o Atual Modelo de Reforma Agrária e Seu Impacto Em

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VI SIMPÓSIO INTERNACIONAL DE GEOGRAFIA AGRÁRIA - VII SIMPÓSIO NACIONAL DE GEOGRAFIA AGRÁRIA 1a. JORNADA DE GEOGRAFIA DAS ÁGUAS (ISBN 978-85-237-0718-7) O ATUAL MODELO DE REFORMA AGRÁRIA E SEU IMPACTO EM ASSENTAMENTOS NOS MUNICÍPIOS DE PIRIPIRI E MIGUEL ALVES PI THE CURRENT LAND REFORM MODEL AND ITS IMPACT ON SETTLMENTS IN THE COUNTIES OF PIRIPIRI AND MIGUEL ALVES - PI Antonio Soares Farias - Graduado em Geografia, UFPI, profissional [email protected] RESUMO: Este trabalho procura identificar os impactos que o atual modelo de Reforma Agrária traz para os assentamentos de agricultores familiares, em dois formatos de gerenciamento desse programa, um através do programa Nacional de Crédito Fundiário, gerenciado pelo Governo Estadual com recursos do Governo Federal, o outro, no modelo desapropriação gerenciado pelo INCRA. Em ambos os casos analisa-se os aspectos sociais e produtivos em dois momentos distintos, no início dos investimentos públicos e num intervalo de 08 e 05 anos respectivamente, traça-se um comparativo no processo de desenvolvimento causado na vida do assentamento utilizando-se o mesmo processo metodológico de pesquisa de campo nos dois momentos. Finalmente traz a conclusão a respeito dos impactos positivos e negativos verificados nos assentamentos dentro da atual política de Reforma Agrária, assim como sugestões fundamentadas nas análises e resultados da pesquisa. Para esse resultado da pesquisa, investiga-se o comportamento do modelo de produção agrícola e pecuária nos assentamentos, levando em consideração o tamanho da área explorada, o valor do capital investido nos processos produtivos e o resultado desse modelo de produção. Faz um comparativo entre a renda agropecuária do assentamento e o volume dos recursos dos programas sociais do Governo Federal e dos serviços diversos na composição da renda das famílias assentadas, chagando às conclusões sobre esses modelos de assentamentos analisados. ABSTRACT: This work seeks to identify the impacts that the current land reform model brings on the settlement of land worker’s families, based on two management strategies of this program, one through the Nacional Land Credit program, managed by the State government with support from the Federal Government, and the other one, on the expropriation model managed by INCRA. In both cases, it is analyzed the social and

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Reforma agrária e politica pública

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1a. JORNADA DE GEOGRAFIA DAS ÁGUAS (ISBN 978-85-237-0718-7)

O ATUAL MODELO DE REFORMA AGRÁRIA E SEU IMPACTO EM

ASSENTAMENTOS NOS MUNICÍPIOS DE PIRIPIRI E MIGUEL ALVES – PI

THE CURRENT LAND REFORM MODEL AND ITS IMPACT ON SETTLMENTS

IN THE COUNTIES OF PIRIPIRI AND MIGUEL ALVES - PI

Antonio Soares Farias - Graduado em Geografia, UFPI, profissional

[email protected]

RESUMO: Este trabalho procura identificar os impactos que o atual modelo de Reforma

Agrária traz para os assentamentos de agricultores familiares, em dois formatos de

gerenciamento desse programa, um através do programa Nacional de Crédito Fundiário,

gerenciado pelo Governo Estadual com recursos do Governo Federal, o outro, no modelo

desapropriação gerenciado pelo INCRA. Em ambos os casos analisa-se os aspectos sociais e

produtivos em dois momentos distintos, no início dos investimentos públicos e num intervalo

de 08 e 05 anos respectivamente, traça-se um comparativo no processo de desenvolvimento

causado na vida do assentamento utilizando-se o mesmo processo metodológico de pesquisa

de campo nos dois momentos. Finalmente traz a conclusão a respeito dos impactos positivos e

negativos verificados nos assentamentos dentro da atual política de Reforma Agrária, assim

como sugestões fundamentadas nas análises e resultados da pesquisa. Para esse resultado da

pesquisa, investiga-se o comportamento do modelo de produção agrícola e pecuária nos

assentamentos, levando em consideração o tamanho da área explorada, o valor do capital

investido nos processos produtivos e o resultado desse modelo de produção. Faz um

comparativo entre a renda agropecuária do assentamento e o volume dos recursos dos

programas sociais do Governo Federal e dos serviços diversos na composição da renda das

famílias assentadas, chagando às conclusões sobre esses modelos de assentamentos

analisados.

ABSTRACT: This work seeks to identify the impacts that the current land reform model

brings on the settlement of land worker’s families, based on two management strategies of

this program, one through the Nacional Land Credit program, managed by the State

government with support from the Federal Government, and the other one, on the

expropriation model managed by INCRA. In both cases, it is analyzed the social and

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productive aspects in the two different moments, in the beginning of the public investments

and within an interval from 08 to 05 years respectively, it is drawn a comparative in the

process of the development caused in the life of the settlement using the same method in the

field research in both moments. Finally, it is brought the conclusion related to the positive and

negative impacts verified in the settlements done under the current Land Reform politics, as

well as suggestion based on the analysis and research results. To achieve this result in the

research, it is investigated the behaviour of the agricultural and cattle husbandry model

production in the settlements, taking it consideration the size of the explored area, the value

the invested capital in the productive process and the result of this productive model. A

comparative is made between the agro- cattle husbandry income of the settlement and the

amount of the support from social programs of the Federal Government and the several

services which are part of the income of the settled families, reaching conclusions on these

settling models analyzed based on the current Land reform model of the Brazilian

government.

Palavras-chave: desenvolvimento social, agricultura familiar, produção, sustentabilidade.

Key-words: Social development, agricultural family, production, sustainability.

Eixo de inscrição e debates: “Assentamentos Rurais e Reforma Agrária”.

OBJETO DE ANÁLISE

O presente artigo tem por finalidade demonstrar a importância da Reforma Agrária, no seu

atual modelo e proposta, na vida dos Assentamentos, sob duas formas distintas, uma com base

nos processos de desapropriação gerenciada pelo INCRA e a outra no modelo alternativo, ou

seja, a aquisição do imóvel dentro do Programa Nacional de Crédito Fundiário - PNCF. Vai

identificar o impacto causado na vida social e econômica dos assentados nos dois modelos em

momentos distintos.

Analisa a produção agropecuária e sua representatividade no desenvolvimento social e

econômico das famílias, assim como faz a sua relação com os investimentos dos programas

sociais do Governo Federal na composição da renda, além da presença dos benefícios da

previdência social na composição geral da renda das famílias. Diante deste conjunto de

possibilidades investigadas, chega-se ao objeto de análise fundamental que é verificar a

viabilidade econômica e social da atual política de Reforma Agrária, neste caso específico.

