noturnas nos bares, com declamao de poemas do mo-dernismo nascente e largo consumo de cerveja gelada. Do ponto devista da poltica local, era dos espectadores mais frios, cuidando me-nos de julgar o governo do que de ignor-lo, para melhor se consa-grar anlise pura do fenmeno poltico, numa espcie de inconsci-ente preparao ideolgica para a atividade de governo que em brevelhe seria dado exercer em circunstncias totalmente diversas das quecaracterizavam ento a vida pblica de Minas e do pas.
De bacharel a interventor em Minas
Gustavo Capanema bacharelou-se em cincias jurdicas e so-
ciais em dezembro de 1924. No ano seguinte retornou a Pitangui,onde lecionou na escola normal e advogou at 1929. Ingressou ao
mesmo tempo na vida poltica, elegendo-se, em 1927, vereador
da Cmara Municipal de Pitangui. Mas Capanema tinha ambies
polticas mais altas. Em abril de 1927, escrever sua me: Vou
ao Rio amanh. Demorarei s uns trs ou quatro dias. E depois
voltarei de novo para Pitangui, para essa enfastiante Pitangui, onde
me espera, alm do mais, a maada de ser vereador. Alis, a
relao dele com a sua cidade natal era marcada pela ambiguidade.
Em setembro de 1929 Capanema retornou a Belo Horizonte,para ocupar o cargo de oficial de gabinete, a convite de Olegrio
Maciel. Em novembro do mesmo ano assumiu a Secretaria do
Interior e Justia no governo Olegrio Maciel, em substituio a
Cristiano Machado.
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Em dezembro de 1930, Capanema travou os primeiros enten-
dimentos com Francisco Campos, em torno da criao da Legio
de Outubro. Campos, ministro da Educao e Sade do governo
provisrio de Vargas, foi, segundo afirma Simon Schwartzman, o
mentor poltico e intelectual de Capanema nesse perodo.
Em fevereiro de 1931, Capanema participou do lanamento
do manifesto de fundao, em Minas Gerais, da Legio de Outu-
bro. A Legio de Outubro foi criada em Minas Gerais por Fran-
cisco Campos (ento ministro da Educao), com o apoio deGustavo Capanema (ento secretrio do Interior e Justia do Es-
tado de Minas Gerais) e Amaro Lanari (secretrio das Finanas),
como um meio de integrar Minas no processo revolucionrio e
como instrumento para enfraquecer as foras polticas oligrquicas
tradicionais do estado. Na realidade, a Legio de Outubro fazia
parte da estratgia elaborada por Francisco Campos para reforar
suas bases de sustentao poltica em Minas Gerais.
Olegrio Maciel faleceu no dia 5 de setembro de 1933. Com
sua morte, Capanema assumiu interinamente o cargo de interventorfederal em Minas, esperando ser efetivado no cargo. Tendo a es-
colha de Vargas recado sobre Benedito Valadares, Capanema,
exonerado em 12 de dezembro de 1933, transmite-lhe o cargo e
retorna a Pitangui, aguardando o desenrolar dos acontecimentos.
Em janeiro de 1934, Getlio Vargas oferece-lhe o cargo de
representante mineiro no Departamento Nacional do Caf.
Capanema recusa a oferta, comunicando sua deciso a Vargas em
carta de 26 de janeiro de 1934:
Prezado amigo doutor Getlio Vargas.
Saudaes afetuosas.
Depois da ltima audincia que o senhor me concedeu, tratei de averi-guar se a residncia em Minas seria compatvel com o exerccio regulardas funes de representante mineiro no Departamento Nacional doCaf, cargo que o senhor to generosamente ps minha disposio.
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Verifiquei que isso no possvel. Para que se exera, conscienciosa-mente, com real proveito para o servio pblico, aquele cargo, cumpreao seu detentor morar no Rio de Janeiro. Ora, presentemente, e pelasrazes que lhe expus, no poderei afastar-me de Minas. Forado, as-sim, a no ocupar aquela posio, quero, entretanto, mais uma vez,manifestar-lhe o meu grande reconhecimento pelo seu gesto, to cheiode gentileza e amizade, oferecendo-me esta oportunidade de trabalharpela economia de meu estado. Aqui continuo, como sempre, ao seudispor, pronto, com os meus amigos, a trabalhar na defesa de seu
governo, bem como a pugnar pela eleio de seu nome para a presi-dncia constitucional da repblica, conforme os compromissos que,no interesse da nao, com o senhor assumi mais de uma vez. Sou,com estima e apreo, seu amigo, Gustavo Capanema.
Defendendo o ensino primrio junto Unesco
Em 26 de julho de 1934, logo aps a posse de Vargas na
Presidncia da Repblica, Capanema ser efetivamente nomeado
para a pasta da Educao e Sade Pblica, cargo que ocupar ata queda de Vargas, em 30 de outubro de 1945.
Em 2 de dezembro de 1945 Capanema elegeu-se deputadopor Minas Gerais Assembleia Nacional Constituinte na legenda
do PSD. Foi membro da Comisso Constitucional, encarregada
de redigir o anteprojeto da nova Carta. Durante os trabalhos cons-tituintes, Capanema participou ativamente dos debates relativos
ao captulo sobre educao, tendo apresentado substitutivo queveio a constituir a base do texto.
A Constituio foi promulgada em 18 de setembro de 1946 e aAssembleia Nacional Constituinte transformou-se em Congresso
ordinrio. Dessa forma, os constituintes tiveram seus mandatos es-
tendidos para a legislatura de 1946 a 1951.De 1947 a 1950, Capanema foi membro da Comisso de
Justia da Cmara, participando ainda da comisso encarregadade elaborar as leis complementares Constituio. Nesta condio,
elaborou parecer sobre o anteprojeto da Lei de Diretrizes e Bases
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da Educao Nacional, sendo responsvel pela sua rejeio e pos-terior arquivamento.
A participao de Gustavo Capanema nos debates sobre edu-cao na Assembleia Nacional Constituinte de 1946 e na tramitao
do anteprojeto de Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional.
Em outubro de 1950, Capanema reelegeu-se deputado fede-ral pelo PSD, tendo sido indicado por Vargas para o cargo de
lder da maioria. Foi reeleito em 1954 e 1962, sempre na legenda
do PSD.Em novembro de 1956, chefiou a delegao brasileira IX Con-
ferncia Geral da Unesco, em Nova Delhi, na ndia, na condio deembaixador extraordinrio. No seu discurso, Capanema defendeu uma
atuao mais firme da Unesco no campo do ensino primrio.Eleito suplente de deputado federal nas eleies de 1958,
Capanema ficou sem mandato parlamentar de fevereiro de 1959a janeiro de 1961. Nesse perodo, nomeado pelo presidente Jusce-
lino Kubitschek, exerceu o cargo de ministro do Tribunal de Con-
tas da Unio. Aposentou-se do cargo em 16 de janeiro de 1961,reassumindo em seguida sua cadeira na Cmara dos Deputados.
Em 31 de maro de 1964, Capanema apoiou o golpe militarque deps o presidente Joo Goulart. Em 1966, aps a extino
dos partidos polticos, ingressou na Arena, partido de apoio ao
governo militar, tornando-se membro de sua Comisso Executi-va Nacional. Em novembro de 1966, foi reeleito para a Cmara
Federal, pela Arena. Na condio de deputado federal, votou fa-voravelmente aceitao do projeto de Constituio encaminha-
do ao Congresso Nacional pelo Marechal Castelo Branco em de-
zembro de 1966, visando a institucionalizao dos ideais e prin-cpios da Revoluo. Em sua declarao de voto, mesmo questio-
nando se a iniciativa do Executivo era legtima, democrtica e cor-reta, Capanema vota favoravelmente por acreditar que o Con-
gresso, aceitando o projeto, estaria dando um passo de sabedoria
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poltica. Alm disso, segundo ele, uma vez aprovada a Consti-tuio, criar-se-ia para o governo um clima de obrigatria
juridicidade e se abriria a perspectiva de um retorno plenitudedemocrtica e ao estado de direito.
Em novembro de 1970, Capanema elegeu-se senador por
Minas Gerais na legenda da Arena. Durante sua permanncia noSenado, foi presidente da Comisso de Educao e Cultura, de
1971 a 1973. Em janeiro de 1979, ao trmino de seu mandato no
Senado, encerrou sua carreira poltica, fixando residncia no Riode Janeiro. Em 1980, candidatou-se a uma cadeira na Academia
Brasileira de Letras, tendo sido derrotado pela escritora DinhSilveira de Queirs.
