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    ANOTAES INICIAIS SOBRE A PSIQUIATRIA DO DESENVOLVIMENTO OU DE PEQUENO QUE SE TORCE O PEPINO

    PSICOLOGIA POLTICA. VOL.12. N 23. PP.87-103. JAN.ABR.2012 87

    Anotaes iniciais sobre a psiquiatria do desenvolvimento: de pequeno que se torce o pepino

    Initial commentary on psychiatry of development:in the childhood future deviation is corrected

    Primeras anotaciones sobre la psiquiatra del desarrollo:es en la niez que se corrigen las desviaciones futuras

    Maria Livia do Nascimento

    [email protected] Maria Bouas Coimbra [email protected]

    Lilia Ferreira Lobo [email protected]

    ResumoO artigo visa discutir alguns dos 16 projetos que fazem parte do

    Instituto Nacional de Psiquiatria do Desenvolvimento (INPD).

    Tomando como analisador as tecnologias de preveno, busca-

    mos colocar em anlise determinadas prticas da psiquiatria no

    contemporneo. Para tanto, tomamos as consideraes de Fou-

    cault sobre biopoder, a partir de sua vertente medicalizante, quenaturaliza as noes de vulnerabilidade e de risco, frequentes

    nas polticas ditas de assistncia. A utilizao da noo de pre-

    veno como uma ferramenta possibilita trazer um debate tico-

    poltico das propostas do INPD, apontando-as como prticas de

    governo da vida, que se apresentam como eficientes e verdadei-

    ras por serem cientficas.

    Palavras-chaveInfncia, Preveno, Psiquiatria do Desenvolvimento,

    Governamentalidade, Biopoder.

    AbstractThis paper discusses some of the 16 projects implemented by the

    National Institute of Developmental Psychiatry (INPD)

    strategies. In order to analyse some contemporary psychiatry

    practices we take in consideration the prevention technologies.

    These analyses are supported by Foucault`s concept of bio

    power. Some of these practices tend to naturalize the notions of

    Doutora em Psicologia Socialpela Pontifcia UniversidadeCatlica de So Paulo, SoPaulo, SP, Brasil e docente dodepartamento de Psicologia e doPrograma de Ps-Graduao emPsicologia da UniversidadeFederal Fluminense, Niteri, RJ,Brasil. Doutora em PsicologiaEscolar e do Desenvolvimento

    Humano pela Universidade deSo Paulo, So Paulo, SP, Brasil,e docente do departamento dePsicologia e do Programa dePs-Graduao em Psicologia daUniversidade Federal Fluminen-se, Niteri, RJ, Brasil.Doutora em Psicologia pelaPontifcia Universidade Catlicado Rio de Janeiro, RJ, Brasil,docente do departamento dePsicologia e do Programa dePs-Graduao em Psicologia daUniversidade Federal Fluminen-se, Niteri, RJ, Brasil.

    Nascimento, Maria Livia do.,Coimbra, Ceclia MariaBouas., & Lobo, LiliaFerreira. (2012). Anotaesiniciais sobre a psiquiatria dodesenvolvimento: depequeno que se torce o pepi-no. Psicologia Poltica,12(23), 87-103.

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    vulnerability and risk, especially those that have been called assistance policies. Therefore,

    using the concept of prevention as a tool enables us to raise an ethical and political debate of

    the INPD propositions, pointing them as governance practices of life that present themselves

    as true because they are efficient and scientific.

    KeywordsInfancy, Prevention, Psychiatry of Development, Governmental Policies, Bio-power.

    ResumenResumen El artculo plantea algunas cuestiones sobre algunos temas del conjunto de

    proyectos presentados por el Instituto Nacional de Psiquiatra del Desarrollo (INPD),

    financiado por el Consejo Nacional de Desarrollo Cientfico y Tecnolgico. (CNPq).

    Tomando como analizador las tecnologas de prevencin, buscamos analizar ciertas

    prcticas de la psiquiatra contempornea. Para hacerlo son consideradas las proposiciones

    de Foucault sobre biopoder, sobre todo en lo referente a la medicalizacin, prctica que

    naturaliza los conceptos de vulnerabilidad y riesgo, muy frecuentes en dichas polticas deasistencia. El uso del concepto de prevencin como una herramienta analizadora permite

    llevar el debate tico-poltico sobre las propuestas de INPD, sealndolas como prcticas de

    gobierno de la vida que, en nombre de las llamadas verdades cientficas, patologiza a la

    infancia y produce la estigmatizacin temprana.

    Palabras claveInfancia, Prevencin, Psiquiatra, Gobernabilidad, Biopoder.

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    Introduo

    O Instituto Nacional de Cincia e Tecnologia de Psiquiatria do Desenvolvimento para aInfncia e Adolescncia (INPD) realizou nos dias 19 e 20 de maro [de 2009] o seu evento

    inaugural. Na oportunidade, o anfiteatro principal do Instituto de Psiquiatria da USP foipalco de apresentaes e debates sobre os projetos que sero realizados pelo instituto [...].O INPD integra um projeto do Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico eTecnolgico (CNPq) que disponibilizou o maior aporte de recursos j destinados para area de pesquisa no Brasil (R$ 520 milhes). As verbas foram divididas entre os 101Institutos Nacionais de Cincia e Tecnologia (INCT) aprovados para participar do

    programa (INPD, 2009). O INPD prope um conjunto coeso e slido de iniciativas eprojetos de pesquisa [...] que, integrados, almejam dois grandes objetivos para a rea desade mental no Brasil: 1) testar ferramentas e mtodos para promover o desenvolvimentosaudvel da criana e do adolescente, preparando-os para a vida adulta; 2) introduzir umnovo paradigma para a psiquiatria brasileira o da Psiquiatria do Desenvolvimento

    (Miguel, Mercadante, Grisi e Rohde, 2009)

    A inteno deste artigo fazer apenas algumas anotaes sobre o conjunto de projetosacima citado, que visam dar partida a questionamentos que esperamos se desdobrem emoutros trabalhos. Portanto, no analisaremos os 16 projetos que fazem parte do Instituto

    Nacional de Psiquiatria do Desenvolvimento INPD1 em seu inteiro teor. O que nos interessa fazer uma anlise das foras polticas que atravessam e constituem tais pesquisas, cujoobjetivo maior so as tecnologias de preveno, tomadas aqui como um analisador2 das

    prticas da psiquiatria do desenvolvimento no contemporneo. Assim, tomaremos apenasalguns desses projetos, levantando algumas questes iniciais naquilo que instrumentam essastecnologias.

