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A METODOLOGIA DA MATEMÁTICA NA FEITURA DOS PLANEJAMENTOS DE BIOLOGIA
Elizabeth Bittencourt Martins ( * )
exrbittencourt@yahoo.com.br
Resumo: Muitas vezes temos uma idéia limitada que as metodologias de ensino da Matemática servem
unicamente para serem aplicados para os conhecimentos da Ciência "Matemática". Temos de ampliar esta
nossa visão restrita e entender que as operações matemáticas estão enraizadas na cultura do Professor
desde a mais tenra idade, nas atividades escolares tanto com um caráter de visão formativa quanto de
cultura e lazer, envolvendo a organização dos espaços e tempos escolares. Os conhecimentos estão
impregnados na cultura de cada Professor desde a mais tenra idade, e este nem se dá conta das quatro
operações matemáticas simples que utiliza continuamente nas atividades de planejamento e depois, na
execução dos planos em sala de aula. A organização das atividades de ensino centradas na partição do
tempo, permite uma clarificação dos objetivos a serem conquistados pelo Professor, e favorecem um melhor
aprendizado por parte das classes, que estabelecem foco nos conteúdos planejados e nas frações do
Conhecimento oferecidos em classe.
"Escravos de Jó jogavam caxangá
Tira, bota deixa o Zé Pereira ficar
Guerreiros com guerreiros fazem zigue zigue za (bis)"
(http://www.alzirazulmira.com/cantigas.htm#escravos)
Introdução
Muitas vezes temos uma idéia limitada que as metodologias de ensino da Matemática servem unicamente
para serem aplicados para os conhecimentos da Ciência "Matemática". Temos de ampliar esta nossa visão
restrita e entender que as operações matemáticas estão enraizadas na cultura do Professor desde a mais
tenra idade, nas atividades escolares tanto com um caráter de visão formativa quanto de cultura e lazer,
envolvendo a organização dos espaços e tempos escolares.
Como bem lembra Moura (2001), a "possibilidade de organizar o ensino de modo a permitir a melhoria da
aprendizagem é uma premissa da Didática desde Coménio (1592-1604)". Assim, cada Professor tem de
estar imbuído da natureza do conhecimento que pretende transmitir aos alunos, e que irá condicionar sua
atuação perante as classes. Os conteúdos em si que pretende apresentar deverão sofrer um
dimensionamento adequado, de forma que a gama de conhecimentos que pretenda transmitir mantenha
sua unicidade. A apresentação destes conteúdos deverão estar sujeitos a estratégias de ensino e ofertados
aos alunos de acordo com os recursos tecnológicos disponíveis na Escola, ou dinâmicas apropriadas, de
conhecimento do Professor. Por fim, o contexto social da comunidade escolar e a relevância deste
conhecimentos na inserção deste aluno como futuro cidadão.
Sem dúvida o conhecimento de um componente curricular foi construído ao longo dos séculos, e este
conhecimento deve fazer parte dos assuntos a serem tratados pelo Professor em suas aulas, de forma que
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o aluno tenha um panorama mais amplo da relação existente entre o desenvolvimentos entre as diferentes
Ciências e sua complementaridade na construção de todos artefatos de que dispões a sociedade
contemporânea.
Os conhecimentos estão impregnados na cultura de cada Professor desde a mais tenra idade, e este nem
se dá conta das operações matemáticas simples que realiza em seu cotidiano:
- Adição - com o diálogo cooperativo entre as vertentes do Conhecimento, na contextualização de
informações que pesquisa nas informações recentes oferecidas pela mídia e que despertam o interesse dos
alunos.
- Subtração - com a redução na ênfase aos assuntos, privilegiando um Conhecimento panorâmico do
assunto a ser tratado, valorizando tópicos que tenham maior valor no contexto da Escola.
- Multiplicação - dos meios e recursos disponíveis, maximizando as ações em favor de resultados
significativos de aprendizado.
- Divisão - dos tempos, pela visualização prévia das aulas disponíveis em cada bimestre ou semestre letivo,
adequando o desenvolvimento dos temas a serem tratados de modo a serem acessíveis aos alunos,
alternando aquisições conceituais com experimentação, exercícios e construção do conhecimento pelo
próprio aluno.
A Genética e a Evolução no Planejamento de Biologia
Ambos temas são bastante interessantes aos alunos, pois resgatam a transmissão das características
hereditárias de uma geração a outra, ou ao longo dos milênios, provocando profundas modificações na
composição da flora e fauna sobre o planeta, desde as suas origens. Temas da maior magnitude, que
requisitam maior capacidade de abstração, pois nenhum deles permite uma visualização clara com os
meios disponíveis nas escolas, nem facilmente sujeitos a experimentação. Os relatos relativos às vidas e
condições em que os primeiros cientistas nestes campos das Ciências se torna necessária, e sua
metodologia, eivada de incompletudes e limitações tecnológicas.
São os temas que apontam maior valoração na pesquisa atual e em muitos livros didáticos são explorados
com muitas limitações, privilegiando exercícios longos e extensivos de Genética, em detrimento de
discussões atualizadas no campo da Evolução.
Vivência e relato de um planejamento
Assumindo aulas para classes de série terminal do ensino médio, com autorização da Direção de Escola,
desenvolvi um projeto piloto, em que busquei, usando uma partição diferenciada dos tempos escolares, o
desenvolvimento destes temas da Biologia..
Considerando que ambos tivessem mesma importância científica, delimitei a cada um destes temas um
semestre letivo. Considerando ainda que estes conhecimentos partiram em uma fase de observação ou de
experimentação bastante significativa dentro da escala biológica a partir dos estudos de Mendel (1822-
1884), Lamarck (1744-1829) e Darwin (1809-1882), restringi um bimestre para o conhecimento das bases
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biológicas destes conhecimentos e a valorização destes cientistas, e um bimestre para as implicações
atuais na espécie humana.
Pela controvérsia causada até hoje pelas conclusões de Charles Darwin em seus estudos, formulados no
livro A origem das espécies (primeira edição inglesa em 24 de novembro de 1859) (1979:16), até hoje os
livros didáticos ainda são fragmentados na apresentação destes tópicos. Apresento a seguir o planejamento
semestral, elaborado na bibliografia disponível na Biblioteca da Escola.
3º ANO – 3º BIMESTRE
26 a 30/07
• Planejamento do Bimestre – matérias a serem lecionadas
•
01 a 06/08
1 - 2
• A evolução das espécies na Terra – eras Geológicas Linhares,S. e Gewandsznajder,F. Biologia Hoje, v.3. São Paulo, Ática,1994: 203,190.
09 a 13/08
3 - 5
• O mecanismo evolutivo – Especiação Paulino,W.R. Biologia,v.único. São Paulo, Ática,2000: 330, 336, 337.
16 a 20/08
6 – 9
• Evidências evolutivas Paulino,W.R. Biologia,v.único. São Paulo, Ática,2000: 338, 339.
Linhares,S. e Gewandsznajder,F. Biologia Hoje, v.3. São Paulo, Ática,1994: 174, 175.
23 a 27/08
10 – 11
• A vida de Lamark – (transparência) – Lamarckismo
Oliveira,F. Engenharia Genética. São Paulo,Moderna,1997: 32 - 34.
29/08 a 03/09
12 – 13
• A vida de Darwin – (transparência) - Darwinismo
• A viagem do Beagle Oliveira,F. Engenharia Genética. São Paulo,Moderna,1997: 36 – 37.
Darwin,C.Viagem de um naturalista ao redor do mundo.V.1.Rio de Janeiro,Sedegra:30,31.
06 a 10/09
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• Fatores evolutivos: mutação e recombinação gênica Paulino,W.R. Biologia,v.único. São Paulo, Ática,2000: 344.
13 a 17/09
15 – 17
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• Seleção natural
• Melanismo industrial e o valor adaptativo Paulino,W.R. Biologia,v.único. São Paulo, Ática,2000: 15 – 17.
20 a 24/09
18 - 19
• Revisão geral
• AVALIAÇÃO BIMESTRAL
Lorenz,K. Civilização e Pecado.Rio de Janeiuro,Artenova,1974:78 – 79. Oliveira,F. Engenharia Genética. São Paulo,Moderna,1997: 52.
27 a 30/09
• Prova substitutiva
• Encerramento do bimestre
3º ANO – 4º BIMESTRE
05 a 08/10
2 - 3
• Sucessão ecológica e Equilíbrio de populações Tanner,R.H. Educação ambiental. São Paulo,Edusp e Sumus1978: 13 – 15.
11 a 14/10
13 - 15
• O jogo da Ecologia CECISP. Caderno de Ecologia. São Paulo, Mosaico, 1980:76 – 81.
18 a 23/10
• CAMPEONATO ESPORTIVO
25 A 27/10
7 - 9
• Especiação e seus mecanismos Simpson, G.G. A Biologia e o Homem. São Paulo, 96 – 101.
01 A 05/11
10 - 11
• O surgimento e Evolução do homem Dobzhansky, T. O homem em evolução. São Paulo, Edusp e Polígono, 1968: 181 – 184.
08 A 12/11
12 - 17
• O comportamento humano Morris, D. O macaco nu. Portugal, Europa-America,1967: 210 – 221.
15 A 19/11
19 - 20
• O futuro da espécie humana Dobzhansky, T. O homem em evolução. São Paulo, Edusp e Polígono, 1968: 326-327,332-335
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22 A 26/11
21 - 26
• O futuro da espécie humana Dobzhansky, T. O homem em evolução. São Paulo, Edusp e Polígono, 1968: 372 – 374, 346-347, 350-353.
29/11 A 03/12
1
• Revisão geral
• AVALIAÇÃO BIMESTRAL
Wallace, B. Biologia Social. A humanidade, suas necessidades, ambiente, ecologia. São Paulo,Edusp,
1978: Prólogo.
06 A 10/12
• Correção dos trabalhos e cadernos / Prova substitutiva
• Encerramento de notas e faltas
13 A 17/12
• DIA - 13 ENTREGA DE NOTAS
À guisa de contribuição, apresento ainda os planos de aula onde foram estudadas as vidas de Jean Baptiste
Lamarck e Charles Darwin, cujos dados foram compilados em extensa pesquisa pela mídia eletrônica, além
da Enciclopédia Encarta (2001). Este material foi desenvolvido durante o Programa "Teia do Saber" do
segundo semestre de 2003.
Jean Baptiste Pierre Antoine de MonetCavaleiro de Lamark01/08/1744 a 18/12/1829
1760 (16 anos) morte de seu pai, Pierre de Monet
1761 (17 anos) ingressou no exército francês e partiu para o norte da Alemanha, lutando na Guerra dos
Sete Anos (1756 a 1763), cujo objetivo era conseguir o controle sobre a Silésia (região histórica da Europa
Central, atual sudeste da Polônia).
1768 (24 anos) doente, deixou o exército e voltou para Paris, com modesta pensão, e passou a trabalhar
como bancário, estudando temas de Medicina, Metereologia e Botânica nas horas vagas. Ele nunca
praticou Medicina e suas publicações em Metereologia não tiveram valor científico, da mesma forma que os
que versavam sobre Física e Química, onde se opôs a Lavoisier.
1778 (34 anos) ele escreveu em seis meses um levantamento da fauna francesa, editada em seis volumes.
Em seguida, outras publicações importantes foram feitas, e em 1789 (35 anos) foi eleito membro da
Academia de Ciências Francesa. Já eleito viajou com Buffon, renomado naturalista francês, através da
Holanda, Alemanha e Hungria.
1790 (36 anos) foi nomeado botânico do Jardim Imperial de Paris, cargo que exerceu até 1790 (46 anos),
quando foi fechado pela Revolução Francesa (1789 a 1799).
1793 (49 anos) quando o Museu de História Natural foi reorganizado, não dispunha de professor de
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Zoologia, e estas aulas foram oferecidas a ele (botânico), que criou coragem e passou a estudar esta
matéria.
1794 (50 anos) passou a lecionar Zoologia e se manteve neste posto até 1818 (74 anos), quando transferiu
esta incumbência ao entomologista Latreille. Neste posto, dedicou-se aos invertebrados e sua classificação,
e publicou extensa obra de onze volumes - "História dos animais sem vértebras". Viveu ainda onze anos,
perdendo gradativamente a visão, e morreu, viúvo quatro vezes, cego e na miséria.
1909 (depois de 80 anos de sua morte) teve seu talento reconhecido e foi inaugurada estátua em sua
homenagem no Jardim Botânico. Neste monumento, ele é representado com um pombo na testa, o que
representa uma vida consagrada à teoria da transformação das espécies - TRANSFORMISMO.
Charles Robert Darwin12/02/1809 a 19/04/1872
1809 Nasceu em Shreushury, Inglaterra, quinto filho de uma família rica e sofisticada. Quando criança
cultivava o hábito de colecionar besouros. Seu pai temia que não seria capaz de fazer nada além de caçar
ratos e besouros, e que acabasse por desgraçar o nome da família. Por ser um hábil caçador, aprendeu a
observar o hábito dos animais. Concluiu que o prazer de observar era maior que o prazer de caçar.
1825 (16 anos) Graduou-se no colegial e foi para Edimburgo (Escócia) estudar Medicina, entretanto notou
que para ser médico teria que assistir muitas operações, feitas sem anestesia, pois o clorofórmio ainda for a
inventado. Ao invés de estudar, acabou dedicando seu tempo a reuniões com estudantes, que discutiam
História Natural.
1827 (17 anos) Ingressou em Cambridge, preparando-se para ser ministro da Igreja da Inglaterra. Ali
conviveu com o geólogo Adam Sedgwick e o naturalista Stevens Henslow, que o ensinaram a ser um
observador meticuloso e cuidadoso dos fenômenos naturais.
1831 (22 anos) Foi recomendado por Henslow a participar da viagem do Beagle, navio britânico incumbido
da tarefa de mapear mares e costas desconhecidos. Foi incorporado como naturalista, apesar de não ter
qualificação acadêmica para tanto, e sua função acabou sendo fazer companhia ao capitão, homem
bastante autoritário.
1831 a 1836 (5 anos) Nesta viagem foi coletando material, que enviava para Henslow, na Inglaterra, e
escrevia um diário com suas observações. Ao fim da viagem, já na Inglaterra, casou-se com uma prima,
Ema e com ela teve dez filhos, no que pareceu uma união feliz.
1840 (31 anos) publicou "Zoologia da viagem do Beagle". Costumava passar horas no Zoológico de Londres
acompanhando o movimento dos macacos e orangotangos, mas também perdia a noção do tempo quando
acompanhava o crescimento de seus filhos.
1851 (42 anos) Sua filha mais velha, Anne, morreu de tuberculose, onde recebia um tratamento a base de
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água.
1859 (8 anos depois) publicou o livro "A origem das espécies", que foi a forma que usou para responder
aos cristãos da época. Deixou de ir à Igreja com a família, apesar de Ema perseverar na fé. O mesmo não
se pode dizer de seus descendentes - todos os Darwins na Inglaterra são agnósticos. Foi cientista
reconhecido no seu tempo e este fato fez com que fosse enterrado (aos 63 anos) na Abadia de
Westminster, ao lado de Isaac Newton.
Indicações "Uma didática que proporciona o desenvolvimento da educação matemática é aquela que reconhece as
particularidades do desenvolvimento matemático na organização de atividades de ensino." (idem Moura,
2001)
A organização das atividades de ensino centradas na partição do tempo, permite uma clarificação dos
objetivos a serem conquistados pelo Professor, e favorecem um melhor aprendizado por parte das classes,
que estabelecem foco nos conteúdos planejados e nas frações do Conhecimento oferecidos em classe.
Bibliografia DARWIN, C. A origem das espécies. São Paulo: Hemus, 1979.
MOURA, M. O. A atividade de ensino como ação formadora. In CASTRO, A.D. e CARVALHO, A.M.P.
Ensinar a ensinar. São Paulo: Pioneira, 2001: 143-162.
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SOROBAN: UMA FERRAMENTA PARA COMPREENSÃO DAS QUATRO OPERAÇÕES
Georgiane Amorim Silva – Graduanda – UESC
georgianeamor@hotmail.com
Jurema Lindote Botelho Peixoto - orientadora – UESC
jurema@hotmail.com
Eurivalda R.S. Santana-orientadora-UESC
eurivalda@uesc.br
Resumo: O ábaco é um dos mais antigos instrumentos de contar e efetuar operações comuns da
aritmética que se conhece. Ele traz em sua estrutura o valor posicional, ou seja, cada conta ou pedra de seu
tabuleiro representa um valor de acordo com a sua posição nas hastes. A compreensão deste princípio
posicional, através do manuseio de um instrumento concreto, pode auxiliar o estudante a entender melhor o
sistema de numeração e suas técnicas operatórias. Este trabalho, fruto do projeto de iniciação científica
Arrtteeffaattooss nnaa hhiissttóórriiaa ddaa mmaatteemmááttiiccaa--ábacos: aspectos históricos,matemáticos, e pedagógicos, teve como
objetivo fazer uma pesquisa abrangente sobre alguns tipos de máquinas de contar ou ábacos como, por
exemplo, o suan pan chinês, o stchoty (contador russo), o soroban japonês, relacionando-os com o período
em que foram concebidos com a finalidade de testar a sua eficácia quanto à compreensão do sistema de
numeração decimal e das operações aritméticas bem como o desenvolvimento do cálculo mental. A partir
deste estudo foi selecionado o soroban para explorar a possibilidade de seu emprego didático e foi aplicado
uma sequência didática com alunos com problemas de aprendizagem em Matemática.
PALAVRAS CHAVES: História da Matemática, Soroban, Operações Aritméticas.
1. Introdução
A realização de operações aritméticas para os calculistas do passado era uma tarefa penosa,
alguns povos trabalhavam com “tabuadas” destas operações, usavam-se também as mãos para realizar os
cálculos, mas ocupar as mãos nem sempre era um processo prático e possível, especialmente se tratarmos
de números muito grandes. Em algumas regiões, a saída para este problema, ao que tudo indica, foi a
criação do ábaco. Portanto o ábaco surge como a solução para tais problemas.
É verdade que dentre todos os dispositivos de cálculo figurado usados pelos povos, ao longo dos
tempos, o ábaco é praticamente o único que reúne as vantagens de uma prática relativamente simples e ao
mesmo tempo rápida para todas as operações aritméticas. Para os que sabem utilizá-lo, é um auxiliar muito
útil para efetuar adições, ou subtrações simples de números compostos de vários algarismos, ou ainda para
resolver problemas mais complicados envolvendo multiplicações, divisões, ou mesmo extrações de raízes
quadradas ou cúbicas.
Este trabalho teve como objetivo fazer uma pesquisa abrangente sobre alguns tipos de máquinas de
contar ou ábacos como, por exemplo, o suan pan chinês, o stchoty (contador russo), o soroban japonês
com a finalidade de explorar a possibilidade de emprego didático no ensino fundamental. Merece destaque
o ábaco japonês, soroban (Fig.1), que consiste em um modelo de ábaco mais prático, pois é composto por
apenas cinco contas em cada haste, agilizando assim o cálculo. Cada conta representa um valor (unidade,
dezena, centena...) de acordo com a haste ocupada. Cada conta da haste superior vale cinco e da inferior
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um. Por isso o seu uso foi mais difundido ao longo do tempo e ainda hoje perdura em diversos ramos da
sociedade como educação, asilos, casas de repouso e sendo adaptado na inclusão de deficientes visuais.
A utilização do soroban, sendo ele um ábaco prático, pois utiliza a base decimal e com poucas
contas (5 em cada haste) podemos representar e operar vários valores, pode auxiliar na compreensão da
contagem e dos algoritmos das operações aritméticas. Com o estudo realizado, elaborou-se uma
seqüência didática para o seu uso em sala de aula, enfatizando os aspectos históricos, didáticos e a
matemática envolvida objetivando validar estas hipóteses.
