Catalogo

106
Entremundos - gravuras, colagens, livros de artista e reflexões de Maria do Céu Diel Ana Utsch, Sebastião Miguel, Tai Nunes, Anamaria Ruegger Almeida Neves Jorge Cabrera Goméz

description

Exposição de Maria do Céu Diel

Transcript of Catalogo

Page 1: Catalogo

Mar

ia d

o C

éu D

iel

Entr

emu

nd

os

Entr

emu

nd

os

− gr

avur

as, c

olag

ens,

livr

os d

e ar

tista

e re

flexõ

es d

e M

aria

do

Céu

Die

l

1

Ana

Uts

ch, S

ebas

tião

Mig

uel,

Tai N

unes

, Ana

mar

ia R

uegg

er A

lmei

da N

eves

Jorg

e C

abre

ra G

oméz

A coleção Viés – cadernos do artista é dedicada ao registro de pesquisas em artes plásticas unidas ao catálogo das mostras realizadas na Galeria de Arte GTO, do Sesc Palladium.

Seu propósito é valorizar o artista e sua obra, abrir um espaço de projeção artística e iluminar figuras pouco conhecidas na história das artes plásticas local e nacional. Assim, também, abre-se espaço aos artistas que escrevem sobre outros artistas e aos pesquisadores em artes plásticas que enri- quecem nosso olhar artístico.

Esperamos que, com a associação entre a pesquisa e a obra do artista, possamos desencadear o de- senvolvimento de maiores e crescentes investi- gações em arte.

Maria do C

éu Diel, artista viajante e pesquisadora, percorre m

undos palpitantes de im

agens. Apropria-se delas com

seu olhar, com sua câm

era, com

seus sentidos. Dos lugares por onde ela passa ficam

os esboços dos cadernos, os cheiros, os gostos, as cores, os sons, as letras, as pessoas, os sentim

entos. Um

a vez em seu retorno toda essa poética desdobra-se em

justaposições de im

agens, colagens que lembram

processos criativos como os

de Katsushika Hokusai com

pondo as Cem

vistas do monte Fuji e Proust nas

suas composições literárias.

Page 2: Catalogo
Page 3: Catalogo

Entremundosgravuras, colagens, livros de artista e reflexões de Maria do Céu Diel

Page 4: Catalogo
Page 5: Catalogo

Entremundosgravuras, colagens, livros de artista e reflexões de Maria do Céu Diel

Sesc MinasBelo Horizonte, 2012

Volume I

Jorge Cabrera Goméz (Org.)Ana UtschAnamaria Ruegger Almeida Neves Sebastião MiguelTai Nunes

Page 6: Catalogo
Page 7: Catalogo

Lázaro Luiz GonzagaPresidente Fecomércio Sesc Senac

Rodrigo PenidoDiretor Regional

Luciano de Assis FagundesDiretor Regional Adjunto

Eliane LacerdaSuperintendente de Cultura e Educação

Jorge Cabrera GómezGerente de Cultura

Milena PedrosaGerente do Sesc Palladium

Robinson Costa do NascimentoAssessor de Comunicação

FICHA TÉCNICADireção de curadoriaJorge Cabrera Gómez

Produção GeralMarcela YokoBeatriz Mom Jorge Cabrera Gómez

Projeto ExpográficoBeatriz MomClodoaldo DiasJorge Cabrera Gómez Marcela Yoko

Projeto de comunicaçãoRobinson Costa do NascimentoSimone GalloTaiana FariasAdriano Rangel

Projeto Arte/EducativoJanaina TábulaMarcela YokoLuana SetteLuciana Félix

Projeto de PesquisaAna UtschEscola de Belas Artes - UFMGAnamaria Ruegger Centro de Conservação e Restauração - UFMG Jorge Cabrera GómezSesc MinasSebastião MiguelEscola Guignard - UEMGTai NunesArtista plástica

Projeto Gráfico e DiagramaçãoAna Carolina SoaresCláudio Diniz Alves

FotografiaErwin OliveiraMaria Do Céu Diel

Vídeo AmaríllisMaria do Céu DielMilton José de Almeida

Revisão Jaqueline Lemos Prados

Parceiros do projetoImagens coletadas e material bibliográfico elabora-do com subsídio da Bolsa de Mobilidad Docente, concedida pela Fundación Carolina em novembro de 2011.

Page 8: Catalogo

Viés

Coleção Cadernos do Artista

Volume I

ENTREMUNDOS:gravuras, colagens, livros de artista e reflexões

Maria do Céu Diel

Page 9: Catalogo

O Sistema de Cultura do Sesc Minas atua como um tripé cujas ações sustentam-se na valorização do componente humano, nas ações de serviço social e no desenvolvimento de pesquisas e atividades arte-educativas de seus produtos culturais.

É sob essa perspectiva que inauguramos, a partir da exposição ENTRE-MUNDOS, de Maria do Céu Diel, a coleção de publicações chamada Viés, Cadernos do Artista, dedicada ao registro de pesquisas em artes plásticas unidas ao catálogo das mostras na Galeria de Arte GTO.

Neste sentido, é nosso propósito valorizar o artista e sua obra, abrir um espaço de projeção artística e iluminar figuras pouco conhecidas na história das artes plásticas local e nacional. Assim, abre-se espaço também aos artistas que escrevem sobre outros artistas e aos pesqui-sadores em artes plásticas, que, com alta qualidade, enriquecem nosso olhar artístico.

Convidamos para esta publicação Ana Utsch, professora da Escola de Belas Artes da UFMG, Sebastião Miguel, professor da Escola Guignard da UEMG, Tai Nunes, artista plástica, e Anamaria Ruegger, pesquisa-dora do Centro de Conservação e Restauração da UFMG. Esse grupo representativo de pesquisadores em arte articula conceitos importan-tes para a compreensão da obra de Maria do Céu Diel, tais como: a memória, os fragmentos, a angústia da influência, o artista viajante.

Esperamos que, com a associação entre a pesquisa e a obra da artis-ta, possamos desencadear o desenvolvimento de mais e crescentes investigações em arte sem a pretensão de fazer da imagem um alvo, pois, ao mesmo tempo em que ela nos observa, ela escorre entre os nossos dedos.

Jorge Cabrera GómezDireção de Curadoria

Galeria de Arte GTO. SESC Palladium

Page 10: Catalogo

12

22

28

36

46

54

58

Page 11: Catalogo

Sumário

Lugares do saberLivros, viagens e arquitetura das imagens de Maria do Céu Diel

Os tarôs e a construção de uma Pós-Memória

Dos lugares da terra e De Céu

Maria do Céu no Sesc Palladium: Um teatro de memórias

Entremundos:Bosque de símbolos, nevoeiro e aura

Resumo curricular

EntremundosGravuras, colagens, livros de artista e reflexões de Maria do Céu Diel

Catálogo da Exposição

12

22

28

36

46

54

58

Page 12: Catalogo

12A

na U

tsch

Lugares do saberLivros, viagens e arquitetura das imagens de Maria do Céu Diel

Ana Utsch

Naquela parte do livro da minha memória, antes da qual pouco poderia ler-se,há uma epigrafe que diz Incipt vita nova.

Vida Nova, Dante Alighieri.

Professora da Escola de Belas Artes, ufmg. Mestre em História Cultural pela École des Hautes Études en Sciences Sociales (ehess), Paris. Doutoranda em História pela ehess, École des Hautes Études en Sciences Sociales e pesquisadora associada à Bibliothèque Nationale de France, Paris, França.

Page 13: Catalogo

13Lu

gare

s do

sab

er

Ao longo de minha convivência com Maria do Céu Diel, recebi inúmeras vezes a privilegiada tarefa de criar uma unidade ma-terial capaz de acolher a diversidade visual de suas imagens através da concepção de um livro. Hoje com este convite do Sesc Palladium, que através da coleção Viés, Cadernos do artista deseja unir a escrita de pesquisadores à obra dos artistas que expõem, recebo a tarefa de convocar este percurso para desta vez debruçar-me textualmente sobre o trabalho fulgurante da artista.

Sendo o livro e seus espaços textuais, materiais e simbólicos o objeto mais freqüente de minhas inquietudes, não poderia, por conseguinte, abandoná-lo neste trajeto textual. A presença constante da literatura e de suas diversas textualidades e materialidades no trabalho da própria artista, também isso não permitiria. Façamos logo dele a nossa metá-fora já tantas vezes desdobrada na materialidade que ela pontualmente impõe e frequentemente suscita nas imagens de Maria do Céu, através de inúmeros cadernos de viagens, livros de artista e livros da artista, contemplados também por esta exposição. Se o livro do qual falamos guarda desenhos, gravuras e colagens, que já foram inúmeras vezes envolvidas materialmente sob os cuidados destas mãos que por ora escrevem, – o que ele nos dá a ver? Não pode haver dúvidas, ele nos mostra os lugares do saber, que são também os da memória, pelos quais passaram o corpo e o olhar da artista.

As viagens, que para Maria do Céu constituem lugares de fabrica-ção de imagens – e de saber – tão legítimos quanto os que a cultura ocidental apresenta exemplarmente pela autoridade da palavra escri-ta, figuram nas suas imagens como momentos privilegiados para o deslocamento do corpo e dos sentidos, da língua e da linguagem, da história e da memória, das tradições e das ordens por elas instaura-das – local privilegiado para o estranhamento. E a propósito destes deslocamentos constantes de espaço e de tempo ao qual nos convida incessantemente as imagens construídas pela artista viajante, não é possível se esquivar da dimensão ocupada pela arquitetura.

