Fundamentos e Politicas

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EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA: FUNDAMENTOS E POLÍTICAS Cuiabá, 2009 Oreste Preti

Transcript of Fundamentos e Politicas

  • EDUCAO A DISTNCIA:FUNDAMENTOS E

    POLTICAS

    Cuiab, 2009

    Oreste Preti

  • Dr Lucia Helena Vendrusculo Possari

    Dr Onilza Borges

    Dr Ana Arlinda de Oliveira Dr Carlos RinaldiDr Gleyva Maria Simes de Oliveira

    Dr Maria Lucia Cavalli Neder Martins

    Comisso Editorial

    RevisoDiagramao

    Capa

    Germano Aleixo FilhoTerencio Francisco de OliveiraMarcelo Velasco

    Cuiab, 2009

    Ficha Catalogrfica

    P942e Preti, OresteEducao a distncia: fundamentos e polticas / Oreste Preti. -

    Cuiab : EdUFMT, 2009.

    171 p. : il. Inclui bibliografiaISBN

    1.Ensino a distncia. I. Ttulo

    CDU - 37.018.43

    978-85-61819-66-8

  • A ningum se pode negar a oportunidade de aprender por ser pobre, estar isolado geograficamente,

    marginalizado, doente ou por qualquer outra circunstncia que impea seu acesso a alguma

    instituio de ensino. Esses so elementos que supem o reconhecimento de uma liberdade para algum decidir

    se quer ou no estudar.

    WEDEMEYER, Charles A. 1966

  • egundo os dados do INEP, no Brasil, em 2007, eram 408 os cursos a distncia, atingindo mais de 350 mil estudantes; 3.702 os cursos Sda chamada educao tecnolgica - cursos com durao de at

    dois anos -, com quase 350 mil matrculas tambm.O Anurio Brasileiro Estatstico de Educao Aberta e a Distn-

    cia (2007) confirma estes dados: 225 Instituies autorizadas pelo MEC para oferecer cursos a distncia, atendendo a mais de 770 mil estudantes.

    Em 1995, a Universidade Federal de Mato Grosso era a primeira instituio a oferecer um curso de graduao a distancia no Pas (Pedago-gia), por meio de seu Ncleo de Educao Aberta e a Distncia (NEAD), criado em 1992. Em 2000, eram apenas cinco as universidades, abrigan-do menos de 5 mil estudantes matriculados.

    Esses poucos dados podem nos dar de imediato uma ideia aproxi-mativa do crescimento desta modalidade, aqui no Brasil, pois no mundo, desde a dcada de 1970, milhes de estudantes frequentam universida-des sem sair de casa ou do local de trabalho.

    A impulso da EaD em nosso pas pode ser atribuda a pelo menos dois fatores:

    - o primeiro, como parte do movimento de luta pela democratiza-o do ensino. H um grito forte e uma luta contnua para que o

    COLETNEAEDUCAO A DISTNCIA

  • direito constitucional educao se concretize para milhes de brasileiros excludos deste bem social historicamente conquis-tado. E a modalidade a distncia vem se afirmando como uma das possibilidades para que isto se realize;

    - o segundo fator pode ser atribudo s novas tecnologias da informao e da comunicao. Essas tecnologias realizaram avanos, e algumas delas, em certo sentido, se populariza-ram, permitindo s pessoas ultrapassar as distncias geogrfi-cas e se aproximar cada vez mais.

    Assim, est ocorrendo uma espcie de rompimento do conceito de distncia. A educao est mais prxima para uma parcela cada vez maior da sociedade (no est mais distante - a distncia). As tecnologi-as da comunicao permitem o dilogo e a interao entre pessoas, em tempo real, como o telefone, o bate-papo, a video e a webconferncia, tornando sem sentido falar em distncia no campo da comunicao.

    Por isso, podemos falar em EDUCAO SEM DISTNCIAS! No somente porque possvel ser realizada, como por ser bandeira de luta a ser levada adiante para as prximas dcadas, por ns, educa-dores!

    Quando, em 1996, lanvamos o primeiro livro da coletnea Educao a Distncia, havamos pensado nomear esta coletnea de Educao sem Distncia.

    Porm, naquele momento, avalivamos que isso poderia provo-car mal-entendidos e que, diante da necessidade de divulgar essa modali-dade de ensino e diante da escassez de material sobre o tema em lngua portuguesa, retratando nossa realidade educacional, social e cultural, seria mais oportuno recorrer expresso consagrada mundialmente: Educao a Distncia.

    Hoje, com a expanso quantitativa de cursos a distncia e com a necessidade de qualificao de quadros para atuar nesta modalidade, existe produo significativa sobre esta prtica educativa.

    Educadores brasileiros com experincia nesta modalidade se propuseram escrever, expor suas experincias em EaD como maneira de contribuir na consolidao desta modalidade, aqui no Brasil, e na forma-o dos que atuam na EaD. So dezenas as teses e dissertaes, centenas os artigos versando sobre Educao a Distncia.

    A participao e a contribuio da UFMT, no debate sobre EaD,

  • tambm tm sido significativa, com produo acadmica, abertura da linha de pesquisa em EaD (2000), no Programa de Mestrado em Educa-o Pblica e a coletnea Educao a Distncia.

    Em 1996, lanvamos o primeiro nmero da coletnea, com o tema: Incios e indcios de um percurso, trazendo relatos da experincia do NEAD/UFMT na oferta do primeiro curso de graduao a distncia no Brasil (1994).

    Em 2000, com o segundo nmero da coletnea, Educao a Distncia: construindo significados, amplivamos a discusso sobre esta modalidade, no se restringindo experincia do NEAD. Trouxe-mos contribuies valiosas de educadores atuando em instituies de renome e com larga experincia em EaD, como G. Rumble, Neil Mercer e F. J. G. Estepa, da Open University da Inglaterra; Walter Garcia, presi-dente da Associao Brasileira de Tecnologia (ABT); Rosngela S. Rodrigues, da Diviso de Engenharia de Produo, Universidade Fede-ral de Santa Catarina, e do socilogo Pedro Demo, que tambm prefaci-ou a obra. Eram relatados percursos diferentes, com experincias e vises diversas sobre EaD, que foram trazidas para o debate e oferece-ram elementos de reflexo para quem estava atuando ou se propondo iniciar nesta modalidade.

    Em 2005, foram lanados dois volumes. Em Educao a Distn-cia: sobre discursos e prticas, discutia-se a Formao de Professores em cursos a distncia, analisando as prticas discursivas sobre a EaD. Na obra Educao a Distncia: ressignificando prticas, discutia-se a questo da gesto da EaD e a produo de material didtico na EaD.

    Neste ano de 2009, estamos lanando outros quatro volumes: um sobre os Fundamentos da EaD e trs sobre a produo de Material Didtico.

    Esperamos, assim, com estes novos volumes da coletnea, conti-nuar participando intensivamente do atual debate sobre a modalidade a distncia, num momento em que o governo federal prope e dirige a expanso do ensino superior por meio da modalidade a distncia, com a criao do Sistema Universidade Aberta do Brasil (2006). Trata-se de poltica ostensiva e extensiva para que essa modalidade de ensino se solidifique e se qualifique como parte regular do sistema de ensino superior.

    Oreste Preti,organizador da coletnea.

  • SUMRIO

    PONTO DE PARTIDA

    UNIDADE 1EDUCAO A DISTNCIA E GLOBALIZAO: NOVOS CENRIOS, NOVOS TEMPOS E NOVAS PRTICAS?

    1.1 Formao profissional e globalizao1.2 A Educao a Distncia em expanso: uma

    questo de funcionalidade?1.3 Fatores de expanso e desafios

    UNIDADE 2BASES TERICAS EM CONSTRUO NA EaD

    2.1 Conceituaes e caractersticas2.2 Bases epistemolgicas 2.3 Rumo a teorias na EaD?2.4 A pesquisa em EaD

    UNIDADE 3SISTEMA DE EDUCAO A DISTNCIA

    11

    1518

    2530

    3538515771

    77

  • UNIDADE 4UM POUCO DA HISTRIA DA EaD NO BRASIL

    4.1 A EaD no contexto brasileiro4.2 A EaD em nmeros4.3 Consideraes gerais

    UNIDADE 5A LEGISLAO EDUCACIONAL: RUMO A UMA "POLTICA" DE EaD NO BRASIL?

    UNIDADE 6A UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASIL: UMA POLTICA DE ESTADO PARA O ENSINO SUPERIOR A DISTNCIA?

    6.1 Como tudo comeou6.2 Situao atual

    UNIDADE 7A INSTITUCIONALIZAO DA EaD NAS UNIVERSIDADES PBLICAS

    7.1 O que entendemos por processos de institucionalizao da EaD

    7.2 Instituio da EaD na UFMT7.3 A instituio do NEAD7.4 Condies favorveis e fragilidades da

    instituio da EaD na UFMT7.5 A caminho da institucionalizao7.6 Ainda, algumas consideraes

    PONTO DE CHEGADA, OU DE PARTIDA?

    GLOSSRIO

    REFERNCIAS

    WEBGRAFIA

    899195

    100

    103

    117119127

    131

    135138143

    146149151

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    159

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    172

  • Amigo leitor:

    nicialmente, havia pensado em organizar e sequenciar a discusso sobre EaD em dois Imomentos: o primeiro sobre seus Fundamentos, o

    segundo sobre as Polticas voltadas para a EaD. Logo me dei conta de que essa diviso era arbitrria e sem sentido. Como separar a discusso "terica" da dimenso poltica se ambas esto imbricadas, emergem e se alimentam da prtica que social, histrica e contextualizada?

    Abandonei esse caminho e iniciei outro sem a certeza do percurso, dos atalhos e encruzilhadas, mesmo sabendo a que porto atracar o navio.

    Como diz o poeta espanhol Antonio Machado (Proverbios y Cantares. Madrid, 1930):

    1PONTO DE PARTIDA

    1. A construo de parte do contedo deste livro foi iniciada em 1994, em nosso primeiro curso de Ps-Graduao a Distncia: Formao de Orientadores Acadmicos para a EaD. Vem sendo utilizado e reformulado, de l para c, nesse mesmo curso que, periodi-camente, oferecido a orientadores dos cursos a distncia da UFMT como de outras instituies de ensino superior. A publicao somente agora se justifica por inmeras solicitaes para que esse material fosse disponibilizado para quem atua no campo da EaD, sobretudo nesse momento de intensa expanso dessa modalidade e de necessidade de formao de quem atua ou vai atuar nessa modalidade.

    Utilizaremos EaD para Educao a Distncia;e EaD para Educao Aberta e a Distncia.

    11Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • Caminhante, no existe caminho.Faz-se o caminho caminhando [...]Caminhante, no existe caminhoA no ser as estrelas do mar [...]E ao olhar para trsVer a senda que nunca maisIr pisar novamente.

    Portanto, nossa caminhada se dar no oceano, em alto-mar, cada um traando seu caminho, mas com os instrumentos necessrios para se guiar e chegar a porto seguro.

