1
Universidade Federal do Rio de Janeiro
A LATERAL PALATAL NO PORTUGUÊS DO BRASIL E NO
PORTUGUÊS EUROPEU
Vivian de Oliveira Quandt
2014
2
A LATERAL PALATAL NO PORTUGUÊS DO BRASIL E NO
PORTUGUÊS EUROPEU
Vivian de Oliveira Quandt
Tese de Doutorado submetida ao
Programa de Pós-Graduação em Letras
Vernáculas da Universidade Federal do
Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos
requisitos necessários para a obtenção do
título de Doutora em Letras Vernáculas
(Língua Portuguesa).
Orientadora: Professora Doutora Silvia
Figueiredo Brandão
Coorientador: Professor Doutor João
Antônio de Moraes
Rio de Janeiro
Fevereiro de 2014
3
A Lateral Palatal no Português do Brasil e no Português Europeu
Orientadora: Professora Doutora Silvia Figueiredo Brandão
Coorientador: Professor Doutor João Antônio de Moraes
Tese de Doutorado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Letras Vernáculas da
Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à
obtenção do título de Doutora em Letras Vernáculas (Língua Portuguesa).
Aprovada por:
_________________________________________________
Presidente, Profa. Doutora Silvia Figueiredo Brandão – Orientadora (UFRJ)
_________________________________________________
Prof. Doutor João Antônio de Moraes – Coorientador (UFRJ)
________________________________________________
Profa. Doutora Myrian Azevedo de Freitas – UFRJ
_________________________________________________
Prof. Doutor Ronald Beline Mendes – USP
_________________________________________________
Prof. Doutor José Sueli de Magalhães – UFU
__________________________________________________
Prof. Doutor Leandro Santos Abrantes – PUC-RJ
__________________________________________________
Profa. Doutora Christina Abreu Gomes – UFRJ – Suplente
__________________________________________________
Profa. Doutora Danielle Kelly Gomes – UFF – Suplente
Rio de Janeiro
Fevereiro de 2014
4
Quandt, Vivian de Oliveira.
A Lateral Palatal no Português do Brasil e no Português Europeu / Vivian de
Oliveira Quandt. – Rio de Janeiro: UFRJ/ Faculdade de Letras, 2014.
xvii, 215 f.: il.; 31cm.
Orientadora: Silvia Figueiredo Brandão
Coorientador: João Antônio de Moraes
Tese (Doutorado) – UFRJ/ Faculdade de Letras / Programa de Pós-Graduação
em Letras Vernáculas (Língua Portuguesa), 2014.
Referências Bibliográficas: f.197-205.
1. Lateral Palatal. 2. Análise Variacionista. 3. Análise de itens Lexicais. 4.
Fonologia Experimental. I. Brandão, Silvia Figueiredo. II. Universidade Federal
do Rio de Janeiro, Faculdade de Letras, Programa de Pós-Graduação em Letras
Vernáculas (Língua Portuguesa). III. Título.
5
"Ciência é conhecimento organizado. Sabedoria é vida
organizada."
Immanuel Kant
6
A meus familiares, que sempre me apoiaram e me
incentivaram a seguir adiante.
A meu filho, Frederico Félix, razão do meu viver.
A Félix, companheiro e amigo de todas as horas.
À Profa Silvia Figueiredo Brandão, que, desde a Iniciação
Científica, acreditou em mim, me incentivou e me ajudou a
não desistir.
7
AGRADECIMENTOS
- A Deus, por ter sempre me protegido e guiado meus passos.
- À Professora Doutora Silvia Figueiredo Brandão, por tudo que me ensinou e pela
orientação sempre competente, própria de uma grande mestra; pela confiança no meu
trabalho e pelas palavras de incentivo nos momentos difíceis.
- Ao Professor Doutor João Antônio de Moraes, por ter me guiado nos estudos
fonético-fonológicos, sobretudo no que se refere à Fonética Acústica, em um curso
oferecido pela Pós-Graduação em Letras Vernáculas da UFRJ, e, principalmente, por
ter aceito, mais uma vez, ser meu coorientador, assim, ajudando-me, sempre com bom
humor, a realizar este trabalho.
- Aos meus professores do Curso de Doutorado, Lúcia Helena Martins Gouvêa,
Leonor Werneck dos Santos, Maria Eugênia Lamoglia Duarte e Mônica Tavares
Orsini, por me incentivarem e por terem contribuído para a minha formação.
- À minha mãe, pelo amor e carinho que me tem dedicado; pelos ensinamentos éticos e
morais transmitidos; pelos inúmeros exemplos de coragem e determinação e por estar
sempre à disposição para me ouvir e me dar bons conselhos.
- Ao meu pai (in memoriam), por tudo o que ele representa para mim.
- À minha avó Haydée (in memoriam), minha segunda mãe, que, além de também me
transmitir um pouco do que sou hoje, sempre me estendeu a mão em momentos
bastante difíceis da minha vida.
- Às minhas irmãs, Aline e Gabriela, pelo importante e saudável convívio durante
todos esses anos.
- A meu filho, meu grande e eterno companheiro, que, mesmo ainda sendo criança,
compreende que os meus momentos de ausência são justificados por uma causa
importante: a minha formação acadêmica.
- A meus sobrinhos, meus pequenos amores, pelos inúmeros momentos de alegria a
mim concedidos.
- A Félix Hermínio (como ele gosta de ser chamado), meu amor e amigo, por, de
alguma forma, ter participado comigo de todos os vestibulares, provas da faculdade,
ingresso no mestrado e doutorado, trabalhos apresentados e feitura da dissertação e
desta tese sem reclamar (muito); por estar sempre ao meu lado, não só nos momentos
acadêmicos, mas também pessoais, dividindo sua vida com a minha.
8
- A Liomar, pelo incentivo e pelo orgulho que sempre sentiu de mim pelo fato de,
segundo ele, eu ser tão empenhada nos estudos.
- A todos os meus familiares, pelo incentivo e pelos momentos agradáveis e divertidos
que passamos juntos.
- A Flávia Ribeiro Santoro Silva Malta, pelos inesquecíveis momentos de convívio no
Projeto APERJ e por ainda ser a amiga de todas as horas.
- Aos amigos Clarisse Sena, Gisele Cantalice e Fábio Gusmão, por fazerem parte de
uma época muito importante da minha vida e por sempre terem paciência de me ouvir.
- A todos os diretores e coordenadores das escolas pelas quais passei ao longo dos
últimos 12 anos, por permitirem, muitas vezes, que eu cumprisse horários especiais de
trabalho para que fosse possível eu levar adiante a vida acadêmica.
- À Coordenação do Programa de Pós-Graduação em Letras Vernáculas, pelo
atendimento sempre prestimoso.
9
Estudo, na linha da sociolinguística variacionista e da fonologia
experimental, sobre o comportamento da lateral palatal, na fala
culta e popular da Região Metropolitana do Rio de Janeiro e da
Região Metropolitana de Lisboa, com base em dados eliciados
de entrevistas pertencentes ao Acervo do Projeto Concordância.
Descrição e análise da variação por meio do controle de
variáveis estruturais e extralinguísticas, da observação do
comportamento de itens lexicais, e de experimentos
laboratoriais no âmbito da fonologia experimental.
10
RESUMO
A LATERAL PALATAL NO PORTUGUÊS DO BRASIL E NO PORTUGUÊS
EUROPEU
Vivian de Oliveira Quandt
Orientadora: Silvia Figueiredo Brandão
Coorientador: João Antônio de Moraes
Resumo da Tese de Doutorado submetida ao Programa de Pós-graduação em
Letras Vernáculas (Língua Portuguesa), Faculdade de Letras, da Universidade Federal
do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de
Doutor em Letras Vernáculas (Língua Portuguesa).
O presente trabalho analisa o comportamento da lateral palatal na fala culta e
popular da Região Metropolitana do Rio de Janeiro (Municípios de Nova Iguaçu e do
Rio de Janeiro, este representado por Copacabana) e da Região Metropolitana de Lisboa
(Oeiras e Cacém) e é desenvolvido à luz dos pressupostos da Teoria da Variação
Laboviana e da Fonologia Experimental, com base em dois corpora, tanto o que se
refere ao PB, quanto o que diz respeito ao PE, eliciados de entrevistas que constituem o
Acervo do Projeto Estudo comparado dos padrões de concordância em variedades
africanas, brasileiras e europeias do Português (www.letras.ufrj.br/concordancia). Os
inquéritos, do tipo DID (Diálogo entre Informante e Documentador), foram efetuados
com 36 informantes brasileiros e 36 informantes portugueses, distribuídos igualmente
por sexo, três faixas etárias e três níveis de escolaridade. Obteve-se um total de 4.209
dados, 2.470 referentes ao PB e 1.739 referentes ao PE.
A pesquisa desenvolve-se em duas etapas. Na primeira, busca-se determinar os
fatores que condicionam a variação de // por meio do controle de variáveis linguísticas
e extralinguísticas e tecem-se considerações sobre a difusão das variantes pelos itens
lexicais. Na segunda, descrevem-se as análises acústicas efetuadas em laboratório para a
obtenção de evidências que contribuam para o debate sobre o status da lateral palatal.
Os resultados advindos das análises variacionistas indicam que, tanto na amostra
representativa do PB, quanto na do PE, dentre as variantes de //, [lj] é a que se mostra
mais produtiva. As demais ([lj], [l], [j] e ) são pouco frequentes, incidindo em
reduzido número de itens lexicais, o que se credita ao fato de as amostras retratarem a
fala urbana. A variação [] ~ [lj] apesar de condicionada por fatores linguísticos e
extralinguísticos em que sobressai a frequência alta/média de alguns vocábulos
presentes nos corpora, parece justificar-se, ainda, como demonstram os experimentos
realizados no âmbito da Fonologia Experimental, pela grande semelhança acústica entre
essas duas variantes.
Palavras-chave: Lateral Palatal; Variação, Sociolinguística Variacionista, Fonologia
Experimental.
11
ABSTRACT
THE LATERAL PALATAL IN BRASILIAN PORTUGUESE AND EUROPEAN
PORTUGUESE
Vivian de Oliveira Quandt
Orientadora: Silvia Figueiredo Brandão
Coorientador: João Antônio de Moraes
Abstract of the PhD Dissertation submitted to Programa de Pós‐Graduação em
Letras Vernáculas, Faculdade de Letras, Universidade Federal do Rio de Janeiro –
UFRJ, as part of requirements for obtaining the title of Doctor in Vernacular Letters
(Portuguese Language).
This work analyzes the behavior of the lateral palatal in formal and colloquial
speech in the Metropolitan Region in Rio de Janeiro city (Nova Iguaçu city and the
neighborhood of Copacabana in Rio de Janeiro) and the Metropolitan Region of Lisbon
(Oeiras and Cacém), and it will be developed according to the principles of the
Labovian Variation Theory and the Experimental Phonology, based on two corpora,
related to BP (Brazilian Portuguese) as well as to EP (European Portuguese) , elicited
from interviews that constitute the Collection of Project “Estudo comparado dos
padrões de concordância em variedades africanas, brasileiras e europeias do
Português” (www.letras.ufrj.br/concordancia). The questionnaires, of the DID
(Informant and Documenter Dialogue) kind, were done with 36 Brazilian informants
and 36 Portuguese informants, equally distributed by gender, age and school level. The
results present 4.209 data, 2.470 referents of BP and 1.739 referents of EP.
This study is carried out in two stages. The first one aims at determining the
factors that condition the variation of the // through controlling the linguistic and extra
linguistic variables, and considerations are made about the diffusion of the variants by
lexical items. In the second, there are descriptions of the acoustic experiments
conducted in laboratory to obtain evidence that contribute to the debate of the
phonological status of the lateral palatal.
The results derived from variacionist analyses indicate that, for the
representative sample of the BP as well as for the EP one, [lj] is the most productive
one among the // variants. The other ones ([lj], [l], [j] and ) are not very frequent,
happening in a small number of lexical items, which is attributed to the fact that the
samples represent the urban speech. Although conditioned by linguistic and extra
linguistic variables in that the high/medium frequency of some words present in the
corpora stands out, the variation [] ~ [lj] seems to be justified as demonstrated by the
experiments carried out in the field of Experimental Phonology, due to the great
acoustic similarity between the two variants.
Keywords: Lateral Palatal; Variation; Variacionist Sociolinguistics; Experimental
Phonology
12
RESUMEN
LA LATERAL PALATAL EN EL PORTUGUÉS DE BRASIL Y EN EL
PORTUGUÉS EUROPEO
Vivian de Oliveira Quandt
Orientadora: Silvia Figueiredo Brandão
Coorientador: João Antônio de Moraes
Resumen de la Tesis de Doctorado sometida al Programa de Pós-graduação em
Letras Vernáculas, Faculdade de Letras, da Universidade Federal do Rio de Janeiro –
UFRJ, como parte de los requisitos necesarios a la obtención del título de Doctora en
Letras Vernáculas (Lengua Portuguesa).
El presente trabajo analiza el comportamiento de la lateral palatal en el habla
culta y popular de la Región Metropolitana de Rio de Janeiro (ciudades de Nova Iguaçu
y Rio de Janeiro, esta representada por Copacabana) y de la Región Metropolitana de
Lisboa (Oeiras y Cacém) y será desarrollada a la luz de los preceptos de la Teoría de la
Variación Laboviana y de la Fonología Experimental, basado en dos corpora, tanto lo
que se refiere al PB, como lo que se relaciona al PE, sacados de entrevistas que
constituyen el acervo del Proyecto “Estudo comparado dos padrões de concordância
em variedades africanas, brasileiras e europeias do Português”
(www.letras.ufrj.br/concordancia). Los inquéritos, del tipo DID (Diálogo entre
Informante y Documentador), fueron hechos con 36 informantes brasileños y 36
informantes portugueses, distribuidos igualmente por sexo, edad y nivel de enseñanza.
Se obtuvo un total de 4.209 datos, 2.470 referentes al PB y 1.739 referentes al PE.
El estudio se desarrolla en dos partes: en la primera, se busca determinar los
factores que condicionan la variación de // por medio del control de variables
lingüísticas y extralingüísticas y son hechas consideraciones sobre la difusión de las
variantes por los vocablos. En la segunda, se describen los análisis acústicos hechos en
laboratorio para la obtención de evidencias que contribuyan para el debate sobre el
status fonológico de la lateral palatal.
Los resultados obtenidos en los análisis variacionistas indican que, tanto en la
muestra representativa del PB, como en la del PE, entre las variantes de //, [lj] es la
que se muestra más productiva. Las demás ([lj], [l], [j] e ) son pocos frecuentes,
ocurriendo en un reducido número de vocablos, probablemente por el hecho de que las
muestras retraten el habla urbana. La variación [] ~ [lj] a pesar de condicionada por
factores lingüísticos y extralingüísticos en que sobresale la frecuencia alta/mediana de
algunos vocablos presentes en los corpora, se justifica, todavía, como demuestran los
experimentos realizados en el ámbito de la Fonología Experimental, por la gran
semejanza acústica estre esas dos variantes.
Palabras-llave: Lateral Palatal; Variación; Sociolingüística Variacionista; Fonología
Experimental.
13
SUMÁRIO
INDÍCE DE QUADROS, TABELAS, GRÁFICOS E FIGURAS
1 INTRODUÇÃO.............................................................................................................. 18
2 CARACTERIZAÇÃO DE []...................................................................................... 23
2.1 Articulatória ........................................................................................................... 23
2.2 Acústica................................................................................................................... 29
3 OUTROS ESTUDOS SOBRE O //: INTERPRETAÇÃO FONOLÓGICA E
VARIAÇÃO...................................................................................................................
35
3.1 Do latim ao Português............................................................................................ 35
3.2 No Português do Brasil.......................................................................................... 38
3.3 No Português Europeu ......................................................................................... 54
4 TRAJETÓRIA DOS ESTUDOS SOBRE AS MUDANÇAS SONORAS ............... 56
4.1 A proposta Neogramática ......................................................................................
56
4.2 A proposta Difusionista .......................................................................................... 61
4.3 A Fonologia de Uso ................................................................................................. 67
5 ASPECTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS ........................................................ 72
5.1 Fundamentação teórica........................................................................................... 72
5.1.1 A Sociolinguística Variacionista ...................................................................... 72
5.1.2 A Fonologia Experimental ................................................................................ 81
5.2 Metodologia e Corpus ............................................................................................. 86
6 ANÁLISE SOCIOLINGUÍSTICA............................................................................... 89
6.1 As variáveis consideradas....................................................................................... 89
6.1.1 A variável dependente ...................................................................................... 90
6.1.2 As variáveis independentes ............................................................................... 102
6.1.2.1 Linguísticas ............................................................................................ 102
6.1.2.2 Extralinguísticas .................................................................................... 111
6.2 A variação de // na RMRJ e na RMLIS ............................................................. 125
6.2.1 Aspectos gerais ................................................................................................. 125
6.2.2 Variáveis atuantes em ambas as variedades .................................................... 128
6.2.3 Variáveis atuantes somente na RMRJ.............................................................. 133
6.2.4 Variáveis selecionadas somente na RMLIS ..................................................... 144
14
6.3 Questões de ordem lexical ...................................................................................... 149
6.3.1 Variantes menos produtivas de // nas amostras da RMRJ e da RMLIS ....... 150
6.3.2. Variante [lj] nas amostras da RMRJ e da RMLIS.......................................... 157
7 ANÁLISE ACÚSTICA DAS VARIANTES DE [] .................................................. 162
7.1 Observações preliminares ...................................................................................... 162
7.2 Variantes em sílaba tônica ..................................................................................... 163
7.3 Variantes em sílaba postônica ............................................................................... 177
7.4 Síntese dos resultados ............................................................................................ 183
8 CONCLUSÕES............................................................................................................. 191
9 BIBLIOGRAFIA .......................................................................................................... 197
10 ANEXOS ....................................................................................................................... 206
10.1 Distribuição das variantes de // pelos vocábulos na RMRJ ............................ 206
10.2 Distribuição das variantes de // pelos vocábulos na RMLIS .......................... 212
15
INDÍCE DE QUADROS, TABELAS, GRÁFICOS E FIGURAS
QUADRO
Quadro 1. Configuração dos Corpora PB e PE 87
Quadro 2. Frases que formam o corpus da 2ª etapa de análise 88
Quadro 3. Vocábulos em que incidem as variantes menos produtivas no corpus da
RMRJ
92
Quadro 4. Vocábulos em que incidem as variantes menos produtivas no corpus da
RMLIS 99
Quadro 5. Municípios/Concelhos que fazem parte da Área Metropolitana de Lisboa 117
Quadro 6. Variáveis atuantes para a concretização de [lj] – nos corpora do PB e do PE –
em ordem de importância
127
Quadro 7. Vocábulos com incidência alta ou média no corpus da RMRJ 134
Quadro 8. Vocábulos com incidência alta ou média no corpus da RMLIS 135
Quadro 9. Distribuição dos vocábulos encontrados na amostra da RMRJ de acordo com
a tonicidade da sílaba em que incide o segmento //
140
TABELAS
Tabela 1. Índices referentes à variação de / / na RMRJ 91
Tabela 2. Índices referentes à variação de / / na RMLIS 97
Tabela 3. Índices referentes à variação entre [lj] vs [] no PB e no PE 125
Tabela 4. Atuação da Variável Faixa Etária para a realização da variante palatalizada na
RMRJ e na RMLIS
129
Tabela 5. Atuação da Variável Classe do Vocábulo para a realização da variante
palatalizada na RMRJ e na RMLIS
132
Tabela 6. Atuação da Variável Frequência do vocábulo para a realização da variante
palatalizada na RMRJ
133
Tabela 7. Número de ocorrências e índice percentual dos fatores que compõem a
variável Frequência do vocábulo no corpus na RMLIS
135
Tabela 8. Atuação da Variável Nível de Instrução para a realização da variante
palatalizada no PB 137
Tabela 9. Número de ocorrências e índice percentual dos fatores que compõem a
variável Nível de escolaridade na RMLIS
138
Tabela 10. Atuação da Variável Tonicidade da Sílaba para a realização da variante
palatalizada no PB
140
Tabela 11. Número de ocorrências e índice percentual dos fatores que compõem a
variável Tonicidade da Sílaba em que incide o segmento // na RMLIS
141
Tabela 12. Atuação da Variável Contexto subsequente para a realização da variante
palatalizada no PB
142
Tabela 13. Número de ocorrências e índice percentual dos fatores que compõem a
variável Contexto Subsequente na RMLIS
144
Tabela 14. Atuação da Variável Localidade para a realização da variante palatalizada
no PE
145
Tabela 15. Distribuição da variante [lj] nas localidades da RMRJ 146
Tabela 16. Atuação da Variável Contexto antecedente para a realização da variante
palatalizada no PE
147
Tabela 17. Número de ocorrências e índice percentual da variante [lj] distribuída entre
os fatores da variável contexto antecedente na RMRJ
148
Tabela18. Variantes de // menos produtivas na RMRJ e na RMLIS 150
Tabela 19. Vocábulos com ocorrência de iodização na RMRJ e na RMLIS 151
Tabela 20. Ocorrências de despalatalização na RMRJ e na RMLIS 152
16
Tabela 21. Ocorrências de vocábulos com o sufixo diminutivo -inho(a) na RMRJ e na
RMLIS 153
Tabela 22. Vocábulos que apresentam a variante [lj] na fala da RMRJ 154
Tabela 23. Vocábulos que apresentam a variante [lj] na fala da RMLIS 156
Tabela 24. Distribuição das ocorrências de [lj] e [] nos vocábulos com frequência alta
e média de uso na RMRJ
158
Tabela 25. Distribuição das ocorrências de [lj] e [] nos vocábulos com frequência alta
e média de uso na RMLIS
160
Tabela 26. Média dos valores dos formantes de [l] seguido de [a] em sílaba tônica 164
Tabela 27. Média dos valores dos formantes de [l j] seguido de [a] em sílaba tônica 165
Tabela 28. Média dos valores dos formantes de [] seguido de [a] em sílaba tônica 167
Tabela 29. Média dos valores dos formantes de [j] seguido de [a] em sílaba tônica 168
Tabela 30. Média dos valores dos formantes de [] seguido de [a] em sílaba tônica 169
Tabela 31. Média dos valores dos formantes de [l] seguido de [i] em sílaba tônica 171
Tabela 32. Média dos valores dos formantes de [l j] seguido de [i] em sílaba tônica 172
Tabela 33. Média dos valores dos formantes de [] seguido de [i] em sílaba tônica 173
Tabela 34. Média dos valores dos formantes de [ j ] seguido de [i] em sílaba tônica 175
Tabela 35. Média dos valores dos formantes de [] seguido de [i] em sílaba tônica 176
Tabela 36. Média dos valores dos formantes de [l j] seguido de [a] em sílaba postônica 178
Tabela 37. Média dos valores dos formantes de [] seguido de [a] em sílaba postônica 179
Tabela 38. Média dos valores dos formantes de [l j] seguido de [i] em sílaba postônica 181
Tabela 39. Média dos valores dos formantes de [] seguido de [i] em sílaba postônica 182
Tabela 40. Valores médios dos formantes de [], seguido de [a] ou [i], em sílaba tônica
e postônica, no PB
184
Tabela 41. Valores médios dos formantes de [] e [l] seguidos de [a] e [i], no PB 186
Tabela 42. Valores médios dos formantes de [] e [lj], seguido de [a] ou [i], em sílaba
tônica e postônica, no PB
187
Tabela 43. Valores de F1 e F2 das variantes das laterais seguidas pela vogal [a], no PB 188
Tabela 44. Valores de F1 e F2 da variantes de // e da lateral anterior velarizada []
seguidas pela vogal [i], no PB
189
GRÁFICOS
Gráfico 1. Distribuição das variantes de // / na RMRJ 91
Gráfico 2. Distribuição das variantes de // / na RMLIS 98
Gráfico 3. Atuação da Variável Faixa Etária para a realização da variante palatalizada,
no PB, em pesos relativos
130
Gráfico 4. Atuação da Variável Faixa Etária para a realização da variante palatalizada,
no PE, em pesos relativos
130
Gráfico 5. Atuação da Variável Nível de Instrução para a realização da variante
palatalizada na RMRJ, em pesos relativos
137
Gráfico 6. Índices percentuais de ocorrência de [lj], distribuídos pelos três Níveis de
instrução na fala da RMLIS
138
Gráfico 7. Índices percentuais de ocorrência de [lj], distribuídos pelos três Níveis de
instrução nas falas da RMLIS e da RMRJ
139
Gráfico 8. Distribuição da variante [lj] na RMLIS, em pesos relativos 145
Gráfico 9. Distribuição da variante [lj] na RMRJ, em índices percentuais 146
Gráfico 10. Distribuição, no espaço acústico, das variantes das laterais seguidas pela
vogal [a], no PB
188
Gráfico 11. Distribuição, no espaço acústico, das variantes das laterais seguidas pela 189
17
vogal [i], no PB
FIGURAS
Figura 1. Oscilograma e espectrograma representando a realização dos logátomos “ele”
e “elhe” (com vogais anteriores médias-baixas), pronunciados por um informante
brasileiro nascido no Estado do Espírito Santo. Valores médios dos três primeiros
formantes para [l]: F1, 639 Hz; F2, 1117 Hz; F3, 3193 Hz; para []: F1, 389 Hz; F2,
2091 Hz; F3, 3146 Hz.
34
Figura 2: Representação de //, segundo a Fonologia Autossegmental 51
Figura 3. Divisão Regional do Estado do Rio de Janeiro 112
Figura 4. Segmentação político-administrativa da Região Metropolitana do Estado do
Rio de Janeiro
114
Figura 5. Segmentação político-administrativa de Copacabana dentro do Município do
Rio de Janeiro 115
Figura 6. Portugal dividido por Distritos (Região Metropolitana de Lisboa circulada) 117
Figura 7. Distrito de Lisboa dividido em Concelhos (Região Metropolitana da Grande
Lisboa) 118
Figura 8. Concelho de Sintra (em destaque freguesia de Cacém) 119
Figura 9. Espectrograma do vocábulo (Eu disse) te[l]ado (2) (de novo), com [l] apical;
F1 a 428Hz, F2 a 1124Hz , F3 a 2837Hz e F4 a 3634Hz. 164
Figura 10. Espectrograma do vocábulo (Eu disse) te[l j]ado(2) (de novo), com [l
j]
laminal (palatalizado) [lâmino-posalveolar]; F1 a 235 Hz, F2 a 1778 Hz, F3 a 2898 Hz
e F4 a 3580 Hz.
165
Figura 11. Espectrograma do vocábulo (Eu disse) te[]ado(2) (de novo), com [] dorsal
[dorso-palatal]; F1 a 269 Hz, F2 a 1851 Hz, F3 a 2974 Hz e F4 a 3942Hz.
166
Figura 12. Espectrograma do vocábulo (Eu disse) te[j]ado(2) (de novo), com [j]
semivogal; F1 a 275 Hz, F2 a 2130 Hz, F3 a 3187 Hz e F4 a 3650 Hz. 167
Figura 13. Espectrograma do vocábulo (Eu disse) te[]ado(2) (de novo), com []
velarizado; F1 a 434 Hz, F2 a 985 Hz, F3 a 3303 Hz e F4 a 3741 Hz.
169
Figura 14. Espectrograma do vocábulo (Eu disse) to[l]ido(1) (de novo), com [l] apical;
F1 a 213 Hz, F2 a 1687 Hz , F3 a 2402 Hz e F4 a 3494 Hz. 170
Figura 15. Espectrograma do vocábulo (Eu disse) to[l j]ido(3) (de novo), com [l
j]
laminal (palatalizado) [lâmino-posalveolar]; F1 a 247 Hz, F2 a 1585 Hz , F3 a 2932 Hz
e F4 a 3567 Hz
172
Figura 16. Espectrograma do vocábulo (Eu disse) to[]ido(3) (de novo), com [] dorsal
[dorso-palatal]; F1 a 257 Hz, F2 a 1699 Hz , F3 a 2702 Hz e F4 a 3570 Hz
173
Figura 17. Espectrograma do vocábulo (Eu disse) to[j]ido(2) (de novo), com [j]
semivogal; F1 a 229 Hz, F2 a 2185 Hz , F3 a 3088 Hz e F4 a 3590 Hz. 175
Figura 18. Espectrograma do vocábulo (Eu disse) to[]ido(2) (de novo), com []
velarizado; F1 a 434 Hz, F2 a 977 Hz , F3 a 2363 Hz e F4 a 3562 Hz
176
Figura 19. Espectrograma do vocábulo (Eu disse) te[l j]a(1) (de novo), com [l
j] laminal
(palatalizado); F1 a 261, F2 a 1735 , F3 a 2560Hz e F4 a 3504Hz
178
Figura 20. Espectrograma do vocábulo (Eu disse) te[]a(3) (de novo), com [] dorsal
[dorso-palatal]; F1 a 282 Hz, F2 a 1897 Hz, F3 a 2753 Hz e F4 a 3394 Hz
179
Figura 21. Espectrograma do vocábulo (Eu disse) te[l j]e(1) (de novo), com [l
j] laminal
(palatalizado); F1 a 257 Hz, F2 a 1508 Hz, F3 a 2510 Hz e F4 a 3657 Hz
181
Figura 22. Espectrograma do vocábulo (Eu disse) te[]e(2) (de novo), com [] dorsal
[dorso-palatal]; F1 a 246 Hz, F2 1643 Hz, F3 a 2585 Hz e F4 a 3769 Hz
182
18
1 INTRODUÇÃO
Ainda há muito a conhecer sobre o Português do Brasil (PB) e o Português
Europeu (PE). Na tentativa de caracterizar essas variedades, fenômenos variáveis e
processos de grande relevância vêm sendo observados, como é o caso do que ocorre
com os fonemas laterais, que merecem atenção especial já que podem não só ocupar
diversas posições no vocábulo, mas também apresentar significativa gama de variantes.
A lateral [+ anterior] pode ser encontrada em posição inicial (lado, mala), medial (clara)
e final de sílaba (calma, canal). A [- anterior], ocupa, fundamentalmente, a posição
intervocálica (mulher, velha), sendo atestadas variantes oriundas da atuação de
diferentes processos, entre os quais a iodização e a despalatalização.
Na sua dissertação de mestrado, Quandt (2004) empreendeu um estudo, com
base na Sociolinguística Variacionista e na Fonologia Experimental, sobre a lateral [+
ant.] (/l/) nas posições final e medial de sílaba na fala do Norte-Noroeste do Estado do
Rio de Janeiro.
Como a curiosidade é inerente a qualquer pesquisador, durante a elaboração da
mencionada pesquisa, não deixou de notar a flutuação de pronúncia de // na fala dessa
região. Assim, após algumas leituras prévias sobre essa variável e a observação de que,
realmente, poucos são os trabalhos que a contemplam, não só com relação ao Português
do Brasil – sobretudo no que diz respeito à fala do Estado do Rio de Janeiro – como
também ao Português Europeu, para dar prosseguimento aos seus estudos, pretende
analisar o // à luz dos modelos teórico-metodológicos acima referidos.
O trabalho proposto tem como tema o comportamento da lateral palatal na fala
culta e popular da Região Metropolitana do Rio de Janeiro (Municípios de Nova Iguaçu
e do Rio de Janeiro, este representado por Copacabana) e da Região Metropolitana de
Lisboa (Oeiras e Cacém) e se desenvolverá à luz dos pressupostos da Teoria da
Variação Laboviana e da Fonologia Experimental, com base em dois corpora, tanto o
que se refere ao PB, quanto o que diz respeito ao PE, eliciados de entrevistas que
constituem o Acervo do Projeto Estudo comparado dos padrões de concordância em
variedades africanas, brasileiras e europeias do Português
(www.letras.ufrj.br/concordancia).
19
A lateral palatal é um tema polêmico do ponto de vista tanto fonológico quanto
fonético. Como se sabe, ela constitui um dos quatro fonemas do português moderno1
não existentes em latim e resultantes de processo de palatalização. Está, ainda,
correlacionada à tendência ao desfazimento de hiatos, que se verificava desde o século I
d.C. O processo que lhe deu origem se consolidou, a depender dos contextos fônicos,
em diferentes estágios da evolução do latim ao português e que recobrem o período que
vai do século IV ao XV-XVI.
A lateral palatal, como se verificará no item 3.1, deriva-se basicamente do
contexto fônico -lj, resultante (a) da transformação em semivogal de vogal [+ cor]
subsequente à lateral anterior, como em fi.li.u > fi.ljo > filho; (b) da vocalização da
consoante velar no grupo -cl- (originalmente -cl- ou <-tl-), medial de vocábulo e
precedido de vogal, com posterior passagem a semivogal e metátese, como em oculu >
oclu > *ojlo > *oljo > olho; vetulu > vetlu > veclu > *vejlo > *veljo > velho; (c) e
também dos grupos mediais latinos -gl- e -bl, como em trib(u)lu > trilho; teg(u)la >
telha.
Como já observara Câmara Jr. (1979, p. 53), “a palatalização ou “molhamento”,
de /n/ e /l/, deu-se exclusivamente em posição intervocálica”, na passagem do latim ao
português. Assim, em início de vocábulo, o contraste fonológico entre // e // torna-se
extremamente reduzido: /lama/ x /ama/, /le/ x //. Da mesma forma, na fala
espontânea, o contraste // x //:
fica comprometido, tendendo a não se efetivar e tornando pares de vocábulos
como óleos e olhos, Júlio e julho homófonos, ora realizando-se como ['u], ['uu], ora como ['u], [„u], dissolvendo-se a ambiguidade pelo
contexto discursivo. Isto é corroborado por outros vocábulos, como família,
frequentemente concretizado como fami[]a.
Deduz-se, portanto, que há, em relação ao segmento que se comenta, um alto
grau de instabilidade decorrente, talvez, dos próprios contextos de que se
originou e de suas características articulatórias. Nesse sentido, não é de
estranhar que, nos dialetos populares, haja uma forte tendência à
despalatalização e à iotização, mais ou menos intensas numa ou noutra
região, num ou noutro segmento social (mas difundida em todos os dialetos),
dependentes, também, de motivações de ordem histórica que ainda é
prematuro delimitar (BRANDÃO, 2006, p. 67-68)
1 Os três outros são //, //, //.
20
Em decorrência dessa instabilidade, aventaram-se diferentes hipóteses sobre seu
status fonológico: apontam-na ora como consoante simples, ora como geminada
(WETZELS 1997 e 2000) ou ainda como consoante complexa, com uma articulação
primária consonantal e uma articulação secundária vocálica, conforme proposto por
Pontes (1973) e, mais recentemente, por Hernandorena (1997 e 2000).
Estudos sobre o Português do Brasil – cf. item 3.2 –, sobretudo em referência à
variedade popular, em comunidades rurais, têm mostrado a frequência da “vocalização”
(iodização) e da “simplificação” (despalatalização) da lateral palatal, citando-se,
respectivamente, entre outros, como exemplos, [muj] e [mul], em lugar de
mu[]er.
CUNHA (1986), inclusive, considera o ieísmo um dos aspectos fonéticos
inovadores do PB. Segundo o autor, apesar de alguns estudiosos o considerarem um fato
geral da linguagem popular, os atlas linguísticos brasileiros até então já publicados não
respaldariam tal assertiva, verificando-se, ao contrário, intenso polimorfismo de
realizações, em que predominariam as formas não ieístas.
Por outro lado, o Estado do Rio de Janeiro carece de mais estudos a respeito do
uso da lateral palatal, que possam contemplar não apenas a variedade popular, mas
também a culta, e que contribuam para testar as hipóteses aqui referidas.
Já que são muito escassos os trabalhos sobre o uso de // no PE, conforme se
verá mais adiante, essa variedade do português também merece atenção especial tanto
no que diz respeito à variedade popular quanto à culta.
Torna-se pertinente, portanto, verificar, no que diz respeito à análise
sociolinguística, se (a) uma das variantes constitui norma de pronúncia nas diferentes
áreas da RMRJ (Região Metropolitana do Rio de Janeiro) e da RMLIS (Região
Metropolitana de Lisboa) aqui consideradas; (b) se as distintas formas de concretização
de [] são condicionadas por fatores linguísticos e/ou extralinguísticos; (c) se a variante
[j], como afirmam Oliveira (1983), Madureira (1987 / 1999), Aragão (1997), Brandão
(2007), Machado-Soares (2008) e Freire (2012), é socialmente marcada; (d) se [lj] vem
sobrepujando as demais variantes ou se mostra em variação estável, competindo com
[] em determinadas situações de fala; (e) se, como afirma Madureira (1999), o PE é a
única variedade do Português que não vocaliza o [].
21
No que se relaciona à análise sob a ótica da Fonologia Experimental, acredita-se
que, por meio de medidas acústicas, se obtenham evidências que também possam
contribuir para o debate sobre a variação da lateral palatal.
As hipóteses específicas que permeiam o desenvolvimento do trabalho
encontram-se arroladas a seguir.
(a) Quanto à análise sociolinguística,
- as variantes [] e [lj] concorreriam na fala da RMRJ, sobretudo entre falantes
de maior nível de escolaridade e a depender de determinados fatores de natureza
contextual; a iodização e a despalatalização, quer através do cancelamento, quer
através da permuta pela lateral anterior, seriam processos mais produtivos entre
falantes de baixo nível de escolaridade;
- a variante [lj], na fala da RMRJ, apresentaria um índice de ocorrência bem
maior, se comparado ao índice de [];
- as variantes [] e [lj] concorreriam, também, na fala da RMLIS, embora ainda
houvesse um número maior de ocorrências de [];
- a tonicidade da sílaba influenciaria a concretização da variante [l], já que é
mais comum a sua presença em sílabas tônicas;
- a frequência média/alta de alguns vocábulos nas amostras seria um fator
importante na difusão de determinadas variantes.
(b) Quanto à análise no âmbito da Fonologia Experimental,
- as variantes [] e [lj] não se diferenciariam, significativamente, do ponto de
vista acústico;
- afirmações de alguns linguistas sobre o pouco uso da lateral palatal, sendo esta
substituída pela lateral palatalizada, no PB, adviria da impressão sensorial que se
tem ao se tentar articular as duas variantes, já que o padrão acústico de ambas
seria muito semelhante.
Em linhas gerais, além deste primeiro item introdutório, os demais sete capítulos
em que se desenvolve a pesquisa, almejam não só retratar os comportamentos
22
encontrados, mas também, fundamentar a análise e postular tendências com base nos
resultados e nos itens que integram os corpora. Nesse sentido, o capítulo 2 descreve
articulatória e acusticamente a lateral palatal e, eventualmente, a título de comparação, a
lateral anterior e a lateral palatalizada.
O capítulo 3 apresenta a revisão bibliográfica, de que constam trabalhos já
realizados sobre o tema e está dividido em duas partes, a saber: na primeira, abordam-se
estudos que descrevem a evolução do // do latim ao português; na segunda, comentam-
se trabalhos que se referem à variação desse fonema no Português do Brasil e no
Português Europeu, tanto dos pontos de vista da teoria da variação laboviana, da
fonologia experimental e da difusão lexical.
No quarto capítulo, apresentam-se enfoques da linguística no que tange ao
estudo da variação e da mudança: o neogramático, o difusionista e o da fonologia de
uso.
No capítulo 5, não só se expõem os pressupostos teórico-metodológicos que
fundamentaram a elaboração do trabalho e que se enquadram nas linhas (1) da
Sociolinguística Quantitativa e (2) da Fonologia Experimental, mas também se descreve
a metodologia empregada neste estudo.
No capítulo 6, são descritas a variável dependente e as variáveis independentes
utilizadas na análise de //, as hipóteses que as fundamentaram, bem como se discutem
os resultados das análises empreendidas, sob a ótica da Sociolinguística Variacionista.
Nessa seção, tecem-se, ainda, considerações de caráter lexical sobre a distribuição das
variantes pelos itens lexicais.
No capítulo 7, expõem-se as análises acústicas efetuadas em laboratório para a
obtenção de respostas mais seguras no que diz respeito à caracterização acústica das
laterais. Além disso, ratifica-se eventuais semelhanças e diferenças entre elas.
Encerrando esta investigação, o capítulo 8 apresenta algumas conclusões a
respeito dos resultados obtidos, sintetizando-os e apresentando a(s) interpretação(ões)
julgada(s) mais coerente(s) tendo em vista as amostras consideradas.
23
2 CARACTERIZAÇÃO DE []
2.1 Articulatória
Segundo Quilis & Fernández (1969), sob o conceito de consoantes líquidas se
agrupa uma série de fonemas laterais e vibrantes que, mesmo não deixando de ser sons
consonânticos, possuem alguns traços próprios dos vocálicos e que, por isso, poderiam
formar um grupo intermediário entre as consoantes e as vogais.
De acordo com os autores, as características principais desses sons são (1)
apresentar a máxima abertura dentre as que caracterizam os demais sons consonânticos,
mas, ainda assim, menor que a abertura vocálica; (2) apresentar o tom mais alto de todo
o sistema consonântico espanhol, uma vez que grande parte da quantidade de energia,
que é empregada no movimento dos músculos elevadores, vai parar nas pregas vocais,
dando origem a um maior número de vibrações por unidade de tempo, ou seja, tem uma
frequência mais alta e (3) apesar de apresentar a referida maior abertura, esta não é, no
entanto, suficientemente grande para que o segmento esteja desprovido do ruído que é
característico dos sons contínuos consonânticos.
Já, nas palavras de Ladefoged & Maddieson (1996, p. 182), as líquidas:
Foneticamente [elas] estão entre as mais sonoras
2 das consoantes orais. E as
líquidas frequentemente formam uma classe especial na fonotática de uma
língua; por exemplo, os segmentos desta classe são com frequência aqueles
com maior liberdade para ocorrer em grupos consonantais.3
As laterais são geralmente definidas como sons produzidos com uma oclusão ou
constrição em algum lugar ao longo da linha sagital medial do trato vocal, em que não
há um impedimento total da passagem de ar: a corrente de ar passa pelos lados da
oclusão.
A maioria dos segmentos laterais nas línguas do mundo é produzida com uma
oclusão na região alveolar/dental. Segundo Ladefoged & Maddieson (1996), estudos
palatográficos e de raios-X de várias línguas mostram que, em muitos casos, a oclusão é
2 Aqui a palavra sonora não é usada no sentido de vozeada. Quando se diz mais sonora, quer-se dizer
que, numa escala de sonoridade, as líquidas estão entre as soantes de maior sonoridade. 3 “Phonetically they are among the most sonorous of oral consonants. And liquids often form a special
class in the phonotactics of a language; for exemplo, segments of this class are often those with the
greatest freedom to occur in consonant clusters.”
24
limitada a poucos milímetros dos alvéolos, na área atrás dos incisivos, se estendendo, às
vezes, até os pré-molares, de tal forma que o corpo da língua esteja relativamente baixo,
permitindo escape de ar lateral na região frontal da boca.
Com o intuito de verificar como eram produzidos os sons [l] e [t] em alemão e
chinês padrão, Wängler (1961) e Zhou & Wu (1963) (apud op. cit., p. 183),
respectivamente, realizaram análises palatográficas e de raios-X e observaram que o
contato indicando o fechamento ao redor dos lados do palato, visto nos palatogramas de
[t], está faltando nos palatogramas de [l]. Os raios-X indicam que, embora, tanto na
produção de [l] quanto na de [t], a ponta da língua faça contato em áreas bastante
aproximadas, o contorno da língua atrás do fechamento é diferente: no que toca à
lateral, a língua está mais baixa, abaixo da área do palato frontal. O maxilar é, também,
mais aberto para [l] do que para [t], facilitando o escape lateral de ar.
Embora esse padrão articulatório de um fechamento medial bastante limitado na
frente da boca seja comum a laterais alveolares e dentais, a área de contato pode
estender-se mais para trás na boca, acarretando um escape lateral localizado, também,
mais para trás. Além disso, é ainda possível que o fechamento frontal seja incompleto.
Já para a articulação de uma consoante lateral palatal, ocorreria um contato entre o dorso da
língua e o palato duro, sendo a área de extensão variável entre um e outro idioma (cf.
LADEFOGED & MADDIESON, 1996).
Segundo Martínez Celdrán & Fernández Planas (2007), pesquisadores que
utilizam eletropalatogramas4 em seus estudos, articulatoriamente, na cavidade oral, as
laterais apresentam uma oclusão, mas não podem ser classificadas como oclusivas, uma
vez que o ar sai de forma contínua e simultânea à oclusão. Esses contatos, no que se
refere aos informantes analisados pelos referidos linguistas, são produzidos nas filas
alveolares do palato artificial com alguns contatos na primeira fila.
Ainda segundo eles, às vezes, a saída do ar é efetuada ou por um lado da boca ou
por ambos, em sua parte posterior na altura dos molares. A esse respeito acrescenta
4 “A eletropalatografia é uma técnica instrumental que proporciona informação dos contatos que efetua a
língua (...) com a superfície palatina, desde os incisivos superiores até o véu palatino, em uma sequência
dinâmica de fala. (...) Para obter os dados de contato, os informantes utilizavam na boca um palato
artificial, especialmente preparado para cada um deles, que continha sessenta e dois eletrodos
classificados em filas e colunas.” (MARTÍNEZ CELDRÁN & FERNÁNDEZ PLANAS (2007, p. 15-16))
<<La electropalatografía es una técnica instrumental que proporciona información de los contactos que
efectúa la lengua (…) con la superficie palatina desde los incisivos superiores hasta el velo del paladar
en una secuencia dinámica de habla. (…) Para obtener los datos de contacto, los informantes llevaban en
la boca un paladar artificial, especialmente preparados para cada uno de ellos, provisto de sesenta y dos
electrodos clasificados en filas y columnas. >>
25
Navarro Tomás (1918): “entre a língua e os molares há uma abertura alargada, por onde
o ar escapa”5. (cf. MARTÍNEZ CELDRÁN & FERNÁNDEZ PLANAS (2007, p. 137))
Finalizam os autores, informando que a assimetria observada nas articulações
laterais não tem relação com a lateralidade referida aos hemisférios cerebrais e é
arbitrária, posto que não necessariamente um mesmo informante escolhe sempre o
mesmo lado para deixar sair a corrente de ar.
De acordo com Quilis & Fernández (1969, p. 122),
As consoantes laterais são aquelas em que, durante a sua emissão, o fluxo de
ar é liberado através de um estreitamento produzido por um ou pelos dois
lados da língua e a borda ou as bordas homólogas da região pré ou médio-
palatal. As pregas vocais vibram sempre durante a emissão destes sons.6
Assim, para Quilis & Fernández (1969), do ponto de vista fonológico, o
espanhol conhece somente dois fonemas laterais: o linguopalatal // e o linguoalveolar
/l/. Para a articulação da lateral palatal, o ápice e as bordas da língua aderem aos
alvéolos superiores, respectivamente, e a parte central da língua se une à parte central do
palato, deixando um pequeno canal por onde escapa o ar.
Os referidos autores ainda alertam que se deve evitar a tendência a pronunciar o
[] como [lj], já que “o [] se pronuncia de uma só vez, e com um amplo contato da
língua com o palato duro”7. (QUILIS & FERNÁNDEZ, 1969, p. 123)
A afirmação dos autores acima contrasta com alguns estudos como os de
Recasens et alii, (1993). Segundo esses linguistas, as laterais palatais deveriam ser
classificadas como alvéolo-palatais, uma vez que não apresentam uma constrição
somente palatal. Em outras palavras, elas são produzidas com um contato em toda a
zona pós-alveolar, estendendo-se até à zona pré-palatal. Os estudos de Recasens &
Espinosa (2006) sobre as consoantes palatais do catalão de Maiorca, por exemplo,
indicam um ponto de articulação de [] dento-alveolar, ou seja, ainda mais anterior.
5 “Queda entre la lengua y los molares una abertura alargada, por donde el aire se escapa”.
6 “Las consonantes laterales son aquellas en las que durante su emisión el aire fonador sale através de
un estrechamiento producido por un lado o los dos de la lengua y el reborde o los rebordes homólogos
de la región pre o mediopalatal. Las cuerdas vocales vibran siempre durante la emission de estos
sonidos.” 7 “La [] se pronuncia en un tiempo, y con un amplio contacto de la lengua con el paladar duro.”
26
Para Recasens et alii (1993), o ponto de articulação do // sugere que este é
produzido com a parte posterior da lâmina ou com o pré-dorso da língua. Já de acordo
com Recasens (1990), no entanto, o grau de contato varia de acordo com o falante, a
vogal seguinte e a posição na palavra. No que diz respeito ao contexto vocálico, o grau
de contato é menor quando a vogal adjacente é um /a/ e é maior quando a vogal é um /i/.
Para o PE, informações disponíveis sobre a consoante lateral palatal são muito
escassas.
De acordo com Sá Nogueira, por exemplo, (1938 apud MONTEIRO, 2012)
durante a produção da lateral dorso-palatal do PE,
o ápice da língua se apoia nos incisivos inferiores e o pré-dorso da língua se
adapta à região pré-palatal, impedindo assim a saída do ar pela linha média,
o que leva ao abaixamento dos bordos laterais da língua para que haja saída
do ar (MONTEIRO, 2012, p. 18).
Já pesquisas mais recentes, como as de Martins et alii (2008 e 2010), indicam
que o contato se efetua entre a lâmina/pré-dorso da língua e a região alvéolo-palatal. De
acordo com esses dados, que foram obtidos por meio de imagens de ressonância
magnética, o // do PE apresenta um ponto de articulação alvéolo-palatal e não
exclusivamente palatal, da mesma forma do que foi apresentado por Recasens et alii
(1993) no que se refere ao catalão.
Ainda de acordo com Martins et alii (2010), esta consoante é, também,
caracterizada por (1) uma área de contato bastante extensa (entre 0.8 – 2.4 cm para
todos os falantes e contextos adquiridos), (2) forma convexa da zona médio-posterior da
língua e (3) compressão médio-sagital.
