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Manifestações digitais no grupo do Facebook “Comunicação. Cidade, Memória e Cultura” 1 RABELLO, Rafaella Prata (Mestranda) 2 Universidade Federal de Juiz de Fora/MG HENRIQUES, Rosali (Doutoranda) 3 Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro/RJ MUSSE, Christina (Doutora) 4 Universidade Federal de Juiz de Fora/MG Resumo: O grupo “Comunicação, Cidade, Memória e Cultura” é um espaço criado em janeiro de 2012 no Facebook, destinado a agregar reflexões sobre as interfaces que se estabelecem entre as narrativas constituintes dos processos de comunicação audiovisual, as sociabilidades que se estabelecem nos centros urbanos, e a memória que é reconhecida como marca identitária e cultural de nossas sociedades. A proposta é a de romper as barreiras do mundo acadêmico e formar uma rede de informações e de afetos, como também dar visibilidade às questões trabalhadas nas reuniões dos projetos de pesquisa e extensão, para que toda a vitalidade dessas discussões possa ultrapassar os limites do espaço e do tempo, e chegar a mais pessoas. O objetivo desse artigo é discutir o uso da ferramenta do Facebook na divulgação da discussão sobre memória, já que o grupo funciona como um local que instiga as perspectivas transdisciplinares da memória e suas relações com a comunicação. Palavras-chave: Comunicação; Memória; Cidade; Facebook; Cultura Introdução O presente trabalho tem como objetivo analisar o uso da ferramenta de grupos do Facebook através do estudo de caso do grupo “Comunicação, Cidade, Memória e Cultura”. Surgido no âmbito do Programa de Pós-graduação em Comunicação Social, o grupo ampliou-se e atualmente possui 264 membros. A ferramenta de grupo do Facebook mostrou-se um aplicativo eficaz para a legitimação da história e da memória 1 Jornalista, mestre e doutora em Comunicação e Cultura pela UFRJ. Professora da UFJF no curso de Jornalismo e no Programa de Pós-Graduação em Comunicação, email: [email protected] 2 Mestranda da linha "Comunicação e Identidades" do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Jornalista pelo Centro de Ensino Superior de Juiz de Fora (CES/JF) e graduanda do 8º período de Letras pela UFJF, e-mail: [email protected] 3 Mestre em Museologia, doutoranda na linha “Memória e Patrimônio” do Programa de Pós-Graduação em Memória Social pela Unirio, e-mail: [email protected] 4 Jornalista, mestre e doutora em Comunicação e Cultura pela UFRJ. Professora da UFJF no curso de Jornalismo e no Programa de Pós-Graduação em Comunicação, email: [email protected]

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Manifestações digitais no grupo do Facebook “Comunicação. Cidade,

Memória e Cultura”1

RABELLO, Rafaella Prata (Mestranda)2

Universidade Federal de Juiz de Fora/MG

HENRIQUES, Rosali (Doutoranda)3

Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro/RJ

MUSSE, Christina (Doutora)4

Universidade Federal de Juiz de Fora/MG

Resumo: O grupo “Comunicação, Cidade, Memória e Cultura” é um espaço criado em janeiro de 2012

no Facebook, destinado a agregar reflexões sobre as interfaces que se estabelecem entre as narrativas

constituintes dos processos de comunicação audiovisual, as sociabilidades que se estabelecem nos centros

urbanos, e a memória que é reconhecida como marca identitária e cultural de nossas sociedades. A

proposta é a de romper as barreiras do mundo acadêmico e formar uma rede de informações e de afetos,

como também dar visibilidade às questões trabalhadas nas reuniões dos projetos de pesquisa e extensão,

para que toda a vitalidade dessas discussões possa ultrapassar os limites do espaço e do tempo, e chegar a

mais pessoas. O objetivo desse artigo é discutir o uso da ferramenta do Facebook na divulgação da

discussão sobre memória, já que o grupo funciona como um local que instiga as perspectivas

transdisciplinares da memória e suas relações com a comunicação.