    Torna-se, ento, fundamental, como ponto de partida, que nos situemos estudando o ambiente onde se d a caminhada, para que as decises sejam tomadas sabendo para onde levam, em que direo e aonde se chegar. O "ambiente" da educao vasto como o oceano, pois alimentado pelas guas da poltica, da economia, da cultura.

    O escritor espanhol Jos Manuel Esteve Zaragoza, na Introduo de seu livro O mal-estar docente, faz a pardia de uma pea teatral: enquanto o ator est recitando o texto A vida sonho, os cenrios do palco vo sendo alterados, completamente dissociados do texto. O ator, inicialmente, no se d conta das mudanas e continua impvido a recitar os versos. Mas, diante das risadas incontidas da plateia, percebe a situao ridcula e burlesca em que se encontra e comea a se sentir incomodado. Aos poucos, vai diminuindo o tom de voz at calar-se... E agora?

    A pardia est baseada na obra A vida sonho, do dramaturgo espanhol Pedro Caldern de la Barca (1600-1681), cuja obra um marco na histria do teatro em lngua espanhola. Em A vida sonho, excepcional drama sobre a liberdade do homem, o personagem se v diante da encruzilhada sonho/realidade, devendo decidir que rumo trilhar.

    Neste sentido, ser importante a posterior contribuio do dramaturgo italiano Luigi Pirandello (1867-1936), cuja obra um marco na histria do teatro europeu. permeada pela problemtica da identidade profunda (e perdida) das pessoas: o homem quase no mais quem acredita ser nem quem os outros acreditam que seja. O palco no mais a caixa mgica para oferecer iluses ao pblico, mas o lugar onde a realidade posta em questo diante de um pblico participante.

    Estes lindos versos foram

    musicados por Juan Manoel

    Serrat.

    Prmio Nobel de Literatura,

    em 1934

    12 Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • Segundo Esteves, somente o gnio de Pirandello para achar uma sada ao nosso ator. Mas, voc pode dar sua contribuio e propor ou provocar algumas reflexes, tomando diferentes direes, como:

    a) Centrar o olhar sobre o ATOR:O que ele deveria fazer, ou melhor, o que voc faria?

    - Continuar recitando os versos, pois a mudana de cenrio no palco no problema do ator, mas do diretor da pea?

    - Pediria silncio e colaborao plateia, pois est no palco para desempenhar seu papel?

    - Pediria ao pblico que lhe dissesse o que fazer? - Abandonaria o palco?- Ou ____________________________________ ____________________________________ ____________________________________ b) Observar atentamente o CENRIO: Que acontece no fundo do palco? Tentar compreender as mudan-

    as ocorridas e que tantos risos e distraes provocaram na plateia? Por que o ator no se adequou ao cenrio, s mudanas?

    c) Posicionar-se como AUTOR:E no como ator, tendo que recitar papis previamente definidos e

    repetindo textos escritos por outrem. Como autor, escrevendo para outros vivenciar uma histria no palco, poderia dar outra direo pea, e no ficar esperando uma "improvisao" do ator para se sair da situao embaraosa.

    d) Assumir a posio da PLATEIA:Aplaude ou vaia, conforme seja, ou no, de seu agrado a pea e o

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    Sugerimos que faa uma pausa e registre suas reflexes.

    13Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • desempenho dos atores (atitude ativa); que se posiciona como julgado-ra do outro, e no se sente parte do que se passa no palco, aguardando que o ator ou algum da direo resolva a situao embaraosa e ridcula (atitude passiva).

    Ou voc daria outro encaminhamento?

    Ator-cenrio-autor-pblico so focos e campos de ao, observao e anlise que esto inter-relacionados. No h como compreend-los separada-mente: fazem parte da mesma vida, do mesmo movi-mento e contexto. Observador e objeto observado se inter-relacionam, se influenciam, so participantes do mesmo cenrio!

    Torna-se, ento, indispensvel entender a complexidade do atual cenrio, configurado pelos acontecimentos no campo poltico, econ-mico, social e educacional, para no corrermos o risco de atuar em ve-lhos papis, desfocados do tempo, no cativando a plateia e nos levando desmotivao e frustrao.

    sobre esse cenrio que iremos tratar na Unidade 1.Porm, para darmos conta da complexidade desse cenrio, das

    questes que envolvem a EaD, da compreenso do por que diferentes prticas so construdas nessa modalidade, na segunda Unidade aborda-remos as bases tericas da EaD.

    Na Unidade 3, para os que se iniciam nessa modalidade de ensino, apresentaremos sucintamente a organizao e a dinmica de cursos a distncia, o que caracteriza ser um curso a distncia.

    Nas trs unidades seguintes, faremos breve incurso na histria da EaD, sua normatizao no campo da legislao educacional e na criao do Sistema Universidade Aberta do Brasil.

    Finalmente, na ltima unidade, discorreremos sobre um tema polmico e atual: a institucionalizao da EaD na universidade.

    Assim, esperamos, por meio desta obra, contribuir na consolida-o de prticas educativas na EaD, provocando questionamentos e esti-mulando a reflexo sobre o que estamos realizando atualmente nesta modalidade, aqui no Brasil.

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    14 Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • EDUCAO A DISTNCIA E GLOBALIZAO:

    NOVOS CENRIOS, NOVOS TEMPOS E NOVAS PRTICAS?

    UNIDADE 1

  • Cresce o desemprego num mundo globalizado!

    As runas do futuro - a vida depois da catstrofe poca - n. 187)O Brasil entra na Ordem Global (Isto Dinheiro, n. 215)O presidente FHC explica o papel do Brasil na nova ordem mundial (poca, n. 187 17-12-01)Misria, o grande desafio do Brasil (Veja, n. 1735, 23-1-02)Fruns de Porto Alegre e Nova York defendem mundo globalizado, mas s um deles fala de educao. (Educao, n. 251, mar. 02)Adultos voltam para a escola: eles precisam estudar para conquistar o mercado de trabalho. (A Gazeta, 14-3-99)

    Empregos: o salto da educao a distncia. (Jornal do Brasil, 21-3-99).Internet: rumo ao popular. (Veja, 5-4-00)Canudo pela internet: o ensino a distncia avana e j existem mais de 30 mil cursos oferecidos na rede. (ISTO ,1663, 15-8-01)

    Certamente, voc j leu em revistas ou jornais notcias semelhana destas:

    Que cenrio este, que mudou ao longo das ltimas dcadas? Que tempos so esses? O que h de novo e quais os traos de "universalidade" nos atuais acontecimentos? Que mudanas ocorreram ou esto

    ocorrendo na economia, nas organizaes e nos servios? So necessrios novos saberes para dar conta da complexidade do atual cenrio, e novas prticas esto surgindo?

    Que tem a Educao a Distncia com tudo isso? Por que vem sendo impulsionada e institucionalizada por polticas governa-mentais, no mundo globalizado, sobretudo a partir da dcada de 1970?

    Responder a essas questes de grande relevncia, pois, esta-mos falando em "tempos" de globalizao [dizem que a matria-prima da economia o conhecimento]. Estamos falando, de acordo com as

    17Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • exigncias do mercado, de "novo tipo de trabalhador", qualitativamente verstil e flexvel, capaz de atuar nas mais diferentes reas e, acima de tudo, um trabalhador capaz de solucionar problemas.

    1.1 FORMAO PROFISSIONAL 2E GLOBALIZAO

    Nas duas ltimas dcadas sobretudo, a educao foi muito adjeti-vada: educao sexual, educao para a vida, educao para o trnsito, educao ambiental, educao do campo, educao para o 3 milnio, educao para o trabalho. Vem-nos agora com mais esta: Educao a Distncia.

    Porm, neste processo de adjetivao, de atendimento a aspectos pontuais e perifricos, no uso e abuso de sua palavra, a educao foi perdendo seu contedo, sua fora. Tudo apresentado como educao. E realmente . Todos se postam como educadores. E deveriam ser, mas no so.

    Pois educao, em sua etimologia de educare (ato de criar, de alimentar, fazer crescer) ou de educere (guiar, conduzir para fora), indica ao, implica relao.

    O que isso significa?

    Significa que a educao uma prtica social, determinada pelos fatos, por seu entorno, que, contudo, acaba tambm por afet-los. Por isso, deve ser espao de dilogo, aberto e comunicativo.

    Quando, pois, estamos falando de Educao, estamos nos refe-rindo a todos os aspectos da vida que ela abarca nas relaes pessoais, sociais, polticas, com a natureza, com o entorno. Ela est imiscuda, misturada e diluda em tudo. parte do todo, o todo.

    Portanto, no haveria necessidade de adjetiv-la, de apontar este ou aquele aspecto particular. Corre-se o risco de enfocar em demasia o secundrio e abafar sua fonte, a origem de sua parturio, de seu nascimento. Por isso, tentaremos, ao falar de Educao a Distncia (EaD), dar-lhe uma aborda-gem contextualizada, focando o substantivo educao.

    2. Parte deste texto, de minha autoria, foi publicado na Revista Brasileira de Estudos Pedaggicos, Braslia, v. 79, n. 191. p. 19-30, jan./abr. 1998.

    Os adjetivos passam, os substantivos ficam (Machado de Assis)

    18 Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • possvel trabalhar esta nova adjetivao quan-do o substantivo ainda se faz ausente para parcela signi-ficativa de nossa sociedade? Ou ela ajudaria a tornar mais substantiva a educao para esta populao exclu-

    da? Como anda a educao em nosso pas, Estado e municpio? E, dentro da atual realidade educacional, como se situaria a EaD? Quais suas possibilidades, tendncias e desafios?

    Segundo o IBGE (Censo 2000), um tero da populao brasileira (31,4%) com mais de 10 anos de idade podia ser considerado analfabeto ou analfabeto funcional e 59,9% da populao acima de 10 anos parou de estudar antes de concluir o ensino fundamental ou as primeiras quatro sries.

    O Brasil possui cerca de 16 milhes de analfabetos com 15 anos ou mais, e 30 milhes de analfabetos funcionais.

    Estamos, pois, tratando de problemtica complexa, cuja referncia, no entanto, so as transformaes na vida poltica, social, econmica e no campo da tecnologia e da cincia, no final do sculo passado e incio deste milnio.

    S daremos conta de compreender a teia de relaes postas e que do unidade e direo a este sistema global, no desconhecendo as especifi-cidades da sociedade nacional e local.

    Vamos, ento, nos deter um pouco sobre este processo de trans-formaes na economia e seus reflexos na educao, para melhor situar as tendncias e os desafios da EaD neste momento em que se inicia novo sculo, no centro da globalizao.

    O que vem a ser essa globalizao?

    GLOBALIZAO

    Globalizao, nova ordem mundial, mundializao do comrcio e da produo industrial, alta modernidade, sistema mundial. No pre-tendemos, neste momento, analisar essas terminologias, o que elas significam e sua base conceitual, nem situar outros momentos da globali-zao ao longo da histria da humanidade.

    O que importa apanhar, neste novo contexto, o processo de formao de nova ordem global tendo por base o poder econmico, em vez do poder poltico, deslocando a discusso sobre as relaes de poder para questes tcnicas, de gerenciamento eficaz e eficiente dos recursos. Isso implica um processo de despolitizao em favor de uma viso tecnocrtica, gerencial e pragmtica, em que a grande empresa capitalis-

    Pessoas com menos de

    quatro anos de estudo.