Gustavo Capanema era casado com Maria de AlencastroMassot, filha do coronel Afonso Emlio Massot, comandante da
Brigada Militar do Rio Grande por mais de vinte anos. Teve doisfilhos. Faleceu em 14 de maro de 1985.
Gustavo Capanema, ministro da Educao 1934-1945
Em 26 de julho de 1934, logo aps a posse de Vargas na
Presidncia da Repblica, Capanema ser nomeado para a pastada Educao e Sade Pblica, cargo que ocupar at a queda de
Vargas, em 1945. Durante quase todo este tempo Capanema ter,
como seu chefe de gabinete, o seu amigo Carlos Drummond deAndrade, antigo companheiro dos tempos da Legio Mineira.
Drummond ser exonerado, a pedido, em 13 de maro de 1945.Durante sua permanncia no Ministrio, Capanema empre-
endeu a reorganizao administrativa do mesmo, iniciou a elabo-
rao das leis orgnicas do ensino e tomou diversas iniciativas nocampo cultural.
A reforma do Ministrio, iniciada em dezembro de 1935, como encaminhamento do projeto ao Poder Legislativo e promul-
gada em 1937 lei n 378, de 13 de janeiro de 1937 foi marcada,
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de um lado, pela preocupao em adequ-lo s exigncias da Cons-tituio de 1934; de outro, pelo interesse de Capanema em au-
mentar os seus poderes. Ao mesmo tempo em que procura tornarmais geis os procedimentos administrativos, Capanema busca
ampliar o campo de atuao do Ministrio, propondo sem su-
cesso a sua transformao em Ministrio da Cultura Nacional.Nesta perspectiva, o Servio de Radiodifuso Educativa e o Insti-
tuto Nacional de Cinema Educativo, j existentes, sero oficial-
mente colocados na esfera do Ministrio de Educao e Sade.
O termo cultura
Ao encaminhar o projeto ao presidente Getlio Vargas, em
novembro de 1935, Capanema escreve:
Rio. 14 de novembro de 1935.
Meu caro presidente.
Trago-lhe, finalmente, o projeto de reorganizao do Ministrio daEducao. Antes do mais, peo-lhe que me perdoe a demora. De-morei muito. Mas demorei, porque no queria apresentar-lhe umareforma parcial, feita de afogadilho. Demorei, no para distrair-mecom outras coisas, mas para consagrar-me fervorosamente, numtrabalho realmente penoso, elaborao de uma construo de gran-de vulto e sentido. Li muito. Percorri livros e livros sobre todos osassuntos relacionados com o Ministrio. Entretanto, no lhe tragoum trabalho livresco e artificial. Estive permanentemente em conta-to com a realidade: observei, examinei, sondei as coisas existentes.Nem uma s linha foi escrita na exposio de motivos e no projetode lei, sem essa prvia indagao a respeito do que existe, do que estfuncionando e de como est funcionando. (...) Busquei realizar umtrabalho de sentido moderno, incorporando, no plano que ora lhe
apresento, as ideias que, a respeito de administrao pblica em gerale sobre os problemas da sade e da educao em particular, vigoramnas naes mais experientes e adiantadas.
E Capanema procura explicar ao presidente a introduo dotermo cultura na nova denominao proposta para o Ministrio:
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Devo ainda dizer que a nova denominao proposta para o Ministriono inteiramente de minha inspirao. Ronald de Carvalho e eu maisde uma vez conversamos sobre a convenincia de se dar nova denomi-nao ao Ministrio. Certo dia, aventei a palavra cultura, pois o objetivodesta justamente a valorizao do homem, de maneira integral. (...)Ronald achou feliz a ideia, e props que se dissesse cultura nacional.A sugesto de nosso malogrado amigo1 me pareceu de grande alcance.Observa-se, hoje em dia, certa tendncia para se dar ao aparelho dedireo das atividades relativas ao preparo do homem este qualificativo
de nacional, como que para significar que para o servio da naoque o homem deve ser preparado.
E, ainda antes da apreciao do projeto pelo Legislativo, oministro articula no sentido de trazer as questes da cultura para o
seu Ministrio.
Entretanto, a incluso da palavra cultura na denominao doMinistrio no foi aprovada na lei. Capanema no desiste, e em
setembro de 1938, encaminha ao presidente projeto de decreto-leicriando, no Ministrio da Educao, um Conselho Nacional de
Cultura, composto de quatro cmaras: cmara de cincia pura e
aplicada, cmara de literatura, cmara de arte e histria e cmarade msica e teatro.
A criao do Conselho Nacional de Cultura
O Conselho Nacional de Cultura foi criado pelo Decreto-lei n
n 526, de 1/07/1938, como rgo de coordenao de todas asatividades concernentes ao desenvolvimento cultural, realizadas pelo
Ministrio da Educao e Sade ou sob o seu controle ou influncia.De acordo com o decreto, o desenvolvimento cultural abrangia um
amplo leque de atividades: a) a produo filosfica, cientifica e literria;b) o cultivo das artes; c) a conservao do patrimnio cultural
(patrimnio histrico, artstico, documentrio, bibliogrfico etc.) d)
1Ronald de Carvalho havia falecido em 15 de fevereiro de 1935, no Rio de Janeiro, vtima
de acidente de automvel. Nessa poca ocupava o cargo de secretrio da Presidncia da
Repblica.
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o intercmbio intelectual; e) a difuso cultural entre as massas atravsdos diferentes processos de penetrao espiritual (o livro, o rdio, o
teatro, o cinema etc.); f) a propaganda e a campanha em favor dascausas patriticas ou humanitrias; g) a educao cvica atravs de
toda sorte de demonstraes coletivas h) a educao fsica (ginstica
e esportes); i) a recreao individual ou coletiva. Ao que tudo indica,porm, este Conselho no chegou a ser instalado.
A figura do professor
Em janeiro de 1936, o Conselho Nacional de Educao (cria-
do no bojo da Reforma Francisco Campos, em 1931) serreestruturado, por proposta de Capanema, visando adequ-lo
sua nova funo de elaborar o Plano Nacional de Educao, quelhe fora atribuda pela Constituio de 1934 (Lei n 174, de 3/1/
1936). Na sesso de instalao dos trabalhos do novo Conselho,
convocado pelo ministro, este pronunciar um discurso no qualtraar as linhas gerais da tarefa a ser realizada pelos conselheiros.
Tratava-se, segundo Capanema, de uma misso difcil:Difcil a tarefa que ides realizar. Efetivamente, a primeira vez que sevai fazer em nosso pas, uma lei de conjunto sobre a educao. Doensino superior temos leis diversas, cada uma sobre determinada partedo assunto. Temos uma lei do ensino secundrio, mas modificadaparcialmente por outras leis. O ensino primrio regulado nos estadose no Distrito Federal, por legislaes autnomas, cada qual diferentedas outras, na estrutura e no valor. Do ensino profissional, de toformidvel importncia, no possumos, rigorosamente falando, aquie ali, seno leis parciais e imperfeitas. Sobre a educao extraescolar notemos nenhuma lei de conjunto. Sobre outros numerosos e importan-tes aspectos do problema educacional, falta-nos a devida legislao.
Segundo o ministro, o ensino superior precisava ser ampliadoe melhorado; o ensino secundrio, deveria subir de padro, fa-
zendo-se, nos colgios, com maior rigor, no s o aprendizado
das cincias, mas tambm o estudo das velhas, altas e egrgiashumanidades. O ensino profissional, nas suas diversas modalida-
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des (industrial, comercial, agrcola, domstico etc.), precisava ser
estruturado solidamente. Quanto ao ensino primrio, este deveria
ser incentivado e padronizado. Quanto educao extra escolar,
impunha-se a necessidade de mobilizar, para a cultura das mas-
sas, todos os instrumentos educativos, estranhos escola e hoje
em dia to numerosos e eficientes.
Capanema ocupou-se ainda, em seu discurso, da educao fsica
e da educao moral. E terminou falando da figura do professor:
O professor foi sempre um ser privilegiado. que dele, sobretudodele, que depende a boa ou a m educao. Dele poder vir para oshomens e para as naes o maior bem ou o maior mal, porque nassuas mos que se coloca o grave oficio de afeioar e preparar o espritoda juventude. Para ter ideia do quanto pode fazer um professor,lembraremos a grande revoluo que Scrates, ensinando, fez emAtenas, mas lembremos sobretudo outra revoluo, esta muitas ve-zes maior, que fizeram aqueles doze homens, na verdade doze pro-fessores, a quem Jesus Cristo mandou que fossem no para contar,negociar, ou guerrear, mas precisamente para ensinar: Euntes ergo,docete onnes gentes. Tal a magia do ensino. Tal o poder do professor.