Porém, nestas imagens o espaço arquitetônico e seus elementos não são em nenhum momento evocados como monumentos ou do-

Page 14: Catalogo

14A

na U

tsch

cumentos, mas como lugares elegidos pela memória e por isso mesmo capazes de arma-zenar, misturar e sobrepor outras imagens que serão em parte obliteradas em um outro tempo – o tempo da artista e o tempo do ob-servador. Digo isso porque Maria do Céu não nos impõe nenhuma atestação e expressa ain-da menos a vontade de construção simbólica ou de reiteração de um lugar comum no qual todos poderiam se (re)conhecer. A arquitetu-ra não é por ela convocada como a prova do “ter visto” ou do “ter estado”, tópicas que a artista, que é também estudiosa das Letras e da Arte da Memória, conhece e recusa. Não se trata, tão pouco, de representações de dife-rentes passados investidas de uma mimesis contemporânea; são Fabulações : narrativas imaginárias de uma realidade vivida e convocada pela memória no mundo das imagens, apresentando o sensível de uma verdade não sensível, sobrepondo diferentes tradições literárias e visuais em tem-poralidades distintas para produzir imagens que funcionam como dispositivos ativos – lugares de saber – que convidam o homem con-temporâneo a um movimento interno – eterno espelho do mundo e verdadeiro Miroir do conhecimento. Talvez por isso mesmo Maria do Céu tenha vivido com tanta sensibilidade as tradições orientais que ela encontrou e vivenciou em uma viagem recente a Granada, pois como escreve Jacques Rancière em um belíssimo texto dedicado ao mutismo da palavra e às contradições da literatura:

A fabulação é duas coisas ao mesmo tempo, ela é a percepção ima-gética e confusa que os povos do Ocidente bárbaro fazem da verdade que eles são incapazes de discernir. Mas ela é também o conjunto de artifícios (fábulas, imagens ou jogos sonoros) que os povos do refinado Oriente inventaram para transmitir a verdade, para esconder o que deveria ser escondido e ornar o que deveria ser transmitido.1

1. Jacques Rancière. La parole muette. Essai sur les contradictions de la littérature. Paris, Hachette, 1998, p. 36. (Tradução da autora).

Maria do Céu Diel, s/ título. Gouache sobre foto (detalhe).

Page 15: Catalogo

15Lu

gare

s do

sab

er

As fabulações que Maria do Céu nos mostra com seus gestos de gravadora e desenhista elencam o que deve ser inscrito e o que deve ser apagado da memória, dos desenhos, dos escritos e das fotografias que perfazem os seus percursos, mas também os de viajantes de todos os tempos. Digo de “todos os tempos”, pois ela também convoca as viagens e as arquiteturas celebradas pela literatura que nos apresenta os percursos iniciáticos de outros viajantes, como o fez, com grande beleza, ao estudar e desenhar as imagens da memória da cidade de Dite, uma das dimensões infernais da viagem de Dante.

Ao eleger portas, batentes, pórticos, passagens, anfiteatros, capitéis, colunas e tantos outros elementos liminares presentes nos livros de pedra que nos são dados a ler pela arquitetura, ela nos diz delicadamen-te que para adentrarmos os espaços de textualidade e de visualidade plasmados pela cultura – lugares do saber – é necessário atravessar o vestíbulo, o peristilo, bater à porta, levantar o véu, em gestos pre-paratórios que conduzem os iniciados ao ato sempre enigmático e arriscado da leitura – que é a própria vida. As arquiteturas efêmeras que pontuam o itinerário do leito-viajante, tal como um frontispício que baliza o espaço organizado do livro, são inscritas no seu ponto mais sensível: o limiar2.

Os repertórios metafóricos construídos em torno das ligações es-tabelecidas entre o livro e a arquitetura são inúmeros e antigos. Eles mobilizam tanto os processos cognitivos de composição dos textos, quanto a construção da materialidade mais manifestamente apreen-sível, indo da letra e da página à tridimensionalidade do objeto. As metáforas que expressam mais propriamente a textualidade fixaram a tópica do texto como edifício bem antes do aparecimento da tipografia, constituindo o modelo recorrente dos sistemas de fabricação de conhe-cimento maquinados pela Arte da Memória. Aquelas ligadas direta-mente à materialidade do livro encontraram o seu lugar privilegiado nas peças liminares tipográficas, icônicas e iconográficas que definem os limites do texto e estabelecem progressivamente um aparelho pro-tocolar que se dirige diretamente ao leitor. Se nos primeiros anos da tipografia a página de rosto se distingue por seu mutismo quase nu,

2. Marc Fumaroli. L’École du silence. Le sentiment des images au XVIIème siècle. Paris, Flammarion, 1998, p. 421-422.

Page 16: Catalogo

16A

na U

tsch

Maria do Céu Diel, s/ título. Gouache sobre foto.

Page 17: Catalogo

17Lu

gare

s do

sab

er

herdeira que ainda era do célebre Incipt – o “aqui começa”–, a partir da segunda metade do século XVI – ornada de um enquadramento que convoca toda a variedade de elementos arquitetônicos: pórticos, motivos vegetais, colunas, capitéis e grotescas – ela se transforma no local privilegiado de expressão da arquitetura; local que o século XVII exacerba com o uso da perspectiva e com a sobreposição de enquadra-mentos, cornucópias, cariátides e figuras monstruosas. Nos dois casos o livro, na sua textualidade e na sua materialidade, é percebido como um local que dispõe de um espaço essencialmente arquitetural para se inventar. O pórtico, que celebra e inaugura a entrada do viajante no edifício do texto, adquire assim uma função liminar que, embora ultrapasse os efeitos de sentido previstos e requisitados em diferentes espaços e tempos, impõe suas formas de controle.

Em um outro tempo, mais próximo do nosso, as relações entre arquitetura e tipografia aparecem ainda mais exaltadas por um ro-mantismo que olhando para um passado gótico plasmou a marca da sua modernidade sob a figura massiva da catedral. Desta sobreposição singular resultaram inúmeras viagens e livros de viagens que o século XIX multiplica para inaugurar uma nova sensibilidade ao passado e fundar a própria noção de patrimônio. Victor Hugo, que desenhando e escrevendo percorre seu país em busca de imagens, monumentos, ruínas e catedrais, ao regressar à casa fabrica o texto que marcará indu-bitavelmente a aliança entre o livro e a arquitetura. Notre Dame de Paris (1832), o romance que gozou de ampla fortuna crítica e iconográfica, assim como de infortúnios mercantilistas e sensacionalistas, no seu capítulo “Isto matará aquilo” (que aparece na edição de 1844) opõe o livro de pedra (a catedral) ao livro de chumbo (o livro impresso). Havia nesta oposição uma predestinação coerente com o fatalismo inúmeras vezes prenunciado na própria intriga do romance3. A afirmação, que propõe uma reflexão profunda sobre as orientações estéticas e sociais da nova cultura tipográfica inaugurada no século XIX, queria dizer: o livro matará a arquitetura. Neste momento as páginas de rosto ele-gem um outro tipo de limiar arquitetural e convocam os elementos das catedrais – balaustradas, ogivas, arcobotantes, pináculos, f lechas

3. Marc Fumaroli. L’École du silence. Le sentiment des images au XVIIème siècle. Paris, Flammarion, 1998, p. 421-422.

Page 18: Catalogo

18A

na U

tsch

e rosáceas – para afirmar o poder da palavra escrita sob o signo da catedral de bolso. Livros, viagens e arquitetura. O livro não matou a arquitetura, mas a transformou profundamente.

Propensas a se tornarem emblemas das obras que encerram, estas páginas arquiteturais propõem sempre um enigma ao leitor, que po-derá, ou não, encontrar o texto que o aguarda para além da portada. Assim como os célebres copistas de Flaubert, que são também viajan-tes, estes pórticos de cobre e de chumbo indagam os leitores ávidos e incautos: “Porquê o conhecimento nos abre portas cujas entradas nos são proibidas”?4

Ao convocar os limiares da arquitetura, Maria do Céu Diel não colo-ca as suas imagens em perspectiva como fizeram os frontispícios com os textos que anunciaram ou como fez a arquitetura com o espaço e com o corpo, mas ela nos lembra com insistência que a cultura criou suas formas de controle, que somos educados pelos edifícios assim como fomos pelos livros e pelas imagens. Muito generosamente, ela nos diz ainda que as viagens podem nos deslocar das nossas habituais formas de controle, para nos emanciparmos da predestinação da seqüência, da repetição, sem que haja no entanto a necessidade de negar o que nelas suscita o movimento, a transfiguração. Pois a nossa loucura pode ser definida como a repetição de uma mesma seqüência que espera resultados diferentes. É por isso que ela não nos fornece imediatamente a resposta à ingênua e terrível indagação dos copistas de Flaubert que fizeram uma viagem sem volta em busca do conhecimento; sem volta porque se perderam em um mundo errante, incapazes que foram de sair de si mesmos, de se deslocar. Movimento que para eles seria im-prescindível para que fosse realizado o salto de tamanho incalculável que separa o mundo do empirismo do mundo da abstração.

Se a arquitetura é a metáfora recorrente do livro e do texto, a viagem com todos os movimentos que ela supõe é a metáfora exemplar da lei-tura, e Maria do Céu assim também pensa quando, ao concordar com Michel Onfray5 , afirma que “toda viagem começa em uma biblioteca”. E em seguida diz ainda a autora:

4. Gustave Flaubert. Bouvard et Pécuchet. Paris, Gallimard, 1979.5. Michel Onfray. Teoria da viagem. Poética da geografia. Porto Alegre, L&PM, 2009.

Page 19: Catalogo

19Lu

gare

s do

sab

er

O viajante arrisca perder-se ou retornar para um lugar que já não re-conhece – estará transformado. Sua metamorfose pretende espelhar a quem pertenceu os emblemas de sua transformação. Narrar, mos-trar, exemplificar, comparar e talvez escrever, representar e falar por imagens: são as formas de preencher o inenarrável de uma viagem.6

Maria do Céu é uma viajante que regressa, conduzida, que é, pelos interlocutores que en-controu ao longo de sua vida: poetas, amigos, escritores e artistas memoráveis. São nestas inúmeras voltas, amparada também por estes mesmos interlocutores, que suas metamorfo-ses suscitam a fabricação de imagens, fabula-ções. Mas a artista se coloca rapidamente em um novo percurso, e convoca as imagens antes produzidas no agora de uma nova viagem que suscitará igualmente outras fabulações.