Quanto à coarticulação, Martins et alii (2011) observaram que o // do PE é
pouco influenciado pelo contexto vocálico adjacente. Embora resultados similares a
esse tenham sido obtidos por Recasens & Espinosa (2006), em relação ao // do catalão
maiorquino, Monteiro (2012) verifica, em seu estudo sobre as laterais nos dialetos de
Aveiro, Bragança e Porto, que a consoante palatal revela sofrer efeitos de coarticulação,
uma vez que se registram diferenças nos valores de F1, F2 e F3 em função do contexto
vocálico adjacente (cf. seção 2.2).
27
De forma minuciosa, Cagliari (1974) fez um amplo estudo sobre a palatalização
no dialeto paulista, no qual afirma que os sons palatais são instáveis, não sendo fácil
caracterizá-los. Ao consultar alguns trabalhos – como os de Gleason (1969), Malmberg
(1971), Ladefoged (1972), Delattre (1965), Heffner (1969), Catford (1968), Strakka
(1965) – ele observou divergências e imprecisão na definição da palatalização: nos
critérios para pontos e modos de articulação de sons palatais; no uso de termos e
interpretações diferentes para resultados idênticos; e no uso da palatografia como
método experimental para a investigação.
Em seus próprios estudos palatográficos, Cagliari (1974) distingue três
realidades fonéticas da palatalização naquele dialeto, no qual distingue consoantes não
palatais, consoantes palatalizadas e consoantes palatais. As consoantes palatais são
descritas pelo linguista da seguinte forma:
As consoantes palatais localizam-se na região palatal (pré-palatal ou central),
apresentam os maiores contatos línguo-palatais, exigem maior esforço
articulatório (...). Apresentam uma duração maior, quer na retenção, quer na
distensão. São, essencialmente, sons simples, não articulações duplas. O
comportamento da língua é decisivo: sempre temos a ponta da língua
abaixada atrás dos incisivos inferiores. Do ponto de vista auditivo,
caracterizam-se pelo timbre “molhado”. (CAGLIARI, 1974, p.160)
A distinção estabelecida pelo autor entre consoantes palatalizadas, não-palatais e
palatais é realizada levando em consideração cinco fatores: lugar de articulação, modo
de articulação, comportamento da língua, energia articulatória e percepção.
No que diz respeito ao ponto de articulação, as palatalizadas têm uma pequena
parte de contato em algumas regiões limítrofes à região palatal e, portanto, maior
contato com essa região.
Quanto ao modo de articulação, as palatalizadas têm um contato mais largo do
que as não-palatalizadas. O contato línguo-palatal é o mesmo de uma não palatal, mas
articulada com maior energia. O autor observa que esses contatos apresentam grande
variação, nem sempre de fácil interpretação palatográfica, gerando uma variação
fonética que pode ser percebida auditivamente, mas considerada irrelevante pelos
falantes, em determinadas línguas, se estiverem em distribuição complementar.
Cagliari (1974) identifica, em língua portuguesa, além das consoantes palatais, a
ocorrência de consoantes palatalizadas seguidas de [i] ou de [j], favorecidas pela
28
articulação palatal, que exige maior esforço articulatório desses segmentos. Segundo o
autor, as consoantes /n/ e /l/ são os sons que se palatalizam e despalatalizam mais
facilmente, pois se incluem entre as consoantes de fraca articulação.
A despalatalização, por sua vez, ocorre devido ao enfraquecimento do contato da
língua com a área palatal, diminuindo assim a área de contato, que sofre encurtamento
para a frente ou para trás. Em vista disto, consoantes palatais ou palatalizadas regridem
para a região anterior ou posterior da boca, ocorrendo o que se chama de “tendência
ieisante” da língua, ou ieísmo, que é o que ocorre na passagem de // a [j].
(...) o enfraquecimento articulatório se produz ao longo da linha média da
língua, originando um canal de constrição, em vez de oclusão. As bordas da
língua, agora, continuam com sua pressão forte para os lados, comprimindo-
se contra os dentes pré-molares e molares, na posição típica do iode.
Observando-se alguns palatogramas das consoantes palatais, nota-se, às
vezes, uma maior tendência a iode, pela diminuição da oclusão sobre a linha
média. No ponto em que essa diminuição acabar, com a oclusão sobre a linha
média, gerando, portanto, um canal constritivo, estamos diante de um iode”.
(CAGLIARI, 1974, p.115)
Segundo Cristófaro-Silva (1999), o som palatal é produzido com a parte medial
da língua contra a parte final do palato duro, como é o som [] em língua portuguesa.
Em termos de realizações, assim como Cagliari (1974), ela também faz importantes
distinções entre a consoante palatal e a palatalizada. Segundo a linguista, no primeiro
caso, sons palatais são aqueles produzidos com a obstrução da passagem do ar na região
palatal (o ar sai pelas laterais) pelo levantamento da parte média ou central da língua
que quase toca o palato duro.
No segundo caso, a lateral palatalizada [lj] é produzida quando a ponta da língua
é erguida em direção aos alvéolos ou aos dentes e, concomitantemente, a região central
da língua é levantada em direção ao palato duro. Assim, “a segunda alternativa
articulatória relacionada ao dígrafo “lh” representa os casos em que uma consoante
lateral alveolar (ou dental) é articulada juntamente com a propriedade articulatória
secundária de palatalização”. (CRISTÓFARO-SILVA, 1999, p. 65)
29
2.2 Acústica
Lindbloom & Sundberg (1971, apud STEIN, 2011) evidenciam uma relação
entre a articulação e o perfil acústico das consoantes. Eles propõem um modelo
articulatório, considerando “a possibilidade de essa relação ser caracterizada a partir de
cinco parâmetros, evidenciando a influência das características do trato vocal sobre os
formantes, na sequência necessária à articulação do segmento” (cf. STEIN, op. cit, p.
224).
Dessa forma, ao considerar F1 como sendo a abertura da mandíbula, este
apresentaria uma trajetória ascendente, o mesmo ocorrendo com F2, se a língua
estivesse retraída em direção ao palato mole; já o aumento de F3 poderia ocorrer de
forma abrupta se a mandíbula estivesse “moderadamente aberta e a língua voltada para
a região do palato” (Id., p. 224).
O movimento da língua – considerado por Lindbloom & Sundberg (1971), o
segundo parâmetro – indica que, “caso ela se movimente da região anterior para a
posterior, F1 descreverá uma trajetória ascendente” (cf. STEIN, op. cit. p. 224). A
constrição do trato vocal, considerada pelos autores o terceiro parâmetro, somente
acarretará uma diminuição nos valores do segundo formante, caso haja um aumento da
constrição.
O arredondamento labial, o quarto parâmetro, “é responsável pelo abaixamento
geral de todos os formantes, especialmente F2 e F3”. Já o quinto, que se refere à altura
da laringe, indica que haverá um abaixamento de todos os formantes, se o trato vocal se
alongar (cf. STEIN, op. cit. p. 225).
Para Kent & Read (1992), as consoantes laterais, pelo fato de possuírem
formantes e antiformantes, são também próximas às consoantes nasais. Assim, para
esses linguistas:
O /l/ é produzido com uma constrição apical parcial que permite que o som se
propague pelas aberturas laterais. Esta bifurcação parcial causa formação de
antiformantes. O /l/ é acusticamente próximo às nasais por ter uma relativa
baixa energia acústica com uma predominante concentração de baixa
frequência.8 (KENT & READ, 1992, p. 39)
8 “The /l/ is produced with a mid-line apical constriction, wich allows sound to radiate through openings
at the sides. This midline bifurcation causes the formation of antiformants. The /l/ is acoustically similar
to nasals in having a relatively low acoustic energy with a predominantly low-frequency concentration.”
30
Segundo Kent & Read (1992), parece ser necessário reconhecer pelo menos as
duas maiores variantes de cada líquida – pré-vocálica e pós-vocálica –, já que estudos
indicam que a sua posição na sílaba acarreta alteração nos seus padrões formânticos.
De acordo com Lehiste (1964), o alofone de /l/ inicial é caracterizado por um F1
baixo que parece ser relativamente independente da vogal seguinte. Já o seu segundo
formante mostra uma variedade maior de flutuação, aparentemente antecipando a
posição do segundo formante da vogal seguinte. O seu terceiro formante é
invariavelmente alto e nenhuma variação sistemática poderia ser atribuída à influência
de um núcleo de sílaba seguinte.
Dessa forma, para Lehiste (1964, p. 14), a diferença principal entre os alofones
inicial e final de /l/ está na relativa proximidade de F1 e F2, no que se refere a /l/ final.
As diferenças na posição do terceiro formante não mostram nenhum padrão claramente
discernível e parecem relativamente insignificantes. Além disso, ainda segundo a
autora, a influência do /l/ final no som vizinho é muito menos ambígua que a do /l/
inicial.
Ladefoged (2003, pp. 145-146), diferentemente de Lehiste (op.cit.), analisa a
lateral alveolar (ápico ou lâmino-alveolar) comparando-a à lateral palatal e observa que
o segundo formante de [] é mais alto que o de [l].
Já Ladefoged & Maddieson (1996, pp. 182-214), ao analisarem três línguas
australianas (arrernte, kaititj e alyawarra), verificam que elas possuem quatro laterais
em contraste e, ao compararem a acústica dessas variantes, afirmam que a lateral
laminal pós-alveolar (que seria o que nesta tese é chamado de lateral palatalizada) teria
o F2 mais alto que o das variantes apicais.
No que diz respeito ao Português Europeu, Andrade (1997, p. 58) menciona que,
do ponto de vista acústico, /l/ está tipicamente associado a uma estrutura formântica
bem definida, mas com irregularidades, decorrentes da partição do canal bucal imposta
pela constrição anterior.
Tais irregularidades manifestam-se sobretudo através da atenuação do pico
de F3 (eventualmente F2). Em termos gerais, a lateral distingue-se de vogais
e glides por apresentar, além disso, uma amplitude espectral inferior nas
baixas frequências, e uma atenuação adicional na região de altas frequências.
(ANDRADE, 1997, p. 58)
Ainda fazendo considerações sobre a lateral, Andrade (op. cit., p. 58) acrescenta
que um /l/ velarizado apresenta um F2 mais baixo do que um não velarizado, já que
31
existe uma relação íntima entre o segundo formante e as características do sistema de
ressonância atrás da constrição da lateral.
Segundo Quilis (1988), as líquidas laterais se caracterizam por sua continuidade,
o que favorece que, em seus espectros, apareçam certos formantes análogos aos
vocálicos. A duração media de /l/ em posição pré-nuclear ou pós-nuclear, sem fazer
parte de uma sequência consonântica tautossilábica, é de 6,03 cs9.
Ainda em seu estudo, Quilis (1988) acrescenta que, em posição átona, o /l/
apresenta um F1 maior que em sílaba tônica, o que indica uma maior abertura
articulatória. Segundo o autor, este seria um dos traços consonânticos das líquidas
laterais, pois, como assinala Straka (1963), com a diminuição da energia articulatória, as
consoantes tendem a abrir-se. (apud op. cit., p. 277)
No /l/ espanhol, o F1 aparece a uma frequência mais baixa que o correspondente
da vogal com a qual forma sílaba e se vê pouco influenciado por ela. É, portanto,
relativamente independente da sua vogal silábica. O F2, diferentemente do que foi
apresentado por Lehiste (1964) para o inglês, é também relativamente independente do
da vogal seguinte:
Em geral, sua frequência descende desde /i/ até /u/, embora costumem flutuar
com as vogais posteriores; de qualquer forma, as diferenças entre as
frequências mais altas e as mais baixas não são muito grandes. 10
(QUILIS,
1988, p. 278)
Quanto ao //, Quilis (1988) afirma que em posição, tanto inicial quanto medial,
o fonema apresenta características bastante similares:
A duração média das realizações de // é de 7,32 cs. [] apresenta maior
duração em sílaba tônica que em átona. A duração maior é a de [-] em
sílaba tônica, e a menor, também em [-] em sílaba átona. 11
(QUILIS, 1988,
p. 281)
9 O autor, em seu livro, opta por utilizar centissegundos em vez de milissegundos, termo este mais
comumente encontrado na literatura especializada. 10
“En general, su frecuencia desciende desde /i/ hasta /u/, aunque con las vocales posteriores suele
fluctuar; de todas formas, las diferencias entre las frecuencias más altas y las más bajas no son muy
grandes.” 11
“La duración media de las realizaciones de // es de 7,32 cs. [] presenta mayor duración em sílaba
tónica que en átona. La duración mayor es la de [-] em sílaba tónica, y la menor, también en [-] en
sílaba átona.”
32
No F1 de [], do espanhol, ainda segundo Quilis (1988), não existe praticamente
nenhuma diferença na frequência, entre a posição tônica e a átona. Já o F2 e o F3
mantêm uma frequência mais alta em sílaba tônica que em átona.
Acrescenta o autor que o F1 de [], geralmente, está situado abaixo do F1 da
vogal com a qual forma núcleo silábico e é independente deste. Já o F2 de [], como já
foi dito anteriormente, apresenta sempre maior frequência que os homólogos [a, o, u],
variando sua situação com [i, e]. Este F2 tem pouca flutuação:
Entre as frequências mais altas e as mais baixas há uma diferença média de
200 cps, o que representa aproximadamente a metade do valor de flutuação
do F2 de /l/. Por outro lado, este F2 antecipa o começo do F2 da sua vogal
núcleo silábico.12
(QUILIS, 1988, p. 282)
Em seus estudos sobre a fonética espanhola, Martínez Celdrán & Fernández
Planas (2007) observam que existe uma distinção entre uma lateral palatalizada,
variante da alveolar, e a palatal plena. A grande diferença existente entre esse dois sons
ocorreria nos picos dos primeiros formantes, embora seja, no segundo, que se apresente
a maior distinção: 1.575 Hz para o palatalizado e cerca de 2.400 Hz para o palatal.
Segundo os autores, “essa diferença justifica que acusticamente se considere a
palatalizada uma simples variante da alveolar, já que seus formantes são muito mais
parecidos entre si”.13
(op. cit., p. 140)
Monteiro (2012), em trabalho que tinha como principal objetivo ampliar os
estudos sobre as laterais no Português Europeu – uma vez que são poucas as pesquisas
sobre esses fonemas na fala da região mencionada –, verificou que, para o PE, a lateral
palatal revela um valor de F1 próximo dos 300 Hz, um valor de F2 cerca dos 2050 Hz e
um valor de F3 ao redor dos 2900 Hz. Ademais, observou que, além de não existirem
diferenças acústicas na lateral palatal entre os três dialetos focalizados (Aveiro,
Bragança e Porto), essa consoante sofre efeitos de coarticulação, visto que se registram
diferenças nos valores de F1, F2 e F3 em função do contexto vocálico adjacente.
12
“Entre las frecuencias más altas y las más bajas hay una diferencia media de 200 cps, lo que
representa aproximadamente la mitad del valor de fluctuación del F2 de /l/. Por otra parte, este F2
anticipa el comienzo del F2 de su vocal núcleo silábico.” 13
“Esta diferencia justifica que acústicamente consideremos a la palatalizada una simple variante de la
alveolar, ya que sus formantes son mucho más parecidos entre sí.”
33
Embora, segundo Recasens & Espinosa (2006), a lateral palatal apresente grande
resistência à coarticulação, Monteiro (2012) verificou o contrário. De acordo com essa
linguista, no que se refere a F1, registram-se valores mais elevados quando a lateral
palatal está próxima da vogal /a/ (352,90 Hz) e valores mais baixos em contexto de /i/
(290,4 Hz) e de /u/ (292,3 Hz).
Em relação a F2, os resultados de Monteiro (op. cit.) assinalam a existência de
três grupos de efeitos distintos, um para cada vogal. “Quando próxima da vogal /a/, o
// apresenta o valor mais baixo (1851,5Hz); quando junto da vogal /i/, o valor mais alto
(2241,2 Hz) e, quando próximo da vogal /u/, o valor intermediário (2074,7 Hz)” (Id. p,
49).
No que diz respeito aos resultados de F3, Monteiro (op. cit.) verifica a existência
de dois grupos distintos que diferenciam os valores de F3 da lateral palatal na presença
de /i/ (2978,0 Hz) e de /u/ (2864,5 Hz). A vogal /a/ apresentaria um valor intermédio
entre as restantes vogais (2888,8 Hz).
No que se refere especificamente ao PB, Silva (1996) indicou haver uma
diferenciação acústica entre as consoantes líquidas [l], [] e [] tanto qualitativa quanto
quantitativamente. Embora os valores de F1 e F2 se mostrem muito próximos,
especialmente os de F1, o que sugere que essas consoantes tendem a se aproximar, as
médias diferentes de F3 são responsáveis pela diferenciação entre esses fones.
Os estudos de Pagan & Wertzner (2007) ratificam os estudos de Silva (1996),
uma vez que, para as referidas autoras,
o F1 apresentou médias e desvios padrão para as consoantes /l/ e //
semelhantes, porém menores para a consoante //. No F2, não foram
observadas grandes diferenças entre os desvios padrão, enquanto que as
médias correspondentes às consoantes // e // pareceram ser semelhantes e
maiores do que as obtidas para a consoante /l/. As médias do F3
diferenciaram os três fonemas sendo o valor mais alto obtido para a
consoante //, seguida da consoante // e, por último, o menor valor foi o da
consoante /l/. (PAGAN & WERTZNER, 2007, p. 107)
Segundo Stein (2011), as médias de F2 e de F3 serem maiores para a lateral
palatal do que para a lateral alveolar é possível, uma vez que, seguindo-se o modelo de
Lindbloom & Sundberg (1971, apud op. cit.), no que se refere à abertura da mandíbula,
“indica ocorrer um grande crescimento no valor de F2 para as consoantes que são
34
produzidas com a língua retraída em direção ao palato mole; o crescimento de F3 é
previsto caso a mandíbula esteja moderadamente aberta e a língua voltada para a região
do palato” (cf. STEIN, op. cit. p. 227). Dessa forma, sendo // uma consoante palatal,
suas médias de F2 e F3 devem ser maiores que as observadas para a lateral alveolar /l/.
Ainda de acordo com Stein (2011, p. 229), é importante assinalar que a
realização fonética da lateral palatal, no português brasileiro, nem sempre ocorre como
[]: observam-se também os alofones [lj] – que indicaria “a realização de um segmento
próximo à vogal [i] acompanhando a consoante – e [j]”.
Stein (2011, p. 229) acrescenta, ainda, que
mesmo em realizações que, em princípio, seriam plenamente palatais (e não
“palatalizadas”) como na pronúncia do logátomo “elhe”, [representada na
figura abaixo], é possível perceber uma manifestação de um segmento que
lembra a vogal [i] (representado pelo estriamento mais escuro no terceiro
terço da área delimitada para [], entre F2 e F3, diferentemente do que se
verifica nos seus dois primeiros terços).
Figura 1. Oscilograma e espectrograma representando a realização dos logátomos “ele” e
“elhe” (com vogais anteriores médias-baixas), pronunciados por um informante brasileiro
nascido no Estado do Espírito Santo. Valores médios dos três primeiros formantes para [l]:
F1, 639 Hz; F2, 1117 Hz; F3, 3193 Hz; para []: F1, 389 Hz; F2, 2091 Hz; F3, 3146 Hz.
Fonte: STEIN (2011, p. 228).
35
3 OUTROS ESTUDOS SOBRE O //: INTERPRETAÇÃO FONOLÓGICA E
VARIAÇÃO
Nesta seção, fez-se um levantamento de estudos relacionados ao comportamento
de //. A seção divide-se em duas partes: na primeira, abordam-se estudos que
descrevem a evolução do // do latim ao português. Na segunda, apresentam-se
trabalhos que se referem à variação desse fonema no Português do Brasil e no Português
Europeu, dos pontos de vista da teoria da variação laboviana e da difusão lexical, bem
como a diferentes interpretações de cunho fonológico.
Ressalte-se, porém, que poucos são os trabalhos que descrevem a variação do
fonema // produzido em Portugal.
3.1 Do latim ao português
Segundo Teyssier (2004), a palatalização está entre as inovações fonéticas do
latim imperial que terão importantíssimas consequências, já que devido a este fenômeno
o galego-português medieval terá cinco fonemas novos: /t/, /d/, //, // e //.
Assim sendo, em várias palavras um i ou um e tônicos, seguidos de uma vogal,
eram pronunciados iode em latim imperial. Dessa forma, “pretium, platea, hodie, video,
facio, spongia, filium, seneorem, teneo resultaram os grupos fonéticos [tj], [dj], [lj] e
[nj] que se palatalizaram em [tsj] e [dzj], [] e []”. (TEYSSIER, 2004, p. 11)
Ainda de acordo com Teyssier (2004), os três séculos passados entre a chegada
dos povos germânicos à Península Ibérica (409) e a dos muçulmanos (711) não
deixaram qualquer documento linguístico. No entanto, a linha geral da evolução não
admite dúvidas: “vê-se acelerar a deriva que transformará o latim imperial em proto-
romance, e aparecerem certas fronteiras linguísticas. Uma destas fronteiras é a que vai
separar os falares ibéricos ocidentais, donde sairá o galego-português, dos falares do
centro da península, donde sairão o leonês e o castelhano”. (op. cit., p. 13)
Segundo o autor, é provavelmente por essa época que se desencadeia a evolução
do grupo consonantal cl (oc’lu de oculum). Nesta posição, c, pronunciado [k], em
36
galego-português, passa a iode [j] (oc’lu > *ojlo) e, depois, o segmento [-jl-] passa a []
palatal.
De acordo com Teyssier (2004), a partir do século IX surgem textos redigidos
num latim “extremamente incorreto” – conhecido tradicionalmente como latim bárbaro
– que às vezes, deixavam aparecer formas da língua falada. “Percebe-se, assim, abelha
em abelia (<apicula) em vez de apis, ou coelho em conelium (<coniculum), ou ovelha
em ovelia (<ovicula). (op. cit., p. 16)
Câmara Jr. (1979) ao analisar a história e a estrutura da língua portuguesa,
aponta que a palatalização de /n/ e /l/ deu-se exclusivamente em posição intervocálica e
// é o reflexo de dois fenômenos fonéticos distintos, a saber: (1) // advém de um
grupo de constritiva labial ou oclusiva surda seguida de /l/, em posição intervocálica
(speculum > speclum > espelho; scopu lum > scoplum > escolho); (2) // é formado a
partir de um /l/ seguido de um /i / assilábico (palea > /pali a/ > palha).
Mattos e Silva (1991), fazendo uma releitura de Paul Teyssier, comenta que as
palatalizações românicas (não só as portuguesas) resultam de complexas mudanças
fonéticas, na maioria dos casos, condicionadas pelo seguinte contexto fônico: presença
de vogal ou semivogal palatal /i, e/, seguindo consoantes oclusivas. Além disso, ainda
menciona que estas mudanças fônicas modificaram a configuração do sistema latino,
introduzindo os elementos palatais – /, , , / – no sistema consonântico do
português.
Ainda de acordo com a autora, esse conjunto complexo de palatalizações não
ocorreu ao mesmo tempo na história. Como já foi dito anteriormente, revisitando
Teyssier, Mattos e Silva (1991) demonstra que já vêm do latim imperial as
palatalizações de nasais e líquidas seguidas de elemento vocálico palatal (te/ne/o >
te//o; fi/li/um > fi//o) e que não são tão recuadas na história as palatalizações que têm
como antecedente consoantes seguidas de /l/:
Pode-se situar entre os séculos V e VIII, isto é, entre a queda do Império
Romano e o despontar das variantes românicas, o surgimento de sequências
/Cl/ decorrentes da perda da vogal não-acentuada. Resultarão na palatal // –
oculu > oc’lu> o//o, apiculas > apic’la > abe//a, ovicula > ovc’la >
ove// a, teguloa > teg’la > te//a, scopulu > scop’lu > esco//o. (MATTOS
E SILVA, 1991, p. 86)
37
Coutinho (1973, p. 121) acrescenta que as geminadas -ll-, do latim, resultaram
na lateral palatal ou simplificaram-se. Assim, para o autor o -lh- veio de empréstimo do
espanhol, “onde o -ll- se transformou em -lh-14
: caballariu > cavalheiro, scintilla >
centelha.”
Ainda de acordo com Coutinho (1973), os grupos formados por consoante e
semivogal (i, u) merecem tratamento à parte pelas transformações peculiares que
apresentam. Segundo ele, o -e- em hiato passou a -i-, no latim vulgar, no século I, e
muitos grupos formados, não só por uma semivogal i, como também pela transformação
apresentada acima (e > i), palatalizaram-se, passando, às vezes, a semivogal para a
sílaba anterior, ou fundindo-se com a consoante num só som.
Para Coutinho (1973, p. 127), o -lh- também advém do grupos -lli-, -li- que se
fundem, como pode ser observado nos exemplos dados pelo autor: “alliu > alho, malleu
> malho, alienu > alheio, consiliu > conselho, ervilia > ervilha, filiu > filho, folia
>*folha, palea > palha, solea > solha”.
Já Said Ali (2001) comenta que, nas palavras formadas com o sufixo -culu, -
cula, conservou-se o acento na vogal precedente e o sufixo alterou-se em lho, lha, como
em espelho (de speculu) e artelho (de articulu). Ainda acrescenta, no entanto, que esta
mudança é difícil de explicar com o simples recurso do sistema ortográfico de que, a
princípio, dispunham as línguas românicas para representar os diversos sons.
Assim, de acordo com Said Ali (2001), aparentemente, deu-se o primeiro passo
na alteração fonética, eliminando uma vogal (-culu- > -c’lu- > *clo). Isto, porém, para o
autor de pouco adianta. Ao contrário da explicação antiga, “que se limita a passar de um
enigma a outro enigma maior”, o autor propõe processos fônicos que, segundo ele,
“atendem às possibilidades fisiológicas” (op. cit, p. 32):
Primeiro que tudo, a modificação em lho, lha, não se faria sem a prévia
sonorização da consoante k, e o novo fonema devia ter qualidade palatal
capaz de influir no fonema vizinho, palatalizando-o igualmente. Em vez de
imaginar desde logo o desaparecimento da vogal entre as duas consoantes,
deve-se antes supor que ela persistisse a princípio, e que não soaria
rigorosamente como u, mas que, sendo átona, a sua pronúncia se aproximasse
de i; teríamos pois spek-ulu> spek–ilu > spe(g)ilu ou spe()ilu. Dar-se-ia
depois metátese na terminação: speilu < spe-liu. (op. cit., p. 32)
14
Nesta passagem, Coutinho (1973) demonstra que o grafema “ll” assumiu a pronúncia [].
38
3.2 No Português do Brasil
A lateral palatal, consoante pouco produtiva na língua portuguesa – já que sua
posição mais comum é a intervocálica15
–, apresenta uma grande flutuação de
pronúncia, a ponto de alguns autores, como Cristófaro-Silva (1999, p. 40), afirmarem
que essa consoante ocorre na fala de poucos falantes do português brasileiro, que a
substituem por uma lateral alveolar (ou dental) palatalizada que é transcrita por [lj].
Pontes (1973), ao apresentar a análise fonêmica que serve de base a seu estudo
sobre a estrutura do verbo no português coloquial, elimina do quadro de fonemas a
lateral palatal, que interpreta como sequência /lj/ (foneticamente [j], lateral
alveopalatal), alegando “não existir na língua coloquial, o contraste que a escrita sugere,
do tipo óleo-olho, que se pronunciam da mesma maneira: [ju]”.
Câmara Jr. (1979, p. 45) também já comentava esse fenômeno, ao chamar a
atenção para a ausência de contraste entre [] e [l] diante de [i]:
São igualmente típicas da variedade relaxada a ausência de /r/ em posição
pós-vocálica final e a neutralização do contraste /l/ - / / e /n/ - // diante de
/i/ com a realização, apenas, do primeiro membro (/foli‟nha/,/ compani‟a/),
ou diante de /j/ a anulação da distinção / / - /lj/, // - /nj/ como nos casos de
venha e vênia (/vê„a/ - /ve‟nja/) ou de olhos e óleos (/ó‟us/ - /ó‟ljus/. (op.
cit., p. 45).
Silveira (1986) identifica mais de uma realização para a lateral palatal. Segundo
a autora, // é realizado por [], [j], [jj], [l], [lj], sendo algumas dessas concretizações
típicas de alguns dialetos brasileiros. Para esta linguista o ieísmo, por exemplo, é típico
do falar caipira e a realização [lj] ocorre, provavelmente, devido à própria origem do
fonema palatal:
Como sabemos, o fenômeno da palatização ocorre, no português, de
combinatórias como: lj > (filium > filiu > filju : fio). (op. cit., 1986, p.
102)
15
Segundo Houaiss (2001), a lateral palatal, só aparece em início de vocábulo, no clítico lhe, e em mais
17 vocábulos, que constituem empréstimos de outras línguas.
39
Já Cagliari (1974), em seu estudo sobre a palatalização no português, dá uma
ênfase grande à variação de // no dialeto paulista e afirma ser a despalatalização uma
etapa de evolução da palatal, a partir da qual se operam outras transformações, sendo a
realização palatalizada, como um dos aspectos da despalatalização, uma realização
intermediária na passagem da palatal para não-palatal. As etapas resultantes desse
processo, apresentadas pelo autor, são: palatal, palatalizada com iode, palatalizada sem
iode, despalatalizada com iode.
Segundo sua interpretação, a passagem da palatal à palatalizada com iode tem a
mesma facilidade da passagem da palatalizada com iode à palatal: no primeiro caso
tem-se o aumento de energia e, no segundo, a sua diminuição:
A passagem de palatal à palatalizada seguida de iode se justifica
perfeitamente pelo fato das palatais, sendo mais longas do que as demais
consoantes, terem uma distensão mais pronunciada, o que pode dar a
entender a presença de iode, seguido imediatamente à distensão. O
enfraquecimento articulatório não permitido a palatal, faz com que gerações
mais novas percebam na distensão da palatal um iode e comecem a realizar a
palatal como uma consoante palatalizada (menos enérgica e firme) seguida de
iode. (CAGLIARI, 1974, p.118)
Segundo a descrição do autor, a lateral palatalizada, como variante de /l/ (lateral
alveolar), é favorecida em alguns casos pela presença da vogal palatal ou iode em
posição átona. Do ponto de vista articulatório, registra-se um avanço da língua na linha
média do palato. Como variante de // pode despalatalizar-se quando precedida de
vogal palatal tônica.
Ainda no que diz respeito às diferentes realizações de pronúncia de //, diversos
trabalhos de caráter dialectológico, como os de Amaral (1920), Nascentes (1922),
Aguiar (1937); Marroquim (1934); Teixeira (1938; 1944); Rodrigues (1974), Melo
(1981), Aragão (1984) e Aguilera (1987) também indicam que, tanto a despalatalização
como a iodização são fenômenos facilmente encontrados no português do Brasil.
Estudiosos como Amaral (1920), Nascentes (1922), Marroquim (1934)
relacionaram a despalatalização de //, no português do Brasil, à influência africana,
sendo essa realização considerada típica dos falares crioulos registrados em Cabo
Verde, Guiné, São Tomé, Ceilão (Sri Lanka), Dio, Goa e Ilha do Príncipe. Já Melo
(1981, p. 58-59) afirma que a não palatalização de //, mais especificamente a sua
40
vocalização, é típica de algumas regiões do interior Brasil, como Goiás e certas
localidades da Bahia. Este autor ainda comenta que a palatal // é tida como ausente no
Nordeste.
Em estudos com outras bases teórico-metodológicas são encontradas descrições
e análises que identificam e relacionam as diferentes realizações de // a aspectos
sociais e linguísticos em diversos falares brasileiros.
Os estudos de Penha (1972), sobre o falar da zona rural do Sul de Minas Gerais,
registram as formas [l] e [j] para //. Já o trabalho de Caruso (1983) sobre o falar baiano
mostra a tendência para a iodização: 64,2% na região litorânea ocidental do estado e
35,8% no interior.
Oliveira (1983), em seu trabalho sobre variação e mudança no português do
Brasil, apresenta análise quantitativa e qualitativa da variável (), em Belo Horizonte,
chegando às seguintes conclusões: (1) a variante [j] tem seus percentuais de realização
nos grupos socioeconômicos mais baixos e ocorre, ainda que de forma esporádica, nos
grupos mais altos; além disso, é favorecida pelo estilo informal e desfavorecida pelas
mulheres, o que evidencia seu status de estereótipo. (2) a variante [l] apresenta-se com
as características de uma variante em extinção, na medida em que se realiza,
preferencialmente, na fala dos mais velhos; nos grupos socioeconômicos mais baixos, é
favorecida pelo estilo formal, o que lhe empresta o caráter de variante de prestígio em
relação à variante [j].
Madureira (1987), em seu estudo sobre as condições de vocalização da lateral
palatal no português, concorda com Oliveira (1983) ao mostrar que há um percentual
bem grande de vocalização na fala dos indivíduos do sexo masculino com baixo poder
socioeconômico. No entanto, ainda demonstra que há indícios de que a variante [j] se
implementa, em Belo Horizonte, de um grupo socioeconômico mais baixo (G2) para o
outro, mais alto (G1), por difusão lexical. Segundo esta autora, dentre os parâmetros
estruturais considerados, o único a apresentar algum grau de favorecimento foi o fator
item lexical. Isto é, a sua análise revelou que o G1 apresentou vocalização em dois itens
lexicais: trabalhar e velho. No G2, esses dois itens receberam os maiores percentuais de
vocalização. Foi identificado, além disso, que o favorecimento desses dois itens
relacionava-se a contexto de fala afetivo.
41
Na fala da cidade de Londrina (PR), Aguilera (1987) registra diferentes estágios
de despalatalização de //, tais como despalatalização por iodização; despalatalização
por síncope ou por apócope, sem resquício de [j]; despalatalização por substituição;
palatalização, por hiperurbanismo, na zona rural; palatalização seguida de rotacismo
(como em orvalho>orváliu> orváriu).
Em um trabalho posterior, Aguilera (1988) também busca identificar as
realizações da lateral palatal no Atlas Linguístico do Paraná, encontrando as realizações
[], [j] e . Sua análise mostra que a primeira é a mais produtiva dentre todas e é
considerada a variante culta, as duas últimas ocorrem mais nas regiões rurais do estado.
A despalatalização e iodização de // são identificadas por Aragão (1997) no
Atlas Linguístico da Paraíba. A autora constata a alta frequência e distribuição de
iodização na fala de indivíduos masculinos e femininos, nas faixas etárias mais altas, e
de menor escolaridade.
Em seu estudo sobre a vocalização da lateral palatal no português brasileiro,
Madureira (1999) constatou que um bom número de falantes do grupo socialmente
menos favorecido desconhecia a articulação da lateral palatal. Assim, toda e qualquer
palavra contendo essa variável era sistematicamente pronunciada com a semivogal
palatal, inclusive aquelas que integram as listas de pares mínimos do tipo teia – telha,
vazia – vasilha. A única exceção aparecia quando a variável era seguida de /i/ ou /e/
realizando-se, então, como lateral alveolar. No que diz respeito a esta variante, segundo
a autora, apresentava-se com as características de uma variante em extinção, na medida
em que se realizava, preferencialmente, na fala dos mais velhos.
Ainda na linha variacionista, inscrevem-se alguns estudos mais recentes como os
de Machado-Soares (2002, 2008, 2009), Castro (2006), Brandão (2006, 2007), Ferreira
(2011), Freire (2011 e 2012) e Santos & Chaves (2012).
Os estudos de Machado-Soares (2002) sobre as variações dos fonemas palatais
lateral e nasal no falar urbano de Marabá-PA identificam para a lateral palatal as
seguintes realizações: [] (4%), [lj] (57%), [lj] (27%), [l] (27%), [j] (9%), e (0%). Os
resultados indicaram condicionamentos linguísticos e extralinguísticos. Para os fatores
sociais levados em conta na análise, as variantes palatais/palatalizadas se identificaram
com as formas padrão e de prestígio, sendo preferidas, em termos probabilísticos, por
42
mulheres, por indivíduos de maior escolaridade e renda mais alta e de faixas etárias
mais baixas (15-25/26-45), ao contrário da forma semivocalizada.
Castro (2006), em seu trabalho sobre o uso da semivogal [j] e a inserção da
lateral palatal [] no português falado pela comunidade afrodescendente de Matição,
Jaboticatubas/MG, chegou à conclusão de que [j] e [] são consideradas duas variantes
(a primeira, conservadora e a segunda, inovadora) de uma variável linguística cujo
comportamento é influenciado por fatores estruturais e sociais.
Segundo a autora, os fatores vogal precedente, classe de palavras e faixa etária
do falante favoreceriam o uso da lateral palatal. Assim, quando o // estivesse sendo
concretizado por indivíduos mais jovens (entre 25 e 45 anos), inserido num nome
substantivo ou adjetivo e antecedido pelas vogais [i] ou [u], na maioria das vezes, a
variante produzida era []. Para ela evidencia-se, então, que a variação se associa a uma
característica de mudança em progresso (em direção ao uso da lateral palatal e
consequente perda da semivogal).
Esses resultados, de acordo com a linguista, ainda permitem supor que, na
comunidade de Matição, há inserção da variante [] através dos falantes mais jovens,
pois eles mantêm um contato mais frequente com a comunidade urbana de Jaboticatubas
– MG.
Brandão (2006), em estudo que tinha por finalidade verificar a vitalidade, na fala
popular, do ieísmo e das variantes que com ele concorrem, observa que o cancelamento
– como em [„miu] por milho – e a variante [j] – como em [„vju], por velho – são
bastante produtivos na fala de comunidades rurais ou de grupos com baixo ou nulo nível
de escolaridade.
Ao analisar os 510 dados referentes à variável //, presentes nas cartas do Atlas
Linguístico da Paraíba, Atlas Prévio dos Falares Baianos, Atlas Linguístico de Sergipe
(vol. 1) e Esboço de um Atlas Linguístico de Minas Gerais, sob a perspectiva da
sociolinguística variacionista, a autora pôde constatar que os falantes das regiões
observadas tendem a não produzir a lateral palatal. Dentre os processos que concorrem
para a não concretização desse segmento, o mais produtivo, segundo a autora, é a
iodização: “do índice de 65% de não manutenção, 53% correspondem à permuta da
lateral pela semivogal” (BRANDÃO, 2006, p. 73). A despalatalização pela troca com a
43
lateral alveolar, bem como a concretização como [lj]
são pouco frequentes. Para a
autora,
essa situação, certamente, deve-se ao tipo da amostra, bastante restrito, em
que não aparecem vocábulos oxítonos como o verbo colher ou os
substantivos colher e mulher, em que o primeiro dos mencionados processos
parece ser mais produtivo. (op. cit., p. 74)
No que diz respeito às variáveis linguísticas que condicionam o processo de
iodização, Brandão (2006) aponta a importância da vogal que precede o segmento. Num
total de 434 dados, mostram-se mais propícios à variação [] > [j] os contextos em que
há, antes do segmento em análise, uma vogal média. Já no que concerne às variáveis
extralinguísticas, a área geográfica mostrou-se condicionadora da regra: “considerando-
se, isoladamente, cada uma das áreas, do ponto de vista geopolítico, verifica-se que os
índices percentuais na Paraíba são de 58%, em Sergipe, de 64%, na Bahia, de 72 % e
em Minas Gerais, de 43%”. (op. cit., p. 75)
Já em seu estudo sobre a variação de // na fala do Norte-Noroeste do Estado do
Rio de Janeiro, Brandão (2007) observa que a lateral palatal aparece como a variante
preferencial (72%)16
em contraste com a semivogal e a lateral alveolar, ambas atingindo
o mesmo índice percentual de 5%. Além dessas variantes, a autora ainda menciona a
ocorrência de cancelamento (1%) – que aparece, geralmente, quando, no contexto
antecedente, existe uma vogal coronal [i] – e de [lj] (17%).
O alto índice de concretização de [] possibilitou que a autora investigasse que
fatores estariam influenciando a ocorrência das demais variantes.
Segundo Brandão (2007), as variantes [lj] e [j] são condicionadas por fatores
tanto linguísticos quanto extralinguísticos, enquanto a troca de [] por [l] deve-se,
apenas, a fatores estruturais.
Estariam favorecendo a concretização de [lj], do ponto de vista estrutural, os
fatores classe do vocábulo, contexto antecedente e tonicidade da sílaba. Há maior
probabilidade de ocorrência em nomes (0,55), depois da semivogal alta (0,62) e em
sílaba postônica (0,64). Já a implementação da variante [j], estaria condicionada à
presença de vogais abertas (0,62), em contexto antecedente, e à posição tônica (0,55).
16
A partir da observação de cartas do Atlas Fonético do entorno da Baía de Guanabara (LIMA, 2006),
verifica-se que, na área Metropolitana do Rio de Janeiro, a variante [], também, é a mais frequente.
44
No que diz respeito ao caráter extralinguístico, enquanto [lj] é mais produtiva na
área litorânea, mais urbanizada (0,62), [j] ocorre, preferencialmente, na área interiorana,
de perfil mais rural (0,72). A variável faixa etária também se mostrou relevante para a
implementação dessas variantes: [lj] distribui-se pelas três faixas etárias de forma
homogênea, com pesos relativos bem próximos (faixa A (0,51), faixa B (0,43) e faixa C
(0,54)) demonstrando, segundo Brandão (2007, p. 96), “ser essa uma regra estável,
apesar de pouco produtiva na região”. Já os índices referentes à [j], mostram que tal
variante é mais frequente na fala dos indivíduos mais velhos (0,64).
Atuam para a aplicação de [l] a presença, em contexto subsequente, de vogal [+
cor], sobretudo de [i] (como em co[„le]mos, co[„li]) ou de outra consoante palatal na
palavra (fo[l]inha). Embora tonicidade da sílaba, não tenha sido selecionada pelo
programa, a autora observa que essa variável parece ser importante para a concretização
de [l], uma vez que das 181 ocorrências dessa variante, 148 (82%) ocorrem em sílaba
tônica.
Segundo Machado-Soares (2008), seis foram as variantes da lateral palatal
atestadas na fala paraense – [lj] (lateral palatalizada); [lj] (lateral dental ou alveolar
(despalatalizada) seguida de semivogal); [j] (semivogal (despalatalizada); [] (lateral
palatal), [l] (lateral dental/alveolar) e o zero fonético – no entanto, as três últimas
variantes foram excluídas do trabalho devido ao baixo número de ocorrência na
amostra. De acordo com a autora, tanto variáveis linguísticas quanto sociais influenciam
na variação de //.
No que diz respeito à tonicidade da sílaba, a autora constatou que o ambiente
tônico favorece as variantes [lj] e [j] enquanto que [lj] é favorecida em ambiente átono.
Já a classe morfológica, por sua vez, mostrou-se bastante irregular: os
substantivos favorecem [lj]; verbos, [lj] e [j] e adjetivos, [lj]. Com isso, a autora conclui
que o processo de implementação das variantes em termos de palatal x não palatal, no
que tange à //, não se relaciona diretamente à classe das palavras nas quais ocorrem.
O contexto seguinte vogal/ditongo teve um comportamento ambíguo: a vogal
favoreceu tanto a variante palatalizada quanto a semivocalizada; e o ditongo favoreceu
somente a variante lateral mais glide. Diante do comportamento indefinido em face das
hipóteses levantadas para esse grupo, a autora, também constata que esse grupo de
fatores não apresenta grande importância para a variação do fonema ora estudado.
45
No que diz respeito à altura do segmento subsequente, o estudo mostrou que os
segmentos altos favorecem [lj]. Já quanto à vogal antecedente, observou-se que as
vogais anteriores favoreceram [lj] e [lj].
Ainda segundo Machado-Soares (2008), no falar paraense, as concretizações
palatal e palatalizada são as de maior prestígio entre as mulheres, sendo a variante [j] a
realização de menor prestígio, o que comprova sua maior probabilidade de ocorrência
entre os homens.
Quanto à faixa etária, a autora verificou que os indivíduos entre 15-25 anos
tendem ao uso de [lj] - [j]; falantes da faixa de 26 a 45 anos dão preferência a [l];
falantes com mais de 46 anos preferem a variante [lj].
Já os resultados para anos de escolaridade mostram que indivíduos com menor
escolaridade (0-8) propendem ao maior uso de [j], enquanto aqueles com maior
escolaridade (acima de 8 anos) tendem ao uso de [lj] e [lj].
Em um trabalho posterior, que somente verificava a influência de
condicionamentos sociais sobre as realizações da lateral palatal na fala paraense,
Machado-Soares (2009) reafirma os resultados apresentados em seu estudo de 2008,
complementando que o alto uso, pelos mais jovens, de [j] como variante da lateral
palatal a surpreendeu um pouco. Segundo ela, o natural seria encontrar um maior uso
dessa variante na fala dos mais velhos. Dessa forma, para a autora, outros fatores
intervenientes podem estar em ação simultânea, como por exemplo, a origem
geográfica:
Considerando aquelas áreas em que predomina a palatalização, pode ser que
a despalatalização seja a variante inovadora e as formas palatalizadas sejam
conservadoras, sendo, por isso, marcas próprias de cada faixa etária.
(MACHADO-SOARES, 2009)
Ainda de acordo com Machado-Soares (2009), o fator origem geográfica
demarca bem os usos das variantes de // e duas considerações podem ser feitas no que
diz respeito a essa variável: (1) o território observado no estudo apresenta duas formas
de realização das variantes: de um lado, formas palatal/palatalizada, representadas na
fala de Belém, Bragança, Soure e Santarém, e, de outro, formas despalatalizadas,
representadas na fala de Altamira e Marabá; (2) a aproximação geográfica entre as
regiões onde se situam essas últimas e a história comum de dinâmica migratória podem
46
explicar a preferência pela semivocalização. A partir desses resultados, segundo a
autora, é possível aventar a hipótese de uma possível influência da colonização
portuguesa em Belém, Bragança, Soure e Santarém, que se revelaria pela preferência
pelas formas palatal/palatalizada.
Em estudo que tinha por finalidade observar o fenômeno da variação da lateral
palatal na fala da amostra-base do banco de Dados do VARSUL, Ferreira (2011)
observou que tanto fatores linguísticos – classe morfológica, contextos seguinte e
precedente, número de sílabas, tonicidade, categoria de frequência – como
extralinguísticos – escolaridade – favoreceram a aplicação da regra de despalatalização.
Segundo a autora, a variante despalatalização comporta-se diferentemente das
demais variantes da lateral palatal. Enquanto a vocalização e o apagamento são
favorecidos pelos verbos, a aplicação da lateral alveolar acontece nos substantivos.
Já no que diz respeito aos contextos subsequente e antecedente, foi constatado
que as vogais coronais, em posição posterior ou anterior à //, parecem favorecer a
regra da despalatalização. No entanto, a autora observa esse resultado com cautela, uma
vez que verificou que o alto índice de determinados vocábulos, como mulher, filhinho,
filhinha, velhinho e velhinha poderiam estar interferindo nesse resultado.
No que toca à variável número de sílabas, novamente a variante
despalatalização mostra um comportamento diferenciado das demais, já que a
vocalização e o apagamento encontram favorecimento em vocábulos dissílados,
enquanto a despalatalização aparece em maior número em contexto trissílabo.
Quanto ao fator tonicidade, verificou-se que a sílaba tônica favorece a
despalatalização. Esse resultado, segundo a autora, não era o esperado, já que sílabas
tônicas, geralmente, favorecem a manutenção da lateral palatal de acordo com um
estudo feito por Machado-Soares (2003) (apud op. cit).
A última variável linguística selecionada pelo programa de análise
probabilística como favorecedora da despalatalização foi a baixa frequência do item
lexical, com peso relativo de .63. Ferreira (2011) argumenta, no entanto, que este
resultado pode estar distorcido e ser influenciado pela retirada do item pronome do
corpus, pois o mesmo representava 100% de despalatalização.
47
A única variável extralinguística selecionada pelo Goldvarb como favorecedora
da aplicação da regra foi a escolaridade. Com peso relativo de .72 o fator até 11 anos de
escolaridade apareceu como favorecedor da concretização da lateral anterior. Mais uma
vez, esse resultado não era o esperado pela autora, uma vez que outros trabalhos que
tinham por objetivo analisar a variação de // demonstraram que era a vocalização a
favorecida pela baixa escolaridade.
Freire (2011), em trabalho que tinha por finalidade demonstrar como ocorre o
processo de variação da lateral palatal à luz da Teoria da Variação, não só em um
corpus sincrônico – coletado em Jacaraú (Paraíba) –, como também em um corpus
diacrônico – em textos do século XVIII –, observou que a manutenção da lateral palatal
([]) é a variante que mais ocorre, na cidade mencionada, seguida dos processos de
semivocalização ([j]), lateralização alveolar ([l]) e apagamento do segmento ( ).
De acordo com os dados analisados no corpus sincrônico, a preferência pela
manutenção de [] ocorre, principalmente, na fala dos informantes femininos. Outro
resultado importante diz respeito ao tempo de escolaridade. Os informantes analfabetos
são os que mais realizam as variantes [l], [j] e . Ao mesmo tempo, são os informantes
mais escolarizados os que mais produzem a lateral palatal [], respectivamente, P.Rs
0,73 e 0,62 para os informantes de 1 a 8 anos de escolaridade e para os com mais de 8
anos de escolaridade.
Ainda no que se refere aos fatores sociais que interferem na variação de //, o
autor constatou que os informantes com mais de 50 anos de idade são os que mais
realizam as variantes consideradas não-padrão e que os informantes mais jovens dão
preferência à lateral palatal.
Com relação às variáveis linguísticas, contextos fonológicos seguinte e
precedente e número de sílabas do vocábulo foram selecionados pelo programa
Goldvarb X como aqueles que poderiam exercer influência no uso da lateral palatal. No
que diz respeito ao contexto fonológico seguinte, o fator que mais favorece a aplicação
da regra é vogal labial. No caso do contexto fonológico precedente, dois fatores se
mostraram importantes: vogais coronais e vogais dorsais. Já no que diz respeito ao
48
número de sílabas do vocábulo, foram as trissílabas que mais favoreceram a
manutenção de [].
O autor acrescenta, baseando-se nas evidências dos dados sincrônicos
apresentados, que a variante lateral palatal no dialeto jacarauense constitui um processo
de variação social (diastrática), já que todas as variáveis sociais consideradas para a
análise foram selecionadas como condicionadores para a aplicação da regra.
