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A Capela de S. João Baptista: o esplendor do mosaico vítreo - Caracterização dos elementos colorantes I Novembro de 2012 Sara Isabel Martins Canaveira Licenciada em Conservação e Restauro Faculdade de Ciências e Tecnologia Universidade Nova de Lisboa A Capela de S. João Baptista: O esplendor do mosaico vítreo - Caracterização dos elementos colorantes - Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em Conservação e Restauro Orientador: Doutora Vânia Solange Muralha, FCT-UNL Co-orientador: Mestre Susana Xavier Coentro, FCT-UNL; Professor Carlo Stefano Salerno, ISCR Università di Roma Tor Vergata

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  • A Capela de S. João Baptista: o esplendor do mosaico vítreo - Caracterização dos elementos colorantes

    I

    Novembro de 2012

    Sara Isabel Martins Canaveira Licenciada em Conservação e Restauro

    Faculdade de Ciências e Tecnologia

    Universidade Nova de Lisboa

    A Capela de S. João Baptista: O esplendor

    do mosaico vítreo

    - Caracterização dos elementos colorantes -

    Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em

    Conservação e Restauro

    Orientador: Doutora Vânia Solange Muralha, FCT-UNL Co-orientador: Mestre Susana Xavier Coentro, FCT-UNL;

    Professor Carlo Stefano Salerno, ISCR – Università di Roma Tor Vergata

    Lisboa

    2012

  • A Capela de S. João Baptista: o esplendor do mosaico vítreo - Caracterização dos elementos colorantes

    II

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    III

    A Capela de S. João Baptista: o esplendor do mosaico vítreo

    - Caracterização dos elementos colorantes –

    © Sara Canaveira, FCT-UNL, UNL

    A Faculdade de Ciencias e Tecnologia e a Universidade Nova de Lisboa tem 0 direito, perpétuo e sem

    limites geográficos, de arquivar e publicar esta dissertação através de exemplares impressos

    reproduzidos em papel ou de forma digital, ou por qualquer outro meio conhecido ou que venha a ser

    inventado, e de a divulgar através de repositórios científicos e de admitir a sua cópia e distribuiçao com

    objectivos educacionais ou de investigacao, não comerciais, desde que seja dado crédito ao autor e

    editor.

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    IV

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    V

    AGRADECIMENTOS:

    Em primeiro lugar quero começar por agradecer à minha orientadora Doutora Solange Muralha, por

    todos os ensinamentos e apoio ao longo deste trabalho.

    À minha co-orientadora, Dra. Susana Coentro, por todo o apoio durante este trabalho.

    Ao Museu de São Roque na pessoa da sua directora Doutora Teresa Morna, por ter permitido que este

    estudo fosse possível.

    Ao meu co-orientador o Professor Carlo Stefano Salerno, pela ajuda, simpatia e boa disposição. Grazie

    mille per tutto!...

    Ao Doutor António Candeias e Doutor José Mirão pela ajuda relativa ao SEM-EDS.

    À engenheira Catarina Miguel pela ajuda prestada relativamente à técnica de μ-FTIR.

    À Ana Maria (DCR), por todas as ajudas prestadas, especialmente em relação à extensão do seguro

    escolar.

    À Cremilde pela ajuda e simpatia.

    À Emilia Rizza, à Martina Bocconi, à Serena Dominijanni, à Nina Covello, à Aurélia Colosimo, à Maria

    Claudia Tocci, à Valentina Forte e à Valeria Bruschi, por todos os momentos de boa disposição que me

    proporcionaram, e por todas as ajudas (per ogni momento di allegria e per tutto l'aiuto...Grazie mille!).

    Às minhas colegas de curso Alexandra Rodrigues e Rita Araújo, pelas ajudas prestadas, pelo

    companheirismo e por todo o apoio desde o início deste trabalho. E claro, pelas aventuras em Istambul.

    Agradeço a todos os meus amigos que me “aturaram” não só durante este ano, mas durante os últimos

    cinco anos de curso. Pelo apoio demonstrado e pela amizade.

    Agradeço também ao meu namorado por todo o apoio e por estar sempre presente nas horas de maior

    aperto.

    Por fim, agradeço aos meus pais, que me proporcionaram este curso, pelo apoio sempre presente e

    pela força para continuar em frente. Por aturarem os meus maus humores especialmente durante o

    último ano, e por estarem sempre presentes quando preciso deles.

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    VI

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    VII

    RESUMO

    Estudou-se um conjunto de fragmentos de tesselas de vidro, do século XVIII, de produção

    italiana, retiradas dos painéis e pavimento da capela de S. João Baptista, na Igreja de S. Roque em

    Lisboa. Esta obra não encontra paralelo no território nacional e apresenta poucos exemplares em Itália,

    terra natal do vidreiro responsável pelo fabrico dos mosaicos, Alessio Matiolli.

    Este estudo surgiu devido à integração da autora na equipa italiana de restauro dos painéis de

    mosaicos, onde surgiu também a necessidade de uma caracterização morfológica e química destes

    materiais, especialmente dos elementos colorantes. A caracterização analítica pretendeu não só

    averiguar a técnica de produção, visto que este tipo de mosaico apenas teve um estudo preliminar em

    2008, mas também investigar a corrosão que algumas cores em particular exibiam. A abordagem

    utilizada foi de natureza multi-analítica, incluindo a espectroscopia de fluorescência de raios X dispersiva

    de energias (μ-EDXRF), a microscopia de Raman, a microscopia electrónica de varrimento com

    microanálise de raios X (SEM-EDS), e a microscopia óptica.

    Os resultados analíticos indicaram que todas as amostras retiradas são constituídas por um

    vidro essencialmente plúmbico e que na maioria das cores analisadas existe um vidro base branco, cuja

    cor é conferida pelo antimoniato de cálcio (Ca2Sb2O7). Os principais colorantes identificados são o cobre

    na forma de cuprite (Cu2O) para os vidros vermelhos, laranjas, rosas e castanhos, o óxido de cobre na

    cor verde, o óxido de cobalto na cor azul e o óxido de manganês na cor roxa. A cor amarela é obtida

    através de um óxido ternário cuja estrutura molecular é similar ao pigmento amarelo de Nápoles

    (antimoniato de chumbo, Pb2Sb2O7) mas apresenta-se numa estrutura designada como óxido ternário

    (Pb2Sb2-xSnxO7-x/2). O terceiro elemento constituinte não foi inequivocamente identificado mas existem

    algumas evidências que possa ser o estanho. Este pigmento amarelo foi responsável também pela

    coloração nas cores laranja, castanho e rosa, juntamente com a cuprite.

    As cores laranja, castanho e rosa apresentavam uma camada negra lateral designada na

    literatura como “scorzetta”. E este trabalho visou também caracterizar a natureza desta camada.

    Verificou-se que a camada negra é constituída essencialmente por tenorite (CuO), formada pelo

    contacto do vidro com o ar durante a sua produção.

    A corrosão observada nas amostras de cor vermelha, rosa e laranja deve-se a processos de

    lixiviação do vidro e à formação de uma camada cinzenta, devido à reacção entre os iões de chumbo

    extraídos.

    Termos chave: Mosaico de vidro; Tesselas de vidro; Alessio Mattioli; Igreja de S. Roque

    DIVULGAÇÃO DO TRABALHO

    Do presente trabalho resultaram duas comunicações:

    - Sara Canaveira; Vânia S. F. Muralha; Susana Coentro; Carlo Stefano Salerno; Teresa Morna; António Candeias; José Mirão; Study of 18th century glass mosaics: the reds and carnagionni of Alessio Mattioli

    in 2nd International Congress Chemistry for Cultural Heritage; 9-12 Julho 2012, Istambul/ Turquia

    [comunicação oral].

    - Vânia S. F. Muralha; Análise científica dos mosaicos da capela no “ciclo de conferências temáticas

    sobre a capela de S. João Baptista”; 3 Maio 2012, Lisboa [comunicação oral].

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    VIII

    ABSTRACT

    A set of glass tesserae samples, from the 18th century Chapel of Saint John Baptist (panels and

    pavement), were analytically analysed. This chapel is located in the Church of Saint Roch, Lisbon. The

    glass mosaic panels and pavement, of Italian production, comprise a unique work of art in the

    Portuguese territory, with very few examples in Italy, birthplace of the glass maker responsible for the

    mosaics, Alessio Matiolli.

    This study came about when the author of the thesis joined the Italian team responsible for the

    restoration of the glass mosaic panels and pavement. It was felt that a thorough morphological and

    chemical study, namely of the colorant elements, was in order. This analytical strategy coveted the

    determination of the production technique and the nature of the degradation exhibited by some colours.

    Prior to this study, in 2008, there was only another study, focused on the degradation process. Our multi-

    analytical strategy included energy dispersive X-ray fluorescence spectroscopy, Raman microscopy,

    scanning electron microscopy with X-ray microanalysis and optical microscopy.

    The analytical results indicate a lead glass composition for all the samples, and the vast majority of the

    analysed colours contain a white glass as a base composition. The opacity of the white glass is given by

    calcium antimonate (Ca2Sb2O7). The main colorants were as follows: cuprite (Cu2O) for the red, orange,

    pin and brown glass, copper oxide for the green glass, cobalt oxide for the blue colour and manganese

    oxide for the purple colour. The yellow colour is given by a compound with a molecular structure similar

    to the yellow pigment Naples Yellow (lead antimonate, Pb2Sb2O7), but with a structure named triple oxide

    (Pb2Sb2-xXxO7-x/2), where X is usually Sn or Zn. The third element was not unequivocally identified but the

    data suggest the element tin. This yellow pigment was also responsible for the colour component in the

    orange, brown and pink glasses.