Trata-se de uma mise en abyme sem volta, circularidade que ao expressar a viagem na própria viagem, mistura mundos, sensações, tradições, deslocando os olhares, criando estra-nhamento e espelhamento “a quem pertenceu os emblemas de sua transformação” – proprietário que é a própria Viagem. Linda homena-gem. Talvez a mão com o bracelete que havia sido um batente de uma grande portada em uma pequena cidade do sul da Itália ou do norte de Portugal – as imagens que ela fabrica não foram feitas para serem reconhecidas nos seus locais de origem – e que figura em um outro tempo sobre uma pequena porta de uma cidade mineira ou espanhola, possa ser uma alegoria da Viagem para a qual nos convida a artista: lector in fabula. E são tantos os lugares do saber!

6. Maria do Céu Diel. Escritos. Campinas, Império do Livro, 2011, p. 7.

Maria do Céu Diel, s/ título. Gouache sobre foto (detalhe).

Page 20: Catalogo

20A

na U

tsch

Referências

Flaubert, Gustave. Bouvard et Pécuchet. Paris, Gallimard, 1979.

Fumaroli, Marc. L’École du silence : Le sentiment des images au XVIIème siècle. Paris, Flammarion, 1998.

Hugo, Victor. Notre Dame de Paris. Paris, Pérotin, 1844.

Ranciere, Jacques. La parole muette: Essai sur les contradictions de la littérature. Paris, Hachette, 1998.

Oliveira, Maria do Céu Diel de. Escritos. Campinas, Império do Livro, 2011

Onfray, Michel. Teoria da viagem, Poética da geografia. Porto Alegre, L&PM, 2009.

Page 21: Catalogo
Page 22: Catalogo

22Se

bast

ião

Mig

uel

Os tarôs e a construção de uma Pós-Memória

Sebastião Miguel

Primeiro o artista realiza seu trabalho copiando.Quando ele falha, aí então é que finalmente se torna original.

Jan Fabre.

Para escapar à alienação da sociedade presente, só existe este meio: fuga para frente; toda linguagem antiga é imediata mente comprometida, e toda linguagem se

torna antiga desde que é repetida.

O Prazer do texto, Roland Barthes.

Professor da Escola Guignard (UEMG). Mestre em Artes Visuais pela Escola de Belas Artes (UFMG). Doutorando em Arte Contemporânea no Colégio das Artes, Universidade de Coimbra, Portugal.

Page 23: Catalogo

23O

s ta

rôs

e a

cons

truç

ão d

e um

a Pó

s-M

emór

iaProposições sobre o trabalho de Maria do Céu:

1. Dicionário: substitui palavras por imagens.2. Aponta campos de possibilidades.3. Ancora unidades ancestrais.4. Cria uma interface entre “uma coisa” e “outra”.5. Pode ser um diagrama.6. É uma projeção sem frente e verso.7. Sua obra não é um produto autobiográfico.

Perguntar se um novo conjunto de mitos é, realmente, o medica-mento que Maria do Céu receitaria para nossos males não equivale a negar a seriedade de nossa situação epistemológica. Há uma urgência das restaurações e reformas do imaginário. Mas, quanto aos velhos mitos, embora os textos geralmente afirmem que a cultura ocidental evoluiu abandonando suas mitologias ligadas à natureza, estes, na verdade, nunca esvaneceram.

Nossa tradição imagética é o produto de uma cultura comum, é a compilação da tradição construída a partir de um rico depósito de mitos, lembranças e obsessões. Os cultos, que somos convidados a procurar em outras culturas chamadas primitivas ou fora do percurso de nossas vidas no século XXI, desmontam a verdade sagrada que na veracidade está fragmentada a nossa volta. Mas vivos e incidindo ao conforto mi-diático fácil e palatável, ainda nos resta saber onde procurá-la.

As Cartas do Tarô como um monumento é um projeto de acesso ao inconsciente. Não é mais um jogo, mas uma possibilidade de criação cujo histórico tangencia a teoria do que é para Alois Riegl1 uma criação da sociedade moderna, um evento histórico localizado no tempo e no espaço. Após um tempo em que não se apontava senão os monumentos intencionais, a partir do século XV, na Itália, as obras da Antiguidade começam a ser valoradas por seus atributos artísticos e históricos, não mais apenas por serem símbolos ou memoriais das grandezas de Grécia e de Roma. Assim, é a partir dessa mudança de atitude que se verifica o despontar de um novo valor de rememoração não mais ligado ao conhecimento coletivo, mas ao valor histórico-artístico.

1. RIEGL, Alois. El culto Moderno a los monumentos. Madrid: VISOR Distr., S. A., 1987. Título original: Der moderne Denkmalkultus. Sein Wesen und seine Entstehung, Viena y Leipzig, 1903.

Page 24: Catalogo

24Se

bast

ião

Mig

uel

A reivindicação de Maria do Céu da autonomia da imagem encontra sua expressão nos registros de um cotidiano. Itinerário exclusivo e contido neste foco particular contra a verdade de uma análise científica, destruindo o que constitui certa especificidade para a banalidade se eleva a um prazer estático. Relativismo que pondera e nivela os valores considerados como grandeza. Abole as diferenças que constituem a singularidade do momento criador, situando-se ao lado e única: tes-temunha. Agrega o mediano e o cotidiano e, por conseguinte, afasta desta fração de olhar o medíocre, aquilo que poderia ser menor. Entra nos obscuros e ignorados lances de olhar e, generosa, não repugna acima de tudo seu tempo. Conteúdo e contexto trabalham sobre uma gestualidade energética que é muito diferente da atividade física. Re-lativamente tranquilo, quase sedentário, característica de algumas obras do passado, seu gesto é uma referência ao corpus do artista. O interesse particular reside nesta referência e não em nenhum outro tema que não o seu próprio contexto.

Ao indicar esse modo alternado do olhar, tem plena consciência de que há mais coisas em jogo que sofismas acadêmicos. Pois, se toda a história da imagem no Ocidente de fato não passa de uma corrida insensata rumo ao distanciamento do mito orientado para a banalidade comercial, suas metáforas e alegorias são o árbitro absoluto do valor e da avaliação da memória. Sua inventividade aponta nossa tragédia.

Maria do Céu alterou ligeiramente a famosa passagem sobre o poder miraculoso e divino do homem de conhecer o mundo, seus Tarots amplificam-se num poder de conhecer um universo infinito e assimilar a ref lexão recém- revelada do conhecimento infinito, num vasto universo em expansão. Quanto à fonte imediata da nova visão, não pode haver dúvidas, De natura rerum2, conferindo a tais mundos inumeráveis um movimento mágico quase absolutamente ausente na arte que hoje se pratica. Assim, seu universo se refugia longe dos fatos terroristas, abraça a gnose hermética, numa nova revelação que informa os inumeráveis mundos como iluminação mágica, sendo que o homem, este mago, este grande milagre, deve se expandir até uma extensão infinita se quiser receber essa visão, e só assim poderá ref leti-la dentro de si.

2. Natura rerum conditum est ut plura sint negotia quam vocabula. [Digesta 19.30]. Pela natureza está determinado que as obras valham mais que as palavras (Tradução do autor).

Page 25: Catalogo

25O

s ta

rôs

e a

cons

truç

ão d

e um

a Pó

s-M

emór

iaSua poética torna as alegorias possíveis. Há o domínio do humor não deixando de ter significado enquanto proposta ao domínio da irracionalidade. Articula múltiplas ideias que se produzem e reper-cutem uma na outra. Talvez seja sua capacidade de inventariar coisas conforme sugerem as suas várias manifestações que leva Maria do Céu a considerar a diluição e a descontinuidade dos conceitos. Desta forma, como no Teatro da Memória, faz surgir o homem e o sagrado como o elo entre as coisas e a existência.

Page 26: Catalogo

26Se

bast

ião

Mig

uel

Referências

Alberti, Leon Batista. Da pintura. São Paulo: Editora Unicamp, 1989.

Alcaide, Victor. La luz, símbolo y sistemas visuais. Madrid: Cadernos ArteCátedra, 1989.

Eliade, Mircea. Imagens e símbolos. São Paulo: Martins Fontes, 1991.

Olaio, António. Ser um individuo chez Marcel Duchamp. Porto: Dafne Editora, 2005.

Oliveira, Maria do Céu Diel de. Imagens do inferno: lugares da me-mória, palavras de Dante. Tese de Doutorado. Unicamp, 2000.

Oliveira, Maria do Céu Diel de. Escritos. Campinas: Império do Livro, 2011.

Riegl, Alois. El culto Moderno a los monumentos. Madrid: VISOR, 1987.

Sardo, Delfim. A Visão em Apineia – escritos sobre artistas. Lisboa: Athena|Babel, 2011.

Wollheim, Richard. A pintura como arte. São Paulo: CosacNaify, 2002.

Wolfe, Tom. A palavra pintada. Porto Alegre: LPM, 1987.

Yates, Frances A. A arte da memória. São Paulo: Unicamp, 2007.

Page 27: Catalogo
Page 28: Catalogo

28Ta

i Nun

es

Dos lugares da terra e De Céu

Tai Nunes

Agora o amanhecer não é mais sinônimo de luz.Agora o amanhecer não é mais sinônimo de ver.

Amanhecer agora é revelação. Não é fumaça ou véu, é neblina.O mundo só existe a poucos passos de onde estou e acontece de novo, se caminho.

Faz frio e o que agrada é a possibilidade de um tempo imóvel que precede o despertar.Medo é o aconchego e o conforto da inércia.

Artista Plástica. Mestre em Artes Visuais pela Escola de Belas Artes (UFMG). Especialista em Ensino e Pesquisa em Arte pela Escola Guignard (UEMG).

Page 29: Catalogo

29D

os lu

gare

s da

terr

a e

De

Céu

Trophonius (Τροφώνιος), Historia Deorum Fatidicorum, Gênova, 1675

Trofônio e Agamedes foram os arquitetos responsáveis pela construção do templo de Apolo em Delfos. Diante do efeito maravilhoso desta construção, Hirieu, rei de Híria na Beócia, deu-lhes a incum-bência da construção de um templo para guardar todo o seu tesouro.