No que diz respeito ao corpus diacrônico, Freire (2011) atestou que, embora a
manutenção de [] tenha sido observada em 93% dos dados coletados do século XVIII,
nessa época, já existia um processo de variação dos segmentos laterais [ ~ l] e [ ~ j].
Em um estudo posterior, Freire (2012) analisou a realização de // em dois
dialetos de divisas de Estado: Nova Cruz (RN), localizada na Microrregião Agreste
Potiguar, e Jacaraú (PB), localizada na Microrregião da Mata Paraibana, Litoral Norte
do Estado da Paraíba e que são cidades vizinhas limítrofes.
Segundo o autor, os resultados iniciais deste estudo indicam uma forte tendência
das variáveis sociais exercerem influência na realização do fonema //, mesmo que a
distribuição da estratificação social tenha sido diferente nas duas variedades estudadas.
Para a variedade paraibana, duas variáveis independentes mostram-se relevantes: sexo e
anos de escolarização. A variável faixa etária não foi selecionada como fonte
condicionadora de variação do //. Dessa forma, para Freire (2012), os falantes de
qualquer idade do dialeto paraibano parecem não demonstrar receio e/ou estigma entre a
realização do [ ~ l], [ ~ j] e [ ~ ] e, assim, não evidenciam preferências.
Já na variedade norte-riograndense, apenas a variável faixa etária mostrou-se
relevante, demonstrando que os informantes adultos são os que mais tendem a produzir
o segmento []. De acordo com o linguista, esse comportamento pode estar vinculado a
duas situações, a saber: (a) naturalmente, esse período da vida está associado à fixação
de diferentes comportamentos sociais (casamento, trabalho, constituição de família,
aquisição de casa própria, de carro, etc.) e (b) esses informantes podem estar sujeitos às
pressões atuais do mercado de trabalho: Nova Cruz (RN) tem um diversificado e
exigente mercado de trabalho, constituindo-se num espaço de maior dinamicidade que
reflete centralidade regional em relação a outras cidades.
49
Neste sentido, as variantes [l], [j], , para o autor, podem estar sofrendo
estigmatização social nessa comunidade de fala, daí serem variantes que tendem a não
ser produzidas pelos adultos que buscam inserção no mercado de trabalho.
Em uma ampliação do projeto de pesquisa que examinava a lateral /l/ em coda
silábica no Alto Acre, Santos & Chaves (2012) analisaram a variação de // em dados
experimentais do Atlas Linguístico do Acre (ALiAC), referentes às Regionais do Alto
Acre (Xapuri, Brasileia e Assis Brasil) e do Purus (Sena Madureira, Manoel Urbano e
Santa Rosa do Purus).
O objetivo geral das autoras era descrever as realizações fonéticas de // – que,
segundo elas, se situa entre os fonemas da língua portuguesa com maior possibilidade
de variação no corpus do Atlas Linguístico do Acre – ALiAC – numa tentativa de
contribuição para a descrição do consonantismo na variedade da língua portuguesa
empregada no estado.
Nesse estudo, foi observado que [] ocorre predominantemente na fala de todos
os informantes, principalmente, na dos mais jovens e das mulheres. Em segundo lugar,
encontra-se [j] como variante mais produtiva, seguido de e [lj]. Além disso, as
autoras constataram que [] ocorre, preferencialmente, depois da vogal média alta
anterior [e] e antes da vogal alta posterior [u] enquanto as variantes [j] e ocorrem,
basicamente, depois da vogal média anterior aberta [] e antes da vogal baixa [a]. Com
apenas uma realização, [lj] ocorreu depois da vogal [e] e antes da vogal nasal [ĩ].
Do ponto de vista fonológico, a lateral palatal foi estudada por Wetzels (1997,
2000), Couto (1997), Silva (1997), Hernandorena (1997, 2000) e, também, por
Machado-Soares (2008) e por Freire (2011).
Segundo Wetzels (1997 e 2000), tanto a lateral (//) quanto a nasal palatal (//)
podem ser consideradas geminadas fonológicas, pois se comportam, sob muitos
aspectos, diferentemente da lateral e das nasais não palatais (/l, m, n/). Para esse autor,
(1) as soantes palatais sempre ocupam a posição intervocálica nas palavras (à exceção
de lhe e suas combinações com os clíticos o(s) e a(s)), tanto que tendem a ser
“abrasileiradas”, se ocorrem no início de palavras emprestadas de outras línguas, como
em llama (lhama) e gnocchi (nhoque), pronunciadas, respectivamente, como [i]lhama e
50
[i]nhoque; (2) não permitem uma sílaba pesada precedente – *trabaulho, *mailha ; (3)
a vogal que imediatamente as precede é sempre acentuada – ovelha e (4) forçam uma
sequência Vogal + Vogal Alta precedente para silabificar como um hiato – faúlha.
Como exposto acima, partindo-se da hipótese proposta por Wetzels (1997 e
2000) de que a lateral palatal é uma geminada fonológica, a sílaba que antecede o //
não pode ser pesada, já que a primeira parte da consoante palatal, que é uma consoante
dupla, já ocuparia a segunda posição da rima da sílaba imediatamente precedente.
Assim, “há, naquela sílaba, apenas uma posição disponível, que pode ser ocupada
somente por uma vogal” (WETZELS (2000, p. 11). Justamente por isso, quando há a
presença de uma Vogal + Vogal alta antecedendo o //, essas duas vogais nunca
formam um ditongo, mas sim um hiato, já que a presença de um ditongo tornaria pesada
a sílaba antecedente à lateral palatal.
Além disso, ainda segundo o autor, se // ocorre entre as duas últimas vogais de
uma palavra que seja pelo menos trissilábica, o acento nunca poderá pular a sílaba pré-
final (como em baunilha), pois, no Português do Brasil, uma palavra proparoxítona com
uma sílaba pesada pré-final não existe (*bágalho, *pífilho, *ovelha). Dessa forma, a
vogal que antecede o // será sempre acentuada.
A dupla articulação de // é também reconhecida por Couto (1997) quando
toma por base a estrutura silábica das proparoxítonas em português. Segundo sua
interpretação, que se assemelha a um dos argumentos apresentados por Wetzels (2000),
a não ocorrência de segmentos palatais [, , , ] em onset da última sílaba de
proparoxítonos se deve ao fato de serem segmentos complexos, tornando pesada a
sílaba antecedente dos vocábulos nos quais ocorrem, o que não acontece com a
penúltima sílaba dos proparoxítonos que não pode ter rima ramificada conforme
*ábarco, *hálisto.
Para Couto (1997), essa restrição deve-se ao fato de esses segmentos não
existirem no latim e historicamente resultarem da fusão de mais de um segmento17
e/ou
se comportarem como segmentos complexos. Os usos (variáveis) de /j/ nos contextos de
17
Como em /lj/ /nj/.
51
// e //18
justificariam a natureza híbrida destes segmentos e seu comportamento
ambissilábico, por comparação com formas como ceia, na qual o segmento /j/ se bifurca
e torna pesada a sílaba antecedente.
Silva (1997, p. 60), além de considerar a lateral palatal um segmento geminado,
uma vez que apresenta dois Tempos, também a visualiza como um segmento complexo,
por apresentar um traço que expressa uma articulação maior, relacionado ao Nó Ponto
de Articulação da consoante, e uma articulação menor, expressa pelos traços do Nó
Vocálico.
Segundo Hernandorena (1997, p. 687), “é possível postular que a diferença
existente entre as soantes alveolares [l] e [n] e suas contrapartes palatais [] e [] seja
de natureza estrutural, no sentido de que as primeiras consistem em segmentos simples
e as segundas, em segmentos complexos”. A figura 2 mostra a representação de //,
segundo Hernandorena (2000, p. 330), a qual aponta ser essa soante palatal uma
“consoante complexa, com uma articulação primária consonantal e uma articulação
secundária vocálica19
”:
Figura 2: Representação de //, segundo a Fonologia Autossegmental
Fonte: Hernandorena (2000, p. 330)
18
Em vocábulos como [´fiju] „filho‟e [bãja] „banha‟. 19
“A articulação secundária é caracterizada, na geometria dos segmentos, pelo nó Vocálico, ligado sob
nó Ponto de Consoante (PC)” (HERNANDORENA, 2000, p. 329).
52
Embora essa proposta não seja a mais apontada em estudos de muitos outros
pesquisadores – que consideram // e // consoantes simples – a autora ratifica sua
opinião ao apresentar seu estudo sobre essas consoantes, baseando-se em dois corpora
diferentes: um formado por 23 adultos (extraído do Banco de Dados VARSUL) e outro
formado por 130 crianças entre 2 e 4 anos (extraído do Banco de Dados sobre Aquisição
da Fonologia do Português - AQUIFONO (HERNANDORENA, 2000).
De acordo com Hernandorena (2000), os dados, obtidos a partir do corpus de
crianças, registram a ocorrência de seis variantes para a lateral palatal ([], [l], [j], [lj]
[li], ). Esse alto índice de variação poderia apontar não só caminhos para o
entendimento do processo de aquisição da fonologia como também determinar o status
fonológico dessa consoante.
Para a autora, a partir do modelo não-linear de Clements & Hume (1995), é
possível defender a ideia de que a aquisição da fonologia é um processo gradual, no
qual a criança vai adquirindo sons da língua à medida que vai ligando os traços à
estrutura que os caracteriza. Pensando-se na soante lateral palatal, essa construção
gradual do segmento pode ser explicitada se considerar-se o // como uma consoante
complexa.
A existência dessa dupla articulação em // é capaz de explicitar as
alternâncias que o segmento evidencia nas diferentes etapas de sua aquisição.
Nas etapas iniciais de aquisição, quando não é apagada, a lateral é realizada
como [l] (significativamente até 2:4 – 2:5) ou como [j] (significativamente
até 2:8 – 2:9). Quando a criança, em lugar da lateral palatal, emprega [l],
revela não estar ligando, à estrutura do segmento, a constrição secundária
vocálica, apresentando apenas a constrição consonantal. (...) Ao realizar o
glide coronal [j] em lugar da lateral palatal, a criança mostra não estar
ligando a constrição consonantal primária do segmento, apresentando apenas
constrição vocálica. (HERNANDORENA, 2000)
Continuando seus estudos, a autora observa que o uso da variante [lj], em etapas
mais avançadas do processo de aquisição da linguagem, é decorrente de um processo de
espraiamento da articulação secundária de [] para o nó Ponto de Consoante (PC) do
segmento vocálico subsequente. Já o uso de [li] no lugar da lateral palatal – que
apresentou baixa significância nos dados de aquisição da língua, talvez por resultar de
uma operação fonológica mais complexa, que acarreta a ressilabação da palavra –
constitui, segundo a autora, uma forma derivacional posterior à do emprego de [lj], pois
53
“implica a realização de um núcleo silábico e, portanto, resulta do acréscimo de um
tempo fonológico no correspondente tier prosódico” (HERNANDORENA, 2000, p.
340).
A análise variacionista, com corpus de adultos, empreendida pela autora está em
consonância com a análise do processo de aquisição desses segmentos, já que as duas
variantes de [] registradas ([j] e [lj]) ratificam o status da lateral palatal como
consoante complexa.
No que diz respeito aos condicionamentos linguísticos das variantes
apresentadas, observou-se que o ponto de articulação tanto da vogal precedente quanto
da vogal subsequente influenciaria a concretização das variantes de //. Quando a vogal
seguinte é [+coronal] e [+ alta] há o emprego, de forma categórica, da consoante
alveolar [l] e quando a vogal anterior ou posterior é [+coronal] favorece o emprego de
outro(s) segmento(s) em lugar da lateral palatal.
Esses resultados ratificariam mais uma vez a ideia de // ser uma consoante
complexa, já que segundo McCarthy (1988, p. 88 apud op. cit.), “elementos adjacentes
iguais são proibidos”. A vogal coronal, seja como contexto antecedente ou subsequente,
inibe a presença das soantes palatais, pois, considerando-se esses segmentos complexos,
atribui-se-lhes o nó Vocálico, o qual apresenta, sob seu domínio, todos os traços
caracterizadores da vogal [i]. “Portanto, uma vogal [coronal] precedente e/ou seguinte
apresenta traços adjacentes iguais exatamente no tier [coronal] sob o nó Ponto de Vogal
(PV)” (HERNANDORENA, 2000, p. 341).
Assim, ao se aplicar a regra proposta por McCarthy (1988, p. 88), ocorre o
desligamento do nó Vocálico da consoante complexa, fazendo resultar a consoante
simples [l], para a lateral palatal, e a consoante simples [n] para a nasal palatal (fi[l]inho
e compa[n]ia).
Machado-Soares (2008), confirmando os estudos de McCarthy (1988),
constatou que a aplicação de regras, que produz a alternância de segmentos, é
favorecida por segmentos com traços primários idênticos adjacentes, pela estrutura
silábica, e por pertencerem à mesma classe natural. As restrições à aplicação de regras
podem estar relacionadas à escala de sonoridade, à soância e à ambiguidade.
54
Freire (2011) constatou que o fenômeno da variação da lateral palatal pode ser
entendido, de acordo com os aspectos abordados pela Geometria de Traços, da seguinte
maneira:
(1) [ ~ l] – como o desligamento da articulação menor (nó vocálico) do
segmento //, com cancelamento de um tempo e a criação do segmento simples
/l/;
(2) [ ~ j] – como desligamento da articulação maior do // do traço [coronal],
também com o cancelamento de uma das unidades de tempo do fonema // e,
posteriormente, a criação do segmento simples /i/ que, no processo de
ressilabificação será caracterizado como [j];
(3) [ ~ ] – como desligamento da raiz, com o cancelamento das duas
unidades de tempo existentes no segmento na lateral palatal e,
consequentemente, o seu desaparecimento nos níveis melódico e métrico.
3.3 No Português Europeu
Como foi dito no início deste capítulo, os estudos variacionistas sobre a lateral
palatal na fala do Português Europeu são extremamente escassos. Sendo assim, até o
momento, só foram encontrados os relatos que serão arrolados a seguir.
De acordo com Madureira (1999), o português falado em Portugal é,
curiosamente, a única língua latina que não registra, em momento algum de sua história,
uma transformação da lateral palatal para a semivogal palatal. Os únicos registros de
vocalização ocorrem, de acordo com Leite de Vasconcelos (1901, p. 158-200 apud op.
cit.), no português falado no Brasil; em outras colônias portuguesas; nos dialetos
crioulos do Ceilão, de Singapura, do arquipélago do Cabo Verde e da Ilha de São Tomé
e num codialeto do português, o guadramilês. Por corresponder esse codialeto a uma
região fronteiriça à Espanha, o fenômeno tende a ser interpretado como influência
espanhola.
Num estudo que tinha por objetivo observar a variação dialetal no território
português, fazendo conexões com o Português do Brasil, Segura (2003) demonstra que
55
nos dialetos madeirenses ocorre a palatalização de /l/, quando precedido de [i] ou [j], ou
seja, a realização como [], como em aquilo [akiu], vila [vi] ou vai lá [vaja].
Embora essa variação não esteja presente no português continental, pareceu
oportuno mostrar que, em outra variedade do português, a palatalização se mostra
produtiva.
56
4 TRAJETÓRIA DOS ESTUDOS SOBRE AS MUDANÇAS SONORAS
Por sua complexidade, sobretudo no que diz respeito à propagação das
alterações, os estudos sobre as “mudanças sonoras” distribuem-se, dentre outras
possibilidades, por três vertentes principais: os que postulam uma difusão gradual no
plano fonético e abrupta no lexical; os que alegam sua disseminação paulatina pelos
itens lexicais e repentina no plano sonoro; e os que argumentam a favor de que, em
ambos os níveis, a mudança se dá gradualmente.
Assim sendo, nesta seção, pretende-se apresentar, em ordem cronológica, as
principais vertentes da linguística que levam em conta o item lexical como
condicionador da regra variável. Para tanto, parte-se da proposta Neogramática – que
apesar de não colocar o léxico no centro dos seus estudos, de certa maneira, o inclui nas
análises ao afirmar que as mudanças sonoras são foneticamente graduais e lexicalmente
repentinas (cf. item 4.1) –; em seguida, apresentam-se as propostas Difusionista e da
Fonologia de Uso – teorias que pressupõem que a palavra é responsável pelo processo
de mudança.
4.1 A proposta Neogramática
Segundo Oliveira (1991 e 2003), um dos maiores avanços da linguística foi, sem
dúvida, a hipótese neogramática. Assim, em termos gerais, pode-se dizer que a grande
precursora das análises referentes às mudanças sonoras foi a Escola Neogramática.
Desenvolvida na Alemanha, ao fim do século XVIII, essa importante vertente
linguística recebe influências diretas das chamadas leis físicas e químicas de Darwin e
Newton. Além disso, de acordo com Faraco (2006), com a evolução das pesquisas de
caráter histórico-comparativo sobre as relações sonoras encontradas entre as línguas
indo-europeias, seguidores do pensamento em questão (Grimm e Verner) concluíram
que as aparentes coincidências verificadas entre as línguas observadas, apresentavam-se
de forma tão regular que poderiam ser interpretadas como leis permanentes. Assim
sendo, surgem as chamadas “leis fonéticas” que “agem cegamente, com cega
necessidade” sobre todos os itens de um sistema de comunicação. (OSTHOFF apud
SILVA NETO, 1979, p. 49)
57
A posição dos neogramáticos com relação à mudança sonora pode ser sintetizada
em três axiomas, segundo Oliveira (1991 e 2003):
(1) As mudanças sonoras não têm exceções;
(2) As mudanças sonoras são condicionadas apenas por fatores fonéticos;
(3) As mudanças sonoras são foneticamente graduais e lexicalmente repentinas.
O primeiro deles é claramente apresentado por Osthoff & Brugmann (1878)
(apud Oliveira, 2003). Na prática, os contra-exemplos que surgiam eram tratados pelos
neogramáticos como casos devidos à analogia. Ou seja, estruturas gramaticais que
porventura tivessem sido destruídas por alguma mudança sonora (regular) poderiam ser,
posteriormente, restauradas pela analogia a outras formas.
O segundo axioma da hipótese neogramática, por sua vez, foi contestado pelo
modelo gerativo clássico, segundo o qual a fonologia pode ser afetada pela sintaxe e
pelo léxico. O terceiro, por outro lado, não aparece enunciado desta forma nos trabalhos
dos neogramáticos. É, na verdade, uma inferência que se faz a partir de (1) e (2). Em
outras palavras, pode-se dizer que o modelo neogramático irá prever que todas as
palavras que contenham um determinado som, num determinado contexto, serão
modificadas do mesmo modo e ao mesmo tempo.
Cristófaro-Silva (2001) ratifica o que foi apresentado por Oliveira (1991) ao
mencionar que a proposta neogramática assume que uma mudança sonora afeta todas as
palavras relevantes de uma língua, ou seja, palavras que satisfaçam as condições
estruturais que regem a implementação da mudança. De acordo com a autora, por
condição estrutural entende-se o ambiente ou contexto que condiciona a mudança
sonora em questão. “Na perspectiva neogramática assume-se que, se numa determinada
língua, o som [o] átono final muda para [u], então, toda e qualquer palavra que tenha [o]
átono final sofrerá uma mudança e passará a ter [u] átono final” (CRISTÓFARO-
SILVA, 2001, p. 210). Segue-se com isso que a mudança sonora é regular e afeta todos
os itens lexicais da língua (desde que as condições específicas que regem as mudanças
sejam satisfeitas). Obviamente, as mudanças sonoras ocorrem e são implementadas
durante um período de tempo, fixando-se uma das formas que estavam em concorrência.
Faraco (2006) reitera que o modelo neogramático se concentra no contexto
estrutural em que o segmento alterado se insere, defendendo que, se um ambiente é
motivador de uma alteração fonética, esta se dá de maneira paulatina, mas, uma vez
atingida sua plenitude, todos os itens que apresentam o mesmo som e ambiente se
58
submetem, abruptamente, ao mesmo processo. Em outras palavras, explicando as
mutações sonoras a partir de fatores de ordem puramente linguística, o pensamento
neogramático postula que tais processos se dão de maneira gradual no plano fonético e
de forma repentina no âmbito lexical. A mudança fonética, assim, por seu caráter
regular, se comprova nos fonemas de uma língua, não atuando palavra por palavra, mas
se aplicando a todas aquelas que apresentem o contexto propício à sua propagação.
Não se pode, no entanto, desprezar o fato de que nem sempre todos os itens de
um mesmo sistema, regidos sob as mesmas condições contextuais, são atingidos por
uma determinada mudança. Com o objetivo de esclarecer essas evidências, a
perspectiva neogramática avalia tais casos como resultantes de analogia, de
empréstimos lexicais, ou, ainda, como ocorrências em que não se esclareceu ou
descobriu a regularidade envolvida. Assim sendo, através da consideração concomitante
de regularidades e irregularidades sistemáticas, muitas foram as conquistas da Escola
em pauta, sobretudo no que concerne às línguas românicas. Mais precisamente, através
de abordagens histórico-comparativas entre esse grupo de línguas que se originam do
latim se aprofunda o conhecimento sobre as semelhanças e distinções interlinguísticas.
Assim, nas palavras de Faraco (2006, p. 134):
É por meio [do método comparativo] que se estabelece o parentesco entre
línguas. O pressuposto de base é que entre elementos de línguas aparentadas
existem correspondências sistemáticas (e não apenas aleatórias ou casuais)
em termos de estrutura gramatical, correspondências estas passíveis de
serem estabelecidas por meio duma cuidadosa comparação. Com isso,
podemos não só explicitar o parentesco entre línguas, como também
determinar, por inferência, características da língua ascendente comum de
um certo conjunto de línguas.
A perspectiva neogramática, entretanto, recebeu, e ainda recebe, inúmeras
críticas, não só pelo seu caráter generalizante e limitado, mas sobretudo devido a duas
das suas temáticas principais, a saber: (1) a lei fonética e (2) a maneira como as
mudanças sonoras se difundem.
No que diz respeito às leis fonéticas, desde suas bases, a Escola neogramática foi
criticada, por entender essas leis como um princípio que somente conhece
condicionamentos fonéticos e que se aplica, sem exceção, a todas as palavras que
satisfaçam igualmente as condições da mudança. Assim, pode-se dizer que o “centro das
59
polêmicas foi o conceito de lei fonética, compreendida como um princípio imamente de
aplicação cega e sem exceções” (FARACO, 2006, p. 150).
Como pondera Câmara Jr. (1989, p. 252), embora a lei fonética seja um
instrumento essencial na pesquisa diacrônica – “porque, baseados em uma lei
suficientemente comprovada, pode-se estendê-la a novas formas, nas condições ali
previstas, e afastar explicações que não se coadunam com ela”, – ela não é, como a lei
física, um instrumento de previsão científica, já que apenas formula um evento do
passado, ocorrido numa região limitada e em condições muito complexas, que
dificilmente se apresentarão todas juntas outra vez.
A questão de como se processa a mudança sonora, isto é, se ela ocorre de modo
abrupto, atingindo todas as palavras ao mesmo tempo, ou de modo lento, atingindo
progressivamente as palavras, foi um dos pontos centrais de debates e polêmicas
posteriores (cf. LABOV, 1981). Sem negar, em princípio, a existência de regularidade
na mudança, os linguistas que se opunham aos neogramáticos não aceitavam o caráter
categórico das leis fonéticas, ou seja, não aceitavam que as mudanças se espalhassem
por toda a comunidade e por todos os itens lexicais de modo totalmente uniforme.
Com base em estudos empíricos (principalmente dialectológicos),
mostraram esses linguistas que uma unidade sonora pode mudar de maneira
diferente duma palavra para outra, o que significa que a expansão das
mudanças é lenta, progressiva e diferenciada tanto no espaço geográfico,
quanto no interior do vocabulário, sendo isso decorrência do fato de as
condições de uso em que cada palavra se encontra não serem idênticas.
(FARACO, 2006, p. 150-151)
Nesse sentido, a fundamentação de grande parte das defesas contrárias a tal
pensamento parece não desmerecer a metodologia, corroborando a proposição de
Bloomfield (1933, apud FARACO, 2006) que, grosso modo, alega que o debate se deve
meramente ao emprego de uma terminologia inadequada. O termo lei, segundo
Bloomfield, nunca poderia ser entendido como um enunciado absoluto, uma vez que se
estava tratando de fenômenos históricos. Além disso, o fato de tais leis não admitirem
exceção, de acordo com o linguista, “era um modo inexato de dizer que fatores não
fonéticos, tais como a frequência ou o significado das palavras, não interferiam na
mudança sonora” (cf. FARACO, 2006, p. 148)
A respeito da forma como as mudanças sonoras se propagam pelas diversas
palavras que compõem um inventário linguístico, a corrente que mais se contrapôs ao
60
pensamento neogramático foi a dialectologia, que se firmou em finais do século XIX e
teve na geografia linguística o principal método de análise. Jules Gillierón, considerado
o principal expoente desse método, afirmava que cada palavra tem sua própria história.
Contemporânea ao modelo em discussão, essa metodologia proporcionou novas
perspectivas de análise, almejando estabelecer os diversos falares que um mesmo
sistema de comunicação engloba, com base em entrevistas com indivíduos residentes
em distintas áreas. Para tanto, realiza pesquisas empíricas, que antes de desmerecer seus
contemporâneos e precursores, acrescentam considerações, englobando desde um
trabalho de campo em busca dos informantes adequados até a observação da fala em uso
por diferentes sujeitos das mais variadas localidades de uma mesma região.
Sendo os seres humanos dotados de linguagem e as situações comunicativas em
que se inserem extremamente complexas, as línguas e suas mudanças,
consequentemente, também o são. Por essa razão, postular leis que atinjam todos os
itens, na fala de todos os indivíduos e nos mais variados contextos interativos parece
inadequado, sendo mais viável entender que, também no nível lexical, tais alterações
sejam graduais. Para Faraco (2006, p. 151):
Adotar essa concepção não significa defender o caráter usual, fortuito, da
mudança; significa, isto sim, mostrar que a realidade da mudança é mais
complexa do que sugeria a formulação dos neogramáticos. Mais complexa
porque tem a ver com o contexto concreto em que a língua é falada, contexto
esse que de forma alguma é uniforme e homogêneo.
Embora sejam vários os linguistas que participaram da crítica às leis fonéticas
dos Neogramáticos, segundo Faraco (2006), foi Hugo Schuchardt, certamente, o mais
importante. Esse linguista ao se opor ao conceito de lei fonética, chamou a atenção para
a imensa gama de variedades de fala existente numa comunidade qualquer, variedades
essas condicionadas por fatores como o sexo, a idade, o nível de escolaridade do falante.
Foi considerando esse quadro heterogêneo que Schuchardt buscou compreender o
processo de mudança linguística.
Dessa forma, ainda de acordo com Faraco (2006, p. 152), Schuchardt
vai introduzindo, no correr do século XX, um tratamento em que o contexto
social e cultural da língua (uma língua que tem, portanto, falantes) é
condicionante básico da variação e, dentro dela, da mudança. É a trilha da
dialectologia e, mais recentemente, da sociolinguística.
61
Assim, apesar de muitos estudos se utilizarem do modelo neogramático de
análise linguística e de serem inúmeras as suas contribuições ao conhecimento da
dinâmica das línguas, a Escola Neogramática, por seu caráter extremamente
generalizante e restrito, recebeu e, ainda recebe, inúmeras críticas.
4.2 A proposta Difusionista
Dentre as muitas correntes que se opuseram às proposições neogramáticas, como
apontado no item anterior, destaca-se o Difusionismo Lexical, por entender, que as
palavras têm suas pronúncias mudadas por meio de avanços discretos, perceptíveis – ou
seja, foneticamente abruptos –, mas individualmente através do tempo – ou seja,
lexicalmente graduais (LABOV, 1981). Nessa perspectiva, uma mudança ocorre
inicialmente em algumas palavras e propaga-se para outras com estrutura sonora
semelhante.
Assim sendo, essa teoria tem por objetivo não só (a) responder como uma
mudança se inicia, como também (b) explicar como uma mudança se propaga na língua
e (c) defender que formas lexicalizadas e o comportamento oscilante das restrições que
regulam a boa formação da estrutura sonora são evidências para o desencadeamento da
variação que será implementada lexicalmente.
Vale ratificar que, segundo o Modelo da Difusão Lexical, a mudança linguística
é aplicada a algumas palavras e pode atingir ou não, o léxico como um todo. Além
disso, para essa teoria é a palavra que muda em relação a sons específicos e as
mudanças não são condicionadas por regras fonológicas, mas por aspectos lexicais, tais
como a frequência da ocorrência e a familiaridade da palavra, que fazem com que um
item lexical se torne mais ou menos vulnerável à mudança.
Apesar de reconhecerem a existência de mudanças linguísticas regulares, os
defensores da proposta difusionista, portanto, discordam do modelo neogramático
quanto à implementação lexical da mudança. Para eles, como já foi dito anteriormente,
transformações fonéticas não atingem todos os itens de uma língua ao mesmo tempo.
Dessa forma, tendo como unidade básica a palavra e não mais o fone, conforme a outra
corrente, o Difusionismo Lexical almeja resolver, de acordo com Labov (1981, p.270), a
trilha pela qual uma mudança linguística está caminhando para se completar.
62
De acordo com Oliveira (1991 e 2003), o modelo da Difusão Lexical surgiu, em
sua forma moderna, em meados da década de 1970, derivado, principalmente, dos
trabalhos de Wang e Cheng sobre o chinês.
Wang & Cheng (1977) dizem que o processo de mudança não opera em cima
dos sons, mas sobre palavras. Não negam que a mudança do som possa ser regular e,
quanto a isso, essa teoria não pressupõe menos regularidade do que o princípio dos
Neogramáticos. No entanto, segundo esses linguistas, a diferença entre os
neogramáticos e os difusionistas reside, sobretudo, na descrição do mecanismo da
mudança, ou seja, na maneira como a mudança é de fato implementada.
Ainda de acordo com os referidos linguistas, o modelo difusionista não recusa a
possibilidade de condicionamento fonético; o que ele faz é incorporar a possibilidade de
mudanças sonoras que não sejam foneticamente condicionadas. Para Wang & Cheng
(op. cit.), o modelo que ficou conhecido como a Teoria da Difusão Lexical é claramente
mais do que um princípio de funcionamento, é uma solução substantiva para o problema
da transição.
O estudo do chinês feito por Wang & Cheng (op. cit.) mostrou que as principais
hipóteses neogramáticas não poderiam se sustentar. Ou seja, (a) há exceções a
mudanças sonoras que não podem ser explicadas por analogia, (b) há cisões lexicais
substanciais que não podem ser explicadas em termos de condicionamento fonético e (c)
a existência da cisão lexical mostra não ser possível que todas as palavras tenham sido
afetadas ao mesmo tempo.
Outros estudos, como os de Krishnamurti e Labov, baseados no Modelo
Difusionista que, portanto, contestam as bases do modelo neogramático, ampliam os
trabalhos apresentados por Wang & Cheng.
Krishnamurti (1978) apresenta evidências bastante sólidas para a Difusão
Lexical no tratamento do deslocamento de consoantes apicais em sete línguas
dravídicas. Deslocamento de apicais é o nome dado a um processo pelo qual consoantes
alveolares e consoantes retroflexas, que ocorrem na posição C‟ nas raízes *(C‟)VC‟ _ V
do proto-dravídico, mudam de posição, produzindo estruturas do tipo (C‟) C‟ V _ num
grupo específico de línguas (telegu, kui, gondi, konda, kuvi, pengo e manda).
Segundo Krishnamurti (op. cit.), esta mudança afeta cerca de 12 itens no estágio
comum a essas línguas e, a partir daí, a regra se propaga de maneira diferenciada no
63
léxico dessas línguas, afetando os itens elegíveis em proporções diferentes em cada uma
delas: 72% em kui, 63% em kuvi, pengo e manda e, por volta de 20%, em gondi e
konda. Dessa forma, a mudança se espalha através do léxico e ainda se encontra em
progresso em algumas dessas línguas como, por exemplo, em kui e kuvi.
Ainda em seu estudo, Krishnamurti (op. cit. p. 16) indaga não só (a) “que tipo de
itens lexicais se tornam as primeiras vítimas de uma mudança de som20
” como também
se (b) “é a frequência dos itens lexicais que os torna mais vulneráveis à mudança do que
outros21
”. Além disso, chega bem próximo a uma resposta definitiva para essas questões
ao mencionar que “os dados das línguas dravídicas aqui apresentados parecem indicar
que os itens lexicais que estão registrando os primeiros vestígios de deslocamento apical
referem-se a conceitos fundamentais para a comunicação e a cultura dos grupos
tribais22
” (Id., p. 16).
Assim sendo, a partir dessas indagações, esse linguista apresenta dois fatores
como possíveis determinantes do grau de exposição das palavras a mudanças sonoras:
frequência e domínio semântico. Infelizmente, uma vez que os objetivos do artigo de
Krishnamurti eram outros, estas sugestões acabaram por não ser exploradas.
Depois das obras de Wang, Labov (1981) retoma as ideias do século XIX sobre
a mudança e tenta resolver o impasse entre os dois modelos (neogramático e
difusionista). Em vez de argumentar a favor de um deles, toma uma posição bastante
cautelosa, avaliando as descobertas de ambos e examinando as condições nas quais cada
um dos pontos de vista opostos é válido.
Com base na língua inglesa e reconhecendo a aplicabilidade de ambas as
vertentes aqui citadas, Labov (1981) decide, então, desenvolver duas listas,
mencionando, de um lado, os fenômenos que melhor seriam interpretados à luz do
pensamento neogramático e, de outro, aqueles em que seria mais adequado o emprego
de uma abordagem difusionista. Nesse sentido, afirma que alterações que remetem ao
alongamento ou abreviamento de vogais entre subsistemas devem ser interpretadas a
partir do modelo difusionista; ao passo que mudanças que aludem ao modo de
articulação das consoantes dentro de subsistemas reafirmam a tese neogramática. Por
outro lado, nos casos de ditongação e monotongação das vogais e de mudanças que
20
“What kind of lexical items become the early victims of a sound change?” 21
“or in their frequency, that makes them more vulnerable to change than others?” 22
“The Dravidian data presented here seem to show that the lexical items registering the earliest traces
of apical displacement refer to concepts fundamental to the communication and culture of the tribal
groups”
64
englobam o ponto de articulação das consoantes, percebe-se a atuação de princípios
restritos à ordem neogramática.
Em outras palavras, conforme pode ser visto acima, Labov (1981) tem por
objetivo uma distribuição paramétrica dos dois tipos de mudança, o que leva a um
paradoxo que ele mesmo questiona ao indagar como é possível que as duas vertentes
dos estudos sobre mudança (neogramática e difusionista) possam estar com a razão
(LABOV, op. cit. p. 304).
O próprio linguista responde à sua questão ao afirmar que é possível situar a
regularidade defendida pelo modelo neogramático em regras de “saída de nível baixo”,
enquanto que se efetiva a difusão na redistribuição de um grupo abstrato de itens
lexicais em outras classes abstratas (LABOV, op. cit, p. 304).
Os mesmos e outros questionamentos à categorização de Labov (1981) são
encontrados em algumas pesquisas desenvolvidas no Brasil, como as de Cristófaro-
Silva (2001), Oliveira 2003 e Ferreira (2011).
Cristófaro-Silva (2001), em seus estudos sobre alguns casos de variação sonora
no português brasileiro – tais como, vocalização da lateral anterior, palatalização de
oclusivas alveolares e quebra de encontros consonantais – faz algumas considerações
bastante pertinentes a favor da difusão lexical.
No que diz respeito à vocalização de /l/, a autora sugere que essa variação se deu
por difusão lexical. Assim sendo, segundo a linguista, algumas palavras começaram a
ser pronunciadas com [u] final e a mudança alcançou todas as palavras da língua (em
alguns dialetos). As evidências para essa afirmação seriam as formas lexicalizadas como
''gol/gous'' e o comportamento alternante em termos das restrições que regulam a boa
formação da estrutura sonora no PB (mel[ / x]o).
No que toca à palatalização de /t, d/, Cristófaro-Silva (op. cit.), também,
argumenta à favor da difusão lexical. Para a autora, a mudança de [t > t] e de [d > d]
foi implementada por difusão lexical e a evidência para isso, seria, como no caso
anterior, (1) a existência de formas lexicalizadas, como ''Pa[di]Cícero'' e (2) o
comportamento alternante, em termos das restrições que regulam a boa formação da
estrutura sonora no PB, como ocorre em “ele[ti]cista”.
65
Para explicar a quebra dos grupos consonantais, a autora, retoma o exemplo
“ele[ti]cista” – dado, anteriormente, para justificar a sua opinião a favor da difusão
lexical nos casos de palatalização de /t, d/. Cristófaro-Silva (op. cit.) salienta que, para
todos os encontros consonantais que resultaram nas formas que apresentam [ti, di], há
uma forma concorrente com [tri, dri]: ele[ti]cista/ele[tri]cista e pa[di]/pa[dri]. Assim,
para a autora, pode-se postular que há uma consoante abstrata que intervém entre o [t, d]
e o [i] e que bloqueia a palatalização: ele[t(r)i]cista e pa[d(r)i]. Essa proposta, porém,
ainda segundo a linguista, “resolve um problema de representação, mas não explica por
que e quando o tepe pode ser cancelado e nem como a implementação da mudança está
ocorrendo no português brasileiro atual” (cf. CRISTÓFARO-SILVA, 2001, p. 216).
De acordo com a autora, os resultados apresentados no seu trabalho, mostram
que os condicionamentos estruturais (como acento, segmento seguinte, posição na
palavra) não regulam o processo. Já os parâmetros extralinguísticos (como sexo, idade,
grau de instrução) parecem não favorecer nem bloquear o cancelamento do tepe em
encontros consonantais.
No caso de quebra de grupos consonantais, observam-se formas lexicalizadas
que violam a boa formação da estrutura sonora como [vr]ido (para „vidro‟) ou [dl]upa
(para „dupla‟) sendo que [vr] e [dl] não ocorrem (tipicamente) em início de palavra no
português. Por isso, a autora, mais uma vez, sugere que essa mudança, também, vem
sendo implementada por difusão lexical. A evidência viria de formas lexicalizadas,
como „[di]blar‟, „[di]blar‟ (driblar) ou „es[tru]po‟ (estupro) e do comportamento
alternante em termos das restrições que regulam a boa formação da estrutura sonora no
PB („vrido, dlupa‟).
Com pôde ser visto acima, a autora, seguindo a proposta da Difusão Lexical,
afirma que a mudança sonora se dá no nível da palavra, podendo se propagar (ou não)
para todo o léxico. Por isso, sugere que formas lexicalizadas são evidências para
desencadear uma variação que será implementada por Difusão Lexical. Além disso,
para a linguista, o comportamento alternante, em termos das restrições que regulam a
boa formação da estrutura sonora, indica a instabilidade da cadeia sonora e contribui,
também, para desencadear a mudança.
Em seu estudo sobre as vogais pretônicas no dialeto mineiro, Oliveira (2003, p.
617), reconhece a existência de resultados que apontam certa regularidade nas
alterações que corroborariam a perspectiva neogramática, mas propõe que “todas as
66
mudanças sonoras são lexicalmente implementadas”. Mais precisamente, ele não só
afirma a ausência de mudanças neogramáticas, com também decide delimitar que itens,
originalmente, seriam afetados pelas alterações, com base na seguinte fórmula geral:
“X Y/Z”
Nela, o fato de X ser um nome comum; de Z proporcionar um ambiente fonético
adequado para Y; e de X compor uma palavra atuante em contextos de fala informal,
favoreceriam, nessa ordem, as alterações fonéticas. Por outro lado, inibiriam o processo
de mudança sonora “nomes próprios, reação contrária por parte de uma classe social e
estilo de fala formais” (OLIVEIRA, 2003, p. 618). No que toca ao comportamento
peculiar de uma classe social, de maneira mais objetiva, o linguista acredita que o
mesmo proporcione um efeito retardatário no processo, mas não o impeça, admitindo
“uma proteção temporária a algumas palavras (não a todas, uma vez que a correção é
aplicada às palavras, não aos sons)” (OLIVEIRA, 2003, p. 619).
Para explicar melhor o efeito inibidor provocado pelos estilos de fala formais, o
autor menciona o trabalho de Madureira (1987). Em seu estudo sobre a lateral palatal,
Madureira (op. cit. apud OLIVEIRA, 2003, p. 619) mostrou que
a vocalização de //, que já reestruturou um conjunto específico de palavras
entre os falantes das classes mais baixas de Belo Horizonte, embora quase
ausente nos falantes das classes médias nos estilos formais, vai atingindo
estes mesmos falantes, como regra variável, e nas mesmas palavras que
conduziram à reestruturação entre os falantes das classes mais baixas,
através dos estilos informais de fala.
Assim, Oliveira (2003) finaliza suas considerações afirmando que, enquanto o
disparo de uma mudança deve ser concebido em termos abstratos, que justifiquem sua
razão de ser, sua implementação não pode ser movida das condições de uso.
Ferreira (2011), em seu estudo sobre a lateral palatal no corpus VARSUL,
verifica que, em apenas algumas palavras, há variação, e que, em termos de frequência,
existem índices muito discrepantes. Além disso, ainda acrescenta que palavras de
diferentes classes – verbos, substantivos, adjetivos –, tamanhos – monossílabas,
dissílabas, trissílabas e polissílabas – e constituição – derivadas ou não – estão sujeitas à
variação, inviabilizando uma interpretação fonológica e/ou morfológica.
A autora ainda observa que as três variantes da lateral palatal, inicialmente
examinadas (despalatalização, apagamento e vocalização), distribuíram-se pelos dados
67
conforme a frequência do item lexical. Além disso, para a linguista, somente onze itens
representam mais da metade de todas as ocorrências verificadas no estudo: “são onze
itens lexicais que representam juntos 773 ocorrências da amostra que possui um total de
1.171 dados” (FERREIRA, 2011, p. 106).
Esse resultado, de acordo com a autora, tornou frágil a análise linguística
empreendida, diante da representatividade que o item lexical de alta frequência possuía
frente o total de dados do corpus. Isso, para Ferreira (2011), ficou mais claro ao
observar o resultado obtido por meio do programa estatístico – apenas as variáveis
extralinguísticas sexo e idade não foram relevantes –, já que, segundo Díaz-Campos e
Ruiz Sánchez (2008 apud FERREIRA, 2011), quando a maioria dos contextos é
favorável, aparentemente, não há padrões fonológicos claros.
Assim sendo, Ferreira (2011) conclui o seu estudo afirmando que, pelo fato de
haver uma frequência muito alta de itens lexicais específicos, a hipótese de a variação
poder estar sendo implementada por meio da difusão lexical se confirma. A autora
acrescenta, no entanto, que não recusa a possibilidade de condicionamento fonético,
mas incorpora a possibilidade de mudanças sonoras que não sejam foneticamente
condicionadas e que a variação pode estar relacionada ao item lexical.
4.3 A Fonologia de Uso
Segundo Bybee (2007), a difusão lexical – o modo como uma mudança sonora
se dissemina através do léxico – ainda foi pouco explorada como uma fonte em
potencial de evidências sobre a forma fonológica de representações lexicais. Para essa
linguista, no entanto, há evidências de que mudanças sonoras são ao mesmo tempo
fonetica e lexicalmente graduais e que o índice percentual de ocorrências de palavras
que se submetem à mudança sonora está intimamente correlacionado com a frequência
com que elas aparecem no discurso. A autora argumenta, ainda, que “efeitos de
frequência na mudança sonora podem ser explicadas ao se assumir que representações
cognitivas são afetadas por qualquer sinal de uso23
”. (BYBEE, op. cit., p. 199)
Assim, no modelo da Fonologia de Uso proposto por Bybee (2003, 2007), a
representação fonológica é compreendida como uma instância de generalização dentro
23
“frequency effects in sound change may be explained by assuming that cognitive representations are
affected by every token of use.”
68
de um processo dinâmico em que o sistema se organiza a partir da experiência do(s)
indivíduos(s). Bybee (2003, p. 1) propõe que o modo como a língua é usada afeta o
modo como ela é representada e estruturada e, além disso, acrescenta que “a frequência
com a qual palavras individuais ou sequências de palavras são usadas e a frequência
com a qual certos padrões se repetem, na língua, afetam a natureza da representação
mental e, em alguns casos, a verdadeira forma fonética de palavras”24
.
De acordo com Bybee (2003, p.5), excluir fatores de uso, em um estudo, é
ignorar a relação potencial entre representação e uso. Assim,
É certamente possível que a forma como a linguagem é usada afeta a forma
como ela é representada cognitivamente e, portanto, a forma como ela é
estruturada. Na verdade, uma boa quantidade de progresso na morfologia e
na sintaxe tem sido feita ao explicar fenômenos específicos a partir
simplesmente desse pressuposto. Morfemas gramaticais se desenvolvem de
morfemas lexicais em construções particulares através de aumento na
frequência de uso e através da extensão do uso a mais e mais contextos.25
(BYBEE, op. cit., p.5)
Para a Fonologia de Uso, há uma estreita relação entre variação linguística,
frequência de utilização das palavras na comunicação e memória fonética do indivíduo,
o qual formaria sua gramática internalizada através do uso. Assim sendo, a
categorização mental das formas – fones, palavras, sintagmas – ocorreria no uso.
Pode-se dizer que a Fonologia de Uso proposta por Bybee (2003, 2007) defende
um Network Model, modelo de estocagem das palavras na mente do falante, que tem
como princípios básicos as seguintes diretrizes:
(1) a experiência afeta as representações linguísticas, isto é, o léxico mental
atribui diferentes representações a palavras mais ou menos frequentes no uso cotidiano,
de modo que as mais frequentes são acessadas com mais facilidade; (BYBEE, op. cit.,
p. 6)
(2) as unidades linguísticas são representadas no léxico mental da mesma forma
que as unidades não-linguísticas; (BYBEE, op. cit., pp. 8-9)
24
“the frequency with which individual words or sequences of words are used and the frequency with
which certain patterns recur in a language affects the nature of mental representation and in some cases
the actual phonetic shape of words.” 25
“It is certainly possible that the way language is used affects the way it is represented cognitively, and
thus the way it is structured. In fact, a good deal of progress in morphology and syntax has been made in
explaining specific phenomena by making just this assumption. It has been shown that syntactic
structures are the result of the conventionalization of frequently used discourse, and that grammatical
morphemes develop from lexical morphemes in particular constructions through increases in the
frequency of use and through extension in use to more and more contexts.”
69
(3) a estocagem lexical inclui informações redundantes sobre as diferentes
formas de pronunciar a mesma palavra e até sobre o contexto situacional em que ela foi
utilizada; (BYBEE, op. cit., p. 9)
(4) a frequência é um dos artifícios de que o léxico dispõe para categorizar itens
léxicos. (BYBEE, op. cit., p. 10)
Vale ressaltar que Bybee (2003 e 2007) diferencia dois tipos de frequência:
token frequency e type frequency. A token frequency é a quantidade de vezes que uma
unidade – geralmente uma palavra – ocorre em um determinado corpus. Já a type
frequency é a frequência de um determinado padrão no dicionário da língua.
Assim, de acordo com Bybee (2007, p. 7), a Fonologia de Uso supõe um estudo
da língua em que “léxico e gramática são entrelaçados de forma específica e geral26
”. A
autora salienta, ainda, que a “frequência tanto de type como de token (...) passaram a ser
considerados fatores importantes na estruturação de sistemas linguísticos27
” e que, em
termos de produtividade, a type frequency é determinante, porque, se um certo padrão é
altamente frequente na língua, acaba por ser aplicado a novos itens.
Bybee (2002) reitera, ainda, a ideia de que, a depender do fenômeno linguístico
analisado, há uma relação entre os termos alterados pela mudança sonora e o emprego
frequente dos mesmos e de que esse último fator deva ser observado de maneira
concomitante com o ambiente de uso. O grande diferencial da sua proposta, entretanto,
está na potencial conjugação entre aspectos de ordem neogramática e difusionista em
uma nova perspectiva que enfatiza o léxico.
Segundo esse modelo, alterações motivadas por elementos fonéticos não só
atingem, primeiramente, as palavras mais frequentes, como também são mais bem
esclarecidas se a disseminação da transformação é observada como paulatina no nível
lexical. Assim, para a autora, valoriza-se o emprego em detrimento do ambiente
fonético.
De acordo com essa perspectiva, conforme os itens sejam repetidos nas práticas
comunicativas dos sujeitos, falante e/ou ouvinte constroem representações cognitivas
dos termos, em uma permanente reformulação do nível lexical em grupos menores.
Dessa forma,
26
“lexicon and grammar are interwoven as are the specific and the general” 27
“both type and token frequency (…) have been found to be factors important to the modeling of
linguistic systems”
70
todas as variantes fonéticas de uma palavra são armazenadas na memória e
organizadas em um grupo: exemplares que são mais similares estão mais
próximos uns dos outros do que aqueles que não são similares, e exemplares
que ocorrem frequentemente são mais fortes do que os menos frequentes (...)
Exemplares repetidos dentro de um grupo vão se tornando mais fortes, e
aqueles usados menos frequentemente podem definhar com o passar do
tempo28
. (BYBEE, 2002 p. 271)
Para Bybee (2003, p. 6), a força lexical das palavras pode mudar conforme elas
são mais ou menos usadas em diferentes contextos. Por isso, como já foi dito antes,
segundo a linguista, palavras e frases de alta frequência têm representações mais fortes,
uma vez que são mais facilmente acessadas. Já palavras de baixa frequência são mais
difíceis de serem acessadas e podem se tornar tão fracas de modo a serem esquecidas.