2. Material e Métodos (ou Procedimentos Metodológicos) Foram sujeitos da pesquisa 25 alunos da 5ª série do ensino fundamental do Colégio Municipal de
Camacan,no estado da Bahia, selecionados pela professora regente, como sendo os que apresentavam
dificuldades de aprendizagem das quatro operações fundamentais com os números naturais. Para nortear a
pesquisa, utilizou-se uma metodologia inspirada na Engenharia Didática, que se caracteriza por ser um
esquema experimental baseado em realizações didáticas em classe, isto é, sobre a concepção, a
realização, a observação e a análise de seqüências de ensino,elaborando-se uma sequência didática onde
foi trabalhada as quatro operações fundamentais, utilizando o soroban. A sequência didática foi
desenvolvida em uma oficina distribuída em seis sessões, cuja carga horária foi de 51 horas aula. Antes de
iniciar a oficina foi aplicada uma prova de 31 questões, visando avaliar o nível de conhecimento e o domínio
dessas operações. Ao término da oficina foi aplicada a mesma prova para avaliar o ganho na aprendizagem
com a oficina. As provas foram corrigidas e analisadas, cada questão foi pontuada com um ponto se a
resposta era correta e zero caso contrário, logo a pontuação máxima da prova foi de 31 pontos. Também foi
criada a variável “ganho” como sendo diferença na pontuação entre o pós-teste e o pré-teste, em relação à
pontuação no pré-teste, expresso em porcentagem. A análise estatística dos dados foi realizada utilizando-
se o pacote SPSS (Statistical Package for Social Science) e o nível de significância utilizado foi 5% (0,05).
Foi utilizado o teste t-student para comparar o desempenho médio na prova nos dois momentos e a análise
de correlação e regressão para analisar a relação entre esses desempenhos.
3. Resultados e Discussão A Tabela 1(em anexo) mostra as estatísticas do desempenho dos alunos na prova, nos dois momentos,
assim como o ganho no prós-teste. No pré-teste, a pontuação variou de 7 a 22 pontos, com uma média de
14,4 pontos e um desvio padrão de 4,2 pontos. Já no pós-teste verifica-se um ganho médio de 45,9%,
passando para uma média de 21,1 pontos, com um desvio padrão de 5,0 pontos, conforme ilustra a Figura
2 (em anexo).
O desempenho no pós-teste foi superior conforme o resultado do teste t-student (t(15)= 6,955; p = 0,000).
Além disso, foi verificada uma boa correlação no desempenho nos dois momentos (r = 0,671; p=0,004),
sendo que todos os alunos tiveram ganhos positivos conforme ilustra a Figura 2 e os resultados da análise
de regressão: Pós-teste = 0,7993*Pré-teste + 9,5227, com um coeficiente de determinação de 45,1%, isto é
Fig.1
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45,1% da variação no desempenho no pós-teste fica explicado pela variação do desempenho no pré-teste.
Na Figura 3 (em anexo) observa-se que todos os pontos caem acima da reta da igualdade, bem como o
coeficiente angular é menor que a unidade, 0,8, isso significa, por um lado, de que para cada ponto
adicional no pré-teste o ganho no pós-teste será de 0,8 pontos, mas de outro lado, a inclinação ser menor
do que a unidade significa que em média, os alunos que entraram com menor desempenho no pré-teste
foram mais beneficiados do que aqueles que entraram com maior desempenho. Em outras palavras, os
resultados apontam que este tipo de trabalho beneficia os alunos com maiores problemas de
aprendizagem.
4. Conclusões A utilização do soroban auxilia na compreensão da contagem e dos algoritmos das operações aritméticas,
uma vez que o aluno faz a transposição do contexto concreto para a representação com símbolos
escritos, entendendo a estrutura posicional do sistema de numeração decimal, e não apenas decorando
as técnicas operatórias. Observa-se, ainda, que este recurso auxilia mais aos alunos que apresentam
maiores dificuldades de aprendizagem ,fato que justifica o uso do soroban no ensino fundamental.
5. Referências Bibliográficas [1] IMENES, Luiz Márcio- A NUMERAÇÃO INDO-ARÁBICA – Editora Scipione. São Paulo, 1989
[2] IFRAH, Georges- OS NÚMEROS, A HISTÓRIA DE UMA GRANDE INVENÇÃO- Editora Globo. São
Paulo, 2001.
[3] DOMINGUES, Hygino- FUNDAMENTOS DE ARITMÉTICA- Atual Editora. São Paulo, 1990.
[4] CARAÇA, Bento de Jesus- CONCEITOS FUNDAMENTAIS DA MATEMÁTICA- Editora e Livraria Sá da
Costa. Lisboa. 1984.
[5] STRUIK, Dirk J.- HISTÓRIA CONCISA DAS MATEMÁTICAS- Editora Gradiva. Lisboa, 1990.
[6]http://www.soroban.org.br
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Anexo 1
Tabela 1. Desempenho dos alunos na prova no pré-teste e no pós-teste
n Mínimo Máximo Media
Desvio
padrão
Pré-teste 16 7 22 14,44 4,211
Pós-teste 16 10 30 21,06 5,013
Ganho (%) 16 8,3 116,7 45,9 33,5
Ganho=100*(Pós-Pré)/Pré
Anexo 2
1616N =
Pós-testePré-teste
Pon
tuaç
ão
35
30
25
20
15
10
5
0
Figura 2. Desempenho dos alunos na prova no pré-teste e no pós-teste
13
Anexo 3
0
5
10
15
20
25
30
35
0 5 10 15 20 25 30 35
Pontuação no pré-teste
Pont
uaçã
o no
pós
-test
e
(Fig.3)
Pós-teste = 0,7993*Pré-teste + 9,5227
14
CICLO, PROGRESSÃO E AVALIAÇÃO NO ENSINO DE MATEMÁTICA – AS DIVERSAS FACES DE UMA MESMA EQUAÇÃO –
Afonso Martins Andrade
Faculdade de Educação- USP
Mestrado em Ensino de Ciências e Matemática
afonso@usp.br
Orientadora – Profa. Dra. Maria do Carmo Santos Domite
Resumo: Durante os últimos anos muitas hipóteses têm sido feitas e levantadas a cerca da implantação do
ciclo, da progressão continuada e de novas metodologias de avaliação como fatores preponderantes na
manutenção do fracasso na disciplina de matemática e de que forma estes assuntos se inter-relacionam,
contudo os argumentos apresentados e relacionados para sustentar ou rebater tal discussão não tem tido
ao longo do tempo o necessário respaldo cientifico. Desde os tempos mais remotos até aproximadamente a
década de 90 que a metodologia de ensino de matemática não sofreu alterações significativas; baseada
quase que exclusivamente na transferência de conteúdos conceituais tornou-se obsoleta não pela
estagnação conceitual mas sim metodológica. Enquanto que suas abordagens conceituais enfatizavam
somente a assimilação da técnica de produção em todas as series do ensino fundamental e médio, o
planejamento por sua vez era feito a partir da constatação dos conteúdos contidos e exibidos no índice do
livro adotado pela escola ou pelo professor. O regime de ciclos com progressão continuada não abre a
possibilidade de promoção automática, nem muito menos desconsidera etapas de escolaridade a serem
vencidas. Ele traz consigo a oportunidade / perspectiva de se dar um outro sentido a avaliação na escola. A
avaliação passa a ser o instrumento guia na progressão do aluno no seu percurso escolar, apontando as
diferenças na aquisição de habilidades e conhecimentos entre os alunos e orientando o trabalho do
professor na condução desse processo. Deixa de ser repressora, castradora e comparativa para ser
norteadora e estimuladora do processo ensino-aprendizagem.
Apresentação
Durante os últimos anos muitas hipóteses têm sido feitas e levantadas a cerca da implantação do
ciclo, da progressão continuada e de novas metodologias de avaliação como fatores preponderantes na
manutenção do fracasso na disciplina de matemática e de que forma estes assuntos se inter-relacionam,
contudo os argumentos apresentados e relacionados para sustentar ou rebater tal discussão não tem tido
ao longo do tempo o necessário respaldo cientifico.
Com o objetivo de identificar até que ponto a implantação do ciclo, da progressão continuada e de
novos sistemas avaliativos contribuíram ou não para a diminuição do fracasso em matemática, e de que
forma isto se deu, seja pela pura e simples manipulação estatística ou pela criação e desenvolvimento de
novas metodologias de ensino.
Objeto e Problema da Pesquisa Este projeto tem por finalidade analisar e discutir de que maneira a implantação do sistema de ciclos contribui ou não na redução / manutenção do fracasso escolar em função da aplicação / criação de novas metodologias e concepções de ensino na disciplina de matemática.
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O problema posto agora, é a necessidade de considerar que podemos identificar duas propostas
distintas de ciclo, a primeira denominada de Ciclo de Formação a qual exige uma proposta global e
generalizada capaz de redefinir os tempos e espaços da escola e a segunda denominada Ciclos de
Progressão Continuada que se destina a viabilizar / facilitar o fluxo de alunos e tentar melhorar sua
aprendizagem com elementos e instrumentos de apoio e reforço (Freitas, 2003).
Justificativas A Questão Histórica: o Porque da Progressão
A partir da segunda metade do século XX, com a implantação de governos democráticos nos
países ocidentais, o impacto do crescimento industrial e urbano levou a um enorme crescimento da classe
média, devido a isto, as classes dirigentes foram obrigadas a aceitar o compromisso de democratização da
informação e do saber. Neste processo, a escola passa a desempenhar um papel fundamental,
principalmente para os grupos mais humildes da população que só terão condições de acesso ao saber
sistematizado, através da ampliação dos serviços públicos ofertados pelo Estado. Com o passar dos anos,
a concepção de escola do passado começa a ruir graças a diferentes contribuições científicas, como da:
Psicologia do Desenvolvimento e da Aprendizagem, da Neurologia, da Epistemologia Genética, da
Pedagogia Moderna e do Sócio Construtivismo que mostraram, que a aprendizagem das crianças tem
características próprias e de forma distinta dos adultos; que o processo de aprendizagem é progressivo e
cumulativo e nem sempre ocorre de forma linear, mas sim por saltos e em ciclos. (Neubauer, 2001)
Assim, ao modelo de relação pedagógica autoritária, elitista e excludente até então existente irá
contrapor-se um radicalmente novo, onde o ser que aprende - o aluno - passará a ser o centro do
processo de aprendizagem, este novo modelo deverá estimular o aluno à participação, atividade
construtiva, pesquisa, comportamento e posicionamento crítico.
Importantes pensadores, teóricos e educadores contribuíram para a construção deste novo modelo,
vale lembrar aqui: Montessori, Piaget, Wallon, Anísio Teixeira, Ana Maria Popovich, Paulo Freire, Emília
Ferreiro entre tantos outros. Propõe, uma escola democrática marcada por relações pedagógicas de
inclusão, troca, respeito e estimulação, o aluno deve ser respeitado, suas características bio-psico-sociais
consideradas no processo de planejamento, desenvolvimento e avaliação do ensino; ao professor é
atribuído o importante papel de mediador, facilitador do processo de aprendizagem, isto é, o de criar as
condições necessárias e adequadas de exposição e apropriação do conhecimento pelos alunos, contudo
estas novas atribuições implicarão maior responsabilidade, dentre elas, zelar e garantir a aprendizagem do
educando. Logo a função do professor que era apenas de ensinar será agora a de levar o aluno a aprender
e a participar efetivamente do processo de ensino-aprendizagem. (Neubauer, 2001)
Com o passar do tempo vários países se dão conta da necessidade urgente de adotar um novo
modelo de educação e mudar radicalmente a cultura da escola, rompem com o modelo anterior e adotam o
sistema de ciclos da aprendizagem para melhor assegurar a permanência com sucesso das crianças na
escola e a formação de cidadãos críticos e criativos. Esta mudança tem algumas premissas básicas
fundamentadas nas ciências modernas. São elas:
• O ser humano é singular, desde o início de sua vida apresenta ritmos e estilos significativamente
diferentes para realizar toda e qualquer aprendizagem - andar, falar, brincar, comer com autonomia, ler,
escrever, relacionar-se, analisar, interpretar, etc;
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• Toda aprendizagem, inclusive a cognitiva, é um processo contínuo, que ocorre em progressão e não
pode nem deve ser interrompida ou sofrer retrocessos ao longo do percurso.
• Toda criança que não detenha problemas ou traumas mentais, quando exposta a situações motivadoras
de ensino é capaz de aprender e avançar em relação a seus padrões anteriores de desempenho e
aprendizagem;
• Padrões de aprendizagens cognitivas desenvolvidas pela escola podem ocorrer com maior ou menor
grau de intensidade em função das características e estimulação desenvolvidas dentro dos ambientes
sociais de onde seus alunos provêm;
• Nos anos iniciais de escolaridade, o desempenho cognitivo e acadêmico de crianças e jovens de
diferentes classes sociais tende a atingir, patamares médios bastante semelhantes, se forem
respeitados as dificuldades e obstáculos iniciais dos alunos e garantida a aprendizagem continuada
com reforço, orientação e processos paralelos de acompanhamento para aqueles que ao longo do ciclo
apresentem maiores dificuldades na relação ensino-aprendizagem.
É, portanto, na Lei de Diretrizes e Bases de 1996, que já estão inscritas e garantidas as diferentes
formas de organização do ensino que ampliam as possibilidades de avanço e respeito à aprendizagem dos
alunos. É nela que está claramente proposta a aprendizagem em progressão continuada na forma de ciclos.
Lá estão apontadas também as formas de fazê-la com sucesso: ampliação da jornada escolar, a
recuperação paralela e contínua dos alunos com dificuldades de aprendizagem, as horas de trabalho
coletivo remunerado do professor para avaliação e capacitação; a proposta de esquemas de aceleração de
aprendizagem para alunos multi-repetentes com grande defasagem idade-série; além do direito à
reclassificação de estudos para todos aqueles que conseguiram aprender, independentemente da
freqüência às escolas. É uma lei renovadora, que buscava provocar mudanças no sistema educacional
brasileiro, na medida em que pretendia criar condições de acesso ao conhecimento para toda a população,
o que até então a escola brasileira não tinha sido capaz de fazer.
No dia 30 de julho de 1997, o Conselho Estadual de Educação de São Paulo instituiu o regime de
progressão continuada para o sistema de ensino paulista, organizado em um ou mais ciclos. O princípio
básico que norteou a decisão dos membros do Conselho é o de que a escola deve ser capaz de ensinar
cada vez melhor, fazendo com que todos os alunos aprendam. A Secretaria da Educação, em consonância
com a nova organização do ensino, optou por dois ciclos: Ciclo I, da 1ª à 4ª, e Ciclo II, da 5ª à 8ª série. A
implantação de dois ciclos de aprendizagem ininterrupta nas escolas que oferecem ensino fundamental
favorecerá a progressão dos alunos. Esse regime de progressão continuada prevê estudos de recuperação
e reforço para os alunos que dela necessitarem, buscando assim mais qualidade para o ensino paulista.
Isto significa que, a partir de 1998, a criança paulista matriculada na 1ª série, na Rede Estadual de Ensino
continuará progredindo durante os quatro anos do Ciclo I. Da mesma forma, o caminho da 5ª até a 8ª série
também será percorrido na forma de ciclo. A avaliação contínua e cumulativa da aprendizagem do aluno
procura identificar a necessidade de atividades de reforço e recuperação para resolver as dificuldades,
assim que elas aparecerem. Avaliando constantemente o aluno, o professor o ajudará a superar cada
problema que ele tiver, oferecendo todas as possibilidades de reforço e recuperação. Se ainda assim, no
término de cada ciclo, excepcionalmente, alguns alunos não tiverem se apropriado dos conhecimentos
mínimos propostos, deverão participar de uma programação específica de estudos que não deverá
ultrapassar um ano. (Viegas, 2001)
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O regime de ciclos e progressão continuada não abre a possibilidade de promoção automática, nem
muito menos desconsidera etapas de escolaridade a serem vencidas. Ele traz consigo a oportunidade /
perspectiva de se dar um outro sentido a avaliação na escola. A avaliação passa a ser o instrumento guia
na progressão do aluno no seu percurso escolar, apontando as diferenças na aquisição de habilidades e
conhecimentos entre os alunos e orientando o trabalho do professor na condução desse processo. Deixa de
ser repressora, castradora e comparativa para ser norteadora e estimuladora do processo ensino-
aprendizagem.(Viegas, 2001)
O Fracasso Escolar : o ensino da matemática antes do ciclo Desde os tempos mais remotos até aproximadamente a década de 90 que a metodologia de ensino
de matemática não sofreu alterações significativas; baseada quase que exclusivamente na transferência de
conteúdos conceituais tornou-se obsoleta não pela estagnação conceitual mas sim metodológica. Enquanto
que suas abordagens conceituais enfatizavam somente a assimilação da técnica de produção em todas as
series do ensino fundamental e médio, o planejamento por sua vez era feito a partir da constatação dos
conteúdos contidos e exibidos no índice do livro adotado pela escola ou pelo professor. (Neto, 1988)
A disciplina de matemática é vista como uma disciplina teórica e por assim ser, esta restrita a sala
de aula, sendo assim para os professores as causas do insucesso dos seus alunos são freqüentemente, a
sua “má preparação” nos anos anteriores. Por um raciocínio recorrente chega-se rapidamente ao 1º ciclo,
daí às insuficiências da educação pré-escolar. Apontam igualmente o fato de muitas famílias terem um nível
socioeconômico e cultural muito baixo — ou terem um nível aceitável mas não incentivarem suficientemente
os alunos. Os professores indicam que os alunos não se esforçam, não prestam atenção nas aulas nem
estudam em casa. Contestam também que os currículos são excessivamente longos e que a necessidade
do seu cumprimento obriga a deixar para trás os alunos mais “lentos”. Por vezes, reconhecem que há certas
matérias mais “áridas”. Responsabilizam assim os alunos, as famílias, os professores dos anos anteriores,
os currículos e as características próprias da disciplina. (Aquino, 1997)
Para os alunos, a principal razão do insucesso na disciplina de Matemática resulta desta ser
extremamente difícil de compreender. No seu entender, os professores não explicam muito bem nem a
tornam interessante. Não percebem para que serve nem porque são obrigados a estudá-la. Alguns alunos
interiorizam mesmo desde cedo uma auto-imagem de incapacidade em relação à disciplina. De um modo
geral, culpam-se a si próprios, aos professores, ou às características específicas da Matemática. (Aquino,
1997)
Para os pais e para a opinião pública em geral, a responsabilidade está nos professores que não
ensinam convenientemente — ou por falta de preparação ou porque não assumem o necessário nível de
exigência — e nos alunos que não se esforçam o suficiente. Algumas vezes referem-se ao peso de fatores
sócio-culturais. Mas todos reconhecem que a Matemática é uma disciplina difícil e que a sua aprendizagem
tem trazido muitas, além de grandes dificuldades em todas as gerações. As causas apontadas decorem
sempre dos mesmos fatos, muito embora apresentem ênfases diferentes: a disciplina, o currículo, o
professor, o aluno, razões de ordem social e cultural. Por vezes as causas aparecem misturadas com
sintomas — com aspectos que são reveladores de insucesso mas que não o explicam por si só. Em todos
os casos as características da disciplina estão sempre presentes. E é curioso verificar que os alunos, como
elo fraco do sistema, são os únicos que aparecem dispostos a aceitar uma parte da responsabilidade pelo
fracasso. (Aquino, 1997)
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Nos anos e décadas que antecederam a adoção do sistema de ciclos, o planejamento de ensino da
disciplina de matemática era feito tomando-se como base o fato do aluno ter somente aquele momento para
aprender, caso isto não ocorresse ele era simplesmente retido na mesma série para que, no ano seguinte,
fosse capaz de recuperar os conteúdos que não tinham sido assimilados ao longo do ano anterior. Como
este aluno já era visto pelo sistema como um aluno que sofria de defasagem de conteúdos referentes a
anos anteriores, eles eram retidos consecutivas e repetidas vezes até que por fim uma grande parcela
destes alunos abandonassem a escola. A adoção do sistema de ciclos e a progressão continuada durante
os mesmos não garantem por si só que o fracasso na disciplina de matemática tenha acabado ou
diminuído, contudo o processo antigo de exclusão ainda é aplicado em diversos estados brasileiros e em
praticamente podas as escolas de ensino médio do país.
Na busca de respostas : A matemática e a nova realidade do sistema de ensino Desde que a implementação do ciclo (com progressão continuada) tornou-se viável oficialmente
com a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional em 1996 (LDB, Lei n.º 9.394, de 20
de Dezembro de 1996) e implantada em caráter oficial no estado de São Paulo pela Secretaria de Estado
de Educação em 1997 (Indicação n.º 8/97 de 30 de Julho de 1997), temos nos deparado com uma
infinidade de questionamentos relativos a sua real contribuição, apesar de todas as criticas sofridas ao
longo da sua implementação , muitas delas devido à forma e não ao conteúdo de como foi e tem se dado
sua efetiva implantação .