Pode-se dizer, portanto, rigorosamente, que uma nao ser aquiloque dela fizerem os seus professores.
A disputa
O projeto do Plano Nacional de Educao foi encaminhado
por Vargas Cmara dos Deputados ainda no primeiro semestre
de 1937. A Comisso Especial criada para examin-lo apresentou
suas concluses no final de agosto, tendo sido rejeitada a proposta
de Capanema no sentido que o projeto fosse votado em bloco. Em
setembro, o documento foi debatido pela Comisso de Educao
e Cultura. Mas a tramitao lenta e o debate ser interrompido
pela proclamao do Estado Novo e fechamento do Congresso,
em 10 de novembro de 1937. A partir deste momento, o plano
nacional de educao preparado pelo Conselho Nacional de Edu-
cao ser esquecido.
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O perodo que antecede e o que se segue imediatamente
proclamao do Estado Novo sero marcados pela disputa entre
Francisco Campos e Gustavo Capanema em torno do Ministrio
da Educao. Ser igualmente o momento em que todos aqueles
que detinham poder decisrio nos rgos federais e estaduais de
educao tero que se definir: ou manifestar sua disposio de
trabalhar no sentido de colocar o sistema de ensino a servio do
regime autoritrio que acabava de ser instaurado ou afastar-se. As
atitudes assumidas por Francisco Campos e Gustavo Capanema,neste momento, so bastante elucidativas a esse respeito.
Com efeito, dentro do projeto autoritrio de Francisco Cam-
pos, o sistema educacional deveria transformar-se em poderoso
instrumento de propagao da ideologia do Estado Novo e de
mobilizao da juventude.
Assim, em entrevista concedida imprensa em novembro de
1937, para explicar a nova Constituio e o novo estado brasileiro,
o ministro da Justia, depois de criticar o sistema educativo de fun-
do liberal, no qual todas as teorias e crenas so objeto de discus-so, no havendo, porm, obrigao de aceitar nenhuma, afirma
que a educao no tem seu fim em si mesma; um processo des-
tinado a servir a certos valores e pressupe, portanto, a existncia de
valores sobre alguns dos quais a discusso no pode ser admitida.
Segundo Campos, era nestes termos que a Constituio de 1937
colocava o problema da educao, conferindo Unio a atribuio
de traar as diretrizes a que se deve obedecer a formao fsica,
intelectual e moral da infncia e da juventude e atribuindo ao esta-
do a responsabilidade de promover a disciplina moral e o adestra-
mento da juventude, de maneira a prepar-la ao cumprimento desuas obrigaes para com a economia e a defesa da nao (p. 65).
Francisco Campos no acreditava que o Gustavo Capanema e
seus auxiliares no Ministrio da Educao pudessem orientar o
sistema educativo do pas nesta direo. Em vista disso, tornava-se
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necessrio, para a realizao do seu projeto poltico, substituirCapanema por algum de sua confiana ou por algum que ele
pudesse manobrar. Ele volta-se ento para Plnio Salgado.Nos entendimentos estabelecidos entre Francisco Campos e
Plnio Salgado, visando obter o apoio dos integralistas para o gol-
pe de novembro de 1937, o Ministrio da Educao foi oferecidoa este ltimo. Os contatos do governo com a Ao Integralista
Brasileira (AIB), que haviam comeado em 1935, acentuaram-se
nos ltimos meses de 1937, antes e imediatamente depois da im-plantao do Estado Novo.
Seguindo orientao de Getlio Vargas, Francisco Campos,oficialmente exercendo o cargo de secretrio da Educao e Cul-
tura da Prefeitura do Distrito Federal, mas na realidade redigindoa nova Constituio e preparando o golpe, encontrou-se com Plnio
Salgado duas vezes, em setembro de 1937.A nica informao que se tem desses contatos encontra-se na
carta encaminhada por Plnio Salgado a Getlio Vargas, em janeiro
de 1938. Eis como Salgado descreve seus encontros com Campos:Foi nessa ocasio que me procurou o Dr. Francisco de Campos (sic),com o qual me encontrei em casa do Dr. Amaro Lanari. Ele me faloudizendo-se autorizado pelo senhor presidente da Repblica e meentregou o original de um projeto de Constituio que deveria seroutorgado, num golpe de estado ao pas. Estvamos no ms desetembro de 1937. O Dr. Francisco de Campos (sic), dizendo sem-pre falar aps entendimentos com V. Excia., pediu o meu apoio parao golpe de estado e a minha opinio sobre a Constituio, dando-me24 horas para a resposta. Pediu-me, tambm, o mais absoluto sigilo.
Em fins de outubro de 1937, Getlio Vargas encontrou-se
pessoalmente com Plnio Salgado, na casa do industrial Renato daRocha Miranda. Relatando esse encontro, Plnio Salgado escreve:
Em relao ao Integralismo, V. Excia. falou-me da reorganizao danossa milcia. Tais palavras me encheram de confiana. Acreditei atque essa grande organizao da juventude seria patrocinada direta-mente pelo ministro da Educao, uma vez que V. Excia. me dizia
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que esse Ministrio tocaria ao Integralismo. (...) Eu tinha a impres-so de que se iria formar um partido nico; que o Integralismo seriao cerne desse partido; que, alm desse partido, existiria uma vastaorganizao da juventude, qual no seriam, de nenhum modo,arrancados os smbolos queridos, os gestos de saudaes que cons-tituem toda a alegria de sua vida.
Vargas relata o mesmo encontro de forma bem mais realista, e
at irnica. No dia 26 de outubro de 1937 escreve em seu dirio:Na noite ltima, fui com o Macedo casa do Rocha Miranda
Renato onde encontrei-me com Plnio Salgado, que de muito pro-curava falar-me. Caipira astuto e inteligente, mas entendemo-nos bem.
Embora esses encontros fossem mantidos em segredo, as ten-
tativas de aliana entre o integralismo e o governo eram patentes.Mas, uma vez concretizado o golpe de 10 de novembro, Getlio
Vargas volta-se contra o Integralismo enquanto partido, emboracontinue a buscar o apoio e a participao de Plnio Salgado em
seu governo. No dia 24 de novembro anotou em seu dirio: As-sentei a recomposio do Ministrio (...) Falta o da Educao, que
est dependendo de uns entendimentos entre o ministro da Justiae o chefe do integralismo sobre a dissoluo deste.
A conspirao integralista
E os entendimentos com Plnio Salgado continuam. nova-
mente Vargas quem escreve, em 6 de dezembro de 1937:Os integralistas, passada a revolta ou os mal-entendidos das primei-ras horas, esto procurando acomodar-se. O Plnio Salgado man-dou-me uma longa explicao por intermdio do subchefe da minhaCasa Militar. Ele deseja aceitar o Ministrio da Educao e est prepa-
rando para isso a sua gente.E continua tambm o drama de Capanema, que em carta de18 de janeiro de 1938 escreve sua me: O presidente chegar
amanh do sul. Espero que logo depois fique de uma vez resolvido
se vou ou no deixar o Ministrio.
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Mas, mesmo tendo aumentado os desentendimentos entreVargas e os integralistas, a questo no se resolve logo, como espe-
rava o ministro. S se resolver com o endurecimento de Vargascom os integralistas e com a crescente insatisfao destes com o
governo, que os conduzir conspirao e tentativa de golpe. Duas
anotaes de Vargas em seu dirio so bastante esclarecedoras:
D. Rosalina teve uma conferncia com Plnio Salgado e traz-me ascondies escritas pelo genro deste para ele entrar para o Ministrio.
Pedi portadora que as devolvesse, dizendo que eu no tomavaconhecimento. (16 de fevereiro de 1938)
Perguntei ao ministro Campos se j havia conversado com PlnioSalgado, conforme eu o encarregara. Respondeu-me que no, por-que este estava ausente. Reiterei-lhe a recomendao, por um deverde lealdade. Ou ele vinha colaborar, ou teria de adotar medidas derepresso contra seus partidrios que estavam conspirando. (5 demaro de 1938)
Mas a colaborao de Plnio Salgado com o governo no se
concretizar, para alvio de Capanema. Em fins de maro de 1938,as sombras que pairavam sobre a sua permanncia no Ministrio
se dissiparam. Novamente as anotaes de Vargas em seu Dirio
so bastante esclarecedoras: Despacho com os ministros da Jus-tia e Educao. (...) Com o segundo [tratei] de vrios assuntos de
educao e assistncia. Achei-o mais animado. Parece que a cons-pirao integralista dissipou-lhe o receio de deixar o Ministrio
(Dia 21 de maro de 1938)2.