A partir das situações interativas vivenciadas pelo falante, registram-se em sua
memória os efeitos de uma mudança sonora gradual nos itens lexicais por ele
empregados e a ele dirigidos. Em decorrência disso, os termos mais usuais, isto é,
aqueles em que a busca é mais recorrente, são selecionados de maneira automática em
suas experiências dialógicas. Consequentemente, as transformações que incidem sobre
os termos mais corriqueiros são produto não só dessa automática aplicação, mas
também dos aspectos relacionados à facilidade articulatória atingida com a fluência
discursiva. (BYBEE, 2002, p. 277-287)
Vale destacar, entretanto, que, apesar de ter como parâmetro principal a
frequência com que um termo atua na oralidade, o modelo em pauta não só alude à
presença de uma alternância fonética e de uma provável alteração em uma instância
mais elementar da língua, como também indica que tais transformações repercutem,
direta ou indiretamente, em um plano linguístico superior. Assim sendo, a variação e a
mudança, de acordo com Bybee (2002, p. 287) não são externas ao léxico e à gramática,
mas inerentes a ambos. A mudança sonora não é uma regra adicional – algo que
acontece no nível superficial sem um efeito nas áreas mais profundas da gramática. Pelo
contrário, as representações lexicais são afetadas no início da mudança. De fato, elas
fornecem um registro da mudança em andamento ao marcar os detalhes dos dados
fonéticos experimentados.
28
“Thus all phonetic variants of a word are stored in memory na organized into a cluster:exemplars that
are more similar are closer to one another than to ones that are dissimilar, and exemplars that occur
frequently are stronger than less frequent ones. (…) Repeated exemplars within the cluster grow
stronger,and less frequently used ones may fade over time.”
71
Dessa forma, para Bybee, não basta que um item lexical seja frequente para que
se verifique certa alteração segmental. Paralelamente a esse aspecto, é fundamental que
o segmento se encontre em um ambiente fonético propício à alteração.
Assim sendo, conforme o exposto, a autora sugere que sejam unidas as
evidências das descobertas realizadas a partir de estudos de cunho sociolinguístico –
como os fatores estruturais e/ou extralinguísticos que controlam a variação – aos
estudos que tem como princípio teórico o modelo baseado em uso. (cf. BYBEE, 2007,
p. 199)
72
5 ASPECTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS
5.1 Fundamentação teórica
5.1.1 A Sociolinguística Variacionista
Antes de tecer considerações sobre a Sociolinguística Variacionista strictu
sensu, cabe observar que, no âmbito da Linguística, se detectam duas linhas principais
de análise: as de cunho essencialmente estrutural e as que levam em conta aspectos
sociais relativos às comunidades de fala.
Segundo Calvet (2002), a linguística moderna nasceu da vontade de Ferdinand
de Saussure de elaborar um modelo abstrato, a língua, a partir dos atos de fala. Seus
ensinamentos constituem o ponto de partida do estruturalismo em linguística e, apesar
de algumas passagens encontradas no Curso de Linguística Geral – escrito
postumamente pelos seguidores de Saussure – indicarem que a língua é a parte social da
linguagem ou que a língua é uma instituição social, nele se considera que a linguística
tem por objetivo a língua considerada em si e por si mesma. Sendo assim, “Saussure
traçava uma nítida separação entre o que lhe parecia pertinente, a língua em si mesma, e
o resto”. (CALVET, 2002, p. 11)
Esse ideal saussureano foi seguido por muitos pesquisadores, como Bloomfield,
Hjelmslev, Trubetzkoy, Chomsky. Todos esses linguistas, elaborando teorias e sistemas
de descrições diversificados, concordavam que o seu objeto de estudo deveria ser a
estrutura abstrata e tudo que não fizesse parte dela deveria ser descartado. Chomsky, por
exemplo, preocupou-se em descrever a estrutura da língua com base em conceitos como
o de gramática interna, de caráter abstrato e homogêneo, e, inclusive, introduziu a noção
de falante ideal, resultado de evidente abstração linguística.
O estruturalismo, na linguística, se recusa, portanto, em considerar o que existe
de social na língua. Já as análises de cunho sócio-cultural levam em conta a
heterogeneidade de usos a que uma língua é submetida e valorizam a dinâmica com que
ela é utilizada pelos falantes, imersos em ininterruptas e inúmeras redes de relações
sociais, culturais e ideológicas. Assim, como afirma Lucchesi (1998, p. 185), “o objeto
de estudo da linguística deixa de ser um sistema autônomo e sem história, para se tornar
um produto do processo histórico de constituição da língua”.
73
De acordo com Silva-Corvalán (1989) existem, também, outras diferenças entre
as duas mencionadas linhas da linguística. Enquanto, nas análises de cunho estrutural,
por exemplo, a intuição dos falantes e os tradicionais juízos de aceitabilidade tendem a
ser considerados como base de dados, nas de natureza sociolinguística, tais aspectos não
são muito valorizados, pois nem sempre refletem o que realmente é usado e sabido
pelos falantes.
Outra diferença entre o estruturalismo e a sociolinguística diz respeito à
interpretação do fator tempo. Os estudos estruturalistas tendem a focalizar em separado
a sincronia e a diacronia, já os de cunho sociolinguístico, ao trabalhar com as noções de
tempo real e de tempo aparente, tratam, pancronicamente, os fenômenos linguísticos.
Apesar dessas dicotomias, as duas linhas de estudo não são totalmente
incompatíveis. Existe a possibilidade de intercâmbio entre as duas áreas de investigação
linguística, podendo estudiosos delas representativos trocar informações para enriquecer
suas análises, visto que, como observa Silva-Corvalán (1989, p. 2), “através do estudo
da fala o sociolinguista pode descobrir, descrever e fazer previsões sobre o sistema
linguístico que subjaz à fala”29
.
A língua, meio de comunicação utilizado nas mais diversas situações de
interação social, caracteriza-se por sua natureza inerentemente variável e por sua inter-
relação com a sociedade. O sistema linguístico dispõe de elementos que se estruturam
de acordo com as necessidades comunicativas e sociais do falante. Essa estruturação, ou
escolhas de formas, entretanto, não se dá aleatoriamente, mas de maneira sistemática,
sendo condicionada tanto estrutural quanto socialmente. Assim sendo, ao se focalizar
um emprego concreto da língua, faz-se necessário correlacionar o enfoque linguístico ao
seu contexto social e averiguar o que há de recorrente, sistemático e previsível na
situação de variabilidade das formas linguísticas, objeto de trabalho da Sociolinguística.
Segundo Tagliamonte (2006), a sociolinguística argumenta que a língua existe
no contexto, que é dependente do falante, do lugar e do motivo pelo qual é usada. Os
falantes imprimem sua história pessoal e identidade na sua fala, assim como suas
coordenadas econômicas, socioculturais e geográficas, no tempo e no espaço.
29
“a través del estudio del habla el sociolingüista puede descubrir, describir y hacer predicciones sobre
el sistema lingüístico que subyace en el habla”.
74
Dois argumentos dão suporte a essa abordagem. Primeiro, não se pode ter a
noção correta de uma língua „X‟ sem pensar que essa noção é social nela mesma, visto
que é definida em termos de um grupo de pessoas que falam „X‟. Segundo, a fala tem
uma função social, não só como meio de comunicação, mas como um modo de
identificar grupos sociais.
Os diferentes modos como a sociedade pode interferir na língua fazem com que
o campo de referência seja bastante amplo. Estudos sobre as várias relações entre
estrutura social e estrutura linguística incluem aspectos pessoais, estilísticos, sociais,
socioculturais e sociológicos. Isso faz com que as orientações de pesquisa sejam
tradicionalmente divididas em áreas abarcadas por dois termos: Sociolinguística e
Sociologia da Linguagem. Uma outra divisão pode ser feita: abordagem qualitativa
(etnografia da comunicação, análise do discurso) e quantitativa (variação e mudança da
língua).
Assim, ainda de acordo com Tagliamonte (2006), a Sociolinguística enfatiza a
língua no contexto social, enquanto a Sociologia da Linguagem enfatiza a interpretação
social da língua. A análise variacionista está inserida na Sociolinguística.
A Sociolinguística Variacionista surge durante a década de 60 do século XX –
fundamentalmente a partir dos estudos de William Labov, sob a orientação de Uriel
Weinreich.
Para a Teoria da Variação e Mudança ou Sociolinguística Variacionista, todos os
sistemas linguísticos são caracterizados por uma heterogeneidade inerente, ordenada e
sistemática. Uma das contribuições fundamentais do modelo foi o desenvolvimento de
métodos rigorosos para a análise da diversidade linguística, métodos que possibilitaram
a identificação de fenômenos variáveis, a depreensão dos padrões de variação em uma
comunidade de fala e a relação direta entre os padrões variáveis e parâmetros sociais
que caracterizam as comunidades linguísticas.
Em Empirical foundations for a theory of language change escrita por
Weinreich, Labov e Herzog em 1968, são propostos os fundamentos teóricos da Teoria
da Variação e Mudança. Para eles, a língua é uma entidade essencialmente heterogênea
e não se pode entender a mudança linguística “sem se considerar a evidência histórica
75
disponível no processo de mudança no interior de uma comunidade de fala”30
(op. cit. p,
147).
Os autores propõem um modelo teórico no qual a variação e a mudança são
resultados da influência de fatores linguísticos e extralinguísticos. Dessa forma, abre‐se
um caminho para a compreensão da interrelação entre uma língua e a comunidade que a
utiliza.
A Sociolinguística Variacionista postula ainda que, ao mesmo tempo em que a
língua muda, de forma gradual, há porções desse mesmo sistema que permanecem
estáveis por largos períodos de tempo. A variação observada na fala dos indivíduos
pode ser representativa de uma mudança em progresso ou pode ser um padrão que se
repete por gerações de indivíduos, sem mudanças no sistema. A observação de tal
fenômeno levou Weinreich, Labov e Herzog (op. cit, p. 188) a afirmarem que “nem toda
variação e heterogeneidade na estrutura da língua envolve mudança, mas toda mudança
envolve variação e heterogeneidade”31
.
Com base nos princípios levantados para a teoria, esses autores enumeram os
cinco problemas centrais envolvidos na investigação da mudança em curso: o dos
fatores condicionantes, o da transição, o do encaixamento, o da implementação da
mudança e o da avaliação.
O problema dos fatores condicionantes envolve a delimitação de um conjunto
geral de condicionamentos, que inclua as mudanças possíveis de acontecer em
determinada língua. Neste sentido, a teoria conta com trabalhos de pesquisa que
investiguem o maior número possível de fenômenos, de forma minuciosa.
Os autores afirmam, por exemplo, que vários estudos parecem indicar como
generalização que, quando um sistema de dois fonemas entra em contato e está em
variação com um sistema de apenas um desses fonemas, a tendência é que a mudança
aconteça em favor do sistema de apenas um elemento fonológico.
Outra questão que, a princípio, se levanta como universal é a impossibilidade de
uma variável surgida como um estereótipo social, estilisticamente estratificada, tornar-
se uma variável não marcada. De qualquer forma, até o momento, ainda não foram
30
“without regard for the historical evidence available on the process of change within the speech
community” 31
“Not all variability and heterogeneity in language structure involves change; but all change involves
variability and heterogeneity”.
76
investigadas todas as combinações possíveis de variáveis linguísticas e sociais, e nem de
todas as variáveis linguísticas entre si.
Para resolver o problema da transição, o linguista preocupado com a mudança
deve centrar-se nos dialetos transicionais e não nos nucleares, sendo, aliás, mais simples
e produtivo considerar que todos os dialetos estão em constante mudança. Assim sendo,
seria possível descobrir também como a mudança ocorria no passado, a partir da
observação de variantes com o traço inovador/arcaico na língua in vivo.
Para a mudança acontecer, é necessário que dois falantes bidialetais (com
sistemas heterogêneos) estejam em contato. Um deles aprende uma forma alternativa,
em seguida, por certo período de tempo, seu sistema suporta as duas formas alternativas
e, por fim, uma delas se torna obsoleta.
As pesquisas têm demonstrado que a mudança evolui de forma contínua através
das sucessivas faixas etárias. Além disso, a transferência de uma característica estrutural
de um falante para outro parece ocorrer entre faixas etárias ligeiramente distintas.
O problema do encaixamento prevê que qualquer mudança estará encaixada no
sistema linguístico como um todo, ou seja, nenhuma mudança acontece isoladamente,
mas se relaciona a outros fenômenos da estrutura da língua. Da mesma forma, toda
mudança também estará encaixada socialmente e cabe à teoria explicar a natureza e a
extensão desse encaixamento linguístico e social.
Segundo Weinreich, Labov e Herzog, um sistema não se transforma totalmente,
ao contrário, apenas algumas variantes mudam e de forma gradual. Elas podem ser
contínuas ou discretas, mas, neste último caso, os índices de frequência apresentam
alguma gradação.
Enquanto uma mudança é encaixada na estrutura linguística, é também
encaixada no contexto mais amplo da estrutura social, pois as variações geográficas e
sociais já estão previstas no sistema. No entanto, em um processo de mudança, o
encaixamento social não ocorre sempre da mesma forma, pois, apesar de os fatores
sociais pesarem sobre todo o sistema linguístico, os elementos do sistema não têm a
mesma significação social. Assim, fenômenos linguísticos são encaixados de forma
desigual na comunidade de fala, principalmente no inicio e no fim do processo, quando
fatores sociais podem ter pouca importância. Por isso, o pesquisador deve se preocupar
mais em explicar a correlação social de uma mudança e como essa correlação pesa
77
sobre o sistema linguístico, do que em tentar delimitar as motivações sociais dessa
mudança.
O problema da avaliação é extremamente importante, pois o nível de
consciência social tem relação direta com o desenvolvimento desses processos. Testes
de autopercepção podem ajudar a observar a diferença entre produção e percepção, o
que favorece o entendimento da mudança em progresso. Esse tipo de controle da
consciência do falante sobre as variantes em competição ajuda a explicar o peso dos
fatores sociais. Por outro lado, usar tais informações para determinar como o vernáculo
evolui é uma tarefa complexa que exige do investigador muito conhecimento da
comunidade de fala e da sociolinguística. Ainda assim, os correlatos subjetivos da
mudança ajudam a entender como categorizações discretas são impostas.
O problema da implementação é bastante complexo em decorrência da gama de
correlações que existe entre os incontáveis fatores sociais envolvidos na mudança.
Desse modo, não é de estranhar que a implementação e os fatores que a influenciam só
possam ser apontados e explicados a posteriori. Mesmo assim, deve ser investigado o
maior número possível de fenômenos em variação para que seja ampliado, ao máximo,
o conhecimento sobre o processo de implementação da mudança.
Esses linguistas consideram que uma mudança se inicia quando um elemento em
variação se propaga em um subgrupo específico da sociedade e se fortalece quando esse
elemento assume um determinado valor social relacionado a tal grupo. Para eles, depois
que a mudança está encaixada no sistema, ela se espalha gradualmente para todos os
outros elementos. Essa generalização é lenta, gradual e frequentemente influenciada por
fatores da estrutura social, como o surgimento de novos grupos na comunidade de fala.
Por isso, um processo quase concluído pode apresentar um aumento significativo da
consciência social da mudança e o surgimento de um estereótipo. No fim da
implementação da mudança, a forma que se tornou constante é esvaziada de qualquer
significação social que pudesse ter até então.
Labov (1994) discute métodos de investigação da mudança linguística, propondo
que ela seja estudada em tempo real e em tempo aparente. O autor levanta as diversas
dificuldades enfrentadas pelo pesquisador no estudo da mudança em tempo real de
longa duração, principalmente pela inconsistência do material disponível para análise
dos séculos passados. Lembra que a investigação da mudança linguística até a primeira
metade do século XX está restrita a materiais escritos, de origem frequentemente
78
desconhecida ou assistemática, e destaca que a maior parte deles são remanescentes
aleatórios.
Apesar das grandes dificuldades enfrentadas por esse tipo de estudo, destaca que
ele é imprescindível, principalmente para se verificar o momento em que uma variante
passa a ser utilizada na língua e o momento em que desaparece. Para o autor, a
investigação a longo prazo também é fundamental para se identificar a regularidade dos
princípios que atuam na variação e subjazem à implementação da mudança.
Por outro lado, Labov (1994) observa que as atuais ferramentas de observação e
controle estatístico de fenômenos linguísticos podem auxiliar os estudos de mudança,
pois com elas é possível verificar se um fenômeno variável, observado no presente,
indica uma mudança em processo de implementação ou é uma variação estável. Assim,
ao olhar dados de sincronia, seria possível observar estágios anteriores da língua, o que
o autor chama de “uso do presente para explicar o passado”. Dessa forma, ele descreve
duas formas de investigar a mudança num curto espaço de tempo: o estudo em tempo
real e o estudo em tempo aparente, dando mais enfoque aos estudos em tempo real de
curta duração.
A análise da mudança em tempo aparente consiste na observação de dados de
fala atuais, controlados com base nas faixas etárias, e parte da hipótese de que o falante
estabiliza o seu idioleto durante a juventude, aproximadamente aos 15 anos de idade,
após o processo de aquisição da linguagem. Assim, um falante de 37 anos, em 2013,
representaria a língua de sua comunidade de fala no ano de 1991.
No caso do estudo em tempo real, é necessário levantar uma amostra
representativa em dois momentos distintos para, com base em índices de frequência,
observar se uma variante está tomando o espaço da(s) outra(s) com o passar do tempo.
Dessa forma, pode ser possível visualizar o final de uma mudança, antes que ela esteja
completamente concluída, e determinar, ainda, com maior ou menor precisão, quando se
iniciou.
A observação em tempo real de curta duração pode ser empreendida através do
estudo de painel e do estudo de tendência.
No estudo de tendência, comparam-se os dados de informantes de um momento
histórico com os de outros informantes de um momento posterior. Assim, é possível
investigar o comportamento da comunidade de fala, mostrando se a mudança está sendo
implementada de modo generalizado.
79
Já no que diz respeito ao estudo de painel, investiga-se a fala dos mesmos
informantes em dois momentos distintos, o que torna possível não só obter dados do
idioleto do falante em duas faixas etárias diferentes, como também refletir sobre a
hipótese clássica da aquisição da linguagem. Tal hipótese prevê que, terminado o
processo de aquisição, na puberdade, o indivíduo mantém as características de sua fala
durante toda a vida adulta.
Segundo Labov (1994), uma distância de aproximadamente 18 anos, equivalente
ao curso de uma geração, é o mínimo necessário para que se verifiquem
comportamentos linguísticos diversos entre as sincronias, não só no estudo de
tendência, como também no de painel. Além disso, é necessário utilizar os mesmos
critérios metodológicos no levantamento de dados dos dois momentos estudados: o
mesmo tipo de entrevista, o mesmo recorte geográfico e social dos informantes, entre
outros procedimentos.
Como ainda ressalta Labov (op. cit.), a conjunção de estudos do tipo painel e do
tipo tendência possibilita que se verifique mais profundamente não só o comportamento
do indivíduo e da sociedade, mas também a relação entre a mudança linguística e as
características sociais da comunidade de fala.
De acordo com Labov (2008 [1972]), uma investigação na área da
Sociolinguística Variacionista, desenvolve-se, geralmente, seguindo cinco etapas: (1)
observação da comunidade e hipóteses de trabalho; (2) seleção dos informantes; (3)
coleta dos dados; (4) análise dos dados – que se subdivide em identificação da variável
e dos contextos, codificação dos dados e quantificação e aplicação dos procedimentos
estatísticos – e (5) interpretação dos resultados.
A observação da comunidade a ser estudada deve ser o marco inicial de uma
pesquisa sociolinguística, pois, muitas vezes, é a partir daí que surgirão as hipóteses
iniciais de trabalho. Já outras hipóteses decorrem do trabalho direto com os dados
(coleta, análise, etc.).
O processo de seleção dos falantes é de grande importância. O sociolinguista deve
organizar uma amostra de fala que garanta sua representatividade em relação à
comunidade estudada. Para Labov, a fala espontânea está frequentemente presente no
decorrer da entrevista e pode ser considerada um correlato da fala usual em contextos
formais. Para o autor, os dados de fala espontânea podem, inclusive, ser analisados
conjuntamente com os dados de fala casual. O pesquisador deve, portanto, incentivar o
80
aparecimento desses estilos e também verificar se um determinado fragmento de fala é
realmente espontâneo, procurando um método de controlar a concretização desses
estilos discursivos.
Labov destaca que o estilo pode ser definido por situações contextuais – diálogo
com uma terceira pessoa (estilo casual), relato de uma situação emocionante, perigosa,
íntima ou muito triste (estilo espontâneo) – e outros marcadores da situação interativa,
como uma variação no ritmo de fala, o riso, um aumento na intensidade da respiração,
altura etc.
Uma análise estatística deve basear‐se na premissa de que a amostra recolhida
representa toda a comunidade estudada e não somente um conjunto de indivíduos. Caso
a constituição do grupo de informantes seja feita com base em critérios bem
delimitados, os resultados poderão ser generalizados para um determinado recorte
social. Em qualquer pesquisa sociolinguística, a seleção dos informantes deve passar
pelo controle social proposto por Labov: escolha aleatória, mas organizada em células
que conjugam variáveis sociais, o que define uma amostra aleatória estratificada.
Um pesquisador que pretende controlar, por exemplo, o gênero do informante
em três faixas etárias diferentes (faixa A, B e C), deve preencher 6 células: homem –
faixa A; homem – faixa B; homem – faixa C; mulher – faixa A; mulher – faixa B –
mulher faixa C. Labov destaca que cinco é o número ideal de informantes para
preencher cada célula social; no entanto, esse número costuma variar. Certamente,
quanto mais informantes apresentar uma amostra, mais fidedigna ela será. Deve‐se
lembrar, no entanto, que esse número depende essencialmente do perfil da comunidade
estudada, do fenômeno sob análise e da ferramenta à disposição para a análise
estatística.
Em contato com a amostra de fala, o linguista já pode definir, com mais eficácia,
as variáveis que nortearão o seu trabalho. Inicialmente, deve-se definir a variável
dependente, composta de formas linguísticas de mesmo valor funcional em estado de
variação no uso da língua e, a seguir, as variáveis independentes, que podem ser tanto
de natureza linguística, que equivalem aos fatores internos – aspectos fonológicos,
morfossintáticos, semânticos e discursivos – da língua em estudo, quanto de natureza
extralinguística e que correspondem a fatores externos como sexo, idade, nível de
instrução, entre outros. Os fatores que as compõem denominam-se variantes.
81
Para que seja verificado o grau de influência das variáveis independentes
(grupos de fatores) no uso das variantes linguísticas pelos falantes, os dados são
submetidos a um método quantitativo de análise, que utiliza o pacote de programas
GOLDVARB-X, nova versão do programa VARBRUL, desenvolvido por David
Sankoff (1978), para tratamento estatístico dos dados. Esse pacote de programas fornece
informações tais como: (1) o índice de aplicação da regra variável; (2) a frequência, os
valores percentuais e os pesos relativos de uma dada variante; (3) as variáveis
linguísticas e extralinguísticas relevantes para o condicionamento do fenômeno em
estudo, por ordem de seleção; (4) e as variáveis não significativas para a análise.
Durante o processo de análise, são determinados índices de significância para
cada rodada e, em cada uma delas, atribuídos pesos relativos para os fatores das
variáveis investigadas. Se os fatores de uma determinada variável têm peso relativo alto,
são considerados relevantes para a aplicação da regra; por outro lado, quanto mais esse
índice estiver próximo de 0.00, menos favorecedores se mostram os fatores para a sua
implementação. As rodadas mais importantes, selecionadas pelo programa, devem
apresentar índice de significância o mais próximo de 0.000. O programa de análises
estatísticas estabelece ainda o input de seleção da regra variável, o que corresponde à
aplicação geral do valor de aplicação (no caso desta tese o processo de enfraquecimento
da lateral palatal com a utilização da lateral palatalizada).
5.1.2 A Fonologia Experimental
O desenvolvimento da tecnologia computacional, que promove o surgimento e a
melhoria de novos programas de análise, dentre outros aparatos técnicos, tem auxiliado
o avanço dos estudos de Fonética Acústica, não só diminuindo as dificuldades de cunho
metodológico que este ramo da linguística sempre enfrentou como também ampliando
as suas possibilidades.
Com isso, embora os estudos de Acústica ainda não sejam tão frequentes quanto
os de Fonética Articulatória, os pesquisadores têm atentado cada vez mais para a
importância de investigar as propriedades da onda sonora. Isso é fundamental para que
se compreendam melhor não só as características prosódicas e segmentais (acústicas) da
língua, como a sua atuação na maioria dos fenômenos fonético-fonológicos (e também
82
morfológicos, sintáticos etc.), que normalmente são observados apenas no nível da
percepção auditiva.
Dentro dessa perspectiva de evolução dos estudos acústicos, amparados pelo
desenvolvimento da tecnologia computacional, aparece a Fonologia Experimental que
teve seu nome cunhado por John Ohala, para uma conferência em Berkeley, em 197932
.
Essa vertente dos estudos fonético-fonológicos, anteriormente chamada de
psicofonologia, mais do que interação, busca e defende a integração da fonética e da
fonologia, que começou a deixar de existir a partir do momento em que a fonologia se
constituiu como disciplina autônoma, na década de 20 do século passado.
Apesar de diversos linguistas desenvolverem estudos no âmbito da Fonologia
Experimental – haja vista uma série de encontros bienais conhecida pelo nome de “Lab
Phon” –, sem dúvida, John Ohala é uma das figuras mais proeminentes dessa linha de
pesquisa. Justamente por isso, nesta seção, as observações que serão feitas estarão
baseadas em trabalhos publicados pelo referido linguista ou por estudos de outros
autores que seguem a sua metodologia.
Segundo Ohala (1987), a imagem popular de que uma disciplina experimental
inclui procedimentos complexos ou instrumentos altamente sofisticados é falsa, uma
vez que a complexidade não é essencial e a instrumentação complexa, por si mesma,
não torna algo experimental.
Para esse linguista, o conhecimento do mundo está sujeito a distorções.
Justamente por isso, torna-se necessário refinar e estruturar as observações de tal modo
que se eliminem ou atenuem os fatores que podem distorcer o conhecimento ou torná-lo
ambíguo. Para tanto, uma simples análise experimental de laboratório pode ser usada
para reverter eventuais problemas de opinião e, assim, se possa “conciliar o que
pensamos com o que vemos” (OHALA, 1987, p. 208).
Ainda de acordo com Ohala (1987, p. 207), à medida que um campo amadurece
e acumula mais experiência com a experimentação, (a) depreende mais fontes potenciais
de erro e modos de compensá-los, bem como (b) dá margem a um questionamento mais
detalhado, que requer observações cada vez mais cuidadosas. É nesse momento que
instrumentos e procedimentos mais elaborados devem ser utilizados, refletindo,
portanto, o desenvolvimento epistemológico da disciplina.
32
Comunicação pessoal dada a João Moraes.
83
Apesar de, como observa Ohala (1987, p. 207), a fonologia como disciplina
experimental estar “na sua infância e as técnicas usadas sejam ainda relativamente
simples”,33
houve certa expectativa por parte dos estudiosos de linguística, no sentido
de que a caracterização da Fonologia Experimental faria alguma menção às técnicas
específicas empregadas nos experimentos fonológicos. A lista de tais técnicas, segundo
o autor, não é necessária, uma vez que “as técnicas usadas são limitadas apenas pela
imaginação, para a qual, felizmente, há um suprimento interminável na
linguística”34
(OHALA, 1987, p. 208).
Para ele, existem duas ideias falsas sobre a Fonologia Experimental que
merecem atenção: (a) a de que é apenas um novo rótulo para a área denominada de
fonética experimental e (b) a de que Fonologia Experimental, em si, não inclui
construção teórica.
Com relação à primeira questão, Ohala (1987) adverte que a Fonologia
Experimental difere da Fonética Experimental não só no que diz respeito à extensão do
estudo como também à orientação filosófica utilizada: A Fonologia Experimental (1)
seria mais ampla que a Fonética, já que incorpora certas áreas da psicologia bem como
dos experimentos sociolinguísticos do tipo dos conduzidos por Labov (cf., por exemplo,
LABOV, 1966) e (2) não estaria relacionada a apenas uma atitude positivista, mas sim,
também, a uma análise “hipotético-dedutiva”, ou seja, guiada igualmente tanto por
hipóteses – um produto da razão -, quanto por dados – um produto dos sentidos.
Com relação à mencionada segunda falsa ideia, Ohala argumenta que, embora se
pense que a Fonologia Experimental consiste exclusivamente em testar teoria sem
construção teórica, isso não é verdade: “uma visão mais madura da ciência, incluindo a
fonologia, a vê como um ciclo contínuo de teoria – teste – teoria revista – teste revisto,
etc.” 35
(OHALA, 1987, p. 209)
A inseparabilidade de teoria e experimento baseia-se no simples fato de que se
pode formar uma crença sobre algo, isto é, formular uma hipótese ou uma teoria,
podendo-se, portanto, também examinar criticamente a origem da crença e tentar
ativamente refinar e controlar as observações que a incitaram.
33
“Perhaps it is no secret that phonology as an experimental discipline is in its infancy and the technics
used are still relatively simple” 34
“(...) the techniques used are limited only by imagination, of wich, hopefully, there is an endless supply
in linguistics.” 35
“A more mature view of science, including phonology, ses it as a continuos cycle of theory – test –
revised theory – revised test, etc.”
84
Concluindo, Ohala (1987, p. 218) acrescenta que o argumento definitivo em
favor da Fonologia Experimental é o acúmulo de bem sucedidas aplicações de métodos
experimentais a questões tradicionais em fonologia. A literatura de tais aplicações,
segundo ele, remontaria pelo menos a 1901 e incluiria trabalhos de linguistas e
psicolinguistas renomados como Edward Sapir (1929, 1933), W. Freeman Twaddel
(1935, p. 11), Stanley Newman (1933), Joseph Greenberg (Greenberg & Jenkins 1964,
1966), Roger Brown (Brown & Hildum, 1956, Brown & Nuttall, 1959), Sandford
Schane (Schane & Tranel, 1970, Schane, Tranel & Lane, 1974), James McCawley
(1986).
Como muitas são as aplicabilidades da Fonologia Experimental no intuito de
comprovar ou não questões tradicionais da fonologia, resolveu-se dar um exemplo de
como essa vertente dos estudos fonético-fonológicos pode ser utilizada.
Ohala (1992) questionando a eficácia da escala ou hierarquia de sonoridade
menciona um trabalho experimental de Price (1980) em que se demonstra que palavras
como “blow” [blo] podem ser transformadas numa versão convincente de “below”
[blo] simplesmente alongando a duração do [l].
Segundo Ohala (1992), (1) se a hierarquia ou escala de sonoridade assume que
sílabas são locais máximos na sonoridade de segmentos que estão concatenados na fala
e que cada segmento ou tipo de segmento tem a sua própria sonoridade inerente, e (2) se
não há mudança de qualidade inerente quando se alonga o [l], “então de onde vêm a
sílaba extra e o perceptível []?36
”(op. cit. p.323).
A resposta a essa pergunta, segundo Ohala (op. cit., p. 331), explica, em parte, o
que ele denomina de a falácia da escala de sonoridade. O fato de a palavra “blow”,
manipulada artificialmente, ser percebida como “below”, quando submetida a alguns
ouvintes, deve-se ao fato de a silabicidade ser um construto perceptual, isto é, criado na
mente do ouvinte. A base para isso, de acordo com o linguista, é o fato de que, quando
os ouvintes escutam a soante – que é mais longa do que se espera para o [l] normal –
depois de [b], são induzidos a construir outra percepção que esteja mais de acordo com
os eventos no sinal acústico.
A transição na soltura do /b/ é acompanhada de uma soltura vocálica /b/
e, naturalmente, a transição /lo/ não muda. Os ouvintes não precisam de
36
“So where does the extra syllable and the perceived [] come from?”
85
uma verdadeira transição /l/ para concluírem que há um // entre /b/ e
/l/37
(op. cit., p. 331).
Assim, Ohala (1992) desconstroi a eficácia da aplicação da escala de sonoridade
a partir de um experimento cujo resultado pode ser verificado em vários sistemas
linguísticos. Menendez-Pidal (1926, p. 217-218), por exemplo, nota a existência em
espanhol, esporadicamente, de uma vogal relaxada quebrando grupos do tipo CL e CR,
como, por exemplo, nos vocábulos Ingalaterra, coronica, egelesia, peredicto. Já em
francês, Malmberg (1971, p. 257), diz ser bastante comum que crianças pronunciem
pelumme em lugar de plume. No Português Europeu, Mateus & Martins (2002)38
ao
estudarem a supressão das vogais átonas [] e [u] junto de consoantes, também
verificam que é muito comum que palavras como crer e prece, por exemplo, quando
submetidas a um teste de percepção sejam, muitas vezes, confundidas com querer e
perece, respectivamente.
Outro trabalho que segue essa linha teórica é o de Quandt (2004). Em estudos
sobre o comportamento da lateral anterior na fala do Norte-Noroeste Fluminense,
utilizando os pressupostos teórico-metodológicos da Fonologia Experimental
preconizados por Ohala, essa autora verificou, através de dois experimentos acústicos,
que, em grupo consonantal, (1) o fone [] apresenta, no seu início, uma porção vocálica
nitidamente segmentável, de qualidade próxima à da vogal núcleo do grupo
consonantal, ainda que mais centralizada; (2) o fone [l] não apresenta, em sua produção,
uma parte vocálica, embora possa ser considerado um som híbrido, já que possui tanto
características de consoante quanto de vogal.
Esses experimentos acústicos, realizados por Quandt (2004), serviram para
comprovar que existem fatores de ordem estrutural que favorecem a permuta de [l] por
[] em grupo consonantal. Como a lateral é um segmento que, do ponto de vista
acústico, apresenta características consonânticas e vocálicas, simultaneamente, o
suposto grupo consonantal formado pela sequência obstruinte + /l/ acaba se tornando
menos estruturado, o que favorece a permuta da lateral por um tepe. Além disso, como o
37
“The transition at the release of the /b/ is compatible with a vocalic release /b / and of course the /lo/
transition is unchanged. Listeners don’t require an actual /l/ transition in order to conclude that is a /
/ in between the /b/ and /l/.” 38
O estudo, que aparece na coletânea citada, foi publicado pela primeira vez em 1982.
86
[] apresenta uma porção vocálica inicial e uma porção consonântica final (de caráter
oclusivo), quando se concretiza o [] no lugar de [l], está-se promovendo, também, uma
abertura de sílaba – criando duas sílabas CV –, desfazendo, assim, o grupo consonantal.
Em estudos mais recentes, Stein (2011, p. 229), ao analisar o percurso acústico-
articulatório da alofonia da consoante lateral palatal, verifica, por meio de experimentos
acústicos, “a presença de uma vogal [i] entre F2 e F3 da área delimitada a []” (cf. item
2.2).
5.2 Metodologia e Corpus
O trabalho será realizado em duas etapas: a primeira à luz dos pressupostos
teórico-metodológicos da Sociolinguística Variacionista Laboviana, levando em
consideração, ainda, aspectos relacionados à difusão lexical, a segunda, com base em
estudos no âmbito da Fonologia Experimental.
A seguir apresentam-se os corpora utilizados nas duas etapas do estudo.
(a) Primeira etapa de análise
Os dados que constituem os corpora da pesquisa foram selecionados de
inquéritos, do tipo DID, pertencentes ao Acervo do projeto Estudo comparado dos
padrões de concordância em variedades africanas, brasileiras e europeias do
Português (www.letras.ufrj.br/concordancia).
Os inquéritos foram realizados com indivíduos distribuídos pela RMRJ
(Municípios de Nova Iguaçu e do Rio de Janeiro, este representado por Copacabana) e
pela RMLIS (Oeiras e Cacém), por sexo, três níveis de instrução (2º segmento do
Ensino Fundamental, Ensino Médio e Ensino Superior) e três faixas etárias – A (18-35
anos), B (36-55 anos), C (56-70 anos).
A seleção dos informantes seguiu os critérios previamente estabelecidos pela
equipe responsável pelo Projeto, a fim de se resguardar a confiabilidade dos dados
coletados. Vale ressaltar que todos os informantes selecionados deveriam ser naturais do
municípios/concelhos alvo, e deles não se terem ausentado por mais de cinco anos.
87
No que diz respeito ao corpus do PB, pretende-se trabalhar com base na fala dos
Municípios de Nova Iguaçu e do Rio de Janeiro, mais especificamente do bairro de
Copacabana, o que perfaz um total de 36 informantes. Com relação ao corpus do PE, o
estudo será feito com base na fala de Oeiras, localizada em Lisboa, e da freguesia de
Cacém, somando, também, um total de 36 informantes, conforme se sintetiza no quadro
a seguir:
Quadro 1. Configuração dos Corpora PB e PE
Faixa etária Nível de escolaridade Gênero
18 a 35 anos Nível 1 – de 5 a 8 anos de escolaridade Masculino
36 a 55 anos Nível 2 – de 9 a 11 anos de escolaridade Feminino
56 a 75 anos Nível 3 – Superior
3 células x 3 células x 2 células = 18 informantes
18 informantes x 2 pontos de inquérito = 36 informantes brasileiros
18 informantes x 2 pontos de inquérito = 36 informantes portugueses
Entre as variáveis estruturais, inicialmente, controlaram-se os contextos
antecedente e subsequente; a classe de vocábulo; a tonicidade da sílaba em que
incide o segmento, o número de sílabas do vocábulo, a presença ou ausência de
outra líquida palatal no vocábulo e a frequência do vocábulo no corpus.
Como uma das variáveis estruturais controladas na análise sociolinguística é a
frequência do vocábulo no corpus, acreditou-se ser pertinente fazer uma análise mais
refinada em que se unissem os princípios da sociolinguística variacionista aos das
teorias da Difusão Lexical e da Fonologia de uso.
A partir não só da leitura de trabalhos que tinham como referencial teórico as
duas últimas teorias mencionadas, como também da observação dos dados desta
pesquisa, acredita-se que a partir da verificação da frequência de cada vocábulo no
corpus, resultados mais precisos, no que diz respeito à variação do fonema //, nas
localidades ora trabalhadas, serão obtidos.
(b) Segunda etapa de análise
Para os experimentos acústicos, que dizem respeito a esta etapa de trabalho, foi
criado um corpus complementar, gravado no Laboratório de Fonética da UFRJ, que
88
contempla a produção das laterais em quatro contextos, a saber: (a) o primeiro com as
variantes das laterais seguidas pela vogal [a], (b) o segundo com as variantes seguidas
pela vogal [i], (c) o terceiro, somente com as variantes [] e [lj] seguidas pela vogal [a]
e (d), o quarto com as variantes lateral palatal e lateral palatalizada, seguidas pela vogal
[i]. Nos dois primeiros contextos todas as variantes analisadas se encontram em sílaba
tônica e, nos terceiro e quarto, [] e [lj] se encontram em sílaba postônica.
O corpus criado pode ser visto no quadro a seguir:
Quadro 2: Frases que formam o corpus da 2ª etapa de análise
Para a análise que contempla os primeiro e
segundo contextos
Para a análise que contempla os terceiro e
quarto contextos
“Eu disse te„_ado de novo” “Eu disse te„_a de novo”
“Eu disse to„_ido de novo” “Eu disse te„_e de novo”
Depois da escolha das palavras que fariam parte das frases que compõem o
corpus, os seguintes procedimentos metodológicos foram realizados:
(1) As frases que compõem o corpus foram lidas três vezes com cada uma das
palatais e com a semivogal [j]39
, por um informante, do sexo masculino40
, e
digitalizadas com o auxílio do Programa Praat;
(2) Fez-se o espectrograma de cada uma das palavras que continham as
variantes das laterais que compõem o corpus;
(3) Mediu-se cada um dos formantes de todas as variantes, em todas as suas
repetições, e depois foi estabelecida a média dos valores encontrados. Todos
os formantes foram medidos no centro de cada segmento.
(4) Analisaram-se esses espectrogramas a fim de verificar a configuração
formântica de cada variante das laterais.
39
Embora o [j] não seja uma lateral, pelo fato de ser uma realização possível do fonema // no PB e no
PE, optou-se por incluí-lo na análise. 40
O coorientador da tese, pelo fato de ser professor de fonética e ter experiência em produzir esses sons,
foi o informante masculino que produziu as frases em laboratório.
89
6 ANÁLISE SOCIOLINGUÍSTICA
Neste capítulo, (a) apresentam-se as variáveis dependente e independentes
utilizadas no estudo da variação de // na fala da RMRJ e na da RMLIS, (b) explicita-se
a produtividade de cada uma das variantes da lateral palatal em ambos os corpora e (c)
discutem-se os resultados da análise variacionista sobre o enfraquecimento da lateral
palatal (passagem de [] para [lj]) de forma comparativa, ou seja, embora as variedades
tenham sido analisadas em separado, os resultados obtidos com os dados do PB serão
contrastados aos verificados com os do PE. No último item, discutem-se questões de
ordem lexical em função dos resultados obtidos na análise variacionista.
6.1 As variáveis consideradas
As variáveis dependente e independentes utilizadas no estudo foram as mesmas
tanto na análise efetuada com dados da RMRJ, quanto na empreendida com os da
RMLIS. Como a investigação se iniciou com a consulta à bibliografia especializada e
pela seleção de dados em entrevistas para a formação dos corpora, foi possível perceber
que as variáveis linguísticas e extralinguísticas que apoiariam a análise variacionista
poderiam ser as mesmas tanto para o corpus do PB quanto para o do PE. O mesmo se
verificou no que diz respeito à variável dependente: durante as transcrições fonéticas,
observou-se que as variantes de // eram as mesmas no PB e no PE, havendo apenas
uma diferença percentual de ocorrência em cada uma das variedades estudadas (cf. item
6.1.1).
As considerações acerca do PE estarão baseadas, principalmente, nos estudos
realizados sobre o PB ou em hipóteses formuladas no momento da recolha dos dados,
uma vez que, como já se ressaltou, são extremamente escassos os estudos sobre // no
Português Europeu.
90
6.1.1 A variável dependente
Da análise auditiva dos dados, registraram-se as seguintes variantes de //, cuja
distribuição, nos corpora, se encontra nas tabelas 1 e 2 e pode, também, ser visualizada
nos gráficos 1 e 2.
Lateral palatalizada [lj]
Três professoras super-maravi[ lj ]osas (COP A1M)
que possa beneficiar o seu traba[ lj ]o (CAC C3H)
Manutenção da palatal []
então ele traba[ ]a em casa (COP C2 M)
acho que quero ter fi[ ]os (CAC A1H)
Despalatalização seguida de semivogal j [lj]
e os fi[ lj ]os do seu Manoel também (COP B1M)
era o meu fi[ lj ]o (CAC B1M)
Iodização [j]
eu ficava mais perto do traba[ j ]o (COP C1 H)
o[ j ]a é o que eu disse à bocadinho (CAC B2M)
Despalatalização [l]
a minha mu[ l ]er (COP C1 H)
todos os traba[ l ]inhos feitos (CAC B2M)
Síncope do segmento [Ø]
eles andava minha fi[ ]a (COP C1 H)
vai ficar fi[ ]a (OEI C3M)
91
(a) As variantes de // no corpus do PB
Conforme se demonstra na tabela 1 e no gráfico 1, abaixo, na RMRJ, a lateral
palatalizada, com índice de frequência de 55.2 % (1363 ocorrências), surge como a
variante preferencial em contraste com a manutenção da lateral palatal, que atinge o
índice de 28.6% (705 ocorrências). As demais variantes apresentam baixa
representatividade na amostra, a saber: despalatalização + iode ([lj]) – 13%;
despalatalização ([l]) – 2.6%; iodização ([j]) – 0.5% e síncope ( ) – 0.1%.
Tabela 1. Índices referentes à variação de / / na RMRJ
ÍNDICES Variação de // na RMRJ
Variantes [lj] [] [lj] [l] [j]
Ocorrências 1363/2470 705/2470 323/2470 64/2470 13/2470 2/2470
Percentuais 55.2 % 28.6% 13% 2.6% 0.5% 0.1%
Gráfico 1. Distribuição das variantes de // / na RMRJ
56%
29%
13%
2%0% 0%
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%Lateral Palatalizada
Manutenção da palatal
Despalatalização + Iode
Despalatalização
Iodização
Síncope
Os baixos índices de algumas variantes, de certa maneira, já eram esperados,
uma vez que esse corpus representa a fala de Copacabana – bairro localizado na Zona
Sul da cidade do Rio de Janeiro – e de Nova Iguaçu – cidade que apresenta um
dinâmico polo comercial, cuja população mantém uma permanente interação com os
moradores da capital. A iodização, por exemplo, é considerada típica do interior ou de
zonas rurais do Brasil, como atestam não só trabalhos mais antigos como os de Penha
(1972), Melo (1981), Silveira (1986) e Aguilera (1988), mas também estudos mais
recentes, como o de Brandão (2006). Também o cancelamento e a despalatalização da
92
lateral palatal são vistos como característicos da fala rural e interiorana em três dos
estudos apontados acima: Penha (1972), Aguilera (1988) e Brandão (2006).
O fato de a lateral palatalizada ser a variante mais utilizada nessas localidades
não surpreende, uma vez que muitos linguistas como Pontes (1973) e Cristófaro-Silva
(1999), por exemplo, indicam ser [lj] a variante preferida dos brasileiros. A primeira
afirma, inclusive, que não existe, na língua coloquial, o contraste que é sugerido pela
escrita, como em óleo-olho, que se pronunciariam da mesma maneira: [ju]. Já a
segunda assevera que, geralmente, a lateral alveolar palatalizada ocorreria no lugar da
lateral palatal na fala da maioria dos falantes do português brasileiro.
Ao observar os dados, percebe-se que as variantes menos produtivas na amostra
aparecem em vocábulos específicos41
. Para deixar mais claro esse resultado, resolveu-se
criar o quadro 3, a seguir.
Quadro 3. Vocábulos em que incidem as variantes menos produtivas
no corpus da RMRJ
Vocábulo Total de
Ocos.
Ocos. de
[ ]
Ocos. de
[j]
Ocos. de
[ l ]
Ocos. de
[ lj ]
Filho 123 1 - - 122
Filha 43 1 - - 42
Filhos 88 - - - 88
Filhas 8 - - - 8
Olho (substantivo)
2 - - -
2
Olho (verbo)
1 - - -
1
Olhos 6 - - - 6
Olhar 3 - - - 3
Olha 4 - 1 - 3
Olham 1 - - - 1
Velho 3 - - - 3
Velha 3 - - - 3
Melhor 9 - - - 9
Melhores 2 - - - 2
Melhorzinho 1 - - - 1
Melhorar 5 - - - 5
Melhorem 1 - - - 1
Melhora 2 - - - 2
Melhorando 2 - - - 2
Melhorou 3 - - 1 2
Melhorado 3 - - - 3
41
Optou-se por considerar em separado as flexões de um mesmo item lexical para ressaltar os diferentes
contextos adjacentes a [].
93
Vocábulo Total de
Ocos.
Ocos. de
[ ]
Ocos. de
[j]
Ocos. de
[ l ]
Ocos. de
[ lj ]
Melhorada 1 - - - 1
Melhoria 1 - - - 1
Orgulho 1 - - - 1
Galho 1 - - - 1
Castelhano 1 - - - 1
Molhada 1 - - - 1
Maravilhas 1 - - - 1
Atrapalha 1 - - - 1
Trabalhos 1 - - - 1
Trabalho (verbo)
5 - 1 3 1
Trabalho (substantivo)
3 - 2 - 1
Trabalha 9 - 4 3 2
Trabalhar 7 - 4 2 1
Trabalhando 2 - 1 1 -
Trabalhava 1 1
Mulher 23 - - 23 -
Mulheres 2 - - 2 -
Detalhe 1 - - 1 -
Colher (Substantivo)
1 - - 1 -
Colheres 2 - - 2 -
Lhes 1 - - 1 -
Bilhete 1 - - 1 -
Escolher 2 - - 2 -
Escolhido 2 - - 2 -
Canalhice 1 - - 1 -
Filhinho 2 - - 2 -
Filhinha 1 - - 1 -
Trabalhinho 1 - - 1 -
Velhinha 1 - - 1 -
Trabalhei 6 - - 6 -
Patrulhinha 5 - 5 -
Manilhou 1 1
Total 402 2 13 64 323
Conforme pode ser observado no quadro 3, os vocábulos marcados em azul são
os únicos concretizados com a variante despalatalizada acompanhada de iode ([lj]). Eles
foram produzidos como se houvesse um iode, como ocorre na palavra “família”. Além
disso, é importante mencionar que essa variante não parece sofrer influência de fatores
extralinguísticos como idade, gênero e nível de escolaridade do falante, já que aparece
bem distribuída no corpus: homens e mulheres, das três faixas etárias e dos três níveis
de escolaridade considerados na análise produzem [lj]. Ainda assim, acredita-se ser
pertinente mostrar com que incidência essa variante aparece em função de cada um
94
desses fatores, a saber: faixa etária (A – 131 ocos.; B – 125 ocos. e C – 67 ocos.); nível
de escolaridade (fundamental – 140 ocos.; médio – 103 ocos.; e superior – 80 ocos.) e
os dois gêneros (homem – 144 ocos. e mulher – 179 ocos.). Embora os valores
mostrados não sejam tão discrepantes, parece que são as mulheres de nível fundamental
de instrução que estão preferindo a variante [lj]. Em contrapartida, a despalatalização
seguida de iode é menos comum na fala de indivíduos mais velhos e com mais tempo de
escolaridade.
Ainda no que diz respeito a essa variante, três importantes observações podem
ser feitas: a primeira, com base no trabalho de Machado-Soares (2008), a segunda,
baseada em Pontes (1973) e a última, nos estudos de Câmara Jr. (1979) e Silveira
(1986), que descrevem a evolução do // do latim ao português.
Segundo Machado-Soares (2008), as vogais anteriores quando precedem //,
favoreceriam a ocorrência de [lj]. Ao observar o quadro 3, percebe-se que 19 dos 33
vocábulos concretizados com [lj], no corpus, são precedidos das vogais anteriores [i],
[e], []. Ressalta-se, ainda, que, (a) dentre esses 19, há alguns bastante expressivos –
como filho (122 ocos.), filhos (88 ocos.), filha (42 ocos), e outros medianamente
expressivos, como filhas (8 ocos.), melhor (9 ocos.), melhorar (5 ocos.), velho (3 ocos.),
velha (3 ocos.); (b) nos outros 14 vocábulos, dos 33 produzidos com [lj], // não é
antecedido por vogais anteriores e, talvez, por isso, a variante tenha apresentado baixa
representatividade.
