94845590 Critica Da Educacao e Do Ensino

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  • Karl Marx Friedrich Engels

    critica da educacao edo ensinor

    introducao e notas de Roger Dangeville

    MQ~edHores

  • T!TUiLO ORIGINAL Critique de L'J!:ducatlon et de L'Enaei.gnement

    CO!PYRIGHT para o prefacio e nota:s

    'L!brai-rie Francois Maspero, Paris, !1.976

    TRADUQAO DO FRAINC~S Ana lMarla iRabaca

    tOOLECCAO Psicolo!;'ia e Pedagogia

    IOAP.A. Luis Duran

    :N..ANO GRAFJCO Julieta !Matos

    iRE.VllSAO iMoraes Editores

    OOMPOSIQAO E LM.PR.ElSSAO Tipograf!a Lousanense

    iLousa

    1. edicao, Abril de iW78 N .0 de ed. 798, 3 000 exemplares

    D!reitos de reproducao e adaptacao deata edicllo reservados para todos os pa!sea

    de Ungua portuguesa par IMoraes Editores

    Rua do Seculo, 34-2. o Lis boa - Portugal

  • APRESENT A
  • 0 processo da alienar;ao crescente

    Uma antologia de Marx-Engels sobre a educar;ao, o ensino e a formar;ao profissional s6 pode ser uma critica, e o seu titulo- como o das obras ja publicadas sobre este assunto 1 - nao deve fazer crer que se trata de uma apolo-gia. Esta critica da educar;ao- como o foi a da economia politica- baseia-se essencialmente em criterios de classe que sublinham o caracter falsamente imparcial e objectivo de todas as instituir;oes existentes que encontram final-mente a sua explicar;ao na economra.

    Para ja, Marx reune numa sintese formidavel as carac-teristicas da burguesia, que ele define de um modo que pode parecer paradoxal a alguns: 0 dinheiro e a ~ultura sao os seus dois criterios essenciais 2.

    Neste nivel burgues da evolur;ao humana, ambos, monopoliza.dos pelo capital, se separaram do trabalho das massas ap6s um processo milenario que deriva das neces-sidades da produr;ao: A primeira grande divisao do tra-balho- a separar;ao da cidade e do campo- ja condenou a popular;ao rural a milhares de anos de embrutecimento, e os citadinos a submissao ao oficio individual. Aniquilou

    1 Por exemplo, a colectanea da Alemanha Ocldental, KARL MARX, BJ/dung und Erzie hung (Cultura e Educa(fao) , ou a da Alemanha do Leste traduzida do russo: MARX-ENGELS, Ueber Erziehung und Bildung (Sobre a Educa9ao e a .Cultural edltada pelo professor P. N. Grusdew, Volkseigener Verlag, Berllm, 1971, 392 p.

    Marx subintitulou 0 Capital como as Grundrlsse, Crit/ca da econom/a politica, e ja Lenine sublinhava que Marx nunca se coloca no terreno econ6mico nas suas analises, porque concebe a produ9ao como urn acto biol6g/co de metabolismo entre o homem e a natureza. Oeste modo, escrevla Marx em 1844, nos seus Manuscrltos paris/enses podera apenas exlstlr uma unica clencla sob o comunlsmo, a das c/enclas da natureza.

    2 MARX, Critica do dire/to polftico de Hegel, in MEGA (Marx-Engels Gesamtausgabe), 1/1, p. 497.

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    as bases do desenvolvimento jisico dos segundos. Des.de entrio o campones apropria-se do solo e o citadino do seu ojicio) e sao eles mesmos apropriados pelo solo e pelo oji-cio. Ao dividir o trabalho, divide-se igualmente o homem, sendo todas as outras potencialidades intelectuais e fisicas sacrificadas ao aperfeiQoamento de uma actividade unica 3.

    A medida que a divisao do trabalho se desenvolve) o 8aber) a arte e a cultura separam-se dos produtores) passam para as superstruturas e sao monopolizados pelas classes dominantes: Enquanto o con junto do trabalho da socie-dade produzir um rendimento que s6 a custo excede o que e preciso para assegurar parcimoniosamente a existencia de todos) enquanto o trabalho exigir todo ou quase todo o tempo da grande maioria dos membros da sociedade) esta divide-se necessariamente em classes. A par do maior numero exclusivamente votado a submissao ao trabalho) jorma-se uma CIJASSE li:berta do trabalho directamente produtivo que se encarrega dos assuntos comuns da socie-dade: direcQao do processo de trabalho) administraQao do Estado e dos assuntos politicos) justiQa) ciencia) belas--artes) etc. E a lei da divisao do trabalho que esta pois na base da divisao em classes 4.

    A tese que aqui se impoe) e que) tendo a burguesia sido em primeiro lugar revolucionaria) tornando-se depois conservadora e finalmente contra-revolucionaria) a sua

    ' ENGELS, Anti-Dilhring, in Werke , 20, pp. 271-272. Uma crftica que se limitasse as partes negativas do sistema, sem ver que estas nao passam da outra face das partes posi-tivas", seria o mais insuficiente possfvel. Para Marx, em todo o caso, civilizac;;ao e barbarie da socicdade condicionam-se reciprocamente: A barba1ie ressurge, mas engendrada no proprio seio cia civilizac;;ao, como se ihe pertencesse. De onde barbarie leprosa, barbiirie enquanto lepra da civilizac;;ao. (Trabalho assa/ariado e Capital, anexo sobre 0 Trabalho assalariado, VI.) 0 totalitarismo fascista bern como os horrores monstruosos do subdesenvolvimento no mundo moderno sao assim o produto necessaria do capitalismo mais avanc;;ado, mais democnitico e mais aperfeic;;oado.

    Cf; ENGELS, Anti-Dilhrlng, op. cit., p. 262. Sao portanto raz6es essencialmente econ6micas que justificam transitoriamente as sociedades de classe. Marx evidenciou de uma maneira tao impiedosa os aspectos terrfveis da produc;;ao capitalista que sublinhou por outro lado que esta forma social foi necessaria para desenvolver as forc;;as produtivas a urn nfvel que permitira a todos os membros da sociedade uma evoluc;;ao harmoniosa e digna do homem. Todas as formas de sociedades anteriores eram demasiado pobres para isso. 86 a produc;;ao capitalista cria as riquezas e as forc;;as produtivas que lhe sao necessarias, ao mesmo tempo que produz tambem, com a multitude dos open'irios oprimidos, a ciasse social que sera cada vez mais obrigada a ter em conta a utllizac;;ao das riquezas e das forc;;as produtivas para toda a sociedade, em vez de serem monopolizadas por uma classe, como hoje . (Cf. ENGELS, Relat6rio do Capital, in Demokratlsches Wochenblatt, Marc;;o de 1968.)

  • APRESENT AQ.AO 11

    direcr;;ao da produr;;ao e do Estado) bem como a sua justir;;a) a sua ciencia e as suas belas-artes) foram uteis e progres-sivas no inicio) e em seguida degeneraram.

    A divisao social do trabalho faz com que a actividade intelectual e material) o prazer e o trabalho caibam em partilha a individuos diferentes ~) e tem) entre outras con-sequencias nefastas para o trabalhador) a oposir;;ao entre Tiqueza e pobreza) depois entre saber e trabalho'; Este antagonismo entre a riqueza que nao trabalha e a pobreza que trabalha para viver faz sttrgir por sua vez uma con-tradir;;ao ao nivel da ciencia: o saber eo trabalho separam--se) opondo-se o primeiro ao trabalho como capital ou como artigo de luxo do rico. E Marx cit a o fisiocrata Necker: A faculdade de saber e de compreender e um dom geral da natureza. Contudo ela s6 e desenvolvida pela instrugao. Seas faculdades fossem iguais) cada um trabalharia mode-radamente (e Marx conclui: e pois mais uma vez o tempo de trabalho que e decisivo), e cada um saberia um pouco) porque ficaria para cada um uma porr;;ao de tempo (livre, precisa) para se entre gar ao estudo e ao pensamento 6.