    The orange, brown and pink colours showed a black lateral layer, named in the literature as “scorzetta”

    that was also analysed. Our results showed that this layer is made of tenorite (CuO), a consequence of

    the exposure of the glass to the atmosphere during its production.

    The degradation exhibited by the red, pink and orange glasses follows a typical process of glass

    weathering (leaching of alkali ions from the glass) and the formation of a greyish layer.

    Keywords: Mosaic glass; Tesserae glass; Alessio Mattiolii; S. Roque Church

    PUBLICATIONS:

    From this work resulted in two papers:

    - Sara Canaveira; Vânia S. F. Muralha; Susana Coentro; Carlo Stefano Salerno; Teresa Morna; António

    Candeias; José Mirão; 2nd International Congress Chemistry for Cultural Heritage; 9-12 July 2012,

    Istanbul/ Turkey [oral communication].

    - Vânia S. F. Muralha; Análise científica dos mosaicos da capela in “ciclo de conferências temáticas

    sobre a capela de S. João Baptista”; 3 May 2012, Lisbon [oral communication].

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    IX

    ÍNDICE

    AGRADECIMENTOS: ................................................................................................................................. V

    RESUMO ................................................................................................................................................... VII

    DIVULGAÇÃO DO TRABALHO ................................................................................................................ VII

    ABSTRACT ............................................................................................................................................... VIII

    PUBLICATIONS: ...................................................................................................................................... VIII

    ÍNDICE ........................................................................................................................................................ IX

    INDICE DE FIGURAS ................................................................................................................................ XI

    INDICE DE TABELAS .............................................................................................................................. XIII

    LISTA DE ABREVIATURAS, SIGLAS E SÍMBOLOS: .............................................................................. XV

    1. INTRODUÇÃO HISTÓRICA ............................................................................................................ - 1 -

    1.1. A Igreja de S. Roque ............................................................................................................... - 1 -

    1.2. A Capela de S. João Baptista .................................................................................................. - 1 -

    1.3. Os mosaicos vítreos da capela de S. João Baptista ............................................................... - 3 -

    1.4. Receituário de Alessio Mattioli ................................................................................................ - 6 -

    2. PROCEDIMENTO EXPERIMENTAL .............................................................................................. - 9 -

    2.1. Amostras estudadas ..................................................................................................................... - 9 -

    2.2. Técnicas de observação e análise ............................................................................................... - 9 -

    3. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS ............................................................................................... - 11 -

    3.1. Caracterização química das tesselas ......................................................................................... - 11 -

    3.2. Vidro Branco ............................................................................................................................... - 16 -

    3.3. Vidro Amarelo ............................................................................................................................. - 17 -

    3.4. Vidro Vermelho, laranja, rosa, castanho .................................................................................... - 18 -

    3.5. Vidro Verde ................................................................................................................................. - 22 -

    3.6. Vidro Azul ................................................................................................................................... - 23 -

    3.7. Vidro Roxo .................................................................................................................................. - 24 -

    3.8. Scorzetta ..................................................................................................................................... - 24 -

    3.9. Camada de corrosão .................................................................................................................. - 26 -

    4. CONCLUSÃO .................................................................................................................................... - 30 -

    5. BIBLIOGRAFIA .................................................................................................................................. - 32 -

    ANEXO 1 ............................................................................................................................................... - 34 -

    ANEXO 2 – DESCRIÇÃO DOS PAINEIS E PAVIMENTO .................................................................... - 36 -

    ANEXO 3 – CONSERVAÇÃO E RESTAURO ...................................................................................... - 42 -

    Campanhas de beneficiação da Igreja de S. Roque ......................................................................... - 42 -

    Estado de conservação dos mosaicos vítreos .................................................................................. - 42 -

    Procedimento de conservação e restauro ......................................................................................... - 49 -

    Considerações finais ......................................................................................................................... - 53 -

    ANEXO 4 – AMOSTRAS ESTUDADAS ................................................................................................ - 56 -

    ANEXO 5 – MAPEAMENTO DA LOCALIZAÇÃO DAS AMOSTRAS ................................................... - 58 -

    ANEXO 6 - COMPOSIÇÃO QUÍMICA DOS PADRÕES UTILIZADOS EM µ-EDXRF.......................... - 60 -

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    X

    ANEXO 7 – CERAS COLORIDAS ........................................................................................................ - 62 -

    BIBLIOGRAFIA ANEXOS ...................................................................................................................... - 66 -

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    XI

    INDICE DE FIGURAS

    Figura 1.1 – Painel lateral (lado da epístola) “Pentecostes” .................................................................. - 2 - Figura 1.2 – Esfera armilar do pavimento em campo elíptico. ............................................................... - 2 - Figura 1.3 – a) Processo de corte das tesselas; b) Tesselas depois de cortadas; c) Pormenor de das

    tesselas de um painel e cera colorida entre as mesmas. ....................................................................... - 4 - Figura 1.4 – Diagrama resumido dos componentes que se pensa terem sido usados por Mattioli [8]. - 6 - Figura 2.1 – Fragmentos de tesselas de diferentes cores. .................................................................... - 9 - Figura 3.1 – Razão entre os teores de PbO e SiO2 (%m/m) ................................................................ - 11 - Figura 3.2 – (a) Imagem da superfície da amostra C13, (b) cristais brancos de antimoniato de cálcio e

    (c) espectro EDS correspondente à análise dos cristais brancos. ....................................................... - 16 - Figura 3.3 – Espectro de µ-Raman do antimoniato de cálcio Ca2Sb2O7 (amostra c13) ...................... - 16 - Figura 3.4 – Imagem de microscopia óptica da tessela P10 ................................................................ - 17 - Figura 3.5 – Espectros de µ-Raman da tessela P10, de óxidos ternários com uma estrutura A2B2O6O’

    tendo na sua composição Pb (a) e Sb (b). ............................................................................................ - 17 - Figura 3.6 - Tessela C21 observada por microscopia óptica. .............................................................. - 18 - Figura 3.7 – Espectro de µ-Raman da Cuprite. .................................................................................... - 18 - Figura 3.8 – a) Imagem de microscopia óptica da amostra A5; b) Imagem de SEM-BSE com as

    estruturas cristalinas observadas também em microscopia óptica e com a composição elementar em Cu

    dentro e fora das estruturas. ................................................................................................................. - 19 - Figura 3.9 – a) Imagem de SEM-BSE da amostra A5; b) Mapa de raios X do cobre; c) Mapa de raios X

    do chumbo ............................................................................................................................................. - 20 - Figura 3.10 – a) Espectro de µ-Raman da hematite (Fe2O3); b) do quartzo (SiO2); c) da anatase (TiO2). -

    20 - Figura 3.11 – Tesselas laranjas analisadas sob microscopia óptica; a) A2 (associada a uma carnação);

    b) C18 (amostra laranja) ....................................................................................................................... - 20 - Figura 3.12 – a) Espectros de µ-Raman da tenorite; b) da cassiterite; c) cloreto de cobre semelhante à

    Eriocalcite. ............................................................................................................................................. - 21 - Figura 3.13 – Tessela castanha P6 analisada sob microscopia óptica................................................ - 22 - Figura 3.14 – a) Tessela P9 analisada sob microscopia óptica; b) Tessela C5 observada sob

    microscopia óptica. ................................................................................................................................ - 22 - Figura 3.15 – Imagem de SEM (amostra C2) que revela uma morfologia bastante heterogénea. Foi

    identificado por EDS cálcio e estanho (a) ............................................................................................. - 23 - Figura 3.16 – Mapa de raios X com a identificação de cristais de Sn numa matriz de Cu. ................. - 23 - Figura 3.17 - Tessela C22 analisada sob microscopia óptica. ............................................................. - 23 - Figura 3.18 – (a) Imagem BSE da tessela C22; (b) mapa de raios X do antimónio. ........................... - 23 - Figura 3.19 - Tessela C19 analisada por microscopia óptica. ............................................................. - 24 - Figura 3.20 – Espectro de µ-Raman da forsterite ................................................................................ - 24 - Figura 3.21 – a) Tessela B6 com scorzetta na posição em que é aplicada no painel; (b) Imagens de MO

    de três tipos de scorzetta com diferentes colorações na amostra B6, (c) A1 e (d) C18. ...................... - 25 - Figura 3.22 - (a) Imagem de microscopia óptica; (b) imagem SEM-BSE; (c) mapa de raios-X do cobre,

    onde se observam as três camadas distintas na scorzetta da tessela B6............................................ - 25 - Figura 3.23 – Gráfico da comparação entre o teor de óxido de cobre na scorzetta e no corpo do vidro,

    calculada por µ-EDXRF. ........................................................................................................................ - 26 - Figura 3.24 - Pormenor do painel “Baptismo de Cristo” onde se observam dois conjuntos de tesselas

    com uma camada de corrosão cinzenta. .............................................................................................. - 26 - Figura 3.25 – Amostras A1 (a), A3 (b) e A4 (c), onde se observa a camada de corrosão cinzenta e, na

    amostraA3, depósitos de tonalidade amarela na superfície. ................................................................ - 26 - Figura 3.26 – (a) Imagem BSE da superfície corroída da tessela A1, e respectivos mapas de raios X do

    enxofre e silício (b), e do chumbo (c). ................................................................................................... - 27 - Figura 3.27 – Imagem BSE de uma secção da tessela A3 (a) e mapas de raios X do (b) silício, (c) cloro,

    (d) cálcio, (e) cobre e (f) chumbo .......................................................................................................... - 27 -

  • A Capela de S. João Baptista: o esplendor do mosaico vítreo - Caracterização dos elementos colorantes

    XII

    Figura 3.28 – Espectro do sulfureto de cobre (a); da Calcite (C), gesso (G) e sulfato de bário (B) (b); do

    sulfato de chumbo (c). ........................................................................................................................... - 28 -

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    XIII

    INDICE DE TABELAS

    Tabela 1: Composição das tesselas, em óxidos (%m/m), obtida por μ-EDXRF. ................................. - 13 -

    Tabela 2: Identificação dos compostos detectados por µ-Raman ....................................................... - 15 -

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    XIV

  • A Capela de S. João Baptista: o esplendor do mosaico vítreo - Caracterização dos elementos colorantes

    XV

    LISTA DE ABREVIATURAS, SIGLAS E SÍMBOLOS:

    EDXRF Espectrometria de Fluorescência de Raios X Dispersiva de Energias

    FCT-UNL Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa

    FTIR Espectroscopia de Infravermelho com Transformada de Fourier

    SEM-EDS Microscopia Electrónica de Varrimento com Espectrometria de Raios X por Energias Dispersivas

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    XVI

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    - 1 -

    1. INTRODUÇÃO HISTÓRICA

    A igreja de S. Roque em Lisboa apresenta uma obra absolutamente ímpar no território

    português: um tríptico e o pavimento em mosaicos de vidro pertencentes à Capela de S. João Baptista,

    datados do século XVIII. A presente dissertação centra-se na caracterização físico-química dos

    mosaicos vítreos, nomeadamente nos seus materiais colorantes, de forma a caracterizar a técnica de

    produção.