2 Estes acontecimentos no abalaram a confiana de Capanema. Vargas continuar a ser
por ele elogiado, em todas as ocasies. Assim, em novembro de 1941, comemorando oaniversrio do golpe de novembro de 1937, o ministro escrever na revista Cultura
Poltica: A atitude do presidente Getlio Vargas, no dia 10 de novembro, foi a dos
grandes, dos autnticos homens de estado, nas horas agudas da histria. Tomou a
perigosa deciso de mudar os rumos dos acontecimentos, a deciso revolucionria de
substituir a crise pelo ideal. E por esse ideal, o ideal do Brasil vencedor de todas as
dificuldades e riscos, rompeu o caminho, com f, com energia e com a disposio de
aceitar os sacrifcios que se oferecessem. Tal chefe merece a venerao do seu povo.
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Tranquilizado, ou melhor, animado, como escreveu o presi-dente, Capanema pode continuar sua atuao no Ministrio.
O Instituto Nacional de Estudos Pedaggicos (Inep)
Em 1938, pelo Decreto-lei n 580, de 30/7/1938, ser or-
ganizado o Instituto Nacional de Estudos Pedaggicos (Inep),criado no bojo da lei que reorganizou o Ministrio da Educao
e Sade, com o nome de Instituto Nacional de Pedagogia (atual-
mente Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas EducacionaisAnsio Teixeira). A organizao do Instituto Nacional de Peda-
gogia e sua nova denominao foram justificadas por Capanema,em Exposio de Motivos encaminhada a Vargas em 10 de ju-
nho de 1938.O Instituto Nacional de Estudos Pedaggicos teria a com-
petncia de: a) organizar documentao relativa histria e ao
estudo atual das doutrinas e das tcnicas pedaggicas, bem comodas diferentes espcies de instituies educativas; b) manter inter-
cmbio, em matria de pedagogia, com as instituies educacio-nais do pas e do estrangeiro; c) promover inquritos e pesquisas
sobre todos os problemas atinentes organizao do ensino, bemcomo sobre os vrios mtodos e processos pedaggicos; d) pro-
mover investigaes no terreno da psicologia aplicada edu-
cao, bem como relativamente ao problema da orientao eseleo profissional; e) prestar assistncia tcnica aos servios es-
taduais, municipais e particulares de educao, ministrando-lhes,mediante consulta ou independentemente desta, esclarecimentos
e solues sobre os problemas pedaggicos; f) divulgar, pelos
diferentes processos de difuso, os conhecimentos relativos teoria e prtica pedaggicas. Muitas foram tambm as inicia-
tivas de Capanema no campo do ensino superior.
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A Universidade do Brasil
Em julho de 1937 a Universidade do Rio de Janeiro ser
reorganizada, transformando-se em Universidade do Brasil (Lei
n 452, de 5/7/1937). Em janeiro de 1939 ser a ela legalmenteincorporada a Universidade do Distrito Federal (UDF), criada
por Ansio Teixeira em 1931. Em abril de 1939, ser nela organi-zada a Faculdade Nacional de Filosofia (Decreto-lei n 1190, de
4/4/1939), para onde sero transferidos os cursos da extinta
UDF. Ainda em abril de 1939 ser criada na Universidade doBrasil a Escola Nacional de Educao Fsica e Desportos (De-
creto-lei n 1212, de 17/4/1939).A incorporao da Universidade do Distrito Federal Uni-
versidade do Brasil, determinada pelo Decreto-lei n 1063, de 20de janeiro de 1939, ser justificada na Exposio de Motivos enca-
minhada por Capanema ao presidente, em 28 de junho de 1938.
Na realidade, o fim da Universidade do Distrito Federal re-presenta mais uma iniciativa do ministro no sentido de reduzir
ainda mais a influncia de Ansio Teixeira nos rumos da educaobrasileira. A Igreja Catlica ter parte ativa nesse processo.
A Escola Nacional de Educao Fsica e Desportos
A Escola Nacional de Educao Fsica e Desportos, criada
em 1939, na Universidade do Brasil, tinha, de acordo como oDecreto-lei que a criou, as finalidades de: a) formar pessoal tcni-
co em educao fsica e desportos; b) imprimir ao ensino da edu-cao fsica e dos desportos, em todo o pas, unidade terica e
prtica: c) difundir, de modo geral, conhecimentos relativos edu-
cao fsica e aos desportos; d) realizar pesquisas sobre a educaofsica e os desportos, indicando os mtodos mais adequados sua
prtica no pas.Por solicitao de Capanema, os militares participaram ati-
vamente na organizao desta escola e assumiram a sua direo,
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procurando orient-la de acordo com o modelo da Escola deEducao Fsica do Exrcito3. Assim, no discurso pronunciado
por ocasio de sua inaugurao, o ministro da Educao poderdizer: No me furto a uma palavra de agradecimento ao Exr-
cito Nacional pela colaborao que emprestou ao Ministrio da
Educao na organizao da nova escola.Com a criao da Escola Nacional de Educao Fsica e Des-
portos, o diploma de licenciado passou a ser exigido para o exer-
ccio da funo do professor de educao fsica nas escolas. Aobteno deste diploma estava condicionada concluso do curso
superior de educao fsica. Mas, em 1941, o ministro da Guerraelabora um projeto de decreto no qual,
considerando que a Escola de Educao Fsica do Exrcito tem sidoa orientadora da educao fsica tanto que o regulamento bsico parao ensino da mesma foi por ela elaborado e as instituies congneresexistentes no pas foram por ela modeladas; e considerando que oselementos egressos da Escola de Educao Fsica do Exrcito, almda preparao tcnica especializada, adquirem no seu estgio no Exr-
cito uma formao cvico-moral que os coloca em situao vantajosapara agir sobre as coletividades, incutindo-lhes o esprito de ordem edisciplina, prope que sejam estendidas aos oficiais formados pelaEscola de Educao Fsica do Exrcito as prerrogativas de licenciadoem educao fsica.
Como se pode ver pelas consideraes apresentadas pelo mi-
nistro da Guerra para justificar a sua proposta, os militares, mesmoinsistindo sobre a educao fsica como instrumento de
revigoramento fsico da raa e de preparao fsica do futuro
soldado, no deixam de valorizar tambm a funo do professor
3 Sobre a organizao da Escola Nacional de Educao Fsica e Desportos de acordo com
o modelo da Escola de Educao Fsica do Exrcito, veja-se a carta endereada ao
ministro da Educao, em 26 de dezembro de 1940, por Peregrino Jnior. Depois de
denunciar a implantao de uma disciplina militar na Escola Nacional de Educao Fsica
e Desportos, Peregrino Jnior, ele prprio professor nessa escola, afirma: Um dos erros
mais graves na organizao da Escola Nacional de Educao Fsica e Desportos, foi a sua
subordinao integral ao padro militar da Escola de Educao Fsica do Exrcito.
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e do instrutor de educao fsica no processo de disciplinamentodo povo. E os oficiais formados em educao fsica pelo Exrcito
estavam, segundo Dutra, mais capacitados que os civis para cumpriresta funo de incutir o esprito de ordem e disciplina na coletivi-
dade, em razo da formao cvico-moral recebido nos quartis.
A proposta do ministro da Guerra ser apoiada por Capa-nema, que a considerar uma medida de justia. Assim, em maro
de 1943, os diplomas de instrutor e de monitor de educao fsica
expedidos pela Escola de Educao Fsica do Exrcito, pelo Cur-so Provisrio de Educao Fsica, pelo Centro Militar de Educa-
o Fsica e pelos Centros Regionais de Educao Fsica organiza-dos pelo Ministrio da Guerra sero equiparados, para todos os
efeitos, aos diplomas de licenciado em educao fsica (Decreto-lei n 5343, de 25 de maro de 1943).