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Processo metodológico:

O processo metodológico abordado na elaboração do presente trabalho foi a pesquisa em

referenciais bibliográficos, assim como a entrevista direta aos assentados do PNCF no

município de Piripiri e aos assentados do assentamento Índio Manduladino, em Miguel Alves,

área desapropriada pelo INCRA

Em ambos se analisa o processo de produção agropecuária, objeto principal da Reforma

Agrária, além da educação e forma de organização da comunidade. Procura-se identificar as

rendas extras, como os programas sociais do Governo Federal e os serviços complementares à

renda agropecuária, seus impactos no processo de produção, identificando a viabilidade

econômica produtiva nos respectivos assentamentos.

A pesquisa de campo foi através de debates e aplicação de questionários, em que busca

informações que permitem identificar a postura e o comportamento do assentamento diante

dos resultados dos dois modelos de assentamentos.

As pesquisas aplicadas com as mesmas pessoas em um intervalo de tempo de 08 anos no

assentamento do PNCF e 05 anos no gerenciado pelo INCRA, ou seja, na implantação do

assentamento se analisou o nível de vida econômica e social de quem estava chegando, após

estes intervalos de tempo, aplica-se o mesmo questionário às mesmas pessoas e se uma

análise com base nos resultados comparativos dos impactos causados pelo modelo vigente de

Reforma Agrária nos casos em apreço, e termina com a conclusão desta pesquisa e as

recomendações necessárias, sob o ponto de vista do autor do artigo.

O MODELO DE DESENVOLVIMENTO RURAL BRASILEIRO

É necessário que compreendamos o processo de desenvolvimento rural brasileiro, desde o

princípio, para que possamos compreender os desafios postos para os avanços da Reforma

Agrária no Brasil dentro dos objetivos que norteiam a inclusão dos milhares de agricultores

que vagam em busca do quinhão da terra prometida. E não somente compreender as nuances

que levam a resultados acanhados, e até pífios, dos projetos de assentamentos já existentes,

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sem desprezar aqueles exitosos, que servem de referencias para animar a política de

“distribuição de terras” implementada ao longo da história pelo governo brasileiro.

Considerando, pois, que a descoberta do Brasil, a princípio, não teve grande repercussão ou

passou quase que despercebida, por que o objetivo português inicialmente era o comércio e

somente depois, Portugal desejando ocupar e colonizar a nova terra, o fez outorgando

concessões de terras a nobres e fidalgos, alguns deles já ricos proprietários, é que a partir de

então se inicia um processo de exploração não somente da terra, mas também dos gentios que

nela já habitavam e posteriormente pela exploração da mão de obra escrava vinda da África,

constituindo-se uma sociedade agrária dominante em minoria e uma dominada em maioria, a

primeira apossando-se com voracidade de terra e de riquezas e a segunda subserviente e cada

vez mais pobre e dependente do sistema implantado.

Neste contexto se forma o processo de desenvolvimento do Brasil, sobre o leito do latifúndio,

cujo resultado na organização administrativa do estado é invertido, ou seja, a estrutura agrária

antecede a sua estrutura política e as consequências dessa inversão não poderiam ser outras,

senão a concentração fundiária e a caracterização de uma sociedade aristocrata rural

subsidiada por ideais conservadores e amplamente vorazes pelo poder de comando político,

formadora de fortes oligarquias.

Vale destacar que o desenvolvimento brasileiro com o modelo das concessões de terras

através das sesmarias foram mais audaciosas no Nordeste brasileiro, assim nos lembra Josué

de Castro ao relatar em sua célebre obra “Sete Palmos de Terra e um caixão” que “...as

sesmarias no sul não excediam a três léguas de extensão, quanto no norte havemos de

encontrar concessões de 20, 50 e mais léguas. Basta assinalar as concessões de Garcia d’Ávila

e seus parentes que se estendiam da Bahia até o Piauí, em uma extensão de 200 léguas”.

(Castro 1969 p.121).

A formação do próprio Estado do Piauí foi pautada na concentração da terra, através da

concessão das sesmarias que tiveram origem em 1676, onde se criou condições para a

exploração das terras piauienses e a caça impiedosa aos índios que habitavam estes vastos

sertões. Para a compreensão do processo de formação da propriedade rural, recorro a Jesualdo

Cavalcanti que em sua obra “Memória dos Confins”, traz detalhes dessas concessões ao

explicitar:

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“... em 12 de outubro de 1676, o governador de Pernambuco, dom Pedro de Almeida,

concedia a Domingos Afonso Mafrense, Julião Afonso Serra, Francisco Dias de Ávila e

Bernardo Pereira Gago dez léguas de terras em quadro para cada um, todas nas margens do

rio Gurguéia; em 30 de janeiro de 1681, pelo novo governador de Pernambuco, Aires de

Sousa Castro, eram concedidas aos conquistadores acima citados e mais a Francisco de

Sousa Fagundes outras dez léguas a cada um, nas margens do rio Parnaíba...” (Barros, 2005.

p. 33)

Após 35 anos do recebimento da sua primeira concessão, como nos relata Jesualdo

Cavalcanti, Domingos Afonso Mafrense, fez doação à Igreja Católica com legaria ao colégio

dos Jesuítas na Bahia, nada menos que 39 fazendas, e delas 59 sítios arrendados a

particulares, que posteriormente foram confiscadas e incorporadas ao patrimônio de Portugal,

na gestão do governador de nacionalidade portuguesa, no Piauí, João Pereira Caldas.

Para melhor compreendermos esta política de concentração fundiária, basta nos ater ao

levantamento oficial de 1825 que revelou a extensão territorial ocupada por essas e outras

fazendas numa área de 145 léguas de comprimento por 71 léguas de largura. Como afirma

Jesualdo Cavalcanti, “tanta voracidade pelas férteis terras dos sertões de dentro do Piagohy

tinha que resultar em desavenças e disputas entre sesmeiros e rendeiros” (BARROS, 2005

p.56). Tais desavenças deram origem à provisão régia de 1744 que estabeleceu o teto de área

para cada sesmaria, limitando-as a três léguas de comprimento por uma légua de largura; um

lote, que representa nada menos que 10.800 hectares de terras. É curioso observar, que com a

independência do Brasil essas terras foram incorporadas ao patrimônio imobiliário do Brasil,

criando-se as “fazendas nacionais”, criadas para “...o desenvolvimento das monoculturas

voltadas para o mercado externo” (IPHAN, p. 11) que não prosperaram em sua finalidade por

diversos fatores, entre eles os conflitos com os Índios que habitavam os vastos sertões

piauienses. Mas, com o advento da Constituição de 1946, foram incorporadas ao patrimônio

do Estado do Piauí, formando as fazendas estaduais, que da mesma forma não se

desenvolveram e nem foram colocadas à disposição dos trabalhadores sem terra.

Devo considerar preliminarmente, o que afirma Maria Tereza de Alencar, que nos ensina:

“ao longo do tempo o poder quase absoluto dos fazendeiros começou a ser contestado pelos

moradores livres que tiveram apoio dos religiosos e autoridades do Maranhão. Por iniciativa

do Bispo de Olinda e do Governador do Maranhão, foi realizado um comunicado sobre a

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situação dos moradores do Piauí. Como resultado dessas correspondências, em 1701 foi

realizada a anexação do Piauí ao Maranhão que passou administrar o espaço piauiense”.

(ALENCAR, 2010 p. 36).