Em uma das paredes deste templo, os arquitetos deixaram em aberto uma pedra através da qual roubavam lentamente o tesouro de Hirieu. Hirieu armou uma armadilha e Agamedes foi capturado en-quanto saía do templo. Receoso de ser apanhado, Trofônio corta então a cabeça de Agamedes, preso no orifício da pedra, e neste momento a terra engole ambos.

Esta é a história que inaugura o antro de Trofônio, um oráculo dos mais visitados na Antiguidade. Para consultá-lo, era necessário enfrentar os mais assustadores obstáculos. O visitante ia assim adentrando para as profun-dezas da terra por câmaras cada vez meno-res, frias e negras, até que por uma abertura estreita introduzia seus pés e depois o corpo, que escorregava numa queda precipitada para o fundo do antro. Quando saía, vinha com a cabeça para baixo e os pés para cima, puxado com o auxílio de uma máquina invisível. Os descrentes nunca mais viam a luz e os crentes sentavam-se num banco denominado Mnemo-sine e evocavam as impressões vividas.

Pretensiosa e vã é a vaidade de Trofônio de livrar-se do passado degolando o próprio irmão1. Quanto mais ele anseia ver-se livre das experiências que o conduziram até aque-le presente, mais estas mesmas experiências concretizam a imagem do que ele é, dentro e para além da terra, enquanto transformam-no em um oráculo.

Ir ao encontro de Trofônio é percorrer os caminhos da terra, vencer as dificuldades do

1. Alguns autores consideram ser Agamedes o padrasto de Trofônio.

Page 30: Catalogo

30Ta

i Nun

espercurso e não ter outra saída a não ser voltar de cabeça para baixo. Esta viagem que termina pelo avesso determina a coragem de ver até a chegada da superfície o último torrão da terra rompido no percurso e trazer à tona as profundezas consigo.

Assim também, ligado às coisas da terra, é o fratricídio que envolve Caim e Abel.

Caim, o sonhador, é também aquele que acredita contribuir para a construção do mundo. Caim deseja construir uma cidade como a melhor demonstração do que é capaz de fazer o trabalho do homem, além de cultivar a terra:

Eu via a cidade como uma outra lavoura, como outra semeadura, como uma nova messe. Que estou a dizer! Era como um desper-tar da terra para fora de si mesma, era, na verdade, sua elevação vertical à imagem do homem, pelo homem, que assim estabelecia sua própria soberania... Suas muralhas teriam circunscrito o espaço onde eu nada esperava Dele2.

Construir através do trabalho um novo mundo era, para Caim, participar da criação. Seria este desejo o que despertou o desprezo de Deus as suas ofertas? Enciumado pela preferência de Deus à pessoa de Abel, Caim mata o irmão e é condenado à errância, à eterna viagem, à maldição de manter-se sob a imposição de uma falta irrecuperável, ao eterno afastamento da presença de Deus.

Para Caim, estar longe de casa, afastado do pai, na insegurança da busca, é assumir todos os riscos da própria existência:

Tu me tiveste segundo o desejo e com a assistência de Deus, diz ele à sua mãe. Muito cedo compreendi que Ele em nada me ajudaria, e que eu não poderia contar senão com minha própria vontade. Sabei, todos vós, que eu tive de conquistar por mim mesmo tudo o que vós me atribuís: o ardor e a rudeza, a força e a obstinação3.

Vagar pela terra é conhecer a terra, tomar posse do que ela significa.É também uma forma de reconciliação, uma reconciliação consigo mesmo.

2. ESTANG, Luc. Le Jour de Cain. Paris: Éditions du Seuil, 1967. p. 112-113.3. ESTANG, Luc. Le Jour de Cain. Paris, 1967. p. 88.

Page 31: Catalogo

31D

os lu

gare

s da

terr

a e

De

Céu

Trofônio e Caim tomam posse da terra. Um pelas suas profun-dezas, outro pela sua superfície. Adentram por paisagens internas e externas, constroem de si mesmos territórios e espaços que acabarão por se tornarem heranças.

Não é qualquer imagem aquela que brota nesta geografia. Quem poderá dizer o que Trofônio e Caim viram em suas viagens?Descrever a memória alheia é como falar de um lugar em que

nunca se esteve.Johannes Kepler, em sua teoria da imagem retiniana, na obra Ad

Vitellionem paralipomena, quibus astronomiae pars optica traditur, defi-ne como dois os termos da imagem: imago rerum (enquanto imagem exterior) e pictura (quando interior, projetada na tela retiniana) que resultam na ideia de que ver é pintar, ut pictura, ita visio – a vista é como uma pintura4.

Estes estudos sugerem a existência de um movimento sincrônico entre o objeto visto e o olho que observa – uma vez que olhar um objeto é capturá-lo para dentro através dos olhos. Neste exercício, transpor-tamo-nos ao objeto e tornamo-nos um com ele através da imagem.

Este é um conceito que em muito difere da definição albertiniana do quadro: uma superfície ou painel emoldurado a certa distância do observador, que olha através dele para um segundo mundo ou um mundo substituto.

Enquanto um método de compreensão da imagem, a teoria retiniana de Kepler propicia também o entendimento de que ver é experimentar a ambiguidade do distanciamento e da imersão ao mesmo tempo, tanto para o artista quanto para o espectador.

O fora e o dentro, o microcosmo e macrocosmo, o corpo e a alma, o intelecto e a percepção, a ideia e a matéria estão manifestos no gesto da criação do artista também para Zuccaro, pintor renomado do período Renascentista, num sistema que ele denominou de desenho interno e desenho externo em sua obra Idea de' pittori, scultori ed architetti, publicada em 1607:

4. Conceito abordado por Svetlana Alpers. In: ALPERS, Svetlana. A Arte de Descrever: A Arte Holandesa no Séc. XVII. Tradução Antônio de Pádua Danesi. São Paulo: EDUSP, 1999. p. 100 - 101

Page 32: Catalogo

32Ta

i Nun

esUma ideia é uma forma no entendimento que representa distinta e expressamente a coisa que ele compreende, sendo também termo e objeto do entendimento. (...) Há dois tipos de operação – algumas externas, como o desenhar, o traçar e formar as linhas, o pintar, o es-culpir e o fabricar; e outras internas, como o compreender e o desejar5.

Importa aqui o fato de que tudo o que o homem é capaz de perceber em seu entorno existe a partir do entendimento que ele apreende deste entorno. Esta compreensão propicia uma concepção de mundo – um desenho interior cuja materialização acontece no desenho exterior. Um é o ref lexo do outro. Um inexiste sem o outro e ambos são indis-sociáveis de pertencer ao homem.

Outro aspecto importante da teoria de Zuccaro diz respeito ao fato de que tanto o julgamento quanto o intelecto manifestam-se no corpo, estabelecendo com ele uma ligação interdependente e, portanto, se constituem quanto ao seu caráter – bons ou ruins – de acordo com a apreensão e a disposição que pode o homem perceber e testemunhar.

Caminhar por lugares mentais nos quais estivemos, reminiscências de experiências vividas, evoca a força da experiência para o presente, mas descrever os caminhos a outros soará sempre falso mediante o que foi a experiência para nós. A verdadeira dimensão do conhecimento reside no próprio corpo e nunca alhures.

Ao artista, nunca será suficiente cortar a cabeça de Agamedes.Neste contexto, talvez a memória seja a única forma comprovada

de existência.O Sistema de Lugares descrito por Quintiliano (Roma, 30 a 95

d.C.), em sua Institutio oratória, é um dos sistemas mais conhecidos na arte da memória. É assim denominado por ser uma orientação do discurso – enquanto percorre estes lugares da memória, o orador, ao visualizar as imagens agentes neles contidas de forma organizada, é capaz de discursar de forma eficiente.

Segundo Francis Yeats, em sua obra A Arte da Memória, existem outras duas fontes latinas da arte clássica da memória. A primeira está contida na obra De oratore, de autoria de Cícero; a segunda, na obra anônima Ad C. Herenium libri IV.

5. ZUCCARO, Frederico. Idéia dos pintores, escultores e arquitetos. In: LICHTENSTEIN, Jaqueline. A Pintura. Vol.3: A idéia e as partes da pintura. Org. Jaqueline Lichtenstein; apresentação de Jean-François Groulier; coord. da tradução de Magnólia Costa. São Paulo: Ed.34.2004. p. 41-42.

Page 33: Catalogo

33D

os lu

gare

s da

terr

a e

De

Céu

No Ad Herenium é acrescido ao Sistema de Lugares de Quintiliano o conceito de Memória Natural – aquela que nasce espontaneamente – e a Artificial –aquela cuja existência depende de disciplina e treinamento:

A Memória Artificial fundamenta-se em lugares e imagens. (...) Um locus é um lugar facilmente apreendido pela memória, como uma casa, um canto, um arco. Imagens são formas, signos, distintivos, símbolos daquilo que queremos lembrar. (...) A Arte da Memória é uma escrita interior (...) porque os lugares são como tábuas de cera ou como papiros, as imagens são como letras, o arranjo e a disposição das imagens são como a escrita, e o fato de pronunciar é como a leitura6.

Para cada lugar, deverá haver uma imagem referente, considerando--se essencialmente que não se trata nem de qualquer lugar, nem de qualquer imagem. Para cada elemento a ser lembrado, existe uma imagem para um lugar (locus) definido que pode ser fictício ou não.

Os afetos apresentam-se como determinantes de uma forma de mundo registrada na memória, de forma a fazer significar não apenas uma verdade natural e moral a respeito deste mundo, mas também e, sobretudo, em que sentido tais significados vinculam-se à alma.

A lembrança que emerge naturalmente difere em muito da memória artificial. A memória artificial é construída em minúcias de detalhes e de escolhas, prescinde de afetos e imagens raras para sua consti-tuição. Lembrar-se de algo involuntariamente é distinto de trabalhar internamente o que deve ser guardado.

A experiência da memória involuntária carrega um vestígio da gratuidade.

No entanto, todo o tempo, o mundo se apresenta a nós de forma involuntária e gratuita, um mundo contemporâneo bombardeado por imagens sempre mediadas por relações impessoais e distantes, referenciadas pelo capitalismo tecnocrata e que instantaneamente absorvemos, desprovidos que estamos de ref lexões e escolhas.

