A Poesia Marginal Hollanda

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8/15/2019 A Poesia Marginal Hollanda

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 A poesia marginalAtualizado em 9 de setembro | 6:26 PM

O que hoje é conhecido como poesia marginal pode ser definido como umacontecimento cultural que, por volta de 1972-1973, teve um impacto significativo noambiente de medo e no vaio cultural, promovidos pela censura e pela viol!ncia da

repress"o militar que dominava o pa#s naquela época, conseguindo reunir, em torno dapoesia, um grande p$blico jovem, até ent"o ligado mais % m$sica, ao cinema, sho&se cartoons.

'istoricamente, os primeiros sinais editoriais da poesia marginal foram osfolhetos mimeografados Travessa Bertalha de (harles )ei*oto e Muito Prazer de(hacal, ambos de 1971+ uas outras publica.es também marcaram as fronteiras dessenovo territ/rio liter0rio+ "o elas Me Segura qu’eu vou dar um troço de al4 alom"o519726 e a edi"o p/stuma de Últimos Dias de Paupéria, de orquato 8eto, 519726+ m1973, a poesia marginal j0 aparece como categoria poética nos encontros *poesia :, na);( <= e *poesia :: em (uritiba+ 8o ano seguinte, o evento )oem>"o, tr!s dias demostras e debates, no ?>? <=, com grande aflu!ncia de p$blico, comprovou apresena liter0ria dos marginais na cena poética da época+

O termo marginal 5ou magistral como diia o poeta (hacal6, amb#guo desde oin#cio, oscilou numa gama inesgot0vel de sentidos marginais da vida política dopaís, marginais do mercado editorial, e, sobretudo, marginais do cânoneliterário+ @oi uma poesia que surgiu com perfil despretensioso e aparentementesuperficial mas que colocava em pauta uma quest"o t"o grave quanto relevanteoethos  de uma gera"o traumatiada pelo cerceamento de suas possibilidades dee*press"o pelo crivo violento da censura e da repress"o militar+ m cada poema-piada,em cada improviso, em cada rima quebrada, além das marcas de estilo da poesiamarginal, pode-se entrever uma aguda sensibilidade para registrar A com maior oumenor lucide, com maior ou menor destrea liter0ria A o dia-a-dia do momentopol#tico em que viviam os poetas da chamada gera"o >:B+

eterminados em n"o dei*ar o Csil!ncioD se instalar, os poetas marginais

definiram uma poesia com fortes traos anti-liter0rios que se chocava com oexperimentalismo erudito das vanguardas daquele momento. Uma dicçãopoética empenhada em brincar! com os padr"es vigentes de qualidadeliterária, de densidade hermen#utica do texto poético, da exig#ncia de umleitor quali$icado para a plena $ruição do poema e seus subtextos + >ssim, osmarginais, com um s/ gesto, desafiaram n"o apenas a cr#tica, mas tambéma instituiço liter!ria oferecendo uma poesia biodegrad0vel que n"o parecia importar-se nem com a perman!ncia de sua produ"o, nem com o reconhecimento da cr#ticainformada pelos padr.es canEnicos da historiografia liter0ria+ >o contr0rio,marcavam sua posição ao não explicitar qualquer pro%eto literário oupolítico e ao apresentar&se claramente como não&programática,mostrando&se avessa ' escolas e a enquadramentos $ormais+ 8este sentido,

poder#amos considerar hoje os marginais como estruturalmente marcados porexperi#ncias que re$letem uma quebra geral de certe(as e $)rmulas se%amelas políticas, literárias ou existenciais, tornando&se, na realidade,mais off  literários do que anti-literários+ >través do uso irreverente dalinguagem poética e da afirma"o de um desempenho ironicamente fora do sistema, ospoetas marginais sinaliavam em sua te*tualidade e atitudes uma apro*ima"o radicalentre arte F vida+

 > surpreendente capacidade de improviso e a diversidade criativa dasinterven.es que os marginais promoviam sem solu"o de continuidade, denunciavamesse firme prop/sito de viver poeticamente.ra o que pregava (acaso quando diia Ca vida n"o est0 a# para ser escrita, mas a poesia sim, est0 a# para ser vividaGD+)oder#amos mesmo definir o estilo marginal a partir da presena renitente da inven"o

poética na pr0tica da produ"o, divulga"o e comunica"o de seus produtos+ mtempos de Cmilagre econEmicoD e profissionalia"o de nossas empresas editoriais, os

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poetas marginais optaram pela produ"o CdomésticaD e pela comercialia"oindependente+ ssa op"o, refletindo as determinantes vitalistas de nossos poetas e seucompromisso em Cviver poeticamenteD, traduiu-se numa série de publica.esdesafiadoras do ponto de vista das normas da produ"o editorial daquele momento+@oram lanados folhetos mimeografados, livros artesanais, livros-envelopes, posters,cart.es-postais, cartaes, varais de poesia, grava.es em muros e paredes e até mesmouma torrencial chuva de poesia que inundou o centro de "o )aulo, no dia H dedeembro de 1979+ :nvadiram as ruas, teatros, e*posi.es, ganharam espao naimprensa nanica, investiram pesado na venda de m"o em m"o, no contato direto entreo poeta e seu leitor+ *riaram sua $orma particular de comunicação com op+blico a Artimanha, produto etimol)gico da $usão de manha - arte,cu%os principais quartéis generais $oram a ivraria /uro e o 0arque ageno 12+ egundo (hacal, a primeira >rtimanha foi produida na ?uro, :panema, emoutubro de 197B+ m janeiro de 7I, no ?>? <=, foi armada a >rtimanha :: Cparaapresentar o "lmanaque Biot#nico $italidade % sociedade da cidadeD reunindo poetas,m$sicos, atores, artistas pl0sticos, técnicos de som e lu e Coutras pessoas semespecifica.es que chamaria de artimanhosas e manhososD+ anto a estética quanto aética das >rtimanhas marginais marcavam clara diferena com os eventos dapoesia %eat , seus antecessores engajados e malditos no melhor estilo &ipiie, deinterven"o violenta dentro do sistema.