    Uma sociedade) cuja condigiio sine qua non e repro-duzir num polo a miseria e no outro a riqueza) produz forr;;osamente tambem) dum lado) a civilizar;;ao e) do outro) a bestialidade: Segundo Storch) o medico produz a saude (mas tambem as doenr;;as)J os professores e os escri-tores as luzes (mas tambem o obscurantismo}J os poetas) pintores) etc.) o gosto (mas tambem o mau gosto)J os moralistas) etc.) a moral) os pregadores o culto e o traba-lho) os soberanos a seguranr;;a) etc. 7.

    Assim que a separar;;ao entre saber e trabalho e efec-tiva) na sociedade J est a lanr;;ada a base para um ascenso gigantesco das trocas que assentam no mercantilismo. A massaJ pobre e ignorante) pode a partir de entao ser

    5 Cf. MARX-ENGELS, Die Deutsche /deo/ogie, in Werke, 3, p. 21. Cf. MARX, Teorias sabre a mais-va!Ja, in Werke, 26/1, p. 280, no capitulo consagrado

    a Necker. 7 Ibid., p. 128. Nao se trata de uma satlra de Marx. As contas mais recentes da

    Seguran(:a Social sabre a saude mostram que, a despeito de uma progressao extraordinaria do on;:amento de doenc;a, a patologia excede continuamente os cuidados prestados aos doentes nos pr6prios paises que sao melhor dotados de protecc;ao social: a infecta economia moderna produz mais doenc;as do que pode pagar remedios.

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    enganada e cair alem disso em fraudes preparadas pelos ricos que dispoem de todos os recursos materiais e inte-lectuais da sociedadeJ num mundo baseado precisamente na acumular;ao da riqueza a custa de outrem.

    A propria ciencia e a partir de entao venal e compra--seJ e um idoloJ um meio de opressao e de extorsao de mais--valia nas maos do capitalista. Nao podeJ com efeitoJ estar acima das condir;oes alienadas que a produziram, como esfera reservada a uma pequena elite. Nestas condir;oesJ um autor alemao classificou muito justamente a ciencia de KochbuchJ livro de cozinhaJ que os homens elaboram nem mal nem bem para produzir objectos e instrumentos uteis a sua vida.

    Esta definir;ao exprime de modo feliz a relatividade das cienciasJ que o idealismo idolatrou como verdades abso-lutas e imutaveis. De facto) a ciencia alienada segue uma curva tormentosaJ efectuando um salta em frente quando da introdur;ao de um modo de produr;ao novo) depois fazendo maJ e) finalmenteJ pessima cozinha durante a fase conservadora e contra-revolucionariaJ para tornar a dar um salta com um novo modo de produr;ao 8

    86 com a ditadura mundial comunistaJ que tera revo-lucionado as relar;oes materiaisJ ficarao as ciencias e as artes libertas da sua parcialidade e das mentiras de classe J e conheceraoJ na base de um desenvolvimento insuspeitado das forr;as produtivas 9) um ascenso tal que os nossos con-

    8 A ciencia, tal como a arte e a tecnica, nao pode deixar de seguir, a sua maneira, o ascenso das forc;as produtivas. Ora, e no infcio do capltalismo, quando es-te foi o mals revolucloniirio, que se registou a progressiio mais forte da produtividade e a taxa mals elevada de crescimento da prodw;:ao, enquanto a massa dos produtos atlnge urn montante vertiginoso a medlda do desenvolvimento. Nos Manuscrltos Parisienses (Ed . Sociales, 1962, p. 14), Marx efta alguns exemplos de aumento lncompariivel da produtividade capltallsta em re/Bt;iio ao modo de produc;iio anterior: Com as forc;as motrizes novas e a melhorla das miiqulnas, urn unico operarlo nas fiibrlcas de aigodiio niio executa multas vezes a obra de 100, ate mesmo de 250 a 300 artesiios de antlgamente?o

    Voltando a educac;iio no sentido mals estreito, os simples numeros seguintes testemu-nham a sua decadencia na era do capitallsmo senil: 0 numero dos analfabetos aumentou de 48 milhoes entre 1960 e 1970 (cf. Le Monde de 10 de Setembro de 1975).

    9 Este volume sobre a educac;iio segue-sa a antologia sobre Os Utoplstas e Utop/smo

    e Comun/dade do futuro que aborda a visiio da base superior da sociedade comunlsta que, em Marx-Engels, esta pr6xima da dos seus predecessores utopistas. 0 marxismo, ao fornecer uma base cientfflca a esta vlsiio, dedicou-se essencialmente a demonstrar a necessldade da passagem ao sociallsmo por urn salto revolucionarlo, a partir da evoluc;ao econ6mica da actual

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    temporaneos nao podem fazer dele uma ideia- sobretudo se tomarem por um pais socialist a a c6pia con forme do capitalismo que e a Russia de hoje) que chega a comprar ao Ocidente senil uma louca tecnica degenerada) impul-sionada pelas guerras e o armamento.

    EspoliaQfio e mistificw;ao A: partir do momenta em que se aborda o problema

    da cultura) da ciencia) das artes e das letras de uma socie-dade) encontramo-nos na esfera a que o marxismo chama as superstruturas que sao o PRODUTO da base econ6-mica, ou seja, do trabalho da classe produtiva de que as classes privilegiadas se apropriam. Importa pois conside-rar o produto sob um duplo angulo: em primeiro lugar os materiais que derivam do processo de trabalho sobre o mercado para serem directamente consumidos; em seguida, o produto social indirecto, ou seja, a divisao do trabalho suscitada pelo modo de produQfio e sobre a qual se enxer-tam as classes e as superstruturas. Esta dissociaQfio cres-cente nas sociedades sucessivas de classe torna-se cada vez mais antag6nica, enquanto a opressao se faz mais dura para as classes exploradas.

    Ainda na !dade Media, o artesao-como o campones proprietario da sua parcela- detinha o produto do seu trabalho. E apenas sob o capitalismo que se separa sistema-Ucamente o produto do trabalhador assalariado e das suas condiQoes reais de produQfio, que s6 podem ser sociais e colectivas, para ser atribuido ao capitalista individual. Assim que o produto imediato- a obra- e dissociado das suas condiQi5es de produQfio, a arte e a ciencia separam-se da massa da produQfio social e autonomizam-se por conta dos capitalistas 10

    sociedade capitalista, formando a economia, com o seu polo socializado, e o proletariado a base objectiva do socialismo, e nao as superstruturas ideol6gicas de que o marxismo serla urn prolongamento.

    10 0 produto, que e o resultado de toda a combinac;ao social da produc;ao, indica mais claramente quais podem ser as manifestac;6es Intelectuals de uma dada sociedade. Como materlalista consequente, Marx, ao Inverter toda a problematica da psicologia actual, que parte

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    Ao dividir os diversos tipos e formas de trabalho que conduzem a obra, opera-se uma inversao sistematica das relagoes reais que suscitam o idealismo absoluto das classes privilegiadas, que twdo fazem partir do Espirito ou da Ideia- da sua esfera ociosa do tempo livre- para se jus-tificar como elite 11 E dai que nascem as loucas teorias fascistas, que se expandem hoje em todo o mundo na hora do capitalismo degenerado, sobre o Homem de excepgao que guia as massas, do Genio que se apodera da arte, e do Sabio que detem a luz do Saber, nao passando todas estas figuras da idealizagao de Sua Majestade o Capital na corporativista divisao do trabalho que encerra o indi-viduo na sua especializagao E na sua nao-especializagao.