Lembro-me agora de uma frase do artista alemão Anselm Kiefer:

6. YATES, Francis. A Arte da Memória. Tradução de Flávia Bancher. Campinas: Editora da Unicamp, 2007. p. 23.

Page 34: Catalogo

34Ta

i Nun

es“Dizer que sou uma coisa ou outra é muito simples. Eu gostaria de descrever a experiência antes da resposta.”7

A identificação do que seja a obra, seu objetivo, sua essência, passa pela essência do próprio artista, pois tudo que poderia ter sido feito e não foi aponta para um estado intocável percebido como um tipo de ausência, a mesma ausência que Trofônio e Caim carregarão para sempre e que só um objeto artístico pode evocar.

Se penso na produção de Maria do Céu, penso nestas questões. Penso também no conhecimento adquirido (e constantemente

renovado) em nossa convivência como sendo estreitamente vincula-do ao conceito de honestidade. Um conceito que não se apreende em dicionários, pois é formulado a cada vez que nos encontramos: qual seja o de tornar cada vez menor a distância que existe entre o que somos, pensamos e fazemos, sabendo-se que o grande desafio não se encontra na distância, nem no que pensamos ou fazemos, mas na busca constante por descobrir quem realmente somos.

7. “To say that I am one thing or another is too simple. I wanted to depict the experien-ce before the response.” In: LAUTERWEIN, Andrea. Anselm Kiefer/Paul Celan: Myth, mourning and memory. New York: Thames and Hudson, 2005. p 37.

Page 35: Catalogo

35D

os lu

gare

s da

terr

a e

De

Céu

Referências

Alpers, Svetlana. A Arte de Descrever: A Arte Holandesa no Séc. XVII. Tradução Antônio de Pádua Danesi. São Paulo: EDUSP, 1999.

Chevalier, Jean; Gheerbrant, Alain. Dicionário dos Símbolos. col. André Barbault; coord. Carlos Sussekind. Tradução de Vera da Costa e Silva. 15 ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 2000.

Lauterwein, Andrea. Anselm Kiefer/Paul Celan: Myth, mourning and memory. New York: Thames and Hudson, 2005.

Lichtenstein, Jaqueline. A Pintura. Vol. 3: A idéia e as partes da pintu-ra. Org. Jaqueline Lichtenstein; apresentação de Jean-François Groulier; coord. da tradução de Magnólia Costa. São Paulo: Ed. 34.2004.

Oliveira, Ana Lúcia M. de. Do emblema à Metáfora, breve abordagem do visualismo patético seiscentista. Disponível em: http://www.filologia.org.br/vcnlf/anais%20v/civ5_07.htm. Acesso em: 1º de mar. de 2009.

Oliveira, Maria do Céu Diel. Imagens do Inferno - lugares da Memória, palavras de Dante. Tese de Doutorado. Unicamp, 2000.

Onfray, Michel. Teoria da Viagem: poética da geografia. Tradução de Paulo Neves. Porto Alegre, RS: L&PM.

Tossato, Claudemir Roque. Os Fundamentos da óptica geométrica de Johannes Kepler. Disponível em: http://www.scientiaestudia.org.br/revista/PDF/05_04_03.pdf. Acesso em: 10/10/2008.

Yates, Frances A. A arte da Memória. Tradução de Flávia Bancher. Campinas: Editora Unicamp, 2007.

Page 36: Catalogo

36A

nam

aria

Rue

gger

Alm

eida

Nev

es

Maria do Céu no Sesc Palladium: Um teatro de memórias

Anamaria Ruegger Almeida NevesProfessora Adjunta da Escola de Belas Artes da UFMG. Restauradora de Bens Culturais Móveis. Doutora em Artes pela Escola de Belas Artes (UFMG).

Page 37: Catalogo

37M

aria

do

Céu

no

Sesc

Pal

ladi

um

Neste texto, pretendo mostrar, tendo por base textos sobre a arte da memória, a inf luência deles na obra artística de Maria do Céu, em exposição no Sesc Palladium. Tenho como referência o “Teatro da Memória”, de Giulio Camillo, que será meu guia neste texto, no qual pelos degraus do Teatro encontrarei com as imagens agentes que identificarão a exposição. E para ref letir sobre isto busco, neste momento, Ítalo Calvino:

[...]quem somos nós, quem é cada um de nós senão uma combina-tória de experiências, de informações, de leituras, de imaginação? Cada vida é uma enciclopédia, uma biblioteca, um inventário de objetos, uma amostragem de estilos, onde tudo pode ser continu-adamente remexido e reordenado de todas as maneiras possíveis.

Estou no Teatro de Giulio Camillo1 que Almeida2, em seu livro O teatro da memória de Giulio Camillo, assim descreve:

Ao morrer, em 1544, Giulio Camillo Delminio deixou aos leitores, em L idea del Teatro, o projeto de uma grande enciclopédia do saber, uma fábrica da memória universal, composta dos mais notáveis textos e imagens do tesouro da filosofia, da literatura, da ciência, das religi-ões, das artes. Uma classificação hierarquizada e articulada do saber universal, para ajudar a memória e propiciar ao praticante da Arte da Memória o seu domínio, que tomaria a forma de um verdadeiro Teatro do Mundo. (ALMEIDA, 2005, p.13.)

Segundo Almeida, o Teatro de Camillo transmitia quase que ma-gicamente a sabedoria pelo recurso da imitação e da analogia. Para elucidar essa afirmação, transcrevo uma descrição do que seria o teatro:

A obra é em madeira, com muitas imagens, e abarrotada, por toda parte, de pequenas caixinhas dispostas em diversas ordens e de-graus. Ele designou o lugar certo para cada figura, cada ornamento particular, e me mostrou uma tal quantidade de papéis que, se bem que eu tenha ouvido que Cícero é a mais rica fonte de eloquência, dificilmente teria pensado antes que um autor pudesse conter tanta

1. Giulio Camillo (1480-1544) pode ser considerado um sincretista. Seu extenso e proliferante saber revela leituras de várias filosofias e literaturas, que se agregam a um intenso núcleo hermético. (ALMEIDA, 2005, p.15)2. Milton José de Almeida é mestre e doutor pela USP, professor na Unicamp e autor dos livros: Teatro da Memória de Giulio Camillo; Imagens e Sons: A Nova Cultura Oral; Cinema: Arte e Memória.

Page 38: Catalogo

38A

nam

aria

Rue

gger

Alm

eida

Nev

escoisa, ou que seus escritos pudessem estar juntos em tantos vo-lumes. Escrevi-te, anteriormente, o nome do autor, que se chama Giulio Camillo. (ALMEIDA, 2005, p. 21.)

Com essa imagem, vejo-me dentro do Teatro e, num dos degraus, descubro o conceito de Memória que foi inventado pelos gregos e atravessou a Antiguidade como parte da Retórica; e sobre as três ori-gens latinas da arte clássica da memória: a primeira delas tem autor desconhecido, sendo intitulada pelo nome a quem foi dedicada: Ad Caium Herennium ou simplesmente Ad Herennium.

Nessa obra, ao começar escrever sobre a Memória, o autor ressalta sua importância dentre as partes da Retórica, a saber: Invenção, Dis-posição, Elocução, Memória e Pronunciação.

Segundo Yates3, a arte da Memória é como um alfabeto interno. Quem conhece as letras do alfabeto pode escrever o que se lhes dita e ler o que hão escrito. Comenta também sobre a importância das imagens que são figuras que representam coisas e com o tempo darão lugar às Imagens Agentes. Em seu livro, a autora faz uma abordagem de vários pensadores que escreveram sobre a Memória. Comenta sobre a Teoria Aristotélica da Memória e a Reminiscência, dizendo que a imaginação é a intermediária entre a percepção e o pensamento. A Memória está sempre relacionada com a Retórica no pensamento de Platão4, que afirma que a sua função verdadeira é a de persuadir os homens ao conhecimento da verdade. Várias são as Imagens Agentes sobre a Memória.

Subo mais um degrau e encontro Giordano Bruno5, que inventou a Memória mágica na tradição hermética, com auxílio da astrologia, do zodíaco, dos decanos e, assim, organizou a sua teoria da Memória acre-ditando que a sistematização é um dos pontos-chave da mente. Como no ocultismo, ele acreditava na existência de forças ocultas regendo o universo. Segundo ele, pensar é especular com imagens, e nada pode ser externalizado se não tiver sido formado antes internamente. É dentro, portanto, onde se há de fazer a obra significativa. A missão de Bruno era modelar o interior (mente) e ensinar que o artista, o poeta e o filósofo são a mesma coisa.

3. Frances Yates (1899-1981), historiadora britânica, lecionou por vários anos na Uni-versidade de Londres. Seus livros Giordano Bruno e a tradição Hermética e A arte da Memória são excelentes contribuições para o meio acadêmico.4. Platão (428 a.C-348 a.C.).5. Giordano Bruno (1548-1600).

Page 39: Catalogo

39M

aria

do

Céu

no

Sesc

Pal

ladi

um

Nesse momento, vejo a imagem agente que os Tarots de Maria do Céu trazem para estar presente na exposição.

Procuro buscar esses ensinamentos para analisar as Imagens Agen-tes formadas pelas pinturas, que trazem seu histórico, sua memória. Assim, identifico os desenhos e as pinturas em exposição quando o alfabeto interno da artista se manifesta.

Outro degrau chama minha atenção: é a Arte da Memória através de Santo Agostinho6 em Confissões:

Ultrapassarei então essas minhas energias naturais, subindo passo a passo até aquele que me criou. Chegarei assim ao campo e aos vastos palácios da Memória, onde se encontram os inúmeros te-souros de imagens de todos os gêneros trazidas pela percepção. Aí é depositada toda atividade de nossa mente, que aumenta, diminui ou transforma, de modos diversos, o que os sentidos atingiram, e também tudo o que foi guardado e ainda não foi absorvido e sepul-tado no esquecimento. Quando aí me encontro, posso convocar as imagens que quero. Algumas se apresentam imediatamente; outras fazem-se esperar por mais tempo e parecem ser arrancadas de re-positórios mais recônditos. Irrompem as outras em lugar daquela que procuro, pondo-se em evidência, como que a dizerem: Não somos nós talvez o que procuras? Afasto-as da memória com a mão do meu espírito; emerge então aquela que eu queria, surgindo das sombras. Outras sobrevêm dóceis em grupos ordenados, à medida que as conclamo, uma após outra, as primeiras cedendo lugar às seguintes, e desaparecendo para reaparecer quando quero. Eis o que sucede quando falo de Memória. (AGOSTINHO, 1997, p. 278.)