    Os projetos do INPD so dirigidos a uma ampla parcela da populao infanto-juvenil,cerca de cinco milhes de crianas e adolescentes, da gestao at os 18 anos, e abarcamaproximadamente 1000 municpios brasileiros3. Com estes projetos o INPD afirma suafinalidade de desenvolver uma nova metodologia para identificar indivduos de risco etestar intervenes antes da manifestao de determinadas doenas visando prevenir/impedirque se desenvolvam. Os proponentes informam tratar-se de um novo paradigma para a

    psiquiatria, pois se elege como alvo de interveno a trajetriado desenvolvimento da doenae no apenas a busca de alvio dos sintomas j instalados. (Miguel, Mercadante, Grisi eRohde, 2009).

    1Projeto 1: Epidemiolgico brasileiro. Projeto PREVENO: Unio dos projetos 2, 3, 4, 5 parainterveno precoce. Projeto 6: Memria verbal. Projeto 7. Tratamento adaptado. Projeto 8: Abordagensno invasivas. Projeto 9: Coorte Butant. Projeto 10: Estudos econmicos. Projeto 11: Modelos animais.Projeto 12: Formao de recursos humanos, ensino mdio, graduao e ps-graduao em medicina.Projeto 13: Treinamento de professores do ensino fundamental. Projeto 14: Formao para profissionaisdo PSF e pediatras. Projeto 15: Aplicao de recursos de Telemedicina. Projeto 16. Traduo, adaptao edesenvolvimento de um Pronturio Eletrnico em Psiquiatria.

    2 Conceito da anlise institucional. Os analisadores so acontecimentos que produzem rupturas,possibil itando colocar em anlise situaes cristalizadas e naturalizadas. Ver Rodrigues e Souza (1991).

    3 Estes dados foram extrados do projeto inicial do INPD.

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    Como anteriormente assinalado, o interesse principal aqui no discutir esses projetos doponto de vista de sua cientificidade, embora alguma referncia a esse respeito, por vezes, setorne necessria. Interessa-nos, como j afirmado, pens-los como um analisador do atualcontexto poltico de controle globalizado que, em nome de uma governamentalidade,comanda a vida, impondo corretivos desde a mais tenra idade. O objetivo do presentetrabalho, portanto, num dilogo com Michel Foucault, pensar como, no contemporneo,esses projetos se fortalecem e se expandem.

    Trata-se, pois, de propostas de uma medicina social que emergem no sculo XVIII naEuropa, e se desenvolvem no sculo XIX no Brasil, e que assumem claramente o carter

    preventivo de administrao de hbitos morais considerados salutares para a populao,passando por uma reordenao sanitria dos espaos da cidade4. Fica evidente, como afirmaLancetti (1989), que a medicina cientfica j nasce sociale muitas das noes [...] passam

    para nosso campo5, como por exemplo, a noo de salubridade determinante da psico-higiene (Lancetti, 1989:79). No campo atual da psiquiatria isto fica ainda mais evidente: uma

    psico-higiene que o carnaval do tempo (Foucault, 2000:33) mascara com novas e sutis

    linguagens cientficas, repetindo-a sem cessar.O que tem possibilitado atualmente a recorrncia de tais prticas preventivas?No se tem a pretenso de responder a questo, apenas puxar algumas linhas e traar

    pistas para levantar alguns problemas sobre o que hoje nos acontece e que no se circunscreveapenas ao Brasil6. Trata-se de um dilogo com Foucault, cuja obra oferece ferramentas que

    permitem romper as repeties do presente. A esse respeito, Ewald assinala: Se existe umalinha tica em Foucault, e ele a tem, ela est fundamentalmente ligada ideia de que precisocombater o perigo da repetio [...]. O presente aquilo que deve ser interrompido (Ewald,1997:205). Repeties que vem, nesses mais de vinte e cinco anos aps a morte do filsofo,tornando-se cada vez mais insidiosas e com discursos cada vez mais poderosos, respaldadosno chamado paradigma cientfico. Bem a propsito, um conjunto de quatro projetos do INPD

    includos em um grupo maior, intitulado genes x ambiente endofentipo7 visa intervenesprecoces nos diagnsticos de transtorno de dficit de ateno e hiperatividade (TDAH),transtornos de conduta, transtornos de ansiedade, transtorno obsessivo compulsivo (TOC),esquizofrenia, transtorno do humor bipolar (THB), transtornos globais do desenvolvimento(TGD) e transtornos de aprendizagem. Essas pesquisas buscam investigar o papel dainterao entre variveis ambientais e marcadores genticos especficos na expressoendofenotpica, a partir de avaliaes neuropsicolgicas e de neuroimagem (Miguel,Mercadante, Grisi e Rohde, 2009).

    A esse respeito, Moyss e Collares (2010) indagam sobre a necessidade de transformar emdoena as peculiaridades da infncia. Dizem as autoras: No se deve esquecer que amedicina constitui seu estatuto de cincia moderna atribuindo-se a competncia para legislar e

    normatizar o que seja sade ou doena e, honrando suas razes positivistas, biologiza a vida

    4 Sobre o tema consultar Machado et al(1978) e Foucault (1979).5 O autor se refere ao campo psi.6 Em 2006, surge na Frana o coletivo Pas de 0 de conduite (Contra o zero de conduta) que denuncia os

    riscos derivados de prticas de cuidado, sobretudo psiquitricas, que visam o controle social de crianas.7 Endofentipos so traos (clnicos, bioqumicos ou cognitivos) associados vulnerabilidade gentica para

    uma determinada doena. Atestam a suscetibilidade de desenvolvimento dessa doena em sujeitos nodoentes, mas que tm proximidade com ela.

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    (p. 72). Citando Ivan Illich (1982) afirmam que o sistema mdico [...] pretende ter autoridadesobre as pessoas que ainda no esto doentes, sobre pessoas de quem no se poderacionalmente esperar a cura (p. 72).