    N a visao marxista, o genio nao pas sa da superstru-tura determinada fundamentalmente e em ultima analise pela actividade produtiva .das massas imensas que despen-dem esforgos quotidianos com as suas lutas e os seus dramas.

    do indivfduo e se encerra num circulo de que nenhuma clencia pode descobrlr os lugares contiguos, declarava que e a industria que e o li.vro aberto da alma humana. t com efeito nos objectos que formam o quadro da nossa vida corrente, do estupido autom6vel prlvado ao clgarro infeccioso, que se le o canlcter do homem moderno, consumidor autodestruidor que paga o minima dos seus gestos, para malar prosperidade do capital. t evldente que o Espirito plana multo baixo neste mercantiUsmo de todos os fnstantes, com as suas satisfa ~;6es pusilanimes e baratas. 0 capitallsmo, ao produzir para o indivfduo prlvado, dlvldido e atomizado, deve produzir artigos a escala liliputiana e mesquinha, porque o seu modo de

    distrlbui~;ao e privado. 0 homem ganhara em amplidiio espantosa, no plano da sua inteligencia e do seu prazer, asslm que a produ~;ao social ja reallzada caminhe harmoniosamente com uma di:>tribui~;ao e uma apropria~;ao socials.

    As artes e as letras, que s6 dlsp6em hoje dos pobres meios privados dos seus autores, conhecerao entiio urn ascenso, cuja amplitude e hoje insuspeitada.

    Sabre o mecanismo da dissocia~;ao progressiva dos produtores dos seus melos de produ~;ao e de vida nas sociedades de classe, cf. A Sucessao das formas de produ~;ao e de sociedade na teoria marxlsta, Le Fil du Temps, n. 9.

    11 Qualquer sociedade encerrada em contradi~;6es de classe e idealista e lnverte o justa termo das coisas, ao atribuir a classe dominante o monop61lo da ciencia, da cultura e da arte- pelo que faz partir todos estes valores do Espfrlto, e nao do trabalho e da pro

    du~;ao. Esta lnversao estende-se ate ao domfnio do ensino e da investiga~;iio, que dao a primazia ao espirito e a lntellgencia. Ora, diz Engels, em todas as disciplinas, nao se trata de elocubrar as rela~;6es na cabe~;a, mas de as descobrir nos factos. (Ludwig Feuerbach e o fim da fllosofia chissica alemi!i, IV, in Werke, 21, p. 265.)

    Fazendo tudo derivar do Espirito, e nao das condi~;6es materials determinadas, os burgueses atrlbuem todos os males da humanidade 8 falta de educagi!io das massas: a com para~;ao entre os rendlmentos das classes cultas (privilegiadas) sugeriu-lhes, alem disso, que o remedio para a pobreza e para o desemprego e pais. .. a educa~;aol Marx lronlza sabre estes pobres paliatlvos que para nada contribuem senao para abolir o proletariado por meio de algumas reformas, o que demonstra a sua inconslstencia, nas suas Notas Criticas de 7 de Agosto de 1944 (trad. fr. In Marx-Engels, Ecrits militaires, 1970, L'Herne, pp. 161-169).

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    0 capital opera uma dupla frustraQao das massas. Em primeiro lugar, o corpo especializado de pensadores, de artistas- e de professores que transmitem o saber de geragao em geragao, para o reproduzir, conservando-o e perpetuando-o - tira o que ha de melhor no saber e na sensibilidade que emana do trabalho das massas, enquanto elas pr6prias permanecem incultas.

    Em seguida, por intermedio do mercado- que, nao e como o desejava Estaline, troca neutra, mas troca com lucro, roubo, pilhagem e espoliagao -, as massas ficam desprovidas do fruto dos seus esforgos. 0 processo e facil, dado que, nos nossos dias, tudo se trans forma neste dinheiro - forga social concentrada, universal mente reconhecida e que comanda o tr.abalho de outrem- que permite a classe dominante apropriar-se e representar tambem as supers-truturas intelectuais, artisticas e filos6ficas de toda a socie-dade, monopolizando a cultura do passado, do presente e mesmo, se os nao impedissem disso, do futuro, e mostrando--se civilizados, sacrossantos, justificados, ate mesmo indis-pensaveis- hoje como ontem.

    Derrube dos idolos e desmistificagao Na simples linguagem do marxismo, dir-se-ia que sao

    de facto os inumeraveis trabalhadores da sociedade que peg am na mao- ou animam a obra- do artist a ou do cientista, que nao sao inspirados nem pelo Espirito nem pelo Genio - ocas abstracgoes das sociedades de classes privilegiadas, sempre idealistas, porque colocam o pensa-mento como principia superior e inicial de todo o bem e de todo o progresso, ao forjar o Grande Arquitecto dos racionalistas iluministas burgueses, clericais ou franco--magaos, estalinistas ou maoistas.

    Em suma, tudo se reduz a jornadas de trabalho, e o seu resultado varia, nao em fungao do merito individual, mas do mecanismo social da divisao do trabalho, que con-centra os meios de expressao da sociedade nalgumas maos mais ou menos talentosas, sendo os momentos privilegia-dos do trabalho das massas apropriados por um corpo de

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    opera tanto a jornada de um trabalhador agricola como a Traviata.

    N a fabrica moderna) o opera rio e directamente vitima desta inversao das relw;oes que atribui a hierarquia vinda das escolas o merito .da tecnica. Na parte intitulada Mis-tificagao do Capital do VI Capitulo Inedito do Capital 12J Marx afirma peremptoriamente: A ciencia) produto inte-lectual geral do desenvolvimento da sociedade, sur[Jf3) tam-bem ela) directamente incorporada no capital e a sua apli-cagao no processo de produgao material independente do saber e da capacidade do operario individual. Como o desenvolvimento geral da sociedade e explorado pelo capi-tal) graQas ao trabalho e agindo sabre o trabalho como forga produtiva do capital) apresenta-se como o proprio desenvolvimento do capital.

    De facto) esta mistificagao e a mais odiosa no maqui-nismo moderno) onde O verdadeiro agente do processo de trabalho total ja nao e 0 trabalhador individual) mas uma forga de trabalho colectiva que se combina cada vez mais socialmente 13.

    0 despojar o trabalhador colectivo da sua obra ori-gina a anexagao do seu genio inventivo as fungoes do capi-tal e aumenta ainda a divisao do trabalho que engendra os especialistas) os peritos e) com eles) o idiotismo profis-sional14. Esta autonomizagao das tarefas intelectuais pro-voca por sua vez a inversao idealista que defende a pri-mazia do Espirito como fonte e justificagao de privilegios econ6micos exorbitantes. Face a este idealismo s6rdido que corresponde be.m ao materialismo burgues) Engels res-tabelece as coisas na sua relagao verdadeira: Quando uma sociedade tem uma necessidade tecnica) isso nao da mais impulso a ciencia do que 0 fariam dez universidades 15.

    " Urn capitulo inedito do Capital, 10/18, 1971, p. 249. " Ibid., p. 226. 14 Cf. MARX, Miseria da Filosofia, in Werke, 4, p. 157. A combinagiio no seio do

    processo de trabalho das materias-primas, dos instrumentos e do trabalho vivo, da dois tipos de produtos: urn , lmediato e material , e directamente apropriado pelo capitalista individual; o outro, indirecto e social, suscita a divisiio do trabalho ou agrava-a, ao mesmo tempo que ela reproduz as condigoes de perpetuagiio da forma capitalista de produgao e de distribuigiio. Cf. Grundrisse, t . 2, pp. 168-275.