Permaneço por mais tempo nesse degrau, faço um intervalo e deixo meu pensamento se manifestar. Percebo como Santo Agostinho ilustra nossa experiência pessoal de buscar na mente acontecimentos e pessoas do passado e o esclarecimento sobre o tempo passado, presente e futuro:

Posso dizer com segurança que não existiria um tempo passado se nada passasse; e não existiria um tempo futuro se nada devesse vir; e

6. Santo Agostinho, no seu livro Confissões, trata da memória como as três potências da alma: Memória, Entendimento e Vontade, que são a imagem da Trindade no homem.

Page 40: Catalogo

40A

nam

aria

Rue

gger

Alm

eida

Nev

esnão haveria o tempo presente se nada existisse. De que modo existe esses dois tempos – passado e futuro – uma vez que o passado não mais existe e o futuro ainda não existe. E quanto ao presente, se permanecesse sempre presente e não se tornasse passado não seria mais tempo, mas eternidade. Portanto se o presente para ser tempo, deve tornar-se passado, como poderemos dizer que existe, uma vez que sua razão de ser é a mesma pela qual deixará de existir? Daí não podermos falar verdadeiramente da existência do tempo, senão quando tende a não existir.[...]O presente do passado é a memória.O presente do presente é a visão.O presente do futuro é a espera. (AGOSTINHO, 1997, p. 343, 349.)

É confusa a relação da existência do tempo. Aprecio a afirmação de que o presente do passado é a Memória, o presente do presente é a visão, e o presente do futuro é a espera. Acredito que esses conhecimentos são importantes para compreender como o tempo se manifesta em uma obra de arte.

Continuando meu caminho dentro do Teatro, encanto-me com Campanella7 e a sua Cidade do Sol:

A Sapiência, além disso, com ordem admirável, fez adornar as mura-lhas externas e internas, superiores e inferiores, com preciosíssimas pinturas representando todas as ciências. Nas muralhas externas do templo e nas cortinas, que se abaixam quando o sacerdote faz o sermão para que a voz não se disperse, veem-se pintadas as estrelas com suas virtudes, grandezas e movimentos, tudo explicado em três versículos especiais. Na parede interna do primeiro círculo, foram pintadas todas as figuras matemáticas, muito mais numerosas do que as descobertas por Arquimedes e Euclides e tão grandes quanto o permitem as proporções das paredes. Um breve conceito, contido em um verso, faz conhecer o significado de cada uma, com definições, proposições etc.Na parede externa do mesmo círculo, descobrem-se, primeiro, uma completa e extensa descrição de toda a terra e, em seguida, as cartas particulares das províncias, com

7. Tommaso Campanella nasceu em Stilo, em 1568. Ainda jovem já manifestava pendor para a filosofia. Sua primeira obra foi a Philosophia Sensibus Demontrata, que lhe valeu a acusação de heresia. Foi preso e permaneceu na prisão por 27 anos, onde escreveu vários livros. A Cidade do Sol é a mais popular dentre suas obras. Morreu em 1639, na França, para onde fugiu por ser perseguido na Itália.

Page 41: Catalogo

41M

aria

do

Céu

no

Sesc

Pal

ladi

um

suas cerimônias, costumes e leis. Origens e forças dos habitantes vêm brevemente esclarecidas. Os alfabetos das diversas nações aparecem igualmente, ao lado do alfabeto da Cidade do Sol. No interior do segundo círculo, ou seja, das segundas casas, estão todos os gêneros de pedras preciosas e comuns, de minerais e metais, não só representados por gravuras, mas também existindo em pedaços verdadeiros, cada qual com explicações especiais em dois versos. [...]

No interior do terceiro círculo, encontram-se as gravuras de todos os gêneros de plantas e ervas, algumas das quais vivem dentro de vasos colocados sobre as arcadas da parede externa. [...]

No interior do quarto círculo, estão representadas todas as espécies de pássaros, suas qualidades, grandezas, índoles, costumes, cores e vida, e o que causa maior admiração é descobrir, entre eles, a verdadeira Fênix. [....] No interior do quinto círculo, aparecem todos os gêneros de animais terrestres mais perfeitos, em um número portentoso. [...] (CAMPANELLA, 2004 , p. 19-21.)

E, assim por diante, vai Campanella descrevendo tudo o que se pode aprender e guardar na Memória pela organização das pinturas nas paredes. Compreendo que lugares e imaginação são fundamentais na Arte. Percebo a imagem agente da Cidade do Sol quando Maria do Céu pendura suas obras em espaços públicos, em muros, portadas e janelas.

Pensando agora na artista, encontro-me com Giacometti8 que está acomodado, pensativo no quinto degrau à esquerda. Por ser também um artista, comenta comigo:

Esse mundo visível é o que é, e nossa ação sobre ele não poderá nunca transformá-lo em outro. Sonhamos então nostálgicos, com um universo em que o homem, em vez de agir com tanta fúria sobre a aparência visível, se dedicasse a desfazer-se dessa aparência, não

8. Alberto Giacometti (1901-1966) distinguiu-se por suas esculturas e pinturas ex-pressionistas.

Page 42: Catalogo

42A

nam

aria

Rue

gger

Alm

eida

Nev

essomente recusando qualquer ação sobre ela, mas desnudando--se o bastante para descobrir esse lugar secreto, dentro de nós mesmos, a partir do qual seria possível uma aventura humana de todo diferente. [...]

Cada objeto cria seu espaço infinito. Se olho o quadro, como disse, percebo-o em sua solidão absoluta de objeto como quadro. Mas não é isso que me preocupa. E sim o que a tela deve representar. O que eu quero apreender em sua solidão é simultaneamente essa imagem que está sobre a tela e o objeto real que ela representa.[...] (GIACOMETTI apud GENET, 2000, p. 11, 14, 22, 94.)

Desço os degraus e, no meio do Teatro, encontro-me com Maria do Céu e juntas começamos a conversar sobre sua exposição. Percebo que seu fazer é simples, vivendo o aqui e o agora, procurando por qualida-de, significados, sinceridade e autenticidade. É uma artista viajante. Ao mesmo tempo em que deixa sua marca pelos lugares onde passa através das obras que pendura nos espaços públicos, também traz na memória paisagens, elementos artísticos e arquitetônicos, sempre presentes em seus desenhos e pinturas, fiéis as suas ideias e alusões.

Suas viagens foram estimuladas quando escolheu como assunto de pesquisa em seu doutorado a viagem de Virgilio pelo inferno na Divina Comédia de Dante9. É o inferno da Memória, justamente ao contrário do que ocorre no Teatro, pois nada está organizado. Não há o que olhar, a escuridão não permite, o tempo é sempre presente e as cenas se repetem eternizando a dor e o desespero. A Memória, nesse momento, é punição e todos que lá estão pedem por momentos de esquecimento. Maria do Céu faz, então, a analogia com as grandes cidades, o trânsito infernal, os viadutos múltiplos sem indicações precisas. Tornou-se também uma artista viajante trazendo e expondo a memória dos lugares visitados.

Acreditamos que, se a Arte é a reflexão das necessidades espirituais humanas, então ela precisa ser exposta não somente por suas evidên-cias físicas, mas também pela virtude de seus significados.

9. Dante Alighieri (1265-1321).

Page 43: Catalogo

43M

aria

do

Céu

no

Sesc

Pal

ladi

um

Conversamos também sobre o contexto atual das artes plásticas e nos lembramos de Novaes10:

Vivemos entre dois mundos: o “velho” mundo moderno está muito próximo de nós ainda, o que torna difícil falar dele como persona-gem lendário; o mundo contemporâneo, que se apresenta como um começo de uma nova era, conta apenas com velhos conceitos para acolhe-lo.[...]

A ideia de unidade e conjunto tende a escapar, apesar do nosso esforço. Como tudo é muito novo e muito veloz, faltam os intervalos do acaso, que é o espaço do pensamento. (ADAUTO, 2007, p. 10)

Para terminar, no meio do Teatro da Memória, revejo os degraus que consultei e se revelaram neste texto e outros que ainda esperam por mim.

10. Adauto Novaes organizou uma série de palestras: Mutações; ensaios sobre as novas configurações do mundo.

Page 44: Catalogo

44

Ana

mar

ia R

uegg

er A

lmei

da N

eves

Referências

Almeida, Milton José. O Teatro da Memória de Giulio Camillo. Campinas: Editora da Unicamp, 2005. 324p.

Calvino, Ítalo. As Cidades Invisíveis. Tradução Diogo Mainard. São Paulo: Companhia das Letras, 1990. 150p.

Genet, Jean. O ateliê de Giacometti. São Paulo: CosacNaify, 2000. 95p.

Neves, Anamaria Ruegger Almeida. Um Banquete de idéias: O juízo crítico na restauração do afresco de Andrea Mantegna. 2010. Tese Doutorado. Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte.

Novaes, Adauto. Artepensamento. São Paulo: Companhia das Letras, 1994. 495p.

Oliveira, Maria do Céu Diel de. Imagens do inferno: lugares da memó-ria, palavras de Dante. 2000. Tese Doutorado. Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Educação, Campinas.

Santo Agostinho. Confissões. Tradução Maria Luiza Jardim Amarante. São Paulo: Paulus, 1997. 401p.

Yates, Frances A. El arte de la memória. Tradução Ignácio Gómez de Liaño. Madrid: Siruela, 2005. 495p.

Yates, Frances A. Giordano Bruno e a tradição hermética. São Paulo: Cul-trix, 1964.