    1.1. A Igreja de S. Roque

    A igreja de S. Roque foi fundada pela Companhia de Jesus1 e situa-se na cidade de Lisboa.

    Data da segunda metade do século XVI (Março de 1555) e a sua fachada apresenta uma simplicidade

    de linhas rectas (Figura 1 – Anexo 1) [1][2]. Grande parte das igrejas jesuítas espalhadas pelo mundo

    apresentam bastantes semelhanças na sua estrutura arquitectónica, mas sabe-se que a igreja de S.

    Roque teve como modelo a igreja de Jesus em Roma, (também pertencente à Companhia de Jesus) [1]

    [3]. Relativamente à igreja de S. Roque, a fachada que se apresenta actualmente não é a original, mas

    sim uma reconstrução realizada após o grande terramoto de 1755 em Lisboa. Toda esta igreja constitui

    um dos mais belos monumentos de estilo jesuítico2 em Portugal, dono de uma grandeza

    impressionante, onde se destaca a existência de apenas uma nave bastante extensa e larga, com

    paredes revestidas de quadros. É composta por quatro capelas de cada lado da nave conduzindo até ao

    transepto (Figura 1.1 – Anexo 1) [1-4].

    1.2. A Capela de S. João Baptista

    “A Capela de S. João Baptista é uma das jóias mais belas e puras de Lisboa, e, no seu género, única em Portugal,

    sem temer confrontos lá fora; porque, se tem rivais, nenhuma todavia se pode lisongear de a vencer.”

    [Serafim Leite [1]]

    A capela de S. João Baptista, (Figura 1.2 – Anexo 1) é a capela mais valiosa da igreja de S. Roque.

    Encomendada a Roma a prestigiados arquitectos como Luigi Vantivelli (1700-1773) e Nicola Salvi

    (1697-1751) por D. João V, foi trazida para Lisboa em três naus, depois de ter sido instalada em Roma

    na Igreja de Santo António dos Portugueses, onde foi benzida pelo Papa Bento XIV no ano de 1744

    [1][2]. O nome da capela foi escolhido em honra do generoso rei que a mandou edificar. Foi edificada a

    pedido dos padres da Casa professa de S. Roque a D. João V, que queriam que fosse instituída na sua

    igreja, uma capela consagrada a S. João Baptista. O rei acedeu ao pedido dos clérigos e escolheu o

    lugar da anterior capela do Espírito Santo, para a colocar [1][2]. Em 1742, D. João V mandou construir a

    capela de S. João Baptista, pelos “melhores artistas que existissem na corte romana”, e a

    correspondência com Roma iniciou-se em Outubro desse ano [1][2]. O padre jesuíta italiano Giovanni

    Battista Carbone dirigiu as negociações da edificação da capela que chegou a Lisboa em 1747 [1][3].

    1 Os jesuítas edificaram a igreja, no local onde em 1506 se construiu uma ermida em honra de S. Roque (padroeiro dos doentes

    da peste), junto ao cemitério aí existente, e onde as vítimas da peste foram sepultadas. A primeira pedra da nova igreja foi

    colocada em 1555 após os jesuítas, em 1553 terem tomado conta do local, e ficaram constrangidos pela Irmandade de S. Roque,

    a manter na nova igreja uma capela em honra de S. Roque [3]. 2 Jesuítico e não barroco. O estilo barroco é luxuriante de formas, enquanto que uma das características do estilo jesuítico é a

    pureza de linhas [1].

  • A Capela de S. João Baptista: o esplendor do mosaico vítreo - Caracterização dos elementos colorantes

    - 2 -

    Porém, D. João V faleceu a 31 de Julho de 1750 não conseguindo assim admirar a sua obra finalizada,

    uma vez que os painéis de mosaicos foram somente colocados em 1752. Talvez devido à sua morte

    não se tenha feito uma inauguração (a 13 de Janeiro de 1751) tão esplendorosa e solene como seria

    com a presença de D. João V [1][2].

    “A capela de S. João Baptista e todos os seus pertences custaram a D. João V mais de duzentas e vinte e cinco

    libras esterlinas, soma enorme para o tempo; mas pode Lisboa orgulhar-se de possuir um monumento sacro, como

    não há outro no mundo.”

    [Queiroz Velloso [1]]

    O interior desta capela é designado como um ”museu de história natural, onde a geologia ostenta os

    mais brilhantes, ricos e raros specimens de materiaes de construção e ornato.” [1]. Foram empregues

    muitas pedras, algumas delas até consideradas pedras preciosas, como por exemplo: ametista, branco

    negro antigo, brecha antiga, vários tipos de pórfiro e lápis-lazúli [1][2].

    Dir-se-ia um museu de mineralogia, mas um museu selecto, em que se expuseram apenas a pedras mais raras, mais

    belas e mais custosas, de mais sedutor aspecto e colorido.”

    [Sousa Viterbo [1]]

    No contexto de tanta riqueza, os três painéis do retábulo apresentam-se emoldurados com pórfiro e

    ornados com bronze dourado, e apresentam os seguintes temas: “Baptismo de Cristo”, “Pentecostes”3

    (Figura 1.1) e “Anunciação do anjo”. No pavimento (Figura 1.2) está representada a esfera armilar. No

    anexo 2 encontram-se as descrições dos painéis e do pavimento.

    3 Vinda do Espírito Santo sobre os Apóstolos no Cenáculo.

    Figura 1.1 – Painel lateral (lado da epístola) “Pentecostes”

    Figura 1.2 – Esfera armilar do pavimento em campo

    elíptico.

  • A Capela de S. João Baptista: o esplendor do mosaico vítreo - Caracterização dos elementos colorantes

    - 3 -

    A intervenção de conservação e restauro da igreja inscreveu-se num programa de beneficiação

    da Igreja de S. Roque, iniciada com o reforço estrutural do monumento entre 1997 e 1998 e continuado

    com o restauro da pintura quinhentista do tecto, em 2001. Seguidamente foi realizado o restauro de

    todas as capelas laterais e altar-mor da igreja, e mais recentemente a implementação de um novo

    sistema de iluminação e beneficiação da fachada [4]. Em 2007 a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa

    deu início a um rigoroso processo de análise do estado de conservação dos revestimentos da capela,

    dando prioridade aos que apresentavam problemas de conservação mais complexos: as composições

    em mosaico. Para o efeito, contratou a equipa liderada por Carlo Stefano Salerno, do Istituto Centrale

    per il Restauro di Roma, que em colaboração com a Stazione Sperimentale del Vetro (Murano -

    Veneza), realizou análises laboratoriais a pequenas amostras de mosaicos de quatro cores diferentes

    que apresentavam uma camada de corrosão à superfície e cujos resultados foram publicados em 2008

    [5]. Neste contexto, a Capela de S. João Baptista foi a última a ser intervencionada, com o seu início em

    2010 com a intervenção de conservação e restauro dos elementos pétreos e os bronzes dourados. Os

    resultados obtidos, assim como os subsequentes testes de limpeza realizados em 2008 às composições

    em mosaico, permitiram identificar, pela equipa de restauro4, uma metodologia para a intervenção na

    capela, que teve início em Setembro de 2011 [4]. Foi nesta equipa que a autora da presente dissertação

    foi inserida, cumprindo o plano de restauro dos mosaicos, estipulado previamente pela equipa

    contratada e que será explicado e discutido no anexo 3. Como parte do trabalho referente à dissertação

    de mestrado, apresenta-se a componente de caracterização material dos mosaicos de vidro,

    especialmente dos seus elementos colorantes, da corrosão observada e outras peculiaridades

    observadas nos mosaicos vítreos. A componente científica inscreveu-se nas linhas de investigação

    seguidas pela Unidade de Investigação VICARTE (Vidro e Cerâmica para as Artes) e orientada por

    membros desta equipa.

    1.3. Os mosaicos vítreos da capela de S. João Baptista

    Previamente à manufactura e colocação dos mosaicos vítreos, os temas dos painéis foram

    pintados sobre tela, para servirem de modelo aos mosaicistas. O seu pintor foi Agostino Massucci (1691

    –1758)5, que fez dois exemplares de cada painel: um foi enviado à corte portuguesa e o outro serviu de

    modelo para a execução dos mosaicos, tendo sido também utilizado na inauguração provisória da

    capela, em Lisboa a 13 de Janeiro de 1751. A composição em mosaico esteve a cargo de Mattia Moretti

    (mosaicista activo entre 1730–1760) [6] e seus colaboradores, na Reverenda Fabbrica di San Pietro em

    Roma. O mosaico do pavimento foi trabalhado por vários mosaicistas sob a coordenação de Henrico

    Enuo [1].