    15 Cf. Engels a B. Borgius, 25 de Janeiro de 1894. 2

  • 18 CRfTICA DA EDUCA9A.O E DO ENSING

    Ora) na sociedade capitalistaJ esta necessidade e essencial-mente dominada pelos neg6cios: Quase todas as inven~;i5es desde 1825 foram o resultado de colisoes entre operarios e empresariosJ tentando estes por todos os meios depre-ciar a especi:alidarde do opera rio 16 J e fazer baixar o salario por meio de uma alta correspondente dos lucros para o capitalista 17

    0 capitalista que utiliza na sua fabrica as maquinas mais aperfeigoadas nao e ele mesmo a maior parte das vezes de uma ignorancia tecnica crassa 18)- e de resto nao e melhor assim?

    A ciencia e a tecnica fazem parte da base econ6micaJ enquanto a culturaJ com as belas-artesJ a filosofia e a reli-giaoJ fazem parte da s111perstrutura na divisao em classes do capitalismo. Claro que a cienciaJ produto geral do desen-volvimento humanoJ e monopolizada pelo capital) mas esta apropriagao s6 se efectua depois de a tecnica e de a ciencia terem sido produzidas pelo trabalho colectivo no pro-cesso de trabalho imediatoJ de maneira tao material como os artigos da produgao. N ao e a sede de promover a cien-cia e a cultura que anima o capital; a sua tendencia irrepri-mivel para o lucro faz-lhe aplicar a ciencia descoberta pelo trabalhador colectivo. Com efeitoJ a ciencia e a tecnicaJ que sao a forga produtiva e a riqueza maiorJ sao gratuitas para o capitalista: A ciencia nao custa absolutamente nada ao capitalistaJ o que nao impede de a explorar. A cien-cia de outrem esta incorporada no capital pela mesma razao do que o trabalho de outrem 19.

    E preciso igualmente distinguir a ciencia nascida das necessidades da produgao da que se ensina nos institutos e universidadesJ que e a forma abstracta e esclerosada do

    " Cf. MARX, Miseria da Filosofia, In Werke, 4, pp. 154-155. 17 Cf. Trabalho assalariado e Capital, IV. 18 Nos Grundrisse (10/18, t. 4, pp. 60-62), Marx cita certos epis6dios rldiculos da

    introdw;:ao de maquinas que nada tern a ver com o genic cientifico. Nenhum espirito inventive condiciona o ascenso de urn ramo de industria: o capitalista pode apropriar-se da tecnica ou das leis cientificas que condicionam os processes tecnicos no mercado contra dinheiro ou por fraude, espolia~;ao e pilhagem.

    19 Cf. MARX, 0 Capital, I, in Werke, 23, p. 407. A prop6sito da ciencia enquanto for~;a produtiva, cf. igualmente Grundrisse, 10/18, t. 2, pp. 53, 88, 108, 205, 214-215; t. 3, pp. 16, 61, 135, 143, 175, 327-328, 331-333, 339-342, 354, 356, 361; t. 4, pp. 16, 21, 38-39, 45.

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    saber) forma que) no livro IV do Capital sabre a evolugiio das Teorias sobre a Mais-Valia para a sua degenerescencia) Marx definiu) segundo o exemplo da ciencia econ6mica) como se segue: 0 ultimo grau e a forma professoral 20 : procede de maneira 'hist6rica' e) com uma sensata mode-ragiio) rebusca em tudo o que hade 'melhor' sem se deixar travar pelas contradigoes) porque-s6 tem uma unica preo-cupagao: ser completa. Priva todos os sistemas do que era a sua alma e a sua forga) e todos acabam por se con-fundir tranquilamente na mesa do compilador. 0 calor da apologetica tempera-se aqui pelo saber que langa um con-descendente olhar de comiseragao sabre os exageros dos pensadores economistas e os faz boiar como curiosidades no caldo incolor do seu compendia. Como estes tipos de trabalhos s6 se efectuam quando a economia politica) enquanto ciencia) terminou o seu ciclo) temos ai ao mesmo tempo o tfunulo desta ciencia. Sera necessaria sublinhar que estes sublimes homenzinhos se julgam igualmente muito acima de todos os sonhos dos socialistas? 2\

    A arte cada vez mais superstrutural

    Uma outra consequencia do capitalismo e separar a arte da tecnica, abstraindo-a cada vez mais da produgao colectiva) para dela fazer uma questiio individual. Carece entiio de todos os meios materiais: praticada em amado-r-ismo) mergulha no esquecimento ou na insignificancia) tornada venal) sucumbe as negociatas burguesas.

    Nos antigos Gregos) techne significava ao mesmo tempo tecnica e arte) sendo as duas inseparaveis. E) de facto) por que razfio a tecnica) o gesto produtivo comum a

    20 Marx classifica a lingua falada e escrita, entre as for~;as produtivas da base econ6-mica (cf. Le Fil du temps, n." 5, pp. 39-46), dado que faz parte des meios ffsicos de comu-nica~;ao e de transporte que o capitalismo desenvolve ao maximo na sua fase revolucionaria de cria~;ao do mercado mundial, como todas as mercadorias, incluindo a for~;a de trabalho. Marx rejeitara toda a bagagem ideol6gica que sobrecarrega este ensino totalmente elementar da lingua, que a burguesia dispensa parcimoniosamente nos inumeraveis pafses subdesenvol-vidos e um pouco mais amplamente nos pafses desenvolvidos, ou seja em fun~;ao das suas necessidades de explora~;ao de uma for~;a de trabalho simples ou complexa.

    21 Cf. MARX, Theorien ilber den Mehrwert, in Werke, 26/3, p. 492.

  • 20 CRiTICA DA EDUCAQAO E DO ENSINO

    todos numa dada fase social) nao conduziria senao ao vul-gar) como o actual empirismo abstracto a partir do qual se fabrica penosamente a fisica experimental e a tecno-logia? E entao) par que razao a grandeza e a nobreza ape-nas existiriam na arte de alguns raros homens) animados pelo genio de alta potencia) cujo unico saber permitiria construir uma doutrina) um edificio ou uma maquina?

    Para o marxismo) a arte e o trabalho sao a mesma coisa) e e com a aboligao da odiosa divisao do trabalho) consequentemente embrutecedora) que havera fusao entre poesiaJ ciencia e trabalho fisico. N ao e possivel expulsar a arte e os seus males do conjunto das relagoes do homem--especie com a natureza. 0 proprio Marx queria escrever uma historia do trabalhoJ da tecnica e da produgao sabre cujas bases se ergue ao mesmo tempo a historia da ciencia e da arteJ cujos produtos so se explicam se se tiver em conta o duro caminho que todos os seres vivos abrem na 'Vida e na produgao de todos os diasJ com a contribuigao de todos- mesmo se essa historia e alienada enquanto a socie-dade estiver despedagada em classes antagonicas.

    0 que se torna a arte sob o capitalismo? Este cria em primeiro lugar a ilusao de promover as belas-artesJ porque retoma as de todo o passado para se tornar o repre-sentante de toda a sociedade) de ontemJ de hoje e de amanhaJ no que ela tem de melhor) e submete-as em seguida a uma exploragao comercial de um modo geral. Enquanto a tecnicaJ estreitamente ligada a produgaoJ se entusiasma e incha cada vez mais como uma verdadeira elefantiaseJ a arte torna-se cada vez mais abstracta) eterea) superstru-tural. E par isso que liga mais os nossos contemporaneos as sociedades primitivas ou antigasJ infelizmente na ordi-naria deformagao venal que predomina nos nossos dias.