Segundo Pontes (1973), o contraste entre óleo-olho, sugerido pela escrita, deixa
de existir na fala, sendo os dois vocábulos pronunciados como [ju]. Dessa forma,
parece pertinente relacionar o que é atestado por essa linguista com o que se observa no
corpus do PB. O vocábulo olhos, por exemplo, aparece mais frequentemente, em Nova
Iguaçu, com [lj] – num total de 6 ocos., 4 são com essa variante. Em Copacabana, das 5
ocorrências desse vocábulo, duas são produzidas com [lj]. Além disso, embora os
vocábulos olhar e olha apareçam bastante frequentemente na amostra do PB com a
variante [lj]– como pode ser visto nas tabelas do anexo 1 – o quadro 3 mostra que eles
ocorrem também, com [lj], mesmo que parcimoniosamente. Assim, bastante natural
seria que houvesse um iode na sua concretização da mesma forma que ocorre em “óleos
([ju].
95
Ainda no que diz respeito à despalatalização seguida de iode, ao se observarem
os vocábulos em que mais incide essa variante – filho, filhos e filha –, pode-se supor
que a concretização de [lj] possa ser considerada um retorno à origem da formação do
fonema //. Para tal interpretação, retomam-se as palavras de Câmara Jr. (1979, p.54) e
Silveira (1986, p. 102). Segundo eles, a realização [lj] ocorre, provavelmente, devido à
própria origem do fonema palatal, uma vez que o fenômeno da palatalização também
ocorreu, no português, a partir de um /l/ seguido de um /i/ assilábico, ou seja, de
combinatórias como lj > , como se verifica em filium > filiu > filju > filho e em
palea > /pali a/ > palha.
A variante despalatalizada ([l]) aparece, no corpus, nos vocábulos marcados em
verde, como mostra o quadro 3. No que diz respeito ao PB, a hipótese de que a
despalatalização ocorreria somente na fala dos indivíduos menos escolarizados, procede
parcialmente, uma vez que, nos vocábulos marcados em verde, acima, ela está presente
também na fala de indivíduos com um nível de escolaridade alto. Os vocábulos detalhe,
colheres (substantivo), colher (substantivo), escolhido, escolher, filhinha e patrulhinha,
por exemplo, foram produzidos com [l] por informantes de todas as faixas etárias, mas
com nível superior. Nos vocábulos filhinho, canalhice, lhes e mulheres, a variante
aparece na fala de informantes das faixas A e B, de nível médio de instrução. O
vocábulo mulher, com maior representatividade no corpus, como mostra o quadro 3, é
produzido com [l] por informantes de nível tanto fundamental (11 ocos.) quanto médio
(7 ocos.) e superior (6 ocos.). Somente bilhete, velhinha e trabalhei são produzidos com
a despalatalização de // por informantes de todas as faixas de idade, mas apenas de
nível fundamental. Esse resultado indica que, provavelmente, não é o nível de
escolaridade que esteja influenciando a concretização dessa variante, mas sim outros
fatores.
Nesse sentido, vale a pena mencionar que, segundo Brandão (2007) e Machado-
Soares (2008), a despalatalização seria influenciada pela tonicidade da sílaba em que
incide o segmento. Para essas linguistas, a sílaba tônica seria um ambiente favorecedor
para a sua concretização. Essas informações parecem coincidir com o que está exposto
no quadro 3, visto que, somente em cinco dos vocábulos, o [l] não é produzido em
sílaba tônica (lhe, detalhe, trabalha, trabalho, melhorou).
96
Além disso, ainda de acordo com Brandão (2007), atuam para a aplicação de [l]
a presença, em contexto subsequente, de vogal [+ cor]. Esse resultado coincide com o
que é exposto no quadro 3: das 21 ocos. de despalatalizações (marcadas em verde)
apenas sete não aparecem nesse contexto. Convém salientar que, dentre esses sete
vocábulos, cinco – trabalho, trabalha, trabalhar, trabalhando, melhorou – foram
proferidos pela mesma informante – de meia idade e com nível médio de instrução –, o
que, provavelmente, seja uma característica do seu idioleto, até porque outras palavras
como mulher42
, canalhice, bilhete também foram produzidas com [l] pela mesma
informante. Os outros dois vocábulos – manilhou e trabalhava – foram concretizados
por dois informantes diferentes: o primeiro por uma mulher de meia idade de nível
superior de escolaridade e o segundo por outra mulher, mais velha, com nível médio de
instrução.
As únicas iodizações presentes no corpus, que estão marcadas em amarelo, no
quadro 3, ocorrem em trabalho (verbo e substantivo), trabalha, trabalhar, trabalhando
e olha produzidas, quase todas, por informantes do sexo feminino, mais velhos e de
pouca escolaridade. Esse resultado também vai ao encontro do trabalho de Brandão
(2007), quem demonstra que a variante [j] ocorre, preferencialmente, na fala dos
indivíduos mais velhos. No entanto, coincide, parcialmente, com o que é apresentado
por Machado-Soares (2009). Segundo essa linguista, pelo fato de [j] apresentar menor
prestígio, seria mais comum na fala de homens com baixa escolaridade. No corpus ora
analisado, houve somente dois vocábulos (trabalho – 1 oco. – e trabalha – 3 ocos.)
proferidos por um homem mais velho (da faixa C). Os demais vocábulos foram
produzidos por mulheres, uma de meia idade (faixa B) e outra mais velha (faixa C).
Ainda quanto aos vocábulos em que incidem as iodizações no corpus do PB,
percebe-se que, assim como mostrou Ferreira (2011) em seus estudos, a vocalização
ocorre preferencialmente em verbos: dos treze dados de [j], apresentados no quadro 3,
apenas dois estão em substantivos; os outros onze aparecem em formas verbais.
No que toca ao contexto subsequente que favorece a vocalização, os resultados
demonstrados no quadro 3, também estão de acordo com o que é exposto por Santos &
Chaves (2012), para as quais a variante [j] ocorre antes da vogal baixa [a], como
42
O vocábulo mulher foi produzido com a variante [l], também, por outros informantes.
97
acontece no corpus do PB: das treze ocorrências de vocalização de //, oito estão antes
da referida vogal.
Os únicos cancelamentos presentes no corpus aparecem nos vocábulos filho e
filha, na fala de um informante mais velho, do sexo masculino e de baixa escolaridade,
confirmando a hipótese inicial. Além disso, ressalte-se que esse resultado está de acordo
com Brandão (2007), segundo a qual, os casos de cancelamento de // ocorrem,
preferencialmente, quando há, no contexto antecedente, a vogal coronal [i].
Merece destacar, ainda, que a vocalização, a despalatalização e a
despalatalização seguida de iode são mais frequentes em Nova Iguaçu ([j] – 9/13 ocos.;
[l] – 51/64 ocos e [lj] – 237/322 ocos.). Já no que respeita ao cancelamento, uma
ocorrência foi encontrada em Nova Iguaçu e a outra em Copacabana.
(b) As variantes de // no corpus do PE
Como pode ser verificado na tabela 2 e no gráfico 2, na RMLIS, a lateral
palatalizada, com índice de frequência de 54.1% (941 ocorrências), também aparece
como a variante preferencial em contraste com a manutenção da lateral palatal, que
atinge o índice de 37.6% (653 ocorrências). As demais variantes, como no PB,
apresentam baixa representatividade, a saber: despalatalização + iode ([lj]) – 6.2%;
despalatalização ([l]) – 1%; iodização ([j]) – 1% e síncope ( ) – 0.1%.
Tabela 2. Índices referentes à variação de / / na RMLIS
ÍNDICES Variação de // na RMLIS
Variantes [lj] [] [lj] [l] [j]
Ocorrências 941/1739 653/1739 107/1739 20/1739 17/1739 1/1739
Percentuais 54.1% 37.6% 6.2% 1.2% 1% 0.1%
98
Gráfico 2. Distribuição das variantes de // / na RMLIS
54%
38%
6%
1% 1% 0%
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
Lateral Palatalizada
Manutenção da palatal
Despalatalização + Iode
Despalatalização
Iodização
Síncope
Comparando os resultados percentuais obtidos nos dois corpora, percebe-se que,
embora os índices da lateral palatalizada sejam bem próximos no PB e no PE (55.4% e
54.1%, respectivamente), a manutenção da lateral palatal ocorre com mais frequência no
PE (37.6% frente aos 28.5% do PB). Com exceção da vocalização (PB – 0.5% – e PE –
1%), as demais variantes de // foram menos produtivas no PE. (cf. tabelas 1 e 2)
Um índice percentual de ocorrência da manutenção de // maior para o PE do
que para o PB já era esperado. Embora não tenham sido encontrados estudos
variacionistas sobre o comportamento da lateral palatal no PE, no momento da recolha
dos dados, já era possível perceber que o número de ocorrências de [], nas localidades
portuguesas estudadas, era maior do que o encontrado nas do Brasil. Ademais, o fato de
a lateral palatalizada ser a variante mais encontrada no corpus do PE, também não
surpreende, uma vez que, além de essa variante ser a preferida no PB (como atestam
Pontes, 1973 e Cristófaro-Silva, 1999) ela também é, de alguma maneira, mencionada
em estudos que caracterizam articulatoriamente o fonema //, não só no espanhol
europeu, como também no PE (cf. QUILIS & FERNÁNDEZ, 1969; MARTINS et alii,
2008; MARTINS et alii, 2010).
Os baixos índices de algumas variantes apresentados na tabela 2, de certa
maneira, também já eram esperados. Assim como foi dito acima, ainda que não tenham
sido encontrados trabalhos que descrevessem a variação de //, no Português Europeu,
esperava-se que, à semelhança do que ocorre no Português do Brasil, a iodização, a
despalatalização e a síncope da lateral palatal não fossem comuns nas regiões ora
99
analisadas, visto que nenhuma das duas é considerada interiorana ou rural: Oeiras é
atualmente o município/concelho que apresenta um dos mais elevados índices de
qualidade de vida de Portugal e Cacém é uma das maiores freguesias de Agualva-
Cacém que, embora ainda seja considerada uma cidade-dormitório, é a quinta maior
cidade da área metropolitana de Lisboa e a décima maior de Portugal.
Ainda no que se relaciona à vocalização da lateral palatal, vale acrescentar uma
informação importante encontrada no estudo de Madureira (1999). Segundo ela, o
português falado em Portugal é a única língua latina que não registra, em momento
algum de sua história, uma transformação da lateral palatal para a semivogal palatal.
Esse dado é bastante curioso, não só porque a vocalização aparece no corpus do PE ora
analisado, mas principalmente, porque ocorre num índice percentual mais alto do que o
encontrado no corpus do PB (cf. tabelas 1 e 2)
Assim como foi feito com o corpus do PB, vale destacar em que vocábulos estão
incidindo as variantes menos produtivas no corpus do PE. Dessa forma, criou-se o
quadro 4, como pode ser visto abaixo.
Quadro 4. Vocábulos em que incidem as variantes menos
produtivas no corpus da RMLIS
Vocábulo Total de
Ocos.
Ocos. de
[ ]
Ocos. de
[j]
Ocos. de
[ l ]
Ocos. de
[ lj ]
Filho 25 - - 2 23
Filhos 17 - - 1 16
Filha 8 1 - - 7
Filhas 3 - - - 3
Velhos 1 - - - 1
Velha 1 - - - 1
Velhas 6 - - - 6
Velhote 1 - - - 1
Trabalhar 6 - - - 6
Trabalho (Substantivo)
6 - 4 - 2
Trabalhava 3 - - - 3
Trabalhavam 1 - - - 1
Trabalha 2 - 1 - 1
Olho (Substantivo)
4 - - - 4
Olhos 5 - 2 - 3
Olha 10 - 9 - 1
Milho 6 - - - 6
Folha 2 - - - 2
Folhas 2 - - - 2
Melhor 2 - - - 2
Guerrilha 1 - - - 1
100
Vocábulo Total de
Ocos.
Ocos. de
[ ]
Ocos. de
[j]
Ocos. de
[ l ]
Ocos. de
[ lj ]
Ilhas 1 - - - 1
Mulher 6 - - - 6
Mulheres 2 - - - 2
Milhões 2 - - - 2
Lhe 15 - - 10 5
Lhes 2 - - 2 -
Olhe 1 - 1 2 -
Trabalhinho 2 - - 1 -
Trabalhinhos 2 - - 1 -
calhar 1 - - 1 -
Total 145 1 17 20 107
As palavras marcadas em azul são as únicas produzidas com a variante
despalatalizada acompanhada de iode ([lj]). Essa variante, assim como no PB, não
parece estar sendo influenciada por variáveis extralinguísticas, uma vez que as
ocorrências se distribuem entre as três faixas etárias (A – 30 ocos.; B – 34 ocos. e C –
43 ocos.), os três níveis de escolaridade (fundamental – 37 ocos.; médio – 33 ocos. e
superior – 37 ocos.) e os dois gêneros (homem – 46 ocos. e mulher – 37 ocos.). No
entanto, percebe-se que, diferentemente do que aconteceu no PB, pelos índices
numéricos expostos anteriormente, há uma leve tendência de a variante [lj], no PE, estar
sendo preferida pelos homens mais velhos.
Aqui, as observações feitas com relação a essa variante no PB também são
pertinentes. Assim como aconteceu no corpus do PB, no do PE a despalatalização
seguida de iode ocorre mais quando // está antecedido de vogais coronais. Das 107
ocorrências de [lj] no PE, 73 ocorrem quando as vogais que precedem // são [i], [e] e
[]. Como foi mostrado anteriormente, esse contexto é apontado como favorecedor de
[lj] nos estudos de Machado-Soares (2008).
O quadro 4 também mostra que os vocábulos olho (substantivo) – 4 ocos. –,
olhos – 3 ocos. – e olha – 1 oco. –, embora ocorram também com [] ou com [lj], no
PE43
(cf. tabelas do anexo 2), se mostram receptivos à variante [lj], assim como no PB.
Esse dado corrobora a hipótese apresentada anteriormente, em que se faz referência ao
trabalho de Pontes (1973). Parece que não é só no PB que não há distinção, na fala,
43
Esses vocábulos somente ocorrem com [lj], na RMLIS, no Concelho de Oeiras.
101
entre as palavras “óleo” e “olho” (verbo), já que, no PE, palavras da mesma família que
a mencionada anteriormente estão sendo pronunciadas, esporadicamente, com a
inserção do iode.
No corpus do PE as palavras filho – 23 ocos. –, filhos – 16 ocos. – e filha – 7
ocos. –, à semelhança do que aconteceu no PB, são as que mais se mostram receptivas à
despalatalização seguida de iode. Essa informação corrobora o que foi apresentado
anteriormente sobre o comportamento dessa variante no PB, na medida em que a
realização [lj] pode, provavelmente, estar ocorrendo devido à própria origem do fonema
palatal, como apontam os linguistas Câmara Jr. (1979) e Silveira (1986).
A variante despalatalizada ([l]) aparece, no corpus, nas palavras marcadas em
verde, como mostra o quadro 4. No PE, assim como no PB, a hipótese de que essa
variante ocorreria somente na fala dos indivíduos menos escolarizados, não procede,
uma vez que as ocorrências de [l] aparecem de maneira bem distribuída entre os três
níveis de escolaridade: 8 ocos., no fundamental; 7, no médio, e 5, no superior. Assim
sendo, provavelmente, são fatores de ordem linguística que devem estar favorecendo o
uso da despalatalizada.
No estudo ora realizado, os pronomes lhe e lhes foram analisados como parte do
vocábulo fonológico. Assim sendo, ora esses pronomes poderiam estar figurando em
sílaba postônica, como em “restou-lhe”, ora poderiam estar em sílaba pretônica, como
em “lhe dou”. Dessa forma, a hipótese de que sílabas tônicas influenciariam o uso de [l]
parece não proceder, com o corpus do PE, já que é o vocábulo lhe, que se mostra mais
receptivo a essa variante.Vale a pena ressaltar que esse resultado pode estar sendo
influenciado pelo perfil linguístico das comunidades ora investigadas, já que o pronome
lhe é muito mais produtivo no PE do que no PB.
Aqui, o que parece estar favorecendo a implementação de [l] é a vogal [+ cor]
em contexto subsequente. O mesmo que indicou Brandão (2007) para o PB parece estar
se verificando no PE: dos 8 vocábulos que são concretizados com [l], 5 aparecem no
ambiente mencionado (cf. quadro 3). Vale a pena salientar que os três vocábulos que
não apresentam vogal [+ cor], em contexto subsequente, (filho, filhos, calhar) foram
produzidos pelo mesmo homem – jovem e de baixo nível de escolaridade – o que pode
estar configurando uma característica idioletal desse informante.
As iodizações presentes no corpus do PE estão marcadas em amarelo, no quadro
4. Conforme pode ser verificado, [j] somente ocorre nos vocábulos trabalho
102
(substantivo), trabalha, olha, olhe e olhos produzidos por homens e mulheres dos três
níveis de escolaridade. Dessa forma, parece que essa variante não está sendo
influenciada pelo nível de escolaridade, uma vez que, por mais que seja mais comum
entre falantes dos níveis fundamental e médio (8 ocos. e 7 ocos., respectivamente), é
também implementado por 2 indivíduos de nível superior. Vale ressaltar que, no tocante
à faixa etária, a vocalização não ocorre na fala dos mais jovens, distribuindo-se,
portanto, entre os de meia idade (9 ocos.) e os mais velhos (8 ocos.). Esse resultado, em
parte, não só é parecido com o que é apresentado no estudo sobre o PB, como também
corrobora o que é defendido por Brandão (2007).
O único cancelamento presente, no corpus do PE, aparece no vocábulo filha,
proferido por um informante mais velho, do sexo feminino e de baixa escolaridade,
confirmando, parcialmente, a hipótese inicial, uma vez que, sendo o cancelamento uma
variante sem prestígio, o mais comum seria ele aparecer na fala de um homem e não na
de uma mulher.
Merece ser salientado, ainda, que a vocalização, a despalatalização e a
despalatalização seguida de iode são mais comuns na fala de Oeiras ([j] – 16/17 ocos.;
[l] – 14/20 ocos e [lj] – 74/107 ocos.). Também, em Oeiras, foi encontrado o único caso
de cancelamento da RMLIS.
6.1.2. As variáveis independentes
6.1.2.1 Linguísticas
(a) Contexto Antecedente
Pelo que se observa na literatura especializada sobre o PB, a variação de //
pode ser influenciada por elementos adjacentes à esquerda ou à direita.
Para Castro (2006), por exemplo, a manutenção de [] seria favorecida pelas
vogais [i] e [u]. Contrariando, em parte, o estudo precedente, Ferreira (2011) demonstra
que, no corpus VARSUL, as vogais coronais, em posição anterior a //, parecem
favorecer a regra da despalatalização. Já para Brandão (2006), a iodização seria
favorecida pela presença das vogais médias ([e], [o], [], []) em contexto antecedente.
103
Para Freire (2011), no que diz respeito ao contexto fonológico precedente, dois
fatores se mostraram importantes para a concretização de []: vogais coronais e vogal
dorsal. Corroborando, em parte, o estudo anterior, de acordo com Santos & Chaves
(2012), o [] ocorre, preferencialmente, depois da vogal média alta anterior [e]
enquanto as variantes [j] e [ø] ocorrem depois da vogal média anterior aberta [], e [lj]
tende a ocorrer depois da vogal [e].
No que respeita ao PE, vale ressaltar que os estudos de Monteiro (2012),
também fazem referência à importância das vogais adjacentes para a configuração de
//.
Assim sendo, para observar o que acontece nos corpora ora trabalhados, resolveu-
se utilizar esta variável independente, que foi constituída pelos seguintes fatores:
Vogal [i]
Eu pretendo ter uma f[i]lha. (COP A1M)
Acho que quero ter f[i]lhos (CAC A1H)
Vogal []
nem m[]lhor nem pior (CAC C3H)
Vogal [e]
Eu dou cons[e]lho. (COP A1M)
do conc[e]lho de Sintra (CAC C3M)
Vogal []
Um cara mais v[]lho. (COP A1H)
na frente de pessoas mais v[]lhas (CAC B2 M)
Vogal [a]
às vezes a educação é f[a]lha. (COP A2H)
eu trab[a]lho na Ferreira Dias (CAC C3M)
104
Vogal []
não querem trab[]lhar (OEI A3M)
Vogal []
O que se []lha nas ruas (COP A1H)
é para os []lhos (OEI B1M)
Vogal [u]
Eu só vejo a patr[u]lhinha (COP A2M)
muita música...muito bar[u]lho (CAC A2H)
Vogal [o]
Ao [o]lhar a política como algo nocivo. ( COP A2H)
quem tem um [o]lho é rei (OEI C1H)
(b) Contexto Subsequente
Assim como o contexto antecedente, o subsequente também se mostrou
importante em diversos estudos sobre a variação de // no PB. Para Ferreira (2011), por
exemplo, as vogais coronais, em posição subsequente à lateral palatal favorecem a
despalatalização. Já os estudos de Machado-Soares (2008) comprovaram que os
segmentos subsequentes altos favorecem [lj].
Para Freire (2011), o fator que mais propicia a manutenção da lateral palatal é
vogal labial. De acordo com Santos & Chaves (2012), [] ocorre antes da vogal alta
posterior [u] – o que está parcialmente de acordo com o que é apresentado por Freire
(2011) – enquanto que as variantes [j] e ocorrem, basicamente, antes da vogal baixa
[a], e [lj] tende a ocorrer antes da vogal nasal [ĩ].
Para Monteiro (2012), as vogais [i], [u] e [a], em posição subsequente, alteram o
perfil acústico de // em três dialetos do PE: os de Aveiro, Bragança e Porto.
105
Dessa forma, com a intenção de verificar se o contexto subsequente, de alguma
forma, influencia a variação em foco, resolveu-se criar esta variável independente
constituída pelas seguintes vogais:
Vogal [i]
A mãe escolh[i] (COP B1M)
estou aqui encolh[i]da (CAC C1M)
Vogal [e]
Eu sempre trabalh[e]i numa área. (COP B2H)
é capaz de me acolh[e]r (OEI C1H)
Vogal []
É só por ser mulh[]r. (COP B2H)
e depois saltava para cima da colh[]r (OEI C2M)
Vogal [a]
a Via Light não é aconselh[a]vel (NIG A3M)
ganhar dinheiro sem trabalh[a]r (CAC A1H)
Vogal []
nós da classe trabalh[]dora (CAC C2H)
Vogal []
Poderia ser melh[]r. (COP B 3 H)
é muito melh[]r já vêm condimentadas (CAC A2H)
Vogal [u]
Eu trabalh[u] na área. (COP B3H)
ter filh[u]s ou não (CAC A2H)
106
e a situação não melh[u]rou (CAC B2M)
Vogal [o]
é orgulh[o]so (NIG B3H)
gostei...maravilh[o]so...entrei em setenta e quatro (CAC C1H)
Vogal [i ]
Aquela manilh[ i ]nha (COP C1H)
e ter o meu trabalh[ i ]nho (OEI A2H)
Vogal [e]
Tão escolh[ e ]do o filme. (COP B3H)
(não ocorre [ e ] em contexto subsequente no corpus da RMLIS)
Vogal []
Um monte de gente trabalh[]do (COP B3M)
graças a Deus vão trabalh[]do (OEI B1M)
Vogal [o ]
Os soldados de todos os batalh[ õ]es. (COP C 3 M)
milh[ õ]es e milhões de todos que são pobres (OEI C1M)
(c) Número de sílabas e tonicidade do vocábulo
Nessa variável, leva-se em consideração não só a quantidade de matéria fônica
do vocábulo em que está inserido o segmento, como também a tonicidade da sílaba em
que ele se encontra.
Ferreira (2011) estuda em separado a dimensão do vocábulo e a tonicidade da
sílaba. Assim, de acordo com a linguista, a despalatalização mostra um comportamento
diferenciado das demais variantes, já que a vocalização e o apagamento encontram
favorecimento em vocábulos dissílabos, enquanto a despalatalização aparece em maior
107
número em contexto trissílabo. Já para Freire (2011), as trissílabas são as que mais
favoreceram a manutenção de [].
Formou-se, assim, a variável com os seguintes fatores:
Dissílabo oxítono
Se torna algo muito melhor. (COP A2H)
agora se calhar cada vez mais (CAC A3H)
Dissílabo paroxítono
Passam aos filhos o que eles têm. (COP A2H)
queria abrir um novo talho (CAC B1H)
Trissílabo/Polissílabo oxítono
Praticamente dentro do batalhão. (COP A2M)
sempre vivi das nove às nove a trabalhar (CAC B1H)
Trissílabo/Polissílabo paroxítono
Ele teve uma oportunidade de trabalho. (COP A2M)
até ajudam uma pessoa velhota (OEI A1H)
(d) Tonicidade da sílaba em que incide o segmento
Com esse grupo, procura-se averiguar se a maioria das ocorrências das
palatalizadas figura nas sílabas de maior ou menor tonicidade.
Segundo Brandão (2007), a sílaba tônica favorece a variante [l]. Para Machado-
Soares (2008), o ambiente tônico favorece as variantes [lj] e [j] enquanto que [l] é
favorecida em ambiente átono. Já Ferreira (2011), não sendo tão detalhista, apenas
menciona que a sílaba tônica favorece a despalatalização.
No momento da recolha dos dados, tanto do PB quanto do PE, pareceu ser o
ambiente tônico favorecedor da concretização de [].
Assim sendo, para não só verificar se essa suposição procede, como também
para averiguar se os resultados encontrados em trabalhos sobre o PB podem ser os
108
mesmos verificados com os corpora deste estudo, resolveu-se controlar esta variável,
constituída pelos seguintes fatores:
Sílaba Tônica
Como se sendo advogada ela fosse melhor. (COP A3H)
os velhotes (OEI A1H)
Sílaba Pretônica
Você passa muita humilhação. (COP A1M)
as pessoas (...) são acolhedoras (OEI A3H)
Sílaba Postônica
É a velha e conhecida morosidade. (COP A 3 H)
que trabalham mais o abdominal (OEI A3H)
(e) Classe do Vocábulo
A análise dessa variável procura investigar se a classe morfológica dos
vocábulos encontrados no corpus pode exercer alguma influência na realização das
variantes ora estudadas.
Para Machado-Soares (2002) e Castro (2006), substantivos e adjetivos
favorecem a manutenção da lateral palatal, enquanto os verbos a desfavorecem. Já
Brandão (2007) constata que a variante [lj] é favorecida, sobretudo, por nomes e a
variante [j] sofre influência tanto de verbos quanto de substantivos.
Para Machado-Soares (2008) e para Ferreira (2011), a classe morfológica
mostrou-se bastante irregular. Segundo a primeira, os substantivos favorecem [lj];
verbos, [lj] e [j]; e adjetivos, [lj]. Já para a segunda, enquanto a vocalização e o
apagamento são favorecidos pelos verbos, a aplicação da lateral alveolar acontece nos
substantivos.
Dessa forma, os fatores definidos para esta variável foram os seguintes:
109
Substantivo
aí como eu tenho uma filha com ele (COP A 1 M)
há sempre um trabalho (CAC A1H)
Adjetivo
a igreja é maravilhosa. (COP A 1 M)
uma pessoa velha (CAC A1M)
Pronome
só lhes falta oportunidade. (COP A 2 H)
quando começaram a pagar-lhe o ordenado (CAC A1M)
Numeral
ele poderia fazer milhões de coisas. (COP A 2 M)
um milhão (OEI A1H)
Verbo
a gente trabalha. (COP A3H)
eu trabalhava no ginásio (OEI A2M)
Somente para o PE
Expressão “se calhar”
se calhar trabalham mais (OEI A3H)
(f) Presença/ausência de outra palatal/palatalizada no vocábulo
Esse grupo foi formado com base em diferentes (e por vezes, paradoxais)
hipóteses: (i) a presença de palatal/palatalizada levaria à manutenção da lateral palatal
ou à despalatalização, por um processo de dissimilação? (ii) a presença de lateral
alveolar poderia, por outro lado, condicionar a ocorrência da variante [l], por um
processo de assimilação?
Essa variável, dessa forma, foi constituída pelos seguintes fatores:
Presença de palatalizada [] / []
com duas filha[]. (COP A1M)
fiz uma operação no []oelho. (COP A2M)
110
eu e[]colhia a Grécia (CAC A1H)
é os filho[] de um lado os pais no outro (CAC A2H)
Presença de palatal []
uma favela... melhorzi[]a. (COP B1H)
e ter o meu trabalhi[]o (OEI A2H)
Ausência de palatal/palatalizada
um trabalho evangélico. (COP B1H)
ou melhor naquilo (OEI A2H)
(g) Frequência do vocábulo no corpus
Segundo Ferreira (2011), a frequência da palavra pode influir no processo de
variação. Assim sendo, como verbos e substantivos são as palavras que mais aparecem
no corpus, isso pode indicar que o uso mais frequente de vocábulos dessas classes
propicia a variação, ao contrário daqueles menos frequentes. De acordo com Yaeger-
Dror (1996 apud Ferreira, 2011), a frequência das palavras é um fator crítico que
influencia a mudança por difusão lexical.
Ainda segundo Ferreira (2011, p. 64), “essa afirmação está de acordo com a
proposta difusionista, pela qual os itens mais utilizados são aqueles que mais se prestam
a processos assimilatórios”.
Como a frequência de cada vocábulo presente nos corpora era bastante
destoante – havia uns com apenas uma ocorrência e outros com 172 – optou-se por
seguir o modelo apresentado tanto em Díaz-Campos & Ruiz-Sánches (2008), como em
Ferreira (2011). De acordo com esses autores, a frequência deve ser divida em níveis, e
vocábulos que aparecem mais de 80 vezes em um corpus são considerados de alta
frequência (cf. DÍAZ-CAMPOS & RUIZ-SÁNCHES, 2008).
Assim sendo, esta variável ficou constituída pelos seguintes fatores:
111
Frequência baixa (1 a 30 ocorrências no corpus)
Frequência média (31 a 80 ocorrências no corpus)
Frequência alta (81 ou mais ocorrências no corpus)
6.1.2.2 Extralinguísticas
(a) Área geográfica
Entre os grupos de fatores extralinguísticos tradicionalmente considerados em
pesquisas de cunho sociolinguístico, costuma-se inserir a origem geográfica dos
locutores, para efetivar-se o controle da variação diatópica. Tal controle é motivado pela
premissa de que o comportamento linguístico de falantes de uma mesma língua pode
diferenciar-se de acordo com as características do ambiente sócio-geográfico que
ocupam e que determinam situações sociais específicas.
A variável que diz respeito à área geográfica, portanto, tem considerável peso no
que concerne à variação/mudança linguística, fato já largamente demonstrado no âmbito
da Dialectologia e observado desde os primórdios da Sociolinguística: muitas vezes essa
variável já vem indicada no título do trabalho, como em Labov (1966), The social
estratification of English in New York, ou em Silva-Corvalán (1979), An investigation of
phonological and syntactic variation in spoken Chilean Spanish.
A variável área geográfica, na pesquisa ora empreendida, tem a função de
controlar o comportamento dos dados em relação às quatro localidades que constituem
os pontos de inquérito da pesquisa, uma vez que se acredita que uma localidade é
primordialmente, um espaço social. Tais comunidades encontram-se distribuídas pela
RMRJ – Nova Iguaçu e Copacabana – e pela RMLIS – Oeiras e Cacém.
Parte-se da hipótese de que essas comunidades podem apresentar
comportamento linguístico diferenciado em decorrência de características fisiográficas,
socioeconômicas, históricas, culturais, entre outras.
(a) Região Metropolitana do Rio de Janeiro
Com base na Lei nº 1.227/87, destinada à aprovação de um Plano de
Desenvolvimento Econômico e Social (1988/1991), o Estado do Rio de Janeiro foi
112
dividido em oito regiões principais (Metropolitana, Noroeste Fluminense, Norte
Fluminense, Baixadas Litorâneas, Serrana, Centro-Sul Fluminense, Médio Paraíba e
Costa Verde) que, paulatinamente, sofreram algumas alterações até atingir a
configuração atual, representada na figura 3.
Figura 3. Divisão Regional do Estado do Rio de Janeiro
Fonte: Fundação CIDE
Dentre as Regiões apresentadas no mapa, destaca-se a Metropolitana que abarca
76% dos cerca de onze milhões de habitantes do Estado. Este índice pode ser atribuído
ao crescente processo de migração para os grandes centros urbanos que teve início, no
Brasil, a partir da década de 1940. Atualmente, acredita-se que, na área, se concentre
não só o capital financeiro, mas também a infraestrutura e a força de trabalho, já que
grande parte das indústrias nela se localiza, o que implica oportunidades empregatícias
que englobam os setores financeiro, comercial, educacional e de saúde, além das
atividades públicas.
Em dissonância com esses aspectos, muitos pontos contraditórios permeiam a
Região. Embora apresente todas essas possibilidades de ascensão, igualmente se
verificam desigualdades sociais salientes, não sendo atendidas as necessidades básicas
da população em comunidades mais específicas. Enquanto os Municípios do Rio de
Janeiro e de Niterói são reconhecidamente mais prestigiados, recebendo grandes
113
investimentos, as localidades que integram a chamada Baixada Fluminense (Japeri,
Queimados, Nova Iguaçu, Mesquita, Belford Roxo, Nilópolis, São João de Meriti e
Duque de Caxias) são classificadas como periféricas e como cidades dormitório. De
acordo com o SEBRAE/RJ, apesar de apresentarem um pólo petroquímico, químico e
plástico (Duque de Caxias, Belford Roxo e São João de Meriti) e alguns pólos
industriais – vestuário (Nova Iguaçu e São João de Meriti) e papel/editorial/gráfica
(Duque de Caxias e São João de Meriti) –, grande parte de seus habitantes desenvolve,
na cidade do Rio de Janeiro, suas atividades profissionais.
Nova Iguaçu
A área em que hoje se encontra Nova Iguaçu teve sua história inicial tumultuada
com a invasão dos holandeses que fizeram aliança com os índios Tupinambás. Com o
término dessa aliança, os índios foram dizimados e o território dividido em grandes
extensões de terra, denominadas sesmarias, que foram ocupadas por colonos
portugueses. A partir de então, as terras passaram a ser exploradas com o plantio de
lavouras e, devido à qualidade do barro das baixadas, foram criadas também as olarias.
A grande produção de café, durante o século XIX, além de ter enriquecido a muitos,
ocasionou a construção de uma estrada de ferro para o transporte da produção.
De início, a região correspondia a 1 303,47 km² de extensão. Atualmente, com
566,6 km2, o município de Nova Iguaçu, criado por decreto de 15/01/1833, tem
801.746 habitantes (IBGE), sendo, depois de Niterói e da capital, o que apresenta maior
contingente populacional. Até meados do século XX, seu território abarcava os atuais
municípios de Duque de Caxias, Japeri, Queimados, Nilópolis, Belford Roxo e
Mesquita, que dele se foram desmembrando de 1943 (Duque de Caxias) a 1999
(Mesquita). Compõe-se de cinco distritos: Nova Iguaçu, Vila de Cava, Cabuçu, Austin e
Comendador Soares.
Situada às margens da mais importante rodovia do país, a Presidente Dutra, que
liga o Rio de Janeiro a São Paulo, é cortada por 300 km de rodovias (federais, estaduais
e municipais). Para lazer e cultura, a cidade oferece teatros, cinemas e bibliotecas e
parques ambientais, como a Reserva Biológica de Tinguá, o Parque Municipal e o
Parque Botânico de Nova Iguaçu.
114
A cidade, que, em suas origens, constituía um dinâmico pólo comercial, destaca-
se, hoje, na Região Metropolitana (cf. figura 4), por apresentar migrantes de outras áreas
do país, sobretudo da Região Nordeste e do Estado de Minas Gerais, mantendo sua
população uma permanente interação com os moradores da capital. Assim sendo,
acredita-se que essa comunidade de fala seja um campo de observação de alto interesse
para a análise de possíveis efeitos do contato interdialetal e de fortes contrastes
socioeconômicos. (cf. BRANDÃO et alii, 2012).
Figura 4. Segmentação político-administrativa da Região Metropolitana
do Estado do Rio de Janeiro
Fonte: http://www.baixarmapas.com.br/mapa/regiao-metropolitana/
Copacabana
A cidade/município do Rio de Janeiro é composta por 33 Regiões
Administrativas: Anchieta, Bangu, Barra da Tijuca, Botafogo, Campo Grande, Centro,
Cidade de Deus, Complexo do Alemão, Copacabana (cf. figura 5), Guaratiba, Ilha de
Paquetá, Ilha do Governador, Inhaúma, Irajá, Jacarepaguá, Jacarezinho, Lagoa,
Madureira, Maré, Méier, Pavuna, Penha, Portuária, Ramos, Realengo, Rio Comprido,
Rocinha, Santa Cruz, Santa Teresa, São Cristóvão, Tijuca, Vigário Geral, Vila Isabel.
115
A Região Administrativa de Copacabana tem uma população de 161.191
habitantes, correspondentes a 2,55 % do total da população da Cidade do Rio de
Janeiro.
Figura 5. Segmentação político-administrativa de Copacabana dentro
do Município do Rio de Janeiro
Fonte: IBGE
Observa-se que a sua população é urbana e apresenta uma participação feminina
relativamente superior à masculina em uma proporção de 74,73 homens para cada 100
mulheres. A maioria da população encontra-se na faixa etária entre 50 anos ou mais,
seguida pela faixa de 30 a 49 anos.
O bairro possui uma extensão territorial de 5,0 km², correspondente a 0,42 % da
do Município do Rio de Janeiro. Verifica-se uma concentração de 31.887,5 habitantes
por km² nessa área.
A Região Administrativa de Copacabana está classificada como de alto
desenvolvimento humano, ocupando a primeira posição no ranking das Regiões
Administrativas, conforme critério do IDH (Índice de Desenvolvimento Humano).
Além disso, apresenta, no item saúde, longevidade (esperança de vida ao nascer)
considerada alta (77,7 anos) em relação ao Município do Rio de Janeiro (70,2 anos) e, a
taxa de mortalidade infantil corresponde a 31 óbitos por mil nascidos vivos, enquanto a
taxa municipal é de 213 óbitos por mil nascidos vivos.
116
É importante observar que a taxa média de alfabetização na Região
Administrativa (98,5%) é mais alta que a da Cidade do Rio de Janeiro (95,6%), tal
como a média de anos de estudo que se apresenta maior (10,0 anos) que a da cidade (6,8
anos).44
(b) Região Metropolitana de Lisboa
De acordo com a lei nº 45/2008 de 27 de agosto, das áreas metropolitanas
criadas em 2003, só subsistiram as chamadas clássicas: Área Metropolitana do Porto e
Área Metropolitana de Lisboa, sendo as restantes reorganizadas em Comunidades
Intermunicipais.
A Área Metropolitana de Lisboa engloba 18 municípios, agrupados em duas
sub-regiões: Grande Lisboa e Península de Setúbal. É o maior centro populacional do
país, onde se concentram 2.821.697 habitantes (2011), “cerca de ¼ da população
portuguesa”, bem como 30% das empresas nacionais (cf. quadro 5 e figura 6)45
.
44
Dados extraídos de http://bis.sebrae.com.br/GestorRepositorio/ARQUIVOS_CHRONUS. Acesso em:
23/11/2013. 45
Dados extraídos de http://www.aml.pt. Acesso em: 10/12/2013.
117
Quadro 5. Municípios/Concelhos que fazem parte da Área Metropolitana de Lisboa
Área Metropolitana de Lisboa
Município Superfície
(km²)
População
(2011)
Densidade
populacional
(hab/km²)
Freguesias Subregião
Alcochete 128,50 17 569 137 3 Península de Setúbal
Almada 70,20 174 030 2 479 11 Península de Setúbal
Amadora 23,77 175 135 7 368 11 Grande Lisboa
Barreiro 33,81 78 764 2 330 8 Península de Setúbal
Cascais 99,07 206 429 2 084 6 Grande Lisboa
Lisboa 83,84 547 631 6 532 53 Grande Lisboa
Loures 160,37 205 054 1 279 18 Grande Lisboa
Mafra 291,42 76 685 263 17 Grande Lisboa
Moita 55,08 66 029 1 199 6 Península de Setúbal
Montijo 348,09 51 222 147 8 Península de Setúbal
Odivelas 26,14 144 549 5 530 7 Grande Lisboa
Oeiras 45,84 172 120 3 755 10 Grande Lisboa
Palmela 462,87 62 805 136 5 Península de Setúbal
Seixal 93,58 158 269 1 691 6 Península de Setúbal
Sesimbra 195,01 49 500 254 3 Península de Setúbal
Setúbal 170,57 121 185 711 8 Península de Setúbal
Sintra 316,06 377 835 1 196 20 Grande Lisboa
Vila Franca de
Xira 317,68 136 886 431 11 Grande Lisboa
Total 2 921,90 2 821 697 966
211
Fonte: http://www.aml.pt
Figura 6. Portugal dividido por Distritos
(Região Metropolitana de Lisboa circulada)
Fonte: http://eportuguese.blogspot.com.br
118
Oeiras
Oeiras, com uma área de 45,84 Km2, 172.120 habitantes e 10 freguesias (cf.
quadro 5), é um dos 18 municípios/concelhos do Distrito de Lisboa. Atualmente o
concelho de Oeiras apresenta um dos mais elevados índices de qualidade de vida de
Portugal, tendo deixado de ser considerado apenas um local de passagem entre Lisboa e
Cascais e se assumindo como sede de importantes empresas ligadas às novas
tecnologias e à prestação de serviços (cf. figura 7).
Figura 7. Distrito de Lisboa dividido em Concelhos
(Região Metropolitana da Grande Lisboa)
Fonte: http://www.eb1-olhalvo.rcts.pt/
Cacém
Cacém é uma freguesia portuguesa, pertencente à cidade de Agualva-Cacém e
ao concelho de Sintra (cf. figura 8). A freguesia do Cacém foi criada em 3 de julho de
2001, pela Lei n.º 18-C/2001, que extinguiu a antiga freguesia de Agualva-Cacém e
criou as novas freguesias de Agualva, Cacém, Mira-Sintra e São Marcos. Das quatro
freguesias constituintes da cidade de Agualva-Cacém, a do Cacém é a segunda maior.
A cidade de Agualva-Cacém, onde se encontra a freguesia do Cacém, ocupa
1050 ha, que corresponde 3,3% da área total do concelho de Sintra e conta com uma
população estimada em quase 120 mil habitantes, o que perfaz cerca de 23% da
119
população total residente no concelho. É um dos 15 maiores centros populacionais do
país, fruto do acelerado desenvolvimento urbano ocorrido nas últimas décadas.
Agualva-Cacém, embora ainda seja considerada uma cidade-dormitório, é a
quinta maior da área metropolitana de Lisboa, e a décima maior de Portugal. A indústria
é o seu principal sustento econômico: dois parques industriais de grande dimensão se
encontram na cidade. No entanto, é crescente e notável, também, uma dinâmica
comercial. Como a sua área urbana cresceu rápida e desordenadamente, apresenta
problemas e desafios de caráter urbanístico e ambiental.46
Figura 8. Concelho de Sintra (em destaque freguesia de Cacém)
Fonte: http://www.visitarportugal.net/
Com este grupo de fatores, procura-se, então, investigar como se configura a
variação do fonema //, tanto nas localidades da RMRJ quanto nas da RMLIS
focalizadas neste estudo. Assim sendo, supõe-se que a influência da variável diatópica
no uso de cada variante, em especial, da lateral palatal e da lateral palatalizada, possa
ser explicada à luz, dentre outros fatores, de hipóteses que levam em conta (1) a questão
46
Dados extraídos de http://mwmservices.net/adps/ADPS_Comunicado_01.html. Acesso em: 10/12/2013
120
sócio-econômica e (2) maior ou menor importância (econômica, cultural) de cada
localidade dentro da região metropolitana da qual faz parte.
Nas comunidades em que o poder aquisitivo é maior – Copacabana, que
apresenta o maior IDH dentre todas as regiões administrativas da cidade do Rio de
Janeiro e Oeiras, considerado, atualmente, um dos concelhos que apresenta um dos mais
elevados índices de qualidade de vida de Portugal – os falantes estariam mais propensos
a produzir a lateral palatal, uma vez que essa variante pode ser considerada, dentre todas
as outras, a mais conservadora e de prestígio e que, por isso, é ainda a mais valorizada
pela escola, que a ensina como norma de pronúncia.
Já a cidade de Nova Iguaçu – por estar localizada na Baixada Fluminense, região
da RMRJ ocupada por municípios com baixa renda per capita e baixo IDH – e Cacém –
por ainda estar em crescimento e ser considerada uma freguesia dormitório – poderiam
apresentar um comportamento oposto. Ou seja, nessas localidades, o mais natural seria
que os falantes optassem, preferencialmente, pelo uso da lateral palatalizada que,
embora seja considerada, por muitos linguistas, a variante mais comum e mais
disseminada no falar brasileiro, é considerada a de uso mais relaxado.
Seguindo as mesmas hipóteses levantadas acima, acredita-se que a vocalização,
a despalatalização, a despalatalização seguida de iode e o cancelamento de //, embora
pouco produtivos nas regiões em foco, sejam mais encontradas em Nova Iguaçu e
Cacém do que em Copacabana e Oeiras.
(b) Faixa etária
Toda e qualquer língua é dinâmica, evoluindo com o tempo, de modo que as
mudanças no sistema linguístico são previsíveis e esperadas. Comparando-se, por
exemplo, o português atual com o medieval são percebidas diferenças em todos os
níveis, dos semântico e sintático aos fonológico, morfológico e lexical.
Essas mudanças, no entanto, processam-se de modo gradual, passando antes por
uma coexistência de formas, isto é, por um estado de variação, embora nem toda
variação represente mudança linguística em progresso.
Um exemplo de variação estável é registrado por Naro (1992), no que se refere à
pronúncia do morfema –ing em inglês:
121
Existem casos bem conhecidos de variação estável como a pronúncia do
morfema –ing em inglês (ex.: Walking „andando‟), que pode ser realizado como
velar [ ŋ ] ou dental [n], (...). Essas variações já estão atestadas há vários séculos
nas gramáticas da língua inglesa e continuam existindo hoje em dia em
praticamente todos os dialetos do inglês falados no mundo.(...). (op. cit., p.84)
Assim, toda e qualquer língua se diversifica ao longo do tempo e, para se entender
melhor o que acontece, pode-se contar com o auxílio de teorias que vão dar conta da
variação linguística.
A Sociolinguística Variacionista, por exemplo, representada por William Labov,
procurou superar a ideia de que o sistema é o domínio da invariância, ao postular que a
variação faz parte de qualquer língua. Essa mudança de ótica permite que se observe a
dinamicidade da mudança em progresso estudando-se fenômenos variáveis num
determinado momento (numa sincronia) por meio do comportamento de falantes de
diferentes faixas etárias (estudo da mudança em tempo aparente), a fim de inferir
fenômenos que operaram no passado.
Um exemplo de mudança em progresso é destacada por Naro (1992), que se pauta
em estudos feitos por Labov (1972) sobre uma comunidade da ilha de Martha‟s
Vineyard, nos EUA.
Nesse trabalho sobre o ditongo /aw/, o autor registrou, além de quatro graus de
centralização da vogal, uma relação entre o seu uso e os grupos etários de falantes, em
que se destaca o fato de os mais velhos apresentarem o uso predominante da forma não
centralizada da vogal baixa, enquanto os mais jovens utilizavam com muito mais
assiduidade as formas centralizadas, o que demonstrou que a centralização estava se
espalhando de maneira rápida.
Com base no que foi mencionado acima por Labov (1972), observa-se que, no
campo dos estudos variacionistas, tem-se verificado que os mais velhos tendem a
preservar as formas antigas, registradas nas suas mentes quando ainda eram jovens. Essa
hipótese empírica é esclarecida por Naro (1992, p.82):
(...) O processo de aquisição da linguagem se encerra mais ou menos no começo
da puberdade e a partir deste momento a língua do indivíduo fica essencialmente
estável. Segundo esta posição, a gramática do indivíduo não pode sofrer
mudanças significativas porque o acesso aos dispositivos cognitivos que
possibilitam a sua manipulação (i.é., a chamada faculté du langage) fica
bloqueado. (...)
122
Em vista do exposto, resolveu-se utilizar a variável faixa etária para averiguar o
grau de conservadorismo e/ou inovação no falar dos indivíduos não só de Copacabana e
Nova Iguaçu, pertencentes à RMRJ, como também de Oeiras e Cacém, pertencentes à
RMLIS, observando o comportamento dos dados em tempo aparente.
Os fatores desse grupo foram definidos com base nas três faixas etárias pelas
quais se distribuem os informantes da pesquisa:
Faixa A (18 – 35 anos)
Faixa B (36 – 55 anos)
Faixa C (56-75 anos)
Acredita-se, no que diz respeito à variação de //, que os casos em que o fonema
é concretizado como palatal se encontrem na fala dos indivíduos mais velhos, embora
estes também possam produzir [j] e o segmento palatalizado [lj], variante esta
praticamente categórica na fala dos mais jovens.
(c) Nível de instrução
Para se entender a opção pela inclusão desta variável no estudo, é necessário
mencionar alguns conceitos que se opõem: forma de prestígio vs. forma neutra e
fenômeno estigmatizado vs. fenômeno não-estigmatizado.
Segundo Votre (1992), uma forma de prestígio se distingue de uma forma não-
marcada ou neutra, no que se refere aos seus contextos de uso. “As formas de prestígio
ocorrem em contextos mais formais (...), entre interlocutores que ocupam posições mais
elevadas na escala social”. (VOTRE, 1992, p. 75). A forma de prestígio, portanto, está
presente nas gramáticas escolares, que a transformam em norma a ser ensinada e
aprendida.
Ainda de acordo com Votre (1992), a forma estigmatizada tende a despertar uma
reação negativa na maioria dos usuários da língua, e é objeto de crítica por parte dos
usuários das formas prestigiadas ou não-estigmatizadas.