    Cabe lembrar a anlise proposta por Foucault, que nos alerta sobre a necessidade de seinterrogar sobre a ambio de poder que a pretenso de ser uma cincia traz consigo. A esserespeito ele indaga:

    Que tipo de saber vocs querem desqualificar no momento em que vocs dizem umacincia? Que sujeito falante, que sujeito de experincia ou de saber vocs queremmenorizar quando dizem: eu que formulo este discurso, enuncio um discurso cientficoe sou um cientista? Qual vanguarda terico-poltica vocs querem entronizar para separ-la de todas as numerosas, circulantes e descontnuas formas de saber? (Foucault,1979:172)

    Busquemos outro ponto da proposta do INPD, anunciado em um de seus projetos. Dizemos autores: Faremos o primeiro estudo de coorte8 com medidas de desfecho coletadas desde o

    perodo gestacional. Investigaremos a interao gene-ambiente e a conectividade neuronal nagnese das alteraes do desenvolvimento e de fentipos intermedirios, em crianas de 0 a 3anos de idade (Miguel, Mercadante, Grisi e Rohde, 2009).

    Em especial quando a clientela a ser atingida composta no somente por crianas eadolescentes considerados em situao de risco e, portanto vulnerveis como afirmam os

    projetos de assistncia e proteo criana esta proposta vai muito mais alm, estendendo-se como um dispositivo de preveno e controle, que chega at mesmo s crianas emgestao. Quais os efeitos desse poder preditivo que, atravs de avaliaes sucessivas,

    pretende selar o destino e emparedar o futuro?Frente a tais questes, e sempre trazendo o pensamento de Foucault, algumas

    problematizaes iniciais so aqui propostas.Em primeiro lugar ser necessrio levantar alguns debates referentes chamada

    psiquiatria do desenvolvimento e generalizao do poder psiquitrico. Como, em linhasgerais, a psiquiatria vem patologizando o desenvolvimento da criana? Como se d o processode construo histrica do chamado transtorno mental a partir da infncia? A psiquiatria noterritrio da infncia apontada por Foucault como terreno frtil para que o poder psiquitricose expanda por todos os campos sociais. Tal tema teve sua emergncia, no sculo XIX naEuropa, chegando rapidamente ao Brasil no incio do sculo XX, na figura dasanormalidades infantis (Lobo, 2008).

    Pari passu e adubando a emergncia do saber psiquitrico, surgem as noes de risco,preveno e, mais tarde, a de vulnerabilidade. Que relaes de fora esto presentes quando se

    trata da sade mental e dos comportamentos? Como vem se aperfeioando dispositivos psique, ao enfatizar a proteo e a assistncia, afirmam o controle e a tutela sob a justificativa depreveno ao risco?

    Afina-se cada vez mais o olhar observador e investigativo que perscruta, nas mincias docomportamento, os indcios de primeiros sinais de anormalidade, transtorno e doena, cujoscritrios diagnsticos so vagos e imprecisos, como demonstra o importante trabalho deMoyss e Collares (2010). Como investigar causas de uma suposta doena a partir de um a

    8Tcnica utilizada pelas pesquisas mdicas que significa acompanhamento

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    priori? Basta examinar o critrio A (Snap IV)9 para confirmar as crticas que as autorasapresentam: Em sntese, podemos afirmar que, sob o cientificista algoritmo de criana queno aprende e/ou com problema de comportamento + exame fsico normal + exameslaboratoriais normais esconde-se, de fato, a criana que incomoda (p.80). Isto significa quequalquer desvio do que historicamente constituiu-se como normal ser considerado doena.Mais do que um posicionamento tico-humanista, a questo eminentemente tico-poltica.Alm da crtica ao mau uso dos instrumentos e paradigmas cientficos, nossa preocupao

    principal apontar as estratgias polticas de produo de verdades e subjetividades que sereconhecem nos sintomas apontados pelo diagnstico.

    conveniente acompanhar uma das vertentes do INPD que diz: Nosso Instituto ser umexemplo de interao. Acho que ser fundamental no s para as questes farmacolgicas,como tambm para as intervenes sociais (Revista Debate:Psiquiatria hoje, 2009).

    Frente a tais consideraes, o biopoder (Foucault 2000) em sua vertente medicalizante quenaturaliza as noes de vulnerabilidade e de risco frequentes nas polticas ditas de assistncia infncia e juventude, importante referir outro projeto do INPD. Nomeado como

    abordagens no invasivas, pretende verificar o impacto da kundaline yoga no tratamentodos transtornos mentais (Miguel, Mercadante, Grisi e Rohde, 2009). Psiquiatriza-se a yoga,pois por onde essas propostas passam produzem dispositivos que funcionam como roloscompressores, laminando e reduzindo tudo a entidades nosolgicas e respectivos tratamentos.

    Ao se propor ultrapassar a prtica orgnico-medicamentosa utilizando procedimentoscomo a yoga e a terapia cognitivo comportamental, afirmando assim uma aomultidisciplinar, o INPD defende intervenes psicossociais, com o apoio dessas tcnicasno invasivas. A chamada interao psicossocial, no entanto, continua enfatizando o visorganicista e, mesmo quando faz meno interao organismo/ambiente atravs da ao deequipes multidisciplinares, a ao psicossocial dos profissionais limita-se a prevenir/corrigirfalhas presentes no comportamento do indivduo que teriam supostas causas biolgicas, sejam

    diferenas anatmicas do crebro, sejam alteraes de ordem gentica. Por isso mesmo, aolado das intervenes psicossociais, reafirma a importncia do uso de frmacos. No poracaso vrios laboratrios so tambm financiadores dos projetos do INPD10. De acordo comMoyss e Collares (2010:94), por trs das equipes multidisciplinares h uma estrutura menosvisvel, que mantm a teia: a indstria farmacutica, interessada em ampliar o nmero de

    pessoas aprisionadas e apropriadas. As autoras, com base em uma srie de reportagensrealizada pela Rede de TV Bandeirantes, intitulada Receita Marcada, em 02.07.2008, afirmam(p. 95): O faturamento anual da indstria farmacutica no Brasil chegou a R$ 28 bilhes,30% dos quais so destinados ao marketing, que inclui, brindes, jantares, passagens paracongressos, sempre gratuitos, para mdicos selecionados. Como feita a seleo? Aqueles

    que mais prescrevem os medicamentos da indstria em questo. E como a indstria sabe?Simples: negocia cpias das receitas mdicas com as farmcias.11.

    9 O critrio A (Snap IV) um questionrio com 18 perguntas, que deve ser avaliado em conjunto com osdemais critrios (B,C,D,E.) no diagnstico do TDAH.