Palavras-chave: Comunicação; Memória; Cidade; Facebook; Cultura

Introdução

O presente trabalho tem como objetivo analisar o uso da ferramenta de grupos

do Facebook através do estudo de caso do grupo “Comunicação, Cidade, Memória e

Cultura”. Surgido no âmbito do Programa de Pós-graduação em Comunicação Social, o

grupo ampliou-se e atualmente possui 264 membros. A ferramenta de grupo do

Facebook mostrou-se um aplicativo eficaz para a legitimação da história e da memória

1 Jornalista, mestre e doutora em Comunicação e Cultura pela UFRJ. Professora da UFJF no curso de

Jornalismo e no Programa de Pós-Graduação em Comunicação, email: [email protected] 2 Mestranda da linha "Comunicação e Identidades" do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da

Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Jornalista pelo Centro de Ensino Superior de Juiz de Fora

(CES/JF) e graduanda do 8º período de Letras pela UFJF, e-mail: [email protected] 3 Mestre em Museologia, doutoranda na linha “Memória e Patrimônio” do Programa de Pós-Graduação

em Memória Social pela Unirio, e-mail: [email protected] 4 Jornalista, mestre e doutora em Comunicação e Cultura pela UFRJ. Professora da UFJF no curso de

Jornalismo e no Programa de Pós-Graduação em Comunicação, email: [email protected]

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dos nossos tempos. O grupo é um espaço de trocas e de comunicação de assuntos

ligados aos temas principais, mas especialmente aos múltiplos aspectos da memória,

uma vez que a mesma é uma disciplina transversal. O Facebook é utilizado pela

facilidade de amplitude das discussões que oferece a plataforma. A escolha da

ferramenta de grupos do Facebook teve como objetivo dinamizar as discussões sobre a

memória, uma vez que atualmente é a rede social de maior utilização no Brasil.

Por questões didáticas, dividimos o texto em três partes: na primeira delas,

discutiremos a importância dos estudos da memória social nos dias de hoje, uma vez

que o foco principal do grupo são as discussões acerca do papel da memória nas

narrativas de comunicação, na cidade e na cultura. Em seguida, apresentaremos um

breve histórico do Facebook e as possibilidades de interação no espaço virtual, por fim,

analisaremos o caso específico do grupo estudado. Nesse item iremos abordar não

somente as questões técnicas da ferramenta, mas a possibilidade de uso que o grupo faz

dela.

O boom da memória

A palavra memória vem do latim memoria e significa a faculdade de reter, a

capacidade de lembrar. No entanto, a memória pode ter uma série de significados em

várias áreas do conhecimento: história, psicologia, informática, arquitetura, etc. E o

conceito de memória tem se modificado ao longo dos tempos. Na mitologia grega, a

memória era representada por uma deusa, Mnemosine, filha de Urano (Céu) e Gaia

(Terra) que, unida a Zeus gerou as nove musas, divindades responsáveis pela inspiração

poética. Para os gregos a memória era a “mãe” da poesia, mas também a musa da épica.

Os gregos acreditavam que a memória e a imaginação vinham da mesma origem. A

memória seria um dom a ser exercitado e, para isso, utilizavam técnicas para relembrar

e para guardar o que lhes interessava.

Os estudos sobre a memória social ganharam fôlego na década de 30, do século

XX, nas obras de Maurice Halbwachs, sociólogo francês. Criador do conceito de

memória coletiva, Halbwachs (2006) via o homem como um ser social. Ele defendia o

caráter eminentemente social da memória, ou seja, a memória é sempre construída pelo

grupo, mesmo sendo uma construção individual. Em seus estudos Halbwachs (1994)

criou três quadros relacionados à memória, três pontos de referência para o seu

entendimento: a linguagem, o tempo e o espaço. Mesmo que os estudos da memória não

sejam recentes, visto que Maurice Halbwachs e o filósofo Henri Bergson (2010) já se

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debruçavam sobre o assunto desde a década de 1930, podemos afirmar que existe

atualmente um boom de pesquisas sobre o assunto.