    19Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • ta posta como modelo.A crise econmica, que se instaurou no mundo capitalista nas

    dcadas de 1970 e 1980 sobretudo, trouxe como uma das consequncias a retratao dos gastos nas reas sociais (particularmente na sade e educao), alm das limitaes do mercado de trabalho.

    Na Europa, por exemplo, o nvel de desemprego sem preceden-tes na histria (taxa mdia de 11%). Em 2005, segundo a Organizao Internacional do Trabalho (OIT), aproximadamente 190 milhes de habitantes do planeta estavam desempregados.

    Hoje, com a crise econmica global, o desemprego voltou a assombrar milhes de trabalhadores, no somente nos pases de econo-mia perifrica mas tambm os do chamado Primeiro Mundo, do mundo desenvolvido.

    No Brasil, segundo dados do IBGE, a taxa de desemprego, entre 2002 e 2008, tem variado entre 6,8% (dezembro de 2008) e 12,9 (maro de 2002).

    Trata-se de crise no conjuntural, passageira, mas estrutural do prprio capitalismo que busca novas formas de sobrevivncia e estrat-gias de recomposio do lucro pelo capital, e de refuncionalizao do sistema; o que afeta sensivelmente os trabalhadores, no s pela perda do emprego e dos direitos sociais, mas tambm por lhes serem exigidos saberes e competncias outras introduzidas no processo de produo. Assim, a necessidade de mo de obra reduzida ao mnimo, e se exige qualificao cada vez maior.

    As mudanas tecnolgicas fazem com que grande parte das qualificaes fique defasada, a um ritmo cada vez mais rpido, diante dos aparatos de informao que operam em tempo real. Por outro lado, existe interdependncia maior entre conhecimento e vida econmica.

    Tambm se tornam necessrios ajustes no plano ideolgico (nos discursos), para buscar o convencimento da sociedade de que este o caminho do crescimento econmico, da melho-ria de vida em direo a uma sociedade justa e equitativa.

    neste contexto que se reafirma uma onda neolibe-ral e neoconservadora que passar a dar novo sentido a categorias antigas ou a reinventar outras, tais como Estado mnimo, flexibilidade, competitividade, eficincia, quali-dade total, gesto, integrao.

    O DISCURSO NEOLIBERAL

    Est havendo, pois, uma refuncionalizao no plano cultural e educacional. A globalizao da economia levou unificao dos siste-

    Equidade (em contraposio igualdade): promove diferenas produtivas entre os indivduos.

    20 Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • mas de mercado e a uma nova era de dominao cultural (SOUZA, 1994, p. 111). , talvez, neste campo da hege-monia de uma ideologia, de um tipo de discurso, que o neoliberalismo obteve sucesso bem maior do que no campo econmico.

    O projeto neoliberal busca, mediante os meios de comunicao, convencer a sociedade de que a nica sada para a crise que impera no campo da economia, da poltica e, em nosso caso, da educao. Parte do pressu-posto ou da constatao estatstica de que a educao formal se expandiu, estando disponvel a todos os seg-mentos da sociedade.

    Alega que a improdutividade do sistema educacional (altas taxas de evaso e reprovao, ao redor de 30%) devida:

    - atitude paternalista e assistencialista do Estado;- incapacidade de a escola se organizar e se adequar aos novos

    tempos;- ao corpo docente desqualificado, acomodado e insensvel s

    necessidades de renovao e inovao em seu trabalho;- s organizaes de classe que s lutam por questes salariais,

    sendo muito corporativistas e responsveis no impedir as mudanas necessrias.

    Isso tornaria a escola ineficiente, ineficaz, incompetente para se firmar numa sociedade que vem se caracterizando como sociedade de informao, sociedade informatizada, sociedade do conhecimen-to, sociedade do saber (GENTILI, 1996, p. 31).

    Fala-se no fim do proletariado, das classes sociais e no incio de um cognitariado, em que o conhecimento se tornaria o maior valor no mercado, e a mercadoria definiria as relaes sociais e de trabalho.

    Segundo o pensamento neoliberal, a escola ainda no se deu conta do valor do conhecimento numa socieda-de onde triunfam os melhores, os detentores de maior conhecimento.

    A escola que est a, sobretudo a escola pblica (leia-se tambm universidade), estaria vivendo profunda

    crise, que a torna ineficiente em sua funo de oferecer esta mercadoria, que o conhecimento, s pessoas interessadas, a seus clientes. E esta crise , fundamentalmente, uma crise gerencial. A escola, ento, deveria ser submetida a uma reforma administrativa para se tornar competitiva e ingressar na esfera do mercado.

    F. Hayek publica O Caminho da

    Servido, 1944.

    Milton Friedman (Liberdade de

    Escolhas), Prmio Nobel de

    Economia, 1976.

    Consenso de Washington -

    1990)

    Cognitariado - do verbo latino

    Cognoscere (conhecer) - reduzido ao sentido de

    arquivar informaes.

    21Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • Muda-se, assim, o discurso e as lutas em favor da democratizao da educao, da formao profissional, de sua expanso nas cama-das pobres e miserveis por um discurso da qualidade, de uma quali-dade submetida aos conceitos, aos preceitos, aos critrios e s prticas empresariais. De uma qualidade que tem a pretenso de melhorar os resultados da educao e de seus processos.

    Para isso, o governo necessita estabelecer mecanismos de contro-le e avaliao dos servios educacionais que deveriam estar articulados com as necessidades do mercado de trabalho e a estas subordinados.

    As reformas educacionais, ento, vm caminhando para fazer com que as escolas funcionem como empresas produtoras de servios educacionais para colocar no mercado seus produtos, obedecendo s regras de controle da qualidade e da produtividade.

    Fala-se, ento, de otimizao, de racionalidade, de melhor utilizar os limitados recursos postos disposio dos servios educacio-nais. Desta maneira, no entendimento neoliberal, a educao poderia cumprir sua funo social: ajustar o cliente, o comprador de seus servi-os, s demandas do mundo dos empregos. Teria uma funo de empre-gabilidade (GENTILI, 1996, p. 25). A educao instrumentalizaria o cliente para poder competir no mercado. O resto seria por conta dele, de seu esforo, de seu interesse e de sua capacidade. Voltamos ao discurso da meritocracia: vence aquele que mais se esfora e batalha!

    A educao, ento, no somente posta como subor-dinada aos objetivos e interesses do capital como tambm passa a ser conformada (com a forma) como organizao capitalista do trabalho. neste sentido e direo que se do as discusses e ganham fora reformas no interior do sistema educacional, com as propostas de descentralizao, de gesto, de qualidade total, de re-qualificao do trabalha-dor, de valorizao do magistrio.

    Discurso economicista da Teoria do Capital Humano - to familiar na dcada de 1960 - com nova roupagem.

    O processo produtivo necessita da escola, da educao formal, para preparar o trabalhador? No se trataria de discurso para culpar a escola pela excluso do trabalhador por sua no qualificao, por sua no

    competncia?

    22 Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • FORMAO PROFISSIONAL

    A necessidade de reordenamento do processo de acumulao capitalista tem estimulado a entrada das novas tecnologias microeletrnicas (informtica, mquinas numricas e a robtica) e das novas formas de organizao do trabalho, intensificadas no fim de 1990, diante da com-petitividade internacional e da busca do crescimento econ-mico.

    Se, no antigo modelo taylorista e fordista, eram exigidos do trabalhador atributos escolares e culturais de pouca relevncia, hoje, o novo padro tecnolgico exige sua re-qualificao, seu aperfeioamento profissional, o domnio de novas especificidades. Torna-se imprescindvel o contnuo retreinamento de todos os profissionais, dando sequncia instruo bsica e ao treinamento ocupa-cional (CAMPION, 1995, p. 193).

    Mas, que tipo de qualificao para o trabalho?As rpidas transformaes econmicas requerem

    formao tcnico-cientfica bsica e acesso a um saber universalizante. O novo modelo de produo (toyotismo) chamado por alguns autores de neofordimso e, por outros, de ps-fordismo porque nele ainda permanecem elementos do modelo anterior. um estgio superior de racionalizao do trabalho, sem modificar sua lgica de produo.

    O toyotismo no requer mais um trabalhador roboti-zado, que consiga executar uma sequncia de operaes mecnicas, privilegiando atividades sensrio-concretas. Requer um trabalhador que possa executar atividades de abstrao, com capacidade analtica, que d conta de lingua-gens diversificadas e que possa tomar decises e intervir. Mais do que aprender a fazer, ele deve ser formado para

    aprender a aprender . E isso, de maneira grupal, coletiva, com viso ampla, no fragmentada do processo produtivo. Pretende-se, assim, dirimir a separao entre trabalho intelectual e trabalho manual, e aban-donar a realizao de tarefas individuais, cronometradas, controladas, em que o tempo til era transformado em mercadoria.

    A cooperao, a participao, a responsabilidade, a organizao, a disciplina, a concentrao e a assiduidade so atributos a ser assimila-dos e praticados por este novo tipo de profissional, um novo trabalha-dor, com boa formao geral, com capacidade para perceber um fenme-no em processo, mas atento, leal, responsvel, capaz de tomar decises.

    O fordismo (Henry Ford,

    1863-1947) representa a

    adaptao do taylorismo

    (Frederick W. Taylor, 1856-

    1915) linha de montagem

    voltada para a produo

    standardizada para o consumo

    de massa.

    Trabalhador no mais

    autmato, mas autnomo.

    Em que sentido?

    ToyotismoCriado na fbrica

    da Toyota (Japo), aps a II

    Guerra Mundial. Consolidou-se na

    dcada de 1980.

    23Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • Fala-se, portanto, da necessidade de uma recicla-gem dos trabalhadores em todos os setores, no s na inds-tria como no setor primrio e, especialmente, no tercirio. Isso vem consolidando a ideia de uma educao tcnica e profissional permanente, continuada, de uma educao no restrita escola e educao formal.

    O que voc pensa? Esse tipo de discurso contraditrio? Exclui-se contingente significativo de trabalhadores com a introduo de outras tecnologias na produo, e exigem-se com-petncias para lidar com elas. Mas de quem? Dos que permanecem no trabalho ou dos desemprega-dos? A despecializao, ou a polivalncia do traba-lhador significa requalificao?

    Desapareceria a diviso entre estudo e trabalho.

    (re)Organi-zao do Trabalho noprocesso produtivo

    EducaoObjetivada

    e de Massa

    Racionalidade Econmica

    (Re)qualificao- novas habilidades -

    Figura 1 - (re)organizao do processo produtivo e pedaggico

    - Alta inovao no produto.- Alta variabilidade no processo.- Baixa responsabilidade do trabalho.

    - Baixa inovao no produto.- Baixa variabilidade no processo.- Baixa responsabilidade do trabalhador.

    - Alta inovao no produto.- Alta variabilidade no processo.- Alta responsabilidade do trabalhador.