Ora, entende-se, a partir deste fragmento, que a situação conservadora dos sesmeiros

piauienses foi o alicerce para uma política de desenvolvimento sustentada harmonicamente

pelo tripé: latifúndio, poder econômico e abuso político. Ingrediente fabuloso para se

construir uma receita para formação de oligarquias duradouras. Essas oligarquias estruturadas

em solos piauienses contribuíram significativamente para o aprofundamento da miséria dos

camponeses e do seu êxodo par as Regiões Sudeste e Centro Oeste, cuja emigração se explica,

em grande parte, pelo resultado do latifúndio subutilizado para a produção agropecuária, que

impede a ocupação da terra por quem dela precisa; no entanto, este latifúndio tornou-se uma

vanguarda de poder político, caracterizado na personagem do coronelismo no campo, cujos

vestígios ainda se identificam facilmente em pleno século XXI.

A partir da Revolução de 1930, o estado do Piauí expediu o Decreto Estadual nº 1.298, que

determinava a fixação de área máxima de sesmaria em 13.068ha de terra, ou seja, o limite da

propriedade imobiliária privada no estado. Mediante este instrumento legal, tudo o que

excedesse a esse limite de área ficava reservada ao estado como terra pública patrimonial.

Porém o referido Decreto foi revogado pela Constituição Estadual de 1935, e entre a vigência

do decreto e sua revogação, deveria prevalecer o limite por ele estabelecido; no entanto,

operadores do Poder Judiciário e da Agrimensura, divergiam quanto acatarem ou não as áreas

estabelecidas no decreto. Em 1946 a Constituição estadual recepciona as fazendas estaduais,

porém, em 1974, a Assembleia Estadual Constituinte, transfere a responsabilidade para os

municípios, pois o artigo 4º do ato das suas disposições transitórias estabeleceu que as terras

particulares demarcadas e divididas até aquela época cuja extensão fosse superior a 13.068ha,

estavam transferidas para os municípios onde estivessem localizadas. Não se conhece um

município no Piauí, que tenha regularizado as suas terras públicas com base nessa

transferência constitucional do nosso estado.

Verifica-se que o ciclo de desenvolvimento econômico do Piauí foi à base da pecuária

extensiva colocando o latifúndio como elemento primordial desse processo, sem se preocupar

com a modernização tecnológica, e esta quando aplicada, dentro dos conceitos dos pacotes

agrícolas vigentes, sem a preocupação ambiental. Essa base econômica, no entanto, não foi

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capaz de elevar os índices de produtividade agropecuária, e como consequência levando o

estado a altos níveis de pobreza.

Dos Séculos XVII ao XIX, a agricultura de subsistência e a pecuária bovina e cavalar (a

segunda pecuária como suporte de apoio à primeira) em regime extensivo constituíram a base

econômica fundamental do Piauí, sendo essa base econômica voltada para o consumo interno

com a produção agrícola (arroz, feijão, mandioca e milho), enquanto a pecuária era destinada

a exportação, colocando o estado numa posição de vanguarda no mercado nacional.

Porém, a tal base econômica trouxe como resultado para a sociedade piauiense a concentração

fundiária que ultrapassou de forma voraz as regras legais estabelecidas pelo próprio estado no

tocante à detenção da posse da propriedade rural. Como consequência imediata, consolida-se

uma sociedade aristocrata rural, conservadora que dificultou o acesso à terra para os

camponeses posseiros, parceiros, meeiros e arrendatários; mantendo-se por conseguinte, a

figura submissa do trabalhador rural agregado (morador), fortalecendo o poder político do

patrão que intervém diretamente na constituição da política local e estadual, elegendo de

vereador a governador do estado e formando oligarquias que até hoje, embora com menor

intensidade, figuram na gestão pública piauiense.

Mesmo com a intervenção de políticas governamentais no campo na última década, através do

governo do Piauí, eleito em 2002 pelo PT (Partido dos Trabalhadores) e seguido pelo sucessor

do PSB (Partido Socialista Brasileiro), mas com apoio de setores conservadores, sobretudo do

campo, não se conseguiu alterar a dinâmica do meio rural, a situação da concentração

fundiária no Piauí não mudou significativamente, pois a partir da instituição do Programa

Nacional de Crédito Fundiário – PNCF em 2000, muitas terras foram adquiridas pelo

programa, mas no outro pólo, incentivos governamentais também incrementaram a

concentração de terras, como exemplo o Grupo Olho D’água, agronegócio do açúcar e álcool;

Suzano Papel e Celulose com o monocultivo do eucalipto para indústria de celulose; Bung

alimentos nos cerrados, com incentivo ao monocultivo da soja.

O PNCF adquiriu até 30 de novembro de 2010, o quantitativo de 306.646,71ha1 de terras,

beneficiando diretamente a 12.875 famílias. Números que de forma absoluta animam, mas

essas terras, todas por uma questão de ordem legal, só puderam ser adquiridas de imóveis com

1 Dados coletados junto ao PCNF, em 02/12/2010.

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até 15 Módulos Fiscais, ou seja, médias propriedades. Na outra ponta, o INCRA, não

conseguiu avanços significativos e poucas áreas foram desapropriadas. No entanto, a

instalação da Suzano Papel e Celulose, de imediato, necessitou de 150 mil hectares de terra,

sendo que a estabilização do seu projeto é em 210 mil hectares, ou seja, área que se aproxima

de 70%, em um único investimento, de toda a área adquirida pelo governo estadual durante 10

anos para assentamentos de agricultores familiares sem terra.

Como conseqüência desse atual modelo de desenvolvimento implantado no Brasil, desde a

sua colonização, foram os resultados sociais absolutamente desfavoráveis aos camponeses,

sobretudo aqueles que estão à margem da posse da propriedade rural. E no recorte de 30

anos, 1980 a 2010, o IBGE nos revela que os investimentos urbanos aspiraram a população

rural de forma contínua de modo que o campo tem se esvaziado num constante processo

migratório rural/urbano, levados por determinação de uma política que ao longo de décadas

priorizou os investimentos públicos na zona urbana, tornando-a atrativa em relação ao campo,

sobretudo pelos serviços públicos ali disponibilizados, como se observa no gráfico 1.

A população rural

brasileira tem uma

diminuição crescente e

constante. E a PNAD 2004

nos traz revelações de que

a população de 10 anos ou

mais, com insegurança

alimentar moderada ou

grave, por tipo de

ocupação, 33% é da

atividade agrícola, 18% da

atividade não agrícola e

aqueles que não tem

ocupação, apenas 19%

apresentam esses sintomas

Gráfico 1 - Evolução das populações rural e urbana

1980 – 2010 (em milhões de hab.)