Por se tratar de um campo transdisciplinar, a memória social é objeto das mais

variadas abordagens. Na internet proliferam sites de histórias que incentivam a

rememoração: são blogs, comunidades virtuais, sites de museus e de projetos de

incentivo ao envio de histórias de vida. Muitos desses projetos sobre eventos

traumáticos tais como Holocausto, pessoas desaparecidas, massacres em massa ou

guerras civis abrem espaço para que as pessoas possam conhecer as histórias daqueles

que viveram determinados acontecimentos e lutar contra o esquecimento. No entanto, o

excesso de informação comunicado pela sociedade pode vir a produzir um efeito

contrário, relegar ao esquecimento essa memória dos acontecimentos, tal como nos

alerta Andreas Huyssen (2000) em sua obra “Seduzidos pela memória”. Para este autor,

este boom da memória nos dias de hoje, quando vivemos uma avalanche de movimentos

nostálgicos, moda retrô e obsessiva musealização não é necessariamente saudável.

Huyssen questiona se esse excesso de memória não acabaria produzindo um

“explosivo” esquecimento e que muito do que consumimos hoje como memórias de

massa seriam “memórias imaginadas”. Estas seriam mais fáceis de serem esquecidas do

que aquelas por nós vividas. Segundo ele, “Quanto mais nos pedem para lembrar, no

rastro da explosão da informação e da comercialização da memória, mais nos sentimos

no perigo do esquecimento e mais forte é a necessidade de esquecer.” (HUYSSEN,

2000, p. 20). Nesse sentido, também Umberto Eco5, em entrevista publicada em 1999,

já alertava para a crise da memória a partir do acumulo de informações produzido pela

internet. Para ele, a internet seria uma espécie de “um imenso Funes6”, pois “até o

presente a sociedade filtrava para nós, por intermédio dos manuais e das enciclopédias”

e com o advento da internet “ampliamos nossa capacidade de estocagem da memória,

mas não encontramos ainda o novo parâmetro de filtragem”. Eco adverte que um pouco

de esquecimento é necessário para o equilíbrio da memória. No entanto, sabemos que

em termos de estudos científicos, é sempre interessante estudarmos a memória sob

vários aspectos e isso tem atraído cada vez mais profissionais de outras áreas de

conhecimento. O grupo no Facebook ajuda a congregar as pessoas em torno de um

5 O Bug da Memória. http://biblioteca.folha.com.br/1/02/1999080801.html

6 No conto „Funes, o memorioso‟, o escritor argentino Jorge Luís Borges conta a história de um homem,

que após uma queda de um cavalo passa a lembrar de todos os detalhes da sua vida, sem esquecer

nenhum pormenor. Esta situação leva a um esgotamento de Funes, pois ele não consegue descansar a

memória.

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denominador comum: a memória dos eventos e acontecimentos.

O Facebook e as possibilidades de interação no espaço virtual

Atualmente, podemos notar que o Facebook está se tornando uma ferramenta

muito eficaz na comunicação de um determinado projeto ou grupo de trabalho. Nesse

sentido, os sites e blogs têm cada vez mais cedido espaço para as redes sociais, não só

pela sua abrangência, mas pela possibilidade de interação com um maior número de

pessoas.

O fenômeno das redes sociais on-line é bem recente e nasceu de uma tendência

natural do crescimento da internet em relação à criação de espaços de participação dos

usuários. A primeira evolução na interação dos internautas com a internet foi o

surgimento da ferramenta de criação dos blogs. A etapa seguinte na evolução histórica

da internet em relação à interação com os usuários foi o surgimento da web 2.07. A ideia

por trás do conceito da web 2.0 é justamente a possibilidade de interação do público

com a internet, através de ferramentas de wikis, postando vídeos no You Tube ou

comentando assuntos em sites de notícias. As redes sociais substituíram, em larga

escala, a experiência das pessoas com os blogs e os comunicadores instantâneos (tais

como MSN, ICQ), que eram os grandes atrativos da comunicação mediada pelos

computadores na internet 1.0.

