Compreender as Provas Bíblicas

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Compreender as Provas Bíblicas Michael Sours Traduzido e adaptado do livro Understanding Biblical Evidence Tradução e Adaptação: Marco António Oliveira © 1993 Assembleia Espiritual local dos Baha’is de Lisboa Adaptado do original inglês com autorização de Oneworld Publications, 185 Banbury Road, Oxford, England, © Michael Sours

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Adaptação do livro Understanding Biblical Evidence, de Michael Sours. Pretende ajudar os Bahá'ís a aprofundar os seus conhecimentos sobre a Bíblia e a prepara-los para dialogar com Cristãos. Publicado em Português em 1993.

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Compreender as Provas Bíblicas

Michael Sours

Traduzido e adaptado do livro Understanding Biblical Evidence Tradução e Adaptação: Marco António Oliveira © 1993 Assembleia Espiritual local dos Baha’is de Lisboa Adaptado do original inglês com autorização de Oneworld Publications, 185 Banbury Road, Oxford, England, © Michael Sours

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SUMARIO

Cap. 1 - INTRODUÇÃO...................................................................................................5 1.1 - PROPÓSITO DESTE DOCUMENTO....................................................................................5 1.2 - TRÊS PRINCÍPIOS BÁSICOS: .............................................................................................5

Enfatizar as áreas de acordo ...............................................................................6 Escutar e entender os pontos de vista..................................................................6 Adaptar a terminologia e a apresentação.............................................................6

Cap. 2 - RACIOCINAR A PARTIR DA BÍBLIA..............................................................7 2.1 - ADAPTAR A NOSSA APRESENTAÇÃO A NOSSA AUDIÊNCIA .....................................7 2.2 - O MÉTODO DO Kitáb-i-Íqán ................................................................................................8 2.3 - AS LIMITAÇÕES DESTE MÉTODO ...................................................................................9

Cap. 3 - ACEITAÇÃO MÚTUA.....................................................................................10 3.1 - A BÍBLIA COMO PALAVRA DE DEUS..............................................................................10 3.2 - BAHÁ'U'LLÁH DEFENDE A BÍBLIA..................................................................................11 3.3 - PONTO DE VISTA DE 'ABDU'L-BAHÁ ..............................................................................12 3.4 - INTERPRETAÇÃO DE 'ABDU'L-BAHÁ SOBRE O PONTO DE VISTA DO ALCORÃO A RESPEITO DA BÍBLIA ................................................................................................................12 3.5 - O SIGNIFICADO DA PALAVRA "EVANGELHO"..............................................................13 3.6 - USAR A BÍBLIA EM DIÁLOGOS COM CRISTÃOS...........................................................14

Cap. 4 - CRITÉRIOS COMUNS......................................................................................15 4.1 - A BASE DAS NOSSAS CONVICÇÕES................................................................................15 4.2 - PADRÕES HUMANOS E PADRÕES DIVINOS...................................................................16 4.3 - CRITÉRIOS ESPECÍFICOS DA BÍBLIA ..............................................................................16 4.4 - CONFIAR NA BÍBLIA .........................................................................................................18

Cap. 5 - MÉTODOS E MATERIAIS ...............................................................................19 5.1 - MATERIAIS QUE NECESSITAMOS ...................................................................................19 5.2 - RELACIONAR OS VERSÍCULOS DE ACORDO COM OS TEMAS ...................................19 5.3 - SUGESTÕES PARA ESTUDAR EFICIENTEMENTE A BÍBLIA.........................................20

Cap. 6 - INTERPRETAR AS ESCRITURAS...................................................................22 6.1 - ENTENDER O SIGNIFICADO ESPIRITUAL DAS ESCRITURAS ......................................22 6.2 - A LINGUAGEM DUPLA......................................................................................................23 6.3 - O PROPÓSITO DA LINGUAGEM SIMBÓLICA..................................................................24 6.4 - PRÉ-REQUISITO PARA ENTENDER AS ESCRITURAS ....................................................25 6.5 - A CHAVE PARA O SIGNIFICADO SIMBÓLICO DAS ESCRITURAS ...............................26

Cap. 7 - RESPONDER AOS ARGUMENTOS DA INTERPRETAÇÃO LITERAL ..29 7.1 - O ARGUMENTO CRISTÃO EM FAVOR DA INTERPRETAÇÃO LITERAL .....................29 7.2 - RESPONDER AOS ARGUMENTOS CRISTÃOS.................................................................29 7.3 - O LITERALISMO E AS PALAVRAS DE JESUS .................................................................30 7.4 - AS INTERPRETAÇÕES ALEGÓRICAS DE S. PAULO.......................................................31 7.5 - COMO ALGUNS LITERALISTAS CONTRARIAM S. PAULO ...........................................32 7.6 - O PAPEL DA CIÊNCIA CONTEMPORÂNEA E DA RAZÃO..............................................33 7.7 - A INTERPRETAÇÃO É UM ASSUNTO COMPLEXO.........................................................35 7.8 - REFERÊNCIAS BÍBLICAS ..................................................................................................35

Cap. 8 - DEMONSTRAR QUE BAHÁ'U'LLÁH É UM MANIFESTANTE DE DEUS ...37 8.1 - A PROVA DAS AFIRMAÇÕES DE BAHÁ'U'LLÁH............................................................37 8.2 - DEFINIÇÕES DOS TERMOS "PROFETA" E "MANIFESTANTE"......................................38 8.3 - TODAS AS COISAS SE CONHECEM PELAS SUAS QUALIDADES .................................39

Cap. 9 - IDENTIFICAR E EXAMINAR AS PROVAS....................................................41 9.1 - IDENTIFICAR AS PROVAS.................................................................................................41 9.2 - EVITAR UM RACIOCÍNIO VICIADO.................................................................................42

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9.3 - EXAMINAR AS PROVAS....................................................................................................42 9.4 - COMO É QUE OS PROFETAS MANIFESTAM O AMOR DE DEUS ..................................43 9.5 - COMO É QUE OS PROFETAS MANIFESTAM O PODER E A SOBERANIA DE DEUS...44 9.6 - DISTINÇÃO ENTRE GRANDES PESSOAS E PROFETAS .................................................45 9.7 - UMA BASE BÍBLICA PARA AS PROVAS BAHÁ'ÍS ..........................................................45

Cap. 10 - APRESENTAR AS PROVAS ..........................................................................47 10.1 - COMO S. PAULO DAVA A CONHECER AS QUALIDADES DE CRISTO.......................47 10.2 - COMO 'ABDU'L-BAHÁ DAVA A CONHECER AS QUALIDADES DIVINAS DE BAHÁ'U'LLÁH.............................................................................................................................47 10.3 - A IMPORTÂNCIA DA EXPERIÊNCIA PESSOAL.............................................................48

Cap. 11 - ALGUMAS QUESTÕES E POSSÍVEIS OBSTÁCULOS ................................49 11.1 - ESTAR PREPARADO PARA OBSTÁCULOS....................................................................49 11.2 - QUESTÕES SOBRE PROFECIAS ......................................................................................49 11.3 - QUESTÕES SOBRE MILAGRES .......................................................................................50 11.4 - QUESTÕES SOBRE DOUTRINAS.....................................................................................52 11.5 - REFERÊNCIAS BÍBLICAS ................................................................................................53

Cap. 12 - A UNIDADE DOS PROFETAS .......................................................................56 12.1 - RESPOSTA AO ARGUMENTO DE QUE A REVELAÇÃO PROGRESSIVA.....................57 REBAIXA A POSIÇÃO DE CRISTO............................................................................................57 12.2 - RESPOSTA AO ARGUMENTO DE QUE ADÃO PECOU..................................................58 12.3 - RESPOSTA AO ARGUMENTO DE QUE ABRAÃO PECOU.............................................59 12.4 - RESPOSTA AO ARGUMENTO DE QUE MOISÉS PECOU...............................................59

Cap. 13 - SUGESTÕES PARA ABORDAR A REVELAÇÃO PROGRESSIVA .............64 13.1 - COMO ADAPTAR O CONCEITO BAHA'Í DE REVELAÇÃO PROGRESSIVA ............ A UMA AUDIÊNCIA CRISTÃ.........................................................................................................64 13.2 - ANALOGIAS BÍBLICAS PARA DEMONSTRAR QUE AS RELIGIÕES MUNDIAIS NÃO SÃO IRRECONCILIAVELMENTE DIFERENTES.......................................................................65 13.3 - REFERÊNCIAS BÍBLICAS ................................................................................................67 13.4 - SUGESTÕES DE LEITURA................................................................................................67

Cap. 14. - RESUMO E CONCLUSÃO ............................................................................70 14.1 - UM BREVE RESUMO........................................................................................................70 14.2 - ASPECTOS IMPORTANTES QUE APERFEIÇOARÃO A NOSSO MODO DE APRESENTAÇÃO........................................................................................................................70

CHAVE DE SIGLAS E ABREVIATURAS.....................................................................74

Anexo 1 - A RESSURREIÇÃO DE CRISTO................................................................76 A INFORMAÇÃO CONTIDA NAS CARTAS DE S.PAULO (50-60 d.C.) ...................................78 O EVANGELHO DE S.MARCOS (aprox. 70 d.C.) ......................................................................78 O EVANGELHO DE S.MATEUS (75-90 d.C.)............................................................................78 O EVANGELHO DE S.LUCAS (80-90 d.C.) ...............................................................................78 O EVANGELHO DE S. JOÃO (90-110 d.C.)...............................................................................79 ENSINAMENTOS BAHA'IS.........................................................................................................80

Anexo 2 - A FÉ BAHA'I E O CRISTIANISMO...........................................................82 A TRINDADE...............................................................................................................................83 A ENCARNAÇÃO........................................................................................................................83 A DIVINDADE DE JESUS ...........................................................................................................84 JESUS, O FILHO DE DEUS..........................................................................................................85

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1ª Parte

A BÍBLIA E A FÉ BAHÁ'Í

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CAP. 1 - INTRODUÇÃO

1.1 - PROPÓSITO DESTE DOCUMENTO O presente documento é uma adaptação do livro Understanding Biblical Evidence, de Michael Sours, e pretende ajudar os Bahá'ís a aprofundar os seus conhecimentos sobre a Bíblia e a prepara-los para dialogar com Cristãos. Este documento tem dois objectivos principais: ajudar a conduzir um diálogo amigável e positivo com os Cristãos, e indicar qual a informação mais útil nesses diálogos. Além da informação aqui contida, devemos ter presente que, a maneira como transmitimos essa informação é um factor determinante na receptividade dos Cristãos. Sempre que estejamos a falar de religião com os Cristãos, devemos ter presente que Bahá'u'lláh nos incita a conviver "com os seguidores de todas as religiões em espírito amistoso e fraternal"[EB, 30]. Gostaríamos também de chamar a atenção que este texto não foi elaborado para ser apresentado a contactos ou pessoas interessadas na Fé. As citações da Bíblia são sempre tiradas da edição da Difusora Bíblica (Missionários Capuchinhos, Lisboa).

1.2 - TRÊS PRINCÍPIOS BÁSICOS: Existem 3 princípios básicos que se devem seguir quando se transmite a Fé Bahá'í a um Cristão:

Enfatizar as áreas de acordo Escutar e entender os pontos de vista Adaptar a terminologia e a apresentação

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Enfatizar as áreas de acordo Quando os Cristãos compreendem que a Fé Bahá'í tem uma atitude positiva em relação a Cristo, à Bíblia e ao Cristianismo, é provável que estejam mais receptivos. Por exemplo, as Escrituras Bahá'ís afirmam claramente que a origem divina do Cristianismo "é incondicionalmente reconhecida, que a Filiação e a Divindade de Jesus Cristo são destemidamente declaradas" e que "a inspiração divina do Evangelho é plenamente reconhecida"1.

Escutar e entender os pontos de vista Para apresentar os ensinamentos Bahá'ís devemos conhecer o Cristianismo. Um bom modo de o fazermos é colocarmos questões aos Cristãos com quem nos relacionamos. A importância de ouvir os outros não deve ser subestimada. Isto permitir-nos-á compreender o ponto de vista e as convicções dos Cristãos, e também, captar a sua terminologia.

Adaptar a terminologia e a apresentação Muita da terminologia Bahá'í é derivada da Bíblia, que é parte da herança religiosa da Fé Bahá'í, e assim muitos Cristãos estarão relativamente familiarizados com esta. No entanto, existem alguns termos e frases que os Bahá'ís utilizam e com os quais os Cristãos não estão familiarizados, tais como "Revelação Progressiva", "Manifestantes de Deus" e "Ordem Mundial de Bahá'u'lláh". Também existem termos que os Cristãos usam para explicar certos conceitos ou crenças e com os quais os Bahá'ís não estão familiarizados, tais como "arrebatamento", "pré-milenarismo" e "relação pessoal com Cristo". Devido às diferenças de terminologia, é frequente as pessoas não se entenderem, mesmo quando estão a dizer a mesma coisa. As Escrituras Bahá'ís dizem-nos que nos devemos "associar com as diversas famílias e povos do mundo; familiarizar-nos com os seus hábitos, tradições, pensamentos e costumes"2. Além disso, as Escrituras afirmam que aqueles que se levantam para espalhar os ensinamentos de Bahá'u'lláh não devem "subestimar o pré-requisito fundamental para qualquer trabalho de ensino bem sucedido, que consiste em adaptar a apresentação dos princípios fundamentais da sua Fé, às origens culturais e religiosas, às ideologias e ao temperamento das diferentes raças e nações onde foram chamados a esclarecer e atrair"3.

1 Shoghi Effendi, O Dia Prometido Chegou, pag. 133 2 Shoghi Effendi, Baha'i Administration, pag. 69 3Shoghi Effendi, Citadel of Faith, pag. 25

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CAP. 2 - RACIOCINAR A PARTIR DA BÍBLIA Estudar a Bíblia não só aumenta o nosso conhecimento do Cristianismo, mas também aumenta a nossa compreensão espiritual da Fé Bahá'í. Na seguinte referência ao Evangelho, Shoghi Effendi indica a importância da relação entre a Bíblia e a Fé Bahá'í:

Das palavras de Cristo, conforme testemunha o Evangelho, todos o observador sem preconceitos captará prontamente a magnitude da Fé que Bahá'u'lláh revelou, e reconhecerá o peso desconcertante da pretensão que Ele expressou. [WOB, 25]

Na medida em que as pretensões de Bahá'u'lláh estão ligadas às profecias bíblicas, não é surpreendente que, ao longo das Suas Escrituras, muita da terminologia que Ele utiliza tenha raízes na tradição bíblica. Este motivo, só por si, é suficiente para os Bahá'ís estudarem a Bíblia. No entanto, existe um outro motivo, ainda mais importante: conhecer a Bíblia é um pré-requisito vital para ensinar a Fé Bahá'í aos Cristãos. Se conhecermos apenas as Escrituras Bahá'ís não estaremos preparados para dialogar de um modo eficiente com um Cristão. Deste modo, se desejamos ser persuasivos quando falamos com Cristãos devemos conhecer a Bíblia para apoiar aquilo que dizemos.

O método proposto neste documento permite-nos analisar racionalmente assuntos religiosos, e consiste em três aspectos básicos:

definir a nossa terminologia avaliar a importância dos diferentes tipos de provas examinar se as provas justificam as conclusões

2.1 - ADAPTAR A NOSSA APRESENTAÇÃO A NOSSA AUDIÊNCIA Raciocinar e dialogar a partir do Antigo Testamento é o método como o próprio Cristianismo se espalhou. Se examinarmos os relatos do Novo Testamento sobre os primeiros Cristãos, tais como Estevão, Apolo e especialmente S. Paulo, encontramos numerosos exemplos de como este método era usado. No livro dos Actos dos Apóstolos, um relato da disseminação do Cristianismo nos 30 anos seguintes à crucificação de Cristo, está escrito que "segundo seu costume, Paulo foi lá procura-los e, durante três sábados, discutiu com eles a partir das Escrituras"[Act 17:2].

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Noutro capítulo do mesmo livro dá-se uma descrição mais detalhada do método de S. Paulo:

Marcaram, então, o dia e vieram ter com ele [Paulo], em maior número, ao seu alojamento. Desde pela manhã até à tarde, Paulo não cessou de lhes dar o seu testemunho. Falou com eles do Reino de Deus e procurou convencê-los do que diz respeito a Jesus, invocando a Lei de Moisés e os Profetas. [Act 28:23]

Também 'Abdu'l-Bahá utilizava frequentemente as Escrituras como base a partir da qual podia tirar conclusões lógicas para apoiar os ensinamentos e declarações de Bahá'u'lláh. Deste modo Ele utilizava um critério - a Bíblia - que Ele e os Seus ouvintes aceitavam. 'Abdu'l-Bahá também utilizava termos bíblicos e frases familiares aos Seus ouvintes. Alguns exemplos incluem "ovelhas" significando "crentes"4, "Pastor" significando "Manifestante"5, "Pai" significando "Deus"6, e "frutos" significando "acções"7. Estes tipos de terminologia bíblica encontram-se na maioria das palestras que 'Abdu'l-Bahá proferiu na América. Frequentemente, 'Abdu'l-Bahá cita a Bíblia para apoiar os ensinamentos Bahá'ís; refere-se frequentemente a Cristo; defende a Fé Cristã; utiliza termos bíblicos e frases que são familiares aos Seus ouvintes. Deste modo, 'Abdu'l-Bahá deixava tornava mais fácil que a audiência cristã entendesse a Fé Bahá'í. Estes aspectos ilustram que 'Abdu'l-Bahá considerava a Bíblia como uma boa base de apoio para a Fé Bahá'í. Além disso, nunca se atrapalhava com a Sua firme fé em Cristo e na Bíblia. Quando 'Abdu'l-Bahá foi convidado a falar numa sinagoga em Washington D.C., Ele até instou a audiência judaica a aceitar Cristo!8 Estudar o método de abordagem de 'Abdu'l-Bahá permitir-nos-á desenvolver a nossa capacidade para raciocinar e dialogar a partir da Bíblia, de modo a demonstrar a verdade da posição de Bahá'u'lláh. Uma tal abordagem mostrar-se-á extremamente efi-ciente nas discussões com qualquer Cristão que acredite que a Bíblia é a Palavra de Deus e que recorra à Bíblia para tomar importantes decisões de fé.

2.2 - O MÉTODO DO KITÁB-I-ÍQÁN Shoghi Effendi declarou que se estudarmos o Kitáb-i-Íqán isso "melhorará infinitamente o trabalho de ensino no Ocidente". Uma das razões pela qual ele fez essa afirmação, é porque esse livro mostra como apresentar uma prova. No Kitáb-i-Íqán, Ba-há'u'lláh fala essencialmente para uma audiência muçulmana, e por isso refere-Se ao Alcorão para apresentar uma série de argumentos em apoio da posição do Báb. A Sua apresentação pode ser resumida a três etapas essenciais. Bahá'u'lláh: 4 Promulgation of Universal Peace, pag. 298 5 Idem, pag. 116 6 Idem, pag. 267 7 Idem, pags. 335-336 8 Idem, pags, 402-410

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1. demonstra a Sua aceitação do Alcorão como Palavra de Deus e fonte

infalível de orientação [KI, 123-124]; 2. demonstra qual o critério que é aceitável e está de acordo com as

Escrituras [KI, 125-132, 139, 142]; 3. demonstra a validade das declarações do Báb aplicando os critérios do

Alcorão [KI, 125-135]. Vamos tentar fazer algo semelhante. Vamos:

1. demonstrar a nossa aceitação da Bíblia como Palavra de Deus; 2. mostrar quais os critérios que são aplicáveis segundo a Bíblia; 3. utilizar o critério da Bíblia para provar que Bahá'u'lláh é o mais

recente Manifestante de Deus.

2.3 - AS LIMITAÇÕES DESTE MÉTODO Devemos ainda acrescentar algumas palavras sobre as limitações do método proposto neste documento. Algumas pessoas poderão questionar se será correcto raciocinar sobre as Escrituras em todos os diálogos com todos os Cristãos. A resposta é não. A abordagem geral proposta neste documento destina-se aos Bahá'ís que pretendem essencialmente dialogar com Cristãos conservadores que interpretam a Bíblia literalmente a a consideram Palavra de Deus. Existem muitos tipos de Cristãos, tais como Católicos, Ortodoxos e muitas confissões Protestantes; estes podem ainda ser conservadores, liberais, progressistas, etc. Alguns Cristãos confiam mais na Bíblia do que outros. Outros há que gostam mais de se aconselhar com os sacerdotes ou que têm uma perspectiva mais filosófica da religião. E todos eles podem ser mais liberais ou mais conservadores. Devemos ter presente que não existe um "Cristão típico". Também é importante que não se crie um estereótipo do Cristão de acordo com a corrente ou congregação a que ele possa pertencer.

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CAP. 3 - ACEITAÇÃO MÚTUA A fidedignidade da Bíblia é um assunto que tem levantado polémica entre autores Cristãos. Há quem questione a inspiração divina de algumas partes e quem sugira que certos versículos foram acrescentados e outros apagados. Há mesmo quem diga que os Apóstolos compreenderam mal o que Cristo disse e espalharam ensinamentos contrários aos d'Ele.

3.1 - A BÍBLIA COMO PALAVRA DE DEUS Quando consideramos se a Bíblia é a Palavra de Deus, vemos que numa tentativa de compreender as aparentes diferenças entre as doutrinas cristãs e os ensinamentos Bahá'ís, os autores Bahá'ís assumem duas perspectivas diferentes sobre a Bíblia e o Cristianismo. Uma dessas perspectivas procura explicar as diferenças dizendo que a Bíblia não é fidedigna e está cheia de erros, omissões e acrescentos, e, portanto, não pode ser considerada Palavra de Deus. A outra perspectiva afirma que a Bíblia é a Palavra de Deus e, portanto, é uma fonte fidedigna de orientação espiritual. Os Bahá'ís que adoptam esta perspectiva indicam que alguns Cristãos compreenderam ou interpretaram mal a Bíblia. Esta má compreensão, por seu lado, provocou as aparentes diferenças entre as doutrinas cristãs e os ensinamentos Bahá'ís. Os adeptos desta segunda perspectiva apontam para as Escrituras Bahá'ís que parecem indicar que a Bíblia é a Palavra de Deus e que tem sido mal interpretada. Este ponto de vista é substanciado à luz da Revelação de Bahá'u'lláh para demonstrar a har-monia entre a Bíblia e as Escritura Bahá'ís. Vamos adoptar este segundo ponto de vista.

"O Alcorão, a Bíblia e as nossas Escrituras" podem ser "considerados livros autênticos".

Shoghi Effendi Lights of Guidance, nº 1033

No Kitáb-i-Íqán, Bahá'u'lláh escreve sobre a importância daquilo que Ele descreve como a «Cidade de Deus» ou a «Cidade da Certeza» [KI, 121]. Eis as Suas palavras:

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Essa Cidade não é senão o Verbo de Deus revelado em cada era e dispensação. Nos dias de Moisés foi o Pentateuco; nos dias de Jesus, o Evangelho. [KI, 122]

Este excerto indica claramente que o Pentateuco (a mensagem dos primeiros contida nos cinco primeiros livros do Antigo Testamento) e o Evangelho (a mensagem contida no Novo Testamento) são a Palavra de Deus. Quem questiona a inspiração divina da Bíblia pode argumentar que é mais correcto dizer que a Bíblia contém a palavra de Deus do que dizer que a Bíblia é a Palavra de Deus. No entanto, o Guardião traduziu o Kitáb-i-Íqán do persa para o inglês a frase «essa cidade [o Evangelho] é... a Palavra de Deus» e portanto isto deve ser aceite como o legítimo ponto de vista Bahá'í.