    10 Alguns desses laboratrios: Norvatis, Eli-Lilly, Janssen-Cilag, Abbott, Shire.11 A metilfenidato (MPH) a droga mais usada no tratamento dos rotulados como portadores de TDAH. De

    acordo com Moyss e Collares (2010:96) No Brasil as vendas de MPH crescem em ritmo assombroso:71.000 caixas de Ritalina em 2000 e 739.000 em 2004 (aumento de 940%); entre 2003 e 2004, aumentou51%. Em 2008, foram vendidas 1.147.000 caixas sob os nomes Ritalina e o sugestivo Concerta; aumento

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    Seguindo o processo capilar de expanso, os projetos do INPD vo alm das abordagensno invasivas ao buscar uma interao com as pessoas presentes no cotidiano da criana,

    professores, familiares, mdicos pediatras, tcnicos do PSF12. Para tanto, recorrem a amploconjunto de propostas de formao, que visa o treinamento de professores do ensinofundamental, e de profissionais do PSF e pediatras. Nesse contexto, alerta aos diferentes

    profissionais para que estejam atentos a quaisquer sinais do que denominam sintomassugestivos de transtornos.

    No temos o propsito de discutir as tcnicas e metodologias utilizadas por essasintervenes psicossociais e farmacolgicas, mas interrog-las enquanto estratgias

    polticas de normalizao no contexto dos projetos da chamada psiquiatria dodesenvolvimento. Para tanto, centraremos a anlise inicial na proposta de preveno queatravessa a lgica dos projetos do INPD, em especial aquele que vem sendo aplicado noacompanhamento de crianas escolares de 6 a 12 anos de escolas estaduais de Porto Alegre eSo Paulo no intuito de entender o desenvolvimento normal e anormal de crianas com alto e

    baixo risco para problemas de sade mental (INPD, Projeto Preveno).

    A Generalizao do Poder Psiquitrico: um novo paradigma?

    A psiquiatria do desenvolvimento uma sofisticao ainda maior que a psiquiatriainfantil, sendo um reforo poderoso na generalizao das chamadas patologias da criana. Ouseja, tem a pretenso de afirmar a verdade sobre a doena, buscando tambm sinais que

    podero possivelmente anunci-la. Trata-se, portanto, de outro dispositivo de periculosidade,atravs do controle das virtualidades. Foucault (1987) j afirmava que as aes que poderoser realizadas pelos sujeitos so to ou mais importantes que aquelas j por eles efetuadas.Produzem-se, com isso, futuros sujeitos perigosos, pois doentes em potencial. Da a marca da

    preveno que instala a priori o estigma da doena.A psiquiatria do desenvolvimento, como uma competente repetio do presente, no

    cria um novo paradigma cientfico, apenas refora antigos preceitos. Embora pretendaultrapassar a chamada psiquiatria biolgica, tem seu solo fundado numa medicina mental, quedescreve e fundamenta os fenmenos mentais atravs de conceitos fisicalistas e biolgicos,colocando o crebro como o rgo da mente. Isto permitiu a abrangncia de sua foraenquanto um discurso-ao atuante nos modos de regulao da vida e controle dasvirtualidades, e em seu papel bem sucedido de catalogar desvios e condutas patolgicas: o

    biopoder em sua vertente medicalizante (Yamada, 2009:48).Mesmo quando a psiquiatria do desenvolvimento afirma a interao do organismo com o

    meio est simplesmente se referindo a um organismo reativo jogado em um mundo ao qual eledeve se submeter. Definir a normalidade a partir da inadaptao social aceitar mais oumenos a ideia de que o indivduo deve aderir maneira de ser de uma determinada sociedadee, portanto, adaptar-se a ela como uma realidade que seria ao mesmo tempo um bem(Canguilhem, 1972:257). A transposio do fenmeno de adaptao biolgica para a vida

    de 1.616% desde 2000. Se for includa a dextroanfetamina, droga menos utilizada, as vendas em 2008ultrapassam 2 milhes de caixas.

    12 O Programa de Sade da Famlia teve incio em 1994, proposto pelo Governo Federal brasileiro aosmunicpios para implementar a ateno bsica de sade.

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    social ao naturalizar a moral e, ao mesmo tempo, moralizar a natureza faz emergir asprofundidades do corpo para as superfcies do comportamento, passa tambm a oferecersadas sedutoras porque naturais para as classificaes em que se baseiam a maioria dosdiagnsticos, dos programas preventivos e educativos de normalizao (Lobo, 1992:116).

    Esse controle sobre a vida tem como alvo o melhor governo sobre a populao, essa figuracomplexa objetivada pelos clculos do poder, pelas prticas e saberes como os da economiapoltica, da estatstica e das tticas de preveno.

    A essas novas tcnicas de governo Foucault chama de governamentalizao, tticas quedefinem o que deve ou no competir ao Estado (Foucault, 1979:292). Trata-se de um poderque tomou a vida humana enquanto espcie e que conduz ao que se poderia chamar deestatizao do biolgico (Foucault, 2000:286). Ento, novas fisionomias se fazem presentesmodificando os dispositivos da disciplina, j agora suavizados. Entre o fazer viver do

    biopoder e fazer morrer da soberania, no houve substituio do segundo pelo primeiro, esim superposio. que essa governamentalizao da vida anuncia um novo racismo naescolha de quem precisa morrer para que outros possam viver. Os genocdios do sculo XX, o

    nazismo, o estalinismo e a eugenia so alguns exemplos. Nova engrenagem, muitas vezes sutildesse jogo fazer viver e deixar morrer que, quando no leva morte, produz mortificaes

    pelas recluses, pelo estigma dos laudos, de certos diagnsticos, e/ou pelo abandono dodeixar morrer. Razo de Estado que deixa de ser uma arte de governar, para tornar-seuma cincia de governo, cujo objeto principal a populao e o instrumento desse saber aestatstica. No se trata mais da manuteno de um povo num territrio que ele ocupa, mas deconhecer seus movimentos, suas densidades, suas diferenas. No mais segurana do

    prncipe e do seu territrio, mas segurana da populao e, por conseguinte, dos que agovernam (Foucault, 2008:85).

    A partir de ento, o grande problema de governo que emerge para esta nova figura, a

    populao, ser garantir a segurana no mais apenas pela interveno quando o mal j estiverinstalado e impedir a sua disseminao (excluir o leproso, esquadrinhar o pestilento, internaros indesejveis, castigar o criminoso), mas intervir antes que o mal aparea. com osacontecimentos das doenas que derivam as tecnologias de controle. Temos como exemplo aepidemia da varola que, a partir do sculo XVIII e principalmente no sculo XIX, darorigem vacina e sua extenso aos atuais mecanismos de preveno. Controle dos corpos que

    biologizar os organismos e os comportamentos. Virtualidades de futuros males queprecisaro, de agora em diante, ser identificados quanto ao grau possvel de periculosidade,normalizados antes que apaream.