Os intelectuais e Capanema
No campo da cultura, a gesto de Capanema assinalou a cria-
o de trs rgos de destacada atuao ao longo de todo o Es-tado Novo: o Servio do Patrimnio Histrico e Artstico Nacio-
nal (Decreto-lei n 25, de 30/11/1937), o Servio Nacional deTeatro (Decreto-lei n 92, de 21/12/1937) e o Instituto Nacional
do Livro (Decreto-lei n 93, de 21/12/1937). Ainda durante sua
gesto ser criado o Conservatrio Nacional de Canto Orfenico(Decreto-lei n 4993, de 28/11/1942).
Nas letras e nas artes plsticas, Capanema, assessorado por seuchefe de gabinete, o poeta Carlos Drummond de Andrade, cercou-
-se de uma equipe diversificada, integrada, entre outros, por Mrio
de Andrade, Cndido Portinari, Villa-Lobos, Lcio Costa, AfonsoArinos de Melo Franco e Rodrigo Melo Franco de Andrade. O
projeto de construo do edifcio-sede do Ministrio foi o maiorexemplo de sua abertura em relao arte moderna.
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O que foi a Comisso Nacional do Ensino Primrio
Aps o golpe de 10 de novembro de 1937, com a promulga-
o da Constituio de 1937 da qual foi um dos signatrios e
a implantao do Estado Novo, Capanema que, como vimos,
apesar da oposio de Francisco Campos consegue manter-se no
cargo, procura reorientar a ao do Ministrio de Educao e Sa-
de no sentido de sua adequao ao carter fortemente centralizador
e autoritrio do novo regime. A criao da Comisso Nacional do
Ensino Primrio (Decreto-lei n 868, de 18/11/1938) e a reali-
zao da Primeira Conferncia Nacional de Educao, em no-
vembro de 1941, constituem bons exemplos dessa reorientao.
A Comisso Nacional do Ensino Primrio (CNEP) foi criada
pelo Decreto-Lei n 868, de 18 de novembro de 1938. Na Expo-
sio de Motivos enviada ao presidente Vargas, para justificar a
sua criao, o ministro, depois de identificar o ensino primrio
como um dos mais importantes problemas do governo, afirma:
Para remediar tais males, s uma soluo se oferece: a interveno
do governo federal. Esta interveno no significar, em nenhumahiptese, que o governo federal entre a dirigir as escolas primriasdo pas. A administrao do ensino primrio tarefa que no deveser arredada das atribuies estaduais e municipais. O papel daUnio ser outro. Cumprir-lhe-, por um lado, traar, em lei fede-ral, as diretrizes fundamentais do ensino primrio, e, por outrolado, cooperar financeiramente, com os governos estaduais e mu-nicipais, na medida das necessidades de cada qual, a fim de que, emperodo o mais curto possvel, se liquide o analfabetismo em todoo territrio nacional, se nacionalize integralmente a escola primriados ncleos de populao de origem estrangeira e se eleve, obede-
cidos os padres prprios e cada nvel cultural do pas, a qualidadeda nossa escola primria.
A funo de traar, em lei federal, as diretrizes fundamentais
do ensino primrio ser atribuda Comisso Nacional de Ensino
Primrio; a cooperao financeira da Unio aos estados e munic-
pios ser viabilizada pela criao do Fundo Nacional do Ensino
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Primrio, em 1942, e regulada pelo Convnio Nacional do EnsinoPrimrio do mesmo ano.
A Comisso Nacional do Ensino Primrio iniciou seus traba-lhos em 18 de abril de 1939. Durante o perodo em que funcio-
nou, a Comisso que, quase sempre, contava em suas reunies
com a participao de Capanema, ocupou-se principalmente comtrs questes, definidas pelo ministro como prioritrias: a naciona-
lizao das escolas primrias nos ncleos de populao de origem
estrangeira, especialmente nas colnias italianas e alems do sul dopas; a elaborao do anteprojeto de lei de organizao nacional
do ensino primrio, e a formao e disciplinamento do magistrioprimrio em todo o pas.
A nacionalizao das escolas primrias estrangeiras, conside-rada como problema de segurana nacional, foi o tema central
dos debates nas primeiras sesses de trabalho da Comisso. Jna segunda sesso, em 26 de abril de 1939, o ministro define o
princpio bsico que deveria orientar as decises relacionadas com
essa questo:Um princpio, desde logo, deve ser estabelecido: o ensino primriono Brasil s poder ser ministrado em escola brasileira, onde se ensineintegralmente em lngua nacional e com programas oficiais, elabora-do pelo governo. Assim teramos: a) professor brasileiro, b) profes-sor formado em escola brasileira; c) programa nacional, elaboradopelo governo brasileiro; d) livros, em lngua nacional, com sentidoexclusivamente brasileiro. Em resumo: s poder haver escolas primriasbrasileiras. Temos que acabar, portanto, com todas as escolas primri-as estrangeiras, atualmente existentes no territrio nacional, e substi-tu-las por escolas brasileiras.
Quanto ao estabelecimento de diretrizes orientadoras da or-ganizao e funcionamento do ensino primrio em todo o pas, a
Comisso elaborou um anteprojeto de decreto-lei, encaminhadoao ministro em dezembro de 1939. Na Exposio de Motivos
que acompanhava o anteprojeto, os membros da Comisso, de-pois de se declararem conscientes de que o sentido nacional, con-
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dio fundamental da educao primria, no decorreria da uni-dade formal, mas sim da unidade de esprito, afirmam:
O carter nacional aludido apresenta-se, no anteprojeto, por um du-plo aspecto: o da nacionalizao da rede escolar primria de todo opas, pela indicao de normas de administrao e coordenao geral,a serem aplicadas pelo Ministrio da Educao; e o esprito mesmodo ensino, a ser ministrado nas escolas, pblicas ou particulares, ouainda no lar, mediante a subordinao do exerccio do magistrio aimperativos de ordem nacional. (...) A nacionalizao da rede escolar
primria de todo o pas, no sentido que se poderia chamar de admi-nistrativo, pela adoo de medidas de coordenao e racionalizaodos esforos dos poderes pblicos e das entidades particulares, po-deria caber em qualquer momento e se justificaria simplesmente pormedida de economia e boa tcnica; a nacionalizao no sentido pol-tico, de que o anteprojeto deliberadamente se impregna, uma exi-gncia do atual momento histrico, que consideraes de nenhumaoutra ordem poderiam iludir ou obscurecer.
Estas orientaes so concretizadas no anteprojeto, que de-termina, no Art. 8, que o ensino primrio, onde quer que fosseministrado, deveria visar a perfeita integrao das novas geraesno esprito da unidade, da comunho e da segurana nacional.Para isso, o hasteamento dirio da bandeira e o canto do hinonacional seriam obrigatrios em todas as escolas primrias, pbli-cas e particulares, bem como o comparecimento dos alunos ssolenidades cvicas.
Em dezembro de 1940, a Comisso Nacional de Ensino Pri-mrio, depois de receber as observaes e sugestes das Secretariasde Educao de diversos estados, encaminhou ao ministro uma nova
verso do anteprojeto. A redao do art. 8 permanece inalterada,
visto ter sido plenamente aceita por todos os secretrios de Educa-o. Nenhum deles contestar tambm a obrigatoriedade do
hasteamento dirio da bandeira e do canto do hino nacional.A preparao e disciplinamento do magistrio ser tambm
objeto de preocupao da Comisso Nacional do Ensino Prim-
rio. Em carta encaminhada a Capanema, em 19 de abril de 1940, o
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Major Euclides Sarmento, presidente da Comisso, reagindo publicao do decreto-lei de criao da Juventude Brasileira,
comunica ao ministro que estava sendo elaborado pela mesmaum plano de formao do magistrio primrio.
Mudanas
Assim, mesmo admitindo a necessidade de preparar as novasgeraes para integr-las nas atividades de produo, de subordin-
las s exigncias que o estado impuser e de disciplinar a vontade doeducando para que este sempre se subordine e se enquadre no pen-samento do estado, o presidente da Comisso Nacional do EnsinoPrimrio insiste que estes objetivos poderiam ser alcanados atravsda prpria escola. Consequentemente, em lugar de enquadrar a in-fncia e a juventude em uma nova instituio, o estado deveriaescolariz-las. Ao mesmo tempo, o estado deveria atuar na prepara-o dos professores, essencialmente atravs de uma educao po-ltica capaz de criar nos mesmos uma mentalidade que os levassea orientar a sua ao sobre os alunos no sentido de disciplin-los,subordin-los e enquadr-los no pensamento do estado.