Page 45: Catalogo
Page 46: Catalogo

46Jo

rge

Cab

rera

Góm

ez

Entremundos:Bosque de símbolos, nevoeiro e aura

Jorge Cabrera GómezDireção de curadoria - Galeria de Arte GTO - Sesc Palladium. Mestre em Artes Visuais pela Escola de Belas Artes (UFMG). Máster em restauração arquite-tônica pela Universidad Politécnica de Madrid, Espanha.

Page 47: Catalogo

47En

trem

undo

s

Maria do Céu Diel, artista viajante e pesquisadora, percorre mundos palpitantes de imagens e se apropria delas com seu olhar, com sua câmera, com seus sentidos. Dos lugares por onde ela passa, ficam os esboços dos cadernos da artista, os cheiros, os gostos, as cores, os sons, as letras, as pessoas, os sentimentos. Uma vez em seu retorno, toda essa poética desdobra-se em imagens-colagens. Essa ação representa um retorno memorial aos lugares percorridos? Ou simplesmente uma metamorfose de sua memória?

As articulações entre suas imagens adquirem, em suas mãos, inú-meras possibilidades e sistemas combinatórios. Com esse procedi-mento, não posso deixar de citar aqui Milton José de Almeida, grande e atuante mestre da artista, referindo-se aos Tarots criados por ela:

Talvez possa ser revivida a idéia de que embalhando imagens – em-baralhando sentidos, embaralhando a História – a ideia de que de uma nova ordem, surgiriam sentidos escondidos tornados visiveis numa nova sequência1.

1. Préface. In: DIEL, Maria do Céu. Tarots. Mise en livre par Ana Utsch. Paris, 2008. p.4.

Maria do Céu Diel, Caderno Vasto. Livro de artista.

Maria do Céu Diel, Tarots. Livro de artista.

Page 48: Catalogo

48Jo

rge

Cab

rera

Góm

ezMaria do Céu Diel embaralha imagens e, nesse movimento, ob-

servamos, às vezes, que as imagens de outras obras de sua autoria mergulham em outros contextos de obras, em um sistema de apropria-ção e de “dupla articulação”2. Assim, os rostos, os lugares imprimem um ar de mistério ao se debaterem com a têmpera guache, matéria de preferência plástica, segundo a artista, pelas propriedades de sua transparência. Ela espalha e raspa essa matéria, criando veladuras ou nevoeiros que ora cobrem suas figuras, ora as revelam. Esses nevo-eiros de Do Céu não se limitam apenas ao tratamento plástico. Eles adquirem uma impressão de pele quando se faz uso do papel de seda para encobrir as imagens.

Um mito dos índios Nez-Percé e Sahaptin, da América do Nor-te, foi analisado por Claude Lévi-Strauss e nele encontramos al-gumas significações dos nevoeiros para os nativos do lugar. Nas duas versões desse mito, o Gato Selva-gem, ou o Lince, era o senhor do nevo-eiro, “criando-o ou dispersando-o a seu bel-prazer”3. Segundo Lévi-Strauss, em uma das versões míticas, esta bruma apresen-tava polaridades. Ela podia ser benéfica ou maléfica, podia representar o gelado ou o quente. Por outro lado, o autor esclarece que o nevoeiro, para os nativos, reúne extremos, desempenhando um papel de intermediário. Pode servir para reuni-los ou para separá-los, dependendo do caso, como unir ou separar o céu e a terra, o alto e o baixo, assim como acontece com os

2. Conceito utilizado por Claude Lévi-Strauss tomado da linguística. Em artes plásticas, é igual a efeito colagem.3. LÉVI-STRAUSS, Claude. Historia de Lince. 1993, p. 23.

Maria do Céu Diel, s/ título. Colagem.

Page 49: Catalogo

49En

trem

undo

s

objetos simbólicos, de culto, nos rituais de magia onde eles facilitam o trânsito.

O nevoeiro, para os índios da América do Norte, ocupa um andar do mundo, acima do nosso, segundo Lévi-Strauss, dentro de uma classificação de quatro andares. O autor afirma:

Todas as crenças parecem dar ao nevoeiro uma conotação positiva. Pode-se cortejar mitos em que o nevoeiro, confundindo o céu e a terra, permite que um determinado protagonista escape de seus perseguidores4.

Sendo assim, o mesmo autor assegura que as lendas celtas atribuam ao nevoeiro ambiguidades, tais como abrir ou impedir a entrada a um

outro mundo.Podemos, então,

assegurar que os “en-tremundos” na obra de Do Céu, como nos mitos citados, articu-lam-se metaforica-mente nos nevoeiros das transparências e das veladuras? Essas transparências arti-culam polaridades ou dualidades? Por outro lado, poderíamos fa-lar de materialidade aurática em função da transparência e da

textura do papel de seda? A aura, para George Didi-Huberman, refere-se a “uma trama singu-

lar de espaço e de tempo”, a “um espaçamento tramado”5 comparável com um sutil tecido, acrescenta o autor:

4. LÉVI-STRAUSS, Claude. Historia de Lince. 1993, p. 22.5. DIDI-HUBERMAN, George. A dupla distância. In: DIDI-HUBERMAN, George. O que vemos o que nos olha, 1998, p.147

Maria do Céu Diel, s/ título. Colagem.

Page 50: Catalogo

50Jo

rge

Cab

rera

Góm

ez

Maria do Céu Diel, s/ título. Colagem.

Page 51: Catalogo

51En

trem

undo

s

como um acontecimento único, estranho, que nos cercaria, nos pegaria, nos prenderia em sua rede (...) E acabaria por dar origem (...) a algo como uma metamorfose visual específica que emerge desse tecido mesmo, desse casulo6.

O ritual das mãos de Do Céu, ao encobrir a figura, como parte do processo criativo, poderia ser associado a uma forma de a artista imprimir suas colagens da aura de que nos falam, na história da arte, Walter Benjamin e Didi-Huberman. Esse ritual se relaciona ao temporal-espacial, com o ato, com a repetição, da qual vai emergindo a “metamorfose visual”, que, neste caso, constitui o objeto, o objeto aurático.

Por sua vez, Didi-Huberman acrescenta que o objeto aurático está relacionado a uma sequência de imagens que se desencadeia como consequência da mémoire involontaire quando a obra nos olha e nós a olhamos. Assim, não poderíamos ser omissos e não poetizar diante de uma colagem de Maria do Céu. É inevitável criar uma rede em torno destes objetos e se perder, parafraseando Didi-Huberman, no “bosque de símbolos” que eles estimulam. Como não relacionar essas colagens com o mundo árabe, com a “estética mestiça” do mudéjar.

A materialidade aurática das colagens de Do Céu se destaca como nevoeiros, podendo ser associada ao embrulho da figura, assim como, por outro lado, o entremundos em sua obra é também uma mistura de procedimentos e suportes. Suas gravuras em metal utilizam como base de impressão, às ve-zes, páginas de livros antigos ou outros materiais impressos, ultrapassando os su-portes convencionais e se entregando ao percurso por outros mundos da técnica.

6. DIDI-HUBERMAN, George. A dupla distância. In: DIDI-HUBERMAN, George. O que vemos o que nos olha, 1998, p.147

Maria do Céu Diel, s/ título. Água forte e ponta seca.

Page 52: Catalogo

52Jo

rge

Cab

rera

Góm

ezPara finalizar, desde esta visão panorâmica do bosque de símbolos

que Maria do Céu Diel nos oferece nesta exposição, encontramos a paisagística de uma artista que percorre o desenho, a gravura e a co-lagem com base na memória, nos esboços de seus papéis de viajante, nas suas junções, nas misturas técnicas e nas lembranças dos cheiros, dos gostos e das histórias de onde esteve.

Page 53: Catalogo

53En

trem

undo

s

Referências

Almeida, Milton José. O Teatro da Memória de Giulio Camillo. Campinas: Editora da Unicamp, 2005. 324p.

Almeida, Milton José. Préface. In: OLIVEIRA, Maria do Céu Diel de. Tarots. Mise en livre par Ana Utsch. Paris, 2008.

George, Didi-Huberman. A dupla distância. In: DIDI-HUBERMAN, George. O que vemos o que nos olha, 1998.

Gómez, Jorge Rafael Cabrera. O ritual como paradigma no processo e na criação plástica [manuscrito]: um estudo comparativo entre a produção artística de Armando Reverón (Venezuela, 1889-1954) e Arthur Bispo do Rosário (Brasil, 1909-1989). 2011, Dissertação de mestrado. Universidade Federal de Minas Gerais. 220p.

Lévi-Strauss, Claude. História de Lince. São Paulo: Companhia das Le-tras, 1996.

Lévi-Strauss, Claude. Olhar, escutar, ver. Tradução Beatriz Perrone-Moisés. São Paulo: Companhia das Letras, 1997.

Oliveira, Maria do Céu Diel de. Tarots. Mise en livre par Ana Utsch. Paris, 2008.

Oliveira, Maria do Céu Diel de. Escritos. Campinas: Império do Livro, 2011.

Page 54: Catalogo

54M

aria

do

Céu

Die

l

Resumo curricular

Maria do Céu DielPorto Alegre, RS, 1962

Page 55: Catalogo

55R

esum

o cu

rric

ular

Formação

1989 Graduação em Educação Artística. Universidade Estadual de Cam-pinas. São Paulo.

1996 Mestrado em Educação. Universidade Estadual de Campinas. São Paulo.

2000 Doutorado em Educação. Universidade Estadual de Campinas. São Paulo.

2001-2012 Professora da Escola de Belas Artes. Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte.

2005/2006 Pós-Doutorais concomitantes. Università degli Studi di LAquila, Itália, e Universidade Estadual de Campinas, São Paulo.

2011 Bolsista da Fundación Carolina. Granada. Espanha.

Trajetória Artística

1987Coletiva de Fotografia. Casa dos Contos. Ouro Preto. Minas Gerais.

Coletiva de Gravura em Metal. Galeria da Unicamp. Campinas. São Paulo.

1989 Coletiva de Gravura em Metal. Itaúgaleria Higienópolis. São Paulo.

1995Bienal Nacional de Santos. São Paulo.