Deparamo-nos agora com enormes encruzilhadas, onde o antigo já não nos serve mais e o novo
ainda não está feito, não existem mais soluções prontas , as receitas indiscutíveis do passado não cabem
nas novas tecnologias, a grande quantidade de informações disponível nos dias de hoje, seja por radio,
televisão ou internet supera em muitas e muitas vezes o conhecimento adquirido pelos professores de dez
ou vinte anos atrás. Esta nova realidade que possibilita disponibilizar grandes quantidades de conhecimento
coloca novos desafios a todos os educadores.
A matemática assim como a apropriação de seus códigos e de suas estruturas de aprendizagem do
conhecimento se apresenta de forma cíclica , onde “o ciclo completo da elaboração do conhecimento
envolve a passagem do concreto ao abstrato e o retorno deste ao concreto” (Machado, 2001), sendo assim
é praticamente inviável que um aluno ao termino de um ano letivo tenha tido tempo suficiente para percorrer
e assimilar todo este percurso. Faz-se então necessário um tempo diferente do estipulado, que possibilite
ao aluno abstrair tais conhecimentos matemáticos a partir da caracterização e reconhecimento do concreto,
podendo a partir da aquisição e interpretação dos códigos e conceitos matemáticos tornar-se capaz de
aplicar estas abstrações conceituais na re-elaboração e re-estruturação do concreto.
O objetivo do ensino de matemática, vai além da mera memorização de informações e de casos
exemplares dos quais o professor, inevitavelmente, se vale na busca da transmissão de um conteúdo.
Sendo assim, avaliamos o êxito de qualquer ensino não pela capacidade de reprodução que o aluno tem do
que lhe foi apresentado, mas sim pela sua capacidade de construir soluções próprias a novos problemas,
nem que para isso se faça uso das soluções exemplificadas anteriormente em sala de aula . (Machado,
2001)
Toda situação didática proposta ou imposta de maneira uniforme a todos os alunos será fatalmente
inadequada para um grupo deles. Para alguns , fácil demais; para outros, difícil demais; mesmo que esta
esteja adequada ao nível de desenvolvimento cognitivo dos alunos , ela pode parecer sem sentido para
19
uns, sem valor para outros ou simplesmente não despertar o interesse dos alunos, a ponto de não
desenvolver atividade intelectual suficiente para promover a construção de novos conhecimentos. Daí a
necessidade e importância da diferenciação do ensino; argumenta Perrenoud. (Perrenoud, 1995)
Diferenciar o ensino, diz Perrenoud, “é organizar as interações e atividades de modo que cada
aluno se defronte constantemente com situações didáticas que lhe sejam mais fecundas” (Perrenoud,
1995, p.28). A necessidade de se aprender matemática e de se pensar matematicamente no mundo
moderno esta intimamente ligada ao acelerado desenvolvimento tecnológico da humanidade nos últimos
anos, mas as pesquisas apontam que para exorcizar o fracasso escolar em matemática é necessário
apostar em mudanças, na escola, na sala de aula, no aluno, no professor. Mudança pode significar a
obtenção de um ambiente de aprendizagem culturalmente sensitivo, pode significar otimização de
currículos, introdução de novas tecnologias ou introdução de novos métodos de ensino, conhecimentos,
construção de novos processos avaliativos, práticas e crenças dos professores, ou , simplesmente uma
tentativa de melhora na relação ensino aprendizagem a partir do fato em que os alunos tenham a
possibilidade de completar seu ciclo de desenvolvimento do conhecimento. (Bicudo, 1999)
A maior mudança, hoje, imposta à educação refere-se a introdução do computador, podemos
inclusive argumentar que não houve substituição ou suplementação de processos ou procedimentos, o
computador provocou uma reorganização da atividade humana dentro do sistema de ensino. Nesse sentido,
temos que pensar de que maneira o conhecimento pode estar sendo gerado em ambientes formais ou
informais de aprendizagem, onde devemos considerar os diferentes sistemas de mídias disponíveis na
geração / produção deste conhecimento. (Bicudo, 1999)
Temos um mundo novo pela frente e para garantir a sobrevivência daquilo que nos acostumamos
de chamar de escola, será necessário revermos nossas posições em relação ao que se ensinar, como se
ensinar e porque se ensinar.
Objetivos e Hipoteses
A Matemática e os Conceitos de Conhecimento dentro do Ciclo O sistema de ciclos , que tem sido apontado por muitos como causador da baixa qualidade de
ensino, na verdade só revelou um problema com o qual a escola brasileira convive há décadas. O nosso
sistema de ensino sempre teve dificuldade em promover uma educação democrática de qualidade, porém, o
problema sempre foi atribuído ao aluno que era reprovado várias vezes nas séries iniciais e acabava
abandonando a escola. O que o sistema de ciclos fez foi mostrar que o nosso sistema educacional tem sido
incapaz de assegurar um ensino fundamental de 8 anos, com padrões mínimos de qualidade para todos os
brasileiros, em especial para os mais pobres. Não devemos nos iludir com propostas simplistas, como por
exemplo, o encurtamento dos ciclos, para um problema que é complexo e histórico.
A presença do ciclo leva os professores a analisar em suas concepções o papel e as finalidades do
ensino fundamental e médio na sociedade brasileira contemporânea e o significado do processo de
aprendizagem de seus alunos. Para muitos professores, diretores e famílias, herdeiros da tradição criada
pela estrutura elitista e excludente da escola brasileira, a organização escolar em ciclos; os quais por
definição, não comportam a retenção em seu interior; não pode ser produtiva para a aprendizagem dos
alunos . Contudo, estudos desenvolvidos têm apresentado que as aprendizagens se fazem por espirais e
que mesmo que algumas aquisições fiquem prejudicadas por um certo período enquanto se desenvolve o
complexo processo de ensino-aprendizagem, a não-retenção dos alunos no ciclo pode permitir mais
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avanços do que quando é defendido um ritmo homogêneo e linear de domínio de conteúdos
escolares.(Hessen,1973; Bruner, 1987)
Assim o sistema de ciclos não se alia de forma alguma com possível rebaixamento do ensino, antes
envolve pensar sempre em diversas formas de prover aprendizagens essenciais, com o domínio de
habilidades e atitudes de busca de novas informações e conhecimentos, de cooperação, etc., através de um
projeto consistente de trabalho pedagógico elaborado e desenvolvido em equipe. Só há aprendizagem
quando a criança reage dinamicamente a uma questão que suscite o seu interesse e responda à sua
curiosidade. A resolução de problemas em matemática exige necessariamente a utilização de
conhecimentos e o domínio de técnicas que, deste modo, se tornam significativas. Nesta fase do seu
desenvolvimento, as crianças interessam-se sobretudo por jogos e histórias (vividas ou de fantasia) que
apresentem questões interessantes para resolver e que constituem verdadeiros problemas, à medida que a
sua idade avança interessa-se também por problemas práticos se estes se relacionarem com a sua vida na
escola ou resultarem da abertura desta à comunidade.
Em síntese, tal como os demais referenciais das outras áreas de conhecimento, os estudos
pedagógicos e psicopedagógicos contribuem para a formulação de um novo paradigma de avaliação
qualitativa, conferindo especial ênfase à avaliação formativa, com insistência num olhar mais descritivo
acerca de como operam os mecanismos de aprendizagem e a construção de conhecimentos pelo aluno. O
eixo desloca-se do produto para o processo da aprendizagem, dando elementos para entender e trabalhar o
papel do erro na escola; acentua-se o caráter diagnóstico da avaliação; a auto-reflexão do aluno sobre
como aprende e o que aprende; a consideração de outras dimensões da avaliação que não a
exclusivamente cognitiva; a interatividade no processo avaliativo. Embora gozando de grande consenso na
área, o que vem a tona em relação ao paradigma de avaliação qualitativa é sobretudo a afirmação de certos
pressupostos, como tendo sido constatada grande lacuna em termos da metodologia e de procedimentos a
serem adotados para viabilizá-lo na prática. (Hadji, 2001)
Quadro Teorico O nosso sistema educacional não comporta especulações a cerca da necessidade ou não da
manutenção do sistema de ciclos e de progressão continuada, mas sim de que forma estes sistemas podem
ser vistos, revistos e aperfeiçoados de modo que efetivamente possamos reverter o quadro de fracasso
não só na disciplina de matemática mas em todo o sistema de ensino (Aquino, 1997). Este processo já em
curso em muitas escolas não se deu nem se dá em virtude de algum projeto oficial, mas sim, em razão de
muitos educadores após inúmeras discussões e reflexões, buscaram a partir de suas experiências
individuais e coletivas a criação de novas estruturas e concepções metodológicas capazes de corrigir se
não que integralmente pelo menos parcialmente os desvios e erros cometidos durante a implantação do
sistema de ciclo.
A concepção de rede e espirais de conhecimento assume uma posição de destaque neste cenário;
hoje uma grande parcela dos livros didáticos de ensino fundamental são construídos e concebidos a partir
destas teorias desenvolvidas de forma experimental ao longo dos últimos anos; a construção destas novas
estruturas e concepções metodológicas vem no intuito de garantir o acesso e a permanência das crianças à
escola. Não podemos esquecer que para superarmos as dificuldades, desajustes e deficiências promovidos
pelo grande aparato tecnológico hoje disponibilizado no mundo (em países como o Brasil a informatização
ainda é restrita às elites financeiras e culturais) temos que ter em mente que será necessário incorporar os
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problemas do cotidiano ao currículo, determinar novas competências para ensinar, que o essencial é o que
o aluno aprende e não o conteúdo ensinado, manter atualizadas as metodologias de ensino e desenvolver
praticas pedagógicas eficientes, inclusão de projetos nos currículos favorecendo a atuação aluno-professor,
as posições e propostas defendidas por Edgar Morin, Philippe Perrenoud, César Coll, Antonio Nóvoa e
Fernando Hernández, mostra-se a cada dia que passa mais consistentes do ponto de vista da necessidade
de darmos continuidade às pesquisas desenvolvidas e relacionadas ao aperfeiçoamento da metodologia e
da qualidade de ensino. (Marangon, 2002)
Fontes, Procedimentos e Etapas Estrutura do Projeto
Este projeto tem a finalidade de reunir informações e subsídios que possibilitem um melhor
entendimento e um maior grau de aprofundamento na discussão de quais são os pressupostos,
fundamentos, condições e implicações fornecidas pelo sistema de ciclos e de progressão continuada ao
sistema educacional e se estes trouxeram ou não melhoras e aprimoramentos a relação ensino-avaliação-
aprendizagem na disciplina de matemática. Para o desenvolvimento desta pesquisa foram definidos,
basicamente, quatro tipos de materiais. O primeiro, relativo a documentos legais e oficiais de instâncias dos
sistemas de ensino que tem como objetivo uma normatização ou determinação de procedimentos e que
procuram fixar orientações, indicações e que dão fundamentação para iniciativas concretas de
implementação de ciclos. O segundo, referente à literatura disponível sobre o objeto, consubstanciado em
livros, artigos, teses e dissertações, além de literatura que se articula ou se relaciona a temas ligados
intimamente a ciclos. O terceiro, colhido a partir da aplicação e tabulação dos questionários (múltipla
escolha e respostas dissertativas) com profissionais (supervisores, diretores, coordenadores pedagógicos,
docentes e professores) da área de educação. O quarto, e último segmento, são a transcrição das
entrevistas com profissionais (supervisores, diretores, coordenadores pedagógicos, docentes e professores)
da área de educação.
Publico a ser pesquisado Supervisor de Ensino, Diretor de Escola e Coordenador Pedagógico: dois de escola publica municipal e
dois de escola publica estadual.
Docentes: dois da área pedagógica de licenciatura em matemática.
Professores: pelo menos 10 professores de diversas disciplinas da rede pública municipal e estadual de
ensino, além dos professores de matemática da Escola de Aplicação da FEUSP.
Procedimentos e Etapas
1ª FASE : Consiste em buscar subsídios teóricos que garantam objetividade , clareza e precisão
na construção dos questionários que serão aplicados nos profissionais entrevistados.
2ª FASE : Identificar quais as unidades de ensino serão selecionadas para a pesquisa.
3ª FASE : Aplicação dos questionários e entrevistas nos respectivos grupos e unidades, após a
aprovação dos mesmos pelo orientador. (Trabalho de Campo)
4ª FASE : Tabulação dos dados colhidos pelos instrumentos de pesquisa e transcrição das
entrevistas.
22
5ª FASE : Construção da dissertação .
Bibliografia Usada na Construção do Projeto ALAVARSE, Ocimar Munhoz: “Ciclos:a escola em (como) questão”, Dissertação de Mestrado em Educação,
FEUSP, São Paulo, 2002
AQUINO, Julio Groppa (organizador): “Erro e Fracasso na Escola : Alternativas Teóricas e Práticas”,
SUMMUS Editorial, São Paulo, 1997.
BICUDO, Maria Aparecida Viggiani (organizadora): “Pesquisa em Educação Matemática: Concepções &
Perspectivas”, Editora UNESP, São Paulo, 1999.
BRUNER, Jerome S. : “O Processo da Educação”, Nacional, São Paulo, 1987.
C.E.E., Secretaria de Estado de Educação, D.O.E : Indicação n.º 8/97. 30.07.97. Institui no sistema de
ensino do Estado de São Paulo o regime de Progressão Continuada no ensino fundamental. Relatores:
Francisco Aparecido Cordão e Nacim Walter Chieco. SÃO PAULO., 01-08-1997.
C.E.E., Secretaria de Estado de Educação. Indicação n.º 22/97 : “Avaliação e progressão continuada”,
Relatores: Bernadete Angelina Gatti, SÃO PAULO, 17.12.1997
C.E.E., Secretaria de Estado de Educação. Parecer n.º 269/2002: “Consulta sobre progressão de aluno”,
Relatora: Sonia Terezinha de Sousa Penin, SÃO PAULO, 03.07.2002
CEE, Secretaria de Estado de Educação, D.O.E.: Deliberação 09/97, 30-07-97. Fixa as normas para
elaboração do regimento dos estabelecimentos de ensino fundamental e médio. Relator: Francisco
Aparecido Cordão, SÃO PAULO, 01-08-1997.
EDUCAÇÃO, Ministério da (Brasil) : “Parâmetros Curriculares Nacionais : Ensino Médio”, Brasília , 1999.
EDUCAÇÃO, Ministério da (Brasil): ”Parâmetros Curriculares Nacionais : Ensino Fundamental”, Brasília,
1999.
EDUCAÇÃO, Ministério da (Brasil): Lei n.º 9.394, de 20.12.96, “Estabelece Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDB)”; In: Diário Oficial da União, Ano CXXXIV, n.º 248, pp. 27.833 - 27.841, Brasília,
23/12/1996
EDUCAÇÃO, Ministério da (Portugal): “Ensino Básico, Programa de Matemática : plano de organização do
ensino-aprendizagem”, Imprensa Nacional, Lisboa, 2001.
FREIRE, Paulo : “Pedagogia da Autonomia”, Paz e Terra, Rio de Janeiro, 1996.
FREIRE, Paulo : “Pedagogia da Esperança”, Paz e Terra, Rio de Janeiro, 1992.
FREITAS, Luiz Carlos de : “Ciclos, Seriação e Avaliação”, MODERNA, São Paulo, 2003
HADJI, Charles : “Avaliação Desmistificada”, ARTMED, Porto Alegre, 2001
HESSEN, Johannes - Teoria do Conhecimento. 6ª ed. Coimbra: Armênio Amado, 1973
MACHADO, Nílson José: “Epistemologia e Didática: As concepções de conhecimento e inteligência e a
pratica docente”, Cortez Editora, São Paulo, 1995
MACHADO, Nílson José: “Matemática e Realidade”, Cortez Editora, São Paulo, 2001.
MARANGON, Cristiane e LIMA, Eduardo : “Os novos Pensadores da Educação”, Nova Escola, Ed. Abril,
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NETO, Ernesto Rosa: “Didática da Matemática”, São Paulo, 1988.
NEUBAUER, Rose: “Quem tem medo da progressão continuada? Ou melhor, a quem interessa o sistema
de reprovação e exclusão social?”, Artigo da SEE, São Paulo, 2001.
NÓVOA, Antonio : “Profissão Professor”, Ed. Porto, Lisboa, 1992.
23
PERRENOUD, Phillipe : “La pédagogie à école des différences”, ESF., Paris, 1995
PINTO, José Marcelino R., CIANFLONE,Ana Raquel L. e JALLES, Cristina Ruffino – Docentes da FFCLRP-
USP “A progressão continuada não é a causa nem a solução mágica para os problemas da educação no
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S.E.E. Subsídios: implementação do regime de progressão continuada no ensino fundamental. Escola de
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VIEGAS,Lygia de Sousa : “Progressão continuada e suas repercussões na escola pública estadual paulista:
concepções de educadores”, , Instituto de Psicologia (IP) da USP, orientação da professora Marilene
Proença Rebello de Souza, Dissertação de Mestrado da USP, São Paulo, 2001.
24
EDUCAÇÃO MATEMÁTICA NO CURSO NORMAL: UMA RETROSPECTIVA HISTÓRICA
Edda Curi
Professora do Programa de Mestrado
em Ensino de Ciências e Matemática da
UNICSUL
edda.curi@terra.com.br
Resumo: Este artigo, fruto da revisitação de minha tese de doutorado1, tem como finalidade identificar
como, em tempos passados, os cursos de formação de professores polivalentes2 contemplaram a
preparação para ensinar Matemática, buscando indícios das influências que orientavam a direção desses
cursos e do que Shulman (1992) denomina de “paradigma perdido”, ou seja, a mudança de foco “do que
ensinar para o como ensinar”. Foram analisados documentos elaborados por órgãos normativos e
instituições formadoras, manuais didáticos e revistas destinadas ao ensino e à formação do professor.
Focalizo o período que se inicia com a criação do Curso Normal3 em 1835 e vai até o início da década de
1930. A pesquisa evidenciou o predomínio de uma formação genérica, assentada nos fundamentos
religiosos, da moral e bons costumes no período de criação desses cursos, uma perspectiva de estudos de
conteúdos disciplinares sob a influência do positivismo no inicio do século 20, e o foco nos Fundamentos da
Educação a partir de 1920. Permitiu ainda conjecturar que não se considerava a necessidade de construir
conhecimentos de Matemática para ensiná-la, deixando transparecer uma concepção de que o professor
polivalente não precisa “saber Matemática”, basta saber como ensiná-la.
A lembrança não pode ser vista como uma coisa nostálgica, mas
como uma forma de pensar o presente para se pensar o futuro.
Augusto Boal
Introdução
As pesquisas sobre formação de professores vêm tomando corpo no Brasil nos últimos anos. Além
da quantidade considerável de trabalhos, há uma diversidade de enfoque sobre o tema. Na tentativa de
ampliar o debate sobre a relação da história com a formação inicial do professor polivalente e com o ensino
de Matemática, revisitei os dados de minha pesquisa de doutorado4 centrando a reflexão na parte histórica.
Selecionei para discutir neste artigo a questão: como (e se) os cursos de formação dos professores
polivalentes, ao longo de sua história, contemplaram e trataram a formação desse profissional para ensinar
Matemática, destacando o período iniciado com a criação do Curso Normal no Brasil até a década de 1930.
A justificativa de uma pesquisa histórica num estudo sobre formação de professores baseia-se em
Tardif (2000) que considera que os saberes docentes evoluem com o passar do tempo. O autor afirma que
“os conteúdos que os professores ensinam” e a “sua maneira de ensinar” evoluem com o tempo e com as
1 Defendida na PUC/SP em agosto de 2004 sob orientação da prof. Dra Célia Maria Carolino Pires. 2 Que atuam nos anos iniciais do Ensino Fundamental, ensinando todas as disciplinas. 3 Denominação comumente dada aos cursos de formação de professores dos anos iniciais da escolaridade básica. 4 O objetivo de minha tese de doutorado era analisar os conhecimentos dos professores polivalentes para ensinar Matemática e de
estudar as crenças e atitudes que interferem na constituição desses conhecimentos.
25
mudanças da sociedade. Revela ainda que os conteúdos da Pedagogia e da Didática, assim como as
concepções de Aprendizagem e de Ensino dependem intimamente da história da sociedade, de sua cultura,
das hierarquias que predominam na educação. Destaca que os saberes disciplinares correspondem aos
saberes que a sociedade dispõe e que são integrados nas instituições formadoras, sob a forma de
disciplinas. Conclui que esses saberes (como, por exemplo, Matemática) emergem dos grupos produtores
de saberes, mas incorporam concepções dos formadores e da própria instituição formadora.