    A produção dos mosaicos foi realizada em Roma pelo vidreiro italiano mais célebre e famoso do

    século XVIII – Alessio Mattioli [7]. A actividade de Mattioli está ligada à Reverenda Fabbrica di San

    Pietro em Roma, e à produção em grande escala de mosaicos vítreos para a Basílica de S. Pedro [8].

    Este tipo de mosaicos tem o maior número de exemplares em arte pública em Itália e foram sobretudo

    usados em motivos religiosos, revestimento de pisos e paredes. Os primeiros tipos de painéis de

    mosaicos foram construídos em material pétreo e receberam o título “pintura para a Eternidade”, devido

    4 Enrico Montanelli - Conservazione e Restauro de Opere d'Arte e Beni Culturali, e Carlo Stefano Salerno do Instituto Centrale per

    il Restauro di Roma.

    http://www.icr.beniculturali.it/http://www.icr.beniculturali.it/

  • A Capela de S. João Baptista: o esplendor do mosaico vítreo - Caracterização dos elementos colorantes

    - 4 -

    à durabilidade do material. Os primeiros exemplares surgiram na Mesopotâmia por volta de 3.500 a.C.

    com motivos geométricos e usualmente revestiam colunas [9]. No entanto foi surgindo a necessidade de

    uma decoração mais polícroma com materiais como metais preciosos [9] e materiais vítreos, que foram

    substituindo os outros materiais gradualmente, pois eram resistentes à água e podiam ser produzidas

    numa gama de cores mais extensa e mais intensa [10][11].

    Todo o potencial do mosaico foi explorado, mas foi no mundo bizantino que teve o seu auge,

    muito apreciado devido à permanência de cor e à sua forte resistência à degradação pelo tempo [11].

    Entre os séculos XV e XVI, Veneza era o centro de produção de mosaicos vítreos. Foram

    criadas novas pastas de vidro designadas como “smalti” que permitiam criar uma maior gama de cores,

    e houve assim um aumento de poucas centenas, para milhares de matizes [11]. Com os mosaicos que

    na época eram produzidos em Veneza, Roma tentou adquirir experiencia com os artesãos venezianos

    que tinham decorado a Basílica de S. Marcos durante o século XVI, tornando-se a grande

    impulsionadora da utilização do mosaico para decoração em edifícios religiosos. O papa Gregório XIII

    com a decoração da Capela Gregoriana na Basílica de S. Pedro (encomendada em 1576) iniciou a era

    moderna dos mosaicos vítreos em Roma, e em 1594 foi realizado o primeiro retábulo nesta técnica [12].

    No séc. XVII Marcello Provenzale desenvolveu a técnica do micromosaico, caracterizado por pequenas

    tesselas (tessela é o vocábulo utilizado para designar uma unidade de mosaico). Já no séc. XVIII o

    Vaticano iniciou um programa de pesquisa que levou à produção de tesselas com um número menos

    limitado de cores, no entanto essas cores continuavam a ter um efeito de luz vibrante. E em 1775 foi

    concebido um novo processo de manufactura, em que o vidro era produzido em cânulas e/ou em placas

    e depois cortado em tesselas (Figura 1.3a e 3b) [11][12][13]. É neste contexto que surge o mestre

    vidreiro Alessio Mattioli que foi contratado para a Fabbrica di San Pietro para produzir especialmente os

    vidros vermelhos, laranjas e carnações. No entanto, a sua notoriedade está não só ligada à produção de

    mosaicos com tesselas de dimensões reduzidas (entre 0.5 e 1 cm de comprimento) mas também a um

    composto vítreo totalmente opaco (Figura 1.3a e 1.3b).

    Com esse composto opaco eliminava-se assim o efeito translúcido típico dos mosaicos

    venezianos, e adequado para proporcionar a cada cor, numerosos gradientes cromáticos, permitindo

    assim ampliar a gama de cores necessária para responder às exigências ditadas pela pintura [8]. O uso

    de vidro opaco é documentado desde o início do século XVII; todavia, com o vidro de Mattioli a gama de

    tonalidades aumentou, e a Fábrica de S. Pedro passou a dispor de ca. 28000 gradações de cores

    diferentes, tornando Roma autónoma na produção de mosaicos [8][10][11]. A fama de Mattioli está

    a)

    b)

    c)

    Figura 1.3 – a) Processo de corte das tesselas; b) Tesselas depois de cortadas; c) Pormenor de das tesselas de um painel

    e cera colorida entre as mesmas.

  • A Capela de S. João Baptista: o esplendor do mosaico vítreo - Caracterização dos elementos colorantes

    - 5 -

    também associada ao fabrico de um vidro chamado porporino, uma cor muito apreciada que veio

    substituir o rubino proveniente de Murano [11]. A identificação do “porporino” nos painéis da capela de

    S. João Baptista revelou-se uma tarefa dificultada. A controvérsia inicia-se logo à partida com o nome

    atribuído à cor, pois “porporino” poder-se-á traduzir literalmente como púrpura. No entanto quando é

    reconhecido o facto de ter substituído o dito “rubino”, ter-se-á que associar a cor a uma tonalidade

    vermelha. Esta discussão será abordada posteriormente. Associada a algumas cores de Mattioli, em

    especial ao laranja, carnações, rosa e castanho, existe uma camada superficial denominada scorzetta.

    Este nome deriva da palavra italiana scorza que significa casca e passou a ser o nome usado para

    denominar esta camada escura que cobre as faces laterais das tesselas, e que não está visível ao

    observador no mosaico [8][10][11]. Torna-se difícil perceber a origem desta camada e a intencionalidade

    da mesma, pois há autores que dizem que Mattioli usava a técnica de vidro “rossi al rame” (vermelho de

    cobre) para a obter, não tendo informação da intencionalidade ou não dessa mesma “scorza” [13]. No

    entanto, a sua formação está possivelmente ligada ao arrefecimento rápido do vidro [13]. Este assunto

    será explicado no sub-capítulo 3.8.

    A fábrica de S. Pedro assegurou a exclusividade dos materiais realizados por Mattioli,

    estipulando em 20 de Julho de 1731 um acto notarial que confirmou os acordos para a produção de

    vidro, e impôs ao vidreiro a entrega do “segreto del mosaico di colore cinabro e sue gradazioni scrito e

    sigillato”5 [7]. No entanto, depois da morte do vidreiro, os envelopes foram abertos e não continham

    quaisquer informações. As receitas a que se tem acesso hoje em dia não foram redigidas pelo próprio,

    mas sim pelos seus discípulos. O receituário conhecido de Mattioli deve-se a documentos compilados

    por Pietro Alberti (1775) e Pietro Raffaeli (meados do séc. XIX) e a um manuscrito redigido em alemão

    datado de 1744-1749 e atribuído a Frederico Stribal6 encontrado no Archivio della Fabbrica di San Pietro

    sobre o fabrico do vidro para mosaico, e também da cor designada como porporino [8].

    Apenas no séc. XIX é que a Fabbrica di San Pietro tentou obter uma tradução das notas de

    Stribal em italiano. A versão em italiano desapareceu e os únicos documentos estavam na língua

    saxónica [8][14]. Os registos deixados pelos discípulos de Mattioli sobre as receitas dos mosaicos,

    indicam-nos que ele usava um vidro base de tonalidade branca para produzir a quase totalidade das

    cores, vidro este que apresentava um elevado teor em chumbo, e sódio como fundente e a cor branca

    adivinha da adição de estanho e antimónio. Formar-se-ia durante a fusão do vidro óxido de estanho e

    antimoniato de cálcio, dois conhecidos opacificantes [8] [15].

    As diferentes cores eram obtidas adicionando óxidos de metais de transição correspondentes à

    cor pretendida e ajustando os teores em algumas matérias-primas para alcançar a tonalidade desejada

    [8]. A Figura 1.4 resume as principais classes de cores conhecidas do receituário de Mattioli [8]. O

    preenchimento do espaço entre as tesselas do mosaico é feito com uma cera colorida (Figura 1.3c). A

    cor desta cera varia consoante a cor das tesselas a que está associada. Assim, todos os espaços são

    preenchidos com cor de modo a criar uma ilusão de continuidade, o que, juntamente com esta

    variedade cromática, faz com que os mosaicos se assemelhem tanto a uma pintura.

    5 Tradução: “segredo do mosaico de cor cinábrio e suas gradações, escrito e em sigilo”.

    6 Discípulo de Mattioli, que tomou notas sobre as receitas de Mattioli e as publicou em 12 livros [8].

  • A Capela de S. João Baptista: o esplendor do mosaico vítreo - Caracterização dos elementos colorantes

    - 6 -

    1.4. Receituário de Alessio Mattioli

    Os únicos registos das receitas de Mattioli para produzir as pastas de vidro foram deixadas por

    discípulos seus. Pogliani e Seccaroni [8] publicaram uma compilação com o receituário de Mattioli, e

    Porfiri descreveu a técnica de produção do “porporino” e “scorzetta” [8].