Desenhos e Gravuras. Coletiva no CTI Campinas. São Paulo.

Page 56: Catalogo

56M

aria

do

Céu

Die

l

1996 Exposição Fac-símiles - Individual. Museu de Arte de Joinville. Santa Catarina.

1997

Individual de Gravura em Metal. Galeria de Arte da Unicamp. Cam-pinas. São Paulo.

Individual de Gravura em Metal. Instituto Moreira Salles. Casa da Cultura de Poços de Caldas. Minas Gerais.

Encuentro Internacional de Grabado. Havana. Cuba.

1998 Exposição Coletiva Poéticas Visuais. Instituto Moreira Salles. Cam-pinas. São Paulo.

2001 Imagens do Inferno. Individual Galeria da Unicamp. Campinas. São Paulo.

2002 Coletiva de Professores da Escola de Belas Artes - UFMG. Belo Ho-rizonte. Minas Gerais.

2004 Individual de Desenhos. Sala Mattioli. Vasto. Itália.

2005 Coletiva Galeria de Arte Cemig. Belo Horizonte. Minas Gerais.

2006

XIII Bienal Internacional de Cerveira. Portugal.

Tarots. Individual Galeria de Arte do Instituto Politécnico de Viana do Castelo. Portugal.

Gravura Ex Libris. Acqui Terme. Itália.

VIII Edizione della Biennale Internazionale per l’Incisione. Acqui Terme. Itália.

Page 57: Catalogo

57R

esum

o cu

rric

ular

2007Tarots: o teatro da Memória. Individual na FAOP. Ouro Preto. Minas Gerais.

Bienal Olho Latino de Gravura. Atibaia. São Paulo.

2008 II Salon des Editerus Independants du Quartier Latin, con Ana Utsch. Paris. França.

2009 Desenho Brasileiro em Milão. Coletiva no Istituto Brasile-Italia. Milão. Itália.

2010

Coletiva de Artistas na Casa do Lago da Unicamp. Campinas. São Paulo.

Pesquisa e Criação Artística nas Universidades – Escola de Belas Artes/ Escola Guignard. Coletiva na Galeria da Reitoria da UFMG. Belo Horizonte. Minas Gerais.

2011

The Sketchbook Project – exposição itinerante de cadernos de desenho nas seguintes galerias de arte norte-americanas: Brooklyn Art Libra-ry, Austin Museum of Art, 29th St Ballroom at Spider House - Austin; SPACE Gallery - Portland; The Granite Room - Atlanta; Hillyer Art Space - Washington; Mercer Gallery at Monroe Community College - Rochester; Form/Space Ateller - Seattle; Madrone Studios - San Fran-cisco; Hyde Park Art Center - Chicago; Full Sail University (Full Sail Live auditorium) - Florida. EUA;

Individual de desenhos, gravuras e livros de artista. Abecedarin Gallery. Denver. Colorado. EUA.

Page 58: Catalogo

Entremundosgravuras, colagens, livros de artista e reflexões de Maria do Céu Diel

Catálogo da Exposição

Sem Título.Colagem.25,5 X 37 cm.

Page 59: Catalogo

Sem Título.Colagem.25,5 X 37 cm.

Page 60: Catalogo

Sem Título.Água forte e ponta seca.52,5 X 29 cm.

Page 61: Catalogo
Page 62: Catalogo
Page 63: Catalogo

Sem Título.Água forte e ponta seca.69 X 39 cm.

Page 64: Catalogo

Sem Título.Água forte e ponta seca.56,5 X 40 cm.

Page 65: Catalogo
Page 66: Catalogo

Tarots. Livro de Artista.(Aberto).52 X 30 X 3 cm.

Page 67: Catalogo
Page 68: Catalogo
Page 69: Catalogo

Caderno Porto de Santos. (Aberto).42 X 30 X 2 cm.

Page 70: Catalogo

Caderno Inferno. (Aberto).46 X 26 X 3 cm.

Page 71: Catalogo
Page 72: Catalogo
Page 73: Catalogo

Caderno Granada. (Aberto).10 X 14 X 1 cm.

Page 74: Catalogo

Caderno São João Del Rey. (Aberto).18 X 14 X 2 cm.

Page 75: Catalogo
Page 76: Catalogo

Caderno Veneziano. (Aberto).30 X 21,5 cm.

Page 77: Catalogo
Page 78: Catalogo
Page 79: Catalogo

Caderno Minas. (Aberto).36 X 25,5 cm.

Page 80: Catalogo

Caderno Bologna. (Aberto).32 X 21 cm.

Page 81: Catalogo
Page 82: Catalogo

Caderno Paris. (Aberto).17 X 13 cm.

Page 83: Catalogo
Page 84: Catalogo

Quaderno Italiano. (Aberto).20 X 14 cm.

Page 85: Catalogo
Page 86: Catalogo
Page 87: Catalogo

Caderno Itália. (Aberto).17 X 13 cm.

Page 88: Catalogo

Caderno Vasto. (Aberto).17 X 13 cm.

Page 89: Catalogo
Page 90: Catalogo

Caderno Porto Alegre. (Aberto).20 X 15 cm.

Page 91: Catalogo
Page 92: Catalogo
Page 93: Catalogo

Caderno Belo Horizonte. (Aberto).19 X 13,5 cm.

Page 94: Catalogo

Caderno Poços de Caldas. (Aberto).17 X 13 cm.

Page 95: Catalogo
Page 96: Catalogo

Sem título. Colagem.25,5 X 37 cm.

Page 97: Catalogo
Page 98: Catalogo

Sem título. Colagem.25,5 X 37 cm.

Page 99: Catalogo
Page 100: Catalogo

Sem Título.Colagem.25,5 X 37 cm.

Page 101: Catalogo
Page 102: Catalogo
Page 103: Catalogo

Sem Título.Colagem.25,5 X 37 cm.

Page 104: Catalogo

composição do conselho regional

PRESIDENTE: Lázaro Luiz Gonzaga

REPRESENTANTES DO GRUPO DO COMÉRCIO VAREJISTA

Efetivos: Sebastião da Silva Andrade

Anelton Alves da Cunha

Helton Andrade

Suplentes: Hercílio Araújo Diniz Filho

Gilbert Lacerda Silva

Edilson Euzébio de Lima

REPRESENTANTES DO GRUPO DO COMÉRCIO ATACADISTA

Efetivos: Marcus do Nascimento Cury

José Geraldo de Oliveira Motta

Amâncio Borges de Medeiros

Suplentes: André Coelho Borges de Medeiros

Artur Santos Sampaio

Nício Fortes Garcia

REPRESENTANTES DO GRUPO DE AGENTES AUTÔNOMOS

Efetivos: Idolindo José de Oliveira

Bento José Oliveira

Suplentes: Marli Portela Zambalde Wollentarski

Francisco de Paula Becattini Filho

REPRESENTANTES DO GRUPO DE TURISMO E HOSPITALIDADE

Efetivos: Marcelo Carneiro Árabe

José Porfiro do Carmo

Suplentes: Victor Marchesi Filho

Matusalém Dias Sampaio

Page 105: Catalogo

REPRESENTANTES DO GRUPO DO COMÉRCIO ARMAZENADOR

Efetivos: Caio Márcio Goulart

Synval Nobre Handeri

Suplentes: Luiz Carlos Furtado de Almeida

Afonso Mauro Pinho Ribeiro

REPRESENTANTES DA FEDERAÇÃO NACIONAL DO COMÉRCIO VAREJISTA DE COMBUSTÍVEIS E DE LUBRIFICANTES

Efetivo: Paulo Miranda Soares

Suplente: Elias Jorge Salomão Barburi

REPRESENTANTES DO INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Efetivo: Mário Borges do Amaral

Suplente: Manoel Ricardo Palmeira Lessa

REPRESENTANTES DO MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO

Efetivo: Alysson Paixão de Oliveira Alves

REPRESENTANTES DAS CENTRAIS SINDICAIS

Efetivos: Cláudio Marconi Ferreira Tomaz

Cibele Cristina Lemos de Oliveira

Ronaldo Ferreira Gualberto da Costa

Suplentes: Salvador Vicente Andrade

Valéria Martins

Fernanda Maria Sampaio

DIRETOR REGIONAL: Rodrigo Penido Duarte

DIRETOR REGIONAL ADJUNTO: Luciano de Assis Fagundes

Page 106: Catalogo

Mar

ia d

o C

éu D

iel

Entr

emu

nd

os

Entr

emu

nd

os

− gr

avur

as, c

olag

ens,

livr

os d

e ar

tista

e re

flexõ

es d

e M

aria

do

Céu

Die

l

1

Ana

Uts

ch, S

ebas

tião

Mig

uel,

Tai N

unes

, Ana

mar

ia R

uegg

er A

lmei

da N

eves

Jorg

e C

abre

ra G

oméz

A coleção Viés – cadernos do artista é dedicada ao registro de pesquisas em artes plásticas unidas ao catálogo das mostras realizadas na Galeria de Arte GTO, do Sesc Palladium.

Seu propósito é valorizar o artista e sua obra, abrir um espaço de projeção artística e iluminar figuras pouco conhecidas na história das artes plásticas local e nacional. Assim, também, abre-se espaço aos artistas que escrevem sobre outros artistas e aos pesquisadores em artes plásticas que enri- quecem nosso olhar artístico.

Esperamos que, com a associação entre a pesquisa e a obra do artista, possamos desencadear o de- senvolvimento de maiores e crescentes investi- gações em arte.

Maria do C

éu Diel, artista viajante e pesquisadora, percorre m

undos palpitantes de im

agens. Apropria-se delas com

seu olhar, com sua câm

era, com

seus sentidos. Dos lugares por onde ela passa ficam

os esboços dos cadernos, os cheiros, os gostos, as cores, os sons, as letras, as pessoas, os sentim

entos. Um

a vez em seu retorno toda essa poética desdobra-se em

justaposições de im

agens, colagens que lembram

processos criativos como os

de Katsushika Hokusai com

pondo as Cem

vistas do monte Fuji e Proust nas

suas composições literárias.