3.2 - BAHÁ'U'LLÁH DEFENDE A BÍBLIA No Kitáb-i-Íqán Bahá'u'lláh apresenta a defesa da Bíblia em resposta ao argumento muçulmano contra a sua autenticidade:

...alguns alegam terem os sacerdotes judaicos e cristãos apagado do Livro aqueles versículos que exaltassem e elogiassem o semblante de Maomé, e inserido em seu lugar outros de sentido contrário. Quão completamente vãs e falsas essas palavras. Pode um homem que acredita num livro e o considera inspirado por Deus, mutila-lo? [KI, 55]

No entanto Bahá'u'lláh explica que a corrupção do texto que aconteceu não se refere ao apagar de palavras mas à "interpretação do Livro Sagrado de Deus de acordo com as suas [dos sacerdotes muçulmanos] vãs imaginações e desejos fúteis" [KI, 55] Referindo-se especificamente ao Evangelho, Bahá'u'lláh assinala que Maomé não poderia ter querido dizer que as Escrituras tinham sido corrompidas, como pretendem alguns muçulmanos, porque o Alcorão afirma a sua verdade:

Todo o observador de discernimento reconhecerá que na Dispensação do Alcorão tanto o Livro como a Causa de Jesus foram confirmados. [KI, 17]

E referindo-se especificamente ao Evangelho acrescenta:

Temos ouvido também numerosas pessoas insensatas na terra as-severarem que o genuíno texto do Evangelho celestial não existe entre os cristãos... Que erro lastimável! Como são inconscientes do facto de que tal afirmação imputar a maior injustiça e tirania a uma Providência clemente e benévola! [KI, 57]

Bahá'u'lláh diz-nos que seria inconsistente com a graça e misericórdia de Deus fazer "desaparecer o Seu Livro Sagrado, o Seu maior testemunho entre as Suas criaturas". [KI, 57]

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3.3 - PONTO DE VISTA DE 'ABDU'L-BAHÁ Quando 'Abdu'l-Bahá esteve em Inglaterra, e foi convidado para falar no City Temple de Londres, teve oportunidade de demonstrar a Sua atitude em relação à Bíblia. Nessa ocasião 'Abdu'l-Bahá foi convidado a escrever algumas palavras numa Bíblia:

Este Livro é o Livro Sagrado de Deus, de inspiração celestial. É a Bíblia da Salvação, o Nobre Evangelho. É o mistério do Reino e a sua luz. É a dádiva divina, o sinal da orientação de Deus. 9

3.4 - INTERPRETAÇÃO DE 'ABDU'L-BAHÁ SOBRE O PONTO DE VISTA DO ALCORÃO A RESPEITO DA BÍBLIA Em algumas ocasiões 'Abdu'l-Bahá teve a oportunidade de demonstrar o apoio e as confirmações de Maomé sobre o facto da Bíblia ser a Palavra de Deus - facto pouco conhecido entre os Cristãos.

É significativo e convincente que quando Maomé proclamou o Seu trabalho e missão, a Sua primeira objecção aos seus próprios seguidores ter sido "Porque não acreditastes em Jesus Cristo? Porque não aceitastes o Evangelho? Porque não acreditastes em Moisés? Porque não seguistes os preceitos do Antigo Testamento? Porque não compreendeis os Profetas de Israel? Porque não acreditastes nos discípulos de Cristo? O primeiro dever que vos incumbe, ó árabes, é aceitar e acreditar nestes. Deveis considerar Moisés como um Profeta. Deveis aceitar Jesus Cristo como a Palavra de Deus. Deveis conhecer o Antigo e o Novo Testamento como a Palavra de Deus [PUP, 201]

Noutra ocasião, 'Abdu'l-Bahá cita a frase de Maomé que "a Bíblia é a Palavra de Deus":

No Alcorão lemos que Maomé falou aos Seus seguidores dizendo: «Porque não acreditais em Cristo e no Evangelho? Porque não aceitais Moisés e os Profetas, pois, seguramente, a Bíblia é a Palavra de Deus?» [PP, 40]

Esta passagem é particularmente importante e merece uma análise cuidadosa. Ao citar o versículo do Alcorão "Porque não acreditastes nos discípulos de Cristo?" 'Abdu'l-Bahá indica-nos a importância que Maomé dava aos escritos dos discípulos. 'Abdu'l-Bahá também cita Maomé como tendo afirmado que o Antigo e o Novo Testamento são a "Palavra de Deus"; depois refere não apenas Moisés, mas também "os Profetas". Deste modo 'Abdu'l-Bahá enfatizou a afirmação de Maomé de que "a Bíblia é o Livro de Deus".

9 Balyuzi, 'Abdu'l-Bahá, pag. 17

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3.5 - O SIGNIFICADO DA PALAVRA "EVANGELHO" Quando no Kitáb-i-Íqán, Bahá'u'lláh se refere ao "texto genuíno do Evangelho celestial" (p. 57), será que Ele se refere apenas às palavras de Cristo ou apenas os primeiros quatro livros do Novo Testamento, ou será que Ele se refere a todo o Novo Testamento que contém outros escritos dos Apóstolos? Um exame cuidadoso do termo «Evangelho» nas Escrituras Bahá'ís sugerem que se refere ao todo o Novo Testamento. Evangelho é uma palavra que provém do grego e que significa «boa notícia» ou «boa nova». Esta palavra refere-se à mensagem de Cristo ou ao texto contido nessa mensagem. Este termo não é usado na forma plural - Evangelhos - no Novo Testamento. Jesus usou o termo Evangelho numa ocasião em que não existia nenhum Evangelho escrito [Mc 1:14-15]. O Apóstolo Paulo sugere que «Evangelho» significa a mensagem trazida por Cristo que revela a rectidão de Deus e conduz à salvação [Rom 1:16-17]. Em parte alguma do Novo Testamento existe algum uso do termo «Evangelho» que sugira que se trata apenas das palavras de Cristo ou qualquer outra parte restrita Novo Testamento. Nas Escrituras Bahá'ís, em algumas ocasiões, Bahá'u'lláh utiliza o termo plural - Evangelhos - para Se referir aos primeiros quatro livros do Novo Testamento [KI 18, 20]. Nestes casos, Ele chama a atenção do leitor para temas específicos mencionados nesses livros. A maioria das referências nas escrituras de Bahá'u'lláh, 'Abdu'l-Bahá e nos escritos de Shoghi Effendi, tal como na Bíblia e no Alcorão, tendem a utilizar o termo «Evangelho» num sentido que não sugere um significado limitado aos primeiros quatro Livros do Novo Testamento. Também é importante clarificar quaisquer dúvidas que possamos ter em relação aos escritos dos Apóstolos incluídos no Novo Testamento. A este propósito, 'Abdu'l-Bahá deixou bem claro que, do ponto de vista Bahá'í, os Apóstolos estão em harmonia com Cristo e por isso os seus Escritos devem ser respeitados10. Compreender que existe essa harmonia é extremamente importante, sobretudo em relação a S. Paulo, pois os escritos de S. Paulo constituem uma grande parte do Novo Testamento. 'Abdu'l-Bahá caracterizou S. Paulo como aquele "que se tornou celestial" e como sendo "um filósofo divino"11, que "estava em grande união com Cristo"12, e que "se tornou o Seu servo mais fiel"13.

10 Selections from the Writings of 'Abdu'l-Bahá, pag. 60 11 Balyuzi, 'Abdu'l-Bahá, pag. 354 12 Tablets of 'Abdu'l-Bahá Abbas, pag. 720 13 Palestras em Paris, pag. 119

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3.6 - USAR A BÍBLIA EM DIÁLOGOS COM CRISTÃOS Aceitar a Bíblia como Palavra de Deus permitirá um acordo mútuo sobre a fonte dos critérios que vamos utilizar nos nossos diálogos com Cristãos. Se os Bahá'ís deixarem de reconhecer a Bíblia como Palavra de Deus, não poderão apresentar os ensinamentos da Fé Bahá'í com a perfeição desejada, e terão abdicado de uma grande quantidade de provas em que a sua religião se pode basear. Deve-se ter em mente que quando falamos em aceitação pretendemos dizer algo mais do que aceitar a Bíblia como livro divinamente inspirado. Devemos tentar compreender qual o significado e o propósito da Bíblia se de facto queremos estabelecer bases de acordo mútuo com os Cristãos. A Bíblia ensina, entre outras coisas, que o nosso propósito é amar Deus, amar-nos uns aos outros, auxiliar o próximo e sermos humildes. Quando abordamos os Cristãos devemos ter em mente que partilhamos uma mesma fé em valores espirituais comuns. Conflitos, críticas ou tentativas de nos enaltecermos acima de outros apenas podem obscurecer esses valores comuns.

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CAP. 4 - CRITÉRIOS COMUNS A aceitação da Bíblia como a Palavra de Deus dá-nos uma base muito ampla e positiva para iniciar o nosso diálogo com Cristãos. Mas por onde devemos começar? Está claro que a Bíblia é para nós uma espécie de "aliado", mas necessitamos de saber como utiliza-la de um modo inteligente e adequado nos nossos diálogos. Neste capítulo, onde vamos seguir o modelo do Kitáb-i-Íqán (ver capítulo 2), examina-se alguns critérios bíblicos específicos que apoiam a verdade das pretensões de Bahá'u'lláh. Mas primeiramente devemos examinar porque é que a Palavra de Deus deve ser a base das nossas convicções, e o que é que diferencia os padrões humanos dos padrões divinos quando procuramos a verdade.

4.1 - A BASE DAS NOSSAS CONVICÇÕES As pessoas reconhecem a verdade por diferentes motivos. É importante saber como podemos reconhecer a verdade. Todas as coisas criadas reconhecem-se pelos seus atributos ou características particulares. Estes atributos e características formam um critério que utilizamos para identificar e conhecer essas coisas. Por exemplo, reconhecemos o sol devido à sua luz e calor. No entanto não podemos aplicar o mesmo critério para reconhecer ou identificar o oceano. De igual modo, um Manifestante de Deus é reconhecido pelas suas qualidades particulares e não pode ser julgado por padrões que não têm qualquer relação com essas qualidades específicas. O primeiro dos atributos de um Manifestante é a Sua Palavra, pois é esta Palavra que renova e espiritualiza os corações da humanidade. Na Bíblia está escrito:

Nem só de pão vive o homem, mas de tudo o que sai da boca do Senhor [Dt 8:3, cf. Lc 4:4]

Esta passagem sugere que a nossa vida espiritual depende da Palavra de Deus. Muitas vezes Bahá'u'lláh enfatizou que a humanidade necessita constantemente da Palavra de Deus. De facto, é por este motivo que Deus envia Manifestantes de tempos a tempos. Deste modo, a Palavra de Deus é o padrão pelo qual se reconhecem os Mensageiros de Deus e é o meio para reconhecer a verdade quando os Mensageiros ascenderam. É para as Escrituras que nos devemos voltar quando procuramos orientação espiritual.

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4.2 - PADRÕES HUMANOS E PADRÕES DIVINOS Podemos obter um grande contributo no nosso estudo da Palavra de Deus se examinarmos a diferença entre os padrões humanos e os padrões divinos. Deus estabelece padrões ao enviar Mensageiros e ao revelar Livros Sagrados. O propósitos destes Mensageiros e destes Livros é revelar os atributos de Deus, transformar as nossas vidas, e dar-nos orientação espiritual. Assim, a verdade dos Profetas deve ser julgada pela existência destas qualidades divinas. Bahá'u'lláh proclama que o Livro de Deus é o padrão divino:

Ó dirigentes da religião! Não pesais o Livro de Deus com aqueles padrões e ciências que são correntes entre vós, pois o próprio Livro é uma balança infalível estabelecida entre os homens. Nesta perfeitíssima balança deve ser pesado tudo o que possuem os povos e raças da terra, enquanto que a medida do seu peso deve ser testada segundo o seu próprio padrão, se apenas o soubésseis. [cf. SCKA, pag. 29]

Não devemos julgar as Escrituras apenas pelo que outros pensam destas, ou pelo seu estilo gramatical ou pelo facto de explicarem ou não certos aspectos que nos interessam mais. Nem a devemos desconsiderar em função de aspectos culturais ou históricos, ou porque a nossa interpretação não coincide com uma teoria científica.

4.3 - CRITÉRIOS ESPECÍFICOS DA BÍBLIA Vamos agora ver alguns excertos do Novo Testamento que ilustram quão eficiente pode ser a Palavra de Deus para nos ajudar a identificar ou estabelecer uma verdade. Mais concretamente, os versículos seleccionados permitem-nos demonstrar a origem divina de Bahá'u'lláh. O autor da primeira epístola de João distingue entre o que é "o Espírito de Deus" e o que "não é de Deus"[I Jo 4:2,3]. Ele começa por aconselhar a procurar uma verdade antes de acreditar:

Caríssimos, não deis fé a qualquer espírito, mas examinai se os espíritos são de Deus, porque muitos falsos profetas se levantaram no mundo. [I Jo 4:1]

Os dois versículos seguintes sugerem um teste que se faz com a distinção entre o que é de Deus e o que não é de Deus. Também define o «Anti-Cristo»:

Nisto conhecereis o Espírito de Deus: todo o espírito que confessa a Jesus Cristo incarnado é de Deus; e todo o espírito que não confessa a Jesus Cristo incarnado não é de Deus. E este é o espírito do Anti-Cristo do qual já ouviste dizer que há de vir, e que já está no mundo. [I Jo 4:2,3]

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Neste versículo, o reconhecimento da divindade de Jesus é apresentada como um teste. Dizer que Jesus encarnou significa dizer que Jesus de Nazaré não era apenas um grande homem: Ele era o Messias, o Cristo. Não há qualquer dúvida que Bahá'u'lláh afirma a divindade de Jesus. Em numerosas passagens das Suas Escrituras, Bahá'u'lláh afirma que Jesus era o Cristo incarnado. Por exemplo, referindo-se à crucificação, e ao facto desta ter mudado o mundo, Ele diz:

Sabe tu que quando o Filho do Homem rendeu a Deus Seu alento, a criação inteira chorou com grande pranto. Por Ele Se haver sacrificado, porém, infundiu-se um nova capacidade em todas as coisas criadas. Suas evidências, segundo se testemunha agora em todos os povos da terra, estão agora manifestas diante de ti.[SEBh, XXXVI, p. 62]

Além disso, Bahá'u'lláh também escreveu:

Reflecti como foi tratado pelos Seus inimigos Jesus, o Espírito de Deus, não obstante Sua humildade extrema e Sua perfeita ternura de coração. Tão veemente foi a oposição à qual Ele, a Essência do Ser e Senhor do visível e do invisível, teve de enfrentar, que não tinha Ele onde deitar a cabeça. Vagava continuamente de um lugar para outro, privado de uma morada permanente. [SEBh, XXIII, p. 45]

Com estas afirmações Bahá'u'lláh estabelece inequivocamente de acordo com o critério do Novo Testamento que Ele "é de Deus" e não é o Anti-Cristo. Quando lemos os escritos de S. Paulo, encontramos um critério semelhante, que estabelece que Bahá'u'lláh fala pelo Espírito Santo. S. Paulo escreve:

Por isso, faço-vos saber: ninguém que fale sob a acção do Espírito de Deus pode dizer: «Jesus é maldito»; e ninguém pode dizer «Jesus é Senhor», senão por influência do Espírito Santo. [I Cor 12:3]

Bahá'u'lláh fala de Jesus Cristo não só como «Senhor do visível e do invisível» [SEBh, XXIII] mas também como «Senhor de todo o ser» [ESW, 100]. Isto é uma prova bíblica que nos mostra que Bahá'u'lláh fala pelo Espírito Santo! Outro critério que podemos utilizar para determinar se Bahá'u'lláh é de Deus ou não, é o que se encontra no Evangelho de S. Mateus, onde Cristo diz:

Acautelai-vos dos falsos profetas que se vos apresentam disfarçados de ovelhas, mas por dentro são lobos vorazes. Conhecê-los-eis pelos seus frutos. Porventura podem-se colher uvas dos espinhos ou figos dos abrolhos? Toda a árvore boa dá bons frutos e toda a árvore má dá maus frutos. A árvore boa não pode dar bons frutos, nem a árvore má dar bons frutos. Toda a árvore que não dá bons frutos é cortada e lançada ao fogo. Pelos seus frutos, pois, os conhecereis. [Mt 7:15-20]

Estes versículos são especialmente importantes para reconhecer um verdadeiro Profeta. O termo «frutos» refere-se às qualidades e atributos. S. Paulo também usa o termo

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«frutos» para se referir aos Cristãos que vivem de acordo com o Espírito e não de acordo com a carne:

Mas o fruto do Espírito é: alegria, paz, paciência, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão, temperança. [Gal 5:22-23]

Para aplicar o conselho de Jesus de que «pelos seus frutos os conhecereis» [Mt 7:20] temos de saber se a vida e ensinamentos de Bahá'u'lláh reflectem o «fruto do Espírito». Se descobrirmos em Bahá'u'lláh «bondade, justiça e verdade» [Ef 5:9], então Ele é de Deus. Vimos que S. Paulo usa o termo «fruto» como significando qualidades ou atributos. Ao aplicar este critério dado por Cristo no Evangelho de S. Mateus, devemos considerar não só a rectidão, mas também outras qualidades que caracterizam um Profeta de Deus. A abordagem de Cristo é, neste aspecto, muito simples; Ele pergunta simplesmente: «Porventura podem-se colher uvas dos espinhos ou figos dos abrolhos?» [Mt 7:16]. Deste modo, o tipo de fruto é determinado pela espécie de árvore em que cresce. Podemos então perguntar: Será que a realidade da posição de Bahá'u'lláh apoia as Suas declarações? Será Ele um profeta ou apenas um homem recto e honesto? Rectidão e honestidade só por si não são prova de um Profeta. O que nos permite saber que Bahá'u'lláh é um Profeta de Deus são aquelas qualidades profundamente consistentes com todas as Suas declarações, e que incluem mais do que rectidão e honestidade. (Isto será visto na 3ª parte)

4.4 - CONFIAR NA BÍBLIA Um Cristão pode dizer: «Não posso acreditar que Bahá'u'lláh seja quem Ele diz que é, se Ele não se chamou Jesus Cristo» ou «Não posso acreditar em Bahá'u'lláh se ele ensinou qualquer coisa que não esteja na Bíblia». Nestes casos devemos questionar e tentar compreender a base do ponto de vista da outra pessoa. Quais são os versículos ou outras fontes de informação em que se baseia para chegar a essas conclusões? Se possível, mostre o texto bíblico. Se um Cristão não sabe onde é que isso está escrito na Bíblia, o seu ponto de vista perderá alguma força, e ele estará mais receptivo às nossas palavras. Pedir a um Cristão, de uma forma respeitosa, que fundamente os seus pontos de vista nas Escrituras, mostra o nosso respeito pela Bíblia e ajuda-nos a manter o diálogo centrado na Palavra de Deus. No entanto, quando nos referimos à Bíblia é importante que o façamos de uma maneira adequada à sensibilidade da nossa audiência. Devemos evitar citar versículos de um modo agressivo ou de recitar os números dos versículos de um modo que pareça pomposo e arrogante.

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CAP. 5 - MÉTODOS E MATERIAIS Muitos Cristãos utilizam um método muito simples que lhes permite localizar certos versículos da Bíblia por ordem sequencial. Trata-se de um método que pode ser muito útil para os Bahá'ís que desejam encontrar os versículos mais relevantes para os seus diálogos com Cristãos. Neste capítulo vamos descrever esse método e apresentar algumas sugestões para um estudo mais eficiente da Bíblia.

5.1 - MATERIAIS QUE NECESSITAMOS Para além de uma Bíblia (preferencialmente uma edição dos Missionários Capuchinhos ou da Escola Bíblica de Jerusalém) necessitaremos de três marcadores ou lápis de cor verde, azul e amarelo. Cuidado para não utilizar marcadores que possam manchar o papel.

5.2 - RELACIONAR OS VERSÍCULOS DE ACORDO COM OS TEMAS Vamos utilizar um código de cores para assinalar os vários temas da Bíblia: Critérios e Provas VERDE Profecias AZUL Doutrinas AMARELO Vamos agora ver como poderemos ligar os versículos mais relevantes de modo a que os possamos localizar facilmente quando falamos com Cristãos.

1. Com um marcador ou lápis de cor verde assinalar os versículos referentes aos critérios para julgar a divindade de Bahá'u'lláh: I Jo 4:1-3, I Cor 12:3, Mt 7:15-20. Gal 5:22- 23, Ef 5:9-10.

2. Ao lado do versículo [I Jo 4:1-3] escrever de forma abreviada o número do

segundo versículo da sequência [I Cor 12:3]. Ao lado do segundo versículo escrever, também abreviadamente, o número do terceiro, e assim sucessivamente. Ao lado do último versículo [Ef 5:9-10] escrever o número do primeiro. Cria-se, assim, um ciclo de versículos que abordam o mesmo tema. Ao localizarmos um destes versículos podemos facilmente localizar todos os outros.

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3. Num papel à parte escrever o nome do tema, (por exemplo: «Critério») e o versículo que serve como ponto de partida (por exemplo: [I Jo 4:1-3]). Guardar este papel junto com a Bíblia de modo a permitir localizar rapidamente os versículos pretendidos.

4. Ao lado dos versículos indicados escreva abreviadamente uma nota que lhe

permita associar esse versículo com algum excerto das Escrituras Bahá'ís. Por exemplo, ao lado do versículo [I Jo 4:1-3] podemos escrever [SEBh XXXVI, XXIII] (significando Selecção dos Escritos de Bahá'u'lláh, secções XXXVI e XXIII).

5.3 - SUGESTÕES PARA ESTUDAR EFICIENTEMENTE A BÍBLIA

1. Devemos começar por estudar o Novo Testamento. É melhor compreender apenas um livro - o Evangelho de S. João, por exemplo - do que compreender todos os livros da Bíblia de um modo superficial. Podemos, posteriormente alargar o nosso estudo a outros livros do Novo Testamento.

2. Quando encontramos frases que queremos salientar na Bíblia e nas Escrituras

Bahá'ís devemos usar abreviaturas e escrever notas. Por exemplo, podemos escrever KI-84 (significando Kitáb-i-Íqán, pag. 84) junto de Mateus 9:1-6. Isto facilitará que encontremos um comentário das Escrituras Bahá'ís sobre alguns versículos da Bíblia.

3. Podemos prolongar o nosso códigos de cores. Por exemplo, podemos traçar

uma linha vermelha na vertical nas partes dos Evangelhos em que o povo se opõe a Cristo. Podemos traçar outra linha vermelha vertical junto das partes do Kitáb-i-Íqán em que Bahá'u'lláh explica o motivo porque o clero se opõe aos Profetas.

4. Devemos falar frequentemente com Cristãos, falar com outros Bahá'ís que

também se interessam por estudar o Cristianismo, e ler atentamente livros e revistas cristãs.

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2ª Parte

COMPREENDER AS

ESCRITURAS

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CAP. 6 - INTERPRETAR AS ESCRITURAS

6.1 - ENTENDER O SIGNIFICADO ESPIRITUAL DAS ESCRITURAS Na Bíblia podemos ler como S. Paulo enfatizava o facto das Escrituras serem compreendidas espiritualmente:

Não falamos dessas coisas em palavras doutas, de humana sabedoria, mas com aquelas que o espírito ensina e que exprimem as coisas espirituais em termos espirituais. Porque o homem natural não entende as coisas do Espírito de Deus, pois, para ele são loucuras. Não as pode compreender porque devem ser julgadas espiritualmente. [I Cor 2:13-14]

Os ensinamentos Bahá'ís também advogam que quando interpretamos a Escritura devemos procurar o seu significado espiritual. 'Abdu'l-Bahá afirmou:

Todos os textos e ensinamentos dos sagrados Testamentos têm significados espirituais intrínsecos. Não se devem aceitar literalmente. Assim, rezo em vosso nome para que vos seja dado o poder de compreensão destes verdadeiros significados interiores das Sagradas Escrituras, e possais ser informados dos mistérios depositados nas palavras da Bíblia, para que possais alcançar a vida eterna e os vossos corações possam ser atraídos ao Reino de Deus. [PUP, 459-60]

Esta frase de 'Abdu'l-Bahá merece um estudo cuidadoso. Apesar do Mestre afirmar que todos os textos têm significados espirituais intrínsecos e que não devem ser tomados literalmente, isso não significa que os textos nunca tenham significados literais. Alguns versículos das Escrituras contêm um significado literal. Por exemplo: "Não matarás" [Ex. 20:13] tem um significado literal. No entanto, o significado e a razão desta lei envolvem um significado espiritual intrínseco. Mas outras existem frases da Bíblia que têm apenas um significado espiritual e não devem ser tomadas literalmente. Por exemplo, Cristo disse:

Do seio daquele que acredita em Mim, correrão rios de água viva, como diz a Escritura. [Jo 7:38]

Este versículo não significa literalmente que sairá água dos corações dos que acreditam em Cristo. Cristo utiliza uma realidade material para representar uma realidade espiritual. Neste caso, a água viva simboliza, provavelmente, a graça e o conforto que advém de conhecer a verdade de Cristo.