    Se o produto da arte degenera menos depressa do que o da tecnicaJ e que a sensibilidade esta um pouco menos corrompida e falseada do que as abstractas verdades ensi-nadas que se podem usar e tornar a usar da maneira mais facil do mundo. Alem disso) a arte pavoneia-se menos no conservantismo do que a tecnica comercialJ mais proxima das maquinasJ ou sejaJ nos nossos diasJ do capital) que degenera o mais monstruosamente nas industrias sofistica-

  • APRESENTAQ.AO 21

    das e no armamento destruidor que as precede. A industria autom6vel) esse pilar da tecnica e da economia modernas) nao restaura ela) s6 por si) mais preconceitos do que a anti-guidade alguma vez pode produzir: o culto desse moderno Jaggernaut * nfio exige diariamente) no mundo desenvol-vido) que centenas de homens passem sob as rodas do monstro moderno? 22

    Luta ideol6gica em primeiro lugar

    U ma sociedade dividida em classes suscita necessaria-mente uma divisao entre. a base econ6mica e as superstru-turas juridicas) politicas e ideol6gicas) evoluindo cada um destes niveis da piramide de forma desigual e especifica em relaQfio aos outros. Contudo) enquanto a economia e antag6nica) o capital que implica no outro polo o assala-riado) como a burguesia supoe o proletariado) as esferas juridica) politica e) mais ainda) ideol6gica- com o Estado e a educaQfio nacional que ele dispensa- apresentam-se como homogeneos) sem antagonismos nem contradiQoes de classe.

    E por is so que Marx e Engels estigmatizam de forma mais categ6rica as manifestaQoes intelectuais do que as formas econ6micas e mesmo politicas das sociedades de classes: o proletariado deve agir ainda nas condiQoes mate-ria is da sociedade onde vive e produz) utilizando meios politicos) quando s6 dispoe de seu das suas ideias e dos seus principJios, nascidos do seu meio material de vida e de produQfiO) para orientar a evoluQfio social no sentido dos interesses socialist as- de classe em primeiro lugar) portanto ainda politicos) sem classes em seguida.

    Prat;:a forte da India inglesa, no Golfo de Bengala e a mals celebre das cidades religlosas da India.- N. T.

    22 Sobre a produt;:ao assombrosa do embrutecimento pela industria moderna, Marx escreveu de maneira sugestlva: "Pretendeu-se ate a qui que os mitos cristaos s6 puderam desenvolver-se porque ainda se nao lnventara a imprensa. t: exactamente o contrario. A lm-prensa quotidiana e o telegrama, que num piscar de olhos difundem as notfclas em todo o mundo, fabricam num dia mais mitos (nos quais o reles burgues acredita e que espalha com zelo) do que antlgamente se podia produzlr num seculo. (Cf. Marx a Kugelmann, 27 de Julho de 1871.)

  • 22 CRiTICA DA EDUCA9A.O E DO ENSING

    Nest as condigoes, o marxismo origina primeiramente uma luta de ideias, e e neste dominio ideol6gico que se deli-mita em primeiro lugar, e mais radicalmente, em relagao as formas de pensamento da burguesia e das classes domi-nantes que a precederam. Contudo, o proletariado dispoe desde entrio do seu proprio Estado transit6rio de classe e empenha-se em transformagoes revolucionarias da socie-dade, as mudangas materiais precedem de novo as d,a cons-ciencia, e o marxismo atribui a prioridade a eliminagao -segundo o seu programa e a sua visao te6ricos - das condigoes objectivas econ6micas- a propriedade privada, o capital, o salariado, o dinheiro e o mercado -, e s6 em seguida desaparecerao progressivamente as instituigoes humanas que sao as nacionalidades, o Estado) a familia, as classes, ou seja as sinecuras bem como as especializa-goes) as profissoes nobres e as manuais) com os idolos separados da produgao e das massas que sao a Cultura, a Arte) a Ciencia e a Tecnica apropriadas hoje pelo capital. E s6 entao que surgira um homem radicalmente novo pelo seu pensamento) a sua sensibilidade e as suas aspiragoes) tendo finalmente a humanidade saido da sua pre-hist6ria.

    H oje- nomeadamente nos paises desenvolvidos-reinam uma falta de vigor e uma resignagao vergonhosas perante uma crise que se tornou tao profunda e tao geral que abala a produgao e as instituigoes do Estado) privando centenas de milhoes de homens dos meios de ganhar a sua vida e arruinando todos os valores e as ideias recebidas sobre o bem-estar) a promogao social e a toda-poderosa tecnica que a ciencia o ficial ensinou zs.

    Os pr6prios proletarios recuam) como que assusta-dos pela enormidade da perturbagao total que a sua revo-lugao implica. Os partidos oportunistas que prepararam este derrotismo empregam todos os esforgos para tran-quilizar, identificando para isso socialismo e capitalismo por todo o lado onde podem. E e no dominio das ideias que defendem menos uma ruptura radical, e apresentam

    23 Esta crlse, que o nosso partido ]a previra ha vinte anos para os anos 1975, apanhou de surpresa a clencia oficial e os partidos politicos conformistas, de dlrelta e de esquerda. Cf. A crise actual e as suas perspectivas revolucionarlas, Le Fil du temps, n." 11 e 12.

  • APRESENT A9AO 23

    os valores da Democracia} da Ciencia} da Tecnica} da Arte e da Cultura como entidades universais} validas para sem-pre -para alem das barreiras de classe e das formas de produgao. De qualquer forma} para eles} o socialismo nao passa do prolongamento e da expansao de todos estes idolos das sociedades de classe . .

    A tentativa para fazer derivar o marxismo de Hegel e a ilustragao disso} e despe o socialismo cientifico d,as suas bases de classe. Constitui alem disso uma monstruosidade absurda} dado que o pensamento das classes dominantes engendraria o socialismo cientifico do proletariado} sendo as ideias produzidas nao pela base material especifica} mas pelas pr6prias ideias- o que encanta} evidentemente} os profissionais especialistas do trabalho intelectual.

    Uma estrita concepgao de classe

    E partindo de tres principios} que Marx-Engels tiram as suas conclusoes te6ricas} diametralmente opostas as das classes dominantes.

    Em primeiro lugar} nao sao OS pensamentos e OS dese-jos dos homens que fazem a vida e as circunstancias mate-riais} sao as condigoes econ6micas que formam a base de todas as manifestagoes intelectuais da sociedade humana. Se ha educagao} sao portanto as condigoes materiais que e preciso educar ou melhor revolucionar} e nao as pobres cabegas! Ora} a crise econ6mica que abala e perturba o mundo capitalista esta em vias de ensinar mais verdades do que todas as ciencias burguesas das escolas e universi-dades avariadas: ela leva as massas proletarias a intervir no sentido do seu programa de classe} e chegara a altura em que estabelecerao uma superstrutura politica para agir em contrapartida sabre a economia} a jim de a transfor-mar} ap6s terem forjado um sindicato e um partido de classe 24

    As relat;1ies complexes entre a base econ6mlca e as superstruturas, bem como os seus elementos componentes, sao estudados em detalhe em Os Factores de Rac;:a e de Nac;:ao na Teorla Marxlstan, Le Fil du temps, n.o 5, pp. 33-43. Aos olhos do marxismo, a

  • 24 CRiTICA DA EDUCA9Ji.O E DO ENSINO

    Em seguida, cada forma de produgao e de sociedade sucessiva tem as suas ideias e o seu saber pr6prios. Claro que se combinam com um determinado fundo comum de todas as classes exploradoras, mas de cada vez de uma maneira especifica.

    OS pensamentos da classe dominante sao, em cada epoca, as ideias dominantes. As ideias que predominam, por outras palavras, a classe que e a potencia nifLterial dominante da sociedade e tambem a potencia espiritual dominante. Em consequencia, a classe que dispoe dos meios da produgao material, dispoe ao mesmo tempo dos meios da produgao intelectual, de tal forma que lhe estao subme-tidos tambem OS pensamentos daqueles que sao desprovidos dos meios da produgao intelectual. Os pensamentos domi.:. nantes nao passam da expressao ideal das relar;oes mate-riais dominantes: sao essas relagoes materiais dominantes tomadas sob a forma de ideias. Par outras palavras, sao a expressfio das relagoes que fazem de uma classe a classe dominante, ou seja as ideias da sua dominagao.