As escolas de formação de professores no Período do Império: a preocupação com a moral e os bons costumes
Entre os documentos oficiais analisei grades curriculares e Programas da Escola Normal da
Província de São Paulo, listas de pontos publicadas para o Exame final e destinadas a concursos de
ingresso de professores.
Na lista de pontos destinados aos exames finais da Escola Normal da Província de São Paulo
observa-se a preocupação com a caligrafia, com métodos disciplinares, com a moral e os bons costumes
dos professores. Não havia nenhuma alusão aos conteúdos matemáticos, embora nas grades curriculares
do Curso Normal houvesse as disciplinas de Aritmética e Sistema Métrico.
Tabela 1 - Lista de pontos para os Exames da Escola Normal da Província de São Paulo
Fonte: Monarcha (1999)
I Pedagogia
1O que seja pedagogia, qual sua matéria e em quantas partes se divide seu estudo;
2. Educação e Instrução;
3. Espécies de Educação;
4. Educação Física;
5. Educação Intelectual;
6. O professor e seus predicados;
7. A escola e suas condições materiais;
8. Mobília e utensílios da escola;
9. Métodos de ensino;
10. Penas e recompensas na escola;
11. Métodos disciplinares na escola;
12. Métodos de leitura.
II Doutrina Cristã
1. O que seja doutrina cristã e de quantas partes consta seu catecismo;
2. Profissão de fé católica;
3. O Credo;
4. Mandamentos da Lei de Deus;
5. Mandamentos da Santíssima Lei da Igreja;
6. Sacramentos da Lei da Graça;
7. Sacramentos em geral;
8. Sacramentos do Batismo;
9. Oração em geral;
10. Oração dominical e outras;
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11. Sacramento da Eucaristia;
12. Os pecados e virtudes.
III Caligrafia
1. Letras primitivas e letras derivadas;
2. Formação das letras;
3. Letras maiúsculas e minúsculas e seus usos;
4. Bastardo, bastardinho, cursiva;
5. Modo de aparar a pena;
6. Posição do corpo, modo de pegar a pena, colocação do papel ou do livro;
7. Modos de traçar as letras;
8. Métodos de escrever;
9. Método da letra cursiva;
10. Primeiras lições de escrita;
11. Inclinação das letras;
12. União das letras e espaços entre as palavras, bem com a divisão delas no fim da linha.
Segundo Tanuri (2000), a influência iluminista predominava no ensino da época da monarquia,
visando a regulação de condutas, buscando desenvolver comportamentos pessoais e sociais compatíveis
com a monarquia instalada.
A autora afirma que os programas dos cursos normais eram rudimentares, não ultrapassando o
nível dos conteúdos das Escolas de Primeiras Letras. A formação pedagógica era limitada a uma disciplina
denominada Métodos de Ensino, que devido à consagração do ensino mútuo5 reduzia o preparo profissional
do professor à compreensão desse método.
Mas não era preciso nem ao menos freqüentar o curso normal para ser professor. Segundo
Monarcha (1999) e Tanuri (2000), se um cidadão “de bem” exercesse o magistério por dois anos e fosse
aprovado em concurso promovido pela Província, se tornaria professor vitalício. Bastava que o professor
lesse corretamente, escrevesse com caligrafia satisfatória, efetuasse as quatro operações, mesmo com
dificuldades ou com alguns erros, e recitasse de cor as Orações da Igreja para ser aprovado.
Tanuri (2000), entre outros autores, informa que o livro do Barão Gérando era usado nos cursos
normais no período do Império. Esse livro, escrito na França e traduzido no país, discutia temas voltados à
formação da personalidade do professor (Tabela 2).
Tabela 2 – Temas de confereência do livro de Barão Gerando Fonte – Tanuri (2000)
1 Dignidade das funções dos professores de primeiras letras
2 Disposição e qualidades necessárias ao professor de ensino primário
3 Educação nas escolas primárias
4 Educação Física
5 Educação intelectual- como pode o professor de primeiras letras cultivar a atenção, a
imaginação e a memória
6 Continuação da matéria antecedente - como pode o professor de primeiras letras formar
5 O ensino mútuo era utilizado na Europa e permitia que um único professor ensinasse a muitos alunos. Até então cada professor
ensinava apenas para um aluno.
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o juízo e a razão de seus alunos
7 Continuação da matéria antecedente - como pode o professor de primeiras letras
cultivar a instrução nas escolas de primeiras letras
8 Continuação da matéria antecedente - como pode o professor de primeiras letras
cultivar o método na instrução elementar
9 Educação Moral nas escolas de primeiras letras
10 Continuação da matéria antecedente - como pode inspirar o professor de primeiras
letras aos discípulos o sentimento de seus deveres
11 Educação Religiosa – parte que nela deve tomar o professor de primeiras letras
12 Com procede o professor de primeiras letras no ensino dos deveres
13 Como trabalha o professor de primeiras letras para fortificar o caráter dos meninos
14 Algumas molas da educação – hábito e imitação
15 Algumas molas da educação – trabalho e ordem
16 Últimos conselhos aos mestres de primeiras letras.
Tanuri afirma que, mesmo com a predominância da formação voltada ao desenvolvimento da moral
e dos bons costumes as grades curriculares dos Cursos Normais englobavam as disciplinas Aritmética e
Geometria. Em 1875 os conteúdos relativos ao Sistema Métrico Decimal foram incluídos na Aritmética.
As escolas normais na Primeira República: a influência do positivismo A influência do Positivismo6 acarretou mudanças no Curso Normal incorporando disciplinas de
cunho científico, aumentando as disciplinas ligadas à Matemática7, incluindo Álgebra, Trigonometria e
Escrituração Mercantil.
Tabela 3. Grade Curricular da Escola Normal de São Paulo. Fonte Anuário Estatístico do Estado de São Paulo de 1895
Cadeira Horas de trabalho por semana, 1o e 2o anos
Portuguez 2
Portuguez e História da Língua 2
Francez 2
Latim 2
Inglez 2
Aritmética e álgebra 1
Geometria e trigonometria 1
Astronomia 1
6 O positivismo opôs-se às abstrações da teologia e da metafísica. Ideologia e movimento filosófico fundado por Auguste Comte, o
positivismo tem como base teórica os três pontos seguintes: (1) todo conhecimento do mundo material decorre dos dados "positivos" da experiência, e é somente a eles que o investigador deve ater-se; (2) existe um âmbito puramente formal, no qual se relacionam as idéias, que é o da lógica pura e da matemática; e (3) todo conhecimento dito "transcendente" -- metafísica, teologia e especulação acrítica -- que se situa além de qualquer possibilidade de verificação prática, deve ser descartado.
7 denominação carinhosa dada à escola Normal da Província de São Paulo após a inauguração de sua nova sede na Praça da
República.
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Mecânica 1
Física e Química 2
História Natural 2
Astronomia e fisiologia 1
Geografia 2
História 2
Economia Política e Educação
Cívica
1
Pedagogia e Direção de Escola 1
Caligrafia e Desenho 1
Disciplinas Horas de trabalho por semana 1o ano/2o ano
Escrituração Mercantil 2/2
Economia Doméstica 3/2
Exercícios Militares e Ginástica 2/3
Trabalhos manuais 2/2
Música 6/6
A Influência Positivista também se fazia presente nos livros de Matemática que priorizavam o treino
de habilidades estritamente técnicas, uma programação extensa centrada em exercícios. Utilizei como
critério de escolha dos livros para análise a
reprodução dos mesmos em várias edições.
Os livros de Trajano (1880), de Dordal
(1901) e de Souza Reis (1919) tinham grande
quantidade de exercícios aritméticos, com ênfase
nos cálculos com números naturais e racionais na
forma fracionária. A formação voltada ao trabalho
no comércio fazia com que os autores incluíssem
proporcionalidade, porcentagem, regra de três e
juros tanto nos livros destinados às escolas
normais como aos escritos para os alunos dos
grupos escolares. Não havia indicações pelos
autores desses livros que os mesmos se
destinavam ao curso normal. Mas, encontramos
no prefácio da segunda edição do livro Arithmetica Progressiva de autoria de Trajano, publicada em 1880,
comentários escritos por diversos formadores de cursos normais, o que permite conjecturar que esse livro
era usado nesses cursos.
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O livro de autoria de Ramom Roca Dordal8, destacava na capa sua utilização no Curso Normal de
São Paulo. O autor chama atenção para a solução dos 2000 exercícios e dos 1000 problemas relativos às
quatro operações aritméticas com números naturais e racionais, proporção e regra de três.
Trajano também apresentava respostas e soluções de questões (figura do livro Arithmetica
Progressiva). Os conteúdos matemáticos desenvolvidos nos livros de Trajano eram: Números naturais,
racionais, operações, medidas de comprimento, de massa e de capacidade, área, raiz quadrada,
proporcionalidade, juros, porcentagens. Cabe salientar ainda que desde o tempo do Império, autores de
livros didáticos apontavam problemas com o ensino de Matemática.
O texto de abertura do livro de Trajano, Arithmetica Progressiva, publicado em 1880, apontava
problemas relativos ao ensino de Aritmética. Nele o autor afirmava que as pessoas, no geral, sabiam pouca
Matemática e que, mesmo as mais inteligentes, não sabiam dispor os termos de uma proporção ou somar
frações.
Considerando o grande número de edições dos
livros de Trajano (71 edições) e de Souza Reis (54
edições), é possível conjecturar que, por muitos anos, os
cursos normais centravam o ensino de Matemática na
Aritmética.
A partir dos anos 20 constatou-se na análise de
revistas especializadas uma tendência de destacar as
metodologias de ensino. Na coleção denominada Revista
de Ensino9, havia programas de ensino, orientações
didáticas para o professor, textos sobre Educação,
legislações, etc. O critério de escolha dessas publicações
foi a presença de textos que discutiam o ensino de
Matemática.
Os assuntos matemáticos mais focalizados nessas revisas eram as quatro operações aritméticas
com números naturais, “as frações”, alguns tipos de problemas. No entanto, os programas do Curso
Primário apresentavam grande quantidade de conteúdos de Geometria.
Tabela 4: Programa de Ensino para os Grupos Escolares Fonte: Revista de Ensino número 2 de 1905,
Aritmética Geometria
1o ano Rudimentos das primeiras operações pelos
meios concretos, com auxilio de taboinhas
ou de tornos de sapateiro.
Ler e escrever números e aprender a ler os
mapas de números.
Uso dos sinais +, -, x , : e =, praticamente
em todas as combinações.
As quatro operações fundamentais até 100.
Esfera, cubo, cilindro, hemisfério, prisma
quadrangular e triangular, estudos quanto
à superfície, às faces, quinas ou linhas,
aos cantos ou ângulos.
8 Livro catalogado no Acervo da E.E. Caetano de Campos. 9 Uma coleção dessas revistas está organizada para consulta no Centro de Referência em Educação Mário Covas. Era publicada pela
Associação Beneficente do Professorado Público de São Paulo
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Cálculo mental. Problemas fáceis.
Algarismos romanos.
2o ano As quatro operações até 1000, inclusive
conhecimentos de ½, 1/3, ¼, etc. Tabuada
de multiplicar e de dividir até 12. Formação
de unidades, dezenas, centenas e milhares.
Soma e subtração. Multiplicação e divisão:
casos simples. Sistema métrico: exercícios
práticos sobre pesos e medidas. Cálculo
mental. Problemas algarismos romanos.
Pirâmide e cone, quanto à superfície, às
faces, às linhas e aos ângulos. Elipsóide
e ovóide. Formas das faces dos sólidos,
nome dos ângulos e das linhas que
limitam a superfície.
3o ano Estudo da multiplicação e da divisão. Fração
decimal: ler e escrever números decimais,
reduzir frações ao mesmo denominador. As
quatro operações com frações decimais.
Sistema métrico decimal. Exercícios práticos
sobre pesos e medidas. Cálculo mental.
Problemas.
Posição das linhas. Construção de
perpendiculares e paralelas, de ângulos,
de triângulos e do quadrado. Medida de
superfície do quadrado e do retângulo.
Problemas.
4o ano Revisão. Frações ordinárias: próprias e
impróprias, homogêneas e heterogêneas.
Redução de frações ao mesmo
denominador pelo processo geral. Adição,
subtração, multiplicação e divisão de frações
ordinárias. Transformar frações ordinárias
em decimais e vice-versa. Sistema métrico
decimal. Cálculo mental. Problemas e
questões práticas.
Avaliação da área dos triângulos,
quadriláteros e polígonos. Circunferência
e suas linhas. Circulo. Construção de
polígonos regulares. Problemas.
Nossa hipótese é que, embora a Geometria constasse da programação do Curso Primário era
pouco ensinada, pois praticamente não havia artigos com orientações didáticas para ensiná-la nas revistas
destinadas ao ensino.
Um fato interessante de apontar é que foi em 1931 que apareceu no currículo no Curso Normal,
pela primeira vez, uma disciplina com o nome de Matemática, unificando as disciplinas Aritmética e
Geometria.
A influência da Psicologia nos cursos de Formação de Professores e o denominado “paradigma perdido”
A partir dos anos 20 identifica-se a influência da Psicologia na Educação e o fenômeno denominado
por Shulman (1992) como “paradigma perdido”.
Shulman (1992) afirma que os tópicos tratados nos textos da Psicologia da Educação na primeira
década do século XX referiam-se à psicologia da aritmética, da leitura, da aprendizagem. Segundo ele, a
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partir dos anos 30, esses assuntos foram sendo substituídos por tópicos gerais tais como memória,
aprendizagem, motivação, tendências que perduraram até os idos de 1960.
No Brasil, a influência da Pedagogia e da Psicologia em detrimento dos conteúdos curriculares,
objetos de ensino, foi se fortificando nos cursos normais com o passar dos anos e dura praticamente até os
dias atuais (CURI, 2004).
Embora as reedições do livro de Trajano indicassem uma preocupação com os conteúdos
matemáticos, mesmo reduzidos à Aritmética, a influência da Psicologia provocava mudanças nos livros
destinados ao Curso Normal. O livro Psicologia da Aritmética de Thorndike foi marcante no país e
influenciou várias gerações de autores de livros de Metodologia do Ensino de Matemática.
Conforme indicação no prefácio, ficava clara a influência da Psicologia:
Esse livro foi escrito com a finalidade expressa de aplicar ao ensino da aritmética
os princípios descobertos pela Psicologia do aprendizado, pela Pedagogia
experimental e pela observação da prática escolar bem-sucedida. (1929, p.7)
É importante salientar que, em conseqüência da influência da Psicologia, os autores de livros
destinados ao Curso Normal preocupavam-se com a motivação no ensino, enfatizando o uso de jogos e
materiais didáticos, o estudo dirigido, tendências fortes do período da Escola Nova10.
O livro de Aguayo (1935) Didática da Escola Nova traduzido em 1935, apresentava vários capítulos
sobre tópicos gerais da Psicologia e outros sobre temas curriculares, entre eles o Ensino de Aritmética, com
sugestões didáticas para os professores.
Esse autor destacava a importância de se respeitar a liberdade da criança na realização dos
procedimentos de cálculos, a utilização de situações da vida real nos problemas aritméticos e a observação
dos processos de raciocínio na resolução dos problemas ao invés da apresentação por parte dos
professores de soluções dos mesmos. Nesse sentido, o aluno torna-se ativo e o professor deixa de ser o
centro tornando-se elemento facilitador da aprendizagem. Aguayo, no prefácio de seu livro, reafirma essa
concepção:
Não é o ensino obra receptiva, em que, de modo passivo e relativamente inerte, a
criança adquire o que o professor lhe transmite e sim processo de aprendizagem,
esforço dirigido no sentido de formação ou modificação da conduta humana. De acordo
com essa doutrina pedagógica, o aluno aprende por si e o mestre se resume em dirigi-lo,
encaminhá-lo e estimulá-lo ...
A análise desse livro permite refletir sobre a importância reservada ao ensino de Geometria, pois o
autor dedica menos de uma página a esse assunto, dentre as 30 páginas destinadas à Matemática. Afirma
apenas que o ensino de Geometria se confunde com o do Desenho e não deve ir além dos exercícios e
problemas que têm aplicação na vida real. Não há nenhuma orientação ao futuro professor sobre como
ensinar Geometria como o autor fez com a Aritmética. Cabe ressaltar que, entre os livros analisados, este
foi o único que apresentava alguma orientação sobre o ensino de Geometria.
A preocupação de apresentar soluções dos exercícios propostos e respostas nos livros de
Matemática permaneceu através dos tempos. Os autores de livros didáticos para o Curso Primário 10 Escola Nova é um dos nomes dados a um movimento de renovação do ensino que foi especialmente forte na Europa, na América e
no Brasil, na primeira metade do século XX . "Escola Ativa" ou "Escola Progressiva" são outros termos usados para descrever esse movimento. Os primeiros grandes inspiradores da Escola Nova foram o escritor Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) e os pedagogos Heinrich Pestalozzi (1746-1827) e Freidrich Fröebel (1782-1852). O grande nome do movimento na América foi o filósofo e pedagogo John Dewey (1859-1952 No Brasil, as idéias da Escola Nova foram introduzidas já em 1882 por Rui Barbosa (1849-1923). (Escola e Democracia, Dermeval Saviani, 32º Edição. Autores Associados.Campinas, SP.)
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chamavam a atenção dos professores para esse fato e salientavam que as soluções dos exercícios
facilitavam o trabalho do professor, o que possibilita conjecturar que os professores necessitavam dessas
respostas para verificar se os exercícios que resolviam estavam corretos (CURI, 2004)..
Shulman (1992) revela que o aumento de pesquisas em Educação sobre o “como ensinar” teve
conseqüências na formação dos professores que passou a privilegiar os procedimentos de ensino em
detrimento do estudo dos objetos de ensino. Tal fato é denominado por ele de “paradigma perdido”, ou
seja, a mudança do foco “o que ensinar” para “como ensinar”.
O livro A nova metodologia da aritmética, de Thorndike (1929) é um exemplo da mudança de foco
para o “como ensinar” apontada por Shulman. Esse livro influenciou autores de outras décadas como
Aguayo que publicou em 1956 o livro Didática11 da Escola Nova e Theobaldo de Miranda Santos (1960).
Ambos mencionavam em sua obra a importância do livro deThorndike.
Considerações finais Com relação à pergunta “como (e se) os cursos de formação dos professores polivalentes, ao longo
de sua história, contemplaram e trataram a formação desse profissional, para ensinar Matemática”, ficou
bastante evidente que na época da criação dos cursos normais havia a tendência de uma formação pessoal
do professor com moral e bons costumes. Essa situação modificou-se com a influência do positivismo: a
formação passou a ser mais disciplinar, com estudos similares aos conteúdos matemáticos a serem
ensinados. A partir dos anos 20 a formação tornou-se polivalente, assentada nos Fundamentos da
Educação, que não considera a necessidade de construir conhecimentos sobre as disciplinas para ensiná-
las, deixando transparecer uma concepção de que o professor polivalente não precisa “saber Matemática”,
basta saber ensiná-la.
O presente artigo contemplou um conjunto de indicações que permitiram delinear um panorama
amplo da organização do Curso Normal no Brasil e, em especial, como estava contemplada a formação
matemática nesses cursos nos primeiros cem anos de sua existência. A continuidade desses estudos até o
período atual abre um leque de possibilidades de investigações na área de Educação Matemática que
contemple a relação da história com a formação inicial do professor polivalente e com o ensino de
Matemática.
Bibliografia AGUAYO, A.M. Didática da Escola Nova. São Paulo: Companhia Editora Nacional. 1ª Edição traduzida,
1935.
CURI, Edda. Formação de professores polivalentes: uma análise dos conhecimentos para ensinar
Matemática e das crenças e atitudes que interferem na constituição desses conhecimentos. Tese de
doutorado. PUC/SP, 2004. FIORENTINI, Dario. et al. Formação de professores que ensinam matemática: um balanço de 25 anos de
pesquisa brasileira. Revista Educação em Revista – Dossiê Educação Matemática, Belo Horizonte: UFMG,
2003.
KILPATRICK, Jeremy; STANIC, George. Perspectivas históricas da resolução de problemas no currículo de
matemática. In: CHARLES R. I.; SILVER, E. A. (Ed.). The teaching and assessment of mathematical 11 É conveniente destacar que a denominação Didática da Matemática usada nesses manuais não corresponde às concepções mais
recentes relativas aos objetos desse campo de conhecimento, mas caracteriza-se mais por seu cunho “metodológico”, com a finalidade de oferecer sugestões e modelos ao professor, para as tarefas a serem desenvolvidas em sala de aula.