    Para a elaboração da frita, Mattioli propõe um procedimento, que usou para todos os esmaltes,

    diferente do que era adoptado para a realização da cor rubino. As matérias-primas comuns a todos os

    esmaltes seriam uma fonte de quartzo (“ciottoli quarzosi” – pedras contendo quartzo) e cinzas de soda

    (fonte de sódio) como fundente. Para opacificar o vidro, Mattioli utilizaria uma fonte de estanho (estanho

    calcinado), que precipita num vidro plúmbico sob a forma de cassiterite (SnO2). Ao vidro branco era

    adicionado uma composição de chumbo, estanho e antimónio, dando origem a soluções sólidas dos

    respectivos óxidos e provavelmente também à parcial formação de óxidos ternários. Para os vidros

    amarelos, era adicionado ao vidro branco óxido de chumbo (menciona-se a adição de minio, Pb3O4),

    com o qual se realiza um amarelo com forte excesso de chumbo. Com a variação da percentagem de

    chumbo e de ferro, obtinham-se colorações de amarelo intermédias. O amarelo dourado era à base de

    antimoniato de chumbo com cloreto de amónio (NH4Cl). Neste receituário diz-se que Mattioli adicionava

    também limalha de ferro que levava à formação de óxidos ternários. As cores amarelas mais claras

    obtinham-se devido à adição de maior quantidade do vidro branco. Por outro lado o amarelo mais

    escuro, semelhante à cor da pele de leão (Leonato) era devido à adição de óxido de manganês [8].

    O azul era obtido adicionando ao vidro branco dois materiais à base de cobalto: safra (minério

    de cobalto calcinado) e o esmalte azul (pigmento que era um vidro de potássio contendo cobalto).

    Relativamente aos verdes, nestes não seriam usados compostos de cobre. Obtinham-se misturando

    vidro amarelo com o turquesa. Os autores Pogliani e Secaroni justificam a ausência do cobre devido à

    vontade de controlar a tonalidade da cor, variando proporcionalmente as doses de amarelo e azul “e

    talvez para compensar a dificuldade de obter colorações verdes com ião Cu++

    numa matriz de chumbo”

    [8]. A cor negra era obtida com óxido de manganês e a cor cinzenta com uma mistura de antimónio e

    limalha de ferro. A cor laranja assemelha-se ao laranja “becco di melro” que era difícil de realizar.

    Mattioli usava um vidro fortemente plúmbico, colorido com óxido de cobre, ferro e estanho. O estanho

    teria uma função de aumentar a opacidade da pasta. A cor designada “rubino” continha um vidro base

    Cristallo

    Frita

    Branco leite

    Branco

    Branco para tom de pele

    Rubino

    Aquamarina

    Purpura

    Bege

    Negro

    Turchino

    Amarelo

    Amarelo de ouro

    Laca

    Giuggiolino

    Amarelo Verde

    Carnações

    Laca

    Roxo

    Verde

    Leonato

    Figura 1.4 – Diagrama resumido dos componentes que se pensa terem sido usados por Mattioli [8].

  • A Capela de S. João Baptista: o esplendor do mosaico vítreo - Caracterização dos elementos colorantes

    - 7 -

    diferente, menos rico em opacificantes e com adição de antimónio além de chumbo e estanho. O

    excesso de chumbo é conferido em maior quantidade pelo minio.

    A autora R. Porfiri, relata as receitas de Pietro Alberti e Pietro Rafaelli para fazer o porporino e a

    scorzetta, e refere-se a elas como “due speciali smalti, color porpora ed incarnato” [13]. Escreve que

    para a scorzetta, Mattioli usava a técnica do vermelho de cobre em que o vidro ainda incolor era

    colocado no forno para assumir a coloração. Refere a possibilidade de coloração coloidal, pois

    partículas coloidais podem formar-se durante o processo, por agregação dos átomos metálicos de

    cobre. Maior era o crescimento das partículas e mais a cor mudava de laranja para castanho. Para

    favorecer a redução do cobre, adicionava-se tartarato de sódio (K2C4H4O6), enxofre e outros compostos

    de ferro, antimónio e estanho. Conseguia obter a coloração vermelha através de cristais de cuprite

    (Cu2O). Refere ainda que a fusão do vidro era feita em duas fases [13]. A formação da scorzetta pode

    estar associada ao rápido arrefecimento da superfície. Em relação ao porporino, refere-se a este como

    vidro púrpura preparado a partir de uma suspensão coloidal de ouro, prata e mercúrio e misturada com

    estanho calcinado, cinábrio (HgS), minío, cobre calcinado, safra, boráx (borato de sódio,

    Na2B4O7.10H2O) e uma fonte de óxido de ferro [8].

  • A Capela de S. João Baptista: o esplendor do mosaico vítreo - Caracterização dos elementos colorantes

    - 8 -

  • A Capela de S. João Baptista: o esplendor do mosaico vítreo - Caracterização dos elementos colorantes

    - 9 -

    2. PROCEDIMENTO EXPERIMENTAL

    Figura 2.1 – Fragmentos de tesselas de diferentes cores.

    2.1. Amostras estudadas

    Estudou-se um conjunto de 29 fragmentos coloridos de tesselas de vidro do século XVIII,

    provenientes da capela de S. João Baptista, retirados dos painéis e pavimento. A Figura 2.1 mostra

    alguns exemplos destas amostras. Foram retiradas várias amostras representativas de várias cores e

    gradações. No anexo 4, apresentam-se todas as amostras retiradas, e no anexo 5 a sua localização nos

    painéis e pavimento. Estes fragmentos foram retirados dos painéis e pavimento com o auxílio de um

    bisturi e pinça. Muitos destes fragmentos foram posteriormente recolocados na obra.

    2.2. Técnicas de observação e análise

    As técnicas analíticas utilizadas para a análise das tesselas foram: a microscopia electrónica de

    varrimento com microanálise de raios X (SEM-EDS), a microscopia óptica, a fluorescência de raios X

    dispersiva de energias (μ-EDXRF) e a microscopia de Raman. Estas técnicas foram seleccionadas para

    determinar a composição elementar e molecular dos vidros em estudo, assim como a sua morfologia.

    Microscópio electrónico de varrimento com microanálise de raios X (SEM-EDS)

    Utilizou-se um equipamento HITACHI 3700N acoplado a um espectrómetro de energia

    dispersiva de raio X Bruker Xflash 5010. Todas as amostras foram analisadas em alto vácuo e a uma

    tensão de 20 kV. O equipamento pertence ao Laboratório Hércules na Universidade de Évora.

    Microscópio óptico

    A superfície dos mosaicos foi observada num microscópio óptico Zeiss Axionplan 2 com câmara

    de alta resolução Nikon DXM 1200F a várias ampliações. O equipamento pertence ao Laboratório

    Científico do Departamento de Conservação e Restauro da FCT-UNL.

    Micro-análise por fluorescência de raios X dispersiva de energias (μ-EDXRF)

    As amostras foram analisadas in situ, usando um espectrómetro ArtTAX, Intax®, equipado com

    um tubo de raios X com alvo de molibdénio (Mo) de diâmetro de aproximadamente 70 µm e detector de

    Si (Li) Xflash refrigerado por efeito Peltier®. O aparelho pertence ao Laboratório Científico do

    Departamento de Conservação e Restauro da FCT-UNL e detecta elementos de número atómico ≥13

    (alumínio).

    P10 C13

    B4

    B6

    C19

    A4 C18

    C3 C5

    C9

    A2

    C11

  • A Capela de S. João Baptista: o esplendor do mosaico vítreo - Caracterização dos elementos colorantes

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    Em todos os casos, o espectrómetro foi operado com os seguintes parâmetros fixos: tensão de

    40 kV, intensidade de feixe e excitação de 600 µA e tempo de acumulação de 300 segundos, numa

    atmosfera de hélio. Foram adquiridos espectros em 2 ou 3 pontos por amostra.

    Para análise semi-quantitativa procedeu-se à deconvulsão dos espectros com o programa

    WinAxil e à quantificação com o programa Winfund, utilizando o método dos parâmetros fundamentais.

    A exactidão do método foi calculada através da análise de dois padrões de vidro plúmbico (CMOG C e

    SGT8). As composições deste vidros podem ser consultadas no Anexo 6. Determinou-se que a

    exactidão foi inferior a 5% para SiO2, K2O, CoO, CuO, ZnO, BaO e PbO, inferior a 15% para CaO, Fe2O3

    e Sb2O3, e inferior a 30% para TiO2, As2O3 e SnO2. A exactidão para Cl, NiO e MnO não foi calculada

    por estes não se encontrarem na composição dos padrões. O equipamento pertence ao Laboratório

    Científico do Departamento de Conservação e Restauro da FCT-UNL.

    Espectroscopia de Infravermelho com Transformada de Fourier (μ-FTIR)

    Os espectros de infravermelho foram obtidos através do espectrómetro de Infravermelho Nicolet

    Nexus – Existente no Laboratório Científico do Departamento de Conservação e Restauro da FCT-UNL

    – acoplado a um microscopio Continuμm, no modo ATR (Attenuated Total Reflaction). Os espectros

    foram adquiridos com ponta de diamante, em reflectância, com resolução de 4 cm-1

    e 128 varrimentos.

    Analisou-se os espectros pelo programa de software OMINIC registados entre o intervalo de 4000 a

    650cm-1

    . O equipamento pertence ao Laboratório Científico do Departamento de Conservação e

    Restauro da FCT-UNL.

    Micro-espectroscopia de Raman

    O equipamento utilizado foi um espectrofotómetro de Raman (LabRam da Horiba Jobin Yvon)

    equipado com um laser interno (He-Ne) com comprimento de onda de excitação de 633 nm e um laser

    externo (estado sólido) com comprimento de onda de excitação de 532 nm. O microscópio acoplado da

    Olympus BXFM-ILHS, apresenta objectivas U-5RE-2 com ampliação 10x, 50x e 100x. A focagem e

    movimentação da plataforma são realizadas com uma plataforma motorizada. A calibração do aparelho

    é realizada diariamente com um padrão de silício. As condições de aquisição médias foram de 20 s de

    aquisição e 15 acumulações. O equipamento pertence ao Laboratório Científico do Departamento de

    Conservação e Restauro da FCT-UNL.