    Como, ento, funciona a previso de um determinado destino? Isto s possvel nomomento em que a populao enquadrada por um aparato regulamentar, que define quais

    so as produes teis, os objetos a serem produzidos e os meios para produzi-los. Em suma,todo um aparato que vai fazer dessa populao, considerada, portanto princpio, raiz, de certomodo, do poder e da riqueza do Estado, que vai garantir que essa populao trabalhar comoconvier, onde conviver e em que convier.(Foucault, 2008:90).

    Aqui lembramos outro ponto da proposta do INPD, assim expressa na fala de um de seuscoordenadores: Acreditamos que esse estudo poder identificar fatores genticos eambientais que conferem riscos para o desenvolvimento desses transtornos [psiquitricos]. De

    posse [...] das informaes genticas ser possvel desenvolver intervenes ambientais

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    especficas para aquelas pessoas que possuem um risco aumentado, de modo a reduzir aschances de expresso da doena. (Entrevista dada a Valria Dias /Agncia USP).

    O levantamento de fatores genticos e ambientais e o acompanhamento gestante, sob opretexto da sade mental quanto preveno de riscos, vm aperfeioando mecanismoseugnicos de controle da vida, que recaem, sobretudo, nos filhos da pobreza.

    Historicamente, a prtica da eugenia apresentava dois aspectos. A eugenia negativa que seconstitua na eliminao de traos biolgicos e comportamentais indesejveis, pelaesterilizao, como aconteceu em vrios pases no incio do sculo XX, culminando com oextermnio nazista. A eugenia positiva tratava da reproduo seletiva, pela exigncia decertificados mdicos obrigatrios para os casamentos e os cruzamentos de espcimes puros daraa com a finalidade de aprimorar a espcie.

    Atualmente, a partir do mapeamento do genoma humano, amplia-se o campo daspropostas eugnicas. Se a eugenia desde sua emergncia foi uma tcnica de preveno, hojeadquiriu instrumentos cientficos antes inexistentes. A esse respeito Rifkin (1999) menciona onascimento de uma nova eugenia: novos homens e mulheres eugnicos, uma raa de humanos

    superiores. No mais um ideal fundado por Francis Galton13, no sculo XIX, e que teveaplicao em vrias partes do mundo durante o sculo XX, principalmente nos EstadosUnidos14, cujas tcnicas foram exportadas para a Alemanha nazista. Teve grande repercussono Brasil15, de forma a constituir o que Foucault (2000) chama de racismo de Estado. Hoje,

    j no mais um sonho de demagogos desvairados, mas uma opo de consumo, em brevedisponvel, e um mercado comercial potencialmente lucrativo (Rifkin, 1999:122). Essa novaeugenia no pode ser necessariamente comparada ao holocausto, nem s experimentaesnazistas, primeiro porque dispe de ferramentas que produzem verdades poderosas paramanipular as instrues genticas nas terapias somticas16 antes inexistentes, e segundo

    porque vem mascarada por uma biopoltica de beneficio social.Parece, entretanto, que a proposta eugnica do INPD no chega a tal sofisticao. At o

    momento pelo menos, a vontade expressa no texto de identificar fatores genticos devefuncionar como justificativa para o controle do ambiente das pessoas em risco aumentadode modo a reduzir as chances de expresso da doena. Isto significa produzir um diagnstico

    precoce e formas de controle de algo que ainda no existe, para as inadaptaes futuras emnome de um cuidado da sade do indivduo e da sociedade. Contudo, isto no quer dizer queestamos prximos da universalizao do bem estar social. Ao contrrio, estamos no limiar denovas formas de excluso pela via do desenvolvimento dessa nova eugenia. O que se

    13 Francis Galton, bilogo, gegrafo e estatstico, fundador do movimento eugnico em 1869.14 De tal maneira a eugenia desenvolveu-se nos Estados Unidos que, em 1925, oficiais alemes escreviam

    aos governos estaduais norte-americanos a respeito de sua legislao sobre a esterilizao (Rifkin,1999:133). A filosofia eugnica s arrefeceu com a queda da bolsa de valores de 1929, quando muitosmembros da chamada elite norte-americana (os chamados WASP: brancos, anglo-saxes, protestantes)cometeram o suicdio ou entraram na fila dos desempregados e da sopa para os pobres.

    15 No Brasil no houve legislao eugnica de esterilizao ou de exigncia de certificados mdicosobrigatrios para os casamentos. Entretanto, a propaganda eugnica foi massiva no incio do sculo XX,em especial na dcada de 20, atingindo principalmente a populao pobre. Ver Lobo (2001).

    16 As manipulaes genticas podem ser de dois tipos: No tratamento somtico, a interveno ocorre emclulas somticas e as alteraes genticas no se transferem para os descendentes. Na terapia de linhagerminativa, as alteraes genticas so efetuadas no esperma, ovo ou clulas embrionrias e so passadass prximas geraes (Rifkin, 1999:135).

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    confirma no trecho do Projeto Preveno previsto para as cidades de So Paulo e PortoAlegre que prope em sua segunda fase a coleta de saliva dos familiares biolgicos das2500 crianas que estariam sendo acompanhadas em cada uma das escolas pblicas dessascidades. Ou seja, o INPD, ao afirmar que o conhecimento das informaes genticas tornarpossvel desenvolver intervenes ambientais especficas para aquelas pessoas que possuemum risco aumentado, est patologizando as diferenas, tentando uniformizar modos deexistncia aceitveis, multiplicando separaes e prticas divisoras cujo efeito maisexcluso, ou melhor, excluso perpetrada pela incluso no estigma de um diagnstico.

    A partir de 1970 a psiquiatria biolgica ganhou fora como resposta ao movimento dedesmedicalizao denominado antipsiquiatria firmando-se como paradigma cientfico paraos chamados transtornos mentais. Alguns princpios da psiquiatria biolgica que, a partir de1980, passam a dominar hegemonicamente a rea da medicina mental mostram que a

    psiquiatria do desenvolvimento, como aparece nos projetos do INPD, no introduz um novoparadigma, como afirma em seus documentos. Monteiro (2006), baseando-se em Aguiar(2002) aponta uma srie de princpios desta psiquiatria biolgica que podemos encontrar nos

    projetos do INPD como, por exemplo, a ideia de que a pesquisa e o ensino da psiquiatriadevem enfatizar, de maneira explcita, o diagnstico e a classificao ou que a pesquisa em

    psiquiatria deve utilizar mtodos cientficos modernos, preferencialmente advindos dabiologia, ou ainda que o limite entre o normal e o patolgico deve ser traado de modopertinente. Neste caso, quem e o que define o que pertinente?