No corpus em questão, os fatores foram distribuídos da seguinte maneira:
123
Nível fundamental de escolaridade (5 a 8 anos);
Nível médio de escolaridade (9 a 11 anos);
Nível superior de escolaridade (12 ou mais anos)
Conforme o exposto, supõe-se que as variantes [] e [lj] concorreriam na fala de
indivíduos de maior nível de escolaridade e a depender de determinados fatores de
natureza contextual. A iotização e a despalatalização, quer através do cancelamento,
quer através da permuta pela lateral anterior, seriam processos mais produtivos entre
falantes de baixo nível de escolaridade.
(d) Gênero do Informante
É sabido que a fala feminina é diferente da fala masculina. Em alguns casos, as
diferenças são mais sutis, mais quantitativas que qualitativas. Segundo Silva-Corvalán
(1989), por exemplo, a frequência no uso de formas diminutivas parece ser bastante
mais alta entre as mulheres, embora estas formas também apareçam na fala masculina.
De maneira geral, alguns estudos concordam que as mulheres usam as variantes de
maior prestígio com mais frequência que os homens. Silva-Corvalán (1989) ainda
ressalta a maior sensibilidade das mulheres em direção às normas de conduta “correta”
pois não só se autocorrigem muito mais que os homens em contextos formais, mas
também aparecem como promotoras de uma variante inovadora, na fala casual. Os
homens, segundo a mesma linguista, rompem as regras e se comportam de maneira mais
rude ou vulgar (op. cit., p. 70).
Labov (2008 [1972], p. 347) ainda acrescenta que “parece provável que o ritmo
do progresso e a direção da mudança linguística devem muito à especial sensibilidade
das mulheres”, na medida em que são elas que influenciam, mais que os homens, a
língua inicial das crianças no momento em que estas estão formando regras linguísticas
com maior rapidez e eficiência.
Paiva (2010) também justifica o emprego dessa variável com base no preceito de
que o sexo feminino seja mais suscetível à correção social e ao emprego de formas de
prestígio, em comparação com o masculino. Para essa autora, entretanto, é necessário
relacionar essa divergência entre os gêneros à classe social do informante. Em níveis
sociais mais elevados, caso um emprego linguístico seja considerado estigmatizado, as
124
mulheres se mostram mais resistentes a adotá-lo. Ao contrário, aderem, mais
rapidamente, a variantes inovadoras se estas não tiverem qualquer valor depreciativo.
Nas práticas discursivas de mulheres que integram realidades menos favorecidas, a
consciência dos empregos linguísticos mais estigmatizados parece se reduzir.
Em vista do exposto, acredita-se que seria típico da fala feminina não só a lateral
palatal, por ser a variante mais conservadora, como também, a lateral palatalizada, por
ser, segundo Cristófaro-Silva (1999), a variante mais disseminada no Brasil.
Gênero dos informantes:
Feminino
Manculino
(e) Identificação do Informante
De acordo com Silva-Corvalán (1989, p. 84), a existência de variações
individuais na conduta linguística de certos membros de um grupo social levou alguns
sociolinguistas a prestar constante atenção às características de um indivíduo dentro de
um grupo determinado.
Assim sendo, mesmo que as diferenças individuais sejam mínimas, elas podem
ser muito significativas a ponto de fazer um indivíduo diferenciar-se de outro de um
mesmo grupo. Isso é possível, uma vez que a experiência linguística e social dos
indivíduos é necessariamente diferente. Ou seja, a história social do indivíduo
condiciona sua fala de forma única.
A partir do que foi relatado, optou-se, então, por criar esse grupo de fatores a fim
de analisar, em separado, cada um dos informantes e verificar até que ponto a
característica idioletal é pertinente para o estudo da variação de //. Assim sendo, para
cada informante, foi criado um código para diferenciá-lo no momento das análises.
125
6.2 A variação de // na RMRJ e na RMLIS
6.2.1 Aspectos gerais
Conforme pode ser verificado nas tabelas 1 e 2 e, também, nos gráficos 1 e 2,
apresentados na seção anterior – em que se expõem os índices numéricos e percentuais
de cada uma das variantes de // encontradas em ambos os corpora –, devido à baixa
produtividade de [lj], [l], [j] e , as análises variacionistas que serão apresentadas nesta
seção só puderam ser realizadas com as variantes manutenção da lateral palatal ([]) e
lateral palatalizada ([lj]).
Ressalte-se, ainda que, conforme poderá ser verificado mais adiante, embora
tenham sido realizadas análises variacionistas para cada uma das variedades, os
resultados serão descritos de forma comparativa.
Como os dados relativos às variantes com baixa produtividade na amostra
(despalatalização + iode ([lj]); despalatalização ([l]); iodização ([j]) e síncope ( ) foram
retirados dos corpora, as análises aqui empreendidas foram feitas com base nos índices
expostos na tabela 3.
Tabela 3. Índices referentes à variação entre [lj] vs [] no PB e no PE
ÍNDICES Variação entre [lj] vs [] no PB Variação entre [l
j] vs [] no PE
Variantes [lj] [] [l
j] []
Ocorrências 1363/2068 705/2068 941/1594 653/1594
Percentuais 65.9% 34.1% 59% 41%
Logo numa primeira observação da tabela 3, percebe-se que tanto no PB quanto
no PE, a lateral palatalizada está se mostrando a variante preferida, uma vez que está
ocorrendo com maior frequência do que []. Nota-se, ainda que, quando se comparam
os índices percentuais de [lj] no Brasil e em Portugal, vê-se que a lateral palatalizada é
um pouco menos frequente no PE do que no PB: 59% vs 65.9%, respectivamente.
Além disso, cabe salientar que, com base na tabela 3, verifica-se que a teoria
defendida por Pontes (1973) parece não proceder, nas amostras aqui consideradas. Essa
linguista elimina do quadro de fonemas a lateral palatal, afirmando não existir [] no
126
português coloquial. Segundo ela, a lateral palatal pode ser interpretada como uma
sequência /lj/. Embora com índice percentual mais baixo, [] aparece não só na fala do
PB, quanto na do PE. O que está ocorrendo, na verdade, é que, em ambas as variedades,
coexiste, ao lado de [], uma outra variante, a lateral palatalizada [lj], muito parecida
com a lateral palatal, tanto articulatória quanto acusticamente.
A partir do momento em que se desconsideraram as demais variantes de //,
foram realizadas diversas rodadas com o auxílio do Pacote de Programas GoldVarb-X,
com o intuito de se verificar quais seriam as variáveis condicionadoras da variante
palatalizada.
Logo nas primeiras, observou-se que algumas variáveis linguísticas e
extralinguísticas não se mostravam relevantes e outras, ao contrário, eram sempre
selecionadas. Em vista disso, resolveu-se fazer uma análise com todas as variáveis e
outras em que não só se desconsideraram variáveis não relevantes, mas também se
modificaram alguns grupos de fatores. Em outras palavras, algumas variáveis sofreram
alterações no decurso da análise, visando, principalmente, ao agrupamento de fatores
com atuação similar. Além disso, eliminaram-se os comportamentos
categóricos/semicategóricos e as variáveis eventualmente sobrepostas. Por se tratar de
alterações resultantes da observação dos padrões encontrados nas rodadas realizadas,
essas recodificações serão comentadas no decorrer deste capítulo.
Tanto na rodada escolhida para a análise da RMRJ – que apresenta input inicial
da regra 0.660, input de seleção 0.678 e significância 0.004 –, quanto na escolhida para
a análise da RMLIS – que apresenta input inicial de 0.590, input de seleção 0.624 e
significância 0.000 – (cf. quadro 6), das dez variáveis independentes utilizadas nas
análises empreendidas, o programa computacional selecionou seis como as
favorecedoras da lateral palatalizada, no corpus do PB, e quatro, no corpus do PE. O
quadro 5 contém essas variáveis, apresentadas por ordem de seleção.
Tanto as variáveis linguísticas quanto as extralinguísticas se mostram
importantes para a realização de [lj], não só na RMRJ – o que já havia sido atestado na
literatura especializada –, como também na RMLIS.
127
Quadro 6. Variáveis atuantes para a concretização de [lj] – nos corpora do PB e do PE – em
ordem de importância
Variáveis condicionadoras da variante Lateral Palatalizada ([lj]) no PB e no PE
RMRJ (Português do Brasil) RMLIS (Português
Europeu)
Variáveis selecionadas
Frequência do vocábulo no corpus
Classe do vocábulo
Nível de instrução
Tonicidade da sílaba em que incide o segmento
Contexto subsequente
Faixa etária
Localidade
Faixa etária
Contexto antecedente
Classe do vocábulo
Input da regra inicial 0.660 0.590
de seleção 0.678 0.624 Significância 0.004 0.000
Como a variável Identificação do Informante, na primeira rodada empreendida
com os dados do PB, foi selecionada como favorecedora da aplicação da regra,
resolveu-se, num primeiro momento, observar quais seriam os informantes que mais
estariam produzindo [lj] para verificar em que medida era realmente a característica
idioletal do informante que se mostrava importante para a variação ou se esta variável
poderia estar mascarando outras.
Assim sendo, uma vez que se percebeu que – embora os pesos relativos mais
altos estivessem distribuídos de maneira bastante heterogênea –, tanto indivíduos das
faixas A, B e C, quanto homens e mulheres de diferentes níveis de escolaridade se
mostravam predispostos ao uso de [lj], decidiu-se excluir da análise a variável
Identificação do Informante para que fosse possível verificar que outro(s) grupo(s) de
fatores poderia(m) ser selecionado(s), mostrando-se pertinente(s) para a aplicação da
regra na análise com a RMRJ.
A observação das variáveis extralinguísticas selecionadas pelo Programa
GoldVarb-X como favorecedoras da implementação de [lj] no PB, demonstra que, com
a retirada do grupo de fatores Identificação do Informante da análise, outra variável
extralinguística – além de Nível de Escolaridade que já havia sido selecionada na
primeira rodada empreendida – aparece como favorecedora da aplicação da regra: a
variável faixa etária. Isso demonstra que, provavelmente, o grupo retirado estava
mascarando a importância dessa variável (cf. quadro 6).
No quadro 6, verifica-se também que, embora haja duas coincidências –
marcadas em vermelho – na atuação dos grupos de fatores na fala das duas variedades,
foram selecionadas, também, outras variáveis como favorecedoras da aplicação da regra
128
– marcadas em preto – tanto no corpus do PB quanto no do PE. Dessa forma, nas
próximas seções, serão descritas, num primeiro momento, as variantes atuantes em
ambas as variedades; num segundo momento, além de serem descritas as diferentes
variáveis que estão favorecendo a aplicação da regra em cada uma das Regiões
Metropolitanas, achou-se pertinente mostrar, a fim de comparação, como se comportam,
pelo menos através dos índices percentuais, os grupos de fatores que foram escolhidos
numa região, mas não em outra.
Saliente-se, ainda, que, conforme pode ser visto no quadro 6 e nas seções 6.2.2,
6.2.3 e 6.2.4, a variação [] ~ [lj], tanto na fala da RMRJ, quanto na da RMLIS, parece
estar se configurando como neutra, uma vez que não só o input da regra de seleção,
como também, os pesos relativos que serão mostrados, para cada grupo de fatores
selecionado, de um modo geral, são muito próximos de .50. Isso, provavelmente, se
deva ao fato de as duas variantes em análise – [] e [lj] – serem muito semelhantes do
ponto de vista articulatório e acústico.
6.2.2 Variáveis atuantes em ambas as variedades
Como pode ser observado no quadro 6, a Faixa Etária e a Classe do Vocábulo
foram selecionadas tanto na RMRJ (respectivamente, em último e em segundo lugar) e
na RMLIS (respectivamente, em segundo e último lugar) como favorecedoras da
aplicação da lateral palatalizada. Nesse sentido, resolveu-se expor os resultados de
ambas as variáveis em conjunto a fim de comparar o comportamento das duas variáveis
nas regiões em foco.
(a) Faixa Etária
Pelos resultados expostos na tabela 4, a variação [] ~ [lj] parece ser um
fenômeno estável na RMRJ, uma vez que os índices de ocorrência de [lj] estão
distribuídos de forma homogênea pelas três faixas etárias – A (P.R. 0.577); B (P.R.
0.510) e C (P.R. 0.460). O mesmo está ocorrendo, na RMLIS. Ou seja, a tabela 4 mostra
que, assim como acontece na RMRJ, os indivíduos mais jovens e os de meia idade são
129
os que estão preferindo a variante [lj] na RMLIS: (Faixa A – P.R. 0.619; Faixa B –
0.557 e Faixa C – 0.335).
Tabela 4. Atuação da Variável Faixa Etária para a realização da variante palatalizada na
RMRJ e na RMLIS
Faixa Etária
RMRJ RMLIS
Fatores Oco % P.R. Fatores Oco % P.R.
Faixa A
(18 – 35 anos) 319/443 72% 0.577
Faixa A
(18 – 35 anos) 331/487 68% 0.619
Faixa B
(36 – 55 anos) 551/809 68.1% 0.510
Faixa B
(36 – 55 anos) 361/553 65.3% 0.557
Faixa C
(56 – 70 anos) 498/821 60.7% 0.460
Faixa C
(56 – 70 anos) 249/554 44.9% 0.335
Os gráficos 3 e 4 mostram, com mais clareza, que, embora os resultados estejam
bem parecidos nas duas Regiões Metropolitanas, na RMRJ, os dados de [lj] parecem
estar distribuídos de forma mais homogênea, visto que todas as faixas etárias
apresentam P.Rs. próximos a .50. Já na RMLIS, tanto a faixa A, quanto a faixa C, se
distanciam um pouco mais da neutralidade: a primeira, apresentando P.R. 0.619, é a que
mais favorece a aplicação da regra, e a segunda, com P.R. 0.335, a que menos se mostra
propícia a implementar [lj].
Esses resultados demonstram que, embora, na RMRJ, os P.Rs. estejam próximos
de .50, são os mais velhos os que mais usam [] e os mais novos os que mais
implementam [lj], o que sugere, de forma bastante sutil, uma tendência crescente ao uso
desta última variante no PB. Já no PE, o fato de o uso da variante palatalizada estar mais
acentuado na fala dos mais jovens e menos na dos mais velhos, indica que a tendência
ao uso de [lj] está mais avançado. Em outras palavras: enquanto ainda é sutil o crescente
uso de [lj] no PB, o mesmo não se pode dizer do que está acontecendo no PE (cf.
gráficos 3 e 4).
130
Gráfico 3. Atuação da Variável Faixa Etária para
a realização da variante palatalizada, no PB, em
pesos relativos
5851
46
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
100
Faixa A Faixa B Faixa C
Gráfico 4. Atuação da Variável Faixa Etária para
a realização da variante palatalizada, no PE, em
pesos relativos
6255
33
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
100
Faixa A Faixa B Faixa C
O resultado vai ao encontro do que é defendido por Labov (1972), para quem os
mais velhos tendem a preservar as formas antigas, registradas na memória desde quando
eram jovens. Naro (1992) concorda com Labov e, ainda, acrescenta que o processo de
aquisição da linguagem se encerra no começo da puberdade, ficando, a partir desse
momento, a língua do indivíduo praticamente estável. Assim, uma vez que [] é a
variante conservadora, nada mais natural que ela esteja mais presente na fala dos mais
velhos e [lj], variante inovadora, na fala dos mais jovens.
(b) Classe do Vocábulo
Antes de comentar os índices referentes a esse grupo, cabe descrever as
alterações realizadas nessa variável no decurso das análises efetuadas.
Logo de início, nas rodadas referentes à RMRJ, percebeu-se que Numeral e
Pronome, por exemplo, deveriam ser retirados da análise, pois, além de apresentarem
baixo número de ocorrências, neles a variante [] era praticamente categórica: nos
numerais ocorria em 11 dos 12 dados; entre os pronomes, em 4 dos 6 dados. Feito isso,
ainda assim, após a realização de outras rodadas, verificou-se que seria necessário
agrupar outros fatores, uma vez que estava havendo inversões nos resultados: classes de
palavras que eram selecionadas como favorecedoras da aplicação da regra eram as que
apresentavam índices percentuais mais baixos. Nesse sentido, resolveu-se unir os nomes
131
(substantivo e adjetivo) confrontando-os aos verbos. A variável ficou reduzida a dois
fatores: verbos e não-verbos.
A modificação, no que diz respeito ao corpus do PE, foi um pouco diferente da
efetuada com o do PB. Num primeiro momento, resolveu-se não desconsiderar qualquer
fator. Depois, com base nos resultados, decidiu-se amalgamar os não-verbos num único
fator (substantivo, adjetivo, pronome, numeral) e contrastá-los aos verbos, deles
separando-se “calhar”, expressão muito produtiva na amostra. Ainda assim, os
resultados não eram satisfatórios, uma vez que essa variável era selecionada como
favorecedora de [lj] e, ao mesmo tempo, era descartada. Em vista desses resultados, foi,
então, necessário retirar da análise o fator numeral, visto que, pelo fato de ser pouco
produtivo na amostra (8 ocos.) e ocorrer preferencialmente com [] (5 ocos.), poderia
estar enviesando o resultado. Dessa forma, essa variável ficou formada por três fatores,
a saber: verbo, não-verbo (constituído por substantivo, adjetivo, pronome) e expressão
“se calhar”. Vale a pena mencionar, ainda, que, na tentativa de se formar um grupo
binário, assim como ocorreu com o PB, decidiu-se retirar da análise a expressão “se
calhar” – para depois, analisá-la em separado, em função da sua grande produtividade
com [lj]. Essa tentativa, no entanto, não foi adequada, uma vez que, novamente, essa
variável passou a ser selecionada e descartada. Em vista disso, decidiu-se manter o
grupo com três fatores.
Conforme pode ser visto, na tabela 5, no PB, são os verbos, com P.R. 0.636, os
que mais influenciam a ocorrência da lateral palatalizada. Os não-verbos (substantivos e
adjetivos), com P.R. bem menor (0.396), parecem não estar favorecendo a aplicação de
[lj].
No PE, os verbos, também, mostram-se produtivos para a aplicação da regra
(P.R. 0.516). A expressão “se calhar”, no entanto, é a que mais está favorecendo a
concretização de [lj] – P.R. 702. Os não-verbos, assim como aconteceu no PB, não
favorecem a lateral palatalizada.
132
Tabela 5. Atuação da Variável Classe do Vocábulo para a realização da variante
palatalizada na RMRJ e na RMLIS
Classe do Vocábulo
RMRJ RMLIS
Fatores Oco % P.R. Fatores Oco % P.R.
Verbo 663/886 74.8% 0.636 Verbo 287/431 66.6% 0.516
Não-verbo (Substantivo e
adjetivo)
703/1169 60.1% 0.396 Não-verbo
(Substantivo,
adjetivo e pronome
504/974 51.7% 0.454
Expressão
“se calhar” 147/181 81.2% 0.702
Esses resultados, por um lado, estão em consonância com o que é exposto em
um estudo de Machado-Soares (2002) sobre o PB. Segundo a autora, nomes
substantivos ou adjetivos, influenciariam a concretização da variante []. Por outro
lado, não está de acordo com o que foi encontrado em Brandão (2007), para quem os
nomes, no PB, estariam favorecendo a ocorrência de [lj].
De qualquer forma, os resultados apresentados na tabela acima parecem estar
sendo influenciados pelo número de ocorrência de verbos nos corpora, uma vez que, no
que diz respeito, por exemplo, à RMRJ, 74.8% das ocorrências de verbos estão sendo
pronunciados com [lj]. Em outras palavras, num conjunto de 886 ocorrências de //
presentes em verbos, apenas 223 são concretizadas com a variante lateral palatal. Já no
que diz respeito aos não-verbos, observa-se que, de um total de 1169 dados, 466 itens
são produzidos com []. Já na RMLIS, 66.6% das ocorrências de verbos estão sendo
concretizados com a lateral palatalizada. Ou seja, num total de 431 ocorrências de //
presentes em verbos, apenas 144 ocorrem com a manutenção da lateral palatal.
Tratando-se, em separado, a expressão “se calhar”, percebe-se que, ainda que ela
não ocorra no PB, no PE, ela é extremamente produtiva, com P.R. 0.702 (81.2% dos
dados). Nesse sentido, podem-se tecer dois comentários, a saber: (1) embora,
aparentemente, tanto na RMRJ quanto na RMLIS os verbos pareçam ser a classe de
palavras ideal para a ocorrência de [lj], o grande número de vocábulos que figuram
nessa classe pode estar interferindo no resultado; (2) como há uma maior concentração
da variante [lj] em se calhar, na RMLIS, supõe-se que essa expressão também possa
133
estar influenciando a escolha desse fator como favorecedor da variação [] ~ [lj] (cf.
seção 6.3).
6.2.3 Variáveis atuantes somente na RMRJ
(a) Frequência do vocábulo no corpus
A Frequência do vocábulo no corpus, a primeira selecionada pelo programa,
parece estar atuando de maneira significativa para a concretização de [lj], uma vez que,
em todas as rodadas empreendidas, essa variável foi selecionada, sempre em primeiro
lugar, como favorecedora da lateral palatalizada.
A tabela 6, abaixo, expõe a distribuição e a relevância dos dados dessa variável.
Tabela 6. Atuação da Variável Frequência do vocábulo
para a realização da variante palatalizada na RMRJ
Frequência do Vocábulo no corpus
Fatores Oco % P.R.
Alta 533/677 78.7% 0.596
Média 384/577 66.6% 0.525
Baixa 451/818 55.1% 0.403
Como pode ser visto na tabela 6, quanto maior a frequência de determinados
vocábulos, maior a possibilidade de ser concretizada a variante palatalizada que é a mais
recorrente na amostra. Esse resultado vai ao encontro do que é apresentado por Ferreira
(2011), segundo a qual o uso mais frequente de certas palavras propicia a variação, ao
contrário daquelas menos frequentes. Vocábulos codificados como de alta (marcados
em azul) ou média (marcados em amarelo) incidência no corpus como filho; filha;
filhos; melhor; mulher; olha; trabalha; trabalhar; trabalho, cujos índices numéricos
totais, distribuídos por localidade, podem ser vistos no quadro 7, embora tenham sido,
às vezes, pronunciados com outras variantes, foram concretizadas, preferencialmente
com a lateral palatalizada [lj].
134
Quadro 7. Vocábulos com incidência alta ou média
no corpus da RMRJ47
Vocábulos Número de ocorrências na RMRJ
distribuído por localidade
Copacabana Nova Iguaçu
Filha 63 4748
Filho 100 179
Filhos 58 126
Melhor 60 95
Mulher 51 34
Trabalha 44 48
Olha 117 86
Trabalhar 76 75
Trabalho 85 100
O fato de a variante [lj] ser mais comum na amostra e concentrar-se em
determinados vocábulos corrobora aspectos da proposta difusionista que se pauta pela
frequência de vocábulos. Segundo essa corrente, itens lexicais mais utilizados são
aqueles que mais se prestam a atuarem como propulsores da variação (FERREIRA,
2011, p. 85-86). Assim sendo, na seção 6.3, será feito um estudo mais atento, com base
nessa proposta, com o objetivo de averiguar em que medida o uso da variante [lj] está
sendo, realmente, influenciado pelo número de ocorrências de determinados vocábulos
presentes no corpus.
Embora, a frequência do vocábulo tenha se mostrado um grupo de fatores muito
produtivo no PB, uma vez que foi selecionado em todas as rodadas e sempre em
primeiro lugar em ordem de importância, não foi indicado como pertinente na análise
efetuada com o corpus da RMLIS. Ainda assim, parece ser interessante verificar o
comportamento dessa variável no PE, mesmo que somente por meio do número de
ocorrências e índices percentuais. Para tanto, criou-se o tabela 7.
47
Aqui estão sendo contabilizadas as ocorrências das palavras com todas as variantes de //. 48
Como pode ser visto na distribuição das variantes pelos itens lexicais na RMRJ, que se encontra no
anexo, das 47 ocorrências do vocábulo filha, em Nova Iguaçu, 7 são com [], 17 com [lj] e 23 com [lj].
Dessa forma, ainda que, com esta palavra, a variante preferida seja a despalatalização seguida de iode, se
se considerarem somente os dados que ocorrem com [] e [lj], a lateral palatalizada é a preferida.
135
Tabela 7. Número de ocorrências e índice percentual dos fatores que
compõem a variável Frequência do vocábulo no corpus na RMLIS
Frequência do vocábulo no corpus
Fatores Ocorrências Percentual
Alta 292/164 64%
Média 319/517 61.7%
Baixa 330/621 53.1%
Na tabela 7, demonstra-se, a princípio, que, semelhantemente ao que aconteceu
na RMRJ, quanto maior a frequência de determinadas palavras – alta (64%) e média
(61.7%) –, maior a possibilidade de ser concretizada a variante [lj], que é a mais
recorrente na amostra. O quadro 8, abaixo, indica quais foram os vocábulos codificados
como de alta (marcados em azul) ou média (marcados em amarelo) frequência no
corpus do PE.
Quadro 8. Vocábulos com incidência alta ou média
no corpus da RMLIS49
Vocábulos Número de ocorrências na RMLIS
distribuído por localidade
Cacém Oeiras
Calhar 99 84
Filho 61 56
Filhos 113 74
lhe 92 43
Melhor 45 41
Olha 21 40
Trabalhar 79 57
Trabalho 62 76
Como pode ser visto acima, são poucos os vocábulos com alta incidência na
RMLIS: somente filhos, calhar e lhe (em Cacém) e trabalho e calhar (em Oeiras) se
mostram mais produtivos. As demais palavras expostas, no quadro 8, apresentam média
ou baixa frequência, como é o caso de olha que, no Cacém, foi produzida somente 21
vezes. Além disso, ao observar, nas tabelas do anexo 2, a distribuição das variantes de
// entre os vocábulos da RMLIS, percebe-se que, na freguesia do Cacém, (1) dos oito
vocábulos com alta ou média frequência no corpus, somente em calhar a incidência de
[lj] foi bem maior que a de [] – de 99 ocorrências, 68 foram com a lateral palatalizada;
49
Aqui estão sendo contabilizadas as ocorrência das palavras com todas as variantes de //.
136
(2) em outras palavras, como lhe, melhor, trabalhar, embora tenham sido mais
produzidas com [lj], a diferença do número de ocorrências entre essa variante e [] é
muito pequena; (3) os vocábulos filho, filhos, olha e trabalho apresentaram maior
frequência com a lateral palatal (cf. seção 6.3).
O mesmo não se verifica em Oeiras, localidade mais propensa à concretização
de [lj] (cf. seção 6.2.4). Ao verificar a distribuição das variantes de // pelos vocábulos
do corpus, nas tabelas do anexo 2, vê-se que todos os vocábulos com alta ou média
incidência, listados no quadro 8 ocorrem, preponderantemente, com [lj].
Esses dados ajudam a que se chegue a duas conclusões iniciais, a saber: (a) o
fato de haver poucas palavras com alta incidência, na fala da RMLIS, e de algumas
palavras com alta e média incidência terem sido mais produzidas com [] do que com
[lj], na freguesia do Cacém, provavelmente, fez com que essa variável não tenha sido
escolhida na análise efetuada com o corpus do PE; (b) o vocábulo calhar, utilizado na
expressão „se calhar‟, parece ser muito importante para a concretização de [lj], pois,
além de ser o único item com alta frequência, na fala de ambas as localidades estudadas
do PE, é muito produzido com a variante em foco – das 183 ocorrências desse vocábulo,
147 são com [lj] – como pode ser visto nas tabelas do anexo 2.
(b) Nível de instrução
Em todas as rodadas empreendidas na análise, com o corpus do PB, a variável
Nível de Instrução foi selecionada como relevante para a aplicação da regra de
palatalização.
Conforme pode ser visto na tabela 8, são os indivíduos com escolaridade
intermediária, seguidos pelos de menor nível de escolaridade, os que mais produzem
[lj].
137
Tabela 8. Atuação da Variável Nível de Instrução para
a realização da variante palatalizada no PB
Nível de Instrução
Fatores Oco % P.R.
Fundamental 439/645 68.1% 0.514
Médio 450/626 71.9% 0.567
Superior 479/802 59.7% 0.436
Como na análise foram descartadas as variantes [l], [j], , mais prováveis na
fala de indivíduos com menos escolaridade, o resultado exposto, na tabela 8, está de
acordo com as hipóteses iniciais e com o que foi encontrado em outros estudos, como o
de Freire (2011), segundo a qual são os informantes mais escolarizados os que mais
produzem a lateral palatal [].
Além disso, ao observar a tabela 8 e o gráfico 5, percebe-se que, embora a
variante [lj] se mostre mais atuante na fala de indivíduos com menor escolaridade e a
variante [], na dos indivíduos com mais escolaridade, a variação [] ~ [lj] parece ainda
estar estável, uma vez que os P.Rs. estão muito próximos de .50.
Gráfico 5. Atuação da Variável Nível de Instrução para a realização
da variante palatalizada na RMRJ, em pesos relativos
44
5751
0
20
40
60
80
100
Nível Fundamental Nível Médio Nível Superior
Assim sendo, como, aparentemente, a variante palatalizada parece ser uma
forma neutra – termo usado por Votre (1992) –, muito natural seria que o uso desta
variável se mostrasse bem distribuída na amostra (cf. gráfico 5), sendo utilizada,
inclusive, pelos informantes mais escolarizados (com nível superior). O fato, no
138
entanto, de estes últimos indivíduos terem passado mais tempo na escola, pode estar
fazendo com que ainda produzam a lateral palatal com mais frequência.
Embora o Nível de Escolaridade tenha sido selecionado pelo Programa
GoldVarb-X, em todas as rodadas efetuadas com os dados da RMRJ, essa variável não
foi escolhida como favorecedora da aplicação da regra em nenhuma das análises
empreendidas com o corpus do PE. Assim sendo, vale a pena mostrar como está
distribuída a variante [lj] entre os indivíduos de Cacém e Oeiras, no que diz respeito à
escolaridade (cf. tabela 9).
Tabela 9. Número de ocorrências e índice percentual dos fatores
que compõem a variável Nível de escolaridade na RMLIS
Nível de escolaridade
Fatores Ocorrências Percentual
Nível Fundamental 334/609 54.8%
Nível Médio 248/428 57.9%
Nível Superior 359/557 64.5%
Observando-se a tabela 9 e o gráfico 6, percebe-se que, na RMLIS, como ocorre
na RMRJ, a variante palatalizada está sendo usada por indivíduos de todos os níveis de
instrução. Contudo, diferentemente do PB, [lj], no PE, está sendo mais implementada na
fala de pessoas com maior nível de escolaridade, com índice percentual de 64.5%. No
PB, eles são os que menos a implementam (59.7%).
Gráfico 6. Índices percentuais de ocorrência de [lj], distribuídos
pelos três Níveis de instrução na fala da RMLIS
55%
64%58%
0
20
40
60
80
100
Nível Fundamental Nível Médio Nível Superior
139
Abaixo, apresenta-se o gráfico 7, em que se compara, por meio de índices
percentuais, a implementação da lateral palatalizada na duas Regiões Metropolitanas.
Gráfico 7. Índices percentuais de ocorrência de [lj], distribuídos
pelos três Níveis de instrução nas falas da RMLIS e da RMRJ
68
55
72
58 60 64
0
20
40
60
80
100
RMRJ Nível
Fundamental
RMLIS Nível
Fundamental
RMRJ Nível Médio
RMLIS Nível Médio
RMRJ Nível
Superior
RMLIS Nível
Superior
A diferença de valores percentuais, no que diz respeito ao uso de [lj] por
indivíduos de diferentes níveis de escolaridade é muito pequena. Ou seja, a variante
palatalizada está sendo usada por indivíduos de todos os níveis de instrução tanto na
RMRJ, quanto na RMLIS, de maneira bastante equilibrada. Esse dado pode comprovar
a hipótese mencionada anteriormente, baseada nas palavras de Votre (1992), de que a
variante palatalizada poderia ser uma forma neutra e que, por isso, estaria bem
distribuída nas amostras. Pode-se dizer, ainda que, provavelmente, o uso dessa variante
não deve estar sendo estigmatizado, uma vez que, nas duas Regiões Metropolitanas, [lj]
é usada com índice percentual mais alto na fala dos mais escolarizados, isto é, nos de
níveis médio e superior. Além disso, o fato de [lj] ser mais comum na fala dos
indivíduos com nível superior, na RMLIS, pode ratificar essa não estigmatização.
(c) Tonicidade da Sílaba
A variável Tonicidade da Sílaba, embora tenha sido selecionada em quarto
lugar, à semelhança do que ocorreu com frequência do vocábulo no corpus, também,
parece estar atuando de maneira significativa para a concretização de [lj], uma vez que,
em todas as rodadas empreendidas, apareceu como uma das favorecedoras da
implementação da regra.
140
A tabela 10, abaixo, apresenta a distribuição e a relevância dos dados dessa
variável na rodada escolhida para a análise.
Tabela 10. Atuação da Variável Tonicidade da Sílaba
para a realização da variante palatalizada no PB
Tonicidade da Sílaba
Fatores Oco % P.R.
Sílaba pretônica 72/135 53.3% 0.354
Sílaba tônica 517/868 59.6% 0.451
Sílaba postônica 779/1070 72.8% 0.559
As sílabas postônicas parecem estar influenciando a concretização de [lj]. Se, por
um lado, esse resultado está de acordo com o encontrado por Brandão (2007) – já que
para a autora a variante palatalizada é mais frequente em sílaba postônica –, por outro,
vai de encontro ao que é defendido por Ferreira (2011) – que afirma ser a sílaba tônica
favorecedora da despalatalização. Se se considerar a variante palatalizada como um
processo de despalatalização, de acordo com Ferreira (2011), as sílabas tônicas
deveriam estar favorecendo esse processo e não o contrário.
De qualquer forma, acredita-se que, mais uma vez, o resultado da análise
empreendida pode estar sendo influenciado pela quantidade e natureza de vocábulos que
apresentam // em sílaba postônica, como pode ser visto por meio do quadro 9 abaixo.
Quadro 9. Distribuição dos vocábulos encontrados na amostra da RMRJ de acordo com a
tonicidade da sílaba em que incide o segmento //
Intensidade da sílaba Vocábulos
Silaba Tônica
Aconselhável – Acolhesse – Afilhado – Atrapalhar – Atrapalhava – Barulheira –
Barulhento – Batalhão – Batalhões – Batalharem – Bilhete – Brilhante – Brilhou –
Brincalhão – Bulhões – Compartilhada – Cordilheira – Detalhado – Embrulhava –
Entulhado – Escolhendo – Escolher – Escolheu – Escolhia – Escolhi – Escolhido
– Espalhar – Espalhou – Falhou – Magalhães – Malhar – Manilhinha – Manilhou
– Maravilhosa(o)(s) – Melhora – Melhor(es) – Melhorem – Mergulhar – Milhão –
Milhares – Molhado(a) – Mulher(es) – Olhada – Olhando – Olhar – Olharam –
Olhava – Olhei – Olhou – Orgulhoso – Palhaça – Telhado – Trabalhando –
Trabalhar – Trabalharam – Trabalhasse – Trabalhava(m) – Trabalhei – Trabalhista
– Trabalhoso – Trabalhou – Olhava – Orelhada – Recolher – Recolheu –
velhinha(o)(s) – velhão
Total (868 ocos.)
Silaba Pretônica
Humilhação – Melhorar – Melhoria(s) – Melhorou – Melhorado – Melhorando
Melhorzinho – Escolheria – Trabalhador(es) – Melhorazinha – Metralhadora
Maravilhamente – Melhorei – Manilhamento – filhozinho – submetralhadora
Trilhozinho – Bilhetinho
Total (135 ocos.)
141
Intensidade da sílaba Vocábulos
Sílaba Postônica
Aparelho(s) – Atrapalha – Atrapalho – Baralho – Barulho – Batalha – Carvalho –
Coelho – Conselho – Detalhe(s) – Empecilho – Escolha – Escolhe – Espelho –
Evangelho – Falha(s) – Falho – Filho(a)(s) – Folha(s) – Galho – Ilha(s) – Joelho –
Julho – Manilha – Malho – Maravilha – Medalha – Migalhas – Molho – Olha(m)
– Olho (verbo) – Olho(s) – Orgulho – Ovelha – Palha – Pilha – Piolho – Quadrilha
– Trabalha(m) – Trabalhe – Trabalho(s) – Trilha – Trilho – Velho(a)(s) –
Vermelho(a)
Total (1070 ocos)
O quadro 9 demonstra que, embora haja um número mais diversificado de
vocábulos com // em posição tônica, a quantidade de concretizações de palavras com
//, em posição postônica, é maior: 1070 vs 868. Além disso, percebe-se que seis dos
nove vocábulos mais frequentes na amostra (cf. quadro 7), como filho, filha, filhos,
trabalho, trabalha e olha, apresentam // em sílaba postônica. Isso, novamente, pode
estar influenciando a escolha de um fator em detrimento de outro como favorecedor de
[lj].
Aqui, mais uma vez, um grupo de fatores que se mostra muito importante para a
aplicação da palatalizada na análise empreendida com os dados da RMRJ, não foi
selecionado nas rodadas feitas com o corpus do PE. Dessa forma, cabe observar se os
dados de [lj], em Portugal, se distribuem da mesma maneira que no Brasil. Para tanto,
criou-se a tabela 11 com o número de ocorrências e o índice percentual dessa variante
em cada uma das sílabas em que incide o segmento //.
Tabela 11. Número de ocorrências e índice percentual dos fatores que compõem
a variável Tonicidade da Sílaba em que incide o segmento // na RMLIS
Tonicidade da Sílaba
Fatores Ocorrências Percentual
Sílaba Tônica 430/644 66.8%
Sílaba Pretônica 53/96 55.2%
Sílaba postônica 458/854 53.6%
Na fala da RMLIS, diferentemente do que ocorre com o PB, a variante
palatalizada aparece preferencialmente em sílaba tônica (66.8%). Nas demais sílabas,
[lj] se distribui de maneira moderada, ao redor dos 50% – em sílaba pretônica ocorre
142
em 55.2% das ocorrências e, em sílaba postônica, em 53.6%. Esse resultado, de alguma
forma, também, se relaciona com a frequência dos vocábulos encontrados no corpus do
PE. Na RMLIS, embora filho, filhos e trabalho (que apresentam // em sílaba
postônica) apresentem um índice médio de ocorrências, os vocábulos melhor e
trabalhar (que contêm // em sílaba tônica) também figuram no quadro 8 como
vocábulos de média frequência.
Observando-se atentamente o quadro 8 e a tabela 11, percebe-se que pode ser o
vocábulo calhar, de grande produtividade no corpus da RMLIS, o grande motivador de
o ambiente tônico estar sendo considerado um fator importante para a concretização de
[lj]: além de ser o único vocábulo com alta frequência tanto em Cacém quanto em
Oeiras, ainda aparece, na análise da variável Classe do vocábulo (cf. seção 6.2.2), como
o grande propulsor da aplicação da regra na RMLIS.
(d) Contexto Subsequente
Como pode ser visto na tabela 12, optou-se por juntar as vogais do contexto
subsequente, não só pelo que foi observado na literatura especializada (cf. BRANDÃO,
2007; FREIRE, 2011; FERREIRA, 2011) mas também, devido aos resultados
encontrados. Assim sendo, foram formados quatro grupos, a saber: vogais coronais
orais, vogal dorsal oral, vogais labiais orais e vogais nasalizadas.
A tabela 12 demonstra que a vogal dorsal, com P.R. 0.558, e as vogais labiais,
com P.R. 0.524, se mostraram importantes para a implementação da regra. Já as vogais
coronais, embora ocorram depois de [lj] em 61% dos dados, não se mostraram
pertinentes para a aplicação da regra (P.R. 0.458).
Tabela 12. Atuação da Variável Contexto subsequente
para a realização da variante palatalizada no PB
Contexto subsequente
Fatores Oco % P.R.
Vogais coronais 114/187 61% 0.501
Vogal dorsal 535/763 70.1% 0.558
Vogais labiais 543/757 68.8% 0.524
Vogais Nasalizadas 95/218 43.7% 0.391
143
O que se expõe na tabela acima vai ao encontro, em parte, do que foi atestado
por Ferreira (2011), segundo a qual são as vogais coronais, em posição posterior a //,
que parecem favorecer a regra da despalatalização. Já Para Freire (2011) e Santos &
Chaves (2012), no entanto, a manutenção da lateral palatal é influenciada por vogais
labiais em contexto subsequente.
Observe-se que, embora esse grupo de fatores tenha sido selecionado como
favorecedor da concretização de [lj], todas as vogais que favorecem a aplicação da regra
apresentam P.Rs. muito próximos a .50, ou seja, à neutralidade. No que diz respeito às
vogais coronais (P.R. 0.501), por exemplo, esse resultado parece ser pertinente uma vez
que a vogal [i] é mais comumente encontrada depois da lateral palatal – em 29
ocorrências, ela aparece 16 vezes depois de []. O mesmo pode ser dito quanto às
vogais labiais, uma vez que a vogal [o] parece ser neutra nessa variação: ocorre em 47%
dos dados depois de [] e em 53% após [lj].
O único grupo de fatores que realmente se distancia da neutralidade é o das
vogais nasalizadas e isso é explicado pelo seu comportamento na amostra. As vogais
nasalizadas [i], [e] e [o ], além de serem pouco produtivas na amostra, aparecem
preferencialmente depois de []: [i] – 2 ocos. com [lj] e 11 com [] – ; [e] – 2 ocos. com
[lj] e 2 com [] –; [o] – 3 ocos. depois de [l
j] e 13 depois de []. Já a nasal [], embora
apareça em um número considerável de vocábulos, também parece influenciar o uso da
lateral palatal: em 185 ocorrências, 97 são com [].
Esse resultado pode, ainda, estar sendo influenciado pelos vocábulos presentes
na amostra, já que há várias palavras com [], [u], [a] e [] depois da variável //, como
demonstra o quadro 7, em que se indicam os vocábulos com incidência alta ou média no
corpus do PB. Tais vocábulos apresentam os contextos subsequentes favorecedores de
[lj], a saber: vogal dorsal – filha, olha, trabalha, trabalhar –; vogais labiais – filho,
filhos, melhor, trabalho –; vogais coronais – mulher. Nesse sentido, o que está sendo
verificado aqui, novamente, pode estar vinculado a questões de natureza lexical (cf.
seção 6.3).
O contexto subsequente, embora tenha sido considerado importante para a
aplicação da lateral palatalizada no corpus do PB, na análise efetuada com a RMLIS,
144
não se mostrou produtiva, uma vez que não foi selecionada nas rodadas efetuadas.
Assim sendo, criou-se a tabela 13 que mostra como está se comportando essa variável
no corpus do PE.
Tabela 13. Número de ocorrências e índice percentual dos fatores
que compõem a variável Contexto Subsequente na RMLIS
Contexto Subsequente
Fatores Ocorrências Percentual
Vogais coronais 168/305 55.1%
Vogais dorsais 402/583 69%
Vogais labiais 338/651 51.9%
Vogais Nasalizadas 33/55 60%
A tabela 13 demonstra um resultado diferente do descrito para a RMRJ. As
vogais dorsais, seguidas das nasais e das coronais parecem ser as que mais influenciam
a ocorrência da lateral palatalizada. De certa maneira, esse resultado pode estar sendo
influenciado pelos vocábulos que apresentam essas vogais em contexto subsequente.
Como já foi apontado acima, vocábulos como trabalhar, olha, mulher, lhe e,
principalmente, calhar, por serem de alta e/ou média incidência no corpus,
provavelmente, estão influenciando a escolha dessas vogais orais como favorecedores
de [lj]. No que diz respeito às vogais nasalizadas, embora [i ] e [o ] tenham tido baixa
produtividade na amostra (5 e 6 ocos., respectivamente, ocorrendo preferencialmente
com []), a vogal [], é um pouco mais produtiva (48 ocos.), e incidiu,
preponderantemente, em palavras com [lj] (32 ocos.).
6.2.4 Variáveis selecionadas somente na RMLIS
(a) Localidade
O grupo de fatores Localidade parece estar atuando de maneira significativa para
a concretização de [lj] no lugar de [], na fala da RMLIS, uma vez que, em todas as
rodadas empreendidas, essa variável foi selecionada, sempre em primeiro lugar, como
favorecedora da lateral palatalizada.
145
Como pode ser visto na tabela 14 e, também no gráfico 8, [lj] está sendo
preponderante na fala de Oeiras (P.R. 0.745), diferentemente do que acontece em
Cacém (P.R. 0.289).
Tabela 14. Atuação da Variável Localidade para a
realização da variante palatalizada no PE
Localidade
Fatores Oco % P.R.
Oeiras 585/727 80.5% 0.745
Cacém 356/867 41.1% 0.289
Gráfico 8. Distribuição da variante [l
j] na RMLIS, em pesos relativos
28
75
0
20
40
60
80
100
1
Cacém
Oeiras
Embora os índices expostos na tabela 14 e no gráfico 8, não estejam de acordo
com a hipótese inicial, no que diz respeito à variável localidade, em que se esperava que
a lateral palatalizada ocorresse, preferencialmente, na freguesia de Cacém (cf. seção
6.1.2.2), o resultado não se mostra incoerente, uma vez que há indícios de que a lateral
palatalizada esteja se configurando como uma variante inovadora de //, na fala da
RMLIS. Essa informação pode ser verificada tanto se observando os resultados
demonstrados na tabela 4 e no gráfico 4 – em que se verifica uma preferência da lateral
palatalizada pelos jovens –, como também examinando, novamente, a tabela 9 e o
gráfico 6 – em que se expõe que [lj] está ocorrendo, preferencialmente, na fala dos
indivíduos com maior nível de escolaridade.
Assim sendo, o fato de [lj] estar sendo mais comum na fala de Oeiras – tendo em
vista os dados expostos até o momento – não surpreende, uma vez que essa localidade,
atualmente, ainda é mais desenvolvida e urbanizada que Cacém. Embora Cacém seja a
segunda maior freguesia da cidade de Agualva-Cacém, no que diz respeito à economia,
146
e sua área urbana tenha crescido bastante nos últimos anos, ainda é considerada uma
freguesia dormitório. Diferentemente, Oeiras, nos últimos anos, deixou de ser um local
de passagem entre Lisboa e Cascais e se assumiu como sede de importantes empresas
ligadas às novas tecnologias e à prestação de serviços. Além disso, Oeiras apresenta um
dos mais elevados índices de qualidade de vida de Portugal.
Como Localidade foi sempre selecionada como uma variável relevante na
RMLIS, e não foi selecionada, sequer uma vez, nas análises da RMRJ, torna-se
pertinente indicar como está distribuída a variante [lj] nas áreas estudadas no Brasil.
Para este fim criou-se a tabela 15 que se encontra a seguir.
Tabela 15. Distribuição da variante [l
j] nas localidades da RMRJ
Localidade
Fatores Ocorrências Percentual
Nova Iguaçu 669/988 67.7%
Copacabana 694/1080 64.3%
Ao observar a tabela 15, num primeiro momento, percebe-se que,
provavelmente, essa variável não foi selecionada para o PB, uma vez que a lateral
palatalizada se mostra distribuída de maneira homogênea nas duas localidades em foco,
sendo apenas um pouco mais produtiva em Nova Iguaçu, com 67.7% de ocorrências.
Em Copacabana, ela aparece em 64.3% dos dados. Essa disposição homogênea de [lj],
nas localidades estudadas, pode ser mais bem visualizada no gráfico 9, abaixo.
Gráfico 9. Distribuição da variante [lj] na RMRJ, em índices percentuais
64 68
0
20
40
60
80
100
Copacabana
Nova Iguaçu
147
Num segundo momento, verifica-se que esse resultado vai ao encontro do que
foi mostrado ao longo da descrição da análise da fala da RMRJ. Nessa região, a
variação [] ~ [lj] mostrou-se estável, não só no que diz respeito à faixa etária dos
falantes, como também no que se relaciona ao nível de escolaridade: a variante [lj]
distribuiu-se de maneira homogênea entre as três faixas de idade – sendo sutilmente
preferida pelos mais jovens – e entre os três níveis de instrução (cf. tabelas 4 e 8 e
gráficos 3 e 5). Nesse sentido, seria natural que os índices de [lj] também se
distribuíssem, nas localidades estudadas no PB, de maneira homogênea.
(c) Contexto Antecedente
A tabela 16 demonstra que, assim como foi feito com o contexto subsequente,
optou-se por juntar as vogais do contexto antecedente, devido aos resultados
encontrados ao longo das análises efetuadas. Foram formados três grupos, a saber:
vogais coronais, vogais dorsais e vogais labiais.
Em todas as rodadas empreendidas o contexto antecedente a // foi selecionado,
em segundo ou terceiro lugar em ordem de importância, como favorecedor da aplicação
da regra. Como pode ser visto, na tabela 16, são as vogais dorsais (P.R. 0.574) e as
vogais labiais (P.R. 0549) que estão favorecendo a variante palatalizada.
Tabela 16. Atuação da Variável Contexto antecedente
para a realização da variante palatalizada no PE
Contexto antecedente
Fatores Oco % P.R.
Vogais coronais 283/612 47.9% 0.394
Vogal dorsal 492/709 69.4% 0.574
Vogais labiais 152/269 56.5% 0.549
Os índices expostos acima sugerem que palavras com frequência alta/média no
corpus da RMLIS podem estar favorecendo esse resultado. Dessa forma, os vocábulos,
com vogal dorsal antecedendo // – trabalho, trabalhar e, principalmente, calhar –, e as
148
palavras com as vogais labiais precedendo // – olha50
e mulher, – podem estar
influenciando o resultado.
Ainda que o contexto antecedente tenha sido selecionado como uma das
variáveis importantes para a implementação de [lj] na RMLIS, não foi, sequer uma vez,
indicada, pelo Programa GoldVarb-X, como relevante para a aplicação da regra na
RMRJ. Na tabela 17, verifica-se o comportamento dessa variável na RMRJ.