    Os individuos que formam a classe dominante possuem igualmente, entre outras coisas, uma consciencia, e par-tanto pensam. Dado que dominam como classe e deter-minam uma epoca hist6rica em toda a sua amplitude, e evidente que dominam sob todos os aspectos; ou seja, dominam, entre outros, como seres pensantes, como pro-.dutores de ideias, regulando a produgao e a distribuigao dos pensamentos da sua epoca. As suas ideias sao par-tanto as ideias dominantes da sua epoca 25 .

    A conclusfio desta tese e, indubitavelmente, que e pre-ciso desconfiar ao maximo das ideias destiladas pelo Estado das classes dominantes, ou seja pela educagao nacional.

    As ideias e a ciencia sao sempre ditadas pela deter-minagao de classe. Sao, ou reprim'Ldas, ou entao passam

    economia e a base mais segura e, quanto mais nos elevamos da produc;:ao as superstruturas, mais a forc;:a de lnercia de cada nivel estrutural nao se acrescenta simplesmente a dos nlveis lnferlores, mas multiplica-se por ele. E na esfera eterea das ideias, passando do direito a arte, a filosofia e a religiao, que as formas sao as mais delicadas, mas tambem as mais tenazes, prolongando de uma forma a outra socledades de classe.

    25 Cf. MARX-ENGELS, Die deutsche ideologie, In MEGA, 1/5, p. 35. Para ja, pode dizer-se que uma cultura que abstrai as estritas condic;:oes econ6micas de classe, tal como a cultura popular, interclasslsta, esta por definic;:ao inteiramente submetida a ideologia dominante.

  • APRESENTAQAO 25

    para o serviQO da classe dominante que as molda para seu uso) a fim de as monopolizar e explorar) tornando-se para as massas um meio de opressao) de mistificaQao e de justi-ficaQao das classes dominantes.

    E essa a razao pela qual os marxistas falam de supers-truturas politicas e ideol6gicas de sujeiQao. I sto salta aos olhos no que diz respeito a politica que deriva do Estado) violencia concentrada (Marx)) mas a educaQao n'q,cional nao sera ela tambem dispensada pelo Estado de classe) pelos pro fessores que ele diplomou? Reconhece-se de bom gr(J).do que o Estado e despota) mas considera-se que) no dominio das ideias onde cada um teria o seu livre arbitrio) e preciso convencer com a Razao e seduzir) ou seja engodar as massas. De facto) os dois sao complementares) e assen-tam sabre uma violencia comum: a terrivel pressao das carencias e da miseria) que reflectem precisamente a caren-c.ia absoluta e a dependencia extrema dos expropriados. A diferenQa reside simplesmente no facto de que a pri-meira exprime uma violencia aberta) franca) a segunda) hip6crita) beata e jesuita.

    A profanaQao capitalista das obras sublimes

    N as suas opiniQi5es e criticas da arte e da ciencia) Marx tem em conta antes de tudo condiQi5es materia is de evoluQao e) nas sociedades modernas) sao as relaQi5es de dominaQao econ6mica e o dinheiro que sao decisivos. Com efeito) apesar do idealismo das sociedades feiticistas) o espirito nao reina. E aquele que paga que suscita as manifestaQi5es delicadas da arte e do pensamento: Sou um homem mau) desonesto) sem escrupulos) estupido-mas o dinheiro e venera-do: tambem eu o sou) eu que o possuo. Sou estupido) mas o dinheiro e a VERDADEIRA INTELIGENCIA das coisas- e poderia entao ser estu-pido) eu que o possuo? ALEM DISSO) COM 0 DINHEIRO) PODEM COMPRAR-SE PESSOAS E ESP1RITOS) E AQUELE QUE TEM 0 PODER SOBRE AS PESSOAS INTEL/GENTES N.AO SERA MAIS INTELIGENTE DO

  • 26 CRiTICA DA EDUCA9A.O E DO ENSINO

    QUE AS PESSOAS INTELIGENTES DE QUE DIS-PoE? 26.

    N a sociedade mer cantil desenvolvida em que vivemos presentemente) a inteligencia vende-se e compra-se siste-maticamente) e e com o dinheiro que nascem as universi-dades) enquanto a ciencia venal funciona mediante um saM-rio- e 0 patrao e 0 pagador. 0 dinheiro liga e mede tudo) como escreve Shakespeare: Ora! Deus visivel qu~ liga estreitamente as coisas INCOMPATIVEIS) e as obriga a abragarem-se) que fala por todas as bocas e une 0 que e contra a natureza! 21

    No periodo venal do capital) os artistas e os pensa-dores sao constrang~dos a mediocridade ou ao silencio. A razao deste facto reside em que a sua arte e o seu pen-samento sao) mais ainda do que todas as outras activi-dades) actividade social, enquanto o cretinismo da nossa sociedade degenerada faz disso o acto mais pessoal e mais privado) cerceando todas as relagoes essenciais para jus-tificar o seu principia de apropriagao privada. 1JJ isto que explica que) para se exprimirem) para se fazerem entender) os artistas tenham a maior necessidade do consentimento das multidoes) ou) segundo a expressao de Marx) da apro-vagao e da admiragao dos outros 28. Se pretendem pois ter exito) devem dar provas) em tempos de paz social) em que toda a vida real se apaga quase na sociedade) de um sentido desenvolvido) cortesanesco e vil) do que pode agradar) de tal forma que fazer dinheiro lhes e particular-mente fatal dado que isso implica fazer a apologia da ideologia dominante) vil e baixa do burgues) da burguesia - tornando-se o ornamento dos poderes detentores do dinheiro. Em periodo revolucionario) certos artistas sepa-ram-se do monte e colocam a sua sensibilidade ao servigo da colectividade. Em suma) a realidade demonstra que os

    28 Cf. MARX, Manuscrftos Parfsfenses de 1844, ditos econ6mlco-fllos6flcos. 27 Tfmao de Atenas, IV, 3. 28 Marx a J. Weydemeyer, 16 de Janeiro de 1852. Em periodo revolucionario, poder-se-ia pensar que ha artlstas que se separam do

    monte e colocam a sua senslbilldade ao servi~;:o da colectivldade. Ora, constata Trotski: Os anos da revolu~;:iio tornaram-se os anos de sllencio quase completo da poesia. lsto niio foi de modo nenhum por causa da falta de papel, cf. Literatura e Revolur;ao, 10/18, p. 36.

  • APRESENTAC.AO 27

    artistas, mais do que gemos sublimes, niio passam de servidores, interpretes, bons e maus, de determinada causa.

    0 capitalismo, que suscita um individualismo furioso na concorrencia para ganhar a sua vida e impor-se, agrava ao maximo a condigiio dos artistas ao desenvolver a publicidade feita em redor dos grandes names. Muito sensatamente, as sociedades pre-capitalistas deixam traba-lhar na obscuridade e no anonimato para o bem d~ todos, os artistas e os cientistas, como to.dos os outros produtores.

    0 modo de remuneragiio dos pensadores e dos artistas resume a sua situagiio no capitalismo. Distingue-se pelo facto de que a obra do artista e do pensador e dificilmente separavel da sua pessoa, se bem que fique na maioria dos casas e na maior parte .do tempo embaragada nas relagoes de dependencia pessoal de outrem, quanta mais nao seja apenas porque e pago pelos rendimentos das pessoas que gozam com a sua arte, ou seja, classifica-se na mesma categoria dos lacaios e criados.