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    - 11 -

    3. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

    3.1. Caracterização química das tesselas

    As amostras foram na sua totalidade analisadas por µ-EDXRF e µ-Raman. As amostras A1, A3,

    A4, B6, C2, C3, C13 e C22 foram analisadas por SEM-EDS, para se ter uma visão generalizada da

    morfologia destas tesselas, e no caso particular das amostras B5, B6, B7, A1, C18 e P5 reconhecer a

    morfologia e composição química associada à scorzetta, e nas amostras A1, A3 e A4 reconhecer a

    morfologia e a composição química da camada de corrosão. A identificação dos espectros de µ-Raman

    foi realizada tendo em conta bases de dados selecionadas para o efeito [16-19]. As excepções serão

    mencionadas durante a discussão dos resultados. A semi-quantificação dos resultados obtidos através

    da análise por µ-EDXRF teve como objectivo caracterizar a composição química das diferentes cores e

    compará-las entre si, assim como obter um melhor conhecimento acerca da composição base do vidro

    que compõe as tesselas. Uma vez que o aparelho utilizado não permite a detecção de elementos com

    número atómico inferior a 13 (Al), os resultados serão comparados, sempre que se justifique, com

    quantificações pontuais realizadas por SEM-EDS. Desta forma, pretende estimar-se a contribuição de

    outros elementos (p. e. Na) para a composição das tesselas.

    Na tabela 1 podem consultar-se os resultados da semi-quantificação por µ-EDXRF.

    Exceptuando algumas tesselas verdes e azuis, todas as amostras contêm teores elevados de PbO,

    entre os 21% e 57% (m/m). De um modo geral, as tesselas laranja, rosa, vermelhas e castanhas

    apresentam teores de chumbo superiores às restantes cores, como se pode observar na Figura 3.1,

    assim como teores de sílica inferiores.

    Através da análise por SEM-EDS, foi possível detectar alumínio, sódio e magnésio nas tesselas

    C3, C22, C13 e C2, com teores elementares aproximados de 4% para o sódio, 2% para o magnésio e

    2% para o alumínio (m/m). As amostras A3, A4 e A5 apresentam diferenças significativas nos teores de

    Na, Mg e Al dentro do próprio corpo do vidro (vide sub-capítulo 3.4.2). Deve ter-se em conta que estes

    valores correspondem a uma semi-quantificação e servem apenas como valores de referência, uma vez

    que não foi possível calcular a exactidão da análise efectuada por SEM-EDS. Os teores de óxido de

    potássio revelam-se relativamente elevados, variando entre ca. 2% a 9% (m/m) para as cores laranja,

    rosa e castanhos, mas subindo acima de 10% (m/m) para a maioria dos azuis e verdes, Uma vez que

    Figura 3.1 – Razão entre os teores de PbO e SiO2 (%m/m) obtidos por µ-EDXRF.

  • A Capela de S. João Baptista: o esplendor do mosaico vítreo - Caracterização dos elementos colorantes

    - 12 -

    são estas últimas as cores que também apresentam teores mais baixos de PbO, o K2O poderá ter sido

    adicionado propositadamente para substituir o chumbo como fundente. As fontes para o potássio podem

    ser diversas: carbonato de potássio, felspatos potássicos introduzidos com a areia ou ainda o muito

    comum tartarato de potássio, referido em vários tratados da época como tartaro calcinato ou sale de

    tartaro, e que era obtido através da calcinação das borras do vinho [8][12][16]. O cálcio está também

    presente em todas as amostras com teores consideráveis (ca. 2 a 11% m/m), não actuando apenas

    como fundente, mas tendo um papel fundamental como opacificante, como se explicará posteriormente.

    A tabela 2 apresenta os resultados obtidos por µ-Raman.

  • A Capela de S. João Baptista: o esplendor do mosaico vítreo - Caracterização dos elementos colorantes

    - 13 -

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    46

    .83

    3.3

    8

    45

    .53

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    0

    44

    .29

    1.0

    5

    7.7

    0

    0.6

    1

    43

    .71

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    3

    55

    .71

    11

    .34

    47

    .92

    4.5

    8

    24

    .64

    2.7

    9

    24

    .57

    3.0

    6

    39

    .04

    0.5

    3

    9.3

    2

    1.5

    1

    54

    .45

    1.2

    8

    54

    .17

    6.3

    9

    5.8

    0

    1.1

    8

    BaO

    0.5

    7

    0.0

    4

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    8

    0.1

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    4

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    1

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    0.0

    9

    Sb

    2O

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    1

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    0

    0.0

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    1

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    0.0

    0

    11

    .14

    2.4

    7

    0.0

    6

    0.0

    2

    0.0

    2

    0.0

    3

    0.0

    3

    0.0

    2

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    0

    Sn

    O2

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    0

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    1

    15

    .77

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    0.0

    5

    0.0

    1

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    7

    0.0

    0

    SrO

    0.0

    2

    0.0

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    1

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    1

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    0

    0.0

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    0.0

    1

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    0.0

    7

    0.0

    7

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    1

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    0.0

    2

    0.0

    0

    0.0

    1

    0.0

    0

    As

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    0

    0.5

    7

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    1

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    2

    0.0

    0

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    3

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    2

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    1

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    0

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    0.0

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    0.0

    0

    0.0

    1

    0.0

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    7

    0.0

    0

    0.0

    7

    0.0

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    0.0

    8

    0.0

    1

    0.0

    0

    Cu

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    0.6

    4

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    7

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    3

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    4

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    5

    10

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    0.9

    0

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    2

    0.0

    1

    3.8

    3

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    1

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    3

    3.0

    3

    0.0

    1

    3.7

    0

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    6

    0.0

    1

    0.0

    0

    13

    .60

    0.0

    4

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    8

    0.8

    4

    0.0

    4

    0.0

    1

    3.1

    2

    0.3

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    9

    0.8

    1

    NiO

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    1

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    1

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    5

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    0.0

    1

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    0.0

    0

    1.2

    2

    0.1

    3

    0.1

    8

    0.0

    1

    0.2

    7

    0.0

    8

    1.0

    2

    0.0

    0

    1.3

    1

    0.3

    2

    0.5

    4

    0.0

    0

    2.5

    4

    0.0

    9

    0.8

    1

    0.1

    6

    1.2

    2

    0.0

    0

    0.4

    3

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    3

    0.8

    7

    0.1

    1

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    1

    0.0

    9

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    1

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    1

    0.0

    1

    0.0

    7

    0.0

    5

    1.4

    0

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    5

    0.4

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    0.1

    2

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    6

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    0

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    4

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    8

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    1

    0.0

    1

    0.0

    3

    0.0

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    1

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    7

    TiO

    2

    0.1

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    1

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    1

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    0.0

    7

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    2

    0.4

    2

    CaO

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    3

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    4

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    2

    0.6

    2

    2.9

    1

    0.5

    5

    3.1

    6

    0.2

    7

    0.0

    2

    0.0

    1

    6.1

    7

    0.7

    9

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    0

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    0

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    5

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    0

    7.3

    0

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    5

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    7

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    1

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    4

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    7

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    7

    10

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    4

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    6

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    4

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    1

    1.1

    9

    7.7

    0

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    4

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    1

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    0.0

    7

    18

    .61

    1.4

    2

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    7

    0.2

    9

    2.6

    1

    0.6

    4

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    1

    0.1

    8

    5.5

    9

    1.7

    5

    9.3

    9

    1.0

    3

    4.9

    6

    0.0

    0

    11

    .96

    2.4

    3

    13

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    4

    0.5

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    8

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    2

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    2

    4.2

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    1.0

    2

    2.7

    9

    0.1

    8

    1.4

    3

    0.4

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    2.0

    5

    0.4

    7

    1.3

    0

    0.0

    9

    0.7

    5

    0.0

    8

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    0

    0.0

    7

    3.8

    0

    0.3

    7

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    6

    0.1

    7

    SiO

    2

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    .66

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    3

    37

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    5

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    .75

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    6

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    2

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    6

    31

    .03

    10

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    9

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    8

    21

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    5

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    7

    18

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    B4

    B5

    B6

    B7

    C2

    C3

    C4

    C5

    C6

    C7

    C9

  • A Capela de S. João Baptista: o esplendor do mosaico vítreo - Caracterização dos elementos colorantes