Entretanto, nenhuma das duas propostas teve andamento.Capanema foi capaz de perceber as transformaes ocorridas nocontexto internacional e a mudana de orientao da poltica externabrasileira, a partir de 1940, e estrategicamente se adequar a elas, afas-tando-se progressivamente do grupo de tendncias totalitrias e na-cionalistas exacerbadas do governo Vargas. A Comisso Nacionaldo Ensino Primrio foi sendo progressivamente esvaziada. Em car-ta de julho de 1944, seu presidente, Everardo Backheuser, solicita ao
chefe de gabinete do ministro dotao oramentria para que aComisso reinicie suas atividades, suspensas desde junho de 1943.Em outubro de 1945, poucos dias antes de deixar o Ministrio,Capanema envia uma Nota a Loureno Filho, diretor do Inep, anun-ciando que as atividades atribudas Comisso Nacional do Ensino
Primrio deveriam passar para a competncia do Conselho Nacio-
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nal de Educao. Na prtica, elas j tinham sido assumidas peloprprio Inep. Assim, em dezembro de 1944, Loureno Filho havia
encaminhado ao ministro um anteprojeto de Lei Orgnica do Ensi-no Primrio, elaborado no Inep, depois de consultados os subsdios
preparados pela Comisso Nacional do Ensino Primrio. Esse an-
teprojeto transformar-se-, com pequenas alteraes de forma, naLei Orgnica do Ensino Primrio, decretada em janeiro de 1946
(Decreto-lei n 8529, de 2 de janeiro de 1946), depois da queda de
Vargas e da substituio de Capanema por Leito da Cunha. Nota--se apenas uma mudana de fundo. O anteprojeto de Loureno
Filho, ao tratar dos princpios orientadores do ensino primrio afir-ma que este dever inspirar-se, em todos os momentos, no esprito
da unidade e da segurana nacional e no da fraternidade humana.Na verso definitiva, permanecem a unidade nacional e a fraternidade
humana. A segurana nacional fica excluda!Na realidade, a concepo de Capanema com relao ao en-
sino primrio havia mudado. No incio do Estado Novo, a fun-
o do ensino primrio, tal como o ministro a definiu no discursopronunciado no centenrio do Colgio Pedro II, em dezembro
de 1937, era dotar a criana de disciplina e eficincia, atributosessenciais do cidado e do trabalhador.
Mas permanece a concepo centralizadora e unificadora, que,
alis, iria acompanhar Capanema mesmo depois de sua sada doMinistrio e balizar a sua atuao como Constituinte, em 1946, e
como relator do anteprojeto de Lei de Diretrizes e Bases da Edu-cao Nacional, em 1949.
E Capanema no estava sozinho. Em 18 de dezembro de 1943,
discursando como paraninfo na formatura das novas professorasdo Instituto de Educao, Vargas vai mais longe de centralizao e
unificao do ensino primrio. Referindo-se aos professores pri-mrios, diz o presidente:
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Sempre foi meu pensamento, logo que as circunstncias o permitam,reuni-los na capital federal, vindos de todos os recantos do pas,mesmo os mais longnquos, auscultar-lhe as aspiraes e sentir deperto as necessidades do ambiente onde trabalham. Seria este o Con-gresso dos Professores, em que se cuidasse de dar unidade ao ensi-no, no s pela legislao, o que pouco, mas pela escolha do livroescolar nico, pela padronizao do material, pela harmonia de esp-rito de todos os apstolos dessa grande cruzada.
Ensino preparador da elite intelectual do pas
A partir de 1942, comearo a ser promulgadas, por iniciativade Capanema, as leis orgnicas do ensino, reformando vrios ra-
mos do ensino mdio: Lei Orgnica do Ensino Industrial (Decre-to-lei n 4073, de 30/1/1942), Lei Orgnica do Ensino Secund-
rio (Decreto-lei n 4244, de 9/4/1942) e Lei Orgnica do Ensino
Comercial (Decreto-lei n 6141, de 28/12/1943).O anteprojeto da Lei Orgnica do Ensino Industrial foi pre-
parado por uma comisso de educadores, presidida por GustavoCapanema, e encaminhado ao presidente em janeiro de 1942. De
acordo com o anteprojeto, transformado em Decreto-lei pelopresidente Vargas em 30 de janeiro de 1942, o ensino industrial
tinha por objetivos atender aos interesses do trabalhador, realizan-
do a sua preparao profissional e a sua formao humana; aosinteresses das empresas, nutrindo-as, segundo as suas necessidades
crescentes e mutveis, de suficiente e adequada mo de obra, e aosinteresses da nao, promovendo continuamente a mobilizao de
eficientes construtores de sua economia e cultura.
Estes objetivos sero reafirmados e detalhados melhor por
Capanema no discurso pronunciado na Confederao Nacionalda Indstria, em agosto de 1942.
O ensino secundrio, apresentado por Capanema no discurso
comemorativo do centenrio do Colgio Pedro II como sendo oensino preparador da elite intelectual do pas, teve sua lei org-
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nica promulgada em abril de 1942 (Decreto-lei n 4244, de 9/4/1942), depois de cuidadosa preparao. Ao contrrio do ocorrido
com o ensino industrial, a elaborao do anteprojeto foi levada atermo, de forma isolada, pelo prprio ministro que, em aspectos
pontuais, levou em considerao os pareceres recebidos de um
seleto grupo de educadores, por ele consultados em maro de1942. Entre esses, destacam-se os educadores ligados ao grupo
catlico, especialmente Alceu Amoroso Lima e os padres jesutas
Arlindo Vieira e Leonel Franca4. As suas observaes referem-seprincipalmente ao currculo, ao ensino religioso e coeducao.
Sociologia e religio e a Lei Orgnica do Ensino Secundrio
Quanto ao currculo, os catlicos criticam o seu carter enci-clopdico, defendem a presena do latim e das humanidades cls-
sicas e se opem introduo da sociologia no ensino secundrio.
A sociologia, introduzida na Frana, outrora, por fins sectrios, nofaz parte dos programas de ensino secundrio da Europa. matriade um curso superior. Aqui, essa experincia no curso complementar
foi desastrosa. Em quase todos os cursos de colgios leigos, essadisciplina se converteu em ctedra de propaganda subversiva. Dissotemos pleno conhecimento, mediante as notas de aula que nos fo-ram apresentadas por nossos antigos alunos e outros. Os pobresrapazes, sem madureza intelectual para ajuizar do valor das doutri-nas de mestres sem conscincia, facilmente se deixam levar por essastiradas de pura demagogia. Seria, pois, conveniente, suprimir essadisciplina do curso secundrio. (Parecer do Padre Arlindo Vieira)
4 No dia 7 de abril de 1942, dois dias antes da promulgao da lei orgnica, o jornal Gazeta
de Notcias publica artigo de seu diretor, Wladimir Bernardes, no qual este afirma que areforma a ser promulgada estava marcada pela influncia dos jesutas. Gustavo Capanema
responde imediatamente, em carta que foi publicada no dia seguinte, no mesmo jornal:
No assim, meu caro amigo. Preocupado em fazer obra segura, tenho ouvido muita
gente sobre o assunto. Ao meu gabinete tm vindo professores e intelectuais de todas as
feies culturais, para dar o seu parecer e a sua contribuio. No do meu modo de ser
deixar-me influenciar por este ou por aquele, deixar-me levar por esta ou aquela tendn-
cia. O governo me deu o hbito de buscar o equilbrio, a equidistncia.
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Sugiro ainda, de modo veemente, a supresso da cadeira de sociologia,que em hiptese alguma, deve ser cadeira do curso secundrio eapenas do curso superior. (Parecer de Alceu Amoroso Lima)
Inclino-me a julgar que a sociologia no se ensina com grande pro-veito nos cursos secundrios. (Parecer do Padre Leonel Franca)
A posio dos pareceristas prevalece e a sociologia no apare-ce como disciplina na verso definitiva da lei.
No que se refere coeducao, as posies do ministro e dos
educadores catlicos so coincidentes. O anteprojeto dedicava todoum ttulo educao secundria feminina, no qual se recomendavaque a educao secundria das mulheres se fizesse em estabeleci-
mentos de ensino de exclusiva frequncia feminina e se determinava
que nos estabelecimentos de ensino secundrio frequentado porhomens e mulheres, a educao destas fosse ministradas em classes
exclusivamente femininas, salvo especial autorizao do Ministrioda Educao, por motivo relevante. Alceu Amoroso Lima apoia
este dispositivo, embora insistindo que seria muito prefervel que se
proibisse a coeducao e se desse um prazo de dois a trs anos para
a adaptao dos estabelecimentos onde ela existe. Estas disposi-es se mantm na verso definitiva da lei. Entretanto, nos anossubsequentes, elas sero suspensas, no incio de cada ano, por porta-
ria do ministro da Educao, em nome da economia de guerra. Aexigncia da autorizao do Ministrio da Educao para o funcio-
namento de classes mistas ser suprimida pelo Decreto-lei n 8347,
de 10 de dezembro de 1945, que mantm a referncia ao funciona-mento de classes exclusivamente femininas sempre que possvel.