    Oontudo, o capitalismo encontra por vezes o meio de fazer do artista um trabalhador produtivo, alugando os seus servigos ou vendendo as suas telas mais baratas do que pagou ao seu autor, de forma que o artista se torna produtivo de capital sem veneer por isso o facto de que as suas activida:des sao manifestagoes superstruturais, basea-das no tempo livre e na mais-valia criada na base econ6-mica pelos proletarios, dado que niio deixa nunca de viver do rendimento de outrem, continuando a serum Servidor dos prazeres do paga.dor- um terciario. Nos periodos de prosperidade do capitalismo, a massa da mais-valia dis-ponivel na balsa aumenta de forma inaudita) e as tran-sacgoes sabre as obras de arte tomam dimensoes gigan-tescas. Estas determinagoes econ6micas do estado do artista e do pensador explicam todas as suas transfor-magoes.

    Com o capital, a arte e o pensamento degradam-se, tornando-se transaccionaveis por dinheiro. Ora, desde o alvorecer das sociedades de classes, os pensadores e os artistas eram individuos fora do comum, porque, na epoca em que o escravo ou o servo estava ligado ao trabalho produtivo e era desprezado por isso, o trabalho niio pro-

  • 28 CRfTICA DA EDUCA ser considerado> sob o capita-lismo) entre OS trabalhos produtiVOS> e abandonar qual-quer reivindicar;iio de superioridade do trabalho intelec-tual) e portanto tambem qualquer pretensiio a um salario dez ou quinze vezes superior ao do trabalhador manual. E por isso que os trabalhadores intelectuais e arti'~tas se revoltam eles mesmos na maior parte das vezes contra esta degradar;iio.

    De facto) diz Marx) o artista como o escritor tende para permanecer tanto quanta possivel na esfera eterea das actividades nobres> nem que seja para salvar os seus privilegios econ6micos. Ora> siio eles que a evolur;iio capi-talista mina no jim: cf. p. 131. Vejamos qual e o meca-nismo.

    A remunerar;iio ou o servir;o dos artistas> escrito-res) etc.) determina-se como nas corridas: o cavalo ven-cedor entre os vinte concorrentes absorveu tanto trabalho como os outros) mas sera o unico a ser pago> absorvendo o lucro de um) o mal de todos os outros.

    No ramo do trabalho intelectual) a diferenr;a sera mais forte entre trabalho simples e trabalho complexo) dando uma hierarquia louca das remunerar;oes a partir da distribuir;ao determinada pelo mecanismo do mercado. I sto passa-se como no derby> explica Marx: finalmente e um genio ou um idolo> Picasso ou Johnny Halliday) quem ficara com o pacote) e a multidiio de to.dos os que cantaram> pintaram> compuseram) escreveram) etc.> tera trabalhado para nada ou para pouco. E o superpa:rasitismo de algu-mas marionetas> orgulhosas pela public-idade e capazes de se dobrar ao gosto e as exigencias do business.

    Daqui resulta efeitos em contrapartida que siio espan-tosos. J a nem se trata de profanagao da arte > que constitui a primeira etapa da obra dissolvente do capitalismo) mas propriamente de impostura. Picasso> por exemplo) dispoe s6 para si de um mercado tal que vulgariza todas as epocas e todos os generos do oficio. Pando de acordo como gosto depravado da sociedade senil do capitalismo> a um ritmo de cadeia de fabrica> as obras originais criadas por todos

  • /!.PRESENT AQAO 29

    os seus predecessores e contemporaneos, eclipsa-os todos, copiando-os e gozando-os. Com esta fetida torrente nive-ladora) o ruido publicitario feito em redor do virtuoso a.bafa no mercado todos os talentos originais que morrem no avo. Do mesmo modo) a difusao do jazz no mercado mundial depravou a inspiraQao original dos inumeraveis tocadores de jazz e secou a sua fonte para o futuro.

    Como cada acto de um homem da classe do'li],inante faz dele um her6i) cada obra de um artista ou de um pen-sador o transforma num genio. Nao e por acaso que na epoca de Estaline) que ligou o mercado do Leste ao do Oeste) o culto da personalidade se alargou tambem ao genio de pacotilha de um Picasso: a arte falsificada decompoe-se entao) como os sentimentos falsificados) aumentados pelo cinema e a televisao) numa epoca de decadencia geral da sociedade que mata no ovo) desde que a hist6ria esta im6vel) toda a vida e todo o sentimento autenticos. A arte deixa de ser viva para se tornar estereotipada) e) num rita monstruoso ao idolo Cultura) as multidoes embrutecidas desfilam perante a Gioconda sob o matraquear da publi-cidade- tal como se ajoelham perante as reliquias sagra-das na Sexta-feira Santa.

    0 mercantilismo da nossa epoca senil opera um nive-lamento e uma degradaQao inauditos da arte - a medida da produQao de massa moderna sabre um mercado cada vez mais universal: o primeiro gesto revolucionario do capital foi a profanagao da arte e do pensamento) na sua fase senil) assiste-se a sua dissolugao e a sua decomposi-gao. 0 que e notavel) e que este proceSSO atinge OS pin-caros do trabalho intelectual) dito nobre, daqueles que vivem na mais-valia e do trabalho livre criados pelos trabalhadores produtivos explorados. Revela que as pr6-prias camadas privilegiadas sao socializadas e desprovidas da sua personalidade para se tornarem uma forQa de tra-balho que se vende e se compra) ou seja assalariada e reduzida ao desemprego. Tudo isto indica finalmente que o capitalismo e um sistema de transiQao para uma forma superior de apropriaQao.

    No comunismo) o artista deixara de serum servidor} desaparecendo tambem esse especialista} quando tudo for

  • 30 CRtTICA DA EDUCAQAO E DO ENSING

    dos individuos, que, entre outras coisas, jarao pintura e musica 29 J porque sera abolida a divisao do trabalho que divide os homens numa especialidade, da qual ignoram as a.djacencias.

    Em Anti-Diihring, Engels escreve que Um dia, dei-xara de haver pedreiros e arquitectos de projissao, se bem que o homem que, durante uma meia-hora, tiver dado directivas de arquitecto, andara tambem algum tempo a puxar 0 carrinho de mao, ate que alguem de novo rhe pega que trabalhe como arquitecto! Que belo socialismo aquele que eternizaria OS pedreiros de projissao! 80.

    0 homem liberto em todos os sentidos nao sera sim-plesmente erudi!to (ou cultivado) em todas as ciencias, letras e artes, como o espirito enciclopedico, esse ideal seco e abstracto do racionalismo, que o proprio Hegel rejeitava (sendo, segundo a expressao de Marx, heretico para a con-cepgao burguesa) quando declarava, baseando-se nas altas j-iguras do passado medieval, num Leonardo Da Vinci, par exemplo: Par homens cultos, deve em primeiro lugar entender-se os que podem F AZER o que F AZEM TO DOS OS OUTROS 8\

    Portanto deste modo, voces querem, voces comunis-tas, abolir nao so a propriedade priva.da, a patria, a fami-lia, mas ainda a Ciencia, a Arte e a Cultura? Sim, sem duvida nenhuma, desde que delas se fagam, como hoje, entidades abstractas que dao lugar a profissoes, desde que as idolatrizem, ou seja, que OS produtos do cerebra humano paregam dotados de uma vida propria, figuras autonomas que tem relagoes entre si e os homens- como e o caso, no mundo comercial, dos produtos criados pela mao do homem 82.

    29 Cf. MARX-ENGELS, Die deutsche Ideo/ogle, In Werke, 3, p. 379. Antes desta citagao, llilarx-Engels tinham subllnhado: A concentragao exclusiva do talento artistico nalguns lndl-vfduos e a sua extinr;ao consecutiva nas grandes massas sao urn efelto da dlvisao do trabalho.