    - 14 -

    Com

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    .45

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    6

    6.8

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    0.0

    2

    5.2

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    0.0

    8

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    .63

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    6

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    0.4

    5

    33

    .10

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    0

    15

    .02

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    2

    25

    .88

    0.5

    5

    BaO

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    4

    0.1

    0

    0.1

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    0.1

    6

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    3

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    1

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    1

    0.1

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    0.0

    3

    0.2

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    3

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    2

    0.0

    0

    0.5

    0

    0.1

    7

    0.2

    2

    0.0

    8

    Sb

    2O

    5

    0.0

    4

    0.0

    2

    0.0

    5

    0.0

    0

    0.0

    5

    0.0

    1

    0.0

    6

    0.0

    1

    0.0

    4

    0.0

    1

    0.0

    5

    0.0

    3

    1.9

    5

    0.5

    5

    0.0

    6

    0.0

    1

    0.0

    5

    0.0

    1

    0.0

    2

    0.0

    0

    0.0

    2

    0.0

    0

    0.0

    6

    0.0

    0

    8.3

    0

    1.1

    5

    8.6

    4

    2.8

    6

    0.0

    4

    0.0

    2

    Sn

    O2

    0.0

    6

    0.0

    3

    0.6

    4

    0.0

    5

    0.4

    1

    0.5

    8

    3.5

    5

    1.0

    0

    1.8

    3

    0.7

    5

    1.0

    4

    0.1

    2

    2.3

    6

    0.0

    0

    0.9

    8

    0.1

    2

    3.4

    5

    1.8

    5

    5.1

    1

    2.2

    2

    1.1

    0

    0.2

    8

    SrO

    0.0

    3

    0.0

    1

    0.0

    1

    0.0

    0

    0.0

    7

    0.0

    1

    0.1

    0

    0.0

    1

    0.1

    3

    0.0

    2

    0.0

    4

    0.0

    4

    0.0

    4

    0.0

    0

    0.0

    5

    0.0

    5

    0.1

    0

    0.0

    1

    0.0

    3

    0.0

    0

    0.0

    6

    0.0

    0

    As

    2O

    5

    0.8

    1

    0.1

    3

    1.9

    5

    0.0

    0

    5.6

    4

    1.2

    0

    0.4

    6

    0.0

    0

    1.4

    7

    0.0

    5

    3.2

    4

    1.0

    8

    Zn

    O

    0.0

    3

    0.0

    0

    0.0

    2

    0.0

    1

    0.0

    3

    0.0

    1

    0.2

    1

    0.0

    1

    0.2

    0

    0.0

    3

    0.0

    4

    0.0

    1

    0.5

    1

    0.0

    1

    0.0

    7

    0.0

    0

    0.0

    3

    0.0

    1

    0.0

    4

    0.0

    0

    0.6

    2

    0.0

    9

    0.4

    8

    0.0

    1

    0.5

    2

    0.0

    3

    0.0

    5

    0.0

    1

    0.0

    6

    0.0

    0

    Cu

    O

    0.6

    7

    0.3

    4

    0.0

    3

    0.0

    0

    0.0

    1

    0.0

    1

    0.0

    4

    0.0

    0

    1.2

    4

    0.0

    5

    5.8

    1

    0.9

    1

    0.5

    8

    0.1

    3

    14

    .04

    0.3

    3

    14

    .47

    0.4

    5

    0.0

    8

    0.0

    0

    0.0

    6

    0.0

    0

    0.8

    7

    0.1

    3

    0.6

    5

    0.0

    3

    5.4

    4

    0.2

    5

    0.6

    5

    0.1

    1

    0.0

    8

    0.0

    0

    NiO

    0.0

    3

    0.0

    1

    Co

    O

    0.6

    3

    0.1

    0

    0.7

    6

    0.8

    2

    0.1

    2

    0.0

    0

    0.0

    2

    0.0

    0

    0.0

    1

    0.0

    0

    Fe

    2O

    3

    4.4

    4

    3.7

    7

    0.6

    5

    0.0

    7

    0.4

    5

    0.2

    2

    0.6

    7

    0.0

    0

    2.4

    8

    0.1

    0

    0.8

    9

    0.0

    8

    0.9

    8

    0.0

    0

    0.3

    6

    0.0

    1

    0.8

    3

    0.0

    0

    0.7

    5

    0.1

    6

    0.9

    2

    0.0

    0

    2.0

    7

    1.2

    9

    0.3

    8

    0.0

    1

    0.9

    3

    0.0

    6

    0.9

    4

    0.2

    2

    1.0

    3

    0.0

    6

    Mn

    O

    1.1

    3

    0.3

    1

    0.0

    3

    0.0

    0

    0.0

    1

    0.0

    1

    0.1

    3

    0.0

    0

    3.0

    5

    0.1

    0

    0.3

    0

    0.0

    4

    10

    .55

    0.2

    8

    0.0

    6

    0.0

    5

    1.6

    5

    0.0

    0

    0.4

    7

    0.0

    9

    0.4

    3

    0.0

    1

    0.0

    7

    0.0

    3

    0.0

    4

    0.0

    0

    1.0

    6

    0.0

    6

    6.1

    2

    0.9

    4

    2.1

    3

    0.0

    6

    TiO

    2

    0.2

    3

    0.0

    1

    0.1

    3

    0.0

    2

    0.2

    0

    0.0

    4

    0.0

    7

    0.0

    0

    0.0

    2

    0.0

    2

    CaO

    9.6

    8

    3.8

    9

    4.8

    3

    1.6

    2

    2.9

    0

    1.4

    6

    7.8

    3

    0.3

    6

    9.9

    3

    0.0

    0

    3.1

    9

    2.5

    1

    5.8

    1

    1.4

    5

    3.3

    8

    0.3

    1

    5.9

    8

    0.6

    9

    7.2

    8

    2.2

    0

    10

    .70

    0.0

    0

    9.3

    6

    1.8

    6

    5.0

    5

    1.0

    7

    5.3

    1

    0.5

    7

    7.2

    0

    1.6

    5

    8.0

    0

    1.0

    0

    K2O

    5.1

    5

    1.7

    6

    4.5

    3

    1.6

    2

    4.6

    3

    2.7

    3

    10

    .88

    0.5

    5

    13

    .12

    0.1

    0

    4.6

    1

    0.5

    0

    3.3

    8

    3.0

    9

    1.8

    3

    0.1

    1

    8.1

    9

    0.4

    8

    12

    .76

    4.4

    7

    17

    .62

    0.1

    8

    4.7

    6

    0.7

    6

    5.4

    7

    0.2

    9

    3.7

    6

    0.2

    4

    8.0

    9

    0.9

    2

    14

    .34

    0.5

    5

    Cl

    2.4

    2

    1.1

    1

    1.7

    9

    0.1

    4

    2.5

    4

    0.8

    6

    2.1

    6

    0.2

    7

    0.8

    3

    0.3

    1

    2.8

    9

    0.4

    2

    0.2

    6

    0.2

    2

    3.0

    5

    0.0

    6

    1.8

    5

    0.0

    7

    0.7

    3

    0.1

    3

    0.9

    6

    0.0

    4

    2.8

    1

    0.3

    2

    3.7

    6

    0.1

    8

    2.6

    2

    0.1

    5

    1.4

    6

    0.3

    8

    1.0

    2

    0.0

    4

    SiO

    2

    27

    .09

    9.4

    2

    14

    .93

    0.0

    2

    39

    .69

    2.7

    1

    19

    .34

    0.7

    8

    51

    .77

    3.0

    1

    31

    .31

    0.8

    4

    46

    .38

    0.6

    9

    29

    .64

    0.7

    6

    33

    .06

    3.1

    2

    64

    .43

    0.0

    0

    63

    .16

    2.3

    3

    21

    .56

    0.7

    0

    31

    .94

    0.8

    9

    33

    .50

    0.8

    9

    42

    .90

    5.8

    4

    46

    .02

    1.7

    3

    Co

    r

    Lara

    nja

    ±

    Am

    are

    lo ±

    Bra

    nco ±

    Lara

    nja

    ±

    Ve

    rme

    lho

    ±

    Lara

    nja

    ±

    Roxo

    ±

    Casta

    nh

    o

    ±

    Ve

    rme

    lho

    ±

    Azu

    l

    ±

    Azu

    l

    ±

    Casta

    nh

    o

    ±

    Lara

    nja

    ±

    Casta

    nh

    o

    ±

    Verd

    e ±

    Am

    are

    lo ±

    Am

    ostr

    a

    C1

    1

    C1

    2

    C1

    3

    C1

    4

    C1

    5

    C1

    6

    C1

    9

    C2

    0

    C2

    1

    C2

    2

    C2

    3

    P4

    P5

    P6

    P9

    P10

  • A Capela de S. João Baptista: o esplendor do mosaico vítreo - Caracterização dos elementos colorantes

    - 15 -

    Tabela 2: Identificação dos compostos detectados por µ-Raman

    Amostra A1

    A2

    A3

    A4

    A5

    B4

    B5

    B6

    B7

    C2

    C3

    C4

    C5

    C6

    C7

    C9

    C 11

    C 12

    C 13

    C 14

    C 15

    C 16

    C 18

    C 19

    C 22

    P4

    P6

    P8

    P 10

    Cor

    Lara

    nja

    Lara

    nja

    Rosa

    Rosa

    Rosa

    Azul

    Lara

    nja

    Lara

    nja

    Lara

    nja

    Verd

    e

    Azul

    Lara

    nja

    Verd

    e

    Azul

    Casta

    nh

    o

    Verd

    e

    Lara

    nja

    Am

    are

    lo

    Bra

    nco

    Lara

    nja

    Verm

    elh

    o

    Lara

    nja

    Lara

    nja

    Roxo

    Azul

    Casta

    nh

    o

    Casta

    nh

    o

    Lara

    nja

    Am

    are

    lo

    Antimoniato de cálcio

    (Ca2Sb2O7)

    X

    X

    X X

    X X

    X X

    X

    Cassiterite (SnO2)

    X

    Quartzo (SiO2)

    X

    X X

    Anatase

    (TiO2) X

    X

    X

    X

    X

    Feldspato

    X

    X

    Estrutura tipo pirocloro

    (Sb3+

    Sb5+

    2O6(OH)) X X

    X

    X

    X X

    Óxido Ternário X X

    X

    X X X

    X

    X

    X

    X X

    X X X X

    Cuprite (Cu2O)

    X

    X X

    X

    X X X X

    X X

    Sulfureto de Cobre (CuSO4)

    X

    Tenorite (CuO)

    X

    X

    Hematite (Fe2O3)

    X

    X

    X

    X

    X

    Forsterite (Mg2SiO4)

    X

    X

    Sulfato de chumbo (PbSO4)

    X

    Gesso (CaSO4.2H2O)

    X

    X

    X

    X X

    Calcite (CaCO3)

    X

    X

    X

    X

    X X

    X

    X

  • A Capela de S. João Baptista: o esplendor do mosaico vítreo - Caracterização dos elementos colorantes

    - 16 -

    3.2. Vidro Branco

    O vidro branco, tal como indicado no receituário conhecido [8] seria o vidro base para a maioria

    das cores produzidas na Revenda Fabbrica di San Pietro. A opacificação do vidro seria alcançada

    através do produto de oxidação do chumbo e do estanho, formando-se óxido de estanho IV (SnO2),

    comummente conhecido como cassiterite. O receituário mencionava a adição de uma fonte de

    antimónio, levando por um lado à formação de óxidos ternários de chumbo, antimónio e estanho (vide

    capítulo 3.3) e, por outro lado com o cálcio presente, conduziria à formação de antimoniato de cálcio

    (CaSb2O6 ou Ca2Sb2O7), um conhecido opacificante branco. Este é possivelmente o mais antigo

    opacificante conhecido, encontrado extensivamente em vidros egípcios e romanos [11][15][20].