    A psiquiatria, desde seu nascimento, a partir da transformao da loucura em doenamental, travou o que Birman (1978:41) apresenta como a grande discrdia entre o fsico e omoral. Para consolidar a pretenso de compor o campo da cincia mdica, a medicina mentalteria que cumprir a exigncia de produzir fundamentos coerentes, no apenas com osfundamentos de uma fisiologia moderna, mas principalmente que estes estivessem articuladosa uma prtica clinica de carter curativo. Surgindo como medicina mental, tentou equiparar-se medicina biolgica. Contudo, Machado, Loureiro, Luz e Muricy (1978:385) nos alertam

    para o fato de que:

    Desde o incio, a psiquiatria apresenta uma tenso entre a exigncia de integrar a loucuraao mesmo esquema de racionalidade do pensamento mdico e a necessidade de reconhecersua originalidade com relao s outras doenas, na medida em que suas caractersticasno se prestam facilmente a esta assimilao ao mundo patolgico. E essa dificuldadeaparece no s na relao entre as abordagens de diversos autores, mas penetra inclusiveas formulaes individuais, onde aparece sob a forma de tenso entre o orgnico e o

    psquico, entre o fsico e o moral.

    Assim, equacionar mente e crebro foi, e tem sido, a grande questo da psiquiatria. Da aambiguidade entre o substrato orgnico da doena mental e as causas morais e sociais. Nossos

    primeiros alienistas do sculo XIX viram-se frente a esta questo: oscilavam entre afragilidade dos pressupostos organicistas e a filosofia das doutrinas psicolgicas. Emboraapontando, ora um ora outro, a insuficincia de tais argumentos, nossos mdicos, em suamaioria, reafirmavam em suas teses a importncia das causas orgnicas cerebrais para adoena mental. Apesar de sustentarem o emprego de substncias farmacolgicas da poca,tratamentos como sanguessugas e ventosas, a prtica dos asilos era eminentemente moral: a

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    disciplina como um ritual dirio, o exerccio do corpo e o trabalho nas oficinas, conjugavam apedagogia dos asilos.

    Preveno, Risco e Vulnerabilidade

    O Instituto Nacional de Psiquiatria do Desenvolvimento inova ao enfatizar a promoo dasade mental ao invs do clssico foco na pessoa doente. A partir de um conjunto coeso eslido de iniciativas e projetos de pesquisa, procura atingir dois grandes objetivos jamaisalcanados na rea de sade mental no Brasil: introduzir ferramentas e mtodos para

    promover o desenvolvimento saudvel da criana e do adolescente, alm de colocar aPsiquiatria Brasileira em concordncia com o mais moderno referencial de trabalho dosmais avanados centros internacionais de sade mental. Todas estas aes deverodiminuir o estigma associado doena psiquitrica. (Entrevista dada a Valria Dias/Agncia USP)

    Interessa-nos neste item, dentro do conjunto de projetos do INPD, abordar o projetoPREVENO que, como j visto, tem o objetivo de acompanhar crianas de 06 a 12 anos deidade, matriculadas em escolas estaduais de Porto Alegre e So Paulo, com o intuito deentender o desenvolvimento normal e anormal dessas crianas consideradas em risco para

    problemas de sade mental. Diz o texto do projeto: Alm dos objetivos de pesquisa, inteno do INPD fornecer assistncia s escolas participantes, com palestras acerca de temasde sade mental e instruo de professores do ciclo bsico (INPD Projeto Preveno)

    O projeto PREVENO17 foi proposto para ter incio no final de 2009 com a triagem dosestabelecimentos e alunos participantes. Previa a seleo de 22 escolas em Porto Alegre e 40em So Paulo, perfazendo um total de 15.000 alunos. Seriam desenvolvidas cinco fasesespecficas. A primeira, diz respeito a visitas de pessoas treinadas pelo INPD s 62 escolas

    selecionadas, para obter informaes atravs de questionrios breves sobre comportamentose emoes durante os perodos de matrcula e rematrcula da rede estadual (INPD ProjetoPreveno). As fases seguintes podem ser descritas a partir do prprio projeto:

    [...] as famlias participantes recebero a visita de pessoal treinado pelo INPD em suascasas para detalhar um pouco mais aspectos de sade mental das crianas e de seus pais.Est prevista tambm coleta de saliva dos familiares biolgicos (fase 2). Alm disso, ascrianas sero avaliadas em cada uma das escolas por psiclogos e fonoaudilogos (fase3) e algumas delas sero convidadas para realizao de exames de Ressonncia Magntica(fase 4), um exame sem radiao e sem riscos para as crianas. Aps um ano da avaliaodomiciliar as crianas sero novamente convidadas para repetir todo o protocolo de

    avaliao (fase 5). (INPD Projeto Preveno)Nessas etapas do projeto PREVENO, em nenhum momento so levados em

    considerao os contextos escolar, social e histrico nos quais esto inseridas essas crianas:suas experincias, seus modos de vida e equipamentos culturais, o funcionamento da escola,as relaes de poder presentes no cotidiano desse estabelecimento entre pais, professores,

    17 As informaes com as quais trabalhamos esto disponveis na rede web em formato de propostas. Notrabalhamos com documentos que dizem respeito implantao do projeto, seus andamentos e possveismodificaes.

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    funcionrios, gestores e a prpria criana. Mais uma vez so atribudos ao indivduo e, nomximo, famlia os perigos sociais. Poderosos processos capitalsticos de laminao desubjetividades submissas: sob a justificativa bem intencionada da preveno, individualizam-se os desvios da norma, cujos efeitos de culpabilizao, vitimizao e criminalizaocompem as pequenas e grandes mortificaes do deixar morrer.

    Aliada lgica do poder mdico encontra-se a judicializao, cujo funcionamento secaracteriza pela produo massiva de discursos e prticas punitivas/criminalizantes que, aoespraiar-se rizomaticamente no contemporneo engendram, como j apontado por Foucault(2000), os racismos de Estado.