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A água, literalmente falando, dá vida ao mundo material. A água satisfaz a sede do corpo. Usada num contexto espiritual, a alma que tem sêde, pode saciar-se obtendo água espiritual das Escrituras. O exemplo utilizado anteriormente [Jo 7:38] é entendido por Bahá'ís e Cristãos conservadores como sendo simbólico e não literal. O significado espiritual é fácil de perceber, e o significado literal parece impossível de realizar. No entanto, nem sempre é fácil justificar uma interpretação simbólica.

6.2 - A LINGUAGEM DUPLA Para nos ajudar a compreender os significados interiores das Escrituras, Bahá'u'lláh explicou-nos que os Manifestantes de Deus e os Apóstolos têm uma linguagem dupla: "É evidente a ti que as Aves do Céu e as pombas da eternidade falam um linguagem dupla". Uma, explica Bahá'u'lláh, é "a linguagem exterior", que é "destituida de alusões, ocultação ou véu". A outra linguagem é "velada e oculta". [KI, 155] Numa passagem que se refere à Sua segunda vinda, Cristo afirma: "Logo após a aflição daqueles dias, o Sol obscurecer-se-á, a Lua não dará a sua luz, as estrelas caírão do céu e as forças do céu serão abaladas" [Mt 24:29]. Os Cristãos discordam entre si sobre o significado deste versículo, demonstrando com isso, tal como disse Bahá'u'lláh - que o seu significado está oculto e velado. É impossível aceitar um significado literal, a menos que deixemos de acreditar na ciência. Mas mesmo que um Cristão reconheça que estas palavras são simbólicas, não é fácil determinar com absoluta certeza o que elas significam. Podem alguns perguntar: "Porque é que as Escrituras não indicam claramente quais são as passagens que devem ser interpretadas simbolicamente e quais devem ser interpretadas literalmente?" Muitas vezes Jesus também não explica o significado dos símbolos.

E [Jesus] disse a outro: «Segue-Me». Mas ele respondeu: «Senhor, deixa-me ir primeiro sepultar o meu pai» Jesus disse-lhe: «Deixa que os mortos sepultem os seus mortos» [Lc 9:59-60]

As Escrituras não explicam o que Cristo queria dizer com estas palavras. Somos forçados a admitir que aqueles que estava espiritualmente mortos podiam sepultar o pai do discípulo, enquanto o discípulo seguia Jesus. Isto parece ser uma interpretação aceitável, pois ao usar a morte física como símbolo da descrença, Jesus dá uma grande ênfase à privação e perda resultante da descrença. Repare-se que Jesus não explicou o significado deste símbolo, e por isso somos forçados a raciocinar a a fazer um esforço para compreender qual o seu significado. Este exemplo não é difícil de entender, mas há simbolismos que são difíceis de detectar e compreender.

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O senso comum diz-nos que Jesus não se referia a pessoas mortas que deviam enterrar outras pessoas mortas. Do mesmo modo, alguns argumentam que o conhecimento científico comum nos diz que a história de Adão e Eva é simbólica. No entanto, como a Bíblia não diz que essa história é simbólica, muitos Cristãos continuam hoje a aceita-la literalmente. Outras diferenças de opinião também se levantam na interpretação de certas profecias, milagres e relatos de acontecimentos como Noé e o dilúvio e a Ressurreição de Cristo. As Escrituras Bahá'ís explicam porque é que na Bíblia deixa por esclarecer as distinções entre o que é simbólico e o que é literal.

6.3 - O PROPÓSITO DA LINGUAGEM SIMBÓLICA Bahá'u'lláh explica que o uso da linguagem simbólica sempre foi o método de Deus para distinguir entre os "corações iluminados" e o "solo estéril":

Sabe tu, verdadeiramente, que o propósito fundamental de todos esses termos simbólicos e alusões abstrusas que emanam dos Reveladores da santa Causa de Deus, é a provação dos povos do mundo; para que, deste modo o terreno dos corações puros e iluminados se distinga do solo estéril e perecedor. Desde tempos imemoriais, é este o método de Deus entre as Suas criaturas, segundo atestam os livros sagrados. [KI, 34]

Numa outra passagem, Bahá'u'lláh enfatiza que a "linguagem dupla" tem um propósito. A linguagem não oculta deve guiar o pesquisador à verdade, e a linguagem oculta deve expor o malévolo.

Uma, a linguagem exterior, é destituida de alusões, ocultação ou véu, a fim de ser uma lâmpada que guie, uma luz de farol pela qual o peregrino possa atingir as alturas de santidade, e quem busca, avançar até ao reino da reunião eterna... A outra linguagem é velada e oculta, de modo que se torne manifesta qualquer coisa que esteja escondida no coração do malévolo e o seu mais íntimo ser se revele. [KI, 155]

Bahá'u'lláh explica que os lideres da religião tentam justificar a sua rejeição e oposição aos Profetas de Deus, ao insistir que estes versículos simbólicos se devem cumprir literalmente [KI, 51-52; 134-135]. Por este meio, esses lideres esperam manter as suas posições de autoridade sobre o povo. Exigem um cumprimento literal desses versículos em vez de reconhecer a perfeição e a verdade dos Manifestantes de Deus. Deste modo, essa linguagem expõe a sua malevolência. Cristo também afirmou que falava em parábolas para que aqueles que têm sensibilidade espiritual e aqueles que procuram possam descobrir o seu significado, e aqueles que não são receptivos ou não procuram conhecimento espiritual não consigam apreciar o significado dos Seus ensinamentos [Mc 4:10-12; Mt 13:13- 16]. Por outro lado, o autor da Epístola aos Hebreus assegura que existe um propósito no modo como a Escritura é apresentada, isto é, mostrar as intenções do coração:

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Porque a palavra de Deus é viva, eficaz e mais penetrante que uma espada de dois gumes; penetra até dividir a alma e o corpo, as junturas e as medulas e discerne os pensamentos e intenções do coração. [Heb 4:12]

Talvez fosse à Palavra de Deus - esta linguagem dupla - que Jesus se referiu quando afirmou: "Não penseis que vim trazer a paz à terra; não vim trazer a paz, mas a espada" [Mt 10:34]. Bahá'u'lláh utiliza o termo "espada" para expressar o efeito da Palavra de Deus:

Quantos pais se afastaram de seus filhos; quantos que amavam abandonaram o objecto do seu amor! Tão implacavelmente cortante foi essa maravilhosa espada de Deus, que rompeu toda a relação! Por outro lado, considera o poder unificador de Sua Palavra. Observa como aqueles em cujo meio o satã do ego desde anos lançara as sementes da malícia e do ódio, atingiram tal harmonia e união, através de sua lealdade a essa maravilhosa Revelação, que pareciam haver nascido do mesmo ventre. [KI, 72]

O termo "espada" é uma metáfora, pois a Palavra de Deus separa "os corações iluminados" do "solo estéril".

Para compreender o propósito da linguagem dupla, devemos ter em mente que a decisão da fé baseia-se no exercício da livre vontade do indivíduo. Bahá'u'lláh assinala que se profecias se cumprissem literalmente, em vez de simbolicamente, o cumprimento seriam tão extraordinário que todos acreditariam, impedindo assim o exercício da nossa livre vontade14.

6.4 - PRÉ-REQUISITO PARA ENTENDER AS ESCRITURAS Quando S. Paulo disse que as Escrituras "devem ser julgadas espiritualmente" [I Cor 2:14], ele salientava que, devido à sua natureza espiritual, as Escrituras devem ser compreendidas sob um ponto de vista espiritual. Para compreender as Escrituras um indivíduo deve estar desprendido e orientado espiritualmente. Por outras palavras, os pré-requisitos para compreender as Escrituras são qualidades espirituais. Bahá'u'lláh garante-nos que Deus "cada alma foi dotada de capacidade para reconhecer os sinais de Deus"15. No entanto estas capacidades podem ser obscurecidas por mundanismos ou limitações humanas. Ao longo do Kitáb-i-Íqán, Bahá'u'lláh salienta a importância do desprendimento como requisito fundamental para a verdadeira compreensão:

14 Kitáb-i-Íqán, pag 51-52 15 Selecção dos Escritos de Bahá'u'lláh, sec. LII, pag. 74

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.os que trilham o caminho da fé, os que têm sede do vinho da certeza, devem purificar-se de tudo o que é terreno - os ouvidos devem eles purificar de palavras fúteis, as mentes de vãs fantasias, os corações do apego às coisas do mundo, os olhos daquilo que perece. [KI, 7]

Bahá'u'lláh aborda ainda este tema:

Se limpasses o espelho de teu coração, tirando-lhe o pó da malícia, compreenderias o sentido dos termos simbólicos revelados pelo Verbo de Deus, que a tudo abarca, tornado manifesto em cada Era, e descobririas os mistérios do conhecimento divino. Antes de consumires, no entanto, com a chama do desprendimento absoluto, aqueles véus de vã erudição usual entre os homens, não poderás contemplar o brilhante amanhecer do conhecimento verdadeiro. [KI, 45]

Bahá'u'lláh rejeita a ideia de que só uma pessoa erudita pode entender a Escritura:

A capacidade para entender as Suas palavras e a compreensão das entoações das Aves do Céu de modo algum dependem da erudição humana. Dependem, tão somente, da pureza de coração, da castidade de alma e da liberdade de espírito. [KI, 129]

Muito lideres religiosos passam vários anos a estudar e frequentemente são muito instruídos. No entanto, Bahá'u'lláh informa-nos que, por vezes, os lideres da religião não conseguem entender a verdade porque se tornam muito apegados aos seus próprios conceitos e às suas posições de liderança:

Esses lideres, estando imersos em seus desejos egoístas e estando preocupados com coisas efémeras e sórdidas, têm considerado estes Luminares divinos como opostos aos padrões do seu conhecimento e sua compreensão, e inimigos de seus juízos e normas. Por haverem interpretado literalmente a Palavra de Deus e as declarações e tradições das Letras da Unidade, e as explicado de acordo com sua própria compreensão deficiente, eles privaram-se a si mesmos e a todo o seu povo, dos abundantes favores e dádivas de Deus. [KI, 53]

Todas estas palavras de Bahá'u'lláh enfatizam a importância da investigação da verdade e estudo das Escrituras por nós próprios.

6.5 - A CHAVE PARA O SIGNIFICADO SIMBÓLICO DAS ESCRITURAS O Livro que maior auxílio pode dar nos nossos esforços para compreender as Escrituras é o Kitáb-i-Íqán. Este Livro apresenta linhas gerais de orientação para interpretar as Escrituras e explica especificamente muitos assuntos que nos ajudarão a falar sobre a Bíblia com Cristãos.

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Porque o Kitáb-i-Íqán foi escrito para um muçulmano, poder-se-ia pensar que tem pouca aplicação a temas cristãos. Mas um exame mais cuidadoso mostra-nos o contrário. De facto, grandes partes do texto elucidam o significado de passagens do Novo Tes-tamento, e abordam temas muito semelhantes a importantes questões e temas cristãos. O Kitáb-i-Íqán foi escrito em resposta às questões de um muçulmano, mas, no entanto, essas questões são semelhantes às questões que preocupam muitos Cristãos. As questões foram colocadas segundo quatro temas:

1. O Dia da Ressurreição. Deverá haver uma ressurreição corpórea [física] ? O mundo está repleto de injustiça. Como é que os justos serão recompensados e os injustos punidos?

2. O Décimo Segundo Imám [sucessor de Maomé] nasceu numa certa altura e

ainda está vivo. Existem tradições que confirmam esta crença. Como é que se pode explicar isto?

3. A Interpretação dos textos sagrados. Esta Causa não parece estar de acordo

com as crenças mantidas ao longo dos anos. Não se pode ignorar o significado literal dos textos e Escrituras Sagradas. Como se explica isto?

4. O Advento do Qá'im. Certos acontecimentos, de acordo com as tradições que

nos chegaram dos Imáns, devem ocorrer no advento do Qá'im [Prometido do Islão]. Alguns destes foram mencionados, mas nenhum destes ocorreu. Como se explica isto?

Vejamos agora quais podiam ser as questões se fossem colocadas por um Cristão:

1. O Dia da Ressurreição. Na descrição de S. Paulo sobre a Segunda Vinda de Cristo, lemos: «Depois, nós, os vivos os que ficarmos, seremos arrebatados juntamente com eles sobre as núvens; iremos ao encontro do Senhor nos ares, e assim estaremos para sempre com o Senhor» [I Tes 4:17]. Este acon-tecimento é referido pela igreja como o "arrebatamento". Este arrebatamento vai acontecer fisicamente? Como é que o julgamento previsto nas Escrituras [Ap. 20:12-13] se vai realizar? Se o «fim» [Mat. 24:14] já veio, onde está o «julgamento» [II Ped 2:9, Is 2:4]?

2. O Regresso. O Novo testamento afirma que Jesus Se levantou dos mortos no

terceiro dia após a Sua crucificação [Mt 28, Mc 16, Lc 24, Jo 20]. Muitos Cristãos acreditam que Jesus venceu a morte física e está vivo. No entanto a Fé Bahá'í ensina que a ressurreição de Cristo tem um significado espiritual e que não se trata de um acontecimento físico. Como se explica isto?

3. A Interpretação dos Textos Sagrados. Muitas passagens da Bíblia têm

sido tradicionalmente interpretadas como tendo significados literais, como é o caso das profecias do Capítulo 24 do Evangelho de S. Mateus. A Fé Bahá'í

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ensina que estes versículos devem ser interpretados simbolicamente. Como se explica isto?

4. Profecias e Sinais. Certos acontecimentos, de acordo com as Escrituras,

devem ocorrer no momento do Regresso de Cristo. O sol deve-se escurecer, e a lua cairá do céu [Mt 24:29]. Nada disto sucedeu. Se Bahá'u'lláh é o Prometido, como se pode explicar a ausência destes acontecimentos dramáticos?

Nem todas estas questões serão importantes para todos os Cristãos, nem serão as únicas que um Cristão poderá colocar. No entanto, o vasto leque de temas do Kitáb-i-Íqán permitir-nos-á responder a muitas dificuldades que tenhamos nos nossos diálogos com Cristãos. Bahá'u'lláh garantiu-nos que compreendendo o Kitáb-i-Íqán uma pessoa pode superar as barreiras que a impedem de reconhecer o Prometido [KI, 78]. Além disso o Kitáb-i-Íqán é uma excelente base para compreender todos os temas difíceis das religiões do passado [KI, 85].

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CAP. 7 - RESPONDER AOS ARGUMENTOS DA INTERPRETAÇÃO LITERAL

7.1 - O ARGUMENTO CRISTÃO EM FAVOR DA INTERPRETAÇÃO LITERAL Os literalistas não negam que as Escrituras contêm símbolos, metáforas, analogias e linguagem figurada, tal como os Bahá'ís não negam que alguns versículos têm significado literal. O que importa é saber até que ponto se deve aplicar o literalismo. Os literalistas assumem que a maior parte das Escrituras deve ser entendida literalmente e que as excepções são apenas aquelas que o próprio texto indica. Argumentam que Deus deseja que a humanidade compreenda a Sua mensagem e portanto preferiu dá-la de uma forma clara e em linguagem normal. Acreditam que o se a Escritura tivesse significados ocultos isso contradiria o desejo de Deus de que se conhecesse as Suas palavras. Além disso, objectam à interpretação simbólica e alegórica porque acreditam que esta dará azo a uma multiplicidade de significados e consequentemente criará confusão. Há mesmo os que argumentam que é irrelevante assumir que as Escrituras têm significados ocultos pois isso implicaria que Deus não conseguiria transmiti-los de um modo claro através das Escrituras.

7.2 - RESPONDER AOS ARGUMENTOS CRISTÃOS De um ponto de vista racional, os argumentos dos literalistas não levam a conclusões compreensíveis para as pessoas que dão importância às conclusões científicas. Por outro lado, as interpretações simbólicas também dão azo a muitas conclusões diferentes e a uma multiplicidade de significados. Mas esta multiplicidade de significados não é confusa, a menos que cada pessoa se convença que o seu ponto de vista é o único correcto. Bahá'u'lláh escreveu:

...nos dizeres d'Aquele que o Espírito (Jesus) jazem ocultos incontáveis significados. [ESW, 148] Sabe, com certeza, que assim como crês firmemente que a Palavra de Deus - exaltada seja a Sua glória - perdura para sempre, deves do mesmo modo acreditar, com fé inabalável, que o seu significado nunca se poderá esgotar. [SEBh, LXXXIX, pag. 144-145]

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A compreensão exige tolerância da parte de todos os crentes que fazem interpretações e que ouvem os pontos de vista de outros. Tanto a Bíblia como as Escrituras Bahá'ís asseguram que Deus utiliza linguagem simbólica e alegórica para testar os Seus servos, e não para os confundir ou impedir de compreender. Deus deu às Escrituras significados ocultos e dotou os seres humanos de capacidade para compreender as Escrituras.

7.3 - O LITERALISMO E AS PALAVRAS DE JESUS Podemos agora citar alguns exemplos da Bíblia para mostrar como, durante o ministério de Jesus, o literalismo impedia as pessoas de ver o verdadeiro significado das palavras de Jesus.

Em verdade, te digo: «Quem não nascer de novo não pode ver o Reino de Deus». Disse-Lhe Nicodemos: «Como pode nascer um homem sendo velho? Poderá entrar segunda vez no seio de sua mãe e voltar a nascer?» [Jo 3:3-4]

Outro exemplo:

Eu sou o pão vivo que desceu do Céu. Se alguém comer deste pão viverá ternamente; e o pão que Eu hei-de dar é a Minha carne pela vida do mundo. Discutiam então os judeus uns com os outros, dizendo: «Como pode Ele dar-nos a comer a Sua carne?» [Jo 6:51]

Mesmo muitos dos Seus discípulos não conseguiam compreender e diziam:

«Duras são estas palavras! Quem pode escuta-las?» [Jo 6:60]

Então, Jesus indicou-lhes que as Suas palavras deviam ser entendidas espiritualmente:

O espírito é que dá vida, a carne não serve para nada. As palavras que Eu vos disse são espírito e vida [Jo 6:63]

Não obstante esta explicação, o Evangelho relata que muitos deixaram de seguir Cristo por causa destes ensinamentos [Jo 6:66]. Isto mostra, claramente, como Cristo usava as palavras de um modo simbólico, ao ponto das pessoas se afastarem d'Ele por não as compreenderem. Estes exemplos são um claro desafio aos literalistas que argumentam que a Bíblia utiliza linguagem comum de modo a que a humanidade possa compreender os ensinamentos de Deus. No entanto, quando falamos com Cristãos devemos ter o cuidado de não confundir as parábolas de Jesus com outros tipos de símbolos do género «nascer de novo» ou «pão do Céu».

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Ao longo do Evangelho, Jesus expôs grande parte da Sua mensagem por histórias alegóricas que ilustram verdades espirituais. Em alguns casos é-nos apresentada uma explicação sobre o significado da parábola, como é o caso do semeador e do joio [Mt 13:18-23, 36-43], e da rede de pesca [Mt 13:47-50]. Sobre outras, como os vinhateiros [Mc 12:1-12], das bodas do filho do rei [Mt 22:1-14] e do grande banquete [Lc 14:16-24], não nos é dada qualquer explicação. Apesar do significado de cada parábola estar oculto no símbolo que a parábola usa, na maioria dos casos, o símbolo não é difícil de entender. A maioria dos Cristãos reconhece prontamente que Jesus usou símbolos quando falava em parábolas. No entanto, para os Cristãos, isto não justifica que outras partes do Evangelho também sejam simbólicas. Devemos compreender que as parábolas não são uma prova suficiente de que a Bíblia deve ser interpretada simbolicamente. Não obstante, do ponto de vista Bahá'í, as parábolas são uma indicação clara de que Jesus usava símbolos para explicar realidades espirituais.

7.4 - AS INTERPRETAÇÕES ALEGÓRICAS DE S. PAULO Os escritos de S. Paulo contêm algumas interpretações alegóricas do Antigo Testamento, que mostram como a Escritura pode ter múltiplos significados - significados espirituais que podem não ser evidentes ser forem interpretados literalmente. No exemplo seguinte, S. Paulo não nega a realidade histórica, mas chega a conclusões que não são aparentes no sentido literal:

Pois está escrito que Abraão teve dois filhos: um da escrava e outro da mulher livre. Mas o da escrava nasceu segundo a carne, e o da mulher livre, em virtude da Promessa. Isto foi dito por alegoria, pois as duas mulheres representam as duas alianças: Uma, a do monte Sinai, que gera filhos para a escravidão, é Agar. Ora, o Sinai é um monte da Arábia e corresponde a Jerusalém actual, que é escrava com seus filhos. Mas a Jerusalém, lá do alto, é livre, e esta é nossa mãe. [Gal 4:22-26]

S. Paulo refere-se ao livro do Génesis [Cap. 3]. No tempo de S. Paulo, Jerusalém estava sob domínio romano. S. Paulo usa este domínio, ou escravidão, para expressar metaforicamente a escravidão dos Judeus à lei de Moisés. S. Paulo vê Agar como símbolo de Jerusalém, porque Agar era uma escrava, e Jerusalém estava sob jugo romano. S. Paulo via, portanto, em Sarai e Agar, no Monte Sinai e em Jerusalém, significados simbólicos que não são aparentes no sentido literal do texto. Outro exemplo:

«Eu estarei diante de ti sobre o rochedo de Horeb. Baterás no rochedo e dele jorrará água: então, o povo poderá beber». Moisés assim fez na presença dos anciãos de Israel. [Ex. 17:6]

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S. Paulo interpreta esta passagem literalmente como se de facto a água jorrasse de um rochedo:

Não quero que ignoreis, irmãos, que os nossos pais estiveram todos debaixo da nuvem e que todos passaram através do mar. Todos foram baptizados em Moisés, na nuvem e no mar: todos comeram do mesmo alimento espiritual e todos comeram da mesma comida espiritual. De facto, todos bebiam de um rochedo espiritual que os seguia, que era Cristo. [I Cor 10:1-4]

S. Paulo vê Cristo neste relato do Exodo, apesar do autor do Livro do Exodo não dar qualquer indicação de que aquelas frases são simbólicas ou que não devem ser entendidas num sentido exclusivamente literal. Também no Exodo encontramos outra história, aparentemente literal, que S. Paulo interpreta simbolicamente. Aí, descreve-se como Moisés depois de falar com Deus, a Sua face brilhava tão intensamente que o povo de Israel tinha medo de se aproximar d'Ele. Isto fez com que Moisés colocasse um véu na face quando falava aos Israelitas [Ex., 34]. S. Paulo interpreta simbolicamente este relato do Exodo, explicando porque é que os Judeus não compreendem as Escrituras tal como os Cristão as compreendem:

Tendo, pois, esta esperança, agimos com plena segurança. Não fizemos como fazia Moisés, que punha um véu sobre o Seu rosto, a fim de que os filhos de Israel não fixassem o fim que era passageiro. Mas o seu entendimento ficou obscurecido, e ainda hoje quando lêem o Antigo Testamento, esse mesmo véu permanece por levantar, porque é só em Cristo que ele deve ser levantado. Por isso esse véu persiste até hoje nos seus corações, todas as vezes que lêem Moisés. Quando, porém, se converterem ao Senhor, então o véu será tirado. [II Cor 3:12-16]

Neste caso, S. Paulo vê o véu na face de Moisés como um símbolo da não aceitação de Cristo e, consequentemente, a sua incapacidade para compreender a verdadeira mensagem das Escrituras.

Em cada um deste exemplos S. Paulo ultrapassa o significado literal e revela um significado oculto. No entanto, não há indicação no texto de que essas passagens devem ser interpretadas de um modo que não o literal. Provavelmente, S. Paulo acreditava que as Escrituras continham significa dos ocultos, mesmo quando pareciam perfeitamente literais.

7.5 - COMO ALGUNS LITERALISTAS CONTRARIAM S. PAULO Os Cristãos não estão inconscientes deste exemplos, e alguns desenvolveram uma série de argumentos para fugir às interpretações alegóricas de S. Paulo.