Quanto ao ensino religioso, nas primeiras verses do antepro-
jeto, Capanema far constar um artigo sobre a educao religiosa,determinando: As escolas secundrias incluiro a educao religi-
osa entre as prticas educativas do ensino de primeiro e segundociclos, sem carter obrigatrio. O Padre Leonel Franca e Alceu
Amoroso Lima, nos seus pareceres, reagiro contra a clusula fi-nal, sem carter obrigatrio, que poderia, segundo eles pres-
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tar-se a interpretao errnea, impedindo que um instituto livreministre o ensino religioso com carter de obrigatoriedade. As-
sim, diferentemente do que acontecia com relao ao ensino pri-mrio, quanto ao ensino secundrio a Igreja parece estar mais pre-
ocupada em assegurar-se o direito de obrigar os alunos matricula-
dos em suas escolas a frequentarem as aulas de religio do que emgarantir o direito de ensinar religio nas escolas secundrias ofici-
ais, alis, em pequeno nmero. A verso definitiva da Lei Orgnica
do Ensino Secundrio levar em considerao essa preocupao.Estava dessa forma assegurado aos colgios religiosos o direito
de exigir de seus alunos a frequncia s aulas de religio 5.O anteprojeto de Lei Orgnica do Ensino Secundrio foi en-
caminhado por Capanema ao presidente Vargas, em 1 de abril de1942. Entretanto, a implantao da Lei Orgnica do Ensino Se-
cundrio no se dar sem problemas, especialmente no momentode sua concretizao nas diferentes unidades da Federao, o que
levar o ministro a encaminhar a Vargas, em fevereiro de 1944, o
anteprojeto de um novo decreto-lei, dispondo sobre a unidade delegislao sobre ensino secundrio em todo o pas. Na Exposio
de Motivos Capanema apresenta a unidade nacional como ideal aser conquistado e mantido com muita luta. Segundo o ministro,
no campo da educao esta unidade decorre da harmonia do sis-
tema legislativo e se mantm por meio da vigilncia e direo.Dessa forma, na execuo das leis do ensino o critrio deve ser
uniforme e geral e as decises devem ser nicas. E isto principal-mente no ensino secundrio.
Esse anteprojeto no se transformou em lei. Mas, tal como
em relao ao ensino primrio, Capanema continuar defendendo
5 Assim, quando um estabelecimento de ensino do Rio de Janeiro, dependente da Igreja
Metodista, recusa, em 1944, matrcula a um aluno cujo pai ope-se a que seu filho
frequente as aulas de religio ministradas pelo estabelecimento, o ministro da Educao,
com base no artigo 21 da Lei Orgnica do Ensino Secundrio, d razo ao Colgio e
manda arquivar o processo aberto contra o colgio pelo pai.
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estes princpios, em sua atuao como Constituinte, em 1946, ecomo relator do anteprojeto de Lei de Diretrizes e Bases da Edu-
cao Nacional, em 1949.Em 29 de abril de 1944, Capanema envia a Loureno Filho,
diretor do Inep, o Aviso Ministerial n 231, solicitando que fosse
organizado um plano de uma revista de cultura pedaggica. Narealidade, a ideia no era nova. Em 4 de dezembro de 1939 Lou-
reno Filho havia apresentado a Capanema uma minuta de decre-
to-lei, criando, no Inep, uma publicao peridica semestral, como nome deArquivos Pedaggicos, para divulgar os estudos e pesqui-
sas realizados pelo Instituto, a legislao federal sobre educao einformaes gerais sobre o desenvolvimento da educao no pas
e no estrangeiro. Tal iniciativa no foi adiante. No fim de abril de1944, o ministro envia ao diretor do Inep um aviso, solicitando
providncias no sentido da organizao de um plano de uma re-vista de cultura pedaggica a ser publicada pelo Instituto, como
rgo oficial do Ministrio, para tudo que se referisse organiza-
o do ensino. Tal plano foi encaminhado ao ministro, por Lou-reno Filho, em 8 de maio de 1944. O plano do diretor do Inep
previa a publicao de uma revista mensal, denominada EducaoNacionalou Revista Brasileira de Educao, com as finalidades de di-
vulgar, em todo o pas, os modernos princpios e tcnicas da edu-
cao, servir como rgo de debate dos grandes problemas daeducao nacional e concorrer por todos os meios para imprimir
crescente unidade de objetivos e de mtodos ao pensamento pe-daggico nacional. Cada nmero teria, em mdia, 120 pginas e a
tiragem seria de mil exemplares. O primeiro nmero sair em ju-
lho de 1944. Embora Loureno Filho tivesse proposto que sechamasseEducao Nacionalou Revista Brasileira de Educao, prefe-
rindo a segunda denominao, o nome finalmente escolhido, cer-tamente por Capanema, foi Revista Brasileira de Estudos Pedaggicos.
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O prprio ministro escrever a apresentao do primeiro nmero.Segundo ele, a funo da revista seria reunir e divulgar, pr em equa-
o e em discusso no apenas os problemas gerais da pedagogia,mas sobretudo os problemas pedaggicos especiais que se deparam
na vida educacional do Brasil. Para Capanema, as questes gerais da
educao j estavam equacionadas, sendo necessrio que a revista seocupasse dos problemas especficos da educao brasileira.
Uma aliana com a Igreja
A partir de 1944 as mudanas ocorridas no cenrio internaci-
onal, com forte repercusso na poltica interna do Brasil, levaro oministro Capanema a se colocar na defensiva, seja para tentar sal-
var o governo do presidente Vargas, a quem ele continuava fiel,seja para defender a sua atuao no Ministrio, que ele sabia ser
decisiva para o seu futuro poltico. Esta posio defensiva se ma-
nifestar em diferentes momentos e assumir formas variadas.Vamos nos referir a duas. Em primeiro lugar, a tentativa de
intermediar uma aliana entre Getlio Vargas e a Igreja Catlica,traduzida em documento encaminhado por ele ao presidente, ain-
da em 1944. Em segundo lugar, a defesa veemente de sua polticaeducacional, contida em conferncia pronunciada por ele, em ou-
tubro de 1945, em resposta s acusaes feitas pelo Brigadeiro
Eduardo Gomes, candidato Presidncia da Repblica.Durante o Estado Novo havia sido estabelecida uma forma de
relacionamento entre o estado e a Igreja, chamada por D. AquinoCorrea de concordata moral. Vargas compromete-se a assegurar
Igreja a liberdade que ela necessita para agir e ambiente propcio a
esta ao. Mas, na concepo de Vargas, a atuao da Igreja deverialimitar-se ao domnio religioso, em sentido estrito: pregao e do-
mnio sobre as almas. Em troca, o Estado Novo esperava dosmembros do clero que estes, atravs da palavra e do exemplo, ensi-
nassem aos fiis a obedincia lei, a ordem e a disciplina.
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No final do Estado Novo a atitude da liderana catlica comrelao ao governo Vargas comear a se modificar, em razo dos
acontecimentos vinculados participao do Brasil na guerra e daspresses internas pela redemocratizao do pas. Buscando elucidar
as razes que o levavam a rever as suas concepes polticas, Alceu
Amoroso Lima escrever, em 1945:
Muitos da nossa gerao rejeitamos, em tempo, a democracia, por serela, ou pelo menos se ter tornado exclusivamente o setor poltico da
burguesia, a mscara da hipocrisia poltica de que ela se revestia parafazer crer ao povo que ele governa. (...) em Maritain que vamosprocurar os fundamentos metafsicos indispensveis para uma res-taurao da dignidade da democracia, que deixa assim de ser, quandobem entendida e aplicada, a defesa de uma classe moribunda, para setornar a garantia dos prprios direitos do homem, contra toda opres-so econmica e poltica, na sociedade.