    Dessa maneira, controle e tutela esto sempre presentes, mais ou menos explcitos naschamadas polticas pblicas de assistncia e proteo infncia e ao adolescente, como se

    pode observar nos projetos do INPD. Uma proteo que, ao invs de positivar cada momentoda vida, fragiliza a infncia e a famlia pelo medo de um futuro incerto e perigoso que precisade especialistas para evit-lo. Assim, famlias assustadas abrem mo de sua autonomia e,quanto mais estiverem distantes do mercado e do consumo, tanto mais carentes e faltosas, ao

    mesmo tempo, perigosas e vulnerveis. Um mal cujos riscos urgem intervenes preventivas.No por acaso, os estudos sobre risco emergem com fora a partir das ltimas dcadas dosculo XX. O acontecimento risco ganha espao e vai sendo tecido no interior das prticassociais como preocupao de governo dos corpos, particularmente de crianas e jovens.Reencontra-se na segurana o mesmo apetite insacivel de saber: a partir do momento emque submetida a um risco, uma populao ser incessantemente vigiada, controlada,observada, decomposta, recomposta. (Ewald, 1993:111). A anlise minuciosa dos riscos temoperado e estado presente tanto nos espaos/territrios ocupados por esses segmentosempobrecidos, quanto na abordagem que os constrange pela virtualidade e os identifica aocrime.

    Para Foucault (2006), a psiquiatrizao da criana produziu a afirmativa de que desvios

    em um desenvolvimento dito normal, quando no regulados por especialistas e escapam dainterveno do Estado, se tornaro germes de crimes e de loucura futura. Para o autor, como

    j apontado, a psiquiatria no territrio da infncia terreno frtil para que o poder psiquitricose generalize em todos os campos sociais. Parece-me que essa difuso do poder psiquitricorealizou-se a partir da infncia, isto , a partir da psiquiatrizao da infncia. [...] em todo osculo XIX foi principalmente a criana o suporte da difuso do poder psiquitrico; foi muitomais a criana que o adulto (Foucault, 2006:255).

    Indo na mesma direo, os saberes do direito, da pedagogia e da psicologia foramconvocados a compor um cordo sanitrio ao redor da infncia em nome da promoo de seudesenvolvimento, compensando possveis deficincias de um processo considerado evolutivo.A construo desse cordo sanitrio se deu a partir da identificao de riscos a seremevitados. Por outro lado, ser necessrio um clculo feito pelas cincias de governo no sentidode estabelecer um quantum de situaes de risco pode ser aceitvel.

    Desse modo, o risco em excesso passa a ser um acontecimento caracterizado comoadverso e enunciador de diferentes tipos de dano, devendo ser medido e tratado para atenuar

    problemas futuros, tanto para os indivduos, quanto para a sociedade. Nessa perspectiva,como afirmam os projetos do INPD, o risco se tornaria um objeto quantitativamente previsvel

    pela via do clculo probabilstico, que permitiria produzir estimativas e nveis de aceitao, jque sempre estaramos sujeitos exposio de variadas e supostas situaes de perigo, em

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    uma verso de gesto da virtualidade dos acontecimentos inesperados (Ewald, 1993). Vistodessa maneira, podendo ser identificadas, previsveis e prevenidas, as situaes de risco

    passam a ser sustentadas por processos de vitimizao, de culpabilizao e de criminalizaoindividuais, em um campo de trplice aliana entre as prticas de preveno, patologizao e

    punio (Lemos, Nascimento & Scheinvar, no prelo).

    Capilarizando e Governamentalizando

    A idia criar vrios pontos de acesso web, onde poderemos levar educao distnciae formao continuada para os novos psiquiatras sob o paradigma da Psiquiatria doDesenvolvimento. J existem 900 pontos espalhados pelo Brasil. Em cerca de dois anos,haver aproximadamente 9 mil (Entrevista dada a Valria Dias /Agncia USP)

    Como se pode observar, a proposta do INPD d nfase especial formao de todosaqueles profissionais que cuidaro e assistiro a infncia considerada em situao de risco:

    professores, tcnicos e mdicos de diversas especialidades, sendo previstas capacitaes etreinamentos para esses diferentes especialistas. Tal preocupao pode ser vistaespecificamente em cinco de seus projetos, que tratam de: 1) formao de recursos humanosno ensino mdio em geral, na graduao e ps-graduao em medicina; 2) treinamento de

    professores do ensino fundamental; 3) formao para profissionais do Programa de Sade daFamlia e mdicos pediatras; 4) aplicao de recursos de telemedicina; 5) organizao de um

    pronturio eletrnico.Diz Rohde, um dos coordenadores do INPD:

    Acho que poderamos resumir assim: o projeto no se prope a aumentar a formao dosprofissionais na rea, mas a qualificar os profissionais. Principalmente traz o psiquiatra da

    infncia e adolescncia que vai estar em uma posio de difundir conhecimento, porqueaquele que est vinculado universidade, est fazendo mestrado e doutorado, vai serinserido em noes de psiquiatria do desenvolvimento. Como voc disse, vai poderreconhecer os quadros de risco, poder entender as trajetrias de desenvolvimento da

    psicopatologia e, com isso, ns vamos qualificar melhor tanto o psiquiatra da infncia eadolescncia quanto o psiquiatra de adulto, dentro dessa perspectiva do Desenvolvimento.(Revista Debate, 2009)

    Com esse funcionamento, o INPD pretende criar dispositivos que possam colocar em aoestratgias de controle capilares, minuciosas, por vezes invisveis, extremamente sedutoras eabrangentes, atingindo no s crianas e seus familiares, mas tambm uma imensa populao

    que vai de estudantes de ensino mdio a profissionais especializados com ps-graduao.Com discursos cientificistas faz uso de tecnologias de ponta, como a utilizao de exames deressonncia magntica, exames de DNA e pronturio eletrnico, dentre outras.

    Esse complexo de tecnologias, entre elas o uso da informtica e a produo de redes, estintrinsecamente ligado aos dispositivos de controle como forma de governo. No por acaso,elas emergem e se fortalecem no momento em que se d a flexibilizao do capital e asociedade de controle globaliza-se e se insinua por todos os cantos do mundo. Sem dvida, aciberntica, que forneceu o suporte terico para o desenvolvimento das cincias dacomunicao, das mquinas inteligentes e da biologia molecular, vem trazendo inovaes

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    tecnocientficas inimaginveis para a anlise de processos psicolgicos, fsicos e fisiolgicosde transformao da informao, como demonstram as manipulaes do DNA. So algunsdesses avanos tecnolgicos que os projetos do INPD pretendem utilizar.