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Uns dizem que ele apenas utilizou este método porque os Judeus a quem ele se dirigia respeitavam esta abordagem e não porque ele acreditasse que tal abordagem fosse válida. Esta ideia é irónica, pois as Escrituras não dão qualquer indicação que S. Paulo usa a alegoria apenas para defender o seu ponto de vista, e os literalistas apenas aceitam o significado literal das Escrituras a menos que o contrário seja especificamente indicado. Outros argumentam que S. Paulo reflecte aqui um tipo incorrecto de interpretação que aprendeu quando era aluno de Gamaliel [Act 22:3]. Assumem que S. Paulo está enganado porque está a usar métodos de interpretação errados. Este argumento baseia-se em conjecturas e não em provas Bíblicas. Deve-se salientar que S. Paulo nunca nega o sentido histórico ou literal quando faz as suas interpretações. Estes exemplos das cartas de S. Paulo não podem ser usados para demonstrar que passagens ou versículos que os Bahá'ís acreditam ser simbólicos não têm também significados literais. Estes exemplos indicam que o texto pode ser simbólico mesmo quando não é dada nenhuma indicação de simbolismo, que as Escrituras podem ter mais de um significados, e que estes significados estão ocultos ou não são evidentes no sentido literal das palavras

7.6 - O PAPEL DA CIÊNCIA CONTEMPORÂNEA E DA RAZÃO Uma das razões porque a Fé Bahá'í interpreta simbolicamente grande parte da Bíblia deve-se ao valor dado à razão e ao moderno conhecimento científico. Os Cristãos que interpretam literalmente a Bíblia vêem muitas vezes as suas convicções em contradição com a ciência moderna. Como consequência, alguns Cristãos decidiram re-interpretar a Bíblia enquanto que outros se sentiram mais seguros seguindo as crenças tradicionais. O ponto de vista Bahá'í sustenta que o intelecto e a razão são o "supremo emblema de Deus"16 e por isso devem ser utilizados no estudo da religião17. Este ponto de vista pode ser observado em muitas das explicações de 'Abdu'l-Bahá sobre os Livros Sagrados que reflectem o pensamento científico contemporâneo.

Entre outras coisas, diz-se que as estrelas caírão sobre a terra. As estrelas são inumeráveis, infinitas, e, de acordo com as provas científicas modernas, estabelecidas matematicamente, o globo solar é cerca de um milhão e meio de vezes maior que a terra, e cada uma das estrelas fixas é mil vezes maior que o sol. Se fossem cair sobre a superfície da terra, onde iriam essas estrelas encontrar lugar? Seria como se mil milhões de Himalaias caíssem em cima de um grão de mostarda! De acordo com a razão e a ciência, isto é absolutamente impossível. [EV, cap. 26, p.105]

'Abdu'l-Bahá não rejeita a profecia nem discute sobre a Palavra de Deus; antes, Ele rejeita que seja interpretada literalmente. É evidente que o ponto de vista Bahá'í valoriza o conhecimento científico como factor a considerar quando se interpreta as escrituras. 16 Secret of Divine Civilization, pag. 1 17 Palestras em Paris, pag. 144

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Alguns Cristãos que mantêm uma perspectiva literalista rejeitam este ponto de vista; argumentam que a Bíblia descreve muitos casos em que Deus interveio nas leis da natureza para mostrar a Sua vontade. Argumentam, por exemplo, que Deus permitiu que Moisés afastasse as águas do mar. Não é cientificamente possível que um homem tenha tal poder, mas Deus deu a Moisés esse poder. De igual modo, Deus pode alterar certas características do universo, tais como, a dimensão das estrelas, para fazer cumprir as profecias das Escrituras de um modo literal. Usando este tipo de raciocínio a ciência moderna não é um factor importante para os literalistas que interpretam a Bíblia. A Fé Bahá'í concorda que Deus é todo poderoso e pode fazer o que Lhe apraz, mas não existe evidência clara na Bíblia de que Deus tenha alterado as leis da natureza de um modo radical no passado, e que o venha a fazer no futuro. As interpretações literais não são uma prova suficiente que nos indique que devemos fazer mais interpretações literais. Muitos episódios registados no Antigo Testamento parecem tratar-se de história real, e podem-se até, apoiar em provas arqueoló-gicas, mas é impossível determinar se tudo aconteceu de acordo com a interpretação literal. Isto aplica-se sobretudo a acontecimentos milagrosos. A Bíblia junta simbolismos e narrativas históricas para transmitir verdades espirituais. Deste modo, os Profetas e autores da Bíblia transmitiram a inspiração de Deus aos seus relatos.

A abordagem Bahá'í baseia-se na razão para nos indicar quais são as partes simbólicas e o que é que elas simbolilizam. É importante compreender que o simbolismo não é uma distorção dos factos, mas sim um instrumento para transmitir o significado espiritual de acontecimentos que de outro modo não poderíamos apreciar.

Alguns adeptos mais ferrenhos do literalismo nas suas tentativas para reconciliar as contradições entre as suas crenças e as leis da natureza, advogam que as descobertas que contradigam as suas interpretações literais da Bíblia são invenções de Satanás. Quando falamos com Cristão que têm uma imagem negativista da ciência, é melhor evitar abordar directamente o assunto. Existem pontos positivos que podemos abordar, tais como o modo como a ciência ajudou a espalhar a Bíblia por todo o mundo, como permitiu que investigadores descobrissem provas que apoiam a verdade da Bíblia, e proporcionam testes que permitem datar os textos bíblicos. Quando chegamos a versículos que Bahá'ís e Cristãos interpretam diferentemente, em vez de se procurar discutir, deve-se procurar pontos de acordo mútuo, e aprofunda-los.

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7.7 - A INTERPRETAÇÃO É UM ASSUNTO COMPLEXO Devemos ter presente que o tema da interpretação é um assunto extremamente complexo e multifacetado. Os pontos até agora tocados apenas nos dão uma base muito geral para alguns aspectos muito gerais da Bíblia. Estes pontos vão-nos ajudar à medida que estudamos as Escrituras. Para estudar as Escrituras nunca será de menos salientar a importância do Kitáb-i-Íqán. Este livro mostra-nos como interpretar as Escrituras de um modo espiritual e racional; um estudo cuidadoso do conteúdo deste livro dar-nos-á um grande apoio nos nossos diálogos com Cristãos.

7.8 - REFERÊNCIAS BÍBLICAS Sublinhar com um lápis ou um marcador amarelo os seguintes versículos:

Mt 13:13-16, Heb 4:12 - Propósito espiritual da linguagem das Escrituras. I Cor 2:13-14 - Escrituras compreendem-se sob ponto de vista espiritual. Jo 3:3-4, 6:51-66 - Literalistas não compreendem os símbolos utilizados por

Jesus. Gal 4:22-26, I Cor 10:1-4, II Cor 3:12-16 - S. Paulo interpreta alegoricamente as

Escrituras

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3ª Parte

PROVAS

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CAP. 8 - DEMONSTRAR QUE BAHÁ'U'LLÁH É UM MANIFESTANTE DE DEUS

8.1 - A PROVA DAS AFIRMAÇÕES DE BAHÁ'U'LLÁH Vamos agora examinar as provas que apoiam a verdade das pretensões de Bahá'u'lláh. Muitas pessoas não se sentirão incentivadas a investigar se os Bahá'ís não lhes souberem responder "Como é que vocês podem provar que Bahá'u'lláh é um Profeta?" Devemos ser capazes de demonstrar através de argumentos racionais que sabemos que Bahá'u'lláh é um Manifestante de Deus, porque na Sua vida e ensinamentos podemos identificar atributos divinos. Além disso, podemos sentir e conhecer pessoalmente a realidade destes atributos ao praticar esses ensinamentos nas nossas vidas e conhecendo Deus através da pessoa de Bahá'u'lláh. Muitas pessoas não conseguem compreender a prova das afirmações de Bahá'u'lláh porque não sabem o que é que constitui uma verdadeira prova ou porque têm expectativas incorrectas. No tempo de Jesus muitas pessoas pensavam que o Messias seria um rei que os libertaria dos romanos. Mas Jesus não apresentou essa prova porque o Seu verdadeiro poder estava em na Sua capacidade de libertar os que O aceitavam da verdadeira escravidão - não a escravidão de Roma, mas antes a escravidão do pecado. O Seu sacrifício é um testemunho que Ele não estava a vencer uma batalha militar contra Roma que levaria ao Reino de Deus, como os Judeus esperavam, mas sim a vencer uma batalha espiritual. Tal como o poder de Cristo se revelou através do Seu triunfo sobre a cruz, o poder e glória de Bahá'u'lláh revelaram-se através do Seu triunfo sobre os Seus exílios e encarceramentos. No entanto, hoje muitos Cristãos esperam que Cristo regresse literalmente por cima das núvens, que derrote todos os povos que se levantem contra Ele, e estabeleça o Reino de Deus na terra para aqueles que acreditam n'Ele. Assim para os Cristãos, os exílios e encarceramentos de Bahá'u'lláh são frequentemente vistos como não tendo qualquer relação com a Bíblia, mas antes como um sinal de fraqueza, tal como os judeus entenderam a morte de Cristo. No entanto, a realidade de Bahá'u'lláh veio do céu, e toda a oposição que Bahá'u'lláh enfrentou não conseguiu impedir o triunfo da Sua palavra sobre os corações daqueles que acreditaram n'Ele. De facto, Ele está a conquistar o mundo através de uma transformação espiritual que se efectua em todas as pessoas que O aceitam, e deste modo a estabelecer o Reino de Deus nos corações da humanidade. Esta é a verdadeira vitória do Cristo que regressou, o verdadeiro significado de poder e glória, e esta vitória é uma prova das afirmações de Bahá'u'lláh.

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Bahá'u'lláh disse: "Nós, em verdade, viemos para vosso bem, e suportámos os infortúnios do mundo para vossa salvação" [EB, 18]. Neste versículo Bahá'u'lláh associa directamente o Seu ministério de sacrifício com a nossa salvação pessoal. É extremamente importante para nós compreendermos isto a nível pessoal e sabê-lo transmitir aos Cristãos, e a todo o mundo. Se não conseguirmos transmitir o significado da vinda de Bahá'u'lláh, a Fé Bahá'í terá mais a aparência de uma ideologia secular ou de uma filosofia, e não aquilo que verdadeiramente é - uma relação com Deus, estabelecida através do ministério de sacrifício de Bahá'u'lláh e experimentada pelo coração de todos os crentes.

8.2 - DEFINIÇÕES DOS TERMOS "PROFETA" E "MANIFESTANTE" Quando dizemos de Bahá'u'lláh e Cristo são "Manifestantes de Deus" devemos explicar o que significa isto: Eles manifestam ou revelam atributos de Deus. Nas Escrituras Bahá'ís os termos "Profeta" ou "Manifestante" surgem com significados semelhante18. "Profeta" é um termo frequente da Bíblia mas é aplicado com diferentes sentidos. Num sentido lato poder-se-ia definir como alguém que fala profetica-mente. Isto parece ser o que S. Paulo pretende dizer quando considera os profetas abaixo dos Apóstolos [I Cor 12:28]. O termo "Profeta" foi inicialmente aplicado para Abraão [Gen. 20:7], mas Moisés é considerado por muitos Cristãos como um protótipo de Profeta de Deus. Na Bíblia, Moisés é o primeiro a ser descrito de maneira que exemplifica todas as características que se muitas pessoas associam com o termo "Profeta". Algumas destas características são:

o Profeta foi chamado directamente por Deus [Ex. 3] ensinava o conhecimento de Deus [Ex. 3:15] legislava para o povo [Dt 24: 19-22] instava o povo à rectidão [Dt 6:25] possuía uma consciência profética da história [Ex. 6]

Estas características são também típicas de outros Profetas Bíblicos que surgiram depois de Moisés, tais como Isaías, Jeremias e Zacarias. No entanto, na Bíblia existe ainda um outro significado do termo "Profeta". Trata-se do tipo "Messiânico". Moisés difere de todos os outros Profetas do Antigo Testamento que Lhe sucederam, porque ele foi o mediador de um nova aliança. Esta aliança foi a origem de uma nova fase na vida religiosa de Israel. Todos os profetas que vieram depois de Moisés procuraram propagar, estabelecer e manter esta nova fase.

18 Exemplos: Kitáb-i-Íqán, pags. 7, 9, 12-14, 52, 101-104, 110, 125, 134-135

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Jesus, tal como Moisés, foi o mediador de uma nova aliança. Alguns Cristãos consideram que Jesus está numa categoria única e acima de qualquer outro Profeta. No entanto, também reconhecem que Jesus é um Profeta, tal como Moisés, pois ambos foram mediadores de novos convénios. Temos, portanto, três definições do termo "Profeta":

Num sentido limitado, é alguém que fala profeticamente; Num sentido geral, são os que foram chamados por Deus a

guiar Israel de acordo com as leis e ensinamentos estabelecidos por Moisés;

Num sentido especial, são aqueles através dos quais Deus estabelece um novo convénio.

Uma vez que Bahá'u'lláh estabeleceu um novo convénio, os Bahá'ís acreditam que Ele é um Profeta do tipo Messiânico. Assim:

Quando dizemos que Bahá'u'lláh é um Manifestante, isto significa

que Ele Manifesta ou revela atributos de Deus; Quando dizemos que Bahá'u'lláh é um Profeta de Deus, isto

significa que Ele é um Profeta do tipo Messiânico, o mediador de um novo convénio.

8.3 - TODAS AS COISAS SE CONHECEM PELAS SUAS QUALIDADES O princípio de que todas as coisas se conhecem pelas suas qualidades, é um princípio chave para provar a verdade das afirmações de Bahá'u'lláh. Bahá'u'lláh expressa este princípio com as seguintes palavras:

A prova do sol é a sua própria luz, que ilumina e envolve todas as coisas. [KI, 128]

O mesmo princípio encontra-se nas palavras de Cristo:

Conhecê-los-eis pelos seus frutos. Porventura podem-se colher uvas dos espinhos ou figos dos abrolhos? [Mt 7:16-17]

Com estas palavras Cristo enfatiza que as coisas se conhecem pelas suas qualidades ou "frutos" e afirma que essas qualidades devem ser consistentes com a realidade com que se identificam. Do mesmo modo, as perfeições divinas, isto é, os atributos de Deus, são qualidades que caracterizam um Manifestante de Deus. Quando alguém afirma que é

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Profeta ou Manifestante de Deus, devemos perguntar: será que essa pessoa se caracteriza por perfeições divinas que atribuímos a Deus? Este princípio aplica-se a todas as coisas, isto é, todas as coisas se conhecem pelas suas qualidades19. Este é o princípio que Bahá'u'lláh aplica quando afirma que um Manifestante deve ser conhecido pelos Seus ensinamentos20.

19 Promulgation of Universal Peace, pag. 421-422 20 Kitáb-i-Íqán, pags. 68, 126-127

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CAP. 9 - IDENTIFICAR E EXAMINAR AS PROVAS

9.1 - IDENTIFICAR AS PROVAS Todas as coisas se conhecem pelas qualidades associadas à sua realidade. Para estudar as qualidades da vida de uma pessoa, podemos examinar dois grandes aspectos: actos e palavras, ou, no caso de um Profeta, a Sua vida (as coisas que Ele faz) e os Seus ensinamentos (as coisas que Ele diz ou escreve). Por este motivo, vamos examinar a vida e ensinamentos de Bahá'u'lláh, e tentar encontrar qualidades que sirvam como prova que apoie a verdades das Suas pretensões. Esta abordagem é sugerida por Bahá'u'lláh, quando Ele definiu o que constitui a prova, ou testemunho, que estabelece a verdade de um Manifestante:

O primeiro e proeminente testemunho para estabelecer a Sua verdade é Ele próprio. Depois deste testemunho é a Sua própria Revelação. Para quem quer que não tenha conseguido reconhecer um ou outro destes, Ele estabeleceu as palavras que revelou como uma prova da Sua realidade e verdade. Isto, em verdade, é uma evidência da Sua terna misericórdia para com os homens. Ele dotou cada alma com capacidade para reconhecer os sinais de Deus. [SEBh, LII, pag. 74]

Uma vez que a vida terrena de Bahá'u'lláh terminou com o Seu falecimento em 1892, nenhum dos dois primeiros testemunhos existem hoje: não podemos ver Bahá'u'lláh, "Ele próprio", nem podemos escutar a Revelação pessoalmente. Consequentemente, temos de ler e estudar o que foi registado sobre as duas primeiras. Assim, "as palavras que [Ele] revelou", - os Seus ensinamentos - são o principal testemunho para o mundo de hoje. Sobre isto Bahá'u'lláh escreveu:

... nem apareceu sobre a terra, em qualquer tempo, um testemunho mais poderoso que o testemunho dos Seus [dos Profetas] versículos revelados. [KI, 126]

Para usar as Escrituras como prova, devemos compreender claramente como é que elas constituem um tipo específico de prova necessária para demonstrar as afirmações de Bahá'u'lláh. Devemos ter em mente que as palavras em si não constituem uma prova, mas antes que a prova são os significados espirituais que estas transmitem. Assim quando dizemos que as palavras são a maior evidência, estamos, na verdade, a referir-nos aos significados contidos nestas palavras. Por outro lado, quando dizemos que as palavras das Escrituras são uma prova, o termo "palavra" pode ser usado para significar tanto os ensinamentos como as vidas dos Manifestantes. Uma vez que não podemos testemunhar directamente a vida de Bahá'u'lláh,

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devemos voltar-nos para os registos da Sua vida e ensinamentos, isto é, as Escrituras Bahá'ís. Estas Escrituras são a nossa principal fonte de provas para demonstrar que Bahá'u'lláh é um Manifestante de Deus.

9.2 - EVITAR UM RACIOCÍNIO VICIADO Quando falamos da Palavra como prova da verdade de um Profeta, devemos ter cuidado para evitar um erro comum. Há quem refira esse erro como "raciocínio viciado". Este erro surge quando a conclusão de um raciocínio é apresentada como prova ou premissa que apoia esse raciocínio. Por exemplo, se dizemos que a Bíblia é a Palavra de Deus porque a Bíblia diz ser a Palavra de Deus, isto é uma ilusão. A premissa "a Bíblia diz ser a Palavra de Deus" tem sido usada para apoiar a conclusão "a Bíblia é a Palavra de Deus". Tanto a premissa como a conclusão são verdadeiras, mas a premissa não é logicamente relevante para provar a conclusão, nem constitui uma prova adequada para esta. Assim, quando dizemos que as Palavras dos Profetas são a Sua maior prova, não é por causa dos Profetas dizerem que as Palavras são o seu maior testemunho. É porque as palavras revelam atributos divinos que nos indicam que se tratam de palavras de Deus, ou reflectem aquilo que atribuímos a Deus. Num outro capítulo deste documento vamos examinar o modo como as palavras que Bahá'u'lláh revelou reflectem atributos divinos.

9.3 - EXAMINAR AS PROVAS Quando estudamos a vida dos Profeta, não nos devemos limitar a ouvir os vários acontecimentos das Suas vidas. Temos de saber como é que estas acções e ensinamentos revelam os atributos de Deus. Bahá'u'lláh afirma:

Examinai a conduta admirável dos Profetas e recordai as recusas e difamações pronunciadas pelos filhos da negação e da falsidade; talvez possais fazer com que o coração humano, semelhante a um pássaro, consiga alçar o seu voo para além das moradas da negligência e da dúvida, até ao ninho da fé e da certeza... Se vos informardes das incertezas amontoadas sobre os Profetas de Deus, e compreenderdes as verdadeiras causas das objecções expressas pelos seus opressores, apreciareis, seguramente, o que significa a Sua posição. [KI, 8-9]

Se virmos como os Manifestantes de Deus suportaram tantas dificuldades, como abdicaram de tantos confortos neste mundo, e como Se tornaram objecto de escárnio e perseguição, podemos ver nas suas vidas testemunhos de qualidades divinas como pureza, desprendimento, submissão à vontade de Deus, e amor incondicional pela humanidade. Bahá'u'lláh apresenta exemplo destas qualidades referindo-se ao Báb:

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Outra prova e evidência da verdade desta Revelação [do Báb], que entre todas as outras provas brilha como o sol, é a constância da Beleza eterna em proclamar a Fé de Deus. Embora jovem de tenra idade, não obstante ser a Causa por Ele revelada contrária ao desejo de todos os povos da terra, tanto poderosos como humildes, ricos ou pobres, enaltecidos ou humilhados, reis e súbditos, todavia, Ele levantou-se e proclamou-a firmemente. Todos sabem e ouviram isto. Ele não tinha medo de ninguém; não olhou às consequências. Poderia tal coisa manifestar-se salvo através do poder de uma Revelação Divina, e potência da invencível Vontade de Deus? [KI, 141]

S. Pedro também escreveu:

Também Cristo morreu uma vez pelos nossos pecados, o justo pelos injustos para nos conduzir a Deus. [I Ped 3:18]

Nas escrituras de Bahá'u'lláh encontramos referência ao mesmo motivo:

Nós, em verdade, viemos para vosso bem, e suportámos os infortúnios do mundo para vossa salvação. [EB, 18] O Meu corpo tem suportado o encarceramento a fim de que vos possais libertar da escravidão do ego. [EB, 20]

Os Manifestantes de Deus sofrem para nosso bem de modo a libertar-nos da "escravidão do ego" e para nos "conduzir a Deus". Na Sua vontade de sofrer podemos perceber a Sua divindade, pois a perseguição que suportaram por nossa causa revelam os Seus atributos de amor, perdão e soberania. Podemos, então, dizer que Eles sofrem para Se tornarem uma revelação dos atributos de Deus à humanidade.

9.4 - COMO É QUE OS PROFETAS MANIFESTAM O AMOR DE DEUS O atributo específico do amor é revelado no sacrifício que os Manifestantes de Deus têm feito pela humanidade. Cristo disse:

Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida pelos seus amigos. [Jo 15:13]

Cristo, o Báb, Bahá'u'lláh e outros Profetas ofereceram as Suas vidas por toda a humanidade, tanto amigos como inimigos; este sacrifício representa o máximo que podemos conceber como prova de amor. S. João escreveu:

Nisto consiste o Seu amor: não fomos nós que amámos a Deus, mas foi Ele que nos amou e enviou o Seu Filho como propiciação pelos nossos pecados. [I Jo 4:10]

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Também Bahá'u'lláh escreveu:

Fixai vosso olhar n'Aquele que é o Templo de Deus entre os homens. Ele, em verdade, ofereceu a Sua vida como resgate para a redenção do mundo. Ele, verdadeiramente, é o Todo-Generoso, o Benévolo, o Altíssimo. [SEBh, CXLVI, pag. 196]

Uma vez que não somos capazes de conceber um grau de amor maior do que o amor dos Profetas pela humanidade, atribuímo-lo, naturalmente, a divindade. 'Abdu'l-Bahá explica:

Que grau infinito de amor os Manifestantes Divinos reflectem pela humanidade! Por amor a guiar o povo Eles de boa vontade privaram as Suas vidas para ressuscitar os corações humanos. Eles aceitaram a cruz. Para permitir que as almas humanas atingissem o grau supremo de progresso, Eles sofreram durante anos limitados profundas dificuldades e provações. Se Jesus Cristo não pussuísse amor pela humanidade, Ele, seguramente, não teria aceite a cruz. Ele foi crucificado por amor à humanidade. Considerai o infinito grau desse amor. Sem amor pela humanidade, João Baptista não teria oferecido a sua vida. O mesmo se tem passado com todos os Profetas e Almas Santas. Se o Báb não tivesse manifestado, Ele seguramente, não teria sacrificado o Seu peito perante um milhar de balas. Se Bahá'u'lláh não estivesse incandescido de amor pela humanidade, Ele não teria aceite de boa vontade quarenta anos de encarceramento [PUP, 256-257]

9.5 - COMO É QUE OS PROFETAS MANIFESTAM O PODER E A SOBERANIA DE DEUS É um axioma que Deus é Todo-Poderoso, e que a Sua soberania subsiste por toda a eternidade. De igual modo, não existe maior prova do poder e soberania existente no mundo do que aquela que os Manifestantes de Deus exercem sobre os corações e consciências da humanidade. A influência dos Manifestantes de Deus sobrevive à passagem dos séculos. Nenhum governante, filósofo, pensador, cientista, poeta ou artista teve uma influência tão profunda e tão duradoura sobre a humanidade. É apenas aos Manifestantes que as pessoas se mantêm fieis mesmo depois de terem passado centenas de anos. Ninguém na história alguma vez igualou os Manifestantes na Sua soberania. Bahá'u'lláh aborda detalhadamente este assunto no Kitáb-i-Íqán, pags. 68-85.