    NEO-FORDISMO PS-FORDISMO

    FORDISMO

    Reformulao de contedose mtodos

    Formao continuada

    - em servio -

    E D U C A OFormao profissional

    Gerenciamento Novas Tecnologias

    24 Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

    crise

  • Por outro lado, foi constatado, por exemplo, que, na grande maio-ria dos empregos abertos no incio da dcada de 1970, na Europa, prefe-riu-se um tipo de trabalhador desqualificado, a quem seria dispensada at mesmo a prpria fala (LINHARES, 1995).

    Segundo o depoimento de um diretor de recursos humanos de uma indstria brasileira, o grande problema no somente a atualizao tecnolgica, mas o treinamento de pessoal para assimilar novas tecnolo-gias [...] trabalhar o Coeficiente Emocional, e no o Quociente de Inteligncia (CARVALHO, 1997).

    Por isso, vrias empresas deram incio introduo de programas de autoestima, autoconhecimento e motivao, como o Programa Top Performance da Microlite, o Projeto Clulas, da Kibon/Sorvane, etc. Servem para melhorar no s a qualidade dos produtos que fabricam, mas sobretudo o relacionamento do trabalhador com a empresa, dando mais autonomia ao empregado e gratificando-o pela assiduidade.

    A re-qualificao se reveste, ento, de outro sentido, ampliando o ciclo de trabalho, tornando os trabalhadores pluriespecialistas, mas no, necessariamente, mais qualificados. Mesmo no toyotismo, conti-nua a uniformizao no trabalho sob a forma de nova repetitividade do trabalho, de nova organizao do trabalho, porque, tal como no fordis-mo, continua presente o processo geral de racionalizao do trabalho, visando ao lucro.

    Assim, nas dcadas de 1970 e 1980, estava posto o desafio para o Estado e para as empresas: re-qualificar milhes de trabalhadores para atender s exigncias do mercado de trabalho.

    Como fazer isso sem onerar as empresas capitalistas, dado que, segundo o Estado, no havia recursos pblicos suficientes?

    Uma das sadas encontradas foi recorrer modalidade a distncia, oferecendo cursos de re-qualificao em servio.

    1.2 A EDUCAO A DISTNCIA EM EXPANSO: UMA QUESTO DE FUNCIONALIDADE?

    No contexto da crise estrutural do capitalismo, a conjuntura econmica, poltica e tecnolgica tornou favorvel a implementao da EaD. Ela passou a ocupar posio instrumental estratgica para satisfa-zer amplas e diversificadas necessidades de qualificao das pessoas adultas, para conteno de gastos nas reas de servios educacionais e, no mbito ideolgico, para traduzir a crena de que o conhecimento est

    25Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • Na Europa, os governos buscam na educao, numa educao eficiente, de qualidade e barata, o lcus para re-qualificar os trabalha-dores, para que rapidamente possam ser inseridos no mercado de traba-lho, num processo de educao continuada. So oferecidos mais de 700

    disponvel a quem quiser.Se antes existiam muitas resistncias e pr-conceitos quanto

    Educao a Distncia, parece que a atual conjuntura encontrou nesta modalidade uma alternativa economicamente vivel, uma opo s exigncias sociais e pedaggicas, contando com o apoio do avano das novas tecnologias da informao e da comunicao.

    Assim, no final do sculo XX que surgem os grandes sistemas de educao superior a distn-cia, primeiramente na Europa e, em seguida, no Canad, nos Estados Unidos e na Austrlia, para depois se expandirem para todos os pases desenvol-vidos e muitos pases em processo de desenvolvimen-to (GUIMARES, 1997, p. 3).

    O boom da institucionalizao da EaD est relacionado com a crise do Estado assistencialista, nacional e social.

    - a Open University (Inglaterra - 1969), a 1 Universidade Aberta, tem seus cursos reconhecidos internacionalmente;

    - a FernUniversitt de Hagen (Alemanha) atende a milhares de estudantes;

    - a Universidad Nacional de Educacin a Distancia (UNED - 1972), na Espanha, oferece mais de 200 cursos, em nvel superi-or, a mais de 180 mil estudantes;

    - o Centre National d' Enseignement Distance (CNED - 1939), na Frana, oferece mais de 3.000 cursos, para todos os nveis;

    - na Rssia, 2.500.000 estudantes (mais de 40% dos inscritos nas universidades) estudavam na modalidade a distncia antes da ruptura do bloco socialista;

    - em pases como Indonsia, Ir, Coreia, frica do Sul, Tailndia e Turquia, somente para citarmos alguns, foram instaladas universi-dades pblicas para atender a mais de 100 mil estudantes;

    - na China, a televiso cultural universitria, desde 1977, oferece cursos a distncia a mais de 500 mil estudantes;

    - na ndia, a Indira Gandhi National Open University conta com mais de cem mil alunos matriculados;

    - a Austrlia o pas que mais desenvolve programas a distncia, integrados com as universidades presenciais.

    26 Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • programas de diferentes nveis, nos mais variados campos do saber, mas os mais atingidos continuam sendo os adultos (90%) e em nvel superior (29%). Sua presena na formao profissional, porm, j significativa.

    O Parlamento Europeu reconheceu a importncia da EaD para a Comunidade Europeia ao adotar uma Resoluo sobre as Universidades Abertas (10-7-87) e ao desenvolver diversos programas comunitrios, a partir de 1991, utilizando a modalidade da EaD. o caso dos programas Scrates, Leonardo da Vinci e ADAPT (do Fundo Social Europeu).

    No incio da dcada de 1980, segundo a FernUniversitt, da Alemanha, existiam aproximadamente 1.500 instituies, no mundo inteiro, atuando em EaD, atingindo 10 milhes de estudantes ou at o dobro, no entender de alguns estudiosos. Em alguns pases, como a Espanha, mais de 10% da populao adulta estava matriculada em algum curso dentro desta modalidade (apud GARCA ARETIO, 1994, p. 481). Este ndice alcanava os 40% em outros pases, como na Colmbia.

    Metade dessas instituies (50%) eram estatais; trs quartos delas, universidades. Como a grande maioria (88%) no de carter lucrativo, o Estado que praticamente as subvenciona, chegando, em alguns casos, a cobrir at 70% das despesas.

    Mas quais os nveis atingidos via EaD?

    Educao fundamental (crianas 2%, adultos 5%) 7 %Educao mdia (adolescentes 8%, adultos 17%) 2 5 %Educao universitria 2 0 %Cursos de ps-graduao 9%Formao profissional 1 2 %Educao permanente / continuada 2 7 %

    Quadro 1 - Nveis atingidos pela Educao a Distncia

    Fonte: GARCA ARETIO, Lorenzo. Educacin a distancia hoy. Madrid: Uned, 1994, p. 482

    Redes Intercontinentais

    - Consortium International Francophone de Formation Distance (CIFFAD), 1987 - mais de 1.000 instituies de 38 pases;

    - Asociacin Iberoamericana de Educacin Superior a Distancia (AIESAD), 1980 - mais de 50 instituies;

    - International Council for Distance Education (ICDE), 1938 - 100 instituies - 60 pases.

    Quadro 2 - Redes de Educao a Distncia

    27Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • Redes Continentais

    - African Distance Learning Association (ADLA), 1973;- Australian and South Pacific External Studies Association

    (ASPESA), 1972;- Asian Association of Open Universities (AAOU), 1986;- Association of European for Correspondence Schools (AECS), 1985 - mais de 70 Organizaes de 17 pases;

    - European Distance Education Net (EDEN), 1990;- European Association of Distance Teaching Universities (EADTU), 1987;

    - Consorcio-red de Educacin a Distancia (CREAD), 1990.

    Estudos recentes tm comprovado que o crescimento econmico e a competitividade das economias mais avanadas dependem primordi-almente da capacidade para inovar nos produtos e nos processos, e que esta capacidade est assentada num elevado nvel de conhecimentos profissionais dos trabalhadores (ESPANHA, 1995, p. 10).

    Assim, a EaD institucionalizada pelos prprios governos como a modalidade que melhor estaria em condies de cumprir esta tarefa de maneira rpida, atingindo nmero expressivo de trabalhadores, e dentro de uma racionalidade econmica superior modalidade presencial.

    Por outro lado, na frica os programas educativos a distncia ainda so incipientes, em face da limitao de recursos econmicos.

    Na Amrica Latina, h pases tomando a iniciativa de consolida-o e institucionalizao de programas de EaD, como a Universidad Nacional Abierta de Venezuela, a Universidad Estatal a Distancia de

    Redes Nacionais e Estaduais

    - Universidade Virtual do Brasil (UVB), 1999;- Universidade Virtual do Centro-Oeste (UNIVIR), 1999; - Universidade Virtual Pblica do Brasil (Unirede), 2000;- Centro de Educao Superior a Distncia do Rio de Janeiro

    (CEDERJ), 2001;- Sistema Universidade Aberta do Brasil (UAB, 2006);- Rede de Instituies Catlicas de Ensino Superior (www.ricesu.com.br)

    28 Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • Costa Rica e o Sistema de Educacin Abierto y a Distancia de Colombia.

    O Brasil vem desenvolvendo programas em EaD h dcadas, alguns deles muito conhecidos, como oMovimento de Educao de Base (MEB, 1956), projeto Minerva (1970), Logos (1977), Telecurso 2 grau (1978), Mobral (1979), Um Salto para o Futuro (1991), Telecurso 2000 (1995), TV Escola (1996), PROFORMAO (1999).

    Com a criao da Secretaria de Educao a Distncia (1995), o MEC acenou para o caminho da formulao de uma poltica nacional para atender a esta modalidade. Iniciou com os programas TV Escola e o Programa Nacional de Informtica na Educao:

    O Programa TV Escola, com a gerao de trs horas de programao diria, repetida quatro vezes por dia atravs de um canal exclusivo, visa formao e ao aperfeioamento do professor e apoiar seu trabalho em sala de aula. Cerca de 48 mil escolas do ensino funda-mental com mais de 100 alunos esto recebendo as imagens, atravs de um kit tecnolgico. At o final do ano, a previso que cerca de 20 milhes de alunos e um milho de professores sero atingidos (Folha de S. Paulo, 27-11-96. Cotidiano 3, p. 3).

    O Proinfo objetiva promover o desenvolvimento da informtica como instrumento de apoio ao processo ensino-aprendizagem. Sero atingidos os 11 milhes de alunos de 5 a 8 sries e os de ensino mdio. Dispe, inicialmente, de 450 milhes para adquirir 100 mil computadores (25% do previsto para atender a cerca de 15 mil estabelecimentos). Metade do dinheiro vem do Banco Mundial (BIRD) e o restante dos cofres da Unio (OLIVEIRA, 1997, p. 17).

    Em 200l, foi cogitada a criao da primeira Universidade Aberta e a Distncia no Pas. Entretanto, a nosso ver, naquele momento, um siste-ma nacional de EaD no era o melhor caminho para nosso pas. Mais vantajoso e produtivo seria o dual mode system, isto , a EaD estar associada a uma universidade ou instituio convencional. As diferenas culturais, as distncias e os problemas sociais muito melhor podem ser

    29Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • atendidos por iniciativas locais e regionais. As pesquisas realizadas, avaliando os grandes programas em EaD que o MEC desenvolveu ao longo dessas dcadas, vm comprovar a debilidade de tais aes cen-tralizadas, sem uma estrutura de apoio e acompanhamento dos progra-mas in loco.