    A amostra C13 de cor branca quando observada ao microscópio óptico revela uma superfície

    bastante homogénea. Porém, as imagens de SEM-BSE, mostram uma morfologia heterogénea (Figura

    3.2 a e b), com múltiplos cristais brancos. Por EDS alguns destes cristais foram identificados como uma

    mistura de antimónio e cálcio (Figura 3.2c) com teores elementares entre 11% e 25% (m/m)

    respectivamente, indicando a presença de antimoniato de cálcio. As análises da matriz vítrea por SEM-

    EDS e µ-EDXRF revelam resultados díspares nos teores atribuídos ao antimónio, apresentando a semi-

    quantificação por µ-EDXRF teores muito reduzidos de ca. 0.03% m/m.

    Finalmente por análise directa aos cristais brancos por µ-Raman, identificam-se as bandas

    características a ca. de 482 e 634 cm-1

    do antimoniato de cálcio na forma ortorrômbica Ca2Sb2O7 [21]

    (Figura 3.3). De salientar que este resultado é consistente em todas as amostras analisadas que

    continham o vidro base branco, sem evidência espectral da forma hexagonal CaSb2O6 que apresenta

    um espectro de Raman distinto. Estudos recentes apontam que a formação de uma fase ortorrômbica

    de antimoniato de cálcio indica por um lado, temperaturas de fusão superiores a 1000ºC, e por outro

    lado, uma razão Sb/Ca perto de 1 [20]. Ao contrário do que é mencionado no receituário [8], não se

    encontraram evidências de estanho nesta amostra por nenhuma das técnicas utilizadas. A identificação

    do estanho por µ-EDXRF é por vezes dificultada pela sobreposição das linhas L deste elemento com as

    linhas K do cálcio e do potássio. Este problema estende-se também ao antimónio e pode justificar os

    v

    Figura 3.2 – (a) Imagem da superfície da amostra C13, (b)

    cristais brancos de antimoniato de cálcio e (c) espectro EDS

    correspondente à análise dos cristais brancos.

    Figura 3.3 – Espectro de µ-Raman do antimoniato

    de cálcio Ca2Sb2O7 (amostra c13)

    200 400 600 800 1000

    Inte

    nsid

    ad

    e R

    am

    an

    Numero de onda (cm1)

    482

    634

    (b)

    (a)

    (c)

  • A Capela de S. João Baptista: o esplendor do mosaico vítreo - Caracterização dos elementos colorantes

    - 17 -

    teores baixos deste elemento obtidos através da semi-quantificação. Contudo, através do SEM-EDS,

    onde a detecção do Sb foi totalmente conclusiva, também não se identificou a presença de Sn quer nas

    partículas brancas, quer na matriz vítrea, pelo que se poderá concluir que, a existir nesta amostra, o

    estanho estaria presente em teores extremamente reduzidos.

    3.3. Vidro Amarelo

    As amostras C12 e P10, de cor amarela, revelaram um corpo vítreo em geral homogéneo que

    na amostra P10 apresenta partículas de cor laranja distribuídas irregularmente na matriz vítrea (Figura

    3.4). As análises químicas por µ-EDXRF revelaram a presença de Pb e Sb em ambas as amostras e

    teores elevados de óxido de potássio (9.5% e 11.5% m/m para as amostras C12 e P10,

    respectivamente).

    Os teores elevados de K podem estar relacionados com a receita utilizada na manufactura do

    pigmento amarelo: algumas receitas antigas mencionam o uso de tartarato de potássio como fundente

    [22]. O estanho foi também identificado em ambos os amarelos, com teores entre 0.64% e 1.10% (m/m)

    (ver tabela 1). As análises por µ-Raman tanto na matriz vítrea como nas partículas laranja identificam

    um óxido que contém antimónio e chumbo, relacionado quimicamente com o famoso pigmento amarelo

    de Nápoles (Pb2Sb2O7), um pigmento muito utilizado a partir do séc. XVI em cerâmica, vidro e pintura

    [23]. O pigmento amarelo de Nápoles apresenta uma estrutura de pirocloro cúbica (A2B2O6O’ com

    possíveis combinações de A2+

    , B5+

    ou A3+

    e B4+

    ) e é isoestrutural com o mineral bindemite

    (Pb2Sb2O6(O,OH)). Em 1998, os autores Roy e Berrie revelaram a utilização em pintura do séc. XVII de

    uma versão modificada do pigmento amarelo de Nápoles com uma estrutura designada de óxido triplo,

    que incluía o chumbo, o antimónio e o estanho (Pb2Sb2-xSnxO7-x/2) [24]. Os espectros de µ-Raman

    obtidos nas tesselas amarelas são consistentes com a estrutura do pirocloro modificado, identificados

    comummente como óxidos triplos de Pb-Sb-Sn ou Pb-Sb-Zn, onde o Sn ou Zn entram na estrutura do

    pirocloro substituindo o Sb [25]. Os espectros representados na Figura 3.5 exemplificam os resultados

    obtidos para o vidro amarelo, onde é possível distinguir dois tipos de espectros com as seguintes

    características: banda de elevada intensidade referente à vibração Pb-O a números de onda baixos

    (119–139 cm−1), bandas de fraca ou média intensidade a ca. de 200 e 400 cm−

    1 e uma banda de média

    intensidade a ca. 510 cm−1, a banda A1g, correspondendo à elongação simétrica do octaedro SbO6. A

    Figura 3.5a corresponde a um caso onde a zona do espectro correspondente à ligação Pb-O apresenta

    apenas uma banda de elevada intensidade a ca. de 135 cm-1

    e a Figura 3.5b corresponde a um caso

    Figura 3.4 – Imagem de microscopia óptica da

    tessela P10

    Figura 3.5 – Espectros de micro-Raman da tessela P10

    de cor amarela, onde se pode observar dois tipos de

    espectros distintos dos óxidos ternários amarelos.

    100 200 300 400 500 600 700 800

    510119

    139

    (b)

    Inte

    nsid

    ad

    e d

    e R

    am

    an

    Numero de onda (cm-1)

    (a)

    135

    510

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    - 18 -

    onde esta zona do espectro apresenta um dobleto a ca. de 119-139 cm-1

    . No entanto só com esta

    informação e como os espectros variam numa mesma amostra, não é possível identificar o tipo de óxido

    ternário por -Raman. Para simplificar a discussão deste composto particular nos próximos capítulos ele

    será referido como um óxido ternário. A microscopia de Raman também identificou o antimoniato de

    cálcio na forma ortorrômbica Ca2Sb2O7, confirmando a existência do vidro base branco na manufactura

    do vidro amarelo.

    3.4. Vidro Vermelho, laranja, rosa, castanho

    As amostras referentes às cores laranja, rosa, castanho e vermelho apresentam uma

    composição química bastante semelhante e como tal são agrupadas num capítulo comum, embora cada

    cor tenha uma discussão individual, baseada em particularidades reveladas por µ-Raman ou SEM. Este

    grupo de cores caracteriza-se na sua generalidade por apresentar teores de chumbo superiores às

    restantes amostras, como se pode observar na Figura 3.1. Na maioria das amostras, identificou-se

    também na sua constituição a cuprite, um óxido de cobre (I), Cu2O (identificado por µ-Raman), que

    confere uma tonalidade avermelhada ao vidro, sendo as diferentes tonalidades deste grupo de tesselas

    obtidas através da mistura do vermelho da cuprite com outras cores, como por exemplo, o branco ou

    amarelo. Saliente-se que o grupo denominado “laranja” inclui gradientes de cor que poderão ser

    considerados desde tons de pele mais claros (carnações) até laranjas mais fortes.

    3.4.1. Vidro vermelho

    Analisaram-se 2 tesselas vermelhas: C15 e C21. A observação por microscopia óptica revelou

    um corpo vítreo relativamente homogéneo, à excepção de alguns pontos brancos e vermelhos na matriz

    vítrea (Figura 3.6). A análise química por µ-EDXRF revelou teores de óxido de cobre bastante distintos:

    1 % (m/m) na amostra C15 e 14 % (m/m) na amostra C21, o que poderá justificar a tonalidade mais

    escura desta. O mesmo acontece relativamente ao CaO (consideravelmente superior no C15) e ao PbO

    (consideravelmente superior no C21). Por µ-Raman identificou-se a presença de cobre na forma de

    cuprite, Cu2O (Figura 12), com uma banda de elevada intensidade a ca. de 95, e 220 cm-1

    . A cor

    vermelha assemelha-se ao tom exibido pelos designados vidros rubi de cobre, que foram alvo de

    inúmeros estudos para determinar a origem da cor vermelha [26]. As teorias existentes apontam

    Figura 3.6 - Tessela C21 observada por

    microscopia óptica.

    Figura 3.7 – Espectro de µ-Raman da Cuprite.

    100 200 300 400 500 600

    Inte

    nsid

    ad

    e R

    am

    an

    N