33
problem solving. Reston: NCTM; Lawrence Erlbaum, 1989. Disponível em:
<http://www.educ.fc.ul.pt/docentes/jponte/sd/textos/stanic-kilpatrick.pdf>. Acesso em: 20mar. 2004.
MONARCHA, Carlos. Escola Normal da Praça – o lado noturno das luzes. Editora da Unicamp. Campinas,
1999
ROMANELLI, Otaiza de Oliveira. Historia da Educação no Brasil. Editora Vozes, 5a Edição. Petrópolis,
1984.
SANTOS, Theobaldo de Miranda. Noções da didática especial. São Paulo: Nacional, 1960.
SHULMAN, Lee. ––––––. Renewing the pedagogy of teacher education: the impact of subject-specific
conceptions of teaching. In: MESA, L. Montero; JEREMIAS, J. M. Vaz. Las didácticas específicas en la
formación del profesorado. Santiago de Compostela; Tórculo, 1992.
TANURI, Leonor M. História da formação de professores. 500 anos de Educação Escolar. Revista Brasileira
de Educação, São Paulo: ANPED, n. 14, maio-ago. 2000.
TRAJANO, A. Arithmetica Progressiva. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1880.
THORNDIKE, Edward Lee. A nova metodologia da aritmética. Porto Alegre: Globo, 1929. n. 584.
VALENTE, W.R. Uma história da Matemática escolar no Brasil. São Paulo: Annablume: FAPESP, 1999.
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OS MANUAIS PEDAGÓGICOS COMO FONTES E OBJETOS DE PESQUISA NA CONSTITUIÇÃO HISTÓRICA DA DISCIPLINA METODOLOGIA DO ENSINO DA MATEMÁTICA
Viviane Lovatti Ferreira
Doutoranda em Educação – FEUSP
vlovatti@terra.com.br
Resumo: Este trabalho procura entender a construção da disciplina Metodologia do Ensino da Matemática,
inserindo-se no conjunto de estudos sobre o campo da história das disciplinas escolares, especificamente, a
história das didáticas das disciplinas, tendo como fontes e objetos de estudo os manuais pedagógicos de
Metodologia da Matemática.
A história das disciplinares escolares como campo de investigação
A história das disciplinas escolares é um campo de pesquisa que vem alcançando êxito nas últimas
décadas e se constituindo numa vertente da história da educação brasileira, ganhando espaço no meio
acadêmico desde a década de 1970, com o processo das transformações curriculares.Esse campo
(...) tem contribuído para o desenvolvimento de análises educacionais visando situar o
conjunto de agentes constituintes do saber escolar, especialmente professores, alunos e
comunidade escolar e, nesse processo, as disciplinas escolares passaram a ser incluídas
como um dos objetos importantes das investigações sobre as práticas escolares (Bittencourt,
2003, p. 13).
Nas últimas duas décadas houve um aumento significativo no número de pesquisas neste campo,
tanto no país quanto na França, Inglaterra, Portugal, México e Canadá. Com o objetivo de identificar a
gênese e os diferentes momentos históricos em que se constituem os saberes escolares, tem dado
elementos para se validar a permanência ou não da disciplina no currículo. Conforme Bittencourt (2003), a
presença de uma determinada disciplina no currículo escolar, bem como sua obrigatoriedade ou sua
condição opcional, não está apenas restrita a problemas didáticos ou epistemológicos, mas articulada ao
papel político que esta disciplina desempenha na conjuntura educacional. A manutenção ou erradicação de
uma disciplina no currículo deve-se à sua articulação com os objetivos da sociedade: “As transformações
substantivas de uma disciplina escolar ocorrem quando suas finalidades mudam. As finalidades mudam
para atender a um público escolar diferenciado e como resposta às suas necessidades sociais e culturais”
(Bittencourt, 1998, p. 17).
Chervel (1990) ressalta a necessidade da pesquisa nesta área:
(...) Mais recentemente, tem-se manifestado uma tendência, entre os docentes, a favor de
uma história de sua própria disciplina. Dos conteúdos do ensino, tais como são dados nos
programas, o interesse então evoluiu sensivelmente para uma visão mais global do problema,
associando-se as ordens dos legisladores ou das autoridades ministeriais ou hierárquicas à
realidade concreta do ensino nos estabelecimentos, e, algumas vezes, até mesmo às
produções escritas dos alunos (Chervel, 1990, p. 177).
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Para ele, a história das disciplinas escolares deve ser problematizada, levando em consideração três
aspectos: sua gênese, seus objetivos e seu funcionamento. De fato, a história das disciplinas escolares
pode desempenhar um papel fundamental no campo da história da educação, contribuindo para a
compreensão da cultura escolar como um todo e inserindo-a nos debates atuais da história cultural. A fim
de referenciar esta pesquisa, contamos com as reflexões de Chartier (1990) sobre a História Cultural, uma
vez que ela tem como principal objeto entender o modo como uma realidade social é construída em
diferentes momentos e lugares.
As percepções do social não são de forma alguma discursos neutros: produzem estratégias e
práticas (sociais, escolares, políticas) que tendem a impor uma autoridade à custa de outros,
por elas menosprezados, a legitimar um projeto reformador ou a justificar, para os próprios
indivíduos, as suas escolhas e condutas. Por isso, uma investigação sobre as representações
supõe-nas como estando sempre colocadas num campo de concorrências e de competições
cujos desafios se enunciam em termos de poder e de dominação (Chartier, 1990, p. 17).
Trabalhar a história das disciplinas escolares implica, inevitavelmente, em trabalhar a cultura escolar
que, na concepção de Julia (2001), seria
“(...) um conjunto de normas que definem saberes a serem ensinados e condutas a serem inculcadas e um conjunto de normas e práticas que permitem a transmissão desses saberes e a incorporação desses comportamentos; normas e práticas coordenadas a
finalidades que podem variar segundo as épocas (finalidades religiosas, sociopolíticas ou
simplesmente de socialização). Normas e práticas não podem ser analisadas sem ter em
conta o corpo profissional dos agentes que são chamados a obedecer a estas normas e logo
a pôr em prática os dispositivos encarregados de facilitar a sua aplicação” (Julia, 2001, p. 10-
11, grifo nosso).
Dessa forma, quando se trabalha a história das disciplinas, trabalha-se também a história do currículo,
já que essa história “procura explicar como as matérias escolares, métodos e cursos de estudo constituíram
um mecanismo para designar e diferenciar estudantes” (Goodson, 1995, p. 118).
Ao longo da história, o currículo sempre esteve voltado às exigências sociais, sejam elas econômicas,
políticas ou culturais. Alguns especialistas, nos estudos sobre currículo, acreditam que o seu propósito seja
o de "...planejar 'cientificamente' as atividades pedagógicas e controlá-las de modo a evitar que o
comportamento e o pensamento do aluno se desviassem de metas e padrões pré-definidos" (Moreira e
Silva, 1995, p. 9). Para compreendermos como as disciplinas escolares mudam historicamente, Goodson
(1983) afirma que precisamos compreender a existência de grupos particulares onipotentes e que
conseguem a alteração nos currículos.
As reflexões de Macedo (1999) também auxiliam na compreensão da inclusão de uma disciplina no
currículo:
(...) ao ser criada, uma disciplina escolar busca resolver um problema imediato relacionado ao
mundo cotidiano dos alunos. No entanto, para conseguir manter-se no currículo, precisa
legitimar-se como área de saber científico, transformando-se em uma disciplina formal e
distante da vida prática” (Macedo, 1999, p. 50).
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Assim, a história das disciplinas escolares, ao propor a identificação da gênese e dos momentos
históricos de constituição dos saberes escolares, vem ajudando a compreender a cultura escolar como um
todo. Ou seja, trabalhar a história das disciplinas escolares implica, inevitavelmente, em trabalhar a cultura
escolar e tentar compreender como as disciplinas escolares mudam historicamente, constatando a
existência de grupos que promovem a alteração nos currículos, em uma análise que considera as relações
de poder e de dominação.
Crescimento das Pesquisas em História da Educação Matemática
Nos últimos anos tem sido crescente a produção acadêmica em história da educação matemática,
área que tem por objetivo constituir um cenário histórico a respeito dos processos de ensino-aprendizagem
da Matemática enquanto área do saber escolar. Estas pesquisas têm gerado número significativo de
publicações e projetos de pesquisa, em congressos específicos ou gerais, com algum apoio oficial por parte
de instituições de fomento à pesquisa. As áreas que têm se desenvolvido nesse campo envolvem a história
das disciplinas escolares, do livro didático, da formação docente, das instituições, mostrando uma
valorização da constituição e disponibilização de arquivos pessoais e escolares.
No que se refere à história da disciplina Matemática, o trabalho de Martins (1984) vem inaugurar uma
área ainda pouco explorada. Somente a partir da década de 1990 é que a produção acadêmica em história
da disciplina Matemática começou a se intensificar. Dentre as pesquisas de que tratam o tema, podemos
registrar os trabalhos de Miguel (1993), Miorim (1995 e 1998), Carvalho (1996), Valente (1997), Silva et al
(1998), Silva (2000), Dassie (2001), Zuin (2001) e Ferreira (2002).
Dessa forma, tem sido consensual entre esses pesquisadores a existência de uma história do ensino
da Matemática no Brasil. Mas constata-se ainda a existência de uma disciplina específica cuja constituição,
funcionamento e objetivos têm como pressuposto o “como ensinar a Matemática”. No Brasil, esta disciplina
já recebeu várias denominações, tais como Didática da Matemática, Metodologia do Ensino de Matemática,
Prática de Ensino de Matemática, sendo oferecida em cursos de formação inicial de professores da escola
básica, seja em escolas normais (de nível médio e/ou superior), seja em cursos de licenciatura. Atualmente,
esta disciplina vem sendo proposta nos currículos das licenciaturas em Pedagogia e Matemática, voltada
para públicos diferentes e com objetivos distintos.
Sobre o surgimento da metodologia do ensino, Fiorentini (1998) afirma que a implementação dos
acordos MEC-USAID, mais precisamente, a introdução das disciplinas metodológicas nos cursos de
formação de professores esteve voltada para a organização de habilidades, atitudes e conhecimentos
específicos e úteis ao trabalho dos indivíduos no mundo capitalista. As disciplinas metodológicas passaram,
então, a valorizar aspectos didáticos.
O trabalho de Silva (2001) também destaca a tendência tecnicista cujo enfoque esteve voltado para a
profissionalização rápida e eficiente dos professores:
“Com a Ditadura Militar, a tendência tecnicista acentuou-se, contribuindo para a divisão do
trabalho pedagógico. Pretendia-se formar professores ‘eficientes e produtivos’, aptos a
trabalharem em nome do desenvolvimento econômico e da segurança nacional. Tal como se
pensava, a Escola Normal deveria ser um curso especificamente ‘profissionalizante’, no
sentido de oferecer predominantemente os conhecimentos metodológicos para o exercício do
magistério. O que se chamava de ‘modernização’ do trabalho docente correspondia à
operacionalização dos objetivos, ao planejamento, coordenação e controle das atividades
37
pedagógicas, à aplicação de métodos e técnicas de avaliação dos alunos, à utilização de
tecnologias de ensino desenvolvidas, tais como os recursos audiovisuais” (Silva, 2001, p. 68-
69).
Configura-se, assim, a existência de pressupostos que formam um contexto sócio-cultural para a
constituição da disciplina Metodologia do Ensino de Matemática. A introdução das chamadas “metodologias
de ensino” caracteriza a valorização dos aspectos didáticos que podem ser úteis no mundo capitalista. É a
lógica tecnicista que está subjacente à pretensão de formar professores eficientes, produtivos, aptos a
trabalharem em nome do desenvolvimento nacional.
Manuais Pedagógicos como fonte para o conhecimento da disciplina Para se compreender a formação obtida pelos professores na disciplina Metodologia do Ensino, os
currículos oficiais constituem-se em fontes primordiais, mas incompletos para uma análise mais ampla. Já
os manuais pedagógicos contribuíram para a expansão dos conhecimentos referentes a esta área, e se
constituem, assim, em fonte de pesquisa para este trabalho.
Conhecidos também como livros didáticos, livros-texto, manuais escolares, os manuais pedagógicos,
assim como os denominamos, vêm sendo ultimamente estudados por historiadores da educação voltados
para a análise de livros didáticos. Segundo Choppin (2004), isso se deve à onipresença de livros pelo
mundo, uma vez que o setor escolar possui um grande peso na economia editorial. Além disso, há o
interesse, por parte dos historiadores, em “recuperar” uma identidade cultural, pois se constituem em
instrumentos para a educação da juventude. Um exemplo dessa “recuperação” é a iniciativa em recensear a
produção escolar em alguns países, tal como os projetos da França (Emmanuelle), da Espanha (Manes), de
Portugal (Eme). No Brasil, o Projeto Livres, sediado na Universidade de São Paulo, tem por objetivo
recensear livros didáticos das diversas disciplinas escolares produzidos no período de 1810 a 2005.
Além de ser um instrumento pedagógico, o livro didático também tem despertado o interesse de
pesquisadores por ser:
...uma mercadoria, um produto do mundo da edição que obedece à evolução das técnicas de
fabricação e também um depositário dos diversos conteúdos educacionais, suporte
privilegiado para se recuperar os conhecimentos e técnicas consideradas fundamentais por
uma sociedade em uma determinada época (Bittencourt, 1993, p. 03).
Estudar um livro pode também representar leituras diversas porque nunca se obtém dele uma
interpretação única. Estudar um livro significa sempre compreender a dimensão desse objeto cultural
(Bittencourt, 1993).
Além de instrumento pedagógico, Choppin (2000) define o livro didático como um suporte “das
verdades”, já que ele se apresenta como depositário dos conhecimentos e das técnicas que a juventude
deve aprender numa determinada sociedade. O livro didático também representa um sistema de valores,
uma ideologia e uma cultura.
Na perspectiva de se “construir” uma história da disciplina Metodologia do ensino da Matemática, os
livros utilizados nesta disciplina constituem-se fontes para este estudo. Dessa forma, os “manuais
pedagógicos”, assim como denominamos, apresentam-se como uma fonte de conhecimentos para a
formação dos professores.
38
No campo internacional, alguns pesquisadores vêm trabalhando os manuais pedagógicos voltados à
formação de professores. Podemos citar os trabalhos de António Carlos Correia (Olhar a escola através dos
livros de texto para formação de professores, São Paulo, FEUSP, Seminário de Estudos, 2000), Fernández
e Salvado (Los libros y guias para el maestro, 1998), Antonio Molero Pintado (Los manuales de historia de
la educación y la formación de los maestros: 1900-1930, in Revista Interuniversitaria, 2000), Michèlle Roullet
(L’Avenement d’une “science pedagoguique”: manuels de pédagogie et de psychologie dês écoles normales
em France entre 1880 et 1920, Tese de Doutorado, Genève, 1998), Teresa Rabazas Romero (Los
manuales de pedagogia y la formación Del profesorado em las escuelas normales de Espana: 1839-1901,
Tese de Doutorado, Madri, 2001).
No Brasil, os trabalhos referentes a “manuais pedagógicos” ainda são escassos. A dissertação de
mestrado de Vivian Batista da Silva denominada “História de leituras para professores: um estudo da
produção e circulação de saberes especializados nos “manuais pedagógicos” brasileiros: 1930-1971”,
defendida na Faculdade de Educação da USP em 2001, constitui-se em uma das poucas fontes de estudo.
Ao analisar manuais pedagógicos de disciplinas pedagógicas da Escola Normal, Silva (2001) divide a
produção dos manuais pedagógicos em três diferentes fases. Num primeiro momento (1930-1946), os
manuais pedagógicos são escritos sob o entusiasmo do movimento escolanovista. Assim, grande parte do
material produzido nesta época foi construída com base no pensamento educacional escolanovista. Num
segundo momento (1947-1959), os manuais pedagógicos propunham metodologias de ensino, já que os
currículos das Escolas Normais começaram a introduzir disciplinas de caráter metodológico em função da
Lei Orgânica de 1946 que passou a privilegiar aspectos metodológicos de ensino. Num terceiro momento
(1960-1971), os manuais pedagógicos passaram a apresentar tecnologias a serviço da eficiência das
atividades pedagógicas. A partir dos anos 1970, a produção de manuais pedagógicos se intensifica, e esta
produção deixa de ser praticamente artesanal, passando a se modernizar com a industrialização em massa
desses manuais, apresentando uma larga diferença entre os antigos “manuais pedagógicos” e os modernos
“livros didáticos”.
Outros trabalhos, como o artigo de Vidal e Faria Filho (2003), ao discutir a constituição da História da
Educação enquanto área de conhecimento, faz uso de manuais pedagógicos para uma compreensão da
História da Educação enquanto disciplinar escolar. Alguns manuais são citados, tais como os de Julio
Afranio Peixoto (1933), Francisca Peeters e Maria Augusta de Cooman (1936), Bento de Andrade Filho
(1941), Ruy de Ayres Bello (1945), Aquiles Archero Filho (s.d.), Theobaldo Miranda dos Santos (1945), Tito
Lívio Ferreira (1966).
Pinheiro (1993) também recorre a manuais de Biologia educacional para compreender a situação da
referida disciplina nos cursos de formação de professores, e fazendo uso de alguns manuais (Antonio
Ferreira de Almeida Junior (1959, 1962), Lídia Rosenberg Aratangy et al (1972, 1975, 1985), Luiz Ancilon de
Alencar Barros (1962, 1964, 1982), José Guerra Pinto Coelho (1959 e 1962), Ary Lex (1953, 1984), e Maria
Ângela dos Santos (1991).
Ao analisar a introdução da disciplina Sociologia na formação dos professores catarinenses nos
anos 1930 e 1940, Daniel e Daros (2002) têm como enfoque os manuais de Sociologia das “coleções
pedagógicas”. A pesquisa buscou perceber a presença dessas publicações em terras catarinenses,
analisando a forma como estes manuais foram introduzidos e utilizados na formação dos professores,
privilegiando as obras de cunho sociológico.
39
Segundo Silva (2001), até 1920 circulavam no país obras estrangeiras, entre elas as de origem
portuguesa e francesa. A partir de 1930, com a organização curricular da Escola Normal – importante
instituição responsável pela formação de professores – houve um aumento na produção e publicação de
manuais pedagógicos no Brasil, principalmente nas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro e Porto Alegre.
Em geral, os manuais pedagógicos estavam voltados para suprir a demanda das disciplinas
profissionalizantes dos currículos das Escolas Normais e, às vezes, até dos cursos de formação de
professores das Faculdades de Filosofia.
Quando produzidos, os manuais pedagógicos abrangiam vários campos do conhecimento (história,
sociologia, lingüística, política, economia, psicologia, etc.), servindo tanto a alunos (disponibilizando
orientações para a aprendizagem) e professores (sugerindo conteúdos e métodos de ensino).
No caso deste trabalho, as contribuições de Chervel (1990) quanto às reflexões sobre a história das
disciplinas escolares nos ajudam a compreender que os manuais escolares constituem um núcleo de
estudos acerca dos saberes transmitidos pela escola. Chervel (1990) também afirma que os temas, as
declarações contidas nos prefácios e os conceitos mais trabalhados numa obra permitem uma análise dos
saberes vistos como indispensáveis à formação do professor. O papel dos manuais pedagógicos restringe-
se a “(...) normalizar e regular a produtividade e a competência da classe, pois determinam o ritmo,
proporcionam critérios de aprendizagem e definem conceitos pelos quais são ensinados os conteúdos
previstos nos currículos” (Silva, 2001, p. 45).
Schmidt (2004) acredita que três fatores importantes contribuíram para a produção e difusão de
manuais didáticos nas primeiras décadas do século XX: a demanda pela escola, a formação de professores
e a “renovação pedagógica”, fruto da filosofia escolanovista. Este “tripé” favoreceu a produção de uma
literatura específica destinada não somente aos alunos, mas também aos professores.
Considerações Finais
Nesse texto, tecemos considerações sobre a possibilidade de os manuais pedagógicos serem fontes
importantes para a compreensão da constituição histórica da disciplina Metodologia do Ensino da
Matemática. Essa construção insere-se no conjunto dos estudos da história das disciplinas escolares, ou da
história das didáticas das disciplinas, campo de pesquisa da história da educação que visa identificar a
gênese e os momentos históricos da constituição dos saberes escolares. Nessa análise, procura-se verificar
que essa constituição vai além de problemas didáticos e epistemológicos, estando relacionada ao papel
político que uma disciplina pode desempenhar, em articulação com necessidades de caráter social e
cultural.