Em 2002, surgiu a primeira rede social on-line, o Friendster, criado por Jonathan

Abrams. Ela não obteve muito sucesso e acabou sendo fechada por problemas técnicos.

Em 2003, surgiu o Myspace, muito utilizado principalmente por músicos para

divulgação de suas produções artísticas. Em 2004, surgiram mais ou menos na mesma

época, o Orkut, que já dominou o mercado brasileiro, e o Facebook. O Facebook foi

criado em 4 de novembro de 2004 por Mark Zuckerberg e outros alunos de Harvard

com objetivo de conectar estudantes dessa universidade e, posteriormente, se estendeu a

outras universidades de Boston, dos EUA, Europa e finalmente se espalhou para o

mundo inteiro. Possui atualmente 845 milhões de usuários ativos no mundo, sendo que

37 milhões desses usuários estão no Brasil8. O Brasil é o quarto país em número de

usuários, após os Estados Unidos, Indonésia e Índia. Conforme pesquisa Nielsen,

7“Web 2.0 é um termo criado em 2004 pela empresa americana O‟Reilly Media para designar uma

segunda geração de comunidades e serviços, tendo como conceito a "web como plataforma", envolvendo wikis, aplicativos baseados em folksonomia, redes sociais e Tecnologia da Informação”

retirada do site www.wikipedia.org em 12/05/2012. 8 Essas informações foram coletadas no site da Facebook em 20/02/2012 e números do Brasil são da

pesquisa Nielsen de outubro de 2011.

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divulgada em outubro de 2011, o Facebook já ultrapassou o Orkut em número de

usuários no Brasil, tornando-se a rede social on-line favorita dos brasileiros.

Em setembro de 2011, o Facebook lançou uma nova versão em que o usuário cria e

alimenta a sua própria linha do tempo. A ideia é criar um espaço de registro dessa

memória do passado, mas também do presente. Mark Zuckerberg, criador do Facebook,

durante o evento de lançamento deste novo aplicativo fez a seguinte afirmação:

"Criamos um jeito de contar todas as histórias importantes de sua vida em uma única

página"9. A ideia é que a vida de qualquer pessoa do Facebook possa ser disponibilizada

na linha do tempo, tornando a rede social um espaço de memórias. Continua

Zuckerberg: “É a história de sua vida e tem três pedaços. Seus aplicativos, suas histórias

e um jeito de expressar quem você é. Queremos fazer do Timeline um lugar que você se

orgulha de chamar de 'casa'”.

Ao disponibilizar esta nova versão, o Facebook assumiu um papel de aglutinador de

registros das memórias das pessoas. No entanto, como em qualquer instituição ou

empreendimento comercial, o objetivo inicial do Facebook não era o de suportar as

memórias das pessoas, mas criar um espaço de socialização. No entanto, é lícito afirmar

que o Facebook está se tornando um “lugar de memórias” ou de um livro de caras

(face), um livro de memórias? Segundo Marion Strecker10

, o Facebook está se tornando

uma espécie de “Catálogo da Terra Inteira11

” com as histórias e fotos que as pessoas vão

voluntariamente alimentando na rede social. Este catálogo aglutinaria as experiências

das pessoas, suas memórias e suas narrativas sobre o mundo.