Fonte/gráfico: PNAD/IBGE 2010

Tais números revelam que as políticas adotadas pelo Estado para o campo não têm se

mostrado eficientes e, principalmente, aquelas adotadas nos financiamentos rurais, salvo

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aquelas destinadas ao agronegócio, que objetivam investimento de capital e alta tecnologia no

campo de forma a propiciar a produtividade e a competitividade de mercado a um custo social

e ambiental exorbitante. No entanto, as políticas adotadas para a Agricultura Familiar não têm

dado a resposta esperada pelo Poder Público concernente, pois os dados do Território da

Cidadania dos Cocais composto de 22 municípios, no qual se localiza o município de Piripiri,

revelam queda crescente nos contratos e no financiamento rural em 05 anos seguidos, de 2006

a 2010, sobretudo pelo processo de endividamento do agricultor familiar junto ao sistema

financeiro, como se verifica na tabela seguinte:

Investimentos em créditos rural (custeio) PRONAF no Território da Cidadania – Cocais

– Piauí de 2005 a 2010

ANO

AGRÍCOLA

VALOR DO CRÉDITO

NO PRONAF (Milhões)

CONTRATOS

ASSINADOS

VALOR MÉDIO DO

CONTRATO R$

2005/06 28.005.035 20.116 1.392,17

2006/07 24.672.505 15.464 1.595,48

2007/08 17.400.901 9.756 1.783,61

2008/09 18.473.664 9.656 1.913,18

2009/10 16.951.594 8.573 1,977,32

T O T A L 105.503.699 63.565 1.659,77 Fonte: Base Municipal – IBGE 2010 – análise do autor

Considerando que o Território dos Cocais no Estado do Piauí, é uma referência econômica

para a Agricultura Familiar, e estando Piripiri como município central no Território e de

maior importância econômica no seu contexto, por se tratar do município mais populoso e

concentrador de serviços, pode-se avaliar que o processo de estagnação e a regressão é visível

na política governamental de fomento a agricultura familiar convencional no tocante ao

financiamento rural. E o mais grave, levando a um empobrecimento progressivo daqueles

agricultores familiares que acessaram esta modalidade de financiamento rural, pois ao analisar

os custos de produção e de financiamento, 83% da renda obtida na agricultura será destinada à

quitação do débito junto ao agente financeiro. O restante, 17% é insuficiente para o sustento

da família no campo na região de análise.

Neste caso, é absolutamente necessário alternativas à presente situação. A Reforma Agrária

trará alternativas de superação para a situação apresentada?

O ATUAL MODELO DE REFORMA AGRÁRIA NO BRASIL

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Mesmo com farto material para executar a Reforma Agrária, o Estado tem se demonstrado

acanhado no tocante esta política sem, entretanto, desconsiderar os Planos de Reforma

Agrária e os Projetos de assentamentos já testados em todo o território nacional. Porém os

fatos históricos têm mostrado que a questão fundiária em nosso país sempre foi relegada a um

segundo plano quando se trata de Reforma Agrária e assentamentos rurais, isso levando em

consideração a conjuntura política brasileira que sempre foi mesquinha ao tratar este assunto

com a seriedade que ele merece, independentemente das forças políticas que já se uniram e se

unem em nome da governabilidade.

Comentando sobre esse tema Bergamasso (1996), nos chamam a atenção para uma reflexão

histórica sobre a origem dessa modalidade de Reforma Agrária, pois lembra que em 1938 foi

instituída por Getúlio Vargas a Primeira Comissão Revisora de Títulos da Terra, e o Governo

Federal estabelece o assentamento de 3.012 famílias produtoras rurais numa área 49.678

hectares de terra divididos em 07 núcleos no estado do Rio de Janeiro. Esta iniciativa de

Vargas não surtiu os efeitos esperados no âmbito dos beneficiários, tanto que 17 anos depois,

em Pernambuco, no Engenho Galiléia houve a revolta de 140 famílias de agricultores contra o

regime de cobrança do “foro” (renda), diretamente feita pelo patrão, que resultou na posse

definitiva de seus 500 hectares de terra para os trabalhadores rurais. É oportuno lembrar que a

luta do Engenho Galiléia iniciada por João Firmino em 1955 não foi pautada na luta pela

terra, mas na luta pelo direito de enterrar os seus mortos, foi pelos “interesses dos mortos de

fome e miséria, os interesses dos camponeses mortos na extrema miséria da bagaceira”

(CASTRO, 1967 p.23). Mas com a intervenção do Advogado e político do PSB (Partido

Socialista Brasileiro) Francisco Julião que procurou defender aqueles trabalhadores fazendo-

os vitoriosos, receberam um lote de 10 hectares de terra cada um, e o Estado de Pernambuco

comprou mais duas áreas para a alocação das 100 famílias que não puderam ser assentadas no

Engenho Galiléia.

Vale chamar a atenção para o processo de articulação que o grande capital, através dos meios

de comunicação, utiliza para diminuir e ridicularizar a luta de parcela da sociedade brasileira

por direitos básicos que lhes são negados. Neste sentido, o Jornal o Estado de São Paulo

chegou a publicar um editorial sobre o processo de desapropriação do Engenho Galiléia aonde

alertou à sociedade brasileira que aquela iniciativa “...acenderia a ambição dos demais

camponeses assalariados, desejosos de favores idênticos”. Daí, não só esse jornal, mas a

imprensa como um todo se aliar aos grandes proprietários rurais para considerarem em outras

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matérias, a desapropriação de terras “um perigoso precedente”, enquanto os camponeses, na

outra extremidade, acreditavam com suas lideranças, estarem antecipando o processo de

Reforma Agrária no Brasil, como direito e não como favor como divulgava a imprensa.

A Reforma Agrária nunca deixou de constar nos programas políticos de candidatos, sejam

eles de direita ou de esquerda, todos tratando o tema de acordo com os seus interesses e dos

projetos que defendem para o país. Assim, Jânio Quadros, em 1960 venceu as eleições e

entre os seus programas de governo estava a Reforma Agrária, tema que indubitavelmente

contribuiu para a sua vitória nas urnas, pois se comprometia em fazer uma reforma no campo

criando uma legislação agrária que contemplasse além do acesso à terra, o acesso ao crédito e

à assistência rural, conforme as suas próprias palavras ao afirmar que iria “eliminar o

latifúndio e condicionar a posse da terra e a monocultura ao interesse social”, como lembra

Sônia Bergamasco.

Com a renúncia de Quadros, seu vice, João Goulart, incentiva politicamente uma aliança entre

os camponeses e os operários urbanos com objetivos de fazer uma Reforma Agrária com

amplitude social. Levou a sua proposta à frente e teve recepção dos Movimentos Sociais em

todo o País, e no dia 13 de março de 1964, Goulart decretou a desapropriação de áreas

improdutivas, o que irritou a burguesia agrária, e com este ato, somado a outras reformas

propostas por Goulart, 18 dias depois foi deposto do cargo por militares, instalando-se a

famigerada ditadura militar que perdurou até 15 de março de 1985.

A ditadura militar, no mesmo ano, cria a Lei 4.504 (Estatuto da Terra), aprovada pelo

Congresso Nacional, em que determinou diretrizes para a implementação de núcleos de

colonização em áreas das fronteiras agrícolas; e, via de regra, para emperrar a luta pela terra

no Brasil, com destaque para o Nordeste aonde os movimentos pelas desapropriações eram

mais contundentes. Foram criados núcleos de colonização na transamazônica, em áreas

prioritárias como no trecho Marabá-Itaituba no Pará. Graciosamente a contrapartida do apoio

dado pela burguesia rural ao Golpe de Estado de 64 foi a “contra-reforma” agrária,

apresentada como colonização dirigida2, consolidando dessa forma, os interesses do latifúndio

brasileiro.