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9.6 - DISTINÇÃO ENTRE GRANDES PESSOAS E PROFETAS Poder-se-á argumentar que muitas pessoas sofrem, e algumas até sacrificam as suas vidas, por causas nobres, mas que isso não faz com que sejam Profetas de Deus. Esta observação é correcta. Os Profetas não são os únicos exemplos destas virtudes no mundo. No entanto, o nosso objectivo é demonstrar que Eles são os maiores e mais perfeitos exemplos dessas virtudes, e as Suas perfeições tornam-se uma prova devido ao facto de Eles terem sofrido, e devido à razão do Seu sofrimento. Deus é para a humanidade o máximo de amor, justiça, perdão e de outras perfeições divinas. Cristo, Bahá'u'lláh e outros Profetas possuíam essas perfeições e por isso dizemos que Eles manifestam aquilo que atribuímos a Deus. Por isso referimo-nos a Eles como Manifestantes dos atributos de Deus, ou simplesmente, Manifestantes. Assim, quem quer que demonstre o maior grau destas perfeições - tal como Cristo, Buda ou Bahá'u'lláh - podemos designar como Manifestante de Deus.

9.7 - UMA BASE BÍBLICA PARA AS PROVAS BAHÁ'ÍS A Bíblia declara de uma maneira indirecta que os versículos ou palavras das Escrituras são a principal prova de um Profeta. Isto pode-se demonstrar porque a Bíblia indica que a capacidade de um Profeta para transmitir a Palavra de Deus é essencial para Ele nos poder conceder a salvação e a vida eterna. Isto faz com que a Palavra de Deus seja um critério bíblico para podermos determinar quem é um verdadeiro Manifestante de Deus. Por exemplo, S. Paulo diz-nos que nós somos "salvos mediante a fé" [Ef 2:8], e que "a fé vem da pregação, e a pregação pela palavra de Cristo" [Rom 10:17]. Cristo afirma:

Em verdade, em verdade vos digo: quem ouve a Minha palavra e acredita n'Aquele que Me enviou tem a vida eterna e não incorre em condenação, mas passou da morte para a vida! [Jo 5:24]

Além disso Cristo diz que devemos "nascer de novo" [Jo 3:3], e S. Pedro escreveu que nascemos de novo "pela palavra de Deus" [I Ped 1:23].

Uma vez que alcançamos fé [Rom 10:17], renascimento [I Ped 1:23] e vida eterna [Jo 5:24] através da Palavra de Deus, a capacidade para transmitir a Palavra de Deus deve ser a primeira qualidade de um verdadeiro Manifestante de Deus.

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Por exemplo, se somos salvos pela Palavra de Deus, então para Jesus ser o nosso Salvador Ele deve ser capaz de transmitir a Palavra de Deus. Se Jesus transmitiu a Palavra de Deus, Ele então deu-nos, aquilo que é essencial para a nossa salvação. A prova de que Ele é um Salvador é o facto de ter transmitido a Palavra de Deus através da qual as almas se salvaram. Todos estes pontos mostram-nos como a Palavra de Deus, que se expressa através da vida e ensinamentos de Cristo, foi o principal instrumento com o qual Cristo realizou a Sua missão de "salvar o povo dos seus pecados" [Mt 1:21] e trazer-nos a "vida eterna" [Jo 3:16]. Isto mostra-nos a natureza proeminente da Palavra de Deus e a sua inseparabilidade de Cristo e de qualquer verdadeiro Manifestante de Deus.

Uma vez que somos salvos através da Palavra de Deus, então qualquer pessoa que afirme ser Manifestante de Deus deve ser capaz de transmitir a Palavra de Deus. Se ouvirmos as palavras de Bahá'u'lláh, e compreendermos que elas são de facto as palavras de Deus, então elas são uma prova da divindade de Bahá'u'lláh.

Assim depreende-se um novo significado para salvação. Um Manifestante de Deus revela qualidades divinas através do Seu exemplo e ensinamentos. Estas qualidades divinas influenciam as nossas vidas, e esta mudança conduz à salvação. Assim percebemos porque é que Bahá'u'lláh apresenta "as palavras que revelou como uma prova da Sua realidade e verdade" [SEBh, LII, p. 74]

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CAP. 10 - APRESENTAR AS PROVAS

10.1 - COMO S. PAULO DAVA A CONHECER AS QUALIDADES DE CRISTO S. Paulo, o principal propagador do Cristianismo após Cristo, enfatiza grandemente o significado do sofrimento que Cristo suportou pela humanidade. Em vez de falar em milagres ou do nascimento virginal, S. Paulo fala do sacrifício de Cristo.

Enquanto os judeus pedem sinais, e os gregos buscam a sabedoria, nós pregamos Cristo crucificado, escândalo para os judeus e loucura para os gentios. Mas para os eleitos, tanto judeus como gregos, Cristo é poder e a sabedoria de Deus [I Cor 1:22-24]

Os Judeus pensavam que o poder de Deus se via em milagres, mas S. Paulo sabia que os puros de coração veriam o poder de Deus revelado no triunfo de Jesus apesar da Sua crucificação. Os gregos procuravam filosofias através das filosofias dos homens, mas S. Paulo sabia que os puros de coração veriam no sacrifício de Jesus uma sabedoria maior, uma sabedoria que conduziria ao conhecimento de realidades espirituais, o conhecimento de Deus. Assim, S. Paulo pregava a "mensagem da cruz" [I Cor 1:18]. Esta mensagem assinalava as qualidades de poder divino e sabedoria espiritual que se revelaram através do sacrifício de Jesus.

10.2 - COMO 'ABDU'L-BAHÁ DAVA A CONHECER AS QUALIDADES DIVINAS DE BAHÁ'U'LLÁH 'Abdu'l-Bahá também enfatiza o sofrimento de Bahá'u'lláh:

Se Bahá'u'lláh não estivesse incandescido de amor pela humanidade, Ele não teria aceite de boa vontade quarenta anos de encarceramento [PUP, 257] Não houve provação ou dificuldade que Ele [Bahá'u'lláh] não tivesse experimentado, e no entanto suportou tudo com o maior prazer e alegria. [PUP, 383] Bahá'u'lláh suportou quarenta anos de vicissitudes, provações e amarguras apenas para espalhar os Seus ensinamentos. [PUP, 372]

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Ele suportou estas provações, sofreu estas calamidades e dificuldades de modo a que uma manifestação do desprendimento e serviço se tornasse aparente no mundo da humanidade; que a Mais Grandiosa Paz se tornasse uma realidade [PUP, 28]

Noutras passagens, 'Abdu'l-Bahá também descreve como o amor de Bahá'u'lláh pela humanidade, patente no Seu desejo de sofrer exílios e encarceramentos por nós, exerce uma poderosa influência nos nossos corações [PUP, 146].

10.3 - A IMPORTÂNCIA DA EXPERIÊNCIA PESSOAL A nossa experiência como crentes é extremamente importante quando apresentamos a mensagem Bahá'í. 'Abdu'l-Bahá muitas vezes desafiou os que questionavam a praticabilidade dos ensinamentos de Bahá'u'lláh chamando a atenção para o facto de estes estarem em prática na vida dos crentes. Se por um lado podemos procurar provas nas Escrituras, por outro também podemos sentir essas provas, permitindo que a sua mensagem influencie as nossas vidas e praticando os ensinamentos prescritos. A medida em que podemos sentir as provas de Bahá'u'lláh depende da medida em que permitimos que a Sua mensagem influencie as nossas vidas. Este tipo de prova não se confina à Fé Bahá'í. Alguns Cristãos falam frequentemente daquilo que popularmente designam como "uma relação pessoal com Cristo". Esta relação envolve uma experiência pessoal em que a sua fé em Cristo mudou as suas vidas. Este tipo de relacionamento envolve oração e meditação, e muitos Cristãos atribuem-lhe grande importância. A maioria das pessoas poderá ver poucas razões para aceitar Bahá'u'lláh se não conseguirem ver como é que Bahá'u'lláh poderá mudar as suas vidas para melhor, ou beneficiar o mundo. Assim, quando falamos com Cristãos devemos estar preparados para explicar como é que Bahá'u'lláh está a transformar a vida das pessoas e como é que a Sua mensagem beneficiará o mundo. Para estarmos preparados para apresentar este tipo de prova temos de reflectir sobre como é que as nossas vidas seriam se não tivéssemos conhecido a Fé Bahá'í. Devemos reflectir nas mudanças espirituais que ocorreram nas nossas vidas desde que aceitámos Bahá'u'lláh. Devemos, também, reflectir sobre o que é que a mensagem de Bahá'u'lláh fez pelos outros. Não é difícil ver como Bahá'u'lláh fez tantas pessoas preocuparem-se com o sofrimento e injustiças infligidas a outras raças. Se não fosse a mensagem de Bahá'u'lláh essa preocupação nunca existiria.

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CAP. 11 - ALGUMAS QUESTÕES E POSSÍVEIS OBSTÁCULOS

11.1 - ESTAR PREPARADO PARA OBSTÁCULOS Antes de concluirmos a apresentação das provas da verdade de Bahá'u'lláh podemos deparar-nos com muitos objecções relacionadas com crenças populares cristãs. Muitos Cristãos acreditam que a maior prova da divindade de Cristo é a ressurreição; outros poderão argumentar com as doutrinas da expiação e do pecado original, enquanto que outros poderão argumentar que Cristo é superior a todos os outros Profetas e é o único que é perfeito. Quando respondermos a estes argumentos devemos mostrar que se por um lado essas doutrinas e interpretações parecem estar em contradição com o ponto de vista Bahá'í, por outro o texto bíblico não sugere contradições. (No fundo discordamos sobre aquilo que a Bíblia verdadeiramente ensina!) Vamos agora ver alguma perguntas típicas que podem surgir a respeito de profecias, milagres e doutrinas.

11.2 - QUESTÕES SOBRE PROFECIAS Pergunta: O Antigo Testamento afirma que um verdadeiro teste para Profeta é quando as Suas profecias se cumprem. As profecias de Bahá'u'lláh já se cumpriram? Se as profecias são um verdadeiro teste para um Profeta, não nos estamos a desviar dos critérios correctos ao investigarmos a Sua vida e ensinamentos, em vez de verificarmos primeiro se as profecias de Bahá'u'lláh se cumpriram? Resposta: As profecias de Bahá'u'lláh, em muitos casos, já se cumpriram e estão mencionadas, por exemplo, por Shoghi Effendi em livros como O Dia Prometido Chegou e The World Order of Bahá'u'lláh. Sobre as profecias serem um critério, o Antigo Tes-tamento afirma que se as palavras de um Profeta não se cumprirem, ele é um falso profeta. No entanto, se as palavras se cumprirem ele também pode ser um falso profeta. Por este motivo não é possível julgar Bahá'u'lláh, ou qualquer outro Profeta, com base no cumprimento das Suas profecias. No texto lê-se: "Quando o profeta anunciar em nome do Senhor, uma coisa que não acontecer, ou não se realizar, essa palavra não foi ditada pelo Senhor; o profeta falou temerariamente e, por isso, não receeis proceder contra ele" [Dt 18:22].

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Pergunta: Mas em vez de examinar a vida e ensinamentos de Bahá'u'lláh, não seria melhor apenas averiguar se Ele cumpriu ou não as profecias bíblicas? Resposta: Bahá'u'lláh, de facto, cumpriu as profecias bíblicas. Mas antes de vermos como a Sua vida se relaciona com a profecia devemos primeiramente examinar e compreender o seu significado espiritual. Devemos ter em mente que os Judeus não compreenderam que Cristo tinha cumprido as profecias porque não compreenderam o significado real da Sua posição. Este problema é apenas uma das muitas razões porque a profecia não é uma prova conclusiva. Muitas profecias, como, por exemplo, no Livro do Apocalipse, estão escritas numa forma simbólica. Como poderemos ter a certeza de que estamos a interpretar correctamente esta profecias misteriosas e complexas de maneira a poder determinar se de facto se cumpriram ou não? Mesmo entre os Cristão existem muitas divergências sobre o significado dessa profecias. Algumas profecias são impossíveis de verificar. O nascimento virginal de Jesus é um exemplo. Apesar de aceitarmos a realidade do nascimento virginal, que é o cumprimento de Isaías 7:13-14 (ver também Mt 1:23), e que nos prova que Isaías era um Profeta, nós aceitamos este facto apenas com base no testemunho das Escrituras (Novo Testamento, Alcorão e Escrituras Bahá'ís), pois de outro modo seria impossível verificar. Outra dificuldade é que as profecias apenas constituem provas circunstanciais sobre acontecimentos relacionados com os Profetas, mas não indicam quem é Profeta e quem não é.

11.3 - QUESTÕES SOBRE MILAGRES Pergunta: Na Bíblia muitos milagres são associados com os Profetas de Deus. Os Evangelhos relatam que Cristo nasceu miraculosamente, fez muitos milagres durante o Seu ministério, e ressuscitou miraculosamente. Os milagres são uma características de todos os Profetas. Assim parece claro que um verdadeiro profeta deve fazer milagres. Bahá'u'lláh também fez milagres para provar a Sua divindade? Resposta: Segundo os ensinamentos Bahá'ís todos os Profetas fazem milagres [EV, cap. XXII, p. 97-99], e de facto, uma prova de Bahá'u'lláh são os milagres que Ele fez [SWAB, pag. 16]. No entanto, Bahá'u'lláh aconselha-nos a não relatar milagres [ESW, 33]. 'Abdu'l-Bahá afirma:

.muitas coisas maravilhosas [milagres] foram feitas por Bahá'u'lláh, mas não as relatamos, porque não constituem provas e evidências para todos os povos do terra, e nem para aqueles que as vêem são provas decisivas; podem pensar que são meros encantamentos. [EV, cap. X, p. 49]

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Obviamente que é preferível que a nossa fé tenha uma base mais sólida. 'Abdu'l-Bahá assinala que não é possível considerar nenhum desses acontecimentos que nenhum de nós teve a possibilidade de testemunhar pessoalmente, como prova incontestável. Somos incapazes de provar que os milagres descritos nos Textos Sagrados são acontecimentos que contrariam as leis da natureza e não relatos simbólicos que pretendem transmitir verdades espirituais. Além disso se aceitarmos esses milagres como prova, como é que os podemos distinguir dos milagres atribuídos a outras pessoas?21 Existem pelos menos duas ocasiões em que a Bíblia nos indica que os milagres não são frutos.

1. Jesus indica que não devemos procurar ou pedir sinais (i.e. milagres) quando afirmou: "Esta geração má e adúltera exige um sinal!" [Mt 16:4]

2. Jesus adverte que a realização de milagres não se limita aos Profetas

quando disse: "Pois hão-de surgir falsos Cristos e falsos Profetas que farão grandes milagres e prodígios, a ponto de desencaminharem, se possível, até os eleitos." [Mt 24:24]

Pergunta: Isso significa que os Bahá'ís não acreditam que os milagres e as profecias constitui uma prova para estabelecer a verdade de um Profeta? Resposta: Segundo o ponto de vista Bahá'í, profecias e milagres constituem uma prova de um verdadeiro Profeta , mas não se trata de uma prova conclusiva. Problemas como a verificação da realização dos milagres e o cumprimento das profecias, fazem os milagres e as profecias pouco fidedignos. Por outro lado, os ensinamentos dos Profetas podem ser ouvidos por todos. Uma vez que os ensinamentos reflectem as perfeições divinas de Deus, e todos podem ouvir e ler os ensinamentos, os ensinamentos são a prova mais fidedigna e verificável de que um Profeta é um Manifestante de Deus. Por isso dizemos que os ensinamentos são a "maior prova". Pergunta: No livro dos actos está escrito:

Homens de Israel, escutai estas palavras: Jesus de Nazaré, Homem acreditado por Deus junto de vós, com milagres, prodígios e sinais que Deus realizou no meio de vós, por Seu intermédio como vós próprios sabeis. [Act 2:22]

Como é que os milagres podem ser recusados como prova como prova se S. Pedro os apresenta como prova? Resposta: S. Pedro fala dos milagres de Cristo no seu "meio". S. Pedro falava para uma audiência que tinha visto estes milagres, para eles estes constituíam uma prova. O texto não

21 'Abdu'l-Bahá refere-Se ao problema da distinção entre os milagres atribuídos aos Profetas pelas diferentes tradições religiosas. Ver Esplendor da Verdade, caps. X e XXII.

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sugere que nos devemos guiar exclusivamente por milagres. Muitos milagres de Cristo podem ser assumidos no sentido literal ou simbólico. A própria Bíblia sugere muitos significados simbólicos. Por exemplo, no Evangelho de S. Mateus está escrito que Jesus alimentou uma multidão apenas com sete cestos de pão [Mt 15]; no entanto, logo depois, Cristo compara o fermento do pão com as doutrinas [Mt 16:5-22]. Assim, o milagre do pão pode ser entendido como Jesus transmitindo a Palavra de Deus. A Bíblia compara Jesus com a Palavra de Deus [Jo 1:1-14] e com o "pão de Deus" [Jo 6:33]. Enquanto houver uma explicação racional e espiritual, não há motivo para insistir que houve um milagre contrário às leis da natureza. Além disso, uma vez que a maioria dos milagres são símbolos dos ensinamentos de Deus, a referência de S. Pedro a esses milagres espirituais pode ser vista como outra forma de falar dos ensinamentos.

11.4 - QUESTÕES SOBRE DOUTRINAS Pergunta: O sofrimento de Bahá'u'lláh foi mencionado como uma prova de que Ele é um Manifestante de Deus. No entanto, Cristo sofreu "uma só vez no fim dos séculos" [Heb 9:23-28] o que parece indicar que não há necessidade para surgir outro Manifestante de Deus. Por outro lado, os Cristãos não acreditam que Cristo sofra novamente quando regressar. Assim, porque é que a humanidade necessita de Bahá'u'lláh, e como é Ele pode ser o Cristo se Ele sofreu? Resposta: É verdade que Cristo Se ofereceu como um sacrifício "uma vez só no fim dos séculos". Esse sacrifício foi completamente suficiente. Segundo a Fé Bahá'í não é a insuficiência dos Profetas dos passado que provoca o surgimento de uma nova Revelação, mas sim a incompetência e teimosia da humanidade22 [22]. O facto de Bahá'u'lláh ter sofrido é mais um sinal da infalível graça de Deus para com a humanidade. Sobre a renovação da religião, 'Abdu'l-Bahá disse:

Ora consideramos: Cristo frisou repetidamente a necessidade de serem seguidos os Dez Mandamentos do Pentateuco - insistiu em que fossem mantidos. Diz um destes mandamentos: "Não adorarás gravura ou imagem". Existem hoje em algumas igrejas cristãs, muitas gravuras e imagens. Assim é claro e evidente que a Religião de Deus não mantém

22 "No Bayan o Báb afirma que todas as religiões do passado estavam destinadas a

tornarem-se universais. A única razão porque não conseguiram atingir esse objectivo foi a incompetência dos seus seguidores. Ele então continua explicando que este não seria o destino da revelação d'"Aquele que Deus tornará Manifesto", que se tornaria universal e incluiria todo o povo do mundo. Isto mostra que no fim venceremos. Mas não poderemos nós, devido aos nossos defeitos, hesitações em sacrificarmo-nos e relutância em concentrar os nossos esforços na disseminação da Causa, retardar a realização desse ideal? E que significado teria isso? Significará que seremos responsáveis perante Deus, e que a raça humana permanecerá mais tempo no seu estado de obstinação, que as guerras não terminarão tão cedo, e que o sofrimento humano durará mais tempo." (De uma carta datada de 20 de Fevereiro de 1932, escrita em nome de Shoghi Effendi à Assembleia Espiritual Nacional dos Estados Unidos e Canadá.)

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entre o povo os seus princípios originais, mas modificou-se e alterou-se até ser completamente destruida. Por este motivo, a manifestação renova-se e uma nova religião estabelece-se. Mas se as religiões não mudassem nem se alterassem não haveria necessidade de renovação. [EV, cap. XLII, p. 143]

Sobre o regresso de Cristo, a Bíblia afirma que Ele voltará para derrotar os exércitos das trevas que Lhe farão guerra [Ap. 19:19-20]. Esta profecia afirma que Cristo enfrentará oposição, mas vencerá. Interpretada literalmente temos: Cristo destrói os Seus opositores militarmente. Mas se interpretarmos estas passagens simbolicamente, podemos compreender que elas nos indicam que Ele será perseguido, sofrerá novamente, e através do Seu sacrifício sairá novamente vitorioso sobre os seus inimigos. Pergunta: Como é que o sofrimento de Bahá'u'lláh pode ser comparado à morte de Jesus na cruz? Bahá'u'lláh sofreu, mas Cristo foi crucificado! Resposta: Tanto Cristo como Bahá'u'lláh sofreram pelo mesmo motivo: "a remissão dos pecados" [EV, cap. XXX, p. 114]. A dimensão ou o tipo de sacrifício não é o factor mais importante. O que é importante são os motivos para o sofrimento e a posição do Profeta que sofre. Esta é a diferença essencial entre o sofrimento sentido pelos Profetas e os sofrimentos sentidos por outras pessoas. Tanto Cristo como Bahá'u'lláh sofreram, apesar de serem inocentes, para transformar as vidas dos povos que eram culpados de muitos pecados. Os Seus sofrimentos podem ser comparados porque em ambos são-nos reveladas qualidades divinas. Pergunta: Mesmo que Bahá'u'lláh manifeste atributos de Deus, porque é que uma pessoa deve deixar de seguir apenas Cristo, se Cristo permanece perfeito para todo o sempre? Resposta: É verdade que Cristo permanece perfeito para todo o sempre. "Jesus Cristo é sempre o mesmo ontem e hoje e por toda a eternidade" [Heb 13:8]. Voltando-nos para Bahá'u'lláh não nos estamos a afastar de Cristo, mas sim reconhecer o cumprimento das promessas e profecias de Cristo. Nunca nos afastamos de Cristo. Se Cristo regressou, é reconhecendo esse regresso que nos mantemos voltados para Cristo. Isto é de extrema importância na Fé Bahá'í.

11.5 - REFERÊNCIAS BÍBLICAS Para uma mais fácil identificação dos versículos apresentados na 3ª Parte, podemos sublinhar os seguintes versículos com um lápis ou marcador verde (significando "Critérios"). Mt 7:16-17 - Critério Mt 1:21, Jo 3:16 - Propósito de Cristo Rom 10:17, Jo 5:24 3:3, I Ped 1:23 - Significado da Palavra de Deus (i.e., o propósito

de Cristo é alcançado através da Palavra de Deus)

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Rom 10:17 - A Fé obtém-se através da Palavra de Deus Estes não são todos os versículos empregues na 3ª Parte. Devemos acrescentar aqui tanta informação bíblica quanto julgarmos necessário para as nossas apresentações.