    30 ENGELS, Anti-Dilhring, In Werke, 20, p. 148. " Cf. a seguir, p. 203. Gada vez que citamos uma passagem reproduzlda mals adiante

    no texto, nao daremos a sua referencia detalhada, mas remetemos slmplesmente o leltor para a pagina onde ela se encontra na presents colectiinea.

    32 Cf. MARX, 0 Capital, In Werke, I, 23, p. 86. Cf. lgualmente 0 caracter id6latra da mercadorla e o seu segredo, capitulo bastante mal abordado pelo tradutor Roy (cf. Ed. Socia-les, livro I, t. 1, pp. 83-94). Esta abolir;ao preocupa ao rna is elevado grau os burgueses e os seus apologlstas: Tal como, para o burgues, o fim da propriedade de classe equivale ao flm de toda a produgao, o fim da cultura de classe significa para ele o fim de toda a cultura.

  • APRESENTA9.AO 31

    A ciencia nao destila verdades absolutas, mas relati-vas. E por isso que Marx aborda simultaneamente objectos e ideias n'O Capital: o fetichismo das sociedades mercantis -tanto no Leste como no Ocidente, nos nossos dias-caracteriza-se precisamente pelo facto de que um objecto ou uma ideia e produzida para ser vendida, alienada, se bem que se autonomize em face do produtor no mercado, onde a forr;a de trabalho, os instrumentos e os produtos se

    . ' acumulam para serem trocados, dom~nando os produtores desprovidos das suas criaQi5es e com necessidades.

    A educar;iio comunista

    Se, por vezes, utilizamos a palavra educagao num con-texto comunista, nao e para alterarmos as nossas pr6prias afirmar;i5es sobre a sua aboliQiio na sociedade sem classes. 0 proprio Marx exprime-se desta forma didactica em 0 Capital para sublinhar de que maneira os conceitos da sociedade de classes se transformam em formas novas, totalmente originais} durante a fase de transir;ao da dita-dura do proletariado. De facto, como explica Marx n' A Ideologia Alema ss, por exemplo a prop6sito do ambiguo termo valor nas nossas sociedades, uma linguagem nova nascera com a forma . de produr;ao nova do comunismo.

    Marx nunca opi5e qualquer concepQiio positiva as solur;i5es burguesas} porque 0 comunismo e abolir;ao das relar;i5es burguesas, ou seja negar;ao) depois sintese nova. N ao ad mite port an to a idealist a educar;ao que vem de ex ducere, conduzir fora de) promover) abstraindo e autono-mizando. Fala de libertar;ao do homem na base de um rnundo material) completamente revolucionado para socia-Uzar e desenvolver o homem em todos os sentidos) ap6s ter operado a fusao da cidade e do campo J do ensino e da produr;ao) do trabalho manual e do trabalho intelectual) de tal forma que o homem deixara de ser uma pessoa pri-

    A cultura de que ele lamenta a perda nao passa, para a !mensa maiorla, de urn trelno para dela fazer maqulnas. (0 Manifesto Comunlsta, cap. Proletarlos e Comunlstas.)

    3' L'ldeo/og/e allemande, Ed. Sociales, p. 263.

  • 32 CRfTICA DA EDUCA
  • APRESENTAQAO 33

    E a cultura opera ria?

    A formar;ao intelectual do proletariado oscila entre dois p6los completamente contradit6rios, enquanto se mover na sociedade de classes. Em primeiro lugar, e indu-bitavel que a classe operaria e portadora da ciencia do futuro. 0 velho Engels, ao evocar a superioridade deste saber, devido nao as virtudes pr6prias de cada proletario, mas ao facto de que a sua classe representa .a sociedade superior do comunismo, prevenia aqueles que aderiam ao partido ap6s sairem das universidades: Sera de qualquer forma necessaria que os senhores estudantes deem conta de que a cultura, com que se preocupam tanto, e muito mediocre em relar;ao aquila que os operarios possuem ja instintivamente, de maneira imediata no sentido de Hegel e de que devem, eles, apropriar-se ainda com mil sofri-mentos 85 .

    Contudo, por outro lado, um dos caracteres essenciais e perpetuos do regime assalariado (que, como a experien-cia confirma duramente, se torna cada vez mais penoso) e a mediocridade inevitavel do nivel de cultura dos ope-rarios em geral. A plena educar;ao cultural das vastas massas nao pode ser atingida na sociedade dividida em classes, mas apenas depois da revolur;ao. Fazer desta cons-ciencia a condir;ao sine qua non anterior a revolur;ao, seria adiar o socialismo sine die. Isso derivaria, alem disso, de uma concepr;ao arqui-reformista, segundo a qual o espi-ri.to guia o mundo e a consciencia progride a despeito do agravamento da explorar;ao que caracteriza o desenvolvi-mento capitalista: Tanto para produzir macir;amente a consciencia comunista, como para levar a cabo o proprio comunismo, e precisa uma transformar;ao macir;a dos homens, que s6 pode dar-se por meio de um movimento pratico, por uma revolur;ao. Em consequencia, a revolur;ao

    35 Cf. Engels a Conrad Schmidt, 4 de Feverelro de 1892. Nesta colectanea, referir-nos-emos a numerosas passagens de Engels sobre as inu-

    meraveis deformac;:oes que os intelectuais formados pelas universidades trazem espontanea-mente para o socialismo cientffico do proletariado revolucionario . 3

  • 34 CRfTICA DA EDUCA9.AO E DO ENSINO

    niio e apenas necessaria) porque niio existe outro meio para derrubar a classe dominante, mas ainda porque a classe subversiva s6 pode conseguir atraves de uma revolugiio livrar-se) ela mesma) de toda a velha podridiio do passado) tornar-se capaz de fundar uma sociedade sobre bases novas 56.

    0 desenvolvimento intelectual de classe e a conse-quencia directa da situagiio econ6mica do operariq) e esta e das mais complexas) porque evolui nas contradigoes) nos altos e baixos dos ciclos de crise e de prosperidade) com fases revolucionarias ou contra-revolucionarias. 0 marxismo afirma todavia que a grande industria faz amadurecer as contradigoes e antagonismos da forma capitalista do processo de produgiio) ou seja) ao mesmo tempo que os ele-mentos de formagiio e de consciencia) os elementos subver-sivos da velha sociedade 51.

    N unca e onde o capitalismo est a mais desenvolvido - ontem em Inglaterra) hoje nos Estados Unidos- que a consciencia operaria e a mais aguda e que a revolugiio se da em primeiro lugar) oferecendo ai o capitalismo o maxi-mo de resistencia porque e o mais forte e o mais armado. EJ pelo contrario) nos paises onde as contradigoes econ6-micas) politicas e sociais sao multiplas e gritantes) de

    " Cf. MARX-ENGELS, Die deutsche /deologie, in Werke, 3, p. 71. Em suma, enquanto o proletariado viver na sociedade capitalista, nao pode existlr

    uma visao consciente do seu futuro em cada um dos seus membros, nem na sua totalidade (tese obreirista) . Do mesmo modo, e insensate pretender que esta consciencla esteja na maior/a desta classe (tese do fetichismo democratico). A contradi

  • APRESENT AQA:O 35

    elo mais fraco. Esta simples constatagao basta para refu-tar a tese do desenvolvimento progressivo da consciencia de classe, que seria gradualmente cada vez mais intensa, ampla e aguda nas massas.

    Seria necessaria um grande volume para abordar esta questao que apenas mencionamos aqui. Mas o leitor pode encontrar noutras obras elementos de resposta mais com-pletos 88

    U m ensino de classe

    Todo o sistema de ensino da sociedade capitalista assenta no racionalismo burgues, ou seja um idealismo ou iluminismo que esclarece os espiritos, a massa e a materia. Neste sentido, o principia da