Entretanto, se a situao internacional leva rejeio do totali-
tarismo, permanece ainda em alguns setores da Igreja uma tendn-
cia autoritria, que no lhes parece incompatvel com certa formade bem entender e de bem aplicar a democracia. o que se
pode verificar nesta afirmao do Padre Leonel Franca, Reitordas Faculdades Catlicas do Rio de Janeiro, no discurso de aber-
tura dos cursos em 1944, publicado no segundo nmero da Revis-ta Brasileira de Estudos Pedaggicos:
No entendemos por democracia um regime poltico caracterizadopor instituies representativas ou parlamentares baseadas no sufr-gio direto, emolduradas quase sempre em quadros republicanos. Asformas de governo so contingncias histricas, que variam de povopara povo, e, num mesmo povo, com as diferentes fases de sua evolu-o social. (...) Por democracia entendemos, aqui e agora, a organizao
da vida comum baseada no respeito da dignidade de cada homem quevem a este mundo, como portador de um destino pessoal e prprio,para cujo conseguimento titular de direitos imprescritveis einconfiscveis. (...) Poder existir sob as aparncias exteriores de umgoverno fortemente hierrquico e autoritrio, mas ser inimiga irrecon-cilivel de qualquer totalitarismo, racista ou comunista.
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A convivncia com Alceu Amoroso Lima e com o Padre Leo-nel Franca permitir a Gustavo Capanema perceber esta transfor-mao no seio da Igreja, em toda a sua ambiguidade e seus limites;com sua habilidade poltica, Capanema procurar tirar proveito dela.
Partindo da proposio do Padre Leonel Franca, de rejeio dototalitarismo e de aceitao de um governo autoritrio, o ministro daEducao propor a Getlio Vargas uma nova aliana com a Igreja,bem mais ampla em suas exigncias e mais modesta em suas pro-
messas do que o pacto proposto por Francisco Campos em 1931.As linhas gerais desta proposta esto contidas em um docu-
mento redigido por Capanema, provavelmente em 1944. Trata-sede um documento de trs pginas, sem data nem assinatura, apre-sentado em papel timbrado do gabinete do ministro do Minist-rio da Educao e Sade, intitulado Algumas consideraes so-bre a nossa atualidade catlica.
Enquanto Francisco Campos, em 1931, havia prometido a Vargasa mobilizao de toda a Igreja Catlica ao lado do governo emtroca da introduo do ensino religioso nas escolas oficiais, Capanema,em 1944, promete a Vargas a simpatia das correntes militantesdo catolicismo brasileiro em troca de uma tomada de posio dopresidente na defesa dos objetivos catlicos essenciais. SegundoCapanema, estes objetivos seriam: combater o totalitarismo, asse-gurar o primado do direito e manter diretriz segura e constante comrelao s polticas da famlia, do trabalho e da educao.
A poltica da famlia, partindo de uma concepo jurdica eeconmica da existncia familiar deveria ser ampla, abrangendoum sistema completo de medidas protetoras; poltica do traba-
lho caberia assegurar ao trabalhador justia social plena; a pol-tica de educao deveria excluir as influncias materialistas de to-das as denominaes, garantir escola a liberdade de ensinar areligio dos alunos e dos pais e fazer com que o ensino, de ummodo geral, estivesse baseado e orientado numa concepo
espiritualista da vida.
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A dimenso poltica da proposta de Capanema aparece nomomento da explicitao dos dois outros objetivos: o combate
ao totalitarismo e a garantia do primado do direito na ordemjurdica nacional.
Segundo Capanema, era possvel distinguir duas correntes de
opinio no catolicismo brasileiro. Para o ministro, os catlicos doBrasil, sem estarem divididos e sem divergirem com relao ao
que havia de essencial no pensamento cristo, apresentavam dois
pensamentos polticos, duas concepes em face dos problemasque agita(va)m o mundo e a (...) ptria.
A primeira corrente era a dos conservadores. Preocupadosacima de tudo em manter uma ordem que permita e existncia
do catolicismo, os conservadores consideravam o comunismocomo o grande inimigo do catolicismo; assim, aceitariam qual-
quer soluo que importasse a liquidao do comunismo.A segunda corrente apontada por Capanema era a dos pro-
gressistas. Para os progressistas, a soluo no seria o simples
combate ao comunismo, visto no ser este o nico inimigo:Para os catlicos progressistas, o inimigo o totalitarismo, e este sereveste de trs formas: o totalitarismo nazista, de tipo alemo ouitaliano; o totalitarismo sovitico, de tipo russo; e o totalitarismo mi-litar, de tipo argentino. (...) Contra todos os trs preciso combater.
Segundo Capanema, existiam no Brasil germes bem vivos efortes do totalitarismo nazista e do totalitarismo sovitico
(integralistas e comunistas). A respeito do totalitarismo militar, oministro no se pronuncia!
Como o combate ao totalitarismo no se coadunava com a
situao ditatorial vigente no pas, era necessrio transform-la, demodo a assegurar, na existncia do pas, o primado do direito.
Contudo, esta transformao no implicava, segundo Capanema,em uma mudana de regime ou em uma nova Constituio. Bas-
tava, segundo ele, tornar vigente em todos os seus termos a or-dem jurdica nacional tomando como base a Constituio de 10
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de novembro de 1937, que envolvia possibilidade ampla de suaprpria adaptao a quaisquer novas condies polticas.
Entretanto, o novo pacto proposto por Capanema no se con-cretizou. Em 1945, o episcopado toma posio em favor de uma
nova Constituio, manifesta preferncia pela forma democrtica
de governo e engaja a Liga Eleitoral Catlica nesta campanha, en-quanto uma parte dos intelectuais catlicos ingressa na Unio
Democrtica Nacional, passando a apoiar a candidatura do Briga-
deiro Eduardo Gomes, que se ope ao General Dutra, candidatooficial de Vargas.
Deixando o Ministrio
Gustavo Capanema deixou o Ministrio da Educao e Sadeem 30 de outubro de 1945, no bojo da renncia coletiva de todos
os ministros, logo aps a deposio do Presidente Getlio Vargas.
Antes de deixar o Ministrio, Capanema pronuncia, no audi-trio do Ministrio da Educao e Sade, em 1/10/1945, diante
de uma plateia formada principalmente por funcionrios do Mi-nistrio, por ele convidados6, conferncia na qual busca respon-
der s acusaes de Eduardo Gomes, que havia denunciado, emdiscurso de campanha presidencial, a ocorrncia de uma crimino-
sa infiltrao fascista no ensino brasileiro, a transformao da es-
cola em rgos de propaganda do regime e a utilizao dos alu-
6 O Arquivo Loureno Filho, do CPDOC, conserva a seguinte carta, por ele recebida em 26
de setembro de 1945, quando ainda era diretor do Inep: Meu Prezado Loureno, no prximo
dia 1 de outubro, segunda-feira, s 5 horas da tarde, terei oportunidade de pronunciar, no
auditrio do edifcio do Ministrio de Educao e Sade, uma conferncia sobre o problemada educao no governo do presidente Getlio Vargas, examinando as consideraes que
sobre esta matria foram feitas pelo senhor Brigadeiro Eduardo Gomes, em seu recente
discurso pronunciado na Bahia. Tenho o prazer de convidar o eminente amigo para assistir
a essa conferncia, confessando-me desde j sumamente agradecido pela honra do seu
comparecimento. Remeto-lhe os inclusos convites, pedindo-lhe com interesse que os
transmita a pessoas que trabalham sob sua direo ou que sejam de suas relaes
pessoais. Apresento-lhe os meus cordiais protestos de estima e apreo, Gustavo Capanema.
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nos para a glorificao dos governantes. Capanema, que era aindaministro da Educao, responde a estas acusaes a partir da defi-
nio do fascismo como regime de partido nico e da escola fas-cista como instrumento utilizado pelo estado para formar politi-
camente a infncia e a juventude e levar os jovens a participarem
das organizaes e atividades do partido. Com base nesta defi-nio de fascismo e de escola fascista, o ministro nega categorica-
mente que o fascismo tenha sido introduzido no ensino brasileiro.
Segundo o ministro, nunca foi fascista a escola brasileira: foi sem-pre uma escola democrtica e patritica.
Mas o mesmo argumento utilizado por Capanema para negaro carter fascista da escola brasileira, poderia ser utilizado para
negar a afirmao feita por ele de que a escola brasileira durante oEstado Novo, havia sido uma escola democrtica. A escola brasi-
leira, principalmente a partir de 1937, no foi democrtica, vistoque o regime no era um regime democrtico.
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