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4ª Parte

A REVELAÇÃO PROGRESSIVA

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CAP. 12 - A UNIDADE DOS PROFETAS Os Bahá'ís acreditam que Deus enviou diferentes Profetas, ou Manifestantes, em diferentes momentos da história para transmitir à humanidade conhecimento de Deus e pré-requisitos para a salvação. O conceito de que a religião (Revelação) evolui ao longo dos tempos é referida pelos Bahá'ís como "revelação progressiva". O facto das religiões aparentemente "diferirem umas das outras deve ser atribuído aos diferentes requisitos das épocas em que foram reveladas" [ESW, 13] Hoje é possível estudar o desenvolvimento e estrutura de praticamente todas as sociedades, sejam tribais ou industriais, e é evidente que a religião é um fenómeno universal. Segundo Bahá'u'lláh:

... as múltiplas graças do Senhor de todos os seres têm envolvido, em todos os tempos, através dos Manifestantes da Sua Essência, a terra e todos os que nela habitam. [SEBh, XII, p. 23]

Além disso, Bahá'u'lláh afirma:

Nem por um momento sequer, foi a Sua graça recusada, nem as chuvas da sua amorosa generosidade cessaram de cair sobre a humanidade. [SEBh, XII, p. 23-24]

As Escrituras e tradições, tanto do Ocidente como do Oriente, descrevem aparecimentos sucessivos de homens santos, Profetas divinos e Mensageiros que trouxeram ensinamentos de Deus. A Bíblia relata as histórias de alguns desses Mensageiros, nomeadamente, Abraão, Moisés e Cristo. Os Bahá'ís acreditam que depois de Jesus, surgiram três outros Manifestantes de Deus: Maomé, o Báb e Bahá'u'lláh. O Báb escreveu:

Deus tem levantado Profetas e revelado livros tão numerosos quantas as criaturas do mundo, e continuará a fazê-lo até à eternidade. [SEBa, p. 129]

Apesar dos Cristãos reconheceram que na Bíblia há uma certa sucessão de Profetas, colocam uma série de objecções ao conceito Bahá'í de Revelação Progressiva. A maioria destas objecções relacionam-se com o conceito Bahá'í de unicidade dos Profetas (que consideram que rebaixa Cristo) e ao reconhecimento de Mensageiros como Maomé e Buda (que acreditam não ser sustentada pela Bíblia).

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12.1 - RESPOSTA AO ARGUMENTO DE QUE A REVELAÇÃO PROGRESSIVA

REBAIXA A POSIÇÃO DE CRISTO Alguns Cristãos acreditam que os ensinamentos Bahá'ís rebaixam Cristo, ao fazer d'Ele apenas um de muitos Manifestantes. Apesar de reconhecerem que há uma sucessão de Profetas na Bíblia, não consideram que Jesus é apenas mais um; Jesus surge como a personagem central da Bíblia. Por isso é natural que os Cristãos, que não reconhecem mais nenhum Profeta depois de Cristo, e Lhe atribuam uma posição mais elevada. A Fé Bahá'í não rebaixa a posição de Cristo ao reconhecer Maomé, o Báb e Bahá'u'lláh como Manifestantes posteriores. Os Bahá'ís acreditam que os Manifestantes de Deus são, por um lado, únicos individualmente, e por outro, essencialmente unos e iguais. Bahá'u'lláh escreveu:

Cada um destes Manifestantes de Deus tem uma posição dupla. Uma é a da pura abstracção e da unidade essencial. Neste respeito, se os chamares a todos por um só nome e lhes conferires o mesmo atributo, não te terás desviado da verdade. [KI, 95]

Quando falamos dos Manifestantes no contexto da Sua divindade, nenhum deles é superior aos outros porque não existe distinção: Eles são essencialmente um só. Todos transmitem a Palavra de Deus e guiam a humanidade de acordo com os Mandamentos de Deus. Se conseguimos reconhecer que Buda, Moisés e Cristo são um só, então não nos será possível colocar um acima de outro. Este é o estado. "pura abstracção e da unidade essencial" [KI, 95]. A outra posição Bahá'u'lláh designa de "posição da distinção" que "pertence ao mundo da criação" [KI, 109]. Neste aspecto, "cada um deles é reconhecido por um nome diferente, é caracterizado por um atributo especial, cumpre uma certa Missão e é-Lhe confiada uma Revelação distinta" [KI, 109]. Assim, neste aspecto podemos distinguir a Sua Revelação e os Seus ensinamentos específicos. Na literatura Bahá'í este conceito é explicado com a analogia de um espelho que reflecte a luz do sol [EV, p. 102-103, 106, 131, 142, 175]. Um Manifestante de Deus é como um espelho que reflecte a luz do sol em diferentes épocas. Podemos dizer que se trata sempre do mesmo espelho, apesar da luz e intensidade poderem parecer maiores num determinado momento do que em relação a outro. Neste aspecto, os Manifestantes são iguais, apesar de parecerem diferir. Por este motivo, o autor da Epístola aos Hebreus enaltece Jesus acima de Moisés [Heb 3:3], facto que também acontece no Alcorão [2:253], e é abordado por Bahá'u'lláh [KI 109-110]. No que respeita à influência dos Manifestantes, 'Abdu'l-Bahá indica que a de Jesus é maior que a de Moisés [PUP, 115, 345]; no entanto, do ponto de vista Bahá'í, Eles são iguais, igualmente perfeitos, ambos Mensageiros de Deus. Mesmo que nos Seus ensina-mentos haja alguns tipos de diferenças, Eles são essencialmente iguais, pois ambos transmitem a Palavra de Deus [KI, 96].

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A posição dupla dos Manifestantes pode-se ver no plano profético de Deus que nos é mostrado na Bíblia. Segundo a Bíblia, Cristo regressará. A segunda vinda de Cristo será diferente da primeira. Anunciará o início da tão esperada paz, o estabelecimento do Reino de Deus na terra, em que "todas as nações" se dirigirão para "ao Monte do Templo do Senhor" [Is 2:2]. Neste aspecto, a segunda vinda de Cristo será uma nova e maior emanação da Revelação de Deus na terra do que foi a primeira. No entanto, Cristo é ainda "o mesmo ontem e hoje e por toda a eternidade" [Heb 13:8]. O segundo aparecimento de Cristo não rebaixa o primeiro porque não se pode fazer distinção alguma entre aquilo que é, em essência, o mesmo Espírito de Deus. Nisto consiste a unidade essencial dos Manifestantes de Deus. O Báb ilustra esta verdade utilizando o sol como metáfora para os Manifestantes:

E sabe tu que Ele, em verdade, se assemelha ao sol. Ainda que o sol continue a nascer até ao fim que não tem fim, não terá havido, porém, nem haverá, mais do que um sol. [SEBa, p. 129]

Por vezes, enfatizar esta posição de "unidade essencial" nos nossos diálogos com Cristãos poderá evitar o mal-entendido de que a Fé Bahá'í rebaixa a posição de Cristo. Isto é particularmente verdade se começarmos por explicar a relação entre Cristo e Bahá'u'lláh.

* * * * *

A principal objecção dos Cristãos ao conceito de unidade dos Profetas é que acreditam que Cristo é o único Profeta que nunca pecou. Note-se que os Cristãos acreditam que Adão, Abraão e Moisés pecaram de alguma maneira. Adão é recordado por ter desobedecido a Deus; Abraão mentiu para Se proteger; e Moisés assassinou um egípcio e pôde entrar na Terra Prometida por ter desobedecido aos Mandamentos de Deus. Por este motivo, os Cristãos perguntam: como podem Adão, Abraão e Moisés ser Manifestantes de Deus que nunca pecaram? Além disso afirmam que Jesus estava livre do pecado original. Vamos examinar cada uma destas questões separadamente.

12.2 - RESPOSTA AO ARGUMENTO DE QUE ADÃO PECOU Segundo o Livro do Genesis, Adão pecou e desobedeceu a Deus. Por outro lado, o Alcorão e as Escrituras Bahá'ís mencionam o nome Adão entre os Manifestantes enviados por Deus. No entanto, segundo os ensinamentos Bahá'ís, o relato do livro do Genesis não foi uma ocorrência histórica literal; trata-se de uma descrição simbólica que pode ser interpretada de muitas maneiras [EV, cap. XXX].

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Nas Escrituras Bahá'ís o nome "Adão" é utilizado para simbolizar o primeiro Manifestante no início de um longo período da história espiritual da humanidade. Tanto quanto sabemos, nem o Alcorão, nem as Escrituras Bahá'ís, descrevem a vida e ensinamen-tos de um Manifestante chamado Adão23.

12.3 - RESPOSTA AO ARGUMENTO DE QUE ABRAÃO PECOU Para responder às acusações contra Abraão temos de examinar a Bíblia. Segundo a Bíblia, houve duas ocasiões em que Abraão se referiu à Sua esposa como sendo Sua irmã [Gen. 12:10-20, 20:1-18]. Ao fazer isto, Abraão impediu que aqueles que estavam no poder O matassem e raptassem a Sua esposa, pois ela era muito bela. Como pensavam que Sara era Sua irmã não viram necessidade em matar Abraão para a raptar. Isto protegeu Abraão, mas trouxe a ira de Deus ao Faraó e a Abimelec por terem tomado a mulher de outro homem. Sobre esta história Shoghi Effendi escreveu:

Sobre a passagem do Antigo Testamento em que se relata que Abraão se dirigiu à Sua esposa como sendo Sua irmã, não tem fundamento a interpretação dada por alguns Cristãos segundo a qual todos os Manifestantes de Deus foram pecadores. Uma explicação mais plausível seria que ao fazer isto, Abraão desejava enfatizar a superioridade da relação espiritual que O ligava à Sua esposa em relação à relação física e material. [LG, 369]

Abraão afirma "ela é filha de meu pai, mas não é filha da minha mãe" [Gen. 20:12]. Isto pode significar que ela era filha do Seu Pai Espiritual (Deus), e não da Sua mãe biológica. A sabedoria de um Profeta é frequentemente mal compreendida. Uma com-preensão literal pode parecer confusa e mesmo decepcionante se não se entender o sentido espiritual da mensagem.

12.4 - RESPOSTA AO ARGUMENTO DE QUE MOISÉS PECOU Os Cristãos acreditam que Moisés pecou por ter assassinado um egípcio e noutra ocasião por ter desobedecido a Deus. A Bíblia relata que Moisés "viu um egípcio a açoitar um dos seus irmãos hebreus" [Ex. 2:11]; então, Moisés "matou o egípcio e enterrou-o na areia" [Ex. 2:12]. "O Faraó soube do que se tinha passado, e mandou prender Moisés para O matar. Moisés, porém, conseguiu fugir do Faraó e refugiar-se na terra de Midian" [Ex. 2:15]. 23 Existem muitos escritos apócrifos antigos e lendas judaicas atribuídas a Adão, ou que pretendem relatar a sua vida. Em algumas ocasiões lendas semelhantes são citadas por Bahá'u'lláh e 'Abdu'l-Bahá, tal como o Antigo Testamento e Jesus parecem fazer referências a histórias antigas para transmitir ensinamentos. Nem sempre é possível ou importante distinguir quais destas histórias (ou partes de histórias) têm um conteúdo histórico ou se são utilizadas apenas para ilustrar uma verdade espiritual.

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Algumas pessoas interpretam este acontecimento como um pecado de Moisés. No entanto, segundo o texto, Moisés foi "reunir-se aos seus irmãos e viu os seus sofrimentos" [Ex. 2:11]. Esta passagem indica a simpatia que Moisés deve ter sentido pelos seus irmãos oprimidos que viviam como escravos no Egipto. A brutalidade dos egípcios está bem patente no facto de Moisés ter visto um egípcio a espancar um hebreu. Moisés correu um grande risco pessoal ao proteger um escravo hebreu e a matar o opressor. Tanto a intervenção de Moisés como a Sua fuga são consistentes com a Sua missão de Profeta, pois Deus protegeu Moisés desde o início [Ex. 1:22; 2:1-10] de modo a que Ele pudesse libertar os hebreus da escravidão. Deste ponto de vista, os motivos de Moisés eram puros e justos. Este incidente é um símbolo de todo o Ministério de Moisés em que Ele se dedicou à libertação dos hebreus. Mas este incidente pode ter a aparência de um assassínio. Se isto faria com que os egípcios, que eram muito ligados às suas tradições e modo de vida, rejeitassem Moisés, porque é que Deus permitiu que este incidente tivesse ocorrido? Além disso, porque é que Moisés não negou a Sua culpa, mas sim admitiu-a? [KI, 37; Alcorão 26:19] Referindo-Se aos actos de Moisés, Bahá'u'lláh insta-nos a ponderar nos nossos corações "o tumulto que Deus provocou" [KI, 37], e pergunta "Não poderia Deus, o Rei omnipotente, ter impedido a mão de Moisés de cometer o assassínio, para que não Lhe fosse atribuído um assassínio, causando perplexidade e aversão entre o povo?"[KI, 37-38] Bahá'u'lláh indica que este incidente foi um teste divino:

Como, porém, o Desígnio Divino exigiu que o verdadeiro se distinguisse do falso, e o sol da sombra, Ele, em todas as épocas, tem feito cairem sobre a humanidade, chuvas de provações, provindas do Seu reino de glória. [KI, 36]

Bahá'u'lláh explica que no tempo de Jesus, o nascimento virginal foi uma prova semelhante ordenada por Deus. Exteriormente parecia que Jesus era filho ilegítimo. Por isso, para compreender a verdade da posição de Jesus era necessário que não seguir os padrões humanos tão falíveis. O mesmo se aplica a Moisés. Os padrões egípcios tinham sido abalados por Deus, e Moisés apelava aos que podiam ver justiça no acto cometido por Ele. Quem percebesse esta justiça seria libertado. Deste modo os puros distinguiam-se dos corruptos. É fácil ver a magnitude do teste quem poderia acreditar numa pessoa que as autoridades consideravam como assassino? Bahá'u'lláh escreve:

Ainda que se levantassem miríades de vozes, ouvido algum escutaria se Nós disséssemos que a uma Criança sem pai [Cristo] fora dada a missão de Profeta, ou que um homicida tinha trazido da chama da Sarça Ardente a mensagem "Em verdade, em verdade Eu sou Deus!" [KI, 39] Assim é que tais actos e palavras são, exteriormente, o fogo da vingança para os ímpios, e interiormente, as águas da compaixão para os justos. [KI, 39]

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Os actos de Moisés e as consequentes acusações de homicídio, foram, portanto, um teste para que os puros de coração, aquele que podiam compreender a posição de Moisés como Profeta, se distinguissem dos opositores. Estes acontecimentos sucederam para que "o verdadeiro se distinguisse do falso".[KI, 36]

* * * * * * * *

O segundo incidente que os Cristãos consideram um acto de desobediência por parte de Moisés (e devido ao qual, afirmam, Moisés não entrou na Terra Prometida) relaciona-se com a água de Meriba. Na Bíblia está escrito:

Nesse lugar, que está nas fronteiras da terra de Edom, o Senhor disse a Moisés e Araão: "Araão vai reunir-se aos seus porque Ele não entrará na terra que destino aos filhos de Israel, visto terdes sido rebeldes à Minha ordem nas águas de Meriba". [Num 20:23-24]

Similarmente, este ponto é reiterado por Deus a Moisés no Deuteronómio. Moisés verá a Terra Prometida mas não entrará nela:

Porque pecaste contra Mim no meio do filhos de Israel, por ocasião das Águas de Meriba, em Cades, no deserto de Sin, não Me santificando no meio dos filhos de Israel. Somente verás, de longe, a terra que darei aos israelitas, mas não entrarás nela. [Dt 32:51-52]

'Abdu'l-Bahá explica que as repreensões dirigidas por Deus aos Profetas, são, na verdade, repreensões dirigidas ao povo:

Todos os discursos divinos contendo repreensões, embora aparentemente dirigidos aos Profetas, são na verdade dirigidos ao povo, através de uma sabedoria que é misericórdia absoluta, de modo que o povo não se desencoraje nem desanime. Assim, parecem ser dirigidos aos Profetas; mas apesar de exteriormente serem para os Profetas, em verdade, são para o povo, e não para os Profetas. [Cf. EV, cap. XLIV, p. 144]

'Abdu'l-Bahá faz ainda a analogia do Profeta com um Rei. Tudo o que um Rei afirme é visto como uma afirmação do povo que ele representa.

Do igual modo, todo o Profeta é a expressão do povo inteiro. Portanto, as promessas e discursos que Deus lhe dirige, são dirigidas a todos. Geralmente, a linguagem da reprovação é muito severa para o povo, e destroçar-lhe-ia o coração. [Cf. EV, cap. XLIV, p. 144-145]

Assim, segundo este ponto de vista, as Escrituras não mostram qualquer pecado da parte de Moisés. Mas devemos examinar cuidadosamente o episódio das águas de Meriba, de modo a podermos compreender a validade da explicação apresentada por 'Abdu'l-Bahá.

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Segundo a Bíblia, Moisés conduziu o povo de Israel para fora do Egipto, e posteriormente acamparam num local chamado Refidim. Porque "não encontraram água para beber" [Ex. 17:1] o povo começou a criticar Moisés:

Mas o povo que lá estava, excitado pela sede que os queimava e sem água para beber, murmurava contra Moisés e dizia: "Porque nos persuadiste a sair do Egipto? Para morrermos de sede com os nossos filhos e rebanhos?" Então Moisés, dirigiu esta súplica ao Senhor: "Que hei-de fazer a este povo? Dentro em pouco irão apedrejar-me". O Senhor respondeu a Moisés: "Coloca-te à frente do povo e leva contigo alguns anciãos de Israel, segura na tua mão a vara que feriste o rio, e caminha. Eu estarei diante de ti sobre o rochedo de Horeb. Baterás no rochedo e dele jorrará água: então, o povo poderá beber". Moisés assim fez na presença dos anciãos de Israel. Deu a esse lugar o nome de Massa [literalmente: tentação] e Meriba [literalmente: desavença], devido à altercação dos filhos de Israel e por terem provocado o Senhor, dizendo: "O Senhor está ou não no meio de nós?" [Ex. 17:3-7]

Segundo este relato, Moisés seguiu o mandamento de Deus, e não foi Ele, mas o povo de Israel que ofendeu e desacreditou no Senhor. Um episódio semelhante decorreu em Cades:

Tomou Moisés a vara que estava diante do Senhor, como Ele lhe tinha dito. Em seguida, Moisés e Araão convocaram a assembleia diante do rochedo e Moisés disse-lhes: "Ouvi, rebeldes. Acaso faremos nós brotar água deste rochedo?" Moisés levantou a mão e feriu o rochedo duas vezes; as águas jorraram em abundância, de sorte que bebeu o povo e os animais. Depois o Senhor disse a Moisés e Araão: "Porque não tivestes confiança em Mim e não glorificastes a Minha santidade aos olhos dos israelitas, não introduzireis esta assembleia na terra que lhes destino". Estas são as águas de Meriba onde os israelitas discutiram com o Senhor, que manifestou entre eles a Sua santidade. [Num 20:9-13]

Mais uma vez se vê que foram os filhos de Israel que "discutiram com o Senhor", enquanto que Moisés nunca deixou de ter fé, nunca Se revoltou nem deixou de obedecer às ordens de Deus. Eis mais um testemunho de Moisés:

Entretanto dirigi ao Senhor esta prece: Eterno Senhor! Já mostraste ao Teu servo a Tua grandeza, e a força do teu braço; quem, nos céus ou na terra, poderá imitar as Tuas obras e as Tuas maravilhas? Ah! se pudesse, também atravessar e ver esse ditoso país que está do outro lado do Jordão, essa bela montanha e o Líbano! Mas o Senhor irritado comigo por vossa causa e não me atendeu; e o Senhor disse: "Basta! Não me fales mais a esse respeito". [Dt 3:23-26]

Note-se que Moisés diz "o Senhor irritado comigo por vossa causa". Tal como todos os Profetas, Moisés deve sofrer para bem do povo, e mesmo suportar o castigo que o povo merecia. 'Abdu'l-Bahá explica:

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Em suma: as afirmações em forma de repreensão contidas nos Livros Sagrados, apesar de aparentemente dirigidas aos Profetas - isto é, aos Manifestantes de Deus - na verdade são destinadas ao povo. Isto tornar-se-á claro e evidente para todos vós quando examinardes diligentemente os Livros Sagrados. [EV, cap. XLIV, p. 147]

Assim, segundo este ponto de vista, Moisés não pecou. Alguns Cristãos interpretam incorrectamente o texto e sugerem que Moisés não acreditou que Deus faria sair água do rochedo porque o povo não merecia. Por este motivo, pensam que Moisés pecou ao desobedecer a Deus.

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CAP. 13 - SUGESTÕES PARA ABORDAR A REVELAÇÃO PROGRESSIVA

13.1 - COMO ADAPTAR O CONCEITO BAHA'Í DE REVELAÇÃO PROGRESSIVA A UMA AUDIÊNCIA CRISTÃ Quando apresentamos os ensinamentos Bahá'ís sobre revelação progressiva, é importante ter em conta se a terminologia que utilizamos pode ser, ou não, mal entendida por uma determinada audiência. Podemos dizer que Deus enviou diferentes Profetas em diferentes momentos da história para guiar a humanidade. E podemos apresentar exemplos: Adão, Noé, Krishna, Abraão, Moisés, Buda, Jesus Cristo, Maomé, o Báb e Bahá'u'lláh. Alguns Cristãos poderão reagir mal por ver Cristo referido como apenas um Profeta entre outros Profetas; outros poderão questionar se Buda ou Krishna eram Profetas, pois a Bíblia não os refere. Uma abordagem alternativa será: "Os Bahá'ís acreditam que Deus sempre guiou a humanidade ao longo da história. Por exemplo, Deus enviou os Profetas Abraão, e Moisés, e depois Jesus Cristo - o Filho de Deus - e depois Maomé - o Profeta - e agora enviou o Báb e Bahá'u'lláh". Esta abordagem também levantará muitas questões, mas por não referirmos Cristo como sendo um "Profeta" evitaremos muitos mal entendidos e objecções. Se os Cristãos perceberem que os Bahá'ís defendem a posição de Cristo conforme exposto na Bíblia, então estarão mais inclinados a fazer perguntas para determinar a verdade de Maomé, do Báb e de Bahá'u'lláh. Maomé pode ser apresentado no contexto da profecia bíblica, mais especificamente [Ap. 11:3]. Este versículo é um bom ponto de partida pois 'Abdu'l-Bahá indica-nos que pode ser imediatamente ligado com o início da era Bahá'í [EV, caps. X- XI] O nosso objectivo é, por um lado evitar afirmações que conduzam a mal entendidos, e por outro, guiar a conversa para aspectos que chamem a atenção e sirvam de apoio às verdades do Báb, de Bahá'u'lláh e de outros Manifestantes. Explicações mais detalhadas sobre a relação de Cristo com outros Profetas poderão surgir mais tarde, quando tivermos estabelecido uma base comum de entendimento. Também não devemos falar de Bahá'u'lláh de um modo que dê a entender que Ele é superior a Cristo, criando assim uma falsa impressão que estamos a negar a soberania de Cristo. Devemos, antes, enfatizar que são ambos o mesmo Espírito e Realidade Divina; devemos centrar-nos no aspecto da Sua unidade essencial.

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Outro aspecto importante é referir os Manifestantes como "Profetas" e Jesus como "Filho de Deus". Isto é uma maneira de apresentar a revelação progressiva utilizando terminologia bíblica que é compreensível para os Cristãos. Referir Buda entre Moisés e Cristo poderá parecer muito estranho aos Cristãos. Para ilustrar a revelação progressiva será sempre melhor utilizar exemplos da Bíblia. Note-se que Bahá'u'lláh não menciona especificamente nenhum Manifestante Oriental no Kitáb-i-Íqán. O destinatário era um muçulmano, e por isso Bahá'u'lláh falava do modo que pudesse ser melhor compreendido por ele. Existem certas coisas que devemos evitar dizer e outras que vale a pena enfatizar:

Devemos apresentar Cristo de um modo que reflicta a linguagem

bíblica. É verdade que Jesus Se refere a Si próprio como um Profeta, mas como vimos existem diferentes significados para a palavra "Profeta", e os Cristãos acreditam que Jesus era mais que um Profeta. A própria Bíblia diz que João Baptista era mais que um Profeta [Mt: 11:9]. Por este motivo será melhor usar termos como "Filho" ou "Filho de Deus" [Mc 1:1].

Devemos evitar mencionar certos detalhes muito cedo nas nossas conversas, como por exemplo, referências a Manifestantes como Buda ou Zoroastro.

* * * * * * * * * *

Bahá'u'lláh insta-nos a "ensinar o povo com completa sabedoria" [EB, 24]. Será natural pensarmos que, entre outras as coisas, por vezes nem sempre será prudente dizermos tudo o que sabemos. E aquilo que dizemos deve ser dito de uma maneira -cuidadosa. Podemos ver este exemplo no Evangelho. Logo depois de S. Pedro reconhecer que Jesus era o Cristo, o Evangelho relata-nos que Jesus "ordenou-lhes, então, que não dissessem isto a ninguém" [Mc 8:27-30]. Claramente, nem todas as pessoas estavam preparadas para ouvir as boas novas.