2 Colonização dirigida foi a política implementada pelo Regime Militar, sob a responsabilidade do INDA (Instituto Nacional

de Desenvolvimento Agrícola) e do IBRA (Instituto Brasileiro de Reforma Agrária), posteriormente extintos e criado o

INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), que a partir de 1970 implementam assentamentos na

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No início de 2003, com a posse do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, volta a esperança de

uma política de reforma agrária consistente, pois se rompera nas urnas com um projeto

neoliberal capitaneado pelos setores conservadores brasileiro representado por Fernando

Henrique Cardoso, por um projeto político nascido dos movimentos sociais. Acreditou-se

nisso. Veio, logo no início do governo Lula uma pressão dos movimentos sociais que resultou

na composição de um grupo de estudo liderado pelo economista Plínio de Arruda Sampaio,

cujo objetivo seria a elaboração de um Plano Nacional de Reforma Agrária que desse contas

de resolver essa problemática com a seriedade que ela merece, sendo que a proposta ficou

conhecida como “Plano Plínio” que estipulou, entre outras metas, o assentamento de um

milhão de famílias em áreas da reforma agrária. Em novembro de 2003, sob pressão do setor

ruralista, Lula aceita uma proposta mais tímida, nascida da burocracia dos funcionários

públicos federais e de formulação meramente teórico-conceitual, sob título “II Plano Nacional

de Reforma Agrária: paz, produção e qualidade de vida no meio rural”. Tal plano elaborado

nos gabinetes federais estipulou metas inferiores a 40% daquelas previstas no Plano Plínio, e

ainda subsidiado pelas orientações do Banco Mundial de uma “Reforma Agrária de mercado”,

ou seja, uma reforma agrária dirigida pelo mercado, assistida pelo mercado ou baseada nas

regras de mercado.

Fundamentado nesse princípio, o Governo Lula fortalece o Programa Nacional de Crédito

Fundiário (PNCF) e o Banco da Terra, originários no governo anterior, cujos princípios e

fundamentos visam o rompimento lento e sistematizado dos processos de desapropriação de

terra, pois as desapropriações geram conflitos e incomodam as elites econômicas, e o objetivo

não é incomodar as elites com esse modelo. (RAMOS FILHO 2009 p. 253) ressalta que esse

modelo não visa ampliar a Reforma Agrária, mas sim o fortalecimento do mercado

institucional de terras beneficiando aqueles que querem vendê-las ao preço que o mercado

ditar. Neste sistema passa-se consequentemente a conta para os Agricultores Familiares sem

terra sob as regras de financiamentos do setor financeiros representados pelos bancos oficiais.

Como resultado, o INCRA ligado ao Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) deixa

de atuar nos processos de desapropriação findando em 2013, no Governo Dilma Roussef, com

uma proposta de sua transformação em instituto meramente burocrático para administrar os

assentamentos já existentes, castrando a sua função de desapropriação de terras improdutivas.

Amazônia que era vista como a solução para os problemas agrários brasileiros e visava a reorientação dos fluxos migratórios,

sobretudo das regiões onde haviam conflitos de terra, criando-se a figura do colono.

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Conclui-se que esse modelo ora estampado é perfeitamente constituído com o objetivo do

fortalecimento do capital no campo, e a luta pela terra faz parte de uma dimensão da luta

contra o capital, e aqui, nos lembra muito bem Eraldo Ramos ao afirmar “Na medida em que

o capital se reproduz, agrava o quadro de desigualdade que o sustenta, mediante a exclusão”

(RAMOS FILHO, 2009 p.251). E nesse processo de Reforma Agrária de mercado, o próprio

MDA se ver aperreado para renegociar as dívidas dos assentamentos fundamentados no

modelo Banco da Terra e PNCF que se encontra em 2013, no Estado do Piauí, com uma

inadimplência considerável nos assentamentos cujas parcelas da terra já se venceram ou

vincenda. E ainda, não se contabiliza a inadimplência dos investimentos produtivos na

propriedade rural através do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar –

PRONAF, linha “A”, que financia recursos para investimentos individuais nos assentamentos

da Reforma Agrária.

ESTUDO DE CASO

O nosso ponto de análise fundamenta-se na pesquisa de campo realizada em 02 assentamentos

da Reforma Agrária, o primeiro com base no Programa Nacional de Crédito Fundiário

(PNCF), Assentamento Boa Esperança, no município de Piripiri – PI e o outro do INCRA,

desapropriação, assentamento Indio Manduladino em Miguel Alves – PI.

A metodologia de pesquisa se deu em dois momentos distintos, em Piripiri a análise foi com a

elaboração do diagnóstico preliminar das famílias na implantação do assentamento realizada

em junho de 2005, enquanto em Miguel Alves, a análise da situação das famílias foi logo na

implantação do assentamento, com pesquisa de campo coordenada pelo Sindicato dos

Trabalhadores Rurais de Miguel Alves, em julho de 2008, supervisionada pelo autor deste

artigo. Em ambos, a abordagem se deu pelo método participativo interativo, onde se fez a

inter-relação dos Agricultores e Agricultoras com sua realidade local, projetando o seu futuro

e de sua família tanto nos aspectos produtivos quanto de bem estar social, envolvendo a

saúde, a educação.

Em 2013, faz-se uma nova pesquisa, nos meses de maio e junho, com os mesmos

questionamentos e com as mesmas famílias, cujo objetivo é avaliar o impacto que os

assentamentos causaram na vida dessas famílias, assim como fazer uma análise dos efeitos do

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atual modelo de Reforma Agrária, sob o modelo compra da terra (PNCF) e desapropriação

(INCRA), no desenvolvimento sócio-econômico dos assentados. Assentamento Boa

Esperança (PNCF) – Piripiri e Assentamento Indio Maduladino (INCRA) – Miguel

Alves - PI

Em 2005, quando aplicado a primeira pesquisa de campo, a população representada no

Assentamento Boa Esperança era composta por números absolutos de 117 pessoas, sendo que

42,7% ainda não haviam completado 18 anos de idade, enquanto que a maioria 57,3% já eram

maiores de idade. Deste total, 52,1% são homens e 47,9% mulheres. A população deste

assentamento estava em 2005, com sua maioria na idade produtiva, isto é, na faixa etária dos

15 aos 55 anos, representando nesse conjunto 60,7% da população residente.

As famílias cadastradas no Assentamento Boa Esperança, são oriundas da periferia da cidade

de Piripiri, espalhadas geograficamente por 05 Bairros, mas com fácil poder de articulação no

que se refere a informação. Vinham de condições de moradia com energia elétrica, e 77%

dispunham de água encanada com fossas séptica. Por estes aspectos estabeleceu-se o critério

de baixo padrão de moradia na periferia da cidade, já que os bairros onde essas pessoas

residiam são bairros considerados de pouco investimento público, sobretudo em saneamento

básico. O grau de escolaridade das pessoas era de 71,4% com o ensino fundamental não

concluído, 22,9% cursando ou concluído o ensino médio e 5,7% não alfabetizados.