    A respeito do duplo aspecto dessas inovaes tecnolgicas Moreira (2006:93) chamaateno para:

    A idia pensar o dispositivo das redes tanto subjetivas quanto sociolgicas etecnolgicas, mas com foco aguado para as de comunicao e informao, cujos sistemasvm suscitando ao mesmo tempo rejeio e fascnio. Tecnologias polticas de controle ede produo de subjetividade que vm afirmando uma racionalidade individualista emassificante ainda que se apresente como um campo potencialmente revolucionrio,

    permeado de processualidade e de abertura a novos mundos.

    A proposta de organizao de um pronturio eletrnico, que vem sendo elaborado peloINPD em colaborao com a Universidade Duke, nos Estados Unidos, adaptado realidade

    brasileira, tornar possvel criar um banco de dados nacional sobre transtornos mentais da

    infncia, facilitando, segundo afirmam, a implantao de polticas pblicas e a comparaoentre diferentes tipos de tratamento. Sofisticao da vigilncia panptica ainda maior emespao aberto, ou melhor, no ciber espao, espao de lugar nenhum, sobre os que se desviamdas normas da sade mental, cujos registros, uma vez em rede, alm da disseminao pelos

    pontos onde a pesquisa se realiza, cairo com certeza em outras instncias de governo, epodero funcionar como agravantes dos comportamentos. Permanncia infinita dessesregistros, ao contrrio do papel que, sem conservao envelhece e pode desaparecer. Ciberregistros escapam do tempo, sem redeno possvel.

    Ser possvel desenvolver na educao outro sentido para as propostas contidas nos trsprojetos do INPD ligados formao, uma tica da autonomia e no da chamadainteratividade, um novo eufemismo para mascarar o controle dos vetores de subjetivao?

    Respondendo a certas palavras de ordem embutidas no marketing, no estamos sendo levadosa acreditar que somos participantes ativos nessas diferentes capacitaes? E, dessa forma, noestaremos tambm fortalecendo a atitude passiva diante de tudo que nos democraticamente imposto?

    A questo que se coloca que, se no estamos afirmando uma essncia para essas novastecnologias, no podemos conjur-las como malficas em si mesmas. Cabe-nos, ento,indagar que foras polticas as atravessam, como elas se constituem, a servio de quem elas seconstituem e direcionam suas prticas?

    Consideraes Finais

    A criana d sinais muito precoces de que a sade dela no est bem e muitas vezes issos vai aparecer como um transtorno na adolescncia ou no adulto. Se ns pudermosidentificar esses sinais na infncia seria melhor para a criana, para a famlia, para aescola, para todos. (Lcio Simes de Lima Coordenador do Departamento de Psiquiatriada Infncia e Adolescncia da ABP e conselheiro da Associao Brasileira de Neurologiae Psiquiatria Infantil. Integrante do INPD. Revista Debate, 2009)

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    A utilizao da noo de preveno como uma ferramenta analisadora que atravessa aconstruo desse trabalho possibilita colocar em anlise tica e politicamente as prticas quese apoderam do mundo no sentido de melhor governar a vida, com mais eficincia em nomeda verdade cientfica. Queremos, com isso, afirmar o dispositivo da anlise micropoltica18como uma possibilidade para pensar as lgicas que sustentam esse tipo de interveno: comofuncionam, para que funcionam e quais os efeitos que vem produzindo.

    Quanto lgica que sustenta a tecnologia de prticas de preveno, algumas questes secolocam. Quem pode ser contra uma vacina que evita a contaminao e previne a doenaantes dela se instalar no organismo? Alm disso, uma coisa identificar sinais que semanifestam como sintomas de uma doena orgnica em seu incio, cujo tratamento ser tantomais eficaz quanto mais cedo se der a interveno. Outra coisa tomar sinais noscomportamentos como sintomas de futuras doenas virtuais, portanto, inexistentes. Estatransposio do paradigma mdico extrado da norma biolgica, para a vida social, que se deua partir do sculo XIX, constitui o que se pode considerar como o substrato micropoltico danormalizao dos comportamentos. Ei-lo, pois, ainda em ao no chamado novo paradigma

    da psiquiatria do desenvolvimento.Como essa lgica funciona e para que funciona? Funciona de um modo geralhomogeneizando e hierarquizando as subjetividades e negando os diferentes modos de viver.Como uma lgica da falta, introduz o negativo de uma patologia futura da qual ningum

    poder estar a salvo. A preveno proposta sustenta-se na concepo de uma natureza infantilno como um ato de vida pleno e em expanso, mas unicamente como um ser que ainda no adulto. Educar, cuidar da criana assim concebida significa instituir dispositivos que sedirijam no apenas para seus atos, mas principalmente para o que lhe falta ser, e para o queela deve ser (Lobo, 1992). Ou seja, a preveno proposta constitui-se em um processo deestigmatizao precoce e de excluso a cu aberto.

    Assim, o critrio negativo da falta que a polaridade da norma institui continua presente

    nas prticas da medicina, da educao e da justia. Quaisquer que sejam os avanos dosprincpios de incluso, preciso estar alerta para detectar o olhar negativo que pode estartrespassando mdico, o professor, o juiz, o assistente social e os profissionais psi.

    Por isso, mais do que nunca, necessitamos de uma tica afirmativa que se contraponha,como via de escape, moral negativa que, em nome da proteo, patologiza a infncia em

    busca do germe do delinquente e/ou da vtima, processo to arraigado em nossassubjetividades contemporneas. Precisamos sim de uma tica insurgente de expanso paratodos os atos da vida cotidiana, contra os microfascismos institudos pelos saberescompetentes, pelo marketing da prepotncia sutil dos eufemismos ditos cientficos da

    psiquiatria, e no de um projeto de pesquisa e interveno que busca sedimentar ainda maistudo que torna a vida insuportvel.

    O problema tico continua e mais do que nunca precisa com urgncia ser debatidocoletivamente.

    18 preciso deixar claro que as perspectivas micro e macro polticas nada tm a ver com tamanho: asociedade, o Estado, e o pequeno os indivduos e suas relaes inter e intraindividuais, tais comohomem-mulher, me-filho, professor-aluno. Enfim, o pequeno cotidiano nas instncias da vida social ouas formas institudas individuais ou coletivas. Trata-se de perspectivas de pesquisa radicalmentediferentes. A micropoltica diz respeito dimenso dos processos de constituio das formas da realidade,aquilo que est em vias de se instituir ou se desmanchar, quais relaes de fora, de poder, de prticas assustentam e fizeram-nas historicamente surgir.

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    Recebido em 12/05/2011.

    Revisado em 23/10/2011.

    Aceito em 16/11/2011.