13.2 - ANALOGIAS BÍBLICAS PARA DEMONSTRAR QUE AS RELIGIÕES MUNDIAIS NÃO SÃO IRRECONCILIAVELMENTE DIFERENTES Alguns Cristãos opoem-se ao conceito Bahá'í de revelação progressiva devido à diversidade de crenças que existem nas religiões mundiais. Como poderão as religiões Judaica, Cristã, Hinduista e Budista vir do mesmo Deus? Como é que podem todas ensinar a mesma verdade espiritual, se, de facto, os adeptos destas religiões discordam profundamente, e acreditam em coisas diferentes? Uma comparação superficial das religiões mundiais parece mostrar-nos diferenças irreconciliáveis. Vamos ver como podemos responder a estes argumentos.

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As tradições Cristã e Judaica apresentam um bom exemplo para ilustrar o ponto de vista Bahá'í. Por um lado os Judeus acreditam que há um só Deus, por outro os Cristãos defendem a Trindade, doutrina que os Judeus rejeitam. Como podem estas religiões provir do mesmo Deus e ensinar coisas diferentes? Segundo os Cristãos, Deus existem simultaneamente em três pessoas: Pai, Filho e Espírito Santo. Para algumas pessoas esta pluralidade poderá parecer uma forma de politeísmo. No entanto, os Cristãos negam praticar qualquer forma de politeísmo. O Hinduísmo tem muitos deuses e é frequentemente considerado como uma religião politeísta. No entanto, nem todos os hindus acreditam que esta pluralidade seja um sinal de politeísmo. O grande filósofo hindu Rammahan Roy (1772-1833) defendeu que segundo as escrituras hindus - os Vedas - Deus é só um. Rammahan Roy acreditava que o Hinduísmo tinha sido destorcido ao longo dos séculos, mas que na sua forma original era uma religião monoteísta24. Segundo alguns pontos de vista, os Cristianismo e o Hinduísmo podem ser vistos com contrários a um monoteísmo estrito. Mas tanto Cristãos como Hindus afirmam que a sua religião é essencialmente monoteísta. Assim, a acusação de que o Hinduísmo é falso porque é politeísta não tem em consideração as convicções de alguns Hindus que se consideram monoteístas. Obviamente que julgar outra religião não é tarefa fácil, uma vez que nenhuma religião pode ser interpretada de um modo único. Similarmente, alguns Cristãos negam a origem divina do Budismo, dizendo que Buda ensinou que não havia Deus. Mas segundo as Escrituras Budistas, Buda preferiu não abordar o assunto, e desejou enfatizar outros ensinamentos. Apesar disso, existem excertos dos discursos de Buda que atestam a existência de um Criador que parece compatível com o conceito de Deus transmitido pela Bíblia25. O facto de Buda não enfatizar o assunto, não indica ateísmo ou mesmo falta de importância. Por outro lado, será presunçoso da nossa parte tentar julgar a sabedoria da atitude de Buda. Isto pode ser ilustrado com uma comparação com o Judaísmo. Moisés nunca fez nenhuma referência directa ou específica à vida depois da morte, mas isto não significa que isso não seja importante. Uma vez que o Antigo Testamento é a Palavra de Deus - facto reconhecido pelo maioria dos Cristãos - deve-se reconhecer que há alguma sabedoria na omissão de ensinamentos claros a respeito da vida depois da morte. Este exemplo do Antigo Testamento sugere que não nos é possível, devido às nossas limitações, julgar porque é que Buda deu mais ênfase a uns ensinamentos e não a outros. As comparações entre o Judaísmo e o Cristianismo apresentam argumentos persuasivos de que as religiões podem aparentemente contradizerem-se, e, no entanto, serem inspiradas pelo mesmo Deus. Esta aparente contradição não resulta das Escrituras mas das diferentes interpretações que são dadas às Escrituras. Os Cristãos que rejeitam a unidade das religiões com base nestas diferenças aparentes ficam assim perante um dilema. Os Cristãos reconhecem o Antigo Testamento, mas acreditam na Trindade, na Encarnação e na vida depois da morte, enquanto que os Judeus também reconhecem o Antigo Testamento mas rejeitam a Trindade, a Encarnação e 24 Citado em The Hindu Tradition, pag. 282-288 25 Three Ways of Asian Wisdom, pag. 94

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têm dúvidas sobre a vida depois da morte. Como é que estas diferenças podem existir se as duas religiões provêm do mesmo Deus? A resposta a esta pergunta é a resposta a todas as outras perguntas. A verdade é só uma, apesar disso nem sempre ser aparente. Cristãos, Judeus, Hindus e Budistas diferem uns dos outros e entre si próprios. Mas essas diferenças não constituem um argumento conclusivo contra a unicidade da religião. Na verdade, essas diferenças podem ser atribuídas a duas causas:

1. As diferentes necessidades de cada época [ESW, 13] 2. A evolução das práticas e interpretações que obscureceram os

ensinamentos originais [EV, p. 143-144] A verdade da revelação progressiva e a validade das grandes religiões mundiais são aspectos que alguns Cristãos não aceitarão sem um estudo mais detalhado. Esse estudo será demorado, e está para além do âmbito deste documento. Vamos apenas recordar dois dos principais argumentos a favor da revelação progressiva. Primeiro, do ponto de vista teológico pode-se argumentar que os atributos de Deus, tais como, graça omnipresente, imparcialidade, justiça, amor e compaixão, apoiam a crença de que Deus Se revelou a todos os povos. Segundo, as Escrituras atestam o facto de um sucessão de Profetas e santos terem guiado a humanidade ao longo dos tempos. Esse testemunho encontra-se nas Escrituras do Oriente e do Ocidente.

13.3 - REFERÊNCIAS BÍBLICAS Seguidamente indicam-se os mais importantes versículos da Bíblia em que nos podemos basear para apresentar a Revelação Progressiva e o conceito de que todos os Manifestantes nunca pecaram. De acordo com os nossos critérios estes versículos devem ser sublinhados com um marcador ou lápis amarelo. Defesa de Abraão: Gen. 12:10-20; 20:1-18 Defesa de Moisés: Ex. 2:11-15; 1:22; 2:1-10 Num 20:23 Dt 32:51-54 Ex. 17:1, 3-7 Num 20:9-13 Dt 3:23-26

13.4 - SUGESTÕES DE LEITURA Existem muitos livros disponíveis que examinam e comparam as grandes religiões mundiais. Alguns autores desses livros não defendem nenhuma religião em particular; outros, porém, analisam as diferentes religiões segundo o seu próprio ponto de vista

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religioso. As sugestões de leitura aqui apresentadas têm uma importância especial para compreendermos como é que os Cristãos vêm as outras religiões. Christianity and World Religions, de Hans Küng, é particularmente útil no estudo de religiões comparadas. Küng é um teólogo Católico muito conhecido que tem dado grandes contribuições para o movimento ecuménico global. Este seu livro inclui, entre outras coisas, uma descrição sistemática de como Maomé possuía as características de um Profeta semelhante aos Profetas do Antigo Testamento. Este tipo de comentários raramente é observado por parte dos Cristãos. Apesar de limitado pelo seu ponto de vista cristão, o seu livro contém muitas observações que nos podem ajudar nos nossos diálogos com Cristãos. Jesus in the Qu'rán, de Geoffrey Parrinder, levanta algumas das barreiras que tem impedido os Cristãos de apreciar Maomé e o Alcorão. Parrinder é professor de Religiões Comparadas na Universidade de Londres. Avatar and Incarnation, também de Geoffrey Parrinder, apresenta-nos uma interessante comparação entre algumas doutrinas Hindus e Cristãs. Os livros de pessoas como Hans Küng e Geoffrey Parrinder fornecem-nos informações que permitem apoiar o ponto de vista Bahá'í. Para compreender e estar preparado para os argumentos mais frequentes dos Cristãos contra o ponto de vista Bahá'í, temos livros de Cristãos conservadores, como Understanding Non-Christian Religions, de Josh McDowell e Don Stewart. Este livro tenta explicar de maneira muito simples os ensinamentos das principais grandes religiões e porque é que, de acordo com os autores, são incompatíveis com o Cristianismo. Outro livro interessante é The Islam Debate, de Josh McDowell e John Gilchrist. Também não advoga uma posição compatível com os ensinamentos Bahá'ís, mas mostram-nos argumentos o objecções que poderemos encontrar com alguma frequência.

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5ª Parte

CONCLUSÃO

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CAP. 14. - RESUMO E CONCLUSÃO

14.1 - UM BREVE RESUMO Na introdução deste documento salientou-se que Bahá'u'lláh nos incitou a conviver "com os seguidores de todas as religiões em espírito amistoso e fraternal"[EB, 30]. O nosso objectivo não deve ser apenas responder às questões dos Cristãos e explicar os pontos de vista Bahá'ís, mas também fazer isso de modo a estabelecer e manter um "espírito amistoso e fraternal". A base mais firme sobre a qual se pode construir este espírito amistoso e fraternal com os Cristãos é o facto da Fé Bahá'í aceitar a Bíblia como Palavra de Deus. Esta aceitação também é importante por que a Bíblia é parte integrante da herança da Fé Bahá'í e parte da "indivisível"[WOB, 114] religião de Deus. Depois de estabelecer este espírito de amizade, podemos utilizar os critérios bíblicos nos nossos diálogos. Devemos ter em mente que a informação apresentada neste documento é apenas uma introdução, e que devemos continuar a nossa aprendizagem à medida que falamos com os Cristãos. Se nos encontrarmos numa situação em que um Cristão não esteja receptivo aos ensinamentos Bahá'ís, isso pode ser sempre uma oportunidade para perguntar e aprender mais sobre as crenças cristãs e a Bíblia. Quanto mais soubermos melhor preparados estaremos no futuro para ensinar a Fé Bahá'í.

14.2 - ASPECTOS IMPORTANTES QUE APERFEIÇOARÃO A NOSSO MODO DE APRESENTAÇÃO Se temos provas que apoiam as nossas conclusões, também é importante termos argumentos convincentes. A nossa familiaridade com as provas também ajudará a fortificar a nossa fé. Quanto mais sólida for a base da nossa fé, maior será a confiança que teremos quando enfrentarmos questões difíceis e desafiadoras. Numa carta escrita em seu nome, Shoghi Effendi afirmou:

O instrutor Bahá'í deve ser a personificação da confiança. Nisto está a sua força e o segredo do seu sucesso. Embora estejais sós, e por maior que seja a apatia do povo ao vosso redor, deveis ter fé que as hostes do Reino estão do vosso lado. [Cf. IE, nº51, p.36]

Deste modo, o conhecimento e confiança adquirido através do nosso estudo das Escrituras tem uma grande influência na nossa capacidade de conduzir diálogos com

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sucesso. Por outro lado, é importante salientar que devemos ter tacto e moderação. É possível ter as respostas correctas e, no entanto, não ser persuasivo devido ao modo incorrecto de apresentação. 'Abdu'l-Bahá deu-nos o seguinte conselho:

De acordo com os ensinamentos divinos, nesta gloriosa dispensação não devemos rebaixar ninguém, e chamar-lhe ignorante, dizendo: "Tu não sabes, mas eu sei". Antes, devemos olhar os outros com respeito, e quando tentarmos explicar ou demonstrar, devemos falar como se estivéssemos a investigar a verdade, dizendo: "Isto é o que temos perante nós. Vamos investigar e determinar onde, e em que forma, se encontra a verdade". O professor não se deve considerar como erudito e aos outros como ignorante. Uma tal ideia pro-voca o orgulho, e o orgulho não é conducente à influência. O professor não se deve ver com qualquer espécie de superioridade; deve falar com a maior gentileza e humildade, pois essa forma de falar exerce influência e educa as almas. [SWAB, 30]

Ao expressar abertamente o nosso desejo em examinar os factos importantes de ambos os lados, colocamos o nosso diálogo num contexto de investigação mútua e de partilha de informação. 'Abdu'l-Bahá diz que devemos "expor argumentos claros"[SWAB, 268], mas devemos evitar contendas ou diálogos quentes:

Não disputes com pessoa alguma e guarda-te de disputas. Fala a verdade. Se o teu ouvinte aceitar, ter-se-á atingido o objectivo. Se ele for obstinado, deveis deixá-lo entregue a si próprio e por a vossa confiança em Deus. Essa é a qualidade dos que são firmes no Convénio. [Cf. IE, nº29, p. 24]

Se compreendermos que os nossos argumentos não estão a ser bem recebidos, se, por exemplo, não nos deixam expressar o nosso ponto de vista sem sermos interrompidos, então devemos tentar mudar o espírito da discussão. Para isso, pode ser necessário que tenhamos de deixar falar a(s) outra(s) pessoa(s) durante longos períodos de tempo de modo que possa(m) sentir que disse tudo o que é relevante para o seu ponto de vista. Podemos mesmo ficar sem tempo para falarmos sobre o nosso ponto de vista. No entanto, é melhor mostrar um espírito de abertura e tolerância perante as opiniões dos outros do que discutir sobre um qualquer assunto, por muito importante que este seja. Mostrando um verdadeiro interesse, colocando questões sempre que possível, e estando sempre pronto para receber todas as explicações, estamos a mostrar que as nossas convicções têm uma base sólida. De outro modo, alguns Cristãos poderão pensar que apenas somos Bahá'ís porque não ouvimos ou não compreendemos os motivos porque eles são Cristãos. Se um Cristão sentir que nós ouvimos o seu ponto de vista, então é provável que ele também fique mais inclinado a ouvir o ponto de vista Bahá'í (pelo menos, para descobrir porque é que nos mantemos firmes nas nossas convicções!). Além disso, ao permitirmos que um Cristão fale muito, poderemos compreender melhor as suas convicções, e preparar-nos melhor para responder às suas preocupações particulares. É frequente as pessoas falarem com facilidade até ao momento em que são desafiadas com perguntas difíceis ou assuntos polémicos. A incapacidade para apresentar boas respostas é frustrante e pode ser embaraçante. Estes sentimentos podem deixar-nos muito arreliados e sem vontade de prosseguir o nosso diálogo sobre o assunto em causa. Por esta e outras razões, o conselho de 'Abdu'l-Bahá, para mantermos o diálogo num espírito de investigação mútua da verdade, não pode deixar de ser recordado.

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Se soubermos bem as provas da Fé Bahá'í, será mais fácil mantermos o diálogo de um modo positivo e amigável. Se, por exemplo, se um certo assunto parece ser causador de algum desconforto, talvez seja melhor enfatizarmos áreas de acordo, como o facto de a Fé Bahá'í aceitar a Bíblia e Jesus Cristo. Também é importante terminar um diálogo afirmando os pontos em que estamos de acordo. Se uma pessoa não estiver receptiva, Bahá'u'lláh diz-nos que isso não deve comprometer o nosso modo digno de apresentação:

Se estiverdes cientes de uma certa verdade, se possuirdes uma jóia da qual os outros estão privados, reparti-a com eles numa linguagem da maior bondade e benevolência. Se for aceite, sendo assim realizado o seu propósito, tereis atingido o vosso objectivo. Se alguém a recusar, deixai-o a sós e suplicai a Deus que o guie. Uma língua bondosa é o imã que atrai os corações dos homens. É o pão do espírito, veste as palavras de significado, é a fonte da luz da sabedoria e compreensão... [SEBh, CXXXII, p. 181]

Nem sempre é fácil manter a atitude que Bahá'u'lláh descreve. O nosso desejo entusiástico de partilhar aquilo que está mais próximo dos nossos corações pode levar à impaciência e a um zelo excessivo. Poderá ser útil para os nossos esforços seguir o conselho de Bahá'u'lláh que, a falta de desprendimento e de moderação nas nossa palavras podem derrotar as nossas intenções:

A moderação é, em verdade, altamente desejável. Toda a pessoa que em alguma medida volve em torno da verdade, poderá compreender por si própria, posteriormente, aquilo que busca. Se, porém, de início for pronunciada uma palavra além da sua capacidade, recusará ouvi-la e levantar-se-á em oposição. [IE, nº3, p. 13]

Isto, naturalmente, levanta a questão: como é que sabemos qual é a capacidade da nossa audiência? Não existe uma resposta simples para esta questão. Compete a cada um de nós julgar, em cada situação, quais as capacidades e necessidades do(s) nosso(s) ouvinte(s). No entanto, podemos ter em conta os seguintes tópicos:

Primeiro: evitar arrastar o diálogo de modo a tentar abordar todos os assuntos.

Segundo: dar respostas breves que estejam à altura do ouvinte e lhe permitam pensar sobre o que foi dito.

Terceiro: se for necessário dar uma resposta mais elaborada (tal como uma explicação detalhada da Ressurreição) esta deve ser apresentada, mas deve-se evitar abordar outros assuntos. Um tema complexo é, geralmente, suficiente para um diálogo. Podemos oferecer-nos para ter outro diálogo noutra ocasião.

Os encontros com Cristãos são excelentes oportunidades para partilhar os ensinamentos de Bahá'u'lláh e aprender mais sobre a Bíblia e as crenças cristãs. Bahá'u'lláh afirma-nos que o nosso objectivo não é derrotar adversários com argumentos, mas sim, conquistar a sua amizade e compreensão:

Os que estão dotados de sinceridade e fidelidade devem associar-se com todos os povos e raças da terra, jubilosa e radiantemente, uma vez que a harmoniosa associação com as pessoas tem promovido, e continuará a promover unidade e concórdia, as quais por sua vez, conduzem à manutenção da ordem no mundo e à regeneração das raças. Bem-

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aventurados aqueles que se seguram à corda da benevolência e da terna misericórdia e estão livres de animosidade e ódio. [EB, 44]

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CHAVE DE SIGLAS E ABREVIATURAS SCKA - Sinopse e Codificação das Leis e Determinações do Kitáb-i-Aqdas. Rio de

Janeiro, Editora Bahá'í do Brasil, 1985. SEBh - Seleção dos Escritos de Bahá'u'lláh. Rio de Janeiro, Editora Bahá'í do Brasil, 1977. SEBa - Seleção dos Escritos do Báb. Rio de Janeiro, Editora Bahá'í do Brasil, 1978. KI - Kitáb-i-Iqan (O Livro da Certeza). 2ª Ed. Rio de Janeiro, Editora Bahá'í do Brasil,

1977. EB - Epístolas de Bahá'u'lláh Reveladas após o Kitáb-i-Aqdas. Rio de Janeiro, Editora

Bahá'í do Brasil, 1983. ESW - Epistle to the Son of the Wolf. 3ª Ed. Wilmette, Bahá'í Publishing Trust, 1976. SWAB - Selections from the Writings of 'Abdu'l-Bahá. Haifa, Bahá'í World Centre, 1978. PUP - Promulgation of Universal Peace: Talks Delivered by 'Abdu'l-Bahá During His

Visit to the United States and Canada in 1912. Wilmette, Bahá'í Publishing Trust, 1982.

EV - O Esplendor da Verdade (Respostas a Algumas Perguntas). 4ª Ed. Rio de Janeiro,

Editora Bahá'í do Brasil, 1979. PP - Palestras de 'Abdu'l-Bahá; Paris 1911. Rio de Janeiro, Editora Bahá'í do Brasil, 1979. WOB - World Order of Bahá'u'lláh: Selected Letters from Shoghi Effendi. 2ª Ed.

Wilmette. Bahá'í Publishing Trust, 1974. LG - Lights of Guidance: A Bahá'í Reference File. Nova Dehli, Bahá'í Publishing Trust,

1983. (comp. Helen Hornby). IE - O Indivíduo e o Ensino: Levantando o Chamado Divino. Rio de Janeiro, Editora

Bahá'í do Brasil, 1981. (Com. Dep. Pesquisa da Casa Universal de Justiça).

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ANEXOS

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ANEXO 1 - A RESSURREIÇÃO DE CRISTO por Stephen Lambden e Moojan Momen (publicado no Bahá'í Journal do Reino Unido, em Julho de 1989)

"E se Cristo não ressuscitou, logo é vã a nossa pregação, e também é vã a vossa fé." (I Coríntios 15:14)

A doutrina da ressurreição de Cristo encontra-se no próprio cerne do Novo Testamento e da Cristandade. A fé do Cristão frequentemente roda em torno da afirmação desta verdade. O seu significado está relacionado com as mais profundas convicções do crente Cristão. Os Bahá'ís devem tentar compreender e reconhecer a importância desta doutrina (I Cor 15:14). Com grande paciência devemos tentar ajudar os Cristãos na sua compreensão dos diferentes níveis de significado e sentido espiritual. Como Bahá'ís acreditamos, evidentemente, na ressurreição de Jesus, apesar de não a interpretarmos no seu sentido literal ou corpóreo. Confessamos a verdade da ressurreição de Jesus e maravilhamo-nos com a sua importância espiritual. A primeira coisa importante que se deve dizer sobre as narrativas dos Evangelhos sobre a ressurreição (ver Mt 27:57ss; Mc 15:42ss; Lc 23:54ss; Jo 19:38ss;) é que nenhuma descreve o acontecimento da ressurreição de Jesus directamente, nem dá um relato global consistente dos acontecimentos que levaram à ressurreição da fé entre os discípulos de Jesus. O moderno teólogo católico, Hans Küng, escreveu sobre esta natureza contraditória e confusa do Novo Testamento, as palavras que se seguem:

"As dificuldades não foram inventadas por teólogos críticos, tal como alguns críticos ingénuos, e por vezes maliciosos, da moderna teologia frequentemente pensam. Estas encontram-se não apenas no próprio assunto, mas também, e mais exactamente, nos relatos, na documentação original, do acontecimento".26

O Cristão médio nem sempre compreende até que ponto as narrativas da ressurreição "estão cercadas de dificuldades". Separando os vários relatos do Evangelhos (ou consultando um resumo) e comparando-os cuidadosamente que as dificuldades se tornam obvias. H.J. Richards ilustrou esses problemas ao formular uma série de questões:

26 COLLINS, Eternal life?, s.d., s.l., 1984, pag. 125.

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"Quando, exactamente, teve lugar o funeral de Jesus? (João diz que o corpo ficou preparado na Sexta-feira à noite; Lucas afirma que as especiarias ficaram prontas ao anoitecer de Sexta-feira; Marcos diz que estes não foram trazidos antes do anoitecer de sábado) Como é que o corpo foi enterrado? (selado e guardado de acordo com Mateus; por embalsamar e não-selado segundo Marcos e Lucas)

Em que momento do Domingo é que a primeira testemunha foi ao túmulo? (João diz que ainda era escuro; em Mateus e Lucas era a alvorada; em Marcos foi depois do nascer do sol) Quem eram estas duas testemunhas? (as duas Marias, segundo Mateus; com Salomé, de acordo com Marcos; com Joana e outras segundo Lucas; apenas Maria Madalena de acordo com João, apesar dela falar no plural) Elas viram a pedra ser removida (Mateus) ou quando chegaram isto já tinha acontecido (Lucas, Marcos, João)?

O que é que elas viram ali? Um anjo (Mateus, Marcos) ou dois (Lucas, João)? No exterior do túmulo (Mateus) ou no interior (Marcos, Lucas, João)? Como é que estes anjos não eram visíveis quando o túmulo foi visitado ao mesmo tempo por Pedro (Lucas) e João (João)? As mulheres entraram no túmulo antes de ouvirem a mensagem do anjo (Marcos, Lucas) ou depois (Mateus)? Qual era a mensagem que elas tinham de entregar aos discípulos - que o Jesus ressuscitado iria, muito em breve, aparecer perante eles (Lucas, João), ou apenas mais tarde, na Galileia (Mateus, Marcos)? Com estas notícias eles ficaram cheios de medo e não disseram a ninguém (Marcos) ou ficaram cheios de alegria e disseram imediatamente a todos os discípulos (Mateus, Lucas, João)?"27

As contradições do Novo Testamento sobre a ressurreição levaram os estudiosos a tentar reconstruir as fases de desenvolvimento da tradição da ressurreição evidente nos cânones Novo Testamento e para além deste. Várias tradições cristãs foram utilizadas de um modo único por cada um dos autores dos quatro Evangelhos, apesar dos autores dos Evangelhos sinópticos (Mateus, Marcos e Lucas), em grande medida, basearem os seus relatos nas tradições contidas no Evangelhos de Marcos, que foi o primeiro Evangelho existente. A convicção essencial de que Cristo não havia sido aniquilado na morte mas que permanecia uma Realidade viva, foi exposta na linguagem da ressurreição. As narrativas da ressurreição tornaram-se crescentemente expressivas de um ressurreição física de Jesus, que era entendida literalmente, e mesmo em termos de corpo físico, em vez do "corpo" místico de Jesus, que é a Igreja. O verdadeiro sentido espiritual da ressurreição quase foi eclipsado pela fé no significado literal das narrativas do Evangelho. Os modernos investigadores bíblicos entendem que os Evangelhos não foram escritos directamente pelos apóstolos dos quais receberam os nomes, mas por evangelistas, no final do primeiro século da era cristã, que herdaram alguns dos primeiros ensinamentos Cristãos. É em algumas das cartas de Paulo que se encontram as primeiras informações do Novo Testamento relacionados com a ressurreição de Jesus. As notas seguintes mostram

27 RICHARDS, H. J. The First Easter. What Really Happened?, Fontana Books, 1976, pags. 15-16. Richards não coloca estas questões para "ridicularizar o texto" mas para permitir aos cristãos descobrir o verdadeiro propósito das narrativas.