A problematização da história das disciplinas escolares insere-se nos debates sobre a história
cultural, considerando o modo como uma realidade social é construída em um campo de competições e de
relações de poder. Trata-se de trabalhar a cultura escolar envolvendo necessariamente a história do
currículo e dos conteúdos, tendo como pano de fundo a idéia de que a constituição desses conteúdos e
currículos está sempre atrelada às exigências sociais, econômicas e políticas.
Considerando o caso da história da disciplina Matemática e da história do seu ensino, propusemos
colocar em destaque a existência de uma disciplina específica de Metodologia do Ensino de Matemática,
cuja introdução e permanência nos currículos está associada à idéia de desenvolvimento de organização de
habilidades, atitudes e conhecimentos eventualmente úteis ao trabalho docente em um contexto capitalista.
40
Os aspectos didáticos são valorizados demonstrando uma tendência tecnicista consistente com noções
como eficiência e produção.
Diversas reflexões sobre a história das disciplinas escolares podem ser geradas ao considerar os
manuais escolares como um núcleo de estudos acerca dos saberes transmitidos pela escola. Nesse
sentido, um estudo sobre os currículos oficiais seria insuficiente, sendo, então, os manuais pedagógicos,
uma abordagem que leve em conta sua identidade cultural, uma forma de se entender a valorização de
certos conhecimentos e técnicas pela sociedade em certa época. Na tentativa de compreender a dimensão
desse objeto cultural, consideramos o sistema de valores, a ideologia e a cultura associadas aos “manuais
pedagógicos”. Esse tem sido o objetivo de grandes projetos de pesquisa no país e no exterior, com
importante impacto para a constituição de pesquisas como esta que propomos.
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42
DEMONSTRAÇÕES DO TEOREMA DE THALES: UM ENFOQUE HISTÓRICO NA ANTIGUIDADE GREGA
Ana Carolina Costa Pereira12
Carolina@rc.unesp.br
Resumo: Esse artigo apresentará um estudo envolvendo algumas demonstrações do teorema de Thales
antes e após a descoberta da Teoria das Proporções de Eudoxo, a partir de obras clássicas encontradas
em bibliotecas e acervo pessoal. Para isso, realizou-se uma pesquisa bibliográfica a fim de se estudar as
possíveis demonstrações do teorema de Thales no período da Grécia Antiga, utilizando conceitos da época,
numa tentativa de resgatar a forma como esse teorema era demonstrado.
Introdução
O presente trabalho é parte de uma pesquisa desenvolvida em nível de mestrado junto ao Programa
de Pós-Graduação em Educação Matemática (UNESP Rio Claro/SP) que visa investigar os livros didáticos
de matemática, editados entre a última metade do século XIX e o século XX, no que diz respeito ao
conteúdo dos campos numéricos, focalizando a ampliação do campo dos números racionais para os reais.
Busca.
Nesse estudo, procurou-se observar como a geometria é explorada nos livros didáticos para o
tratamento dessa questão, mais precisamente, tomando como base o teorema de Thales que relaciona o
tratamento geométrico e algébrico por meio de medidas e com isso buscou-se evidencias no que diz
respeito à questão da comensurabilidade.
Para o desenvolvimento deste estudo foram selecionados oito livros didáticos de matemática13 no
período em questão, os quais apresentam o teorema de Thales conhecido como teorema das Linhas
Proporcionais. Com a finalidade de embasar teoricamente nosso estudo, foi realizada uma pesquisa
bibliográfica a fim de se estudar as possíveis demonstrações do teorema de Thales no período da Grécia
Antiga, utilizando conceitos da época, numa tentativa de resgatar a forma como esse teorema era
demonstrado.
Esse artigo apresenta o estudo de algumas demonstrações envolvendo o teorema de Thales no
período Pré-Eudoxiano e após a descoberta da Teoria das Proporções de Eudoxo, a partir de obras
clássicas encontradas em bibliotecas e acervo pessoal.
Demonstrações no período Pré-Eudoxiano
No livro História da Matemática, Rubens G. Lintz, 1999, apresenta duas demonstrações para o
teorema. Numa primeira demonstração o autor se baseia no conceito de números na época de Thales, em
que números é uma coleção de unidades e, por sua vez, unidade é um ponto sem posição (LINTZ, 1999,
59). Vejamos a demonstração apresentada por ele:
12 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Educação Matemática, UNESP, Rio Claro-São Paulo, orientada pela Profa. Dra
Rosa Lúcia Sverzut Baroni 13 Elementos de Geometria e Trigonometria Rectilínea, Ottoni, 1904; Elementos de Geometria, FIC, s/d; Geometria Elementar, FTD,
1925; Curso de Mathematica. Roxo et all, 1940-1942; Matemática – Curso Moderno, Sangiorgi, 1960-1963; Matemática – Curso Ginasial, Quintella, 1968-1970; A Conquista da Matemática, Giovanni e Castrucci, FTD, 1985; e Matemática, Imenes e Lellis, 1999.
43
Proposição: Se duas retas a e b são cortadas por retas paralelas, os vários segmentos determinados em a
e b são proporcionais, isto é = = ...' ' ' '
AB BCA B B C
(LINTZ, 1999: 39).
Demonstração
Tomemos um segmento u como unidade e construamos o reticulado da figura 2, formado de dois feixes de
retas paralelas, definindo o quadrilátero ABCD, etc., (figura 2) de lados u e v. Consideremos as duas retas
VA e VE e as paralelas AE, A’E’, A’’E’’. Então, diretamente da figura, vem
VA’’ = 2u VE’’ = 2w
VA’ = 3u VE’ = 3w
onde w é o segmento DB tomado como unidade de medida das retas paralelas a DB.
(...)
Das relações acima, tiramos
'VE''VE
32
'VA''VA
==
O resultado facilmente se generaliza para a situação da figura 2, desde que, os segmentos determinados
nas retas a e b sejam múltiplos, respectivamente, de unidades u e v pré-estabelecidas. Esta hipótese da
existência de unidade comum para medir segmentos está ligada à questão da comensurabilidade de
segmentos de grande profundidade e importância para a geometria e que vai culminar com a crise da
escola pitagórica (...).
(LINTZ, 1999: 42-43)
Uma outra tentativa de demonstração era a utilização das noções de números na época dos
pitagóricos para o problema da proporcionalidade, o qual era exposto da seguinte maneira:
Proposição: Se duas retas a e b são cortadas por um certo número de paralelas, estas determinavam
sobre a e b segmentos proporcionais, isto é, 'C'B
BC'B'A
AB'VA
VA== . (LINTZ, 1999: 63)
Figura 1 Figura 2
44
Demonstração
De acordo com a hipótese fundamental acima enunciada14 existe uma unidade ou módulo u em a tal que
VA = p×u; AB = q×u (1)
Assim, VA fica subdividida em p segmentos e AB em q segmentos. O teorema ficará demonstrado se
provarmos que, traçando-se as paralelas tracejadas a AA’ e BB’, também VA’ e A’B’ ficam subdivididos no
mesmo número de partes iguais e, neste caso, se u’ é uma dessas partes teremos VA’ = p.u’; A’B’ = q. u’ (2)
donde, comparando (1) e (2),
'B'AAB
'ququ
'uu
'pupu
'VAVA
====
Provemos, então, a asserção acima, que se reduz à seguinte: dado um triângulo ABC (figura 4) e o ponto
médio D de um dos lados, se traçarmos por D uma paralela a AB, ela divide CB em duas partes iguais CE e
EB. De fato, tracemos por D uma paralela a CB e por C, uma paralela a AB. Agora usaremos o fato de
serem iguais segmentos determinados em duas paralelas cortadas por outras duas. Os pitagóricos
seguramente conheciam este fato que, nos elementos de Euclides, pode ser obtido facilmente do teorema
sobre ângulos alternos e igualdade de triângulos, mas é provável que eles o conhecessem através de
“demonstrações incompletas”, quando comparados ao padrão de Euclides. Enfim, assumindo isso, os
triângulos DMC e AND são iguais e, portanto, DM = DN; mas DM = CE e DN = EB, logo CE = EB
q.e.d
(LINTZ, 1999: 63-65)
Nota-se uma mudança razoável da demonstração da época de Thales para a época de Pitágoras,
embora ambas estejam incompletas. Enquanto Thales tira conclusões a partir das figuras tomando-as como
hipótese válida para o raciocínio da demonstração, os pitagóricos vão além, conseguem assimilar uma certa
organização para a época, desprendendo-se de algumas particularidades visuais das figuras.
14 A hipótese fundamental que Lintz se refere é: seja u um segmento unidade ou módulo e seja AB um segmento qualquer. 1) u pode
ser aplicado um número inteiro n vezes sobre AB, então diremos que AB é n vezes u ou AB = n.u (...) e 2) u não pode ser aplicado um número inteiro de vezes sobre AB e, então subdividimos u em q partes novamente. Pode acontecer que AB seja igual a p vezes o novo módulo ou nova unidade u/q ou não, caso em que repetiremos o processo usado agora u/q dividido em q’ partes como módulo e assim sucessivamente (Lintz, 1999: 60-61).
Figura 3 Figura 4
45
Demonstrações após a descoberta da Teoria das Proporções
Até então, trabalhava-se apenas com o caso em que os segmentos (grandezas) eram
comensuráveis, associando-se a número natural ou a uma razão de dois números naturais. Entretanto,
após a descoberta do problema das grandezas incomensuráveis, muitos dos matemáticos gregos voltaram-
se para solucionar o problema das grandezas incomensuráveis, desenvolvendo, assim, novas teorias. Esse
problema foi resolvido pela descoberta da teoria das proporções de Eudoxo de Cnido (408 a.C. - 355 a.C.)
encontrado no Livro V dos elementos de Euclides. Uma das conseqüências, supostamente causadas pela
Teoria das Proporções de Eudoxo, foi forçar uma forte separação entre números e geometria, deixando
somente à geometria o tratamento das razões incomensuráveis.
Para provar o teorema de Thales utilizando a teoria das proporções, consideraríamos (Não seria
“devemos considerar”?) os segmentos
AB, BC, A'B', B'C' (comensuráveis ou não), em
que' '' '
AB A BBC B C
= é válida, se as três condições abaixo,
para todo m e n naturais quaisquer, forem satisfeitas:
Se n AB < m BC ⇒ n ' 'A B < m ' 'B C ;
Se n AB = m BC ⇒ n ' 'A B = m ' 'B C ;
Se n AB > m BC ⇒ n ' 'A B > m ' 'B C .
DEMONSTRAÇÂO
Assim, tomaremos m e n dois números naturais quaisquer, iremos dividir o segmento AB em m partes
iguais de um certo segmento U, então teremos AB = mU e traçando-se paralelas dividiremos B'A' em m
partes iguais de um certo U’, de modo que A'B' = mU’. Na reta a, partindo de B para C, marcaremos n
segmentos U ( BC = nU). Do mesmo modo na reta b, partindo de B’ para C’, marcaremos n segmentos U’
( ' 'B C = nU’). Sendo D a ultima extremidade do último segmento contido em BC podemos ter três casos
possíveis:
1º caso: D está entre B e C (provar n AB < m BC ⇒ n ' 'A B < m ' 'B C .);
2º caso: D coincide com C (n AB = m BC ⇒ n ' 'A B = m ' 'B C .);
3º caso: D está além de C (n AB > m BC ⇒ n ' 'A B > m ' 'B C .).
Analisando o 1º caso em que D está entre B e C.
De AB = mU temos que n AB = nmU e de BD = nU temos que m BD = mnU. Logo n AB = m BD .
Como BD < BC então n AB = m BD < m BC . Portanto n AB < m BC .
Por outro lado, de ' 'A B = mU’ temos que n ' 'A B = nmU’ e de ' 'B D = nU’ temos que m ' 'B D = mnU”.
Logo n ' 'A B = m ' 'B D .
b a
r
s
A
B
C
D
C’
D’
B ’
A ’
t
Figura 5
46
Como ' 'B D < ' 'B C então n ' 'A B = m ' 'B D < m ' 'B C . Portanto n ' 'A B < m ' 'B C .
Concluímos que n AB < m BC ⇒ n ' 'A B < m ' 'B C .
O 2º caso em que D coincide com C.
De AB = mU temos que n AB = nmU e de BD = nU temos que m BD = mnU. Logo n AB = m BD .
De ' 'A B = mU’ vem que n ' 'A B = nmU’ e de ' 'B C = nU’ vem que m ' 'B C = mnU’. Logo n ' 'A B =
m ' 'B C
Concluímos que n AB = m BC ⇒ n ' 'A B = m ' 'B C .
O 3º caso em que D está além de C.
De AB = mU temos que n AB = nmU e de BD = nU temos que m BD = mnU. Logo n AB = m BD .
Como BD > BC então n AB = m BD > m BC . Logo n AB > m BC .
De ' 'A B = mU’ temos que n ' 'A B = nmU’ e de ' 'B D = nU’ então m ' 'B D = mnU’. Logo n ' 'A B =
m ' 'B D .
Como ' 'B D > ' 'B C então n ' 'A B = m ' 'B D > m ' 'B C . Logo n ' 'A B > m ' 'B C .
Concluímos que n AB > m BC ⇒ n ' 'A B > m ' 'B C .
Portanto as três condições estão satisfeitas, provando que =' '' '
AB A BBC B C
.
Uma outra demonstração, é a demonstração Euclidiana, que aparece na proposição 2 do Livro VI
dos Elementos de Euclides que baseia-se no método das áreas e na teoria das proporções de Eudoxo.
Essa demonstração pode ser encontrada em alguns livros-textos, como por exemplo, no livro dos autores
Moise e Dowrs, 1971, Geometria Moderna, em que apresentaremos a seguir:
TEOREMA: Se uma reta paralela a um lado de um triângulo intercepta os outros dois lados em pontos
distintos, então ela determina segmentos que são proporcionais a esses lados.
Re-enunciado. No ∆ABC sejam D e E pontos de AB e AC tais que
BC//DE . Então AEAC
ADAB
= .
Demonstração15
Nos ∆ADE e ∆BDE consideremos AD e BD como bases. Então esses
triângulos têm a mesma altura. (Por que?) Portanto, pelo Teorema16 11-7, a
razão de suas áreas é igual a razão de suas bases e temos
(1) ADBD
ADEaBDEa
=∆∆
.
Analogamente nos ∆ADE e ∆BDE consideramos AE e CE como bases. Como esses triângulos têm mesma
altura, concluímos, como antes, que
15 O tratamento que o autor dá, por exemplo, a a∆BDC é a área do triângulo BDC. 16 Se dois triângulos têm a mesma altura h, então entre suas áreas á igual a razão entre suas bases (MOISE, 1971: 281)
Figura 6
47
(2) AECE
ADEaCDEa
=∆∆
.
Mas ∆BDE e ∆BDE têm a mesma base DE. (veja a figura à direita do re-enunciado). E eles têm a mesma
altura, porque DE e BC são paralelas. Portanto, pelo Teorema 11-6.
(3) ∆BDE = ∆BDE
Combinado as três equações (1) (2) e (3), obtemos
(4) AECE
ADBD
= .
Adicionando 1 a ambos os membros da equação (4), obtemos
(5) AE
AECEAD
ADBD +=
+, ou
AEAC
ADAB
= ,
como queríamos demonstrar.
(MOISE e DOWRS, 1971: 307-308)
Considerações Finais Nesse estudo, diante dessas demonstrações do teorema de Thales a partir de algumas obras
clássicas, e baseado em conceitos da Grécia Antiga, antes e após a descoberta da teoria das proporções,
observa-se que: as duas primeiras demonstrações utilizam o conceito de comparação de segmentos, uma
outra utiliza a idéia proposta pela teoria das proporções e a última usando o método das áreas.
Transportando esse estudo à pesquisa, percebe-se que as duas primeiras demonstrações podem
ser encontradas na maioria dos livros didáticos analisados, os quais direcionam suas demonstrações
apenas para segmentos comensuráveis com a unidade de medida.
Alguns livros ainda omitem o fato da existência da prova para segmentos incomensuráveis, o que
pode implicar a permanência do pensamento pitagórico em que somente as grandezas comensuráveis
eram utilizadas. Porém, encontramos livros que desenvolvem demonstrações utilizando outros conceitos,
como por exemplo, o livro17 que trabalha com as aproximações sucessivas de uma série de “números
comensuráveis18”, para a prova de segmentos incomensuráveis. Em outro exemplo19 desenvolve-se a
demonstração para o caso em que os segmentos são incomensuráveis utilizando-se o conceito de
semelhança de triângulos, porém não é mencionado o conceito de comensurabilidade de segmentos,
melhor dizendo, medição de grandezas geométricas.
Entretanto atualmente seja conhecida a demonstração completa para o teorema de Thales, são
poucos os livros didáticos de matemática que abordam essa demonstração. Foi possível perceber que ao
longo da História da Educação Matemática no Brasil, esse assunto foi perdendo o rigor nos Manuais
Escolares, embora seja um assunto presente em diversas situações cotidianas, nos problemas que
envolvem medida, por exemplo.
Assim, é plausível crer que a idéia subjacente ao teorema de Thales, ligada às condições de
proporcionalidade de segmentos, isto é, medição de segmento, pode ser uma forma de introduzir
números reais positivos. No trabalho de Baroni & Nascimento (2005), encontrar-se uma proposta de
17 Elementos de Geometria e Trigonometria Rectilínea, Ottoni, 1904. 18 Nesse Livro o autor refere-se a números comensuráveis a relação numérica entre duas grandezas comensuráveis. 19 Matemática, Imenes e Lellis, 1999.
48
tratamento para os números reais, via medição, a qual pode ser considerada como uma proposta
concreta visando à melhoria do ensino dos números reais.
Deste modo, enfatizar o tratamento de comensurabilidade de segmentos ao desenvolver a
demonstração o teorema de Thales, possibilita estabelecer relação com a construção dos Números Reais,
pois segundo BARONI & NASCIMENTO (2005: 2) essa construção está antecedida pela elaboração da
noção de proporcionalidade, no sentido de comensurabilidade, estando assim, em concordância com o
desenvolvimento histórico do tema. Conforme salienta Lebesgue, o processo de medição permite introduzir
tanto os números que são ditos racionais quanto aqueles que serão ditos irracionais, (...).
Parece-nos que na História da Matemática o estudo do teorema de Thales está ligado diretamente
com o conceito de comensurabilidade de grandezas, favorecendo assim, a utilização desse tema para a
construção do conjunto dos Números Reais.
Bibliografia BARONI, R. L. S.; NASCIMENTO, V. M. do. Um Tratamento, via Medição, para os Números Reais. São
Paulo: SBHMat, 2005. Coleção História da Matemática para professores.
BOYER, C. História da Matemática. 2ª edição. São Paulo: Editora Edgard Blücher, 1998.
EVES, F. Introdução à História da Matemática. Campinas, SP: Editara da UNICAMP, 2004.
HEATH, T. L. The Thirteen Books of Euclid’s Elements – Volume II (Books III-IX). Second edition. New
York: Dover Publications, INC., 1956b.
LINTZ, R. G. História da Matemática – Volume 1. Blumenal – SC: Editora FURB, 1999.
MOISE, E. E.; DOWRS, F. L. Geometria Moderna – Parte I. Renata G. Watanabe e Dorival A. Mello (Trad).
São Paulo: Editora Edgard Blücher, 1971.
49
A CONTEXTUALIZAÇÃO NO ENSINO DE FUNÇÕES MATEMÁTICAS
Maria da Conceição Freitas Feitosa
FATEMA-Faculdades Integradas Teresa Martin
fatema@fatema.br
Resumo: Este painel tem o propósito de apresentar o trabalho que vem sendo desenvolvido como Projeto
de Iniciação Científica no curso de Licenciatura em Matemática nas Faculdades Integradas Teresa Martim
sob a orientação da Professora. Ms Andréia Dalcin. A pesquisa pretende discutir o termo contextualização
no ensino de Matemática, bem como, analisar as diferentes interpretações e compreensões deste termo
divulgadas e legitimadas por meio de livros didáticos de matemática ao apresentarem o conteúdo de
Funções. Até o momento, estou dedicando-me ao estudo das diferentes concepções de contextualização,
buscando referenciais teóricos e metodológicos que possam orientar a posterior escolha e análise dos livros
didáticos. Nesta perspectiva, a intenção com este texto e apresentação do pôster é também, trocar
experiências e idéias, apresentar algumas das reflexões e tentativas primeiras de categorização do termo
“contextualização” e vivenciar a participação em um evento científico.