 >inda refletindo a cultura 7JKs da vida e da produ"o grupal e cooperativa, ospoetas marginais defenderam sua Ct0tica das cole.esD, uma forma de associa"oepis/dica que n"o se identificava com a forma"o de grupos ou tend!ncias, A uma veque se conectavam e dissolviam em fun"o de lanamentos -, mas que lembravam umaforma de agrupamento ocasional t#pico das festas ou de momentos de laer esocialia"o, reforando a idéia da pr0tica poética como instrumental para novasformas de verLe*perimentar a vida+ >lgumas cole.es tornaram-se Chist/ricasD como@renesi 5<=6, Mida de >rtista 5<=6, 8uvem (igana 5<=6, @olha de <osto 5<=6, Nandaia5<=6, Narra uburbana 5<=6, )inda#ba 5)6, (ooperativa de scritores 5)<6, imiar

5<86 e tantas outras+ 8"o muito diferentes das cole.es, surgem também um semn$mero de revistas+ iia ent"o )aulo eminsPi COs maiores poetas dos anos 7J n"os"o gente, s"o revistas+ <evistas pequenas, at#picas, protot#picas, n"o t#picas, coletivas,antol/gicas, onde a poesia e os poetas se acotovelam+ m comum a auto-edi"o5samiardat6 todo mundo juntando grana para comprar a droga da poesiaD+ Q o casodo "lmanaque Biot#nico $italidade 5publica"o oficial do grupo 8uvem (igana6, dopornE 'ornal Do%r!%il , do (ordelur%ano, Balo, )rion 5<=6, de ) Saco 5(6, Tri%o 5Rras#lia6, Sil*ncio e  Prot+tipo 5?N6 e tantos outros+ 8esse piquecresce a lista e a novidade das revistas e das cole.es além de algumas batalhas ganhasna grande imprensa, como as editorias do Suplemento ,iter!rio da Tri%una da -mprensa 5por ?aria >mélia ?ello6 e de o m cartaz  de (uritiba+ 3m 4567, a poesiamarginal entra para o debate acad#mico e para o circuito literário o$icial

através da publicação da antologia 26 Poetas Hoje, org. por 8eloisa 9.8ollanda que esquentou a pol#mica em torno do anti&pro%eto marginal!,com enorme repercussão na imprensa+ 8o ano seguinte, os marginais voltam aocentro da cena na /eira Poesia e "rte, um evento de grande porte em comemora"o aosBB anos da emana de >rte ?oderna, organiado pelo poeta (laudio iller no eatro?unicipal de "o )aulo+

m 197S, tr!s eventos marcam a entrada dos marginais em territ/riosinesperados a poesia marginal é tema de discuss"o no encontro oficial da R)(5ociedade Rrasileira para o )rogresso da (i!ncia6, centro da produ"o acad!micanacional, é objeto da e*posi"o C)oucos e raros A retrospectiva da produ"oindependenteD no ?>) 5?useu de >rte de "o )aulo6, um dos mais importantesmuseus do pa#s e do evento ?ostra 8acional de )ublica.es >lternativas no (; 5(asa

do studante ;niversit0rio6, reduto da resist!ncia estudantil no <io de =aneiro+ > dic"o e o tom de transgress"o da poesia marginal e suas t0ticas de produ"o ecomunica"o trou*e um saldo inesperado ainda que inevit0vel o questionamento da

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pr/pria no"o de valor liter0rio+ , com ele, a abertura de novas fronteiras para ae*perimenta"o de uma enorme variedade de estilos, dic.es, novos campos dee*press"o e posicionalidades pol#ticas e culturais no trato poético+

)or estas pr/prias caracter#sticas, a defini"o do contorno de seus grupos oumesmo de seus participantes n"o é muito f0cil+ >lguns, entretanto, destacaram-se, comclarea, na cena poética daquela hora+ Os nomes de al4 alom"o, (acaso, @rancisco >lvim, (hacal, (harles, Rernardo Milhena, >dauto de oua antos, ui Nleiser,udoro >ugusto, >na (ristina (ésar, <onaldo antos, Neraldo (arneiro, eila?iccholis e tantos outros v!m imediatamente como uma refer!ncia dessa poesia+ 8oseu conjunto, a poesia marginal parece ter sido um fenEmeno mais CatuadoD no <io de=aneiro mas com grande presena no Rrasil inteiro, como é o caso de )auloeminsP4 e >lice <ui em (uritiba, de =omard ?uni de Rrito em <ecife, de 8icolas Reher emRras#lia, de <oberto )iva em "o )aulo+

 > emerg!ncia desta poesia descart0vel e CalienadaD, sem aparente projetoestético ou pol#tico, n"o veio sem conflitos, provocando uma forte rea"o negativa dacr#tica e dos te/ricos da literatura+ > pr/pria 'ist/ria, entretanto pode nos surpreenderhoje a poesia marginal é reconhecida pela historiografia liter0ria como a e*press"o, pore*cel!ncia, da poética dos anos 7J no Rrasil+