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uma imagem simplificada do aparecimento da fé da Ressurreição, em termos da cronologia das fontes básicas do Novo Testamento28.

A INFORMAÇÃO CONTIDA NAS CARTAS DE S.PAULO (50-60 D.C.)

É dito que os Cristãos individuais que estão "em Cristo" formam o "corpo de Cristo" ressuscitado (ver I Cor 6:15, 12:27, Rom 7:14, Gal 2:20ss). Faz-se referência a Cristo "ressuscitado" e a várias aparições (I Cor 15:4-9, escrito nos anos 55-56 d.C.), mas não é mencionado o túmulo vazio nem nenhum dos detalhes que se encontram nos Evangelhos. A natureza do corpo ressuscitado de Jesus como oposto ao corpo espiritual dos Cristãos não é afirmado detalhadamente. Afirma-se claramente que a "carne e o sangue não podem herdar o reino de Deus" (I Cor 15:50). Na primeira Epístola aos Coríntios (15:4-9), S.Paulo apresenta uma lista de aparições de Cristo. Também incluía a sua própria experiência (a visão na estrada para Damasco) nesta lista, indicando, deste modo, que ele pensava que se tratavam de visões em vez de acontecimentos físicos.

O EVANGELHO DE S.MARCOS (APROX. 70 D.C.)

Aqui surge pela primeira vez a descrição do "túmulo vazio". A história simbólica assinala a ausência do corpo, tendo em conta a ascensão de Jesus ao céu. Não se afirma que o corpo tomou vida e saiu do túmulo; não é descrita a ressurreição física. A história do túmulo vazio é uma interpretação de fé, e não uma afirmação evidente de como surgiu a fé. É um modo de dizer "Jesus ressucitou" em termos concretos. A história tornou-se um elemento de apoio da fé na Ressurreição, e foi criada e elaborada no começo da Igreja. No campo linguístico e textual é um facto estabelecido que o Evangelho original terminava em 16:8; os versículos 9-20 foram acrescentados no século II. As aparições após a ressurreição estão ausentes.

O EVANGELHO DE S.MATEUS (75-90 D.C.)

Aqui a descrição de Marcos é retomada, revista e alargada. É nova, por exemplo, a história explicativa dos guardas no túmulo vazio (28:11-15) designados para lançar o rumor que o corpo de Jesus havia sido roubado. Não é historicamente credível quando pressupõe que as autoridades judaicas acreditaram na possibilidade da ressurreição física antes dos discípulos. As aparições depois da ressurreição têm lugar na Galileia (28:10ss)

O EVANGELHO DE S.LUCAS (80-90 D.C.)

28 Os detalhes dos relatos do Evangelhos não podem ser resumidos aqui. As referências destes relatos estão no 3º parágrafo deste artigo.

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A descrição de Marcos é mais uma vez retomada, revista e alargada. A história do túmulo vazio é consistente estilizada no sentido da ressurreição física. O Jesus ressuscitado, que aparece apenas aos homens crentes nos arredores de Jerusalém29, é retratado como um "espírito" com "carne e ossos" (24:36ss) que comeu com os discípulos. Na história de Emaús, o Cristo ressuscitado (24:13-25) apenas é reconhecido por dois homens com quem partilha o pão, que significa a sua capacidade para compreender o que significa o "pão" dos Seus ensinamentos30, e provavelmente reflecte o entusiasmo inicial da presença eucarística de Jesus.

O EVANGELHO DE S. JOÃO (90-110 D.C.)

Este Evangelho contém as tradições primitivas, mas reflecte o Evangelho de Marcos quando descreve a história do túmulo vazio, e o Evangelho de Lucas quando utiliza os conceitos quasi-físicos do "corpo" do Jesus ressuscitado. A história de Tomé (20:24-29) é um episódio simbólico que ensina que o Cristo ressuscitado que os discípulos tiveram nas suas visões era o mesmo que tinha sido crucificado. As portas estavam fechadas (20:19-26) mas diz-se que Jesus veio e esteve entre os discípulos. Tomé foi convidado a (não se diz se ele o fez) a sentir as "feridas" do "corpo" de Jesus (estabelece a identidade do Cristo ressuscitado) deixa-se claro que os verdadeiramente abençoados são os crentes que têm uma fé que não depende de provas palpáveis(20:29). Desde o século II, a florescente ortodoxia cristã seguiu a tendência mais evidente do livro dos Actos (S.Lucas) acreditando na ressurreição do corpo crucificado de Jesus. Um importante factor que se deve ter em conta na aceitação destes pontos de vista materialistas, é a noção do Antigo Testamento de que o homem é um organismo psico-físico: uma entidade múltipla, mas única (não se trata de uma dualidade corpo-alma). A doutrina segundo a qual a alma espiritual do homem tem vida sem o corpo após a morte era uma doutrina estranha ao Judaísmo, e desconhecida ou absurda para a maioria dos Judeus no tempo do Novo Testamento. Paulo, conforme referido, sentiu ser necessário falar da vida eterna em termos de ressurreição e de "corpo espiritual", apesar de ter salientado o seu "mistério" (I Cor 15:42ss). Enquanto que os fundamentalistas Cristãos parecem gostar de algumas citações dos Textos do Novo Testamento que aparentemente salientam uma ressurreição física, muitos outros Cristãos, mais liberais traçaram o tipo de evolução das tradições da ressur-reição, e rejeitam a ressurreição do corpo. Seguidamente apresentam-se duas citações extraídas de uma profusão de fontes que expressam o ponto de vista dos pensadores Cristãos liberais acerca da ressurreição:

"A fé no Cristo Ressuscitado era, no início, uma simples afirmação da Sua exaltação à posição de Messias e Senhor, e era absolutamente independente de qualquer convicção na revivificação material do corpo. Esta é uma ideia secundária que nasceu da necessidade de defender a crença. Foi apenas mais

29 Lucas 24:12 provavelmente não fazia parte do Evangelho original. Refere-se a um homem chamado Pedro, que descobriu o túmulo vazio; à luz da antiga crença Judaica, o testemunho as mulheres era de pouco ou nenhum valor. 30 Tablets of 'Abdu'l-Bahá Abbas, Vol I, Bahá'í Publishing Trust, New York, 1930, pags. 193-4

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tarde que a perspectiva material da Ressurreição se tornou objecto de crença, e foi feita prova ou 'sinal' principal da verdade da Fé Cristã"31. "A ideia da ressurreição do corpo é um simbolismo bíblico que às mentes modernas surge como uma grande ofensa, e que há muito foi substituida nas versões modernas da fé cristã pela ideia da imortalidade da alma"32.

Os pontos de vista mais profundos sobre o Cristianismo têm sido crescentemente sentidos desde o tempo da visita de 'Abdu'l-Bahá ao Ocidente (1911-1913). Em 1984 tornaram-se conhecidos da generalidade da população britânica quando David Jenkins, o Bispo Anglicano de Durham, (que havia sido Professor de Teologia na Universidade de Leeds) proferiu uma série de afirmações de conteúdo liberal sobre a ressurreição, afirmações estas que causaram preocupação considerável aos fundamentalistas33.

ENSINAMENTOS BAHA'IS

Várias Epístolas e palestras de 'Abdu'l-Bahá e cartas de Shoghi Effendi contêm explicações sobre a ressurreição de Jesus e acontecimentos associados. As palavras seguintes resumem a interpretação básica:

"Quanto à ressurreição do corpo de Cristo três dias após a Sua morte, isto significa os ensinamentos divinos e a religião espiritual de Sua Santidade Cristo, que constitui o Seu corpo espiritual, que está vivo e é perpétuo por toda a eternidade. Por «três dias» da Sua morte pretende-se significar que após o grande martírio, a propagação dos ensinamentos divinos e divulgação da lei espiritual abrandou devido ao relato da crucificação de Cristo, pois os discípulos estavam preocupados com a violência dos testes divinos. Mas eles tornaram-se firmes, aquele espírito divino ressuscitou e aquele corpo - que simboliza o mundo divino - ergueu-se"34. "Não acreditamos que tenha havido uma ressurreição corpórea após a crucificação de Cristo; mas houve uma ocasião após a Sua ascensão em que os discípulos compreenderam espiritualmente a Sua grandeza, e perceberam que Ele era eterno na Sua existência. É isto que é descrito simbolicamente no Novo Testamento e tem sido mal compreendido. O mesmo se aplica ao facto de Ele comer com os discípulos após a ressurreição"35.

31 McGREGOR, G. The Growth of the Ressurection Faith. Expository Times. Vol 50, s.e., 1939, pag. 220. 32 Palavras de R. Neibuhr (1939) citadas em GEERING, L. Ressurection: A Symbol of Hope, Hodder & Stoughton, 1971, pag. 60. 33 Para alguns detalhes veja-se, por exemplo, o programa de palestras do Credo dos Bispos (feitas em 29 de Abril de 1984) em HARRISON, T. The Durham Phenomenon, Darton, Longman & Tod, 1985, e SCOTT, J. The Authentic Jesus, Marshalls, 1985, pags 36-37. 34 Tablets of 'Abdu'l-Bahá Abbas, Vol I, pag. 192. Para mais detalhes ver também Esplendor da Verdade, CXXIII. 35 De uma carta de Shoghi Effendi citada em High Endeavours, Messages to Alaska, s.e., 1976, pags.69-70

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A interpretação Bahá'í é uma interpretação implícita nas interpretações iniciais e reflecte o simbolismo originário do Novo Testamento. O corpo de Jesus permanece enterrado na antiga cidade de Jerusalém; é um facto afirmado por 'Abdu'l-Bahá em várias das Suas palestras e uma conclusão a que chegaram um bom número de Cristãos modernos. Aceitar isto, porém, de modo algum deprecia o verdadeiro milagre da ressurreição. Os Bahá'ís aceitam este milagre: o milagre da regeneração da fé cristã após a crucificação do seu Fundador, e a "morte" espiritual temporária dos apóstolos. Um cuidadoso estudo das escrituras Bahá'ís, ou da Bíblia e das palavras destes modernos pensadores Cristãos permitir-nos-ão amar, relacionar e ensinar mais adequadamente os Cristãos36.

36 Não nos foi possível apurar se as obras de H.J. Richards e de Geering se encontram disponíveis nas livrarias do nosso país.

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ANEXO 2 - A FÉ BAHA'I E O CRISTIANISMO

Ponto de vista Bahá'í sobre alguns conceitos Cristãos

por Stephen Lambden e Moojan Momen publicado no "Bahá'í Journal" do Reino Unido em Julho de 1990

* * * * * * * * * *

"Dizei: este é Quem glorificou o Filho e Lhe exaltou a Causa"37. Bahá'u'lláh

"Quanto à posição da Cristandade, diga-se sem qualquer hesitação ou equívoco, que a sua origem divina é incondicionalmente reconhecida, que a Filiação e Divindade de Jesus Cristo são destemidamente declaradas"38.

Shoghi Effendi

A perspectiva Cristã da posição de Jesus Cristo constitui parte do que hoje é a Cristologia. A teofania Bahá'í, ou a doutrina da Manifestação de Deus, inclui uma Cristologia Bahá'í em são reconhecidas e pressupostas a Filiação espiritual e sublime Divindade de Jesus. As discussões entre Cristãos e Bahá'ís tornam-se por vezes desnecessariamente detestáveis quando se abordam aspectos da Cristologia tais como a Trindade e a Encarnação (do latim, incarnatio, "existir na carne") ou da Divindade (ou natureza divina) e a Filiação de Jesus de Nazaré. Para muitos cristãos é a afirmação de que Jesus é Deus que salienta a Sua unicidade e coloca Cristianismo à parte das outras religiões. As doutrinas clássicas da Trindade e da Encarnação têm sido geralmente vistas como centrais da teologia cristã. Contudo, um crescente número de cristãos modernos têm rejeitado e reformulado o trinitarismo e outras doutrinas como as da Encarnação. Têm sido propostas muitas Cristologias novas. Certas formulações antigas e largamente esquecidas têm sido e são reavivadas e repensadas. Muito do que é central para teofania/cristologia Bahá'í tem sido defendido por académicos Cristãos liberais. Se bem que este assunto não possa ser plenamente

37 Lawh-i-Aqdas, in Epístolas de Bahá'u'lláh. Editora Bahá'í do Brasil, Rio de Janeiro, 1983, pag. 21, aludindo a João 16:14. 38 O Dia Prometido Chegou, Editora Bahá'í do Brasil, Rio de Janeiro, 1960, pag. 21.

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abordado nestas páginas, espera-se que os parágrafos seguintes contribuam para um maior nível de abertura, respeito mútuo e compreensão entre Bahá'ís e Cristãos. Afinal temos muito em comum.

A TRINDADE A palavra trindade ("ser três") não é bíblica. As suas formulações clássicas foram largamente interpretadas no texto bíblico com vista a repelir ou confrontar um grande número de alegadas heresias. Muitos teólogos modernos consideram esta doutrina como sendo difícil ou um "mistério divino" ilógico. Outros rejeitam-na completamente. Os Bahá'ís rejeitam a consubstancialidade ("da mesma substância") das três «Pessoas» (Pai, Filho e Espírito Santo) da Trindade, mas encontram nela verdades simbólicas profundas. 'Abdu'l-Bahá apresentou frequentemente imagens positivas da "Trindade"39.

A ENCARNAÇÃO Esta doutrina afirma que Jesus não está subordinado a Deus, mas é uma Pessoa igual na unidade com a Divindade que, tendo corpo humano e alma, viveu uma vida humana. «Encarnação» não é um termo do Novo Testamento. Nas últimas décadas, a teologia segundo a qual Jesus é Deus encarnado, tem sido cada vez mais criticada e também negada.

"Porque há um só Deus, e um só Mediador entre Deus e os homens, Jesus Cristo, homem"40.

A importante obra The Myth of God Incarnate (O Mito do Deus Encarnado)41 expõe um grande e contínuo debate cristão42. Para muitas pessoas tornou-se claro que a doutrina clássica da Encarnação não é algo directamente presente nas escrituras do Novo Testamento (apesar de ter sido interpretada desse modo). Deus não pode encarnar, mas os Seus Manifestantes, como Seres divinos, são encarnações da totalidade de nomes e atributos da Divindade. A essência de Deus não se pode tornar humana, mas os Manifestantes de Deus são seres humanos perfeitos. Ao expôr as teologias da encarnação, os modernos teólogos ocidentais deram pouca atenção às verdades da incognoscibilidade da Essência da Divindade43. 39 Para exemplo, ver O Esplendor da Verdade(Respostas a Algumas Perguntas) Cap. 27; Tablets of 'Abdu'l-Bahá Abbas, Vol. I, Bahá'í Publishing Trust, New York, 1930, pags. 117-118. 40 I a Timóteo 2:5 41 Ed. John Hick. SCM Press Ltd, London. 42 Os muitos livros e artigos não podem ser todos referidos aqui, mas Incarnation and Myth, the Debate Continued (Ed. M. Goulder, SCM 1979) e God Incarnated: Story and Belief (Ed. A.E. Harvey SPCK London 1981) merecem um estudo cuidadoso. Um outro trabalho importante é Avatar and Incarnation de G. Parrinder's (Faber & Faber, London 1970). 43 Nos séculos passados incontáveis Cristãos ufanaram-se da sublime incompreensibilidade de Deus, o Pai. Alguns santos eruditos e místicos consideravam a "experiência interior" da incognoscibilidade de Deus como sendo o cume da realização mística.

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A DIVINDADE DE JESUS Existem numerosas passagens no Novo Testamento em que Jesus Cristo está subordinado a Deus, o Pai. Jesus não é a Essência da Divindade44. Jesus parece não Se ter designado a Si próprio como «Senhor» (kyrios) ou «Deus» (theos). Alguns dos primeiros Cristãos, sob uma perspectiva perfeitamente legítima, acabaram por compreender gradualmente a Sua Divindade. São, na verdade, muito poucas as vezes em que no Novo Testamento se refere directamente a Jesus como «Deus».45

"...ao descrever Jesus como «Deus», o Novo Testamento ainda é muito moderado..."46

Do ponto de vista Bahá'í, Jesus poderia ter revelado "Eu sou Deus", pois esta afirmação é a prerrogativa dos Manifestantes de Deus, o "espelho" puro que reflecte do modo mais perfeito o "Sol" da Divindade.

"Se qualquer um dos Manifestantes de Deus - aqueles que a tudo abran-gem - declarasse: "Sou Deus!", Ele certamente diria a verdade, sem a menor dúvida."47

Relativamente à humanidade e a este mundo contingente nenhuma distinção se pode fazer entre Deus e Suas Manifestações48. Quando um Cristão diz que «Cristo é Deus», nós temos a confirmação nas Escrituras Bahá'ís de que isto é uma importante verdade teológica. 'Abdu'l-Bahá explicou que o primeiro versículo do Evangelho de S.João "está repleto de grandiosos significados"... Indicou que muitos cristãos tinham limitado a sua interpretação em termos do versículo João 1:14, em vez de realçar a identificação dos «raios» da Divindade de Jesus com o «Sol» da própria Divindade49. É essencial que os Bahá'ís deixem claro que Jesus não é a Essência de Deus e importante que "sustentem destemidamente" a Sua Divindade. Paulo escreveu numa carta aos Filipenses que "Cristo Jesus, que sendo em forma de Deus, não teve por usurpação ser igual a Deus"50.

44 Para exemplo, ver Mateus 10:40, 19:17; Marcos 10:10, 13:21 & 32, 15:34; Lucas 10:16, 18:19; João 5:30, 7:16, 10:30, 12:44, 14:28, 17:3 & 21; I aos Coríntios 8:6; Efésios 1:2 45 Para exemplo, ver João 1:1, 20:28; I João 5:20; Tito 2:13; Hebreus 1:8-9; II Pedro 1:1; Cf. Marcos 2:7 46 The Theology of the New Testament, Vol I, de R. Bultmann (SCM, London, 1965), pag. 129. Nas suas controvérsias cristológicas alguns dos primeiros Cristãos cometeram o erro de não fazer distinção entre o Jesus "Divino" e a própria Essência de Deus. 47 Bahá'u'lláh, Kitáb-i-Iqán, Editora Bahá'í do Brasil, 2ª Ed, pag. 110. 48 Segundo Exodo 4:16, Moisés era como "Deus" em relação a Aarão, e na sua sua missão ao Faraó. 49 Ver The Promulgation of Universal Peace, Bahá'í Publishing Trust, Willmette, Illinois, 1982, pags 154-155. Em João 20:28, Tomé atribui Divindade ao Cristo erguido ao exclamar "Meu Senhor e Meu Deus", apesar de Jesus ter dito que Deus, o Pai, era maior que Ele (João 14:28). 50 Filipenses 2:6-11 é um hino litúrgico e cristológico primitivo. Jesus "sendo em forma de Deus" («en morphé theou») não indica a sua identidade pré-existente com a Essência da Divindade. Pelo contrário, Ele é identificado com o Lugar pré-existente da Imagem Divina.

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Compreender as Provas Bíblicas

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JESUS, O FILHO DE DEUS

"A condição de Filho é o coração de Cristo"51. "Porque Cristo encontrou existência através do espírito de Deus, chamou-Se a Si próprio o Filho de Deus"52.

No Novo Testamento, o título messiânico - Filho de Deus - de Jesus é de importância fundamental. Mas a ideia de que Jesus é Filho de Deus não se aplica apenas a Jesus, na Bíblia. Podemos encontrar muitos outros que são referidos como «Filhos de Deus»; os homens em geral, ou os filhos de Israel também são designados como «Filhos de Deus»53. Também David e Salomão são referidos como Filhos de Deus54. No Novo Testamento, encontramos os que acreditam em Cristo sendo referidos como os filhos de Deus55; os pacificadores são referidos como filhos de Deus56, e tal como os que se levantarão na ressurreição57. A ideia de que Jesus não teve um pai terrestre e por isso era Filho de Deus, não é única na Bíblia. No Novo Testamento, Melquisedec é referido como "sem pai, sem mãe, sem genealogia, não tendo princípio de dias, nem fim de vida, mas sendo feito semelhante ao Filho de Deus"58. Nem a ideia de que Jesus foi gerado por Deus se aplica unicamente a Jesus59. Segundo John Hick: "... este título (Filho de Deus)...era metafórico e honorífico, e não uma descrição literal. Não há dúvida que Jesus falou do mesmo modo poético sobre Deus como nosso Pai e os homens como Seus filhos. Mas com o decorrer do tempo, à medida que os teólogos latinos trabalhavam, o simbolismo transformou-se em dogma, e o filho metafórico de Deus tornou-se o filho metafísico de Deus, a Segunda Pessoa da Trindade"60. O título Filho de Deus expressa a relação especial de Cristo com Deus, o Pai, através do Espírito Santo. Tal como com todas as Manifestações de Deus, Ele era um Filho de Deus "ímpar" ou "único" (monogénese)61. A Sua Filiação não deve ser interpretada literal ou fisicamente.

51 Cf. 'Abdu'l-Bahá, O Esplendor da Verdade (Respostas a Algumas Perguntas), Editora Bahá'í do Brasil, Rio de Janeiro, 4ª Ed., pag. 107. 52 Idem, pag. 69 53 Genesis 6:2; Hoseias 1:6 Job 1:6 54 Salmos 2:7; II Samuel 7:14 55 João 1:12 56 Mateus 5:9 57 Lucas 20:36 58 Hebreus 7:3 59 Salmos 2:7 60 The Second Christianity (SCM Press, London, 1983), pag. 31. 61 A monogénese grega é bastante inadequada para traduzir "unigénito" (Cf. João 1:14 & 18, 3:16 & 28; I João 4:14. No antigo Judaísmo este adjectivo era aplicado a todo o povo de Israel ou noutras formas que não geneológica.

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Bahá'u'lláh mencionou que os crentes em geral são chamados "filhos de Deus" nos Livros Sagrados do passado62. No Antigo Testamento, os Israelitas são referidos como os "filhos de Deus" (por adopção, não por procriação), tal como vários reis, anjos e outras personagens63. Na Sua Epístola a líder Templário, G.D. Hardem64[28], Bahá'u'lláh indica que a posição de Jesus ainda é mais transcendente do que limitada simbologia das escrituras. Os Bahá'ís poderiam, sem qualquer dúvida, melhorar o seu diálogo com os Cristãos se fossem campeões do enaltecimento da posição de Cristo como Manifestante de Deus. 'Abdu'l-Bahá, frequentemente, realçava a grandeza da vida, posição e sacrifício de Jesus. Para nós, Bahá'ís, a plena compreensão das posições de Manifestantes de Deus como Jesus (o Filho) e de Bahá'u'lláh (o Pai) é hoje extremamente importante.

62 Exemplo: Mateus 5:9. Epístola não traduzida publicada em Iqtidarat (1310 AH), pag. 3. 63 Exodo 4:22. Ver as palavras de 'Abdu'l-Bahá em Star of the West, Vol 5, nº8, pag. 122. Para "membros da corte celestial" ou "anjos" ver Génesis 6:2, 2:1, 38:7; Salmos 29:1; 89:7. Para mais detalhes ver The Son of God de M. Hengel (London SCM Press Ltd, 1976). 64 Lawh-i-Hirtik, revelada em 1878.