Tabela 17. Número de ocorrências e índice percentual da variante [lj]
distribuída entre os fatores da variável contexto antecedente na RMRJ
Contexto Antecedente
Fatores Ocorrências Percentual
Vogais coronais 538/888 60.6%
Vogal dorsal 530/768 69%
Vogais labiais 300/417 71.9%
A partir da tabela 17, percebe-se que, provavelmente, essa variável não foi
selecionada na análise da RMRJ, uma vez que os índices da lateral palatalizada estão
distribuídos de maneira homogênea entre os contextos antecedentes. Ainda assim, há
uma leve preponderância de [lj] quando as vogais que antecedem // são as labiais
(71.9%) e a dorsal (69%). Embora apresente um índice de ocorrência relativamente alto
diante de [lj], as vogais coronais (60.6%), assim como aconteceu na RMLIS, parecem
ser as menos pertinentes para a aplicação da regra.
Esse resultado ora vai ao encontro do que foi visto na literatura especializada,
sobre o PB, ora não. Machado Soares (2002), afirma que [] ocorre preferencialmente
antecedido pelas vogais [i] e [u]. Em outro estudo de 2008, a mesma autora observa que
as vogais anteriores favorecem [lj]. Para Freire (2011), no caso do contexto fonológico
precedente, dois fatores se mostraram importantes para a manutenção de []: vogais
coronais e vogais dorsais. Já para Santos & Chaves (2012), [] ocorre,
preferencialmente, depois da vogal média alta anterior [e].
50
Ainda que o vocábulo olha tenha apresentado baixa ocorrência em Cacém, em Oeiras, é considerado de
média frequência.
149
Tendo em vista tamanha diversidade de estudos que indicam diferentes vogais,
em contexto anterior a //, favorecendo [lj], pode ser que, aqui, os resultados, mais uma
vez, possam estar sendo influenciados pelos vocábulos de alta e/ou média frequência no
corpus. Em outras palavras, os vocábulos mulher, olha, trabalha, trabalhar, trabalho
que estão listados no quadro 7 – talvez justifiquem a alta incidência de [lj] depois dos
contextos mencionados acima.
6.3 Questões de ordem lexical
Como se verificou, embora as análises variacionistas apontem vários fatores
linguísticos e extralinguísticos como favorecedores do enfraquecimento da lateral
palatal (passagem de [] para [lj]), tanto na amostra de RMRJ, quanto na da RMLIS
51, a
frequência do item lexical no corpus mostrou-se relevante para a aplicação da lateral
palatalizada e, inclusive, das demais variantes. Isso ficou patente, não só pelo fato de
essa variável ter sido selecionada como favorecedora de [lj] na análise empreendida com
a RMRJ, mas principalmente pela diversidade de contextos estruturais indicados como
propulsores da variação [] ~ [lj], tanto nas análises sociolinguísticas apresentadas neste
estudo quanto nas demais análises mostradas no capítulo 3, em que se faz uma revisão
bibliográfica, comentando-se trabalhos que se referem à variação de [] no PB e no PE.
Em suma, pode-se dizer que os resultados encontrados, como já foi apontado ao
longo do capítulo, podem não estar representando um condicionamento propriamente
estrutural, mas um condicionamento determinado pela frequência média/alta de
determinados vocábulos nas amostras.
Com o intuito de demonstrar em que medida a alta/média incidência de
vocábulos em ambos os corpora é um fator que deve ser analisado em conjunto com os
condicionamentos linguísticos e sociolinguísticos apontados nas análises variacionistas
como influenciadores da aplicação de [lj], optou-se por listar todos os vocábulos
referentes a cada amostra deste estudo – RMRJ e RMLIS –, demonstrando a
51
Embora, na amostra da RMLIS, a variável Frequência do vocábulo no corpus não tenha sido
selecionada como favorecedora da lateral palatalizada, na análise sociolinguística foram mostrados fortes
indícios de que a alta e/ou média frequência de determinados vocábulos na amostra podem estar
influenciando a variação [] > [lj].
150
distribuição de todas as variantes de // entre eles. Nos anexos 1 e 2, pode-se visualizar
tal distribuição e, consequentemente, a frequência de cada vocábulo nas amostras.
Nesta seção, à semelhança do que foi feito no decorrer do capítulo,
primeiramente, serão focalizadas as variantes menos encontradas nas amostras e, num
segundo momento, será analisada a variante [lj], a mais produtiva em ambas as
variedades. Serão feitos alguns comentários de ordem estrutural, social ou idioletal que,
porventura, possam estar influenciando tais ocorrências. Em seguida, serão listados os
vocábulos que apresentaram alta/média produtividade nas amostras, demonstrando os
índices de [lj] em cada um deles. Além disso, serão feitas algumas considerações,
também de ordem linguística e social, com relação aos dados apresentados.
6.3.1 Variantes menos produtivas de // nas amostras da RMRJ e da RMLIS
Na tabela 18, reproduzem-se dados que se encontram nas tabelas 1 e 2 – para
facilitar a observação –, em conjunto, dos índices obtidos em relação às variantes.
Tabela18. Variantes de // menos produtivas na RMRJ e na RMLIS
Índices Variantes de // menos produtivas
na RMRJ
Variantes de // menos produtivas
na RMLIS
Variantes [lj] [j] [l] [lj] [l] [j]
Ocorrências 323/2470 13/2470 64/2470 2/2470 107/1739 20/1739 17/1739 1/1739
Percentuais 13% 0.5% 2.6% 0.1% 6.2% 1.2% 1% 0.1%
(a) O cancelamento, a iodização e a despalatalização
O cancelamento, tanto na RMRJ, quanto na RMLIS, aparece apenas nos
vocábulos filho (1 ocorrência na RMRJ) e filha (2 ocorrências, uma na RMRJ e outra na
RMLIS).
Aparentemente, como foi mostrado na seção 6.1.1, os únicos condicionamentos
que parecem estar atuando sobre essa variante são extralinguísticos, uma vez que as três
ocorrências se deram na fala de indivíduos mais velhos e com baixo nível de
escolaridade. Tendo em vista, no entanto, que foram poucos os casos de cancelamento
e, somente nesses vocábulos, e que essa variante é muito comum em áreas interioranas,
151
é provável que, em amostras de fala urbana, a ocorrência do cancelamento possa ter
implicações apenas de cunho idioletal.
A segunda variante menos usual nas amostras foi a iodização que, grosso modo,
ocorreu nos mesmos vocábulos em ambas as Regiões Metropolitanas (cf. tabela 19).
Tabela 19. Vocábulos com ocorrência de iodização na RMRJ e na RMLIS
Itens Lexicais
RMRJ
Ocorrências de
iodização /
Ocorrências totais
Itens Lexicais
(RMLIS)
Ocorrências de
iodização /
Ocorrências totais
Olha 1/203 Olha 9/62
Trabalho (verbo) 1/139 Olhos 2/10
Trabalho (subst.) 2/46 Olhe 1/28
Trabalha 4/92 Trabalho (subst.) 4/34
Trabalhar 4/151 Trabalha 1/21
Trabalhando 1/50
A tabela 19 mostra que tanto na RMRJ, quanto na RMLIS, a iodização
aconteceu nas formas relacionadas a olho/olhar e trabalho/trabalhar.
Os 13 casos de [j] na RMRJ, ocorreram na fala de apenas três informantes: em
Copacabana, os vocábulos trabalho (1 oco.) e trabalha (3 ocos.) foram proferidos por
um homem mais velho e de baixa nível de escolaridade; em Nova Iguaçu, os vocábulos
trabalhar (4 ocos.), trabalho (2 ocos.), trabalha (1 oco.) e trabalhando (1 oco.) foram
produzidos por uma mulher mais velha e com médio nível de escolaridade; já o
vocábulo olha (1 oco), apareceu na fala de uma mulher jovem e com baixo nível de
escolaridade.
Já na RMLIS, os 17 dados de iodização ocorrem na fala de quatro informantes,
um de Cacém e três de Oeiras, como pode ser visto a seguir: os vocábulos olhos (2
ocos.), trabalho (4 ocos.), trabalha (1 oco.), olhe (1 oco.) foram proferidos por uma
mulher de Oeiras, de meia idade e baixo nível de escolaridade; já o vocábulo olha, foi
produzido seis vezes por uma mulher de Oeiras, mais velha e nível intermediário de
instrução; duas vezes por outra mulher mais velha de Oeiras, só que com nível alto de
instrução; e uma vez, em Cacém, por uma mulher de meia idade e nível intermediário
de instrução.
Tais vocábulos também são encontrados com essa variante em exemplos
arrolados por Madureira (1987 e 1999) e Ferreira (2011). Como foi mencionado
anteriormente, ela é muito comum na fala de pessoas que vivem em regiões
interioranas, em geral, de baixo nível de escolaridade. Como os dados que compõem os
152
corpora deste estudo foram eliciados de entrevistas realizadas com indivíduos
residentes em áreas urbanas, muito natural seria que houvesse poucos casos de
iodização e que, provavelmente, estivessem relacionados a características particulares
de um ou outro informante, isto é, a características idioletais. No entanto, não se pode
descartar a possibilidade de essas poucas ocorrências de [j] estarem, de alguma forma,
indicando certa interferência do nível de escolaridade: das 30 ocorrências de [j], apenas
duas, são encontradas na fala de um indivíduo de nível superior.
No que diz respeito à despalatalização, com base na tabela 20, percebe-se que,
no PB e no PE, salvo em vocábulos específicos, como manilhou, melhorou, trabalho,
trabalha, trabalhar, trabalhando, trabalhava, filho, filhos, calhar, produzidos por
determinados informantes, os demais casos de [l] ocorrem seguidos de vogal [+ cor].
Tabela 20. Ocorrências de despalatalização na RMRJ e na RMLIS
Itens Lexicais
RMRJ
Ocorrências de
despalatalização /
Ocorrências totais
Itens Lexicais
(RMLIS)
Ocorrências de
despalatalização /
Ocorrências totais
Mulher 23/85 Lhe 10/135
Mulheres 2/10 Lhes 2/46
Detalhe 1/6 Olhe 2/28
Colher (subst.) 1/2 Trabalhinho 1/1
Colheres 2/2 Trabalhinhos 1/1
Lhes 1/2 Calhar 1/183
Bilhete 1/1 Filho 2/117
Escolher 2/6 Filhos 1/187
Escolhido 2/2
Canalhice 1/1
Filhinho 2/3
Filhinha 1/1
Trabalhinho 1/1
Velhinha 1/2
Trabalhei 6/53
Patrulhinha 5/6
Manilhou 1/1
Melhorou 1/33
Trabalho (verbo) 3/139
Trabalha 3/92
Trabalhar 2/151
Trabalhando 1/50
Trabalhava 1/57
Esse condicionamento linguístico, portanto, parece estar sendo influenciado pela
incidência de vocábulos que apresentam esse contexto em posição subsequente a //,
como é o caso de mulher, na RMRJ.
153
Merece ainda ser salientado que alguns vocábulos (marcados em amarelo) que
apresentam o contexto linguístico favorecedor da despalatalização, em ambas as
amostras, ocorrem de maneira categórica ou semicategórica com [l], como pode ser
visto em seguida: na RMRJ, colheres, bilhete, escolhido, canalhice, filhinha e
trabalhinho aparecem categoricamente com [l], já colher (substantivo), lhes, filhinho,
velhinha e patrulhinha ocorrem de maneira semicategórica; na RMLIS, trabalhinho e
trabalhinhos ocorrem categoricamente com [l].
Esses dados ratificam a influência das vogais [+ cor] como favorecedoras de [l].
No entanto, a tabela 21 indica que, quando // está seguido do sufixo –inho(a), há 50%
de possibilidades de ocorrer [l], o que não descarta a possibilidade de ser a presença de
outra palatal (//) o elemento impulsionador da despalatalização.
Tabela 21. Ocorrências de vocábulos com o
sufixo diminutivo -inho(a) na RMRJ e na RMLIS
RMRJ / Vocábulos Ocos. de [l]
Ocos. de []
Filhinha 1 -
Filhinho 2 1
Patrulhinha 5 1
Trabalhinho 1 -
Velhinha 1 -
Manilhinha - 1
Velhinho - 3
Velhinhos - 4
Total 10 10
RMLIS / Vocábulos
Ocos. de [l]
Ocos. de []
Trabalhinho 1 -
Trabalhinhos 1 -
Migalhinhas - 1
Velhinha - 1
Total 2 2
O sufixo parece favorecer a variação [] > [l], uma vez que não ocorrem, nesse
contexto, casos de [lj] – a variante inovadora e mais comum em ambas as amostras.
Brandão (2007) estabelece uma distinção de natureza sociolinguística em
relação a [l]. No caso da variante em foco, haveria um [l]1, “não marcado socialmente”,
aquele que ocorre seguido de [i], em especial no sufixo –inho, e um [l]2, “marcado
154
socialmente”, o que antecede outras vogais, como em [mu‟l], por exemplo. A autora
observa ainda:
Ressalte-se que duas das variantes aqui consideradas mais estigmatizadas
equivalem a variantes que se observam nas etapas iniciais de aquisição da
lateral palatal. Como demonstrou Hernandorena (1997-s/d), quando não se
verifica o apagamento, a criança concretiza-a, em qualquer contexto,
inicialmente, como [l] (até os 2:4 ou 2:5 anos) e, em seguida, como [j] (até
2:8, 2:9 anos) até que, por volta dos 3:6-3:7 anos, começa a implementar a
sequência [lj], que, como se observa nos corpora aqui focalizados concorre,
em qualquer dialeto, com a variante [] (pág. 97).
(b) A despalatalização seguida de iode
A despalatalização seguida de iode, como pôde ser visto na tabela 18, é a mais
produtiva, dentre as outras variantes que menos ocorrem nas amostras. As tabelas 22 e
23 mostram que, embora [lj] apareça em uma diversidade considerável de vocábulos,
somente alguns se destacam com um número de ocorrências significativo.
Tabela 22. Vocábulos que apresentam a variante [lj] na fala da RMRJ
Itens Lexicais com [lj]
(Copacabana)
Ocorrências de [lj] /
ocorrências totais
Itens Lexicais com
[lj] (Nova Iguaçu)
Ocorrências de [lj] /
ocorrências totais
Filha 19/63 Atrapalha 1/9
Filhas 1/6 Castelhano 1/1
Filho 40/100 Filha 23/47
Filhos 20/58 Filhas 7/7
Olham 1/1 Filho 82/179
Olhar 1/6 Filhos 68/126
Olhos 2/5 Galho 1/1
Trabalho 1/85 Melhor 9/95
Melhora 2/7
Melhorada 1/1
Melhorado 3/5
Melhorando 2/6
Melhorar 5/31
Melhoraria 1/4
Melhorem 1/1
Melhores 2/10
Melhorou 2/19
Melhorzinho 1/3
Molhada 1/1
Olha 3/86
Olhar 2/7
Olho (Substantivo/verbo) 3/9
Olhos 4/6
Orgulho 1/7
Trabalha 2/48
Trabalhar 1/75
Trabalho 1/100
Trabalhos 1/2
Velha 3/12
Velho 3/20
155
Como se expõe na tabela 22, na RMRJ, [lj] aparece com um grande número de
ocorrências, nos vocábulos filha, filho e filhos (marcados de laranja). Os vocábulos
marcados em verde, embora poucas vezes produzidos com essa variante, foram
encontrados nas duas localidades da RMRJ.
O fato de essa variante aparecer insistentemente, nos vocábulos mencionados
acima, além de parecer ser uma volta à origem da lateral palatal – proposta defendida
por Silveira (1986) e discutida na seção 6.1.1 – pode estar mostrando que algum
condicionamento linguístico pode estar influenciando tais ocorrências.
O maior número de dados com a variante [lj] aparece no item lexical filho (filho,
filha, filhos) que apresenta a vogal [i] antes de //. Esse resultado vai ao encontro do
que é apresentado por Machado-Soares (2008), que atesta serem as vogais [i], [e], []
antecedendo // as favorecedoras da despalatalização seguida de iode. Observe-se, na
tabela 22, que, além dos vocábulos mencionados, há outros que apresentam esse
contexto, tais como: filhas, melhor, melhora, melhorada, melhorado, melhorando,
melhorar, melhoraria, melhorem, melhores, melhorou, melhorzinho, velho e velha (em
geral, grupos de vocábulos que apresentam a mesma base lexical) (cf. seção 6.1.1).
Um dado curioso, que parece pertinente ser exposto aqui, diz respeito à
quantidade de ocorrência de [lj], em determinados vocábulos, em Nova Iguaçu. Como
pode ser confrontado com a tabela do anexo 1, os vocábulos filho e filhos aparecem em
maior número com [lj] do que com [lj] (variante preferida na fala da RMRJ) e os
vocábulos filhas, castelhano, galho, maravilhas, melhorem e molhada somente
ocorrem, em Nova Iguaçu, com a variante [lj]. Esse dado vai ao encontro do que é
afirmado por Cagliari (1974) para quem a despalatalização é uma etapa de evolução da
palatal, a partir da qual se operam algumas transformações, sendo a realização da lateral
despalatalizada com iode a última etapa desse processo. Essa informação é pertinente na
medida em que, conforme foi exposto na seção 6.1.1, [lj] parece estar se configurando
como uma variante inovadora, pois é menos comum na fala de indivíduos mais velhos e
com mais tempo de escolaridade.
Vale ressaltar ainda que (1) além dos casos categóricos com [lj], mostrados
acima (marcados em amarelo), Nova Iguaçu apresenta, ainda, palavras (também
marcadas em amarelo) que ocorrem de maneira semicategórica com essa variante –
156
melhorado, melhorzinho e trabalhos –;(2) em Copacabana, a única ocorrência de olham
se dá com a variante [lj].
Observando a tabela 23, percebe-se que, à semelhança do acontece com a
RMRJ, é no item lexical filho (filho, filhos, filha, filhas), além de em milho e velhas
(marcados de laranja) que mais aparece [lj] na RMLIS. Os vocábulos marcados em
verde, ainda que pouco produtivos com [lj], na fala da região, coincidem nas duas
localidades.
Tabela 23. Vocábulos que apresentam a variante [lj] na fala da RMLIS
Itens Lexicais
(Oeiras) Ocorrências de [lj] /
ocorrências totais Itens Lexicais
(Cacém)
Ocorrências de [lj] /
ocorrências totais
Filha 7/14 Filho 11/61
Filhas 3/17 Filhos 6/113
Filho 12/55 Folha 2/3
Filhos 10/74 Folhas 2/6
Guerrilha 1/1 Milhões 2/2
Ilhas 1/1 Mulher 5/27
Lhe 5/43 Mulheres 1/5
Melhor 2/41 Trabalhar 1/57
Milho 6/7 Trabalhavam 1/3
Mulher 1/20 Trabalho 1/62
Mulheres 1/10 Velhote 1/2
Olha 1/41
Olho (subst/verbo) 4/6
Olhos 3/8
Trabalhar 5/79
Trabalhava 3/21
Trabalho 1/76
Velha 1/8
Velhas 6/7
Velhos 1/8
O fato de, também, no PE, os vocábulos mais produtivos com [lj] serem os
mesmos que os encontrados na RMRJ, ratifica as afirmações feitas acima. Ou seja, na
RMLIS, o uso mais frequente da variante [lj] também está ocorrendo,
preferencialmente, nos vocábulos com as vogais [+ ant] antecedendo //. Além dos
vocábulos mencionados anteriormente, a despalatalização seguida de iode ainda aparece
nos seguintes vocábulos que apresentam o mesmo condicionamento linguístico: filhas,
guerrrilha, ilha, melhor, milhões, velha, velhos e velhote.
Vale destacar que alguns vocábulos (marcados em amarelo) estão ocorrendo de
maneira categórica ou semicategórica com [lj], na RMLIS: em Oeiras, guerrilha, ilhas
aparecem categoricamente com a despalatalização seguida de iode, já milho, olho
157
(subst./verbo) e velhas ocorrem de maneira semicategórica; em Cacém, milhões ocorre
categoricamente com [lj] e folha, trabalhavam e velhote aparecem de modo
semicategórico.
Embora na RMLIS, como foi apontado na seção 6.1.1, essa variante não esteja,
aparentemente, apresentando condicionamento extralinguístico, uma vez que os dados
estão distribuídos de maneira uniforme entre as três faixas etárias, os três níveis de
instrução e os dois gêneros, acredita-se que a variante [lj] pode também ser considerada
inovadora na região em foco. Essa variante é mais comum em Oeiras, concelho que foi
apontado nas análises sociolinguísticas como mais propenso às variantes inovadoras (cf.
seção 6.2.4).
6.3.2. Variante [lj] nas amostras da RMRJ e da RMLIS
Na análise sociolinguística efetuada tanto com a RMRJ quanto com a RMLIS,
buscou-se esclarecer quais os condicionadores linguísticos e/ou extralinguísticos que
levavam à aplicação da lateral palatalizada. Durante essa análise, observou-se que,
muitas das variáveis escolhidas como favorecedoras de [lj], estavam, provavelmente,
sofrendo a influência de determinados vocábulos de alta ou média frequência do corpus.
Isso ficou muito claro, quando, no que diz respeito à variável contexto subsequente –
selecionada como favorecedora da aplicação de [lj], na RMRJ – todas as vogais orais se
mostraram pertinentes para a concretização da lateral palatalizada. Essa informação vai
ao encontro do que é afirmado por Díaz-Campos & Ruiz-Sánchez (2008), segundo os
quais quando a maioria dos contextos é favorável, aparentemente não há padrões
fonológicos claros, o que leva a imaginar que fatores como incidência de determinados
vocábulos na amostra, podem estar influenciando, também, a variação. Brandão (2007),
inclui [lj] entre as variantes “não marcadas socialmente” (ao lado de [] e [l]
1, acima
referida), acrescentando serem ela e esta última consideradas por Câmara Jr. “típicas da
variedade relaxada”.
Como a variação [] > [lj] apresentou uma configuração um pouco diferente
entre as amostras, não só no que diz respeito às variáveis condicionadoras de [lj], mas
principalmente, no que toca à distribuição da lateral palatalizada entre os vocábulos,
decidiu-se examinar cada amostra em separado.
158
(a) A lateral palatalizada na RMRJ
Partindo-se do pressuposto de que a alta produtividade de alguns vocábulos, na
amostra da RMRJ, estariam influenciando a escolha de determinadas variáveis
estruturais como favorecedoras de [lj], resolveu-se criar as tabelas que se encontram no
anexo 1, em que se demonstram (a) todos os vocábulos com //, elencados, em cada
uma das localidades, e (b) como se distribuem as variantes da lateral palatal entre esses
vocábulos.
As tabelas do anexo 1, mostram não só que 136 vocábulos foram elencados com
//, na amostra de Copacabana, e 134, na de Nova Iguaçu, mas também que as 694
ocorrências de [lj], em Copacabana, estão distribuídas entre 84 vocábulos e as 674
ocorrências da lateral palatalizada, em Nova Iguaçu, entre 77.
Das 84 palavras com [lj], da amostra de Copacabana, e das 77, da de Nova
Iguaçu, 9 apresentam, em ambas as amostras, uma frequência bastante alta de uso, como
pode ser visto na tabela 24.
Tabela 24. Distribuição das ocorrências de [lj] e [] nos vocábulos com frequência alta e
média de uso na RMRJ
Vocábulos Copacabana Nova Iguaçu
Ocos. totais Ocos.
com []
Ocos.
com [lj] Ocos. totais Ocos.
com []
Ocos.
com [lj]
Filha 63 11 32 47 7 17
Filho 100 11 49 179 25 72
Filhos 58 5 33 126 20 38
Melhor 60 25 35 95 23 63
Mulher 51 16 27 34 4 15
Olha 117 12 105 86 21 61
Trabalha 44 13 28 48 6 36
Trabalhar 76 15 61 75 20 48
Trabalho 85 7 76 100 25 69
Ao confrontar a tabela 24 com as tabelas do anexo 1, percebe-se que das 694
ocorrências da lateral palatalizada no corpus de Copacabana, 446 incidem nos
vocábulos de uso mais frequente, o que equivale a 64% de todos os casos de [lj] na
localidade. O mesmo está acontecendo em Nova Iguaçu, das 674 ocorrências de [lj],
419, estão nos vocábulos listados na tabela 24, isto é, 62% dos dados da lateral
palatalizada ocorrem nas palavras de frequência alta ou média.
159
Esses números indicam, também, que, embora 84 vocábulos, em Copacabana, e
77, em Nova Iguaçu, apareçam com [lj], no corpus da RMRJ, apenas 9 vocábulos,
apresentam mais da metade de todas as ocorrências da lateral palatalizada da amostra.
Esse resultado parece indicar que os condicionamentos linguísticos apontados na análise
sociolinguística como favorecedores da variação [] ~ [lj], estão sofrendo influência da
incidência de determinados vocábulos na amostra.
A análise sociolinguística da RMRJ indicou três variáveis linguísticas, além da
frequência do vocábulo no corpus, como favorecedoras da aplicação de [lj]: classe do
vocábulo, tonicidade da sílaba em que incide o segmento e contexto subsequente. A
tabela 24 mostra que as palavras de uso mais frequente, na amostra, apresentam os
fatores selecionados como motivadores da variação: quase todos os vocábulos são
verbos, que apresentam // em sílaba postônica, além de vogais coronais, labiais ou
dorsal em contexto subsequente (cf. itens 6.2.2 e 6.2.3). Os vocábulos de baixa
frequência com tais contextos, embora apareçam com [lj], também ocorrem, bastante
frequentemente com [] (cf. tabelas do anexo 1).
(b) A lateral palatalizada na RMLIS
A análise sociolinguística com a RMLIS revelou que [lj] é muito mais produtivo
em Oeiras do que em Cacém (cf. item 6.2.4). Nesse sentido, pareceu ser necessária a
criação das tabelas, que constam do anexo 2, não só para listar todos os vocábulos com
//, encontrados, em cada uma das localidades, mas também para mostrar como se
distribuíram as variantes da lateral palatal entre esses vocábulos.
O // ocorreu em 93 vocábulos, em Oeiras, e, em 105 vocábulos, em Cacém. Os
585 dados de [lj], em Oeiras, estão distribuídos por 72 vocábulos, já as 356 ocorrências
referentes a Cacém se distribuíram em 49 palavras.
Através das informações fornecidas não só no item 6.2.4, mas também nas
tabelas do anexo 2, percebe-se que, se das 727 ocorrências de //, em Oeiras, 585 foram
com [lj] e que, se dos 867 dados da lateral palatal, em Cacém, apenas 356 foram
concretizados com a lateral palatalizada, os resultados, no que diz respeito à frequência
de determinados vocábulos, nas duas localidades, podem ser diferentes. Ainda assim,
160
mesmo que, em Cacém, a produtividade de [] seja maior, da mesma forma que em
Oeiras, a constituição lexical do corpus da pesquisa demonstrou que o resultado pode
estar mais vinculado à recorrência de determinados vocábulos do que propriamente a
condicionamentos estruturais.
Excetuando as palavras filho, melhor, olha, trabalhar, trabalho, que apresentam
média frequência na amostra, e lhe, filhos e calhar, com índice alto de ocorrência, as
demais 64 palavras com [lj], da amostra de Oeiras, e as demais 41, da de Cacém,
apresentam baixa frequência na amostra. A tabela 25 mostrará como estão distribuídos
os dados da lateral palatalizada nas palavras de alta frequência tanto em Oeiras quanto
em Cacém.
Tabela 25. Distribuição das ocorrências de [lj] e [] nos vocábulos com frequência alta e
média de uso na RMLIS
Vocábulos Oeiras Cacém
Ocos. totais Ocos.
com []
Ocos.
com [lj] Ocos. totais Ocos.
com []
Ocos.
com [lj]
Calhar 84 ocos. 4 79 99 ocos. 31 68
Filho 56 ocos. 11 31 61 ocos. 33 17
Filhos 74 ocos 30 33 113 ocos. 85 22
lhe 43 ocos. 10 22 92 ocos. 42 46
Melhor 41 ocos. 13 26 45 ocos. 21 24
Olha52
40 ocos 2 29 21 ocos. 11 9
Trabalhar 57 ocos. 3 71 79 ocos. 26 30
Trabalho 76 ocos. 3 68 62 ocos. 43 18
A tabela mostra resultados díspares, no que diz respeito ao uso de [lj], nas
palavras de frequência alta ou média, nas duas localidades. Em Oeiras, mesmo que o
vocábulo filhos se mostre neutro quanto ao uso de [lj] – 33 dados – ou de [] – 30 dados
–, as demais palavras estão mais propensas a serem produzidas com a lateral
palatalizada. O contrário está acontecendo em Cacém: com a exceção de lhe, melhor e
trabalhar – que se mostram neutros quanto a serem concretizados com uma ou outra
variante, mas ainda assim, sendo mais produzidos com [lj] –, e calhar que, claramente
está mais propensa a ser concretizada coma lateral palatalizada, as demais palavras de
uso médio ou alto no corpus, estão sendo produzidas mais comumente com [].
52
O vocábulo olha não será analisado, no Cacém, pois, nessa localidade, apresentou baixa frequência de
uso.
161
Em Oeiras, os condicionadores estruturais – classe de palavra e contexto
antecedente –, indicados na análise sociolinguística (cf. itens 6.2.2 e 6.2.4), parecem
estar, mais uma vez, sendo influenciados pela recorrência de alguns vocábulos do
corpus.
As análises efetuadas indicam ser as vogais dorsais e labiais, em contexto
antecedente, os verbos e o vocábulo calhar (dentro da expressão „se calhar‟) os
favorecedores da aplicação da regra. Ao observar atentamente a tabela 25, percebe-se
que, em Oeiras, os vocábulos que se enquadram nesses padrões são os que mais estão
sendo produzidos com [lj], a saber: olha, trabalhar, trabalho e calhar.
Vale acrescentar que, observando-se as tabelas do anexo 2, percebe-se que,
independentemente do contexto linguístico, da classe do vocábulo ou da frequência do
item lexical no corpus, os indivíduos da localidade de Oeiras, parecem estar, realmente,
bastante propensos a utilizar a variante [lj]. Mesmo vocábulos de baixíssima incidência
na amostra e/ou que não se enquadram nos contextos que favorecem a aplicação de [lj],
estão sendo produzidos mais vezes com a lateral palatalizada. Note-se que essa
informação não invalida o que foi dito acima, no entanto, demonstra que,
provavelmente, fatores extralinguísticos estejam atuando na variação [] > [lj] de
maneira mais contundente do que se previa.
Na análise sociolinguística efetuada com a RMLIS, demonstrou-se que a lateral
palatalizada parece estar se configurando como uma variante inovadora de //, preferida
dos indivíduos mais jovens e com maior nível de escolaridade (cf. itens 6.2.2, 6.2.3
6.2.4). Assim sendo, talvez, em Oeiras – concelho que apresenta um dos mais elevados
índices de qualidade de vida de Portugal e que se assumiu como sede de importantes
empresas ligadas às novas tecnologias e à prestação de serviços –, esses fatores sociais
estejam sobrepujando os de ordem estrutural e de frequência de uso, fazendo com que
os falantes, de um modo geral, estejam preferindo a lateral palatalizada à lateral palatal.
Já, em Cacém, percebe-se que somente calhar, item lexical de alta frequência,
está atuando como favorecedor da aplicação da regra. Além disso, esse vocábulo,
também apresenta os condicionamentos linguísticos apresentados, (cf. itens 6.2.2 e
6.2.4), como favorecedores de [lj]: apresenta vogal dorsal antes de // e está inserido na
expressão “se calhar”, escolhida pelo programa probabilístico GoldVarb-X, como a que
mais favorece o uso da lateral palatalizada na RMLIS.
162
7 ANÁLISE ACÚSTICA DAS VARIANTES DE //
7.1 Observações preliminares
Tendo em vista que, para alguns autores como Pontes (1973) e Cristófaro-Silva
(1999), a consoante [] ocorre na fala de poucos falantes do PB, que a substituem por
[lj] e que, ainda segundo Câmara Jr. (1979), é comum a neutralização do contraste /l/ -
// diante de /i/ com a realização, apenas, do primeiro membro [l], e que, não só
segundo Cagliari (1974), mas também de acordo com Cunha (1986), o ieísmo é bastante
comum no PB, verificou-se a necessidade de se fazerem algumas análises acústicas a
fim de observar as características formânticas das variantes das laterais. Cabe ressaltar
que (1) a inserção da lateral anterior velarizada no estudo advém da observação da fala
de alguns informantes do PB e do PE que, por vezes, produzem a lateral anterior /l/
como uma velarizada [] e, (2) embora o [j] não seja uma lateral, pelo fato de ser uma
realização possível do fonema // no PB e no PE, optou-se por incluí-lo na análise.
Como para Ohala (1987), o nosso conhecimento do mundo está sujeito a
distorções e que, justamente por isso, se torna necessário refinar e estruturar as nossas
observações de tal modo que se eliminem ou atenuem os fatores que possam distorcer o
nosso conhecimento ou torná-lo ambíguo, optou-se por criar um corpus complementar,
gravado no Laboratório de Fonética da UFRJ, que contempla a produção das laterais em
quatro contextos, a saber: (a) o primeiro, com as variantes das laterais seguidas pela
vogal dorsal [a], (b) o segundo, com as variantes seguidas pela vogal + anterior [i], (c) o
terceiro, somente com as variantes [] e [lj] – que mostraram ser as mais produtivas nas
amostras do PB e do PE – seguidas pela vogal [a] e (d) o quarto, com as variantes lateral
palatal e lateral palatalizada, seguidas de [i]. Nos dois primeiros contextos, todas as
variantes analisadas se encontram em sílaba tônica e, nos terceiro e quarto, [] e [lj] se
estão em sílaba postônica.
Com os dois primeiros contextos, por meio de uma análise acústica, pretende-se
observar os perfis espectrográficos das laterais para averiguar possíveis diferenças e/ou
semelhanças entre elas. Para a feitura dessa análise, as frases “Eu disse te'_ado de novo”
e “Eu disse to'_ido de novo” foram ditas três vezes por um mesmo informante
163
masculino, com cada uma das variantes e digitalizadas com o auxílio do Programa Praat
para que pudessem ser analisados os seus respectivos espectrogramas.
Com os terceiro e quarto contextos, analisaram-se somente as variantes [] e [lj],
em sílaba postônica, para averiguar se os resultados encontrados nas análises
empreendidas com os dois primeiros contextos ocorreriam, também, com essas
variantes, num ambiente com menor intensidade. Aqui, assim como foi feito nos dois
primeiros contextos, as frases “Eu disse „te_a de novo” e “Eu disse „te_e de novo”
foram ditas três vezes pelo mesmo informante masculino, com cada uma das variantes,
e digitalizadas com o auxílio do Programa Praat.
Conforme se verá mais adiante através da descrição das análises acústicas, para
que o resultado fosse mais confiável, mediu-se cada um dos formantes de todas as
variantes, em todas as suas repetições, e depois foi estabelecida a média dos valores
encontrados. Ressalte-se, ainda, que os formantes – F1, F2, F3 e F4 – foram medidos no
centro de cada segmento.
7.2 Variantes em sílaba tônica
(a) Seguidas pela vogal [a]
A análise acústica das variantes das laterais foi efetuada, primeiramente, seguida
pela vogal [a], já que não só esse contexto subsequente é frequentemente utilizado nos
estudos acústicos sobre a lateral palatal na literatura especializada, mas também, pelo
fato de essa vogal ter sido considerada importante para a variação [] ~ [lj], na análise
sociolinguística empreendida neste trabalho (cf. capítulo 6).
Como pode ser visto na tabela 26, a variante [l] presente na palavra “te[l]ado”
apresenta os seguintes valores médios dos quatro primeiros formantes, medidos sempre
na porção central do segmento: F1 – 447 Hz, F2 – 1122 Hz, F3 – 3087 Hz e F4 3671
Hz.
164
Figura 9. Espectrograma do vocábulo (Eu disse) te[l]ado (2)53
(de novo), com [l] apical; F1 a
428Hz, F2 a 1124Hz , F3 a 2837Hz e F4 a 3634Hz.
Tabela 26. Média dos valores dos formantes de [l] seguido de [a] em sílaba tônica
Formantes
Vocábulos F1 F2 F3 F4
te[l]ado (1)54
446 1105 2949 3684
te[l]ado (2) 428 1124 2837 3634
te[l]ado (3) 468 1137 3476 3695
Média 447 1122 3087 3671
Desvio Padrão 20,1 16,1 341,2 32,5
Ao se compararem os valores médios dos formantes de [lj] na palavra “te[l
j]ado”
(F1 – 233 Hz, F2 – 1806 Hz, F3 – 2843 Hz e F4 – 3580 Hz) com os de [l], percebe-se
que houve um abaixamento significativo de F1 e, em menor escala, de F3, um
abaixamento mais singelo em F4 e uma elevação acentuada de F2, como pode ser visto
na tabela 27.
53
O número 2, ao lado, neste caso, do vocábulo „te[l]ado‟ indica segunda repetição. Assim sendo, essa
figura foi feita a partir da gravação da segunda repetição da frase (Eu disse) te[l]ado(2) (de novo). 54
Os números que aparecem nas tabelas, ao lado dos vocábulos, indicam a ordem das gravações. Ou seja,
1 – significa primeira gravação, 2 – segunda gravação, 3 – terceira gravação.
t e [ l ] a d u
165
Figura 10. Espectrograma do vocábulo (Eu disse) te[l j]ado(2) (de novo), com [l
j] laminal
(palatalizado) [lâmino-posalveolar]; F1 a 235 Hz, F2 a 1778 Hz, F3 a 2898 Hz e F4 a 3580 Hz.
Tabela 27. Média dos valores dos formantes de [l
j] seguido de [a] em sílaba tônica
Formantes
Vocábulos F1 F2 F3 F4
te[lj]ado (1) 228 1853 2785 3547
te[lj]ado (2) 235 1778 2898 3580
te[lj]ado (3) 235 1789 2848 3614
Média 233 1806 2843 3580
Desvio Padrão 4,1 40,5 56,6 33,5
Observando-se a tabela 28, percebe-se que a variante [] apresenta os seguintes
valores médios dos quatro primeiros formantes: F1 – 308 Hz, F2 – 1847 Hz, F3 – 2884
Hz e F4 – 3807 Hz.
Contrastando a configuração formântica desta variante com a da apresentada
anteriormente – [lj] –, percebe-se que poucas são as diferenças encontradas: os valores
médios dos formantes de [] são um pouco mais altos que os dos formantes de [lj]. Essa
diferença sutil encontrada parece justificar não só por que é tão difícil, muitas vezes,
perceber se um falante está pronunciando a lateral palatal propriamente dita ou a
t e [l j] a d u
166
palatalizada, mas também, entender por que muitos linguistas acreditam ser [lj] a
variante mais produtiva de // no PB. Essa suposição, que provavelmente decorre da
impressão sensorial que se tem ao se tentar articular as duas variantes, pode advir da
semelhança acústica de ambas as variantes.
Se forem comparados os valores médios dos formantes de [] com os de [l],
percebe-se que F1 e F3 de [] são mais baixos que os de [l] e F2 e F4 de [] são mais
altos que os de [l]. Esse resultado é, em parte, o mesmo encontrado no estudo de Stein
(2011), para quem as médias de F2 serem mais altas para [] do que para [l] é previsível
segundo o modelo de Lindbloom & Sundberg (1971), já que, segundo esses autores, no
tocante à abertura da mandíbula, parece ocorrer um grande crescimento no valor de F2
para as consoantes que são produzidas com a língua retraída em direção ao palato mole,
que é o caso da palatal [] e não de [l], que é uma alveolar.
Figura 11. Espectrograma do vocábulo (Eu disse) te[]ado(2) (de novo), com [] dorsal
[dorso-palatal]; F1 a 269 Hz, F2 a 1851 Hz, F3 a 2974 Hz e F4 a 3942Hz.
Figura 10
t e [] a d u
167
Tabela 28. Média dos valores dos formantes de [] seguido de [a] em sílaba tônica
Formantes
Vocábulos F1 F2 F3 F4
te[]ado (1) 373 1803 2797 3755
te[]ado (2) 269 1851 2974 3942
te[]ado (3) 281 1887 2882 3725
Média 308 1847 2884 3807
Desvio Padrão 56,9 42,1 88,5 117,6
A partir dos dados apresentados na tabela 29, vê-se que os valores médios dos
formantes da variante [j] inserida na palavra “te[j]ado” são os seguintes: F1 – 276 Hz,
F2 – 2128 Hz, F3 – 3180 Hz e F4 – 3670 Hz.
Comparando esses resultados com os encontrados nas demais variantes vistas até
agora, observa-se que há bastante diferença entre elas: o primeiro formante de [j] é mais
baixo que os de [] e [l] e mais alto que o de [lj]; os segundo e terceiro formantes de [j]
são mais altos do que os das demais variantes e o quarto formante apresenta o mesmo
valor do de [l], valor mais baixo que o de [] e mais alto que o de [lj] (cf. tabelas 26, 27,
28, 29).
Figura 12. Espectrograma do vocábulo (Eu disse) te[j]ado(2) (de novo), com [j] semivogal;
F1 a 275 Hz, F2 a 2130 Hz, F3 a 3187 Hz e F4 a 3650 Hz.
t e [ j ] a d u
168
Tabela 29. Média dos valores dos formantes de [j] seguido de [a] em sílaba tônica
Formantes
Vocábulos F1 F2 F3 F4
te[j]ado (1) 253 2141 3242 3682
te[j]ado (2) 275 2130 3187 3650
te[j]ado (3) 301 2112 3112 3679
Média 276 2128 3180 3670
Desvio Padrão 24,1 14,6 65,2 17,7
Conforme pode ser verificado na tabela 30, as médias dos formantes de [] são
as apresentadas a seguir: F1 – 467 Hz, F2 – 914 Hz, F3 – 3221 Hz e F4 – 3584 Hz.
Comparando a configuração formântica de [] com as demais variantes da
lateral, observa-se que [] apresenta tanto F1 quanto F3 mais alto que os das outras e F2
mais baixo que o das demais. No que diz respeito ao F4, pode-se dizer que este é mais
baixo que o de [j], [] e [l] e apresenta um valor muito próximo do de [lj].
Embora, aparentemente, [] apresente formantes bastante díspares dos das
demais variantes das laterais, ao observar mais cuidadosamente as suas configurações
espectrográficas, percebe-se que há bastante semelhança entre [l] e [], o que pode ser
comprovado através das médias dos seus formantes, principalmente do primeiro, do
segundo e quarto, como pode ser visto a seguir: formantes de [l] – F1: 447 Hz, F2: 1122
Hz, F3: 3087 Hz, F4: 3671 Hz –; formantes de [] – F1: 467 Hz, F2: 914 Hz, F3: 3221
Hz, F4: 3584 Hz.
169
Figura 13. Espectrograma do vocábulo (Eu disse) te[]ado(2) (de novo), com []
velarizado; F1 a 434 Hz, F2 a 985 Hz, F3 a 3303 Hz e F4 a 3741 Hz.
Tabela 30. Média dos valores dos formantes de [] seguido de [a] em sílaba tônica
Formantes
Vocábulos F1 F2 F3 F4
te[]ado (1) 427 849 3121 3662
te[]ado (2) 434 985 3303 3741
te[]ado (3) 539 909 3241 3350
Média 467 914 3221 3584
Desvio Padrão 62,7 68,2 92,6 206,7
Merece ser salientado, ainda, que o fato observado por Stein (2011), a saber, que
mesmo em realizações plenamente palatais, e não palatalizadas, seria possível perceber
uma manifestação de um segmento que lembraria a vogal [i], não foi verificado nessa
análise.
t e [] a d u
170
(b) Seguidas pela vogal [i]
Como não só nos estudos de Câmara Jr. (1979), mas também nos de Madureira
(1999), Brandão (2007) e Ferreira (2011), a vogal + coronal [i] parecia influenciar a
concretização da variante [l], resolveu-se observar um segundo contexto em que, como
já foi dito anteriormente, foi gravada a frase “Eu disse to'_ido de novo” com as
diferentes variantes das laterais. Essa segunda análise teve por objetivo verificar se a
vogal + coronal [i], de alguma forma, modificava a configuração espectrográfica das
laterais.
Como pode ser visto na tabela 31, nota-se que a variante [l] presente na palavra
“to[l]ido” apresenta os seguintes valores médios dos quatro primeiros formantes: F1 –
244 Hz, F2 – 1612 Hz, F3 – 2391 Hz e F4 3497 Hz.
Figura 14. Espectrograma do vocábulo (Eu disse) to[l]ido(1) (de novo), com [l] apical; F1 a
213 Hz, F2 a 1687 Hz , F3 a 2402 Hz e F4 a 3494 Hz.
t o [ l ] i d u
171
Tabela 31. Média dos valores dos formantes de [l] seguido de [i] em sílaba tônica
Formantes
Vocábulos F1 F2 F3 F4
to[l]ido (1) 213 1687 2402 3494
to[l]ido (2) 249 1541 2300 3499
to[l]ido (3) 271 1609 2473 3498
Média 244 1612 2391 3497
Desvio Padrão 29,3 73,1 87 2,6
Comparando esse resultado com o encontrado na primeira análise empreendida,
com as palavras “telado/telhado”, percebe-se que a configuração formântica de [l] difere
bastante. Quando [l] vem seguido de vogal [a], os valores médios de F1, F3 e F4 são
mais altos (447 Hz, 3087 Hz, 3671 Hz, respectivamente). Já o F2 é mais baixo (1122
Hz) (cf. tabela 26).
Além disso, observa-se, também, que o F1 de [l] parece que se harmoniza com o
F1 da vogal [i]. A partir da figura 14, vê-se que a linha vermelha que assinala a
evolução temporal do primeiro formante de [l] permanece praticamente inalterada
durante a pronúncia do [i].
Conforme pode ser visto na tabela 32, a variante [lj] presente na palavra
“to[lj]ido” apresenta os seguintes valores médios dos quatro primeiros formantes: F1 –
253 Hz, F2 – 1617 Hz, F3 – 3290 Hz e F4 3561 Hz.
Ao comparar a configuração formântica desta variante com a anteriormente
apresentada, percebe-se que não houve muita diferença: somente o F3 é bem mais alto –
3290 Hz para [lj] e 2391 Hz para [l].
Ao contrastar o perfil espectrográfico de [lj] seguido pela vogal [a] e de [l
j]
seguido pela vogal [i], observa-se que também não há muita diferença: ocorre um
pequeno abaixamento de F2 (1806 Hz x 1617 Hz) e um aumento de F3 (2843 Hz x
3290).
Ao observar melhor, no entanto, as figuras 15 e 10, nota-se, mais uma vez, que o
primeiro formante de [lj] parece harmonizar-se com o primeiro formante de [i], o que
não ocorre com a vogal [a], na primeira análise. Nesta, percebe-se, claramente, que F1
sobe durante a pronúncia da vogal.
172
Figura 15. Espectrograma do vocábulo (Eu disse) to[l
j]ido(3) (de novo), com [l
j] laminal
(palatalizado) [lâmino-posalveolar]; F1 a 247 Hz, F2 a 1585 Hz , F3 a 2932 Hz e F4 a 3567 Hz.
Tabela 32. Média dos valores dos formantes de [l j] seguido de [i] em sílaba tônica
Formantes
Vocábulos F1 F2 F3 F4
to[lj]ido (1) 259 1477 3520 3548
to[lj]ido (2) 254 1790 3420 3570
to[lj]ido (3) 247 1585 2932 3567
Média 253 1617 3290 3561
Desvio Padrão 6,1 159 314,6 11,9
A partir dos dados apresentados na tabela 33, vê-se que os valores médios dos
formantes da variante [] inserida na palavra “to[]ido” são os seguintes: F1 – 266 Hz,
F2 – 1756 Hz, F3 – 2853 Hz e F4 – 3551 Hz.
t o [ l j ] i d u
173
Figura 16. Espectrograma do vocábulo (Eu disse) to[]ido(3) (de novo), com [] dorsal
[dorso-palatal]; F1 a 257 Hz, F2 a 1699 Hz , F3 a 2702 Hz e F4 a 3570 Hz.
Tabela 33. Média dos valores dos formantes de [] seguido de [i] em sílaba tônica
Formantes
Vocábulos F1 F2 F3 F4
to[]ido (1) 284 1780 2925 3481
to[]ido (2) 257 1791 2934 3604
to[]ido (3) 257 1699 2702 3570
Média 266 1756 2853 3551
Desvio Padrão 15,6 50,2 131,4 63,5
Aqui, à semelhança do que ocorre no primeiro contexto, o perfil espectrográfico
de [] é muito parecido com o de [lj]. Os valores médios de F1, F2 e F4 são
praticamente idênticos; somente o F3 de [] apresenta média 437 Hz mais baixa que o
de [lj], conforme pode ser visto a seguir: formantes de [] – F1: 266 Hz, F2: 1756 Hz,
F3: 2853 Hz, F4: 3551 Hz –; formantes de [lj] – F1: 253 Hz, F2: 1617 Hz, F3: 3290 Hz,
F4: 3561 Hz.
t o [ ] i d u
174
Com esse contexto, então, ratifica-se a hipótese de que, por apresentarem
configuração formântica muito parecida, é difícil distinguir a pronúncia de um [] da de
um [lj].
Além disso, nessa análise empreendida com as laterais seguidas de [i], os valores
médios de F2 e F3 de [], embora modestamente, também são mais altos que os de [l].
Isso demonstra que, independentemente da vogal que venha depois da consoante, o
perfil espectrográfico da lateral alveolar e da lateral palatal difere, comprovando o que
afirmam Lindbloom & Sundberg (1971): haver uma relação ampla entre a articulação e
o comportamento acústico das consoantes.
Como // é uma consoante palatal, suas médias de F2 e F3 devem ser maiores
que as verificadas para /l/, cujo ponto de articulação é alveolar. Assim, o F2 das
consoantes que são produzidas com a língua retraída em direção ao palato mole é maior
e o F3 é mais alto, caso a mandíbula esteja moderadamente aberta e a língua voltada
para a região do palato.