São pessoas que já vinham de uma atividade rural que não lhes garantia o sustento sem uma

complementação de uma renda extra, onde se verificou com maior presença, os programas

sociais do Governo Federal, além dos benefícios da previdência social como as

aposentadorias. As famílias morando na cidade de Piripiri auferiram um rendimento muito

baixo, não permitindo um padrão de vida digno. Estas famílias tinham um rendimento médio

mensal de apenas 1,65 Salário Mínimo vigente, no entanto no mesmo grupo encontramos

famílias que percebem 2,27 Salários Mínimos.

Dos rendimentos identificados, somente 36,6% deles eram provenientes da produção

agropecuária, enquanto que a renda vinda de outras fontes, como dos benefícios sociais

(aposentadoria, pensão, salário maternidade, bolsa escola, vale gás, etc.), representavam

63,4%, demonstrando existir, na época, uma dependência econômico-financeira dos

programas do Governo Federal. Um detalhe importante a ser observado é que nenhuma dessas

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famílias tinha restrições cadastrais em seu nome, como SPC e SERASA, pois para

ingressarem no assentamento era necessário ter o nome isento das restrições de crédito.

Quando observamos os dados pesquisados pelo Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras

Rurais de Miguel Alves (STTR de Miguel Alves) no Assentamento Indio Manduladino, em

agosto de 2008, o processo metodológico foi diferenciado, pois o objetivo do Sindicato era

avaliar o desempenho econômico e social dos assentados, assim como analisar os pontos de

estrangulamentos observados e oferecer alternativas possíveis ao desenvolvimento do

assentamento, tanto no campo institucional, quanto no campo das inter-relações do

Movimento Sindical com sua base.

Porém, são os dados observados no Assentamento Indio Manduladino em Miguel Alves,

assentamento da Reforma Agrária feito pelo INCRA não se distanciam daqueles observados

no Assentamento Boa Esperança em Piripiri, na modalidade Crédito Fundiário, gerenciado

pelo Governo Estadual com recursos do Ministério do Desenvolvimento Agrário. A idade que

caracteriza a mão de obra familiar também é juvenil, e dos rendimentos identificados

verificou-se uma variação de famílias que sobreviviam entre 0,23 a 1,1 Salários Mínimos. Os

rendimentos identificados somente 35,9% oriundos como resultado da atividade agropecuária

do assentamento, 64,1% originários de outras fontes, tendo os programas sociais uma

participação da ordem de 50,6%, conforme se visualiza no gráfico 1. O grau de escolaridade

da população residente é de 32,9% no ensino fundamental, 1,2% no ensino médio e 65,9%

não alfabetizado. Neste aspecto, o assentamento do INCRA é considerado pior que aquele do

Crédito Fundiário em Piripiri.

RENDIMENTO DAS FAMÍLIAS

0

10

20

30

40

50

60

Agrope. Prog. Sociais Outros

Origem da renda

Per

cen

tual

Boa Esperança

Mandulandino

que, a maior fonte de renda se revela nos programas sociais. Segundo suas lideranças, são

esses programas que efetivamente mantém as famílias nos assentamentos, pois os

Percebe-se no gráfico que

o rendimento familiar,

tanto no assentamento do

INCRA quanto naquele do

Crédito Fundiário, as

famílias sobrevivem

praticamente a mesma

situação econômica, sendo

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rendimentos agropecuários, não são suficientes para a manutenção da família na terra. Tal

afirmativa leva a um questionamento central do presente trabalho: qual efetivamente é a

função da Reforma Agrária no atual modelo analisado? É exatamente esses fatores de

estrangulamento que procuraremos identificar nesta discussão.

Sendo a educação o ponto de partida para a garantia do sucesso de qualquer empreendimento,

não é surpresa afirmar que o grau de pobreza revelado no assentamento do INCRA, no

primeiro momento da análise, tem relação direta com o seu grau de analfabetismo, pois

enquanto em Piripiri os analfabetos resumiam-se a 5,7% da sua população assentada, em

Miguel Alves este índice era de quase 66%. A falta de Assistência Técnica e Extensão Rural –

ATER os atingia em 94,5% ao contrário daquele de Piripiri que a ATER chegava a todas as

famílias assentadas.

Situação atual dos assentados

Na última análise vamos perceber que no Assentamento do PNCF em Piripiri houve uma

evasão de 32% dos assentados inicialmente, embora substituídas as vagas por outros

agricultores familiares. Considerando a metodologia aplicada à pesquisa, só entrevistamos os

68% que permaneceram e deles pode-se afirmar que o rendimento das famílias teve aumento

significativo, pois o rendimento médio mensal saiu de 1,65 Salário Mínimo para 2,24 Salários

Mínimos com um crescimento da ordem de 73,7% no rendimento bruto mensal das famílias.

Quando analisamos, em Piripiri, a origem dos recursos que compõem a renda das famílias,

percebe-se que a situação não melhorou ao longo de 08 anos, muito embora, não se pode

descartar, como fator preponderante no freio do crescimento agropecuário, as secas de 2012 e

2013, mas no geral o peso na economia do assentamento Boa Esperança continua sendo o

repasse de recursos do Governo Federal, pois os rendimentos da produção agropecuária

passaram a representar 35,1% da composição da renda bruta, ou seja, teve redução se

comparado ao início do assentamento de 4,1%. No tocante aos demais rendimentos, os

programas sociais e benefícios da previdência social representam 59,2% do total, também

diminuindo a sua influência na ordem 6,6%. A novidade é que surgiram novas fontes de

rendas, como o serviço público e outras atividades de prestação de serviços que representam

na composição geral 5,7% dos rendimentos totais.

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Na composição da população residente houve queda de 1,7% em 08 anos, porém os

assentados melhoraram as suas condições educacionais, pois 4,3% continuam não

alfabetizados, 55,2% com ensino fundamental não concluído, 21,3% com ensino médio

concluído ou em conclusão, 14,9% no ensino superior, e 4,3% com ensino superior concluído

ou em pós-graduação. Houve investimento na melhoria habitacional com ampliação e

melhoria na qualidade das moradias, com isso dando mais dignidade e orgulho aos

assentados, embora argumentem que o processo de administração do assentamento, através da

associação, não atende aos desejos e às necessidades dos moradores, sobretudo na questão da

organização da produção e da melhoria da infraestrutura básica como o abastecimento de água

domiciliar.

Como se trata de assentamento de Agricultores Familiares, o processo da produção

agropecuária é o foco do desenvolvimento desta proposta política de combate a pobreza no

campo. Na implantação do assentamento a área média cultivada por família era de 2,3ha, e

atualmente é apenas 1,12ha. No caso do assentamento Boa Esperança todo o seu processo

produtivo teve o acompanhamento de ATER, começando com a construção de agrovila,

cercamento do perímetro do imóvel, abastecimento de água, energia elétrica e construção da

unidade habitacional com 42m² para cada família, com investimento inicial de R$ 264 mil

reais. Após a implantação, mais de R$ 265 mil foram investidos no processo produtivo com

acompanhamento de ATER por empresa pública de extensão rural. Observa-se, no entanto,

que há um processo de endividamento dos assentados através da linha de crédito PRONAF A,

cuja produção agropecuária não será suficiente para resgate do passivo junto às instituições

financeiras. Pois somente 15% do débito foi quitado, conforme a cédula pignoratícia

empenhada junto ao Banco do Nordeste.