Com a ajuda de seus usuários e através do aplicativo linha do tempo, o Facebook está

adquirindo um perfil de uma grande enciclopédia de histórias e memórias, memória do

momento presente e memória dos momentos passados. Seria uma espécie de museu de

si mesmo. A evolução das redes sociais nesta direção era previsível, uma vez que a

tendência da Web 2.0 é transformar cada pessoa em autor, criando o seu próprio

9 Frases retiradas da fala de Zuckerberg na matéria sobre o lançamento da linha do tempo em 22 de

setembro de 2011, informação disponível no site

http://g1.globo.com/tecnologia/noticia/2011/09/facebook-apresenta-linha-do-tempo-para-registrar-

vida-do-usuario-no-site.html, Acesso em 31/05/2012. 10

Artigo publicado no site UOL Tecnologia e consultado em 18/05/2011. Disponível em

http://tecnologia.uol.com.br/noticias/redacao/2012/05/18/novo-catalogo-da-terra-inteira-facebook-

transforma-pessoas-em-marqueteiros-de-si-mesmos.htm 11

Catálogo da Terra Inteira (ou “Whole Earth Catalog”) é um nome de um catálogo publicado entre os

anos de 1968 e 1972 por Stewart Brand.

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broadcast, tornando-se o centro de uma ferramenta de comunicação cada vez mais

voltada para o individuo e suas individualidades. Segundo Paula Sibilia (2008), este

foco no individuo e suas representações na internet teve início com os blogs, passa pelas

redes sociais, mas encontra seu terreno mais fértil no Second Life12

, no qual é possível

viver uma vida completamente diferente da sua.

O diferencial do Facebook em relação às outras redes sociais on-line, e que fez dele o

líder mundial, foi a disponibilização de um mural onde os internautas podem postar

comentários que são facilmente visualizáveis pelo círculo de amigos do usuário. Além

disso, possibilitou o compartilhamento de informações sobre qualquer assunto, seja um

link de uma notícia lida em algum portal ou um vídeo visualizado no YouTube. Com a

possibilidade de compartilhar, criou-se uma ferramenta de mobilização on-line, muito

utilizada por movimentos sociais. Um dos exemplos atuais de seu uso eficiente é em

relação ao movimento por democracia nos países árabes, mais conhecida como

Primavera Árabe, no qual as redes sociais e o Twitter tiveram um papel importante na

mobilização para as manifestações13

. Obviamente seria ingenuidade acreditar que as

redes sociais foram sozinhas responsáveis pela mobilização, mas foram importantes no

processo de comunicação entre os grupos de revoltosos.

Para efetuar com sucesso uma mobilização, seja na internet ou fora dela, o importante é

abranger um maior número de pessoas. E para isso, quanto maior o número de conexões

que a pessoa possui, maior é a força da mobilização de uma rede. Albert-László

Barabási (2009), em obra publicada originalmente em 2002, estudou a questão dos

conectores em um sistema de redes. Utilizando a teoria dos Seis Graus de Separação

formulada por Frigyes Karinthy em 1929 e retomada por Stanley Milgram em 1967,

Barabási afirma que alguns nós das redes possuem mais conexões do que outros nós.

Estes seriam os conectores (hubs em inglês), por onde trafegam mais informações do

que em outros nós14

. Nas redes sociais on-line o sistema é o mesmo. Quanto mais

contatos o usuário tem em sua rede de amigos, maior é a possibilidade de seus posts

serem compartilhados e curtidos por um maior número de pessoas. No Facebook,

12

Second Life é um ambiente virtual e tridimensional, criado em 1999 e no qual as pessoas interagem

através de avatares. 13

Sobre o papel do Twitter nas revoluções no Egito e na Tunísia, ver interessante artigo de LOTAN, Gilad

et alii. The Revolutions Were Tweeted. 2011 14

Sobre isso, ver estudo de Benjamin Doerr et alii (2012) analisando como um boato se espalha nas redes

sociais, utilizando um diagrama matemático proposto por Réka & Barabási (2002),

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quando você curte ou compartilha um determinado conteúdo de um amigo, você está

dando aval aquele conteúdo. Este tipo de ação transformou a forma como as pessoas

lidavam com as redes sociais. A interação entre as histórias e as pessoas passa a ser

transversal e não linear e possibilita trabalhar o conteúdo em forma de cadeias de

informações.