    Segundo o Centro Internacional de Ensino a Distncia da Univer-sidade das Naes Unidas (ICDL/UNU), as instituies que atuam na EaD podem ser classificadas em trs tipos:

    - aquelas que atuam exclusivamente atravs desta modalidade (como a UNED e a Open University);

    - as instituies tradicionais que tm em seu interior algum Departamento voltado para a EaD (como nos EUA, Austrlia e Brasil);

    - as tradicionais que oferecem cursos a distncia, mas sem uma estrutura e um sistema em EaD implantado em seu interior.

    Houve as tentativas do Consrcio BRASILEAD, em 1998, e da UNIREDE, em 2000, tendentes a criar um rede das instituies pblicas para oferta de cursos a distncia. Porm, sem um apoio institucional efetivo, por parte do MEC, no se consolidaram.

    S recentemente, em 2006, com a criao do Sistema Universida-de Aberta do Brasil (UAB), o MEC daria a largada a esse sonho e expanso da modalidade a distncia no Pas, no ensino superior.

    1.3 FATORES DE EXPANSO E DESAFIOS

    Ao longo do texto fomos expondo, de maneira sucinta, como certos fatores, estruturais e conjunturais, foram favorveis implantao de polticas, sistemas e programas em EaD, impulsionando seu cresci-mento em quase todos os pases do mundo:

    - poltico-social: diante do crescente desemprego ante a intro-duo de mquinas inteligentes e o processo de conteno de despesas, por parte do governo, em quase todos os setores da vida social, buscando estabelecer um Estado mnimo, e ante a desqualificao dos trabalhadores, impunha-se dar nova formao ao trabalhador e criar um consenso de aceitao das duras e amargas medidas econmicas e sociais. Como fazer isso, atingindo rapidamente o maior nmero de trabalhadores?

    30 Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • - econmico: e como dar essa formao sem onerar os cofres pblicos ou das empresas, diante da reduo de investimentos na educao e sem tirar o trabalhador de seu local de trabalho?

    - pedaggico: a escola que est a no atraente, no criativa. Sua estrutura muito fechada e burocratizada um obstculo para o trabalhador. Impe-se uma modalidade mais leve, mais flexvel, que oferea alternativas que correspondam realida-de do trabalhador.

    - tecnolgico: os atuais meios tecnolgicos favorecem pensar em situaes de aprendizagem novas, em que a figura presen-cial do professor, na maioria das vezes, dispensvel ou ele pode interagir no com uma sala de 20 a 30 alunos, mas, sim, com centenas, sem perder o nvel de qualidade dos cursos oferecidos.

    Se esses fatores indicam tendncias positivas para a expanso da EaD, no podemos, diante do quadro de anlise que tentamos esboar no incio do texto e a partir dos fatos e acontecimentos recentes, negar que esses mesmos fatores tambm apontam e indicam tendncias pertur-badoras e desafiantes, cujos reflexos podemos, em parte, senti-los agora, diante da crise que nossa sociedade vivencia.

    luz desses fatores e do atual cenrio, temos pela frente diversos desafios:

    - Desafios no sentido de demonstrarmos nossa capacidade de produzir educao de qualidade, voltada para o trabalhador, que no seja tratada simplesmente como um bem econmico, e o trabalhador como um cliente a quem se deve vender uma mercadoria, um conhecimento, uma habilidade. Devemos trat-la como uma qualificao social, no simplesmente tcnica.

    - A EaD deve ser praticada como outra opo que se prope ao trabalhador para sua qualificao. No pode ser encarada sim-plesmente como substitutivo do sistema educacional que est a, por mais deficiente que esteja operando, pois uma das conquistas histricas do trabalhador, um compromisso e obri-gao do Estado com as classes trabalhadoras. Alimenta-se o discurso da democratizao do conhecimento, ele est a dispo-nvel para todos; cabe a cada um o interesse e o esforo para busc-lo, qualificar-se e, assim, alcanar ou manter o emprego. Fortalece-se com isso a perspectiva da privatizao do ensino, a

    31Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • criao de um mercado educacional sem precedentes.- EaD vem sendo vista por muitos governos como caminho mais

    barato, que atinge rapidamente a um nmero maior de trabalha-dores, sem a devida preocupao com a qualidade da educao oferecida. Ao mesmo tempo, a EaD assumida como estratgia poltica de desmobilizao, pois no haveria necessidade de o trabalhador estar reunido e ter que se encontrar em locais determinados, uma formao sem a presena do educador, mais impessoal. Temos que combater este pragmatismo e esta des-politizao do ato educativo (que poltico em sua essncia), e fazer da EaD um caminho real de socializao de conhecimen-tos, de democratizao dos bens culturais e tcnicos produzidos pela sociedade, de sociabilidade e convivncia, e da formao do cidado, de um cidado solidrio, cooperativo e coletivo.

    - Desafios no sentido de ingressarmos nas novas linguagens de comunicao, mas sem sermos por elas abafados e anulados, pelo encantamento, por uma espcie de canto das sereias. No podemos alijar o trabalhador da sociedade. Temos que aprender a conviver com as novas tecnologias e a desenvolver-nos, como cidados livres e responsveis. Portanto, temos que ousar aprendendo, sem timidez, com o olhar no horizonte, para onde caminha a sociedade, o progresso, mas com os ps calcados em nossa realidade local.

    - Desafios para superarmos a dimenso reprodutivista, da individualidade acrtica favorecida pelo vislumbramento do indivduo diante da modelagem de belas verdades, rumo construo de sujeitos sociais coletivos, mais presentes nos destinos da sociedade.

    PARA CONCLUIR

    claro que o processo de globalizao da economia no vem se dando de maneira igual em todos os pases, nos pases do primeiro mundo e nos demais, assim como os projetos neoliberais de reformas do sistema educacional tm seguido ritmos diferenciados no confronto com as organizaes de classes. Mas no podemos fechar os olhos diante desta realidade, diante das demandas por uma educao diferenciada que instrumentalize o trabalhador, o cidado, a compreender e a superar os novos desafios no campo da produo e da vida poltica e social. Estamos vivendo o incio de novo milnio que vem sendo definido, em diferentes campos, marcando mudanas radicais de paradigmas e de valores.

    Falava-se, no final do sculo XX, em fim da religio, fim da

    32 Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • Para compreender o atual cenrio, necessitamos de instrumental terico, de vises e percepes diferentes das anteriores.

    Voc conhece a metfora da guia e da galinha, contada pelo lder poltico James E. Kwegyir Aggrey (1875-1927), nos incios do sc. XX? Natural de um peque-no pas da frica Ocidental, chamado Costa de Ouro, no litoral do Golfo da Guin, em partes do territrio do atual Gana, lutava pela libertao de seu pas, do domnio ingls.

    Isso ocorreria em 6 de maro de 1957, uma gerao aps, com o lder Kwame N'Krumah.

    Leonardo Boff, o Telogo da Libertao, explorou essa metfora to maravilhosamente em suas obras "A guia e a Galinha: uma metfora da condio humana" e "O despertar da guia: o dia-blico e o sim-blico na construo da realidade" (Ed. Vozes, 1998 ).

    Precisamos deixar a cerca segura do galinheiro, da proteo e dos cuidados do outro, da firmeza dos ps no cho. Procurar fortalecer

    cincia, fim da Histria, etc. No se trata de fins, mas de rupturas que descortinam horizontes novos, que abrem espaos para a construo de um novo tipo de homem e de sociedade para o terceiro milnio.

    Devemos, pois, continuar sonhando e buscar realizar a utopia de uma sociedade mais justa, em que a educa-o, a formao e os conhecimentos sejam realmente um bem de todos, e no de minorias. A EaD tem essa potencialidade, facultando a milhes de excludos realizar tambm seus sonhos e utopias.

    BATISTA, Wagner Braga. Educao a Distncia e o refinamento da excluso social. Revista Conect@, n. 4, fev. 2002. Disponvel em: www.conecta.com.br

    BELLONI, Maria Luiza. Educao a Distncia. Campinas: Autores Associados, 1999. Cap. I - "Os paradigmas econmicos: contribui-o para a Educao a Distncia".

    PRETI, Oreste. A Formao do professor na modalidade a distncia: (des)construindo metanarrativas e metforas. Revista Brasileira de Estudos Pedaggico. Braslia, v. 82, n. 200/2001/2002, p. 26-39, set. 2003. Disponvel no site: www.nead.ufmt.br (Produo Cientfica).

    SABER M

    Disponvel em www.

    leonardoboff.com (1997)

    33Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • nossas asas e voar como guia, recuperando nossa identidade e fora. L do alto poderemos descortinar o horizonte e ter viso contextualizada da realidade. Precisamos, portanto, de asas firmes e abertas que nos impulsionem para este vo.

    Necessitamos, momentaneamente, nos afastar da imediatez e da pragmaticidade de nossas aes, da rotina do dia a dia da vida domstica e profissional, da "tirania dos fatos" (como diz Pedro Demo), para melhor observar nossa vida, nossas prticas profissionais, repensar sobre elas numa atitude questionadora. Poderemos, assim, retornar a elas com outra postura e compreenso para uma interveno crtica e transformadora.

    Na prxima unidade, ento, iremos abordar alguns dos referenci-ais que fundamentam a EaD, que podem contribuir para esse vo de guia e impulsionar reviso e mudanas em nossas prticas.

    34 Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • EM CONSTRUO NA EaDBASES TERICAS

    UNIDADE 2

  • Nesta unidade, iremos tratar de algumas questes que, geralmente, as pessoas nos endeream quando falamos sobre Educao a Distncia:

    A EaD uma metodologia, uma modalidade, o que ?- Por que o uso de terminologias diferentes para se referir EaD?- Por que a adjetivao a distncia? - Hoje, com o desenvolvimento das tecnologias da

    comunicao, que rompem com a clssica concepo mecanicista de tempo e espao, faz sentido falar em distncia?

    Muitos anos atrs, quando se ouvia falar em educao a distncia, pensava-se em algum num lugar bem distante, numa casa de madeira, estudando luz de lampio. Mais recentemente, passou-se a pensar em algum diante da televiso, com livro, caderno e lpis, assistindo a cursos veiculados por mgicas parablicas, ou a um jovem embevecido diante de uma tela de computador acompanhando cursos on-line, pela internet, participando de salas de bate-papo, enviando e recebendo correio eletr-nico, etc.

    E hoje?

    Vejamos algumas possveis atitudes.

    - Aludir Educao a Distncia, opondo-a em relao educa-o presencial, sala de aula ou a partir do que ela no ;

    - entronizar a EaD porque permitiria, mediante o uso das novas tecnologias, a ampliao do acesso escola, democratizao do conhecimento, possibilitando "ensinar tudo a todos" (como j propunha Comnius, em sua obra Didtica Magna, em 1657);

    - execrar, repudiar a EaD, sustentando tratar-se de educao de terceira categoria, supletiva, no capaz de qualificar e formar adequadamente o cidado;

    - pr nfase na organizao do sistema de Educao a Distncia, com seus subsistemas (comunicao, tutoria, produo de material didtico, gerenciamento), e no nos processos de ensino e de aprendizagem e de formao para a vida.