PALAVRAS CHAVES:
Educação - Matemática - Contextualização - Funções
Introdução
Como é sabido, existe uma grande preocupação com a melhora do ensino de matemática. Embora
ocorram problemas e dificuldades em outras disciplinas, è na Matemática que se evidencia grande aversão
por parte dos alunos; além disso, existe uma deficiência de domínio de conteúdos que a tempos preocupam
os pesquisadores e professores da área. Quanto ao problema da deficiência relacionada à disciplina,
MICOTTI (1999) nos acena:
"A aplicação dos aprendizados em contextos diferentes daqueles em que foram adquiridos
exige muito mais que a simples decoração ou a solução mecânica de exercícios: domínio de
conceitos, flexibilidade de raciocínio, capacidade de análise e abstração. Essas
capacidades são necessárias em todas as áreas de estudo, mas a falta delas, em
matemática, chama a atenção." (MICOTTI, 1999, p.154).
Neste sentido, muitos trabalhos e estudos têm sido feitos com o propósito de melhorar o ensino da
disciplina, e conseqüentemente, seus resultados. Influenciados pelo atual momento escolar, no qual as
novas propostas pedagógicas surgem preocupadas com o processo de aprendizagem e focalizando o que
deve ser evitado no ensino, esses estudos e trabalhos fazem considerações ao ensino tradicional e também
à Matemática Moderna, sobre aspectos que podem ter intensificado os problemas no ensino.
Surgem, então, idéias novas e expressões tais como Construtivismo, Resolução de Problemas,
Etnomatemática, entre outras, frutos de elaborações teóricas de diversas áreas que se relacionam e
auxiliam na constituição da Educação Matemática.
50
Nesse sentido, o projeto de Iniciação Científica que venho desenvolvendo junto a FATEMA,
Faculdades Integradas Teresa Martim, sob a orientação da Professora Ms. Andréia Dalcin tem por propósito
estudar e analisar as diferentes concepções do termo Contextualização, bem como, identificar e analisar
aquelas que estão sendo utilizadas e legitimadas por meio de livros didáticos de matemática mais
especificamente quando abordam o conteúdo de Funções.
Até o momento, estou dedicando-me ao estudo das diferentes concepções de contextualização,
buscando referenciais teóricos e metodológicos que possam orientar a posterior escolha e análise dos livros
didáticos. Nesta perspectiva, a intenção com este texto e apresentação do pôster é de trocar experiências e
idéias, apresentar algumas das reflexões e tentativas primeiras de categorização do termo
“contextualização” e vivenciar a participação em um evento científico.
O Ensino de Matemática e o termo contextualização Inicialmente, ressaltaria alguns aspectos e críticas que são feitos ao ensino para então entender o
que se pretende com a contextualização no ensino de matemática hoje. Os PCN’s (2000) apontam algumas
considerações com relação ao ensino de matemática categorizado como Tradicional que predominou no
período da anterior a Matemática Moderna:
"A insatisfação revela que há problemas a serem enfrentados, tais como a necessidade de
reverter um ensino centrado em procedimentos mecânicos, desprovidos de significados
para o aluno. Há urgência em reformular objetivos, rever conteúdos e buscar metodologia
compatíveis com a formação que hoje a sociedade reclama"(p.15).
Aqui os PCN’s ressaltam problemas oriundos do ensino tradicional: procedimentos mecânicos e falta
de significado, a valorização da memorização sem compreensão. Dentro desta perspectiva temos a
transmissão de informação, o aluno aprende a reproduzir através de memorização e essa reprodução é a
garantia de que aprendeu.
No entanto, as características citadas correspondem ao tipo de formação que se esperava.
“Assim, para os livros da década de 50 e do início dos anos 60, período caracterizado por um ensino
de Matemática que se convencionou chamar de ‘tradicional’ e que quase sempre associamos à
memorização de regras e ao treino de algoritmos, o estudo de Matemática na “tenra idade” formaria um
adulto bem disciplinado, persistente, rigoroso.Fala-se em ordem, atenção, precisão e paciência”.
(FONSECA, 1995:48)
No final dos anos de 1960 e durante os anos 70 tivemos no Brasil o advento da Matemática Moderna,
originária da concepção formalista que pretendia dentre outras coisas “modernizar o ensino de matemática”
dando a ela um caráter de aplicabilidade.
“A organização da Matemática moderna baseava-se na teoria dos conjuntos, nas estruturas
matemáticas e na lógica matemática. Esses três elementos foram responsáveis pela
‘unificação’ dos campos matemáticos, um dos maiores objetivos do movimento. (...) Os
alunos não precisavam ‘saber fazer’, mas sim, ‘saber justificar’ por que faziam”.(MIORIM,
1998:115)
51
Neste sentido,
“Realçava muitas propriedades, tinha preocupações excessivas com abstrações
matemáticas e apresentava uma linguagem matemática universal, concisa e precisa.
Entretanto, acentuava o ensino de símbolos e uma terminologia complexa que comprometia
o aprendizado.” (ONUCHIC, 1999:202)
Com essas caracterizações relacionadas à Matemática moderna, podemos entender que o
aprendizado dos alunos era comprometido por falta de compreensão e interação. Assim como no ensino
tradicional, agora o aluno manipulava entes matemáticos. .
Os PCN’s(2000) ressaltam ainda que,
“Ao aproximar a Matemática escolar da Matemática pura, centrando o ensino nas estruturas
e fazendo uso de uma linguagem unificadora, a reforma deixou de considerar um ponto
básico que viria se tornar seu maior problema: o que se propunha estava fora do alcance
dos alunos, em especial daqueles das séries iniciais do ensino fundamental. O ensino
passou a ter preocupações excessivas com abstrações internas à própria matemática, mais
voltada à teoria do que à prática.” (p.21).
Porém, foi durante o período da Matemática Moderna que o conteúdo de funções passou a ganhar
destaque e estabilidade nos currículos no Ensino Secundário.
A partir dos anos 1980 iniciou-se no Brasil um processo de rediscussão do ensino de Matemática
embasado nas novas teorias da Educação, Psicologia, História, Filosofia e da própria Matemática que
resultaram na formação de programas de pós-graduação em Educação Matemática, criação de sociedades
e grupos de pesquisa e em termos legais na criação dos PCN’s e PCNEM. Dentro destas novas propostas e
discussões os termos interdisciplinaridade e contextualização ganham destaque. Daí nosso interesse por
centrar as reflexões no termo “contextualização”.
Antes, porém, é importante ressaltar que além da variedade de concepção que pode se ter em
relação ao conhecimento, como concepção linear ou de rede, o professor pode ainda focalizar seu ensino
em uma outra vertente, a da informação, confundindo uma com a outra.
Para distinguir ambas, ressaltaremos o que Nilson Machado (2002) fala sobre a uma pirâmide
informacional, representada por: dados, informações, conhecimento e inteligência. Ressalta que dados
estão espalhados em variadas formas e que apesar de úteis, dependem do interesse de pessoas que lhes
organizem e os transforme em informações, as quais são veiculadas aos meios de comunicação. Quanto
aos dois últimos elementos o autor destaca:
“Assim, para atingir o terceiro nível da pirâmide informacional, qual seja, o do conhecimento,
é fundamental a capacidade de estabelecer conexões entre elementos informacionais
aparentemente desconexos, processar informações, analisa-las, relaciona-las, armazena-
las, avalia-las, segundo critérios de relevância, organiza-las em sistemas.(...) a inteligência
52
encontra-se diretamente associada à capacidade de ter projetos; a partir deles, dados,
informações, conhecimentos são mobilizados ou produzidos.” (MACHADO, 2002:67-68)
Apesar de em muitos momentos o ensino ter sido direcionado a passagem de informações, equivoco
que ainda ocorre, o conhecimento é o objetivo do ensino, ou deveria ser, como tanto se fala atualmente. É
necessário que ao se propor um projeto na escola, buscando integrar o aluno na assimilação do
conhecimento, não faça o aluno verificar informações e aplica-las diretamente ao projeto, pois para
concretizar essa ligação, o aluno tem que desenvolver capacidades próprias do conhecimento, o que lhe
possibilitará trabalhar em projetos coletivos e individuais.
1.1 - Contextualização como compreensão do passado
Para Maria da Conceição F.R. Fonseca, contextualizar não é abolir a técnica e a compreensão,
ultrapassar esses aspectos e entender fatores externos aos que normalmente são explicitados na escola de
modo a que os conteúdos matemáticos possam ser compreendidos dentro do panorama histórico, social e
cultural que o constituíram.
“ as linhas de frente da Educação Matemática têm hoje um cuidado crescente com o
aspecto sociocultural da abordagem matemática. Defendem a necessidade de
contextualizar o conhecimento matemático a ser transmitido, buscar suas origens,
acompanhar sua evolução, explicitar sua finalidade ou seu papel na interpretação e na
transformação da realidade do aluno. É claro que não se quer negar a importância da
compreensão, nem tampouco desprezar a aquisição de técnicas, mas busca-se ampliar a
repercussão que o aprendizado daquele conhecimento possa ter na vida social, nas opções,
na produção e nos projetos de quem aprende.” (FONSECA, 1995:53)
A autora destaca que com um ensino contextualizado o aluno tem mais possibilidades de
compreender os motivos pelos quais estuda um determinado conteúdo. Idéia similar a essa é a de
D’Ambrósio:
“Contextualizar a Matemática é essencial para todos. Afinal, como deixar de relacionar os
Elementos de Euclides com o panorama cultural da Grécia Antiga? Ou a adoção da
numeração indo-arábica na Europa como florescimento do mercantilismo nos séculos XIV e
XV? E não se pode entender Newton descontextualizado. (...) Alguns dirão que a
contextualização não é importante, que o importante é reconhecer a matemática como a
manifestação mais nobre do pensamento e da inteligência humana... e assim justificam sua
importância nos currículos” (D’AMBROSIO, 2001,76).
Quanto a essa critica, sobre a restrição da matemática voltada apenas ao seu caráter “nobre” de
pensamento, é necessário destacar que nem todos os alunos se encaminharão em áreas exatas. Apesar da
linguagem matemática no seu aspecto sintático ter importância e a escola ter o objetivo de fazer com que os
53
alunos a entenda, não se pode esquecer dos fatores envolvidos nesse processo. Destaquemos o que diz
nos PCN’s (2000):
“O conhecimento matemático formalizado precisa, necessariamente, ser transferido para se
tornar possível de ser ensinado, aprendido; ou seja, a obra e o pensamento do matemático
teórico não são passiveis de comunicação direta aos alunos.(...) Esse processo de
transformação do saber cientifico em saber escolar não passa apenas por mudanças de
natureza epistemológica, mas é influenciado por condições de ordem social, e cultural que
resultam na elaboração de saberes intermediários, como aproximações provisórias,
necessárias e intelectualmente formadoras. É o que se pode chamar de contextualização do
saber.” (p.39).
A partir destas colocações podemos entender que a aversão dos alunos muitas vezes se dá porque
os conteúdos matemáticos são apresentados diretamente em sua forma, geralmente difícil de ser
compreendida pelo aluno.
1.2 Contextualização e cotidiano
Existe uma aproximação entre os termos contextualização e cotidiano, muitas vezes usados como
sinônimos. Nesta perspectiva, analisamos alguns trabalhos a exemplo da pesquisa em Modelagem
Matemática que propõe o ensino de funções polinomiais aplicadas ao plantio de morangos, cuja idéia de
contextualização aparece de forma significativa no desenvolvimento das atividades.
“Não é mais possível apresentar a Matemática aos alunos de forma descontextualizada,
sem levar em conta que a origem e o fim da Matemática é responder às demandas de
situações-problema da vida diária.” (GROENWALD, FILLIPSEN, 2002:29)
Nesta pesquisa o termo contextualização aparece associado à idéia de situação problema no
cotidiano.
Num outro estudo sobre o processo de aquisição da alfabetização matemática, o autor mostra dois
grupos de problemas. No primeiro, utiliza o subtítulo “Contextualização da experiência” e no segundo,
“Explorando a descontextualização?”. (JUNIOR, 2003)
Os temas escolhidos para trabalhar respectivamente foram divida externos e osteoporose. No
primeiro, o autor associa divida externa à divida feita por famílias às famílias dos estudantes. No segundo,
não houve aproximação das situações com a vivência dos alunos.
Resumindo, podemos dizer que contextualização se aplica a situação problema relacionada ao
cotidiano. Ou seja, não basta uma situação em que o aluno faça apenas operações, mas que a aproveite
primeiro relacionando a sua vida. Verificaremos, primeiro, algumas considerações sobre contextualização e
cotidiano.
“O ensino contextualizado vem sendo bem aceito na comunidade educacional, como
atestam trabalhos apresentados em recentes congressos da área. Rapidamente, vem se
54
fazendo uma substituição do conceito de cotidiano e de valorização dos saberes populares
pelo conceito de contextualização, muitas vezes havendo a suposição de que se trata do
mesmo enfoque educacional.” (LOPES,2002,399)
Com essa consideração em relação à substituição que se faz de contextualização por cotidiano,
devemos verificar que é necessário contextualizar o ensino de acordo com o grau de cognição e fatores
socioculturais, mas não deixar o ensino se transferir apenas para o cotidiano, ou saberes populares.
Contextualização é fazer o intercambio entre ensino e cotidiano. Não se atentando a essa questão, se
permitirá ao aluno apenas lidar com seu mundo de saberes, de práticas, de códigos e de continuar sem
estabelecer conexões com os símbolos, estruturas, e com outros aspectos universalizantes do ensino.
“Outra distorção perceptível refere-se a uma interpretação equivocada da idéia de
“cotidiano”, ou seja, trabalha-se apenas com o que se supõe fazer parte do dia a dia do
aluno.” (MEC, 2000:25)
Com o ensino Tradicional e a Matemática Moderna buscava-se formar, um indivíduo disciplinado e
inteligente, respectivamente. Atualmente, o que se propõe ao formar o aluno á torná-lo cidadão. Assim,
como entre as várias idéias, encontra-se a de utilizar o cotidiano, onde temos que entendê-lo não somente
como integrante de atividades quaisquer, mas com as várias atividades que se possa ter na sociedade.
1.2.1 Contextualização e interdisciplinaridade A idéia de contextualização, em trabalhos e estudos, vem surgindo paralelamente a de
“interdisciplinaridade” estando incluídas tais palavras inclusive nos PCN’s, e no PCNEM. Estes, ao tratarem
dos critérios para elaboração do currículo, esclarecem:
“O critério central é o da contextualização e da interdisciplinaridade, ou seja, é o potencial
de um tema permitir conexões entre diversos conceitos matemáticos e entre diferentes
formas de pensamento matemático, ou, ainda, a relevância cultural do tema, tanto no que
diz respeito às suas aplicações dentro ou fora da Matemática, como à sua importância
histórica no desenvolvimento da própria ciência.” (p.255)
Percebemos que o que predomina nesta citação é a concepção de contextualização como processo
histórico. No entanto, contextualização aparece vinculada a interdisciplinaridade numa perspectiva mais
ampla que enfoca a ação pedagógica como o processo de desenvolvimento de competências por meio de
estratégias, e:
“Em tal processo, é condição necessária que os conteúdos sejam contextualizados e
tratados de forma interdisciplinar. Muitas vezes, a simples contextualização já acarreta a
interdisciplinaridade, porque entender um contexto real e agir sobre ele depende dos
diversos pontos de vista das diferentes disciplinas.” (IMENES,LELLIS,2001:2)
55
Nesta concepção, fica claro que a idéia de contextualização dos conteúdos é a possibilidade de
entendê-los a partir de um contexto e agir sobre o mesmo. Já a interdisciplinaridade é as diferentes formas
de compreender os conteúdos considerando as diferentes disciplinas.
Seguindo as orientações de Milton Greco (1994), em seu livro intitulado Interdisciplinaridade,
podemos entendê-la como sendo o tratamento que se dá a um determinado assunto relacionando-o às
demais disciplinas, sem sobrepor os objetos de cada disciplina, mas sim os do assunto abordado.
Tratando-se ainda de estudos que relacionam a idéia de contextualização com a de
interdisciplinaridade, destacamos um trabalho que trata da importância de usar a Pedagogia de Projetos:
“Consideramos que o trabalho com projetos deve favorecer a qualidade da educação
escolar umas vez que as idéias de interdisciplinaridade e contextualização nele presentes
apontam, entre outras coisas, para uma (re)significação dos conteúdos e do currículo, para
uma adoção de estratégias de ensino diversificadas, para uma organização dos conteúdos
em estudos ou áreas que propiciem uma visão não fragmentada do conhecimento e,
principalmente, o tratamento dos diferentes conteúdos em associação direta a uma
realidade sócio-cultural.” (BELLO,BASSOI,2003:29)
Novamente, temos a contextualização e a interdisciplinaridade tratadas simultaneamente. Nesse
caso, as idéias estão estabelecidas como sendo importantes para um trabalho com projetos. Como
havíamos falado sobre projetos, quando falamos da pirâmide informacional estabelecida por Machado,
projeto era o último elemento, sendo alcançado quando já assimilado o conhecimento, possibilitando
interação e produção sobre o que se projetou.
De acordo com o conhecimento e inteligência definidos por Machado, esta ligada à capacidade de
estabelecer projetos, nas quatro características acima, as duas primeiras auxiliam no desenvolvimento de
capacidades e as duas últimas no reconhecimento do contexto ao qual se esta inserindo.
Considerações finais O objetivo dessa primeira parte do trabalho foi de analisar as concepções do termo contextualização,
estudo importante para as próximas fases que são o estudo do conteúdo de funções, seu aspecto histórico
e com qual concepção de contextualização se apresentam nos livros didáticos. A escolha do tema funções
se deu por considerá-lo um conteúdo muito presente nas diversas relações da sociedade, nas diversas
disciplinas e ramos internos da matemática.
Bibliografia BELLO, Samuel E.L. e BASSOI, Tânia Stella. A Pedagogia de Projetos para o ensino interdisciplinar de
Matemática em curso de formação continuada de professores. Educação Matemática em Revista. São
Paulo: SBEM, n.15, p.29-38.
D’AMBROSIO, Ubiratan. A História da Matemática: Questões Historiográficas e Políticas e reflexos na
Educação Matemática. In BICUDO, Maria Aparecida Viggiani (Org). Pesquisa em Educação Matemática:
concepções e perspectivas. São Paulo: Editora UNESP, 1999. Parte II, cap. 5, p.97-115.
D’AMBROSIO, Ubiratan. Etnomatemática – elo entre as tradições e a modernidade. Belo Horizonte:
Autêntica, 2001. 112p (Coleção Tendências em Educação Matemática, I)
56
FONSECA, Maria C.F.R. Por que ensinar Matemática. Presença Pedagógica, Belo Horizonte, vol 1, n.6,
p.46-54, marco/abril, 1995.
GRECO, Milton. Interdisciplinaridade e revolução do cérebro. São Paulo: Pancast Editora, 1994. 174p.
GROENWALD, Claudia L.Oliveira e FILIPPSEN, Rosane Maria Jardim. O meio ambiente e a sala de aula: A
função polinomial de 2° grau modelando o plantio de morangos. Educação Matemática em Revista. São
Paulo: SBEM, n.12, p.21-29, 2002.
IMENES, Luiz Marcio e LELLIS, Marcelo. A matemática e o novo ensino médio. Disponível em
<www.somatematica.com.br/artigo/a4/p5.php> Acesso em: 2001.
JUNIOR, Lucilo de Souza. A matemática popular e a apropriação dos códigos formais. Educação Matemática em Revista. (SBME), n. 13, p.36-40, 2003.
MACHADO, Nilson Jose. Epistemologia e Didática: as concepções de conhecimento e inteligência e a pratica docente. São Paulo: Cortez, 2002.
MICOTTI, Maria Cecília de Oliveira. O ensino e as proposta pedagógicas. In: BICUDO, Maria Aparecida
Viggiani (Org.) Pesquisa em educação matemática: concepções e perspectivas. São Paulo: Editora
UNESP, 1999. Parte III, cap.9, p.153-167.
MIORIM, Maria Ângela. Introdução à História da Educação Matemática. São Paulo: Atual, 1998.
Ministério Da Educação. Parâmetros curriculares nacionais: ensino médio. Brasília: MEC, 1999. 364p.
Ministério Da Educação. Parâmetros curriculares nacionais: matemática. Rio de Janeiro: DP&A, 2000.
142P.
SILVA, Jairo Jose da. Filosofia da Matemática e Filosofia da Educação Matemática. In: BICUDO, Maria
Aparecida Viggiani (Org.). Pesquisa em educação matemática Pesquisa em: concepções e perspectivas. São Paulo: Editora UNESP, 1999. Parte I, cap.2, p.45-58.