A dinâmica do grupo no Facebook

O grupo do Facebook “Comunicação, Cidade, Memória e Cultura” surgiu em

janeiro de 2012, a partir da demanda de gerar visibilidade para o conteúdo discutido

durante as reuniões de alguns mestrandos e graduandos ligados à linha de pesquisa

“Comunicação, Identidade e Cidadania” do Programa de Pós-Graduação em

Comunicação da Universidade Federal de Juiz de Fora. Os alunos se reúnem

semanalmente para discutir temas relevantes ligados à área de comunicação, cultura e

memória, tendo como coordenadora, a professora adjunta da Universidade Federal de

Juiz de Fora, Christina Ferraz Musse. A partir das discussões do grupo amadureceu-se a

ideia de levar as discussões para o ambiente on-line, primeiramente, através da criação

de um blog e, posteriormente, através de um grupo no Facebook. Por questões técnicas,

o blog foi lançado somente em maio de 2012, enquanto o grupo no Facebook de caráter

secreto para discussão em torno dos assuntos abordados, de mais fácil criação e

manutenção, teve início em janeiro de 2012. Para complementar o grupo, foi criada a

Fan Page. Atualmente a Fan Page reúne 129 pessoas.

O grupo do Facebook “Comunicação, Cidade, Memória e Cultura” reúne

atualmente um grupo de 264 pessoas das mais diversas formações, predominando um

grupo maior de profissionais da área de Comunicação (169 membros) e de História (52

membros). Embora tenha se iniciado com um caráter mais regional, o grupo se expandiu

para outros usuários fora da cidade de Juiz de Fora, possuindo atualmente oito membros

fora do Brasil (moradores de Portugal, França, Austin e Timor).

O grupo funciona como uma comunidade de divulgação científica e cultural,

segmentado por pessoas com interesses comuns. É um filtro de conteúdos e também

uma forma de direcionar compartilhamentos, uma vez que as pessoas podem deixar de

postar conteúdos específicos da área acadêmica em sua linha do tempo para

disponibilizar diretamente no grupo. Com um discurso transversal em várias áreas do

conhecimento, é um local democrático que faz com que os internautas estejam ativos

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nas produções de sentidos para o trabalho da equipe de pesquisa. Nesse sentido,

podemos afirmar que o uso da ferramenta de grupo do Facebook, torna-se mais eficaz

do que uma lista de discussão, pois estabelece uma rede de colaboração, na qual não é

preciso entrar exclusivamente para postar informações, mas estar presente dentro de um

ambiente (ou espaço) em que há uma regularidade na visita, como é o caso do

Facebook.

A grande diferença entre a postagem no caso da Fan Page e do Grupo reside no

fato de que, no primeiro caso, os sujeitos são mais passivos, podendo ou não fornecer

feedback, e a publicação de conteúdo está dependente do administrador do mesmo. Este

tipo de página funciona muito bem para instituições e grandes grupos comerciais, nos

quais o controle de informações postadas é muito importante. Dessa forma, as empresas

ficam no controle, as pessoas apenas acompanham as publicações. Talvez por isso, no

grupo, tenhamos um número bem mais significativo de "curtir", comentários,

visualizações e compartilhamentos, uma vez que a participação é mais ampla, pois

qualquer membro do grupo pode postar, curtir ou compartilhar o conteúdo

disponibilizado por outros membros do grupo.

Mas existem aspectos negativos no grupo, tais como: ele não disponibiliza as

visualizações de compartilhamentos, além de apresentar dificuldades de utilização de

algumas ferramentas por falta de clareza no modo de execução, como, por exemplo,

retornar com usuário banido do grupo. Ao analisarmos o Facebook enquanto

ferramenta de comunicação e discussão de determinado tema e ao compararmos com o

Orkut, por exemplo, podemos notar que a ferramenta de Comunidades do Orkut,

embora possua uma dinâmica de publicação mais interessante, pois ela é organizada em

torno de tópicos, ela é um fórum diferenciado do mural do participante. No Facebook

todo o conteúdo postado aparece na linha do tempo do usuário, seja ele postado no

mural de algum amigo, seja no mural do grupo. Dessa forma, a consulta ao tópico

postado é imediata e não necessita de um acesso específico para tal, tornando o post

mais visualizado por todos os membros do grupo.