Conforme pode ser visto em seguida, a tabela 34 apresenta os seguintes valores
médios dos formantes da variante [j]: F1 – 230 Hz, F2 – 2171 Hz, F3 – 3219 Hz e F4 –
3621 Hz.
Comparando os resultados da primeira análise com os da segunda, percebe-se
que o perfil espectrográfico de [j] + [i] e o de [j] + [a] apresentam uma diferença
bastante modesta. Tanto F1 quanto F4 de [j] seguido de vogal [i] são um pouco mais
baixos do que os de [j] seguido de vogal [a]: F1: 230 Hz x 276 Hz.; F4: 3621 Hz x 3670
Hz. Já os valores médios de F2 e F3 seguidos da vogal [i] são um pouco mais altos que
os dos seguidos da vogal [a]: F2: 2171 Hz x 2128 Hz; F3: 3219 Hz x 3180 Hz. (conf.
tabelas 29 e 34)
Além disso, como era de se esperar, o F1 do iode, nessa análise, é muito
semelhante ao da vogal [i] que se lhe segue: a vogal, inclusive, conforme pode ser visto
na figura 17, parece uma continuação da semivogal.
175
Figura 17. Espectrograma do vocábulo (Eu disse) to[j]ido(2) (de novo), com [j] semivogal; F1
a 229 Hz, F2 a 2185 Hz , F3 a 3088 Hz e F4 a 3590 Hz.
Tabela 34. Média dos valores dos formantes de [ j ] seguido de [i] em sílaba tônica
Formantes
Vocábulos F1 F2 F3 F4
to[j]ido (1) 234 2080 3381 3704
to[j]ido (2) 229 2185 3088 3590
to[j]ido (3) 228 2249 3190 3570
Média 230 2171 3219 3621
Desvio Padrão 3,2 85,3 148,7 72,3
Conforme pode ser verificado na tabela 35, as médias dos formantes de [] são
as apresentadas a seguir: F1 – 374 Hz, F2 – 1106 Hz, F3 – 2513 Hz e F4 – 3554 Hz.
t o [ j ] i d u
176
Figura 18. Espectrograma do vocábulo (Eu disse) to[]ido(2) (de novo), com [] velarizado;
F1 a 434 Hz, F2 a 977 Hz , F3 a 2363 Hz e F4 a 3562 Hz
Tabela 35. Média dos valores dos formantes de [] seguido de [i] em sílaba tônica
Formantes
Vocábulos F1 F2 F3 F4
to[]ido (1) 448 982 2443 3560
to[]ido (2) 434 977 2362 3562
to[]ido (3) 242 1361 2736 3541
Média 374 1106 2513 3554
Desvio Padrão 115,1 220,3 196,7 11,6
Comparando a configuração formântica de [] com as demais variantes da
lateral, observa-se que a lateral alveolar velarizada apresenta o F1 mais alto do que o
das outras variantes e o F2 mais baixo. Quanto ao F3, percebe-se que o de [] é mais
alto que o de [l] e mais baixo que o de [j], [] e [lj]. Já a média dos valores de F4 de []
é muito próxima da das demais variantes.
t o [ ] i d u
177
Observando os dados dos primeiro e segundo contextos, verifica-se que o perfil
espectrográfico de [] é bastante semelhante tanto quando seguido de [a] quanto quando
seguido de [i]. O quarto formante, por exemplo, apresenta médias muito próximas: []
seguido de [a]: 3584 Hz; [] seguido de [i]: 3554 Hz. Somente o terceiro formante
apresenta-se um pouco mais desigual: 3221 Hz, quando [] está seguido de [a] e 2513
Hz, quando [] está seguido de [i].
Destaque-se, ainda, que a porção vocálica semelhante a um [i] detectada na lateral
palatal, tal como relatado por Stein (2011), tampouco se faz presente nesse contexto.
Observando as figuras 14, 15, 16 e 17, em que [l], [lj], [] e [j] vem seguido da vogal
[i], verifica-se que, na verdade, diferentemente do que ocorre com a vogal [a], o
primeiro formante de cada uma das variantes parece harmonizar-se com o F1 da vogal
[i].
7.3. Variantes em sílaba postônica
Conforme foi dito anteriormente, resolveu-se analisar, em sílaba postônica, as
variantes [] e [lj], também, seguidas pelas vogais [a] e [i] para verificar se os resultados
encontrados, em um ambiente com menor intensidade, seriam semelhantes aos que
foram verificados em sílaba tônica. O fato de ser dada atenção aqui somente às variantes
mencionadas acima, ocorre não só (1) pelo fato de esses segmentos terem sido os mais
produtivos na fala tanto da RMRJ quanto na da RMLIS (cf. capítulo 6), mas também (2)
para tentar confirmar se realmente há semelhança acústica entre [] e [lj] mesmo em um
ambiente cuja intensidade seja diferente da efetuada nos dois primeiros experimentos.
Assim sendo, a análise formântica das laterais palatal (dorsal) [] e palatalizada
(laminal) [lj], cujos formantes (F1, F2, F3 e F4) foram medidos no centro do segmento,
foi estabelecida nos vocábulos “telha” e “telhe”, nos contextos “Eu disse „te __ a‟ de
novo‟ e “Eu disse ‘te _ e‟ de novo”.
178
(a) Seguidas pela vogal [a]
Como pode ser visto na tabela 36, a variante [lj] presente na palavra “te[l
j]a”
apresenta os seguintes valores médios dos quatro primeiros formantes: F1 – 256 Hz, F2
– 1743 Hz, F3 – 2561 Hz e F4 3541 Hz.
Figura 19. Espectrograma do vocábulo (Eu disse) te[l j]a(1) (de novo), com [l
j]
laminal (palatalizado); F1 a 261, F2 a 1735 , F3 a 2560Hz e F4 a 3504Hz
Tabela 36. Média dos valores dos formantes de [l
j] seguido de [a] em sílaba postônica
Formantes
Vocábulos F1 F2 F3 F4
te[lj]a (1) 261 1735 2560 3504
te[lj]a (2) 253 1704 2542 3553
te[lj]a (3) 253 1791 2580 3565
Média 256 1743 2561 3541
Desvio padrão 4,6 44,1 19,0 32,31
Ao se compararem os valores médios dos formantes de [] + [a] (F1 – 275 Hz,
F2 – 1892 Hz, F3 – 2794 Hz e F4 – 3500 Hz) com os de [lj] + [a], percebe-se que
poucas são as diferenças visualizadas: os valores médios dos primeiro, segundo e
t e [l j] a
179
terceiro formantes da lateral palatal são um pouco mais altos que os dos formantes da
lateral palatalizada. Ou seja, conforme pode ser verificado na tabela 37, a diferença
encontrada entre os três primeiros formantes de [] e de [lj] seria a seguinte: F1 – 19 Hz
a mais; F2 – 149 Hz a mais; F3 – 233 Hz a mais. Somente o F4 de [] apresentou-se um
pouco mais baixo que o de [lj]: 41 Hz a menos.
Figura 20. Espectrograma do vocábulo (Eu disse) te[]a(3) (de novo), com []
dorsal [dorso-palatal]; F1 a 282 Hz, F2 a 1897 Hz, F3 a 2753 Hz e F4 a 3394 Hz
Tabela 37. Média dos valores dos formantes de [] seguido de [a] em sílaba postônica
Formantes
Vocábulos F1 F2 F3 F4
te[]a 1 277 1943 3026 3440
te[]a 2 265 1837 2604 3666
te[]a 3 282 1897 2753 3394
Média 275 1892 2794 3500
Desvio Padrão 8,7 53,2 214,0 145,6
t e [] a
180
Muito semelhante é o resultado encontrado na comparação entre [] e [lj], diante
de [a], em contexto tônico (cf. tabelas 27 e 28 da seção 7.2). Os valores médios dos
formantes da primeira variante, também, são sutilmente mais altos do que os da
segunda: F1 – 75 Hz a mais; F2 e F3 – 41 Hz a mais e F4 – 227 Hz. Em contexto
postônico, no entanto, a diferença entre F2 e F3 de [] e de [lj] é maior e o F4 apresenta-
se mais baixo em [] do que em [lj]. Acredita-se, entretanto, que essa pequena
discrepância, não impeça de se continuar afirmando que, pelo fato de [] e [lj] serem
muito parecidos acusticamente, tem-se a impressão sensorial de só haver um fone, o que
justifica a dificuldade de se perceber se o falante está pronunciando a lateral palatal ou a
palatalizada.
(b) Seguidas pela vogal [i]
A tabela 38 demonstra que os valores médios dos quatro primeiros formantes da
variante [lj] diante de [i], em posição postônica, são os seguintes: F1 – 254 Hz; F2 –
1547 Hz; F3 – 2513 Hz e F4 – 3647 Hz. Já, observando-se a tabela 39, percebe-se que a
variante [], inserida na palavra “te[]e”, apresenta os seguintes valores médios dos
quatro primeiros formantes: F1 – 240 Hz, F2 – 1713 Hz, F3 – 2616 Hz e F4 – 3763 Hz.
Assim sendo, aqui, à semelhança do que ocorre, no contexto [a]/[lja], o perfil
espectrográfico de [i] é muito parecido com o de [lji]. O valor médio de F1 é um pouco
mais baixo e os valores médios de F2, F3 e F4 são ligeiramente mais altos, conforme
pode ser visto a seguir: formantes de [] + [i] – F1: 240 Hz, F2: 1713 Hz, F3: 2616 Hz,
F4: 3763 Hz –; formantes de [lj] + [i] – F1: 254 Hz, F2: 1547 Hz, F3: 2513 Hz, F4:
3647 Hz.
181
Figura 21. Espectrograma do vocábulo (Eu disse) te[l j]e(1) (de novo), com [l
j] laminal
(palatalizado); F1 a 257 Hz, F2 a 1508 Hz, F3 a 2510 Hz e F4 a 3657 Hz
Tabela 38. Média dos valores dos formantes de [l j] seguido de [i] em sílaba postônica
Formantes
Vocábulos F1 F2 F3 F4
te[lj]e (1) 257 1508 2510 3657
te[lj]e (2) 263 1478 2551 3694
te[lj]e (3) 242 1655 2477 3589
Média 254 1547 2513 3647
Desvio Padrão 10,8 94,7 37,1 53,3
Ao comparar a configuração formântica da lateral palatalizada, diante da vogal
[a] com a da diante da vogal [i], percebe-se que não há muita diferença: o F1, o F2 e o
F3 de [lj] + [i] são um pouco mais baixos que os de [l
j] + [a] e o F4 se apresenta
sutilmente mais alto: F1: 254 Hz com [lji] e 256 Hz com [l
ja]; F2: 1547 Hz com [l
ji] e
1743 Hz com [lja]; F3: 2513 Hz com [l
ji] e 2561 Hz com [l
ja], F4: 3647 Hz com [l
ji] e
3541 Hz com [lja] (cf. tabelas 36 e 38).
Ressalte-se, ainda, que, observando atentamente a figura 21, percebe-se que, à
semelhança do que aconteceu com o segundo contexto, apresentado na seção 7.2, o
primeiro formante de [lj] parece harmonizar-se com o primeiro formante de [i], o que
t e [l j] e
182
não ocorre, com a vogal [a]. Por meio da figura 19, percebe-se que, na análise de [lj] +
[a], há uma sutil subida de F1 durante a pronúncia da vogal.
Figura 22. Espectrograma do vocábulo (Eu disse) te[]e(2) (de novo), com [] dorsal [dorso-
palatal]; F1 a 246 Hz, F2 1643 Hz, F3 a 2585 Hz e F4 a 3769 Hz
Tabela 39. Média dos valores dos formantes de [] seguido de [i] em sílaba postônica
Formantes
Vocábulos F1 F2 F3 F4
te[]e (1) 253 1729 2609 3813
te[]e (2) 246 1643 2585 3769
te[]e (3) 232 1767 2654 3707
Média 240 1713 2616 3763
Desvio Padrão 7,4 63,5 35,0 53,3
Ao contrastar o perfil espectrográfico da lateral palatal seguida pela vogal [i] ao
do seguido por [a], observa-se que, também, não há muita diferença: ocorre um
abaixamento de F1 (275 Hz em [a] x 240 Hz em [i]), F2 (1892 Hz em [a] x 1713
t e [] e
183
Hz x em [i]) e F3 (2794 Hz em [a] x 2616 Hz em [i]) e um aumento de F4 (3500 Hz
em [a] x 3763 Hz em [i]).
Na figura 22, nota-se que o primeiro formante de [], também se harmoniza com
o F1 da vogal [i] que se lhe segue. O mesmo não se visualiza na lateral palatal seguida
de [a], em que há um leve deslocamento para cima do primeiro formante da vogal.
Nesse sentido, percebe-se que, em sílaba postônica, está ocorrendo o mesmo que
se visualizou em sílaba tônica (cf. seção 7.2). Ou seja, o que é defendido por Stein
(2011), novamente não é encontrado nesses contextos. Quando a lateral palatal está ao
lado da vogal [a], não se percebe a manifestação de um segmento que se assemelhe a
um [i]. O que está ocorrendo, na verdade, é uma harmonização entre o F1 de [] com o
F1 da vogal [i], que não acontece com a vogal [a].
Assim sendo, a principal diferença encontrada entre a lateral palatal e a
palatalizada, em ambientes de intensidade distintas, diz respeito, principalmente, aos
valores do primeiro e segundo formantes: em sílaba tônica, quando o fone era [], tanto
F1 quanto F2, deslocavam-se para cima (cf. tabelas 27, 28, 32, 33), já em contexto
postônico, a subida se dá mais especificamente no segundo formante (cf. tabelas 36, 37,
38, 39).
Nesse sentido, uma vez mais, pode-se afirmar que a configuração formântica da
lateral palatal é muito semelhante da da lateral palatalizada, o que corrobora a hipótese
de que essa pouca diferença parece justificar por que é tão difícil perceber se um falante
está produzindo [] ou [lj].
7.4 Síntese dos resultados
Depois de serem analisadas as características formânticas das variantes de //,
tanto em contexto tônico, quanto em postônico, carece relacioná-las às encontradas nos
estudos de Lindbloom & Sundberg (1971), Quilis (1988), Ladefoged & Maddieson
(1996), Ladefoged (2003), Martínez Celdrán & Fernández Planas (2007), Stein (2011) e
Monteiro (2012), reafirmando alguns comentários feitos, ao longo das seções 7.2 e 7.3.
184
Quilis (1988) afirma não existir, para a língua espanhola, praticamente nenhuma
diferença na frequência de F1 do fone [], em contextos tônicos ou átonos. Já F2 e F3,
mantêm uma frequência mais alta em sílaba tônica do que em átona. Observando a
tabela 40, em que se demonstram os valores médios de F1, F2, F3 e F4 da variante []
seguido de [a] e [i], no corpus gravado em laboratório, em diferentes ambientes de
tonicidade, percebe-se que, no PB, diferentemente do que foi apontado por Quilis (op.
cit.), o primeiro formante da lateral palatal, seguida de [a] ou [i], apresenta frequência
um pouco maior em sílaba tônica. Quanto aos valores dos segundo e terceiro formantes,
os resultados obtidos para o PB, em laboratório, vão ao encontro do que é apresentado
pelo linguista espanhol. Com exceção do valor de F2, que no contexto [a] postônico,
se apresenta sutilmente mais alto que no tônico, os demais valores médios, tanto de F2
quanto de F3, são mais altos em ambiente tônico.
Tabela 40. Valores médios dos formantes de [], seguido de [a] ou [i], em sílaba tônica e
postônica, no PB
Formantes
Intensidade da sílaba
F1
(Valor médio)
F2
(Valor médio)
F3
(Valor médio)
F4
(Valor médio)
Tônica [] + [a] 308 1847 2884 3807
[] + [i] 266 1756 2853 3551
Postônica [] + [a] 275 1892 2794 3500
[] + [i] 240 1713 2616 3763
Monteiro (2012) observou que a consoante [] revela sofrer efeitos de
coarticulação, visto que se registram diferenças nos valores de F1, F2 e F3 em função
do contexto vocálico adjacente. De acordo com essa linguista, no que se refere a F1, há
valores mais elevados quando a lateral palatal está próxima da vogal /a/ e valores mais
baixos em contexto de /i/. Em relação a F2 e F3, os seus resultados mostram que,
quando próximo da vogal /a/, o // apresenta o valor mais baixo e, quando junto da
vogal /i/, o valor mais alto.
185
A tabela 40 indica que, no PB, assim como foi observado no PE por Monteiro
(2012), a lateral palatal parece sofrer influência do contexto vocálico adjacente, haja
vista que os valores médios dos seus formantes, em sílaba tônica ou postônica, se
modificam a depender da vogal que a segue. Os índices, contudo, apontados por
Monteiro (op.cit), somente conferem com os apresentados neste estudo no que diz
respeito a F1; quanto a F2 e F3, ocorre justamente o contrário: os valores médios do
primeiro, segundo e terceiro formantes de [] são sempre mais altos quando próximos
de [a] e mais baixos quando seguidos de [i].
Quando compara a configuração acústica da laterais, Ladefoged (2003) comenta
que o segundo formante da lateral palatal é mais alto do que o da lateral alveolar (ápico
ou lâmico-alveolar). O mesmo é observado por Lindbloom & Sundberg (1971) e Stein
(2011) que acrescentam ser o valor de F3, também, mais alto quando o som é um [], já
que para a emissão desse fone a mandíbula está moderadamente aberta e a língua
voltada para a região do palato. Os resultados expostos, na tabela 41, ratificam, em
parte, o que foi afirmado pelos autores. A lateral palatal seguida por [a] ou [i] apresenta
o segundo formante mais alto do que o da lateral alveolar [l]. Já os valores médios de
F3, entretanto, são um pouco diferentes de acordo com a vogal que segue a lateral.
Quando a vogal adjacente é um [i], o valor do terceiro formante de [] é mais alto que o
de [l], quando é um [a], o F3 de [] é sutilmente mais baixo que o de [l]55
.
55
Como se pode verificar nas repetições da frase “(Eu disse) „te__ado‟ (de novo)” (tabelas 26 e 28), os
valores para F3 obtidos no PB em duas das três repetições foram muito próximos, indicando que
provavelmente não haja um comportamento significativamente diferente desse formante nessas duas
variantes das laterais; um estudo mais aprofundado, com maior número de dados, é necessário para se
dirimir essa questão.
186
Tabela 41. Valores médios dos formantes de [] e [l] seguidos de [a] e [i], no PB
Formantes
Variantes [] e [l]
F1
(Valor médio)
F2
(Valor médio)
F3
(Valor médio)
F4
(Valor médio)
Variante [] seguida de [a] 308 1847 2884 3807
Variante [] seguida de [i] 266 1756 2853 3551
Variante [l] seguida de [a] 447 1122 3087 3671
Variante [l] seguida de [i] 244 1612 2391 3497
Martínez Celdrán & Fernández Planas (2007), ao descreverem os sons do
espanhol, observam que existe uma distinção entre uma lateral palatalizada, variante da
alveolar56
, e a palatal plena. A grande diferença existente entre esse dois sons ocorreria
nos picos dos primeiros formantes, embora seja, no segundo, que se apresente a maior
distinção: a variante palatal apresentaria F2 mais alto que o da palatalizada. Ladefoged
& Maddieson (1996), estudando as distintas laterais de três línguas australianas,
observam o mesmo: a lateral laminal pós-alveolar (lateral palatalizada) apresentaria o
segundo formante mais alto que o das variantes apicais. A tabela 42 mostra que a
diferença observada entre [] e [lj], tanto na língua espanhola quanto nas línguas
australianas, também ocorre no PB. Ou seja, a partir do corpus criado em laboratório,
foi possível verificar que, no PB, o segundo formante da lateral palatal (marcado em
amarelo na tabela 42) é mais alto que o da lateral palatalizada, independentemente da
vogal adjacente à lateral ou da intensidade da sílaba.
56
Embora os autores considerem a lateral palatalizada uma variante da lateral anterior, nesta tese a
consideramos uma variante da lateral posterior. Isso não faz com que as informações fornecidas por esses
linguistas sejam inválidas. Pelo contrário, vão ao encontro do que é apresentado, inclusive, por Ladefoged
& Maddieson (1996), no que diz respeito a três línguas australianas.
187
Tabela 42. Valores médios dos formantes de [] e [lj], seguido de [a] ou [i], em sílaba tônica e
postônica, no PB
Formantes
Variantes [] e [lj]
F1
(Valor médio)
F2
(Valor médio)
F3
(Valor médio)
F4
(Valor médio)
Tônica [] + [a]
[lj] + [a]
308
233
1847
1806
2884
2834
3807
3580
[] + [i]
[lj] + [i]
266
253
1756
1617
2853
3290
3551
3561
Postônica [] + [a]
[lj] + [a]
275
256
1892
1743
2794
2561
3500
3541
[] + [i]
[lj] + [i]
240
254
1713
1547
2616
2513
3763
3647
Por meio da tabela 42 é possível verificar, também, a tamanha semelhança
acústica entre a lateral palatal e a lateral palatalizada. Em outras palavras: por mais que
os valores médios de cada formante difiram em ambas as variantes, essas diferenças são
muito sutis.
A grande semelhança da configuração formântica dessas variantes de // parece
justificar não só por que, muitas vezes, é difícil perceber se um falante está
pronunciando a lateral palatal ou a palatalizada, mas também entender por que
linguistas, como Pontes (1973) e Cristófaro-Silva (1999), por exemplo, acreditam ser
[lj] a variante mais produtiva de // no PB. A primeira afirma que “óleo-olho”, na
língua coloquial, seriam pronunciadas da mesma maneira – [ju] – não havendo,
portanto, o contraste que é sugerido pela escrita. Já a segunda assevera que “a lateral
palatal ocorre na fala de poucos falantes do português brasileiro”, sendo a lateral
palatalizada produzida no lugar de [] (cf. CRISTÓFARO-SILVA,1999, p. 40). Essas
suposições, que provavelmente decorrem da impressão sensorial que se tem ao se tentar
articular as duas variantes, pode advir da semelhança acústica que há entre os dois
segmentos.
Merece salientar ainda que, ao observar os padrões formânticos das variantes das
laterais seguidas de [a] ou de [i], em contexto tônico, e perceber que há semelhanças e
188
diferenças entre eles, criaram-se dois gráficos para que fosse possível visualizar como
essas variantes se distribuem, no espaço acústico dos dois primeiros formantes.
Por meio do gráfico 10 e da tabela 43, em que se verifica a disposição, no espaço
acústico, das variantes seguidas de [a], percebe-se que, com base no comportamento dos
dois primeiros formantes, as variantes podem ser distribuídas por quatro categorias, a
saber: (a) os dois primeiros formantes muito afastados: [j], (b) medianamente afastados:
[lj] e [], (c) relativamente próximos: [l] e (d) muito próximos: [].
Gráfico 10. Distribuição, no espaço acústico, das variantes
das laterais seguidas pela vogal [a], no PB.57
0
500
1000
1500
2000
2500
[j] [lj] [lh] [l] [l] vel.
F2
F1
Tabela 43. Valores de F1 e F2 das variantes das laterais
seguidas pela vogal [a], no PB
Variantes
Formantes [j] [l
j] [] [l] []
F2 2128 1806 1847 1122 914
F1 276 233 308 447 467
Em outras palavras, as três primeiras variantes são “difusas”, ao estilo da vogal
[i], e as duas últimas laterais são mais “compactas”, como a vogal [u]. Essa observação
se justifica acusticamente, uma vez que a lateral anterior velarizada [] se aproxima da
vogal velar [u] e a lateral palatalizada, da vogal palatal [i].
57
No gráfico 10, [lj], [lh] e [l] vel. correspondem a [lj], [] e [], respectivamente.
189
Já a partir do gráfico 11 e da tabela 44, pode-se visualizar a distribuição, no
espaço acústico, das variantes [j], [lj], [], [l] e [] diante da vogal [i]. Aqui, levando-se
em conta, novamente, somente os dois primeiros formantes, em vez de quatro categorias
nitidamente distintas, haveria apenas três, a saber: (a) os dois primeiros formantes muito
afastados: [j], (b) medianamente afastados: [l], [lj] e [], (c) muito próximos: [].
Gráfico 11. Distribuição, no espaço acústico, das variantes das laterais
seguidas pela vogal [i], no PB.58
0
500
1000
1500
2000
2500
[j] [lj] [lh] [l] [l] vel.
F2
F1
Tabela 44. Valores de F1 e F2 da variantes de // e da
lateral anterior velarizada [] seguidas pela vogal [i], no PB
Variantes
Formantes [j] [l
j] [] [l] []
F2 2171 1617 1756 1612 1106
F1 230 253 266 244 374
Assim sendo, na análise das variantes diante de [i] tem-se, também, F1 e F2
muito afastado com [j], muito próximos com [] e medianamente próximos com [lj] e
com []. A diferença, em relação ao contexto diante de [a], diz respeito a [l] que, antes
de [i], também vai se distribuir, no espaço acústico, de maneira similar a [lj] e [] e não
à lateral anterior velarizada, como ocorreu com a variante [l] seguida por [a]. Esse
58
No gráfico 11, [lj], [lh] e [l] vel., também, correspondem a [lj], [] e [], respectivamente.
190
resultado, a princípio, parece fazer sentido, haja vista que [l] está se coarticulando com
o [i] – vogal palatal que vem em seguida –, fenômeno que gerou, historicamente, o
surgimento do fonema // na passagem do latim ao português.
Essa coarticulação da lateral [l] com a vogal [i] que se lhe segue é, de certa
maneira, verificada, também, com as variantes [] e [lj], seja em contexto tônico, seja
em ambiente átono. Observando as figuras 15, 16, 21 e 22, percebe-se que o primeiro
formante dessas variantes se harmoniza com o primeiro formante de [i]. Ou seja, vê-se,
claramente, que a linha vermelha que assinala a evolução temporal do primeiro
formante de [l] permanece praticamente inalterada durante a pronúncia do [i]. Essa
proximidade acústica na articulação da palatal e da apical no contexto diante de [i], de
certa forma, parece justificar não só a passagem de [l] + [i] > [lj] > [], ocorrida na
evolução do latim ao português, mas também a variação [] ~ [lj] ~ [lj] ~ [l], chamada
por Cagliari (1974) de despalatalização ou enfraquecimento da lateral palatal. Esse
fenômeno, muito comum na atualidade (cf. capítulo 6), é considerado por esse linguista
uma etapa de evolução da palatal, a partir da qual se operam várias transformações,
sendo a realização palatalizada, intermediária na passagem da palatal para não-palatal.
191
8 CONCLUSÕES
O estudo sobre o comportamento de // na fala da RMRJ e na da RMLIS foi
realizado, essencialmente, com o objetivo de aferir a atuação de variáveis estruturais e
extralinguísticas sobre as variantes de // registradas nos corpora representativos da
fala da Região Metropolitana do Rio de Janeiro e da Região Metropolitana de Lisboa.
Os capítulos iniciais introduzem o tema, não só tecendo comentários gerais
sobre essa variação mas também, por meio de uma revisão bibliográfica, mostrando os
resultados de outras investigações. Mais adiante, apresentam-se alguns enfoques
linguísticos quanto ao estudo da variação e da mudança bem como os pressupostos
teórico-metodológicos que fundamentaram a elaboração desta tese e que se enquadram
nas linhas da Sociolinguística Quantitativa Laboviana e da Fonologia Experimental,
com base em Ohala (1987).
A pesquisa, que se desenvolveu em duas etapas, mostrou, de modo geral, que (1)
em ambas as Regiões Metropolitanas a variante [lj] é mais produtiva que []; (2) a
variação [] ~ [lj], tanto na fala da RMRJ, quanto na da RMLIS, apresentou índices
próximos à neutralidade no que toca à atuação de determinados fatores, o que
provavelmente se deve à semelhança das duas variantes tanto do ponto de vista
articulatório quanto acústico, (3) os fatores linguísticos selecionados como
favorecedores da aplicação de [lj] parecem sofrer interferência dos vocábulos com
alta/média incidência nos corpora e (4) as demais variantes de // ([lj], [l], [j] e ), pelo
fato de as amostras retratarem a fala urbana, são pouco produtivas, incidindo em
reduzido número de itens lexicais.
Na primeira etapa do trabalho, analisou-se, com base nos pressupostos da Teoria
da Variação Laboviana, a variável // tanto na RMRJ como na RMLIS. Constatou-se,
inicialmente, que, devido à sua baixa produtividade, as variantes despalatalização
seguida de iode ([lj]), despalatalização ([l]), iodização ([j]), e síncope do segmento ( )
deveriam ser desconsideradas nas análises variacionistas que seriam realizadas com
ambas as amostras.
192
Assim sendo, analisaram-se de maneira qualitativa as variantes menos
produtivas, tendo-se observado que:
(a) o cancelamento, que aparece em apenas um item lexical nas amostras,
apesar de ter ocorrido na fala de indivíduos mais velhos e com baixo nível
de escolaridade, aparentemente, não está relacionado a questões de ordem
social, mas sim idioletais.
(b) a iodização ocorreu, em ambos os corpora, somente nas formas
relacionadas a olho/olhar e trabalho/trabalhar. Como foram encontrados
poucos dados dessa variante, acredita-se que essas ocorrências poderiam
estar relacionadas quer (i) a questões de ordem idioletal, haja vista que essa
variante não é usual na fala urbana quer, mais propriamente, (ii) a fatores
de ordem social, já que os poucos casos registrados podem estar indicando
certa interferência do nível de escolaridade: das 30 ocorrências de [j],
apenas duas, são encontradas na fala de um indivíduo de nível superior.
(c) a despalatalização ocorreu em vocábulos cujo contexto subsequente a //
apresenta vogal [+ cor], em especial quando esta constitui parte do sufixo -
inho;
(d) a despalatalização seguida de iode, aparentemente, parece estar sendo
influenciada pelo contexto antecedente, visto que o maior número de dados
com [lj] aparece no item lexical filho, que apresenta a vogal [i] antes de
//. Além disso, foi observado que [lj] parece estar se configurando como
uma variante inovadora, na RMRJ, pois é menos comum na fala de
indivíduos mais velhos e com mais tempo de escolaridade. Já na fala da
RMLIS, embora os casos de [lj] estejam distribuídos de maneira uniforme
entre as três faixas etárias, os três níveis de instrução e os dois gêneros,
acreditou-se que essa variante poderia também ser considerada inovadora
na região em foco, já que ela foi mais encontrada em Oeiras, concelho
apontado nas análises sociolinguísticas como mais propenso às variantes
inovadoras.
Quando se descartaram as variantes menos produtivas, foram feitas análises
sociolinguísticas, em separado, com cada Região Metropolitana. Os resultados – que
193
foram demonstrados de forma comparativa – revelaram que tanto as variáveis
linguísticas quanto as extralinguísticas se mostraram salientes para a realização de [lj],
não só na RMRJ como também na RMLIS.
Mostraram-se relevantes para a implementação de [lj], por ordem de seleção, na
RMRJ, as variáveis Frequência do vocábulo no corpus, Classe do vocábulo, Nível de
instrução, Tonicidade da sílaba em que incide o segmento, Contexto subsequente, Faixa
etária; na RMLIS, as variáveis Localidade, Faixa etária, Contexto antecedente, Classe
do vocábulo.
Assim, atuaram,
(a) em ambas as amostras:
(i) Faixa Etária – a variação [] ~ [lj] é um fenômeno estável na RMRJ e
na RMLIS, visto que os índices de ocorrência de [lj] estão distribuídos de
forma homogênea pelas três faixas etárias. Os resultados, no entanto,
demonstram também que, embora os P.Rs. estejam próximos de .50, nas
duas regiões em foco, o fato de, na RMRJ, os mais velhos estarem usando
mais o [] e os mais novos, o [lj], sugere, de forma sutil, uma tendência
crescente ao uso desta última variante no PB. Já no PE, o uso de [lj] parece
estar num processo mais avançado, já que a variante palatalizada está
sendo mais usada pelos mais jovens e menos pelos mais velhos.
(ii) Classe do vocábulo – Na RMRJ, os verbos se mostraram os
favorecedores da lateral palatalizada. Já na RMLIS, os verbos e a
expressão “se calhar” foram os fatores selecionados como os que mais
favoreceriam a aplicação de [lj];
No que toca a essa variável, a alta incidência de determinados vocábulos
nas amostras pareceu influenciar a escolha de um fator em detrimento de
outro. Como na RMRJ, há uma alta incidência de verbos na amostra, essa
classe de palavras foi a selecionada como favorecedora de [lj]. Na RMLIS,
a escolha dos fatores favorecedores também foi induzida pela alta
produtividade não só dos verbos como também do vocábulo calhar.
194
(b) somente na RMRJ:
(i) Frequência do vocábulo no corpus – Esse grupo de fatores pareceu
atuar de maneira significativa para a concretização de [lj], na RMRJ, não
só pelo fato de ter sido o primeiro selecionado em todas as rodadas
empreendidas, mas também porque demonstra que quanto maior a
frequência de determinados vocábulos, maior a possibilidade de ser
concretizada a variante palatalizada: palavras com alta ou média incidência
no corpus, ainda que tenham sido, às vezes, produzidas com outras
variantes, foram concretizadas, preferencialmente com [lj].
(ii) Nível de instrução – São os indivíduos com escolaridade intermediária,
seguidos pelos de menor nível de instrução, os que mais produzem [lj], na
RMRJ. No entanto, por mais que a variante [lj] se mostre mais atuante na
fala de indivíduos com menor escolaridade e a variante [], na dos
indivíduos com mais escolaridade, a variação [] ~ [lj] parece ainda estar
estável, uma vez que os P.Rs. estão muito próximos de .50.
(iii) Tonicidade da Sílaba – As sílabas postônicas parecem estar
influenciando a concretização de [lj], na RMRJ. Esses resultados,
entretanto, provavelmente foram influenciados pela alta incidência de
vocábulos que apresentam //, em contexto postônico.
(iv) Contexto Subsequente – Na RMRJ, a vogal dorsal e as vogais labiais
se mostraram relevantes para a implementação da regra, o que também
parece ser influenciado pelos vocábulos presentes na amostra, já que há
itens lexicais de média e alta frequência com [a], [], [u] depois da
variável //.
(c) somente na RMLIS:
(i) Localidade – Essa variável foi bastante significativa, na análise efetuada
com a RMLIS, já que, em todas as rodadas empreendidas, sempre foi
selecionada em primeiro lugar, como favorecedora da lateral palatalizada.
Oeiras aparece como a região que mais implementa [lj]. Cacém, ao
contrário, é a que menos a utiliza. Embora as hipóteses iniciais não
195
previssem esse resultado, ele é extremamente coerente com o que foi sendo
apresentado ao longo das análises: como [lj] se mostrou uma variante
inovadora de //, na fala da RMLIS, bastante natural seria que Oeiras,
localidade desenvolvida e urbanizada que apresenta um dos mais elevados
índices de qualidade de vida de Portugal, estivesse preferindo a lateral
palatalizada em detrimento da lateral palatal.
(ii) Contexto antecedente – Na RMLIS, são a vogal dorsal e as labiais que
estão influenciando a ocorrência de [lj]. Esses índices probabilísticos
sugerem que palavras com frequência alta/média que apresentam esses
contextos em posição anterior a //, no corpus, favorecem tal resultado.
Como se observou ao longo de toda a análise sociolinguística, os resultados
encontrados quanto à variação [] ~ [lj], provavelmente, não estão representando um
condicionamento apenas estrutural/social, mas também um condicionamento
determinado pela frequência alta e/ou média de determinados vocábulos nas amostras.
Na segunda etapa do trabalho – com base nos pressupostos teóricos da
Fonologia Experimental – foram feitas análises em laboratório, para a obtenção das
características acústicas das diferentes variantes de //.
Com a criação de um corpus que contemplava a produção das laterais em quatro
contextos – os primeiros com as variantes das laterais, em contexto tônico, seguidas
pelas vogais [a] e [i] e os últimos, com as variantes [] e [lj], em ambiente postônico,
também seguidos pelas mesmas vogais – foi possível verificar, não só as diferenças e
semelhanças acústicas entre as distintas laterais e o [j] – variante de // tanto no PB
quanto no PE – como também ratificar o fato de ser muito difícil perceber se um falante
está produzindo [] ou [lj], justamente por esses sons apresentarem características
formânticas muito semelhantes.
Em síntese, observou-se que a variação entre [] e [lj] – estável, tanto na RMRJ
quanto na RMLIS, haja vista os inputs da regra (inicial e de seleção) – claramente está
abaixo do nível de consciência dos falantes, o que é previsível não só pela própria
196
origem do fonema palatal que advém de uma lateral seguida de um iode, mas,
principalmente, da proximidade acústica entre esses sons, comprovada por meio das
análises efetuadas em laboratório.
197
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206
10 ANEXOS
10.1 Distribuição das variantes de // pelos vocábulos na RMRJ
Tabela 45. Distribuição das variantes // por Copacabana
Itens Lexicais
(Copacabana) l
j lj l j Total
Acolhesse 2 2
Afilhado 1 1
Alho 1 1 2
Aparelhagem 1 1
Aparelho 2 2
Aparelhos 1 1
Atabalhoada 1 1
Atrapalhar 1 1
Atrapalharia 1 1
Atrapalhava 1 2 3
Atrapalho 1 1
Barulheira 1 1
Barulhento 1 1
Barulho 3 3
Batalha 1 1
Batalhão 55 3 58
Batalhões 9 2 11
Brilhante 1 1
Brilhou 1 1
Brincalhão 1 1 2
Bulhões 1 1
Carvalho 1 1
Coelho 1 1
Colhe 2 2
Colher 1 1
Colheres 2 2
Conselho 1 1
Detalhado 1 1
Detalhe 1 1 2
Detalhes 1 2 3
Embrulhava 1 1
Empecilho 1 1
Entulhado 1 1
Escolha 2 2
Escolhe 1 2 3
Escolhendo 1 1 2
Escolher 2 1 3
Escolheu 1 1
Escolhi 1 1
Escolhia 1 1
Esculhambação 4 1 5
Esculhambado 2 2
Espelho 1 1
Evangelho 1 1
Falha 2 2
Falhas 1 1
Filha 11 32 19 1 63
Filhas 2 3 1 6
207
Itens Lexicais
(Copacabana) l
j lj l j Total
Filho 11 49 40 100
Filhos 5 33 20 58
Filhozinho 2 1
Folha 4 4
Folhas 3 3
Galho 3 3
Humilhação 1 1 2
Ilha 4 4
Ilhas 2 2
Joelho 1 2 3
Julho 3 3
Lhes 1 1 2
Magalhães 1 1 2
Malhar 1 1
Manilha 3 3
Manilhinha 1 1
Maravilha 3 7 10
Maravilhosa 4 6 10
Maravilhosas 1 1 2
Maravilhoso 17 5 22
Maravilhosos 1 1
Medalha 1 1
Melhado 3 3
Melhor 25 35 60
Melhora 1 1
Melhorado 2 2
Melhorando 1 2 3
Melhorar 3 9 12
Melhore 1 1
Melhores 3 13 16
Melhoria 5 3 8
Melhorias 3 1 4
Melhorou 6 8 14
Melhorzinha 1 1
Mergulhão 1 1
Mergulhar 1 1 2
Metralhadora 2 2
Migalhas 1 1
Milhagem 1 1
Milhão 3 1 4
Milhões 4 4
Molho 1 7 8
Molhou 1 1
Mulher 16 27 8 51
Mulheres 2 1 3
Olha 12 105 117
Olhada 2 2
Olham 1 1
Olhando 5 11 16
Olhar 1 4 1 6
Olharam 1 1
Olhava 1 1 2
Olhei 1 1 2
Olho (Subst/Verbo) 1 3 4
Olhos 1 2 2 5
208
Itens Lexicais
(Copacabana) l
j lj l j Total
Olhou 2 2
Orelhada 1 1
Ovelha 1 1
Palha 3 3
Patrulhinha 1 1
Pilhas 1 1
Piolho 1 1
Quadrilha 1 1
Retalhada 1 1
Semelhança 4 4
Submetralhadora 1 1
Trabalha 13 28 3 44
Trabalham 1 8 9
Trabalhando 4 24 28
Trabalhar 15 61 76
Trabalharam 1 1
Trabalhasse 2 1 3
Trabalhava 8 14 22
Trabalhavam 2 2
Trabalhe 1 1
Trabalhei 7 18 25
Trabalho 7 76 1 1 85
Trabalhos 1 1
Trabalhou 6 3 9
Trilha 1 1
Trilho 3 3
Trilhozinho 1 1
Velha 5 4 9
Velhas 4 4
Velho 7 12 19
Velhos 5 5
Vermelha 2 4 6
Vermelho 3 1 4
Total 386 694 85 13 4 1 1183
209
Tabela 46. Distribuição das variantes // por Nova Iguaçu
Itens Lexicais
(Nova Iguaçu) l
j lj l j Total
Aconselha 1 1
Aconselhável 1 1
Aparelho 1 1
Atrapalha 4 4 1 9
Atrapalhar 2 2
Atrapalhe 1 1
Baralho 2 2
Batalha 1 1
Batalhando 3 3
Batalhão 1 1
Batalharem 1 1
Batalhou 1 1
Bilhete 1 1
Bilhetinho 1 1
Brilhante 1 1
Canalhice 1 1
Castelhano 1 1
Coelho 2 1 3
Colhe 2 2
Colher (verbo) 1 1
Compartilhada 3 3
Compartilhar 1 1
Conselho 2 2
Cordilheira 1 1
Detalhe 3 1 4
Escapulhada 1 1
Escolhe 1 1
Escolher 1 2 3
Escolheram 2 1
Escolheria 1 1
Escolhido 2 2
Esculhambou 1 1
Espalhar 1 1
Espalhou 2 2
Falha 2 2
Falhas 1 1
Falho 1 1 2
Falhou 1 1
Filha 7 17 23 47
Filhão 1 1
Filhas 7 7
Filhinha 1 1
Filhinho 1 2 3
Filho 25 72 82 1 180
Filhos 20 38 68 126
Folha 1 1
Folhinha 1 1
Galho 1 1
Grandalhões 1 1
Ilha 2 2
Lhe 3 1 4
Malhar 1 1
Malho 1 1
210
Itens Lexicais
(Nova Iguaçu) l
j lj l j Total
Manilhamento 2 2
Manilhou 1 1
Maravilha 1 5 6
Maravilhamente 1 1
Maravilhas 1 1
Maravilhosa 6 5 11
Maravilhosas 1 1
Maravilhoso 9 1 10
Maravilhosos 1 1
Melhor 23 63 9 95
Melhora 1 4 2 7
Melhorada 1 1
Melhorado 2 3 5
Melhorando 4 2 6
Melhorar 11 15 5 31
Melhoraria 1 2 1 4
Melhoras 2 2
Melhorazinha 2 2
Melhorei 2 2
Melhorem 1 1
Melhores 3 5 2 10
Melhoria 4 3 7
Melhorias 1 1
Melhorou 5 11 2 1 19
Melhorzinha 1 1
Melhorzinho 2 1 3
Metralhadora 2 2
Milhão 3 3
Milhares 1 1
Molhada 1 1
Molhado 1 1
Mulher 4 15 15 34
Mulheres 5 2 7
Olha 21 61 3 1 86
Olhado 1 1
Olhando 7 7
Olhar 5 2 7
Olhava 2 2
Olhei 2 2
Olho (Substantivo/verbo) 6 3 9
Olhos 2 4 6
Olhou 1 2 3
Orgulho 4 3 1 7
Orgulhoso 2 2
Palhaça 1 1
Pastilha 1 1
Patrulha 3 5 8
Patrulhinha 5 5
Pilha 1 1
Recolher 1 1
Recolheu 1 1
Telhado 4 4
Trabalha 6 36 2 3 1 48
Trabalhador 1 1
Trabalhadores 2 4
211
Itens Lexicais
(Nova Iguaçu) l
j lj l j Total
Trabalham 2 6 8
Trabalhamos 1 1 2
Trabalhando 2 18 1 1 22
Trabalhar 20 48 1 2 4 75
Trabalharem 1 1
Trabalhasse 1 1
Trabalhava 4 30 1 35
Trabalhavam 2 2
Trabalhe 1 1
Trabalhei 4 18 6 28
Trabalhem 1 1
Trabalhinho 1 1
Trabalhista 1 1 2
Trabalho 25 69 1 3 2 100
Trabalhos 1 1 2
Trabalhoso 1 1
Trabalhou 2 8 10
Velha 6 3 3 12
Velhão 2 2
Velhinha 1 1 2
Velhinho 3 3
Velhinhos 4 4
Velho 9 8 3 20
Velhos 5 3 8
Vermelha 6 5 11
Vermelho 4 4
Total 319 669 238 51 9 1 1287
212
10.2 Distribuição das variantes de // pelos vocábulos na RMLIS
Tabela 47. Distribuição das variantes // por Cacém
Itens Lexicais (Cacém) lj lj l j Total
Acolhedor 1 1
Aconselhavam 1 1
Aconselhável 1 1
Afilhado 2 2
Agasalhado 1 1
Alhearmos 1 1
Alhos 1 1
Armadilha 1 1
Assemelha-se 1 1
Assoalhadas 1 1
Bacalhau 4 4
Barulho 4 5 9
Batalha 2 2
Bilhete 1 1 2
Bilhetes 1 1 2
Cabeçalho 2 2
Calha 1 1 2
Calhar 31 68 99
Cambalhotas 2 1
Colher (substantivo/verbo) 1 2
Concelho 7 2 9
Embrulhozinhos 1 1
Encolhida 1 1
Escolha 1 2 3
Escolhe 1 1 2
Escolher 3 2 5
Escolhi 4 4
Escolhia 2 2
Escolho 2 2
Espalhada 1 1
Espalhar 1 1
Espalho 1 1
Evangelho 1 1 2
Falha 2 1 3
Filha 17 10 27
Filho 33 17 11 61
Filhos 85 22 6 113
Filhotes 3 3
Folha 1 2 3
Folhas 4 2 6
Forquilha 1 1
Ilha 3 3
Ilhas 1 1
Lhe 42 46 4 92
Lhes 14 13 27
Maravilha 4 4
Maravilhas 1 1
Maravilhoso 2 2
Maravilhosos 1 1
Matraquilhos 1 1
Melhor 21 24 45
213
Itens Lexicais (Cacém) lj lj l j Total
Melhorado 2 1
Melhorar 1 2 3
Melhoraram 1 1
Melhorarem 1 1
Melhores 2 1 3
Melhorias 2 2
Melhorou 2 2
Milhão 1 1
Milhões 2 2
Molhar 1 1
Mulher 9 13 5 27
Mulheres 4 1 5
Mulherzinha 2 2
Olha 11 9 1 21
Olham 2 2
Olhamos 1 1 2
Olhando 1 1 2
Olhar 7 7
Olhara 1 1
Olhe 5 13 1 19
Olhos 2 2
Orgulho 7 7
Palha 1 1
Palhaçada 2 2
Partilha 1 1
Partilhado 1 1
Partilham 1 1
Partilharem 1 1
Partilhavam 1 1
Paspalho 1 1
Ralhar 2 2
Recolha 1 1
Recolhimento 1 1
Semelhantes 1 1
Talho 3 1 4
Trabalha 8 6 14
Trabalhadora 1 1
Trabalham 6 5 11
Trabalhamos 1 1 2
Trabalhar 26 30 1 57
Trabalhasse 1 1
Trabalhava 6 6 12
Trabalhavam 2 1 3
Trabalhei 8 1 9
Trabalhinhos 1 1
Trabalho 43 18 1 62
Trabalhos 5 12 17
Trabalhou 1 1 2
Velha 6 1 7
Velhas 2 1 3
Velho 6 3 9
Velhos 4 4
Velhote 1 1 2
Velhotes 1 1
Total 511 356 33 6 1 0 907
214
Tabela 48. Distribuição das variantes // por Oeiras
Itens Lexicais (Oeiras) lj lj l j Total
Acolhe 1 1
Acolhedor 1 1
Acolhedoras 1 1
Acolhedores 1 1
Acolher 1 1
Aconselho 3 3
Atrapalha 2 2
Atrapalhado 1 1
Baralhada 1 1
Baralhado 1 1
Baralho 1 1
Barulho 1 1
Batalha 2 2
Bilhete 1 2 3
Bilhetes 4 4
Bolha 1 1
Borralheira 1 1
Cabecilha 1 1
Calha 3 3
Calhar 4 79 1 84
Colher (substantivo) 1 1
Concelho 10 10
Concelhos 2 2
Escolha 1 1
Escolhas 1 1
Escolher 2 2
Evangelho 1 1
Falhado 1 1 2
Falham 1 1
Filha 7 7 1 15
Filhas 2 11 3 16
Filho 11 31 12 2 56
Filhos 30 33 10 1 74
Guerrilha 1 1
Ilha 2 2
Ilhas 1 1
Joelho 2 2
Lhe 10 22 5 6 43
Lhes 5 12 2 19
Maravilha 2 2
Maravilhosas 1 1
Melhor 13 26 2 41
Melhora 1 1
Melhorando 1 1
Melhorar 3 3
Melhore 2 2
Melhores 2 9 11
Melhorou 1 1 2
Migalhinhas 1 1
Milhão 1 1
Milhares 1 1
Milho 1 6 7
Milhões 5 1 6
215
Itens Lexicais (Oeiras) lj lj l j Total
Mulher 1 18 1 20
Mulheres 2 7 1 10
Olha 2 29 1 8 40
Olhar 2 2
Olhe 1 6 1 1 9
Olho (subst/verbo) 2 4 6
Olhos 2 1 3 2 8
Partilhado 1 1
Partilhar 1 1
Piolho 1 1
Ralham 1 1
Recolher 1 1
Semelhante 1 1
Toalhas 1 1
Trabalha 6 1 7
Trabalhador 1 1
Trabalham 2 17 19
Trabalhamos 1 1
Trabalhando 2 2
Trabalhar 3 71 5 79
Trabalharam 1 1
Trabalharem 1 1
Trabalhasse 1 1
Trabalhava 4 14 3 21
Trabalhavam 1 5 6
Trabalhávamos 1 1
Trabalhei 5 5 10
Trabalhinho 1 1
Trabalho 3 68 1 4 76
Trabalhos 9 9
Trabalhoso 1 1
Trabalhou 2 2
Velha 5 2 1 8
Velhas 1 6 7
Velhice 1 1
Velhinha 1 1
Velho 1 10 11
Velhos 3 4 1 8
Velhota 1 1
Velhotes 1 1
Total 142 585 74 14 16 1 832
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