    - assentar o foco em sua possibilidade de estabelecer o dilogo

    37Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

    O que voc pensa sobre tudo isso?

  • entre educadores e educandos, embora separados no tempo e no espao; de promover processos de aprendizagem autnoma, independente, respeitando os ritmos particulares de cada apren-dente; de desenvolver prticas mais interativas e menos objeti-vadas que o ensino presencial.

    Afinal, o que Educao a Distncia?Apresenta caractersticas que a diferenciam de

    outras modalidades de ensino?

    32.1 CONCEITUAES E CARACTERSTICAS

    Falar em educao a distncia , antes de tudo, ingressar no campo polissmico da educao, tratar de conceituaes e prticas diferenciadas. Vamos, inicialmente, tratar do termo "educao e, em seguida, de "educao a distncia".

    Por que privilegiamos o termo "educao" a outras terminologias a que recorrem as instituies de ensino, adotadas por tericos da educa-o, tais como ensino, treinamento, aprendizagem e formao?

    - Ensino - Representa instruo, reproduo, socializao da informao, transmisso de conhecimento, adestramento - de onde vem a palavra "maestro", j que adestrado significa ensi-nado ou amestrado, conduzido pelo lado direito, isto , destro -.

    um termo mais restrito ao processo ensinar x aprender, em que algum sabe (quem ensina) e o outro no sabe (quem aprende). A nfase recai no aparato institucional e tecnolgico para que determinado pacote de conhecimentos seja transmitido e assimilado pelo aluno.

    - Treinamento - H autores que falam em treinamento, sobretudo quando se referem a cursos voltados para o campo empresarial, em que a preocupao central melhorar o desempenho do trabalhador, "agregando valor para a empresa" (NISKIER, 1999, p. 40-1), como os cursos e-learning.

    3. Parte deste texto foi retirado de: PRETI, Oreste. Educao a Distncia: uma prtica educativa mediadora e mediatizada. In: PRETI, O. (Org.). Educao a Distncia: incios e indcios de um percurso. Cuiab: NEAD, EdUFMT, 1996, p. 25-32; e de: ________. Educao a Distncia e/ou Educao Aberta. In: UNIREDE. Fundamentos e Polticas de Educao e seus reflexos na Educao a Distncia. Curitiba: UFPR, 2000, p. 81-94.

    Insignare (lat.): gravar um

    sinal, colocar signos,

    depositar informaes.

    38 Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • - Aprendizagem - O termo desloca o eixo do sujeito ou da insti-tuio que ensina para o sujeito que aprende, tornando-se este o centro do processo de aprendizagem. H um deslocamento de foco de um polo (o professor) para outro polo (o aprendente) da relao. Por isso, para superar novamente esta dicotomizao, h autores que sugerem o termo "aprendncia".

    - Formao - Em sua base etimolgica, embute a ideia de uma "frma", de uma estrutura j ordenada, planejada e disponibili-zada. Nela se depositaria determinado saber, ou prticas espec-ficas. Voltada para preparao especializada em tarefas defini-das pelo mercado, ou para formao parcelar e seletiva, estimu-lada pelo taylorismo e sustentada na teoria do "capital humano" (ex.: a formao para o trabalho).

    Deixa, porm, espao para uma possvel "ao", uma interveno e participao do sujeito "em-forma-ao". Segun-do Demo (1998), numa perspectiva construtivista, "formar formar-se". Tratar-se-ia de processo autofomativo, educativo e libertrio.

    - Educao - Em sua etimologia (de educare: criar, alimentar; ou de educere: conduzir para fora), indica uma ao para fora da "forma", uma relao muito particular, muito ntima e afetiva entre educador e educando, ambos se influenciando e se trans-formando.

    No dizer de Sanviens (1985), abarca "toda trama social e poltica [...] implica a educao como atividade e como processo interativo de heteroeducao e de autoeducao". Por isso, apresenta-se como sistema aberto, dinmico, interacionis-ta e (auto)organizador em que a educao determinada pelos fatos, pelo seu entorno e, por sua vez, acaba por afet-los:

    Quando estamos falando de educao, estamos nos referindo a todos os aspectos da vida que ela enfeixa nas relaes pessoais, sociais, polticas, com a natureza e com o entorno. Est imiscuda, misturada e diluda em tudo. parte do todo, o todo (PRETI, 1998, p. 20).

    Trata-se de "estratgia bsica de formao humana, aprender a aprender, saber pensar, criar, inovar, construir conhecimentos, participar de, etc." (MAROTO, 1995), do processo de constituio histrica do sujeito, atravs do qual se torna capaz de projeto prprio de vida e de

    39Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • Por isso, quando aludimos Educao a Distncia, no devemos centrar nosso foco na "distncia", e sim nos processos formativos, na educao, fazendo recurso a abordagens contextualizadas, situadas, crticas e libertadoras da educao.

    sociedade, em sentido individual e coletivo (DEMO, 1998, p. 19). Em sntese, processo (re)contrutivo, dialgico, humano e criador.

    No entender de N. J. Machado (1997 apud OLIVEIRA, 2002, p. 99), somente h educao no contexto da proximidade, seja ela ideol-gica, seja afetiva, seja conceitual, no precisando ser necessariamente geogrfica.

    EDUCAO A DISTNCIA

    No campo desta modalidade, tambm, emergem variadas termi-nologias para caracteriz-la e explic-la:

    estudo por correspondncia (Reino Unido)estudo em casa (Estados Unidos)estudos externos (Austrlia)ensino a distncia (Open University)tl-enseignement (Frana)educacin a distancia (Espanha)istruzione a distanza (Itlia)teleducao (Portugal)

    As expresses Ensino a Distncia e Educao a Distncia, mais 4usuais no Brasil, j eram utilizadas na Alemanha na dcada de 1960 , em

    substituio expresso "estudo por correspondncia", em uso durante 5mais de um sculo . Inicialmente, foram empregadas e divulgadas pelo

    fernstudium e fernunterricht (Alemanha)

    4. Em 1967, foi fundado o Deutches Institut fr Fernstudien / DIFE (Instituto Alemo de Educao a Distncia).

    5. Em 20 de maro de 1728, na Gazeta de Boston, aparecia um anncio oferecendo material de ensino e tutoria por correspondncia. Em 1840, foi criada, no Reino Unido, a primeira escola de ensino por correspondncia: Sir Isaac Pitman Correspondence College. Em 1858, a Universidade de Londres outorgava ttulos a estudantes externos que recebiam ensino por correspondncia. Esses cursos, que se expandiram em pases anglo-saxnicos e nrdicos, em sua maioria se destinavam ao ensino bsico e tcnico.

    40 Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

    Estudo/educaoa distncia.

  • sueco Brje Holmberg. O ingls Desmond Keegan e Charles A. Wedemeyer (1966) a

    introduziram no mundo anglo-saxnico, a partir da criao da Open University (Universidade Aberta), em 1969 (GARCA ARETIO, 1994, p. 28-9; NISKIER, 1999, p. 53).

    O que se entende por Ensino ou Educao a Distncia?

    No h unanimidade. Garca Aretio, em sua obra Educao a Distancia Hoy (1994), lista mais de 20 definies. Vejamos algumas delas:

    O ensino/educao a distncia um mtodo de trans-mitir conhecimentos, habilidades e atitudes, racionali-zando, mediante a aplicao da diviso do trabalho e de princpios organizacionais, assim como o uso extensivo dos meios tcnicos, especialmente para o objetivo de reproduzir material de ensino de alta qualidade, o que torna possvel instruir grande nme-ro de alunos ao mesmo tempo e onde quer que vivam. uma forma industrial de ensinar e aprender (Otto Peters, 1983).

    Educao a Distncia uma modalidade mediante a qual se transferem informaes cognitivas e mensa-gens formativas atravs de vias que no requerem uma relao de contiguidade presencial em recintos deter-minados (Victor Gudez, 1984). Educao a Distncia um sistema multimdia de comunicao bidirecional com o aluno afastado do centro docente e ajudado por uma organizao de apoio para atender de modo flexvel aprendizagem de uma populao numerosa e dispersa. Este sistema somente se configura com recursos tecnolgicos que permitam economia de escala (Ricardo Marin Ibaez, 1986).

    Metodologia de ensino em que as tarefas docentes ocorrem em um contexto distinto das discentes, de

    41Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • modo que estas so, em relao s primeiras, diferen-tes no tempo e no espao ou em ambas as dimenses ao mesmo tempo (Jaime Sarramona, 1991).Um sistema tecnolgico de comunicao bidirecional que pode atingir massas e que substitui a interao pessoal na sala de aula entre professor e aluno como meio preferencial de ensino pela ao sistemtica e conjunta de diversos recursos didticos e o apoio de uma organizao e tutoria que propiciam uma apren-dizagem independente e flexvel (Lorenzo Garca Aretio, 1995).

    Encontramos, mais recentemente, a conceituao de Michael Moore (1996), consultor do Banco Mundial no campo da educao, e que assessorou a introduo do programa ProFormao, aqui no Brasil:

    Educao a Distncia aprendizagem planejada que geralmente ocorre num lugar diferente do ensino e, por causa disso, requer tcnicas especiais de desenho de cursos, tcnicas especiais de instruo, mtodos espe-ciais de comunicao atravs da eletrnica e outras tecnologias, bem como arranjos essenciais organizaci-onais e administrativos.

    Segundo Maria Luiza Belloni (1996),

    com exceo da definio de Peters, que aplica EaD o "paradigma" econmico elaborado para descrever o processo de produo industrial de um perodo do capitalismo (fordismo), as definies [...] so de modo geral descritivas e definem EaD pelo que ela no , ou seja, a partir da perspectiva convencional da sala de aula.

    H nfase nos "processos de ensino", na estrutura organizacional

    do sistema e seus subsistemas.No Decreto 2.494/98, que regulamenta o art. 80 da LDB

    9.394/96, encontramos a seguinte definio:

    Educao a Distncia uma forma de ensino que possibilita a auto-aprendizagem, com a mediao de recursos didticos sistematicamente organizados,

    42 Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • apresentados em diferentes suportes de informao, utilizados isoladamente ou combinados e veiculados pelos diversos meios de comunicao.

    Maria Lcia C. Neder (2000), ao analisar, igualmente, as diferen-tes definies mais em uso na literatura especializada, pondera que a EaD vista como:

    a-sistema de comunicao bidirecional;b-recursos para proporcionar instruo;c-modalidade alternativa de ensino;d-sistema tecnolgico de comunicao para massas

    e bidirecional;e-modelo pedaggico;f- prtica educativa mediatizada;g-forma pedaggica;h-modalidade alternativa de educao;i- meio para o ensino; ej- educao alternativa.