No grupo são feitas postagens diárias sobre temáticas interdisciplinares. Existe

um estímulo por parte da administração do grupo em atrair membros de diferentes áreas

acadêmicas para que o discurso produzido naquele espaço possa reverberar em outros

locais. São postados links de eventos acadêmicos, convites de lançamentos de livros,

palestras, cursos, entrevistas divulgadas na mídia com autores ou coerentes com os

assuntos abordados nesse espaço de discussão, divulgação de blogs e/ou sites, páginas

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do Facebook e também dicas de referências bibliográficas que dialogam com as

temáticas do grupo.

Durante acompanhamento das publicações ao longo do ano de 2012 e início de

2013, um fato curioso chamou a atenção da administração do grupo: grande parte das

postagens, que não era comentada ou marcada com a opção “curtir”, possuía

considerável número de visualizações. Tal ocorrência talvez seja um indicativo do

interesse dos membros pelo conteúdo explicitado. Podemos citar exemplos que nos

indicam as considerações propostas. Na postagem da Fan Page do Museu da Maré, no

RJ, apenas uma pessoa curtiu, enquanto 32 pessoas visualizaram. Outra postagem que

mostra a diferença de manifestação é sobre a terceira edição da Revista Brasileira de

História da Mídia, com 8 curtir e 34 visualizações. Há também postagens com nenhum

curtir e com 45 visualizações, como a divulgação do site do Simpósio na Anpuh sobre

Autoritarismo, Memória e resistência. Alguns exemplos de postagens do Grupo:

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Considerações finais

Ao finalizarmos a análise do material do grupo, podemos afirmar que embora

tenham sido criados um blog e uma fan page no Facebook, a comunicação efetiva com

um maior número de pessoas só foi possível através da criação do grupo no Facebook.

A adesão ao grupo e a participação dos membros crescem consideravelmente a cada dia,

o que leva a crer que desse espaço de comunicação e memória passamos a construir um

gerador de cultura, um tipo de boletim informativo com conteúdos pertinentes a área

acadêmica.

Sabemos que, por ser mais dinâmico, o Facebook possui mais acesso do que o

blog. Com objetivos diferenciados, o que podemos notar é que o grupo tem atraído

visitantes para o blog, uma vez que a cada postagem no mesmo uma chamada é

colocada no grupo. Nesse sentido, diferenciamos as ferramentas de comunicação: o blog

é um espaço para a publicação de textos acadêmicos produzidos pela equipe de

pesquisadores da UFJF, resenhas de livros e filmes, anais de congressos, coisas que nem

sempre estão disponíveis no Facebook. Fica registrado que o blog ainda está em modelo

de planejamento, adaptando-se a ideias criativas que possam contribuir na visibilidade

deste espaço.

Sobre o conteúdo postado no Grupo, podemos notar que conteúdos referentes à

cultura parecem atrair atenção dos membros na observação do que foi curtido,

comentado ou apenas visualizado, feita pelos pesquisadores em 15 dias de postagens no

primeiro semestre de 2013. O presente artigo não contempla a análise do perfil dos

usuários pela falta de tempo para aplicação e coleta de dados. Também deixamos claro

que o trabalho é apenas a primeira produção que se detém nesse objeto. Uma das ideias

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para a continuidade do trabalho será a aplicação de um questionário entre os membros

do grupo para entender melhor o perfil dos participantes, bem como elucidar quais tipos

de conteúdos são mais interessantes para as pessoas envolvidas. Dessa maneira será

possível ampliar os conteúdos e transformar o grupo em um espaço dinamizador para

discussões sobre a memória no momento atual. O que podemos afirmar, com toda

certeza, é que o grupo tem potencial para crescer com este objetivo, deixando de ser

meramente uma vitrine de eventos para se transformar verdadeiramente espaço de

discussão e de trocas de experiências sobre a memória.

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