As famílias assentadas, seguramente não sobrevivem conforme o projeto de assentamento,

pois dos rendimentos totais agropecuários auferidos, considerando o patrimônio de

semoventes existentes, 60,2% são despesas de manutenção, o que já atinge o limite de

viabilidade de projeto agropecuário. Nesta situação os assentados atingem o limite extremo de

pobreza, pois cada família passaria a sobreviver com o indigno valor de R$ 7,04 (sete reais e

quatro centavos) percapta ao dia. Quando deduzida as amortizações das parcelas do

financiamento rural com o banco, estas consumiriam 104,14% dos rendimentos agropecuários

do assentamento e ainda não estamos contabilizando as amortizações das parcelas do

financiamento da terra.

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O Assentamento Indio Manduladino em Miguel Alves, gerenciado pelo programa de Reforma

Agrária do INCRA, a situação é periclitante, pois o rendimento das famílias, ao longo de 05

anos, teve aumento não significativo, pois o rendimento médio mensal saiu de 0,75 Salário

Mínimo para 1,18 Salário Mínimo com um crescimento da ordem de 57,3% no rendimento

bruto das famílias. Porém numa análise da produção agropecuária, essa atividade teve uma

queda significativa na ordem de 25% na composição da renda das famílias, pois a área média

cultivada hoje é de apenas 0,7ha por família não havendo evolução se comparado com o

período anterior que era de 0,67ha/família, cultivada com as culturas de feijão, milho e arroz.

Antes, estas culturas representavam 35,9% da composição da renda dessas famílias, hoje

apenas 27,2%. Os programas sociais diminuíram a sua importância na vida dessas famílias,

pois como trata-se de um assentamento com uma população jovem, a inserção da previdência

social não é significativa, pois esta conjuntamente com os programas de amparo social do

Governo Federal têm atualmente uma representação na ordem de 44,2% na renda das

famílias, demonstrando uma queda de 12,6% no período. As outras atividades identificadas,

como serviços não agrícola, extrativismo e serviços públicos saíram de 13,5% para 28,6%, ou

seja, os assentados buscam outras alternativas que não seja a atividade agropecuária no

assentamento, isso representou em 05 anos um crescimento na ordem de 112%.

Ao lançarmos a média de pessoas por família e o seu rendimento médio deste assentamento

do INCRA vamos perceber que a renda per capta é apenas R$ 151,00 mês, enquanto aquele

do PNCF em Piripiri apresenta uma per capta mensal de R$ 230,00, ou seja, 52,3% superior à

do Assentamento do INCRA. No item agropecuário (rendimento líquido), o assentamento do

INCRA não sobreviveria, pois a per capta mensal desta atividade é de apenas R$ 25,92 o que

equivale a apenas R$ 0,86 (oitenta e seis centavos) pessoa dia. Esta situação situa-se em

pobreza extrema, pois com os incrementos das rendas vindas de fora da agropecuária e dos

benefícios sociais ainda colocam essas pessoas com uma sobrevivência indigna de apenas R$

5,03 (cinco reais e três centavos) por dia.

No campo da educação percebe-se que o Assentamento do INCRA ainda estar bastante

atrasado, pois o índice de analfabetismo continua elevadíssimo, embora tenha melhorado

substancialmente, pois aqueles que cursam o ensino fundamental representam 56,9%, quem

cursa o ensino médio representa apenas 3,5%, e o analfabetismo ainda domina 39,6% dos

assentados. Este assentamento continua sem receber os serviços de ATER.

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Para a presidente do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Miguel Alves,

Katiana Lima da Silva, o assentamento Indio Manduladino precisa de um incentivo do

Governo Federal, pois o processo de organização do assentamento sempre foi conturbado,

especialmente na aplicação dos créditos iniciais e da construção das habitações, houve má fé

dos empreiteiros que aproveitaram-se da situação de analfabetismo dos assentados e a

Associação do Assentamento não teve condições gerenciais para se impor diante dessa

situação, assim como se verificou uma omissão do INCRA em não fazer o acompanhamento

com uma fiscalização eficaz na aplicação dos recursos no assentamento. Passou a imagem de

que os recursos públicos são pra ser mal gerenciados mesmo, isso é cultural, lamenta. No

entanto, o Sindicato ao querer intervir teve dificuldades, pois os assentados sempre foram

enganados pelos empreiteiros que os alertavam que a presença da entidade sindical poderia

atrasar as obras no assentamento, pois o Sindicato não entende de construção civil.

Ao verificar essa afirmativa do Sindicato, percebe-se quanto é importante o processo

organizativo da comunidade e mais ainda, o domínio do conhecimento com a educação. Não

ocorreu a mesma situação em Piripiri, pois lá, além das pessoas serem esclarecidas tinha

ATER e gerenciaram a iniciação do seu empreendimento, e os resultados são perceptíveis na

melhoria da qualidade de vida daquelas famílias, se comparadas a essas de Miguel Alves.

No entanto, os dois assentamentos foram unânimes em avaliar que as condições de vida

melhoraram após se tornarem assentados da Reforma Agrária, sendo que em Piripiri, os

assentados com uma visão crítica mais aprofundada, 22% afirmaram não ter melhorado de

vida depois da condição de assentados, no entanto, em Miguel Alves, apenas 9% acham que

não houve melhora.

Questionados sobre os aspectos que melhorou na vida de assentados, quando se analisa o

ponto de vista conjunto dos dois assentamentos, 85% acham que as principais melhorias

ocorreram em obterem uma terra para morar, aonde não há “patrão para lhes mandar”, como

foram unânimes nessa questão. Aqueles que não avaliaram esse aspecto fazem parte dos 15%

que tinham moradia e família com terra própria em outra localidade e que não se desfizeram

dela, portanto ao analisarem essa situação não valorizaram estes pontos como os demais.

Avaliam também a qualidade de vida no aspecto da moradia, pois todos têm casa, sistema de

abastecimento de água e energia elétrica.

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Quando analisamos a infraestrutura de apoio, os assentados do PNCF em Piripiri são mais

críticos politicamente e defensores de propostas coletivas, como requerem e conseguem

estradas ligando o assentamento à cidade, lutam por melhoria no atendimento da educação no

item “melhor qualidade”. Já no assentamento do INCRA em Miguel Alves, as reivindicações

são mais individualizadas, embora pensem no coletivo, mas não pressionam o Poder Público

para agir. Acham que a Prefeitura deve fazer a estrada, fazer o posto de saúde e a escola no

assentamento, mas não agem rigorosamente sobre essa política, como fazem os assentados do

PNCF no caso analisado. Em Miguel Alves ainda recorrem ao Sindicato dos Trabalhadores

Rurais para indicarem à direção da entidade as suas necessidades e aguardam que o sindicato

tome as providências reivindicativas em substituição a associação, ou seja, culturalmente são

dependentes dos outros para resolverem os seus próprios problemas.