    Segundo a autora, a EaD compreendida como "meio", como "forma" de possibilitar o ensino ou como possibilidade de evoluo do sistema educativo, seja porque permite ampliao de acesso escola e atendimento a adultos, seja porque faculta o uso de novas tecnologias de comunicao.

    Critica essas concepes porque, os autores ao incorporarem contribuies das teorias funcionalistas e estruturalistas, dissociam a educao a distncia, considerada objetivada, da educao como prtica social, destituindo desta ltima as caractersticas que apontam como exclusivas da EaD.

    No Relatrio da Comisso Assessora para Educao Superior a Distncia (ago. 2002), que propunha alterao das normas que regula-mentam a oferta EaD no nvel superior, compreendida como

    atividade pedaggica que caracterizada por um processo de ensino-aprendizagem realizado com mediao docente e a utilizao de recursos didticos sistematicamente organizados, apresentados em diferentes suportes tecnolgicos de informao e comunicao, os quais podem ser utilizados de forma isolada ou combinadamente, sem a frequncia obriga-

    43Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • tria de alunos e professores, nos termos do artigo 47, 3, da LDB.

    Porm, o Decreto n. 5.622, de 19 de dezembro de 2005, que deu nova regulamentao ao art. 80 da Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996, definiu assim a EaD, no art. 1 :

    modalidade educacional na qual a mediao didtico-pedaggica nos processos de ensino e aprendizagem ocorre com a utilizao de meios e tecnologias de informao e comunicao, com estudantes e profes-sores desenvolvendo atividades educativas em lugares ou tempos diversos.

    Em nosso entender, nas definies pe-se nfase, em demasia, ou na estrutura organizacional do sistema e de seus subsistemas, ou nos meios tecnolgicos, e menos nos processos de ensino e de aprendizagem.

    Afinal, como podemos compreender Educao a Distncia?

    EaD

    - como processo de aprendizagem centrado na relao sujeito que aprende e sujeito que ensina, isto :

    - o sujeito aprendente, com capacidade de autonomia relativa (intelectual e moral) e de gerir sua formao;

    - em interao com professores, orientadores/tutores, colegas;- processo mediatizado por um conjunto de recursos didticos e

    tecnolgicos acessveis ao estudante;- apoiado por uma instituio ensinante que lhe oferece todo tipo

    de suporte (do cognitivo ao afetivo), para que se realize a mediao pedaggica, a interao e a intersubjetividade;

    - processo este que se realiza presencialmente e/ou a distncia.

    Deve ter percebido que, ao compreender EaD dessa maneira, em muito pouco ela se diferencia da modalidade presencial. Trata-se, fundamentalmente, de fazer educao, de processo de ensinar e de aprender que pode ser realizado das mais diferentes maneiras!

    44 Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • Faz parte de nossa formao metafsica e apriorista buscar com-preender a realidade com base em definies, tentar nomear uma situa-o nova, fazer o confronto disso com aquilo, enquadrar a realidade dentro de um referencial explicativo nico e racional. isto ou aquilo. Parece que, a partir da definio (Educao a Distncia ), a realidade mais facilmente se torna compreensvel e pode ser apanhada em suas dimenses e caractersticas.

    Podemos, porm, em lugar de seguir este caminho e tentar esco-lher uma entre tantas definies, quando no oferecer ainda outra concei-tuao, que sempre apresentar suas limitaes, no dando conta de incluir todos os aspectos relativos ao complexo e dialtico processo educativo "a distncia", apontar algumas de suas caractersticas funda-mentais:

    - Educando e educadores esto separados pelo tempo e/ou espao;- H um canal, ou melhor, canais que viabilizam a interao

    (canais humanos) e/ou a interatividade (canais tecnolgicos) entre educadores e educandos. Trata-se, portanto, de processo mediado e "mediatizado", construindo outros sentidos aos conceitos de tempo, espao, presencialidade e distncia;

    - H uma estrutura organizacional complexa a servio do edu-cando: um sistema de EaD como rede integrando comunicao, orientao acadmica (tutoria), produo de material didtico, gesto, avaliao, etc.;

    - A aprendizagem processo de construo, que se d de forma independente, individualizada, autnoma e, ao mesmo tempo, de forma coletiva, por meio de interaes sociais (com os cole-gas do curso, os orientadores acadmicos, os professores, os autores do material didtico).

    Desde 1992, temos proposto a utilizao da expresso orientador acadmico em substituio a tutor. Trata-se de opo epistemol-gica, pois, numa perspectiva interacionista, a aprendizagem se d na relao dialgica e de trocas entre educador e educando, no caben-do a idia de submisso ou de tutela, ainda mais quando tratamos com adultos!

    Por outro lado, fica subentendido que esta modalidade nem sempre est adequada a todos os segmentos da populao, pois exige motivao, maturidade, autodisciplina para que o resultado seja satisfa-

    45Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • trio. Existem experincias realizadas com crianas e jovens adolescen-tes que foram mal-sucedidas. Por isso, essa modalidade est muito mais voltada para atendimento da populao adulta.

    Ao longo do texto, ao nos referirmos Ead, diversas vezes a mencionamos tambm de Educao Aberta e a Distncia. Por qu?

    EDUCAO ABERTA E A DISTNCIA

    Diante dos novos processos econmicos e tecnolgicos que expandem as relaes sociais e de produo para alm dos limites do local, das fronteiras nacionais, fortalece-se a concepo de uma educa-o contnua e permanente que possa ser oferecida, pelas instituies educativas, de forma aberta, sem restrio, excluso ou privilgios.

    Mas o que uma "Educao Aberta"?Esta expresso foi utilizada, inicialmente, pela Open University

    da Inglaterra (que antes se denominava de University of Air), indicando:- a falta de requisitos na inscrio de estudantes. No h restri-

    es, a inscrio livre e aberta a quem quiser se matricular em qualquer curso;

    - a ausncia de um cmpus universitrio;- a utilizao de todos os meios de comunicao para educar:

    mtodos livres e variados modos de aprender;- o acesso a diferentes teorias e doutrinas.

    A bem dizer, era posta em oposio a um ensino fechado, reducio-nista, exclusivista e de privilgios.

    Segundo Garca Aretio (1994), o que mais se acentua no adjetivo "aberto" a ausncia de requisitos para o ingresso dos estudantes. So poucas as instituies de EaD que se caracterizam como "abertas".

    Armando R. Trindade, que participou do projeto de implantao e consolidao da Universidade Aberta de Portugal (1988), explicita-nos sua compreenso:

    Aprendizagem aberta tem, essencialmente, dois signi-ficados: de um lado, refere-se aos critrios de acesso aos sistemas educativos ("aberta" como equivalente da ideia de remover barreiras ao livre acesso educao e ao treinamento); de outro lado, significa que o proces-so de aprendizagem deve ser, do ponto de vista do estudante, livre no tempo, no espao e no ritmo (time-free, place-free, space-free). Ambos os significados esto ligados com uma filosofia educacional que

    46 Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • identifica abertura com aprendizagem centrada no estudante (apud BELLONI, 1999, p. 30).

    Em nosso entender, essa segunda caracterstica prpria da Educao a Distncia em geral. Talvez Trindade queira chamar a ateno menos sobre o "acesso" ao sistema educacional e muito mais sobre os "processos de aprendizagem", sobre a flexibilidade do ensino a distncia.

    EaD e AAA EaD diz respeito mais a uma modalidade de educao e a seus aspectos institucionais e operacionais, referindo-se, principalmen-te, aos sistemas "ensinantes; enquanto AA [Aprendizagem Aberta] se relaciona sobretudo com modos de acesso e com meto-dologias e estratgias de ensino e aprendizagem, ou seja, enfoca as relaes entre os sistemas de ensino e os aprendentes (BELLONI, 1999, p. 32).

    So diferenciaes que, na prtica educativa a distncia, pelo menos em nossa experincia no curso de Licenciatura na modalidade a distncia da Universidade Federal de Mato Grosso, no ocorrem.

    Quando se pensa numa ao concreta, concebe-se e se implemen-ta um sistema, uma rede de encontros em que no se faz esta separao. Pensa-se tanto na estrutura organizacional como no aprendente, para

    6apoi-lo em seu percurso de autoaprendizagem .Niskier (1999), ao referir-se ao modelo das chamadas universida-

    des comunitrias, muito numerosas nos Estados Unidos da Amrica, prope uma terminologia que nos agrada muito: Universidade de Porta Aberta.

    Trata-se de educao aberta, no somente no sentido do acesso ao conhecimento por parte do cidado adulto, mas, sobretudo, porque a comunidade tem como avaliar essa educao. Pois a universidade comu-nitria marca presena nos diferentes espaos geogrficos, disponibiliza material e programas, atende a demandas especficas, e seus resultados podem ser mais rapidamente percebidos e avaliados.

    6. Autoaprendizagem, na realidade, retrata redundncia, pois um processo de aprendiza-gem no ocorre sem autoaprendizagem, isto , sem a participao ativa do aprendente; seno seria domesticao, transmisso, inculcao de contedo; tudo, menos aprendizagem.

    47Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • E "a distncia"?

    Diante da introduo macia das novas tecnologias da comunicao que pem os homens em contato, independentemente do espao geogrfico e com rapidez cada vez mais surpreendente, faz sentido se referir ao termo "distncia" em sua acepo original e restrita?

    Alguns educadores vm repensando esta adjetivao e sugerindo outras: "no presencial", "virtual", "mediada por meios eletrnicos".

    No seria melhor descartar qualquer adjetivao e falar somente de educao?

    CARACTERSTICAS

    As diferentes concepes apresentadas apontam tambm, em seu interior, algumas caractersticas que seriam especficas da EaD, dife-renciando-a da modalidade presencial.

    Vejamos algumas delas:

    - distncia fsica professor-aprendente: a ausncia fsica do professor, isto do interlocutor, da pessoa com quem o estudan-te vai dialogar, no impeditiva para que se d a aprendizagem. O dilogo pode ocorrer de outras maneiras, sincronicamente (utilizando telefone, chat, udio, web/videoconferncias, etc.) e/ou assincronicamente (correio eletrnico, lista de discusso, frum, etc.);

    - estudo individualizado e independente: reconhece-se e se desenvolve a capacidade de o estudante construir seu caminho, de se tornar autodidata; de ser autor de suas prticas e reflexes;

    - processo de ensino e aprendizagem mediado e mediatizado: a EaD deve oferecer suporte e estruturar um sistema que viabilize e incentive a autonomia dos estudantes no processo de aprendi-zagem. E isso se d por meio da interao e do tratamento dado ao contedo e formas de expresso mediatizados pelo material didtico, meios tecnolgicos, sistema de tutoria e de avaliao (MAROTO, 1995);

    - uso de tecnologias: os recursos tcnicos de comunicao, que hoje tm alcanado avano espetacular, permitem romper com as barreiras das distncias, das dificuldades de acesso educa-o e dos problemas de aprendizagem por parte dos aprendentes que, embora estudem individualmente, no esto isolados e

    Sncrono:dialogar na

    mesma hora; asscrono:

    em tempos diferentes.