57
AS LEIS DA EDUCAÇÃO E A AVALIAÇÃO: PROPOSTA DE UM ESTUDO HISTÓRICO
Iara da Silva França
Mestranda em Educação da PUC-PR
isfranca@gmail.com
Resumo: O presente trabalho tem como objetivo refletir sobre a trajetória da avaliação da aprendizagem no
Estado do Paraná, fazendo uma análise das relações existentes entre as leis que regiam a avaliação da
aprendizagem e o contexto político e social, durante as décadas de 1960 a 1980, por ser o período de
desencadeamento e posterior esgotamento do Movimento da Matemática Moderna. Para tanto, faz um
breve relato da avaliação historicamente situada no contexto social do Brasil. Num segundo momento,
busca conhecer as principais leis que se pressupõe, direcionavam os professores em suas práticas
avaliativas, a nível Nacional e Estadual no período do Movimento da Matemática Moderna.
Palavras-chave: avaliação, leis, práticas avaliativas, professores, Movimento da Matemática Moderna.
Introdução Sendo a Matemática uma criação ou uma série de criações humanas, é importante entender as
relações da Matemática com o mundo, no qual ela está em constante mutação e aperfeiçoamento.
Da mesma forma, a matemática escolar também sofre constantes mudanças e, ao longo do tempo,
apresentou diversas alterações. Entre estas alterações pode-se citar um importante Movimento de reforma
curricular, que foi o Movimento da Matemática Moderna e sobre o qual julga-se importante recorrer à
história, para buscar informações que possibilitariam conhecer como se desenvolveram as práticas
pedagógicas que ocorreram no interior das Escolas, no período d o referido Movimento e as possíveis
contribuições à Matemática de hoje. No interior destas práticas, destaca-se a avaliação.
A importância da avaliação vêm tendo inúmeras alterações no decorrer dos tempos, sofrendo a
influência das tendências de valorização que se acentuam em cada época. Em uma visão simples e
objetiva, atualmente, considera-se a avaliação da aprendizagem como um processo que possibilita a
tomada de decisões para aperfeiçoar o processo de ensino-aprendizagem.
A prática da avaliação vêm sendo discutida por importantes e respeitados educadores a partir das
últimas duas décadas do final do século XX. Como resultado de tais reflexões, estes educadores têm
proposto inúmeras alternativas para que esta prática seja efetivamente colaborar no aperfeiçoamento do
processo de ensino-aprendizagem em Matemática. Entretanto, muito pouco se sabe sobre as práticas
avaliativas dos professores de Matemática , no período do Movimento da Matemática Moderna.
Embora a Matemática seja apontada pelas estatísticas como uma das disciplinas mais excludentes
na Educação, parece que a avaliação era uma das questões menos relevantes nos debates científicos da
comunidade matemática das décadas de 60 até 80, o mesmo acontecendo com os documentos oficiais da
Educação.
Pressupõe-se que os professores de Matemática seguiam a legislação no que se refere à avaliação
naquele período. O que dizia essa legislação? As práticas avaliativas dos professores de Matemática do
referido período eram efetivamente direcionadas por uma legislação? Para Pinto (2003, p.1) a análise dos
documentos históricos pode revelar a lógica presente nas finalidades da avaliação vigente em determinado
período histórico.
58
É, portanto, na perspectiva de conhecimento das práticas avaliativas em Matemática deste
momento histórico que se propõe a reflexão sobre a trajetória da avaliação em Matemática a partir da
década de 60, analisando as leis da educação e buscando alguns depoimentos de professores do referido
período.
Por se tratar especificamente da avaliação em Matemática no Estado do Paraná, serão analisadas
leis Estaduais e Nacionais. Procurar-se-á discutir as referidas leis em seu aspecto regulador e sua possível
Interferência nas práticas avaliativas dos professores de Matemática.
1. Avaliação no Contexto Histórico, Político e Social Avaliar é uma atividade intrínseca ao ser humano. Sempre se está avaliando para tomar decisões
em diversas situações em nossa vida. Entretanto, a avaliação também pode ser vista como uma forma de
controle, que para Garcia (2003, p. 29) “visava selecionar e, portanto, incluir uns e excluir outros”. A
avaliação de uma maneira geral, serve como subsídio, tendo em vista, a obtenção do melhor resultado
possível. Nesse sentido, avaliação da aprendizagem escolar, compreendida para subsidiar os resultados da
aprendizagem, tem como finalidade garantir a qualidade do resultado que se está construindo.
As recentes reformas curriculares de Matemática, propostas na última década em um grande
número de países, têm colocado na ordem do dia algumas questões que tinham pouco ou nenhum
destaque nos programas curriculares vigentes até então, entre elas a questão da avaliação.
Há muitas variáveis colocadas para que se entenda a avaliação. Dessa forma, para que melhor se
compreenda o significado da avaliação escolar é necessário que se compreenda também sua dimensão
sócio – histórica e o contexto político social em que se insere a avaliação em dado momento, na tentativa
de uma reconstrução de seus significados sociais, assim como, o entendimento de algumas concepções de
avaliação que vem sendo formadas ao longo do tempo pelos professores e pela sociedade.
Segundo Garcia (2003, p. 31), não há nada na literatura pedagógica até muito recentemente sobre
a prática do exame na escola. As duas primeiras formas de se institucionalizar o exame surgem no século
XVII e uma vem de Comenius que entende o exame como “um lugar de aprendizagem e não de verificação
da aprendizagem” . A outra, propõe o exame como supervisão permanente e é defendida por La Salle em
Guia das Escolas Cristãs. Ao que parece, as posições de ambos os teóricos deixaram conseqüências que
se pode sentir até hoje.
No que se refere ao exame ainda no século XVII, Barriga comenta que:
A transformação operada nesse século: promover e qualificar o desempenho estudantil através do
exame. Por um lado, separou o exame da metodologia. O exame deixou de ser um aspecto do
método ligado à aprendizagem. Por outra parte, perverteu a relação pedagógica ao centrar os
esforços dos estudantes e docentes apenas na certificação. (BARRIGA, 2003, p. 61)
Devido à escassez de literatura no que se refere à avaliação escolar, possivelmente pelo fato da
pouca ou nenhuma importância dada ao assunto, que já adquirira a função de controle, nos transportamos
ao século XX, quando a pedagogia deixa de se referir ao termo exame e o substitui por teste, como
resultado da influência dos Estados Unidos em seu processo de transformação social provocada pela
industrialização. Ainda segundo Barriga (2003, p. 64) a construção de provas para medir a inteligência,
através do conceito de coeficiente intelectual, reduziu o problema da injustiça social a uma dimensão
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biologista. Estes estudos rapidamente se transformaram numa teoria de testes e daí, considerados testes
científicos, válidos para determinar uma série de fatores psicológicos do indivíduo. A partir daí, foram
elaborados por Thorndike e seus discípulos, também testes de rendimento escolar com a finalidade de
efetuar a discriminação entre os que se destacavam ou não para determinadas habilidades. Dessa forma,
para Barriga (2003, p. 67), “No plano político os testes de inteligência e aprendizagem permitiam justificar o
acesso à escola de acordo com as condições individuais”.
Na segunda metade do século XX, o que se percebe é que o exame parece ter-se desvinculado da
didática tornando-se independente como campo de estudo. O termo exame passa a ser teste e finalmente
avaliação, porém, continua tendo a mesma finalidade: a de controle e medição.
As políticas públicas de diferentes países sofreram brusca mudança na década de 1970 devido à
grandes problemas econômicos advindos da crise do Petróleo. Segundo Dalben (2002, p. 25) “o Estado
passou de provedor de bens e serviços para avaliador e controlador”. A educação que até então era um
direito do cidadão, em uma escola aberta para todos, deixa de lado as idéias de igualdade e ampliação do
acesso à escola e passa ao controle orçamentário. Em consonância com o mercado, (Sobrinho apud
Dalben, 2002, p. 26) afirma que, dessa forma ”os governos passam a exigir a mudança do referencial
básico para as avaliações”.
Ainda na década de 1970, já entrando nos anos de 1980, podem-se encontrar políticas centradas
nas reformas curriculares como sendo a salvação da escola pública brasileira. E o Estado novamente se
impõe, através da Avaliação Institucional.
Podem-se claramente estabelecer as relações entre a avaliação vista como um todo, num processo
histórico, político e social e a avaliação escolar, estabelecida nas relações sociais da escola.
Os princípios da avaliação têm sido legitimados por um modelo social liberal conservador,
manifestando-se assim, de forma autoritária na sociedade e na escola. Dessa forma, a avaliação escolar
não acontece desarticulada do contexto histórico onde se insere, traduzindo em sua prática uma concepção
teórica de educação e de sociedade.
2. Leis Nacionais e Estaduais que direcionavam a Educação no período do MMM.
Através da história pode-se comprovar, que as leis da Educação, e conseqüentemente, as leis que
se referem à avaliação da aprendizagem, parecem seguir as tendências das demais leis instituídas no
Brasil, que sempre procuraram atender às ideologias de dominação das elites.
No início do período em que se situa o Movimento da Matemática Moderna no Brasil, 1960, a lei
ainda vigente na educação era a Lei Orgânica Gustavo Capanema, nº 4244 de 09 de abril de 1942. Esta
Lei foi substituída em 20 de dezembro de 1961 pela Lei 4024/61 e posteriormente, ainda durante o
Movimento da Matemática Moderna foi implantada a Lei 5692/71.
A primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional elaborada no Brasil, foi a Lei n º
4024/61, que tinha por objetivo fixar as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. A criação da referida lei
veio após exaustivo debate do Congresso Nacional, com duração de quase vinte anos, pois a única lei para
regulamentar a educação no Brasil, até então, era a Lei Orgânica nº 4244/42, que no entanto, segundo
profissionais da educação, não tinha estrutura para dar as diretrizes para a educação.
60
Entretanto, a primeira lei de diretrizes e bases da educação, a Lei 4024/61, não correspondeu às
expectativas das pessoas envolvidas no processo, por trazer ainda muitas falhas, principalmente no que se
refere ao ensino básico. Segundo Saviani (1997), a Lei n º 4.024/61 era uma lei inócua.
Parece que a avaliação da aprendizagem neste período era tratada como se tivesse pouca ou
nenhuma relevância no processo de aprendizagem, sendo essencialmente classificatória e utilizada
somente para a verificação dos resultados na forma de conceitos.
Em relação à avaliação da aprendizagem, a Lei 4024/61 determina em seu Artigo 39 que:
Art. 39 A apuração do rendimento escolar ficará a cargo dos estabelecimentos de ensino, aos quais caberá expedir certificados de conclusão de séries e ciclos e diplomas de conclusão de cursos. §1º Na avaliação do aproveitamento do aluno preponderarão os resultados alcançados durante o
ano letivo, nas atividades escolares, asseguradas ao professor, nos exames e provas, liberdade de formulação de questões e autoridade de julgamento.
§2º os exames serão prestados perante a comissão examinadora, formada de professores do próprio estabelecimento, e, se for particular, sob fiscalização de autoridade competente.
Embora a determinação da Lei 4024/61 fosse no sentido de que preponderassem os resultados
obtidos durante o ano letivo, fica implícito que estes resultados são aferidos em forma de conceitos que
classificava o aluno em excelente, ótimo, bom, regular ou insuficiente, assim como, é explicitada a
autoridade do professor, num processo de autoritarismo, podendo-se claramente reconhecer na avaliação
um instrumento de dominação e poder.
Outro aspecto muito importante a ser analisado na Lei 4024/61, é a forma de ingresso no Ensino
Médio, que era composto do ciclo ginasial e colegial e que são hoje as quatro séries finais do Ensino
Fundamental e as três séries do atual Ensino Médio. Para ingressar no 1º ano do 1º ciclo do Ensino Médio,
atual 5ª série, o aluno tinha que obrigatoriamente passar pelo exame de admissão, que se tratava de um
exame para verificação de conhecimentos considerados básicos para que o aluno prosseguisse seus
estudos. Entre as disciplinas “seletivas”, a Matemática era, estatisticamente, a que mais reprovava. Para
Valente, o exame de admissão funcionou como um verdadeiro rito de passagem no processo de seleção à
continuidade dos estudos, representada pelo ginásio acadêmico, que teve procura intensificada a partir de
1930 (VALENTE apud PINTO, 2003, p. 1). O Art. 36 da Lei 4024/61 trata do referido aspecto da seguinte
forma:
Art. 36 O ingresso na 1ª série do ciclo dos cursos de ensino médio depende de aprovação em exame de admissão, em que fique demonstrada satisfatória educação primária,
Na Coletânea da Legislação Estadual de Ensino do Estado do Paraná (1969, p.767), encontra-se a
Portaria 566/69 de 31 de janeiro de 1969, que estabelece normas para a elaboração de relatórios
semestrais e anuais dos Estabelecimentos de Ensino Médio, subordinados ao Sistema Estadual de Ensino.
Segundo o Art. 2º desta Portaria, nos meses de janeiro e julho de cada ano letivo, os Estabelecimentos de
Ensino deveriam remeter às Divisões de Ensino competentes, os relatórios das notas bimestrais, das faltas
dos alunos e das aulas dadas e previstas nas diversas disciplinas e práticas educativas, utilizando o
impresso oficial.O artigo 3º estabelece ainda, que até 30 de março do ano letivo deveria ser enviado ainda,
o relatório das atividades escolares, compreendendo entre outras, ata de exame da admissão, ata de
resultado de exames finais, relação de alunos matriculados e estatística da matrícula e aproveitamento. Tal
Portaria parece confirmar na educação do Paraná a postura encontrada à nível Nacional de um Estado
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autoritário e regulador, sendo utilizado o exame de admissão como um mecanismo de exclusão e controle
da escolarização da população.
No período em que a Lei 4024/61 dava as diretrizes para a educação a nível nacional, parece que
no Estado do Paraná não havia legislação específica que tratasse da avaliação da aprendizagem.
A Lei 5692/71 de 11 de agosto de 1971, cujo objetivo principal era alargar a faixa de educação
obrigatória, que até então era o antigo primário e remodelar o sistema educacional referente ao ensino de 1º
e 2º graus, fixando suas diretrizes e bases, foi promulgada no período em que o Movimento da Matemática
Moderna já não era tão vigoroso no Brasil, porém, ainda se encontrava bastante dinâmico no Paraná.
Cabe aqui observar, que quando uma nova lei é promulgada, sua implantação é feita gradualmente,
e sua intervenção recai, apenas, sobre as novas turmas, ficando, portanto, também em vigor, por um longo
período, a lei anterior. Uma das grandes mudanças propostas pela Lei 5692/71, foi a extinção do Exame de
Admissão ao Ginásio. Este exame era constituído, entre outras, por provas de Aritmética e perdeu seu
sentido ao serem extintos os antigos, Primário e Ginásio, visto que, ao serem unificados em Ensino de 1º
Grau, extinguiu-se, a seleção de alunos para o acesso à 5ª. Série, que era feito através de provas
intituladas Exame de Admissão.
No Paraná foi a Deliberação 42/71 de 09 de novembro de 1971 que estabeleceu as normas para o
acesso à 1ª série do então Curso Ginasial, determinando, entretanto, em seu Art. 4º, que “Nos casos de
insuficiência de vagas, na 1ª série do atual Curso Ginasial, será realizado teste classificatório dos
candidatos inscritos”, o que demonstra ainda resquícios de controle e regulação do Estado.
Sobre avaliação da aprendizagem, em 1971 a Lei 5692/71 dizia o seguinte em seu artigo 14:
Art. 14 – A verificação do rendimento escolar ficará, na forma regimental, a cargo dos estabelecimentos, compreendendo a avaliação do aproveitamento e a apuração da assiduidade. § 1º Na avaliação do aproveitamento, a ser expressa em notas ou menções, preponderarão os aspectos qualitativos sobre os quantitativos e os resultados obtidos durante o período letivo sobre os da prova final, caso esta seja exigida.
§ 2º O aluno de aproveitamento insuficiente poderá obter aprovação mediante estudos de recuperação proporcionados obrigatoriamente pelo estabelecimento.
§ 3º Ter-se-á aprovado quanto à assiduidade: a) o aluno de freqüência igual ou superior a 75% na respectiva disciplina, área de estudo ou atividade; b) o aluno de freqüência inferior a 75% que tenha tido aproveitamento superior a 80% da escala de notas ou menções adotadas pelo estabelecimento; c) o aluno que não se encontra na hipótese da alíquota anterior, mas com freqüência igual ou superior ao mínimo estabelecido em cada sistema de ensino pelo respectivo Conselho de Educação, e que demonstre melhoria de aproveitamento após estudos a título de recuperação. § 4º - Verificadas as necessárias condições, os sistemas de ensino poderão admitir a adoção de
critérios que permitam avanços progressivos dos alunos pela conjugação dos elementos de idade e aproveitamento.
Como se pode observar, a Lei 5692/71 deixa a critério dos estabelecimentos de ensino a
responsabilidade pelo rendimento escolar, incluindo neste a avaliação da aprendizagem e a assiduidade, o
que vem legitimar as observações acerca de um estado controlador e avaliador também no Brasil.
Entretanto, é necessário que se busque referencial teórico acerca das Leis no Estado do Paraná
onde se desenvolve o presente estudo.
Nesse sentido, ao se examinar o Currículo elaborado pela Secretaria de Estado da Educação do
Paraná na década de 1970, verificou-se a ausência de quaisquer orientações relacionadas à avaliação da
aprendizagem. Entretanto, implicitamente pode-se perceber uma avaliação voltada para a verificação dos
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objetivos alcançados, como um produto final, quando se analisa no Currículo de Matemática (1973, p. 143)
a orientação de que Para que a aprendizagem seja efetiva, os objetivos formulados devem considerar as
fases do desenvolvimento mental do aluno, numa manifestação clara de que a aprendizagem se
concretizará, quando ao serem avaliados, os alunos demonstrarem ter conseguido alcançar os objetivos
inicialmente fixados pelo professor, apesar de o professore considerar as fases do seu desenvolvimento
mental.
Entretanto, a Deliberação 035/76 (SEED, 1976, p. 353- 356) da Secretaria de Estado da Educação,
que estabelece princípios e normas gerais para a avaliação, promoção e recuperação a serem obedecidos
pelos estabelecimentos de ensino de 1º grau regular, do Sistema Estadual de Ensino do Paraná, ao trazer
as orientações para a avaliação da aprendizagem escolar, a partir de 1976, período em que a Matemática
Moderna ainda vigorava, determina que a mesma deve ser entendida como um processo de pesquisa que
visa interpretar e estudar, não só os conhecimentos, habilidades e atitudes dos alunos, como também o
diagnóstico do professor em sala de aula, o controle do rendimento do processo escolar e todos os
aspectos do currículo. Além disso, orienta que a avaliação deve estar sempre voltada para a concretização
dos objetivos e deve respeitar as diferenças individuais dos alunos, utilizando técnicas e instrumentos
diversificados. Na forma regimental, cada escola determinará os próprios critérios de avaliação, que deverá
ser contínua e permanente, preponderando os aspectos quantitativos sobre os qualitativos. Os registros
desta avaliação deverão estar em documentos próprios do estabelecimento. Ao que parece, de acordo com
essa deliberação, já em meados da década de 1970, se propunha uma avaliação formativa no Estado do
Paraná.
Considerações Finais Ao analisar a legislação a nível Nacional e parte da Legislação do Estado do Paraná, relacionadas
à avaliação, do referido período, buscou-se conhecer as diretrizes utilizadas para a avaliação sem a
pretensão de estabelecer comparações entre as leis vigentes em cada período, visto que a seu tempo todas
foram importantes e retratam a história da avaliação em determinado contexto.
Dessa forma, as conclusões parciais deste trabalho nos levam a conhecer e refletir sobre as diferentes
leis que trazem sua contribuição em determinado momento e parecem evoluir segundo as necessidades
que se apresentam nos diferentes tempos e contextos, na busca de novas diretrizes e de novos caminhos
para a avaliação.
Entretanto, o presente trabalho denota a necessidade de estudos mais aprofundados, buscando-se as
opiniões dos sujeitos que vivenciaram o Movimento da Matemática Moderna, procurando trazer significado
ao cotidiano escolar do referido período, para que se possam fazer reflexões mais amplas, em uma
pesquisa mais profunda e abrangente, especialmente no que se refere à relação entre as leis a as práticas
avaliativas dos professores no período do Movimento da Matemática Moderna.
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