A Assistência Técnica e Extensão Rural - ATER

Mesmo com as dificuldades apontadas, ausência de eficácia do Estado em efetivar as

condições de vida do assentado pelo INCRA através da modalidade desapropriação e do

modelo alternativo à Reforma Agrária, percebe-se claramente a satisfação na maioria das

pessoas. Verifica-se que a sua luta pela sobrevivência antes de se beneficiar do programa de

Reforma Agrária era periclitante, porém ao sair do estado latente de miséria já é uma vitória e

que de certa forma acomoda o Agricultor.

Ao analisar a ATER e a sua sistemática metodológica no assentamento, percebe-se que aquele

que inicialmente foi assistido, bem ou mal, teve melhoria na qualidade de vida dos seus

assentados, como é o caso do Assentamento Boa Esperança em Piripiri, no entanto, aquele

que não obteve nenhum serviço de assistência técnica o seu estado de pobreza é agudo e o

analfabetismo impera, contribuindo desta maneira para a manutenção da dependência de

favores, seja de pessoas, seja de entidades da sociedade civil ou do estado.

Inicialmente na implantação do assentamento Boa Esperança, este teve ATER de empresa

particular contratada pela associação de assentados com recursos do PNCF. Esta assistência

foi primordial no processo de implantação do assentamento auxiliando-os no gerenciamento

administrativo da associação, assim como na implantação dos primeiros projetos

agropecuários, o que resultou na época, uma área cultivada 47,8% superior a atual e um

melhor rendimento agropecuário no início do projeto e sem financiamento do PRONAF A.

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Hoje, o assentamento deveria estar estabilizado financeiramente, porém sem um serviço de

ATER adequado a situação ainda é de insustentabilidade econômica das famílias assentadas,

além da dívida do financiamento agropecuário junto ao Banco do Nordeste.

Ao analisar a Assistência Técnica e Extensão Rural do Assentamento “Data Sítio” em

Piracuruca – PI, também do Crédito Fundiário, percebe-se que este tem uma melhor qualidade

de vida entre seus assentados, e segundo a Associação e a entidade que presta ATER a estes

agricultores familiares o seu rendimento médio mensal ultrapassa 05 (cinco) salários mínimos

e a produção é orgânica, e ao longo de 06 anos apenas um agricultor deixou o assentamento.

As visitas programadas pela entidade são semanais além das atividades extras à propriedade.

No assentamento Boa Esperança, em Piripiri, que tem “ATER”, feita pela empresa oficial de

extensão rural do Piauí – EMATER, os resultados são os já relatados e o processo de

produção é convencional e a empresa passa, segundo os associados, de 01 (um) ano que não

vai no assentamento. Em Miguel Alves, não há assistência técnica de nenhuma instituição.

Diante desta constatação, é possível afirmar que um dos elementos fundamentais ao processo

de desenvolvimento da Agricultura Familiar, assentados ou não, é uma assistência técnica de

qualidade, sem esta, o processo é inviável do ponto de vista econômico e social do agricultor

familiar e leva esse agricultor muitas vezes retornar a condição de morador de proprietários

rurais. Deixando transparecer que a agricultura familiar é inviável e não tem retorno

econômico e social, o que é um engano, o que lhe falta é processo de pesquisa e extensão que

der resultados e fixe o agricultor familiar como agente de desenvolvimento econômico em sua

propriedade.

O MDA, vem fazendo chamadas públicas para ATER em áreas da Reforma Agrária e fora

dela, porém os resultados têm sido ineficientes no ponto de vista de promover a melhoria na

qualidade de vida do agricultor familiar.

CONCLUSÃO E RECOMENDAÇÕES

Os assentamentos do PNCF e do INCRA em análise são absolutamente inviáveis do ponto de

vista da sustentabilidade econômica. No entanto, trouxeram paz e tranqüilidade ás famílias no

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que se refere ao “ter a terra pra morar em minha casa”, como afirmaram nas entrevistas

concedidas. É perceptível, neste campo de visão, a melhoria na qualidade de vida social.

No entanto, o processo de Reforma Agrária no Brasil, partindo dos exemplos analisados e

pelo seu fundamento político e histórico precisa ser revisto. Os agricultores sobrevivem nos

assentamentos não do que produzem na terra, mas dos programas sociais do Governo Federal

e dos benefícios previdenciários, distanciando a prática do objetivo dos dois modelos de

Reforma Agrária analisados.

O estado brasileiro é ineficiente e negligente, sobretudo nos assentamentos do INCRA, e o

projeto alternativo “Crédito Fundiário”, apesar de mais ágil, também reflete falhas que

precisam de correção, caso contrário estaremos constituindo favelas rurais e, como afirmou

um diretor da FETAG-PI, “com essa Reforma Agrária aí estamos transformando agricultores

pobres em miseráveis endividados”. Isto é, a liderança sindical expressou em sua frase que o

atual modelo de Reforma Agrária precisa ser revisto em seu objetivo final, que é dar

condições de vida com dignidade às famílias assentadas.

Percebe-se que o principal gargalo é a assistência técnica e extensão rural, o modelo estatal

estar ultrapassado e não responde mais às necessidades da agricultura familiar e os projetos de

assentamentos do INCRA atolados na burocracia se tornam absolutamente ineficientes, pois

no assentamento Indio Manduladino em Miguel Alves, pasmem, tem créditos que deveriam

ter sido aplicados no início do PA (Projeto de Assentamento) que ainda não saíram do papel.

Em Piripiri, a ineficiência da empresa estatal em prestar assistência técnica e em alguns casos,

leva a baixos índices de produtividade e a inviabilidade econômica dos projetos produtivos

aplicados. Verifica-se, lamentavelmente, a indolência do agricultor (nos dois casos

analisados) que garantido pelos programas sociais do Governo resistem em ampliar e pensar

um gerenciamento para a sua terra e dela fazer um meio de produção e de dignidade sua e de

sua família.

Finalmente, recomendamos a todos aqueles que lidam com essa temática que busquem

alternativas para o enfrentamento da ineficiência do atual modelo de Reforma Agrária, e o

primeiro deles, passa pela revitalização do processo de seleção do assentado para o imóvel

rural e, sobretudo, pela qualidade da ATER que deverá ser destinada a essas famílias, pois é

perceptível que aonde a ATER chega com qualidade os resultados e a satisfação dos

assentados são absolutamente diferentes e eficazes.

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O mau gerenciamento dos projetos de assentamentos é que leva a ineficiência produtiva, sem

deixar de reconhecer os casos exitosos que são poucos, portanto, necessitando que o MDA em

parceria com as organizações de agricultores familiares e técnicos da ATER propiciem

debates que provoquem as mudanças necessárias nesse mecanismo importante e definidor do

sucesso ou insucesso de um projeto de assentamento da Reforma Agrária, de modo a torná-lo

mais eficaz. Pois os fatos históricos e os resultados desta pesquisa apontam para a necessidade

de se rever urgentemente a política de Reforma Agrária no Brasil.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALENCAR, Maria Tereza de. Considerações sobre a formação organização, do território e da

sociedade piauiense. SILVA, Conceição de Maria e. et al. Seminário piauiense: educação e

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