    48 Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • sozinhos. Oferecem possibilidades de estimular e motivar o estudante, de armazenar e divulgar dados, de dar acesso s informaes mais distantes e com uma rapidez incrvel, de um trabalho cooperativo/colaborativo;

    - comunicao multidirecional: o estudante no mero receptor de informaes, de mensagens; apesar da distncia, busca-se estabelecer relaes dialogais, criativas, crticas e participati-vas entre aprendentes, entre professores e aprendentes e entre as diferentes equipes envolvidas no curso a distncia;

    - abertura: uma diversidade e amplitude de oferta de cursos, com a eliminao do maior nmero de barreira e requisitos de aces-so, atendendo a uma populao numerosa e dispersa, com nveis e estilos de aprendizagem diferenciados, para atender complexidade da sociedade moderna;

    - flexibilidade (plasticidade): de espao, de assistncia e tempo, de ritmos de aprendizagem, com distintos itinerrios formati-vos que permitam diferentes entradas e sadas e a combinao trabalho/estudo/famlia, favorecendo, assim, a permanncia em seu entorno familiar e profissional;

    - adaptao: atendendo s caractersticas psicopedaggicas dos aprendentes que so adultos, oferecendo-lhes atendimento personalizado;

    - efetividade: o estudante, estimulado a se tornar sujeito de sua aprendizagem, a aplicar o que est apreendendo e a se autoava-liar, recebe um suporte pedaggico, administrativo, cognitivo e afetivo, por meio da integrao dos meios e de comunicao multidirecional;

    - formao permanente: h grande demanda, no campo profissi-onal e pessoal, para dar continuidade formao recebida formalmente e para adquirir novas atitudes, valores, interes-ses, etc.

    - a economia: evita o deslocamento, o abandono do local de trabalho, o desgaste fsico, a perda de tempo; favorece o atendi-mento a um nmero maior e diferenciado de estudantes; cursos mais baratos somente quando numa economia de escala.

    Procedimento efetivo - que

    produz resultados

    sociais

    O fundamental da EaD estaria na relao educativa entre o estudan-te e o professor (que pode ser o especialista ou o orientador acad-mico/tutor), mediatizada por diferentes meios, podendo se reali-zar em momentos e lugares diferentes, fazendo uso de uma organi-zao de apoio.

    49Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • A EaD , pois, uma prtica pedaggica de grande alcance, que deve utilizar e incorporar as novas tecnologias como meio para alcanar os objetivos das prticas educativas implementadas, tendo sempre em vista as concepes de homem e sociedade assumidas, considerando as necessidades das populaes a que se pretende servir.

    A EaD se apresenta, ento, como um conjunto de mtodos, tcni-cas e recursos, postos disposio de populao estudantil dotada de um mnimo de maturidade e de motivao suficiente, para que, em regime de (auto)aprendizagem, possa adquirir conhecimento ou qualificao em qualquer nvel.

    A EaD cobre distintas formas de ensino e de aprendizagem em mbito que no tenha a contnua superviso imediata de professores presentes com seus aprendentes na sala de aula, que, no entanto, se bene-ficiam do planejamento, guia, acompanhamento e avaliao de uma organizao educacional, de uma instituio ensinante.

    Portanto, a EaD no deve ser confundida com seu aparato instru-mental e tecnolgico ou ser sinnimo de ensino eletrnico. Ela envolve muito mais do que administrar recursos humanos e tecnolgicos. Ela precisa ser ancorada em projeto poltico-pedaggico, sobre bases episte-molgicas claras e comungadas pela instituio ensinante.

    Em suma, a Educao a Distncia pode ser compreendida como:

    uma prtica social situada, mediada e mediatizada, uma modalidade de fazer educao, de democratizar o conhecimento, de disponibilizar mais uma opo aos sujeitos da ao educativa, fazendo recurso das tecnologias que lhes so acessveis.

    As diferentes terminologias, conceituaes e caractersticas da EaD, aqui apresentadas brevemente, emergem de bases epistemolgicas de como se d o processo de compreenso de mundo e de relaes sujei-to-objeto, professor-aprendente, etc. e que do sustentao a toda e qualquer prtica educativa.

    Por isso importante que abandonemos o debate sobre as especificidades da EaD (se que existem!) para retomarmos um pouco as discusses e estudos sobre os fundamentos da educao, os diferentes caminhos de construo da teoria e da prtica educativa, da prxis pedaggica e social.

    Porm, faremos um recorte nesta discusso, analisando o proces-so de ensino e de aprendizagem, a relao professor-aprendente e orien-tador-aprendente.

    50 Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • 2.2 BASES EPISTEMOLGICAS

    Entre os possveis caminhos traados ao longo do processo mile-nar da humanidade na construo de seu conhecimento, de sua viso de mundo, privilegiaremos trs deles: o empirismo, o inatismo e o interacio-nismo, por serem aqueles que mais influenciaram o pensamento e a prtica pedaggica na modernidade.

    EMPIRISMO

    Parte-se do pressuposto que existem "leis" na natureza que deter-minam o comportamento dos fenmenos, parecida com o funcionamen-to de um relgio, de uma mquina, com uma engrenagem sincronizada, seguindo movimentos regulares.

    Segundo essa viso, a mente humana vai assimi-lando as experincias e preenchendo seu vazio. Na mente, as impresses sensveis se vo depositando, transforman-do-se, depois, por meio de determinados processos men-tais, em conceitos e ideias gerais. O conhecimento se daria, assim, fundamentalmente, na leitura da realidade pelos sentidos, partiria de uma ao sobre o objeto.

    Essa maneira de conceber o processo de produo do conheci-mento influenciou as teorias psicolgicas e pedaggicas, sobretudo no ltimo sculo.

    O processo de ensinar e aprender centrado na figura do professor. Cabe a ele o papel de repassar o conhe-cimento acumulado ao longo dos tempos pela sociedade e fazer com que o aluno passe a "dominar" determinado contedo tido como vlido e correto para qualquer sociedade em qualquer fase de sua histria.

    papel, ento, do professor organizar esse contedo e definir as estratgias mais eficazes para que o aluno os internalize. Aqui predomi-nam as atividades da cpia, da repetio, da memorizao, do acmulo de informaes isoladas, o no questionamento, a submisso autorida-de do professor, etc. Trata-se muito mais de instruir, ensinar e treinar do que formar e educar.

    A organizao do trabalho pedaggico definida e controlada de cima para baixo: a instituio (Ministrio da Educao e/ou secretarias de educao) decide o que fazer e como. Esse "modelo" organizacional reproduzido pela direo na escola e pelo professor na sala de aula.

    Conhecer: fazer cpia mental da realidade;captar algo vindo do meio externo.

    Conhecimento como mercadoria.

    51Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • Professor/instituio Aluno "doador", tem a verdade "receptor", sujeito passivo

    transmisso, autoridade repetio, submissoCabe ao professor ensinar, ao aluno aprender.

    E na EaD? H instituies que se utilizam de uma forma "industrializada de ensino", oferecendo "pacotes instrucionais", fundamentados nas teorias comportamenta-listas (neobehavioristas e tecnicistas, de base estmulo-resposta, com material autoinstrucional). Seu objetivo

    treinar os cursistas (desenvolvendo habilidades tcnicas) ou instrui-los (oferecendo um volume de informaes).

    - O estudante considerado (no incio do curso) a matria-prima a ser trabalhada, qualificada;

    - o professor (muitas vezes substitudo pelo tutor) como o trabalhador numa linha de montagem, seguindo as orien-taes recebidas (manuais, guias, monitoramentos). O autor do material didtico chamado de conteudista;

    - as tecnologias como as ferramentas, o currculo como o plano de modelagem e o aluno formado (ao final do curso) como o produto!

    J ouviu falar em cursos "e-learning", em cursos "mediados eletronicamente"? Seria interessante que voc pudesse analisar um deles e tirar suas prprias concluses.

    Instruo Programada;

    virtualizao de cursos

    tradicionais

    Aprendizado just-in-time:

    entrega rpida e ligada s demandas.

    Seria mais apropriado falar

    em e-teaching.

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    52 Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • INATISMO

    Ao contrrio do que sustenta o empirismo, mediante a razo que se descobrem os princpios gerais sobre a realidade e que estes sero confirmados ou no mediante o conhecimento de fatos particulares. Pois, os homens, ao nascerem, seriam agraciados por Deus que lhes confere ideias inatas (inatismo), ideias "a priori" (apriorismo). Por meio de um processo mental (da razo, racionalismo), partindo de teorias e leis, na maioria das vezes teramos a capacidade e a possibilidade de fazer predi-o sobre a ocorrncia de fenmenos particulares. O conhecimento, portanto, seria intelectual, provindo das ideias, e no da experincia.

    H um rejeio da informao sensorial (por ser limitada e sujeita ao "engano") e um privilegiamento da razo (por ser precisa e rigorosa) como caminho para se chegar ao conhecimento. Pois, o homem, ao nascer, traria consigo, determinado "pacote de conhecimentos" (herana genttica ou "ddiva divina") que poder ser aberto e atualizado se lhe forem oferecidas as condies apropriadas.

    No processo de aprendizagem, o foco central passa ser o aluno, por sua capacidade inata de apreender. Cabe ao sujeito, de sua respon-sabilidade a aprendizagem ou no; s exercitar. A instituio, a escola ou o professor tm como funo criar condies para despertar e apoiar o que o aluno j tem dentro dele.

    Aluno Professor traz um saber "facilitador", motivador,

    animadoraprende por si mesmo intervm o menos possvel

    Ningum ensina ningum.

    Na EaD, desenvolveu-se uma espcie de mito na "independncia intelectual" do estudante, em sua capacidade autodidtica (muitas vezes nomeada equivocadamente de autonomia), em saber estudar sozinho, no necessitando da presena de outrem.

    Divulga-se esta crena: quanto menos o cursista recorrer ao auxlio do professor ou do tutor, melhor. Isso significaria que o curso foi bem planejado e que o estudante confia em si mesmo, em suas capa-cidades e que o material de ensino autodidtico.

    Por isso, a troca, o dilogo com o outro, o sentido de cooperao e construo coletiva no so estimulados. O individualismo premiado!

    53Educao a Distncia: Fundamentos e Polticas

  • INTERACIONISMO

    Essa terceira via prope uma alternativa de supera-o da oposio e dualidade empirismo-inatismo, pois rejeita o absolutismo de um dos polos. a busca de um sntese de duas posies que historicamente se digladia-ram, ao afirmarem que a realidade dialtica, um proces-so de ir e vir, de reflexo-ao, de interao da experincia sensorial e da razo, da inter-relao sujeito-objeto, sujei-to-sujeito.

    O conhecimento no dado "a priori", nem pelo meio social. uma "construo humana de significados que procura fazer sentido do seu mundo" (JONASSEN,

    1996). Trata-se, portanto, de processo de construo que se d na relao do sujeito (que conhece) com o entorno fsico e social (que conhecido). A aprendizagem, portanto, vai depender das condies do indivduo (bagagem hereditria, motivao, interesse, etc.) como das condies do meio, do aprendente como do professor, dos estudantes como da institui-o ou da escola que tem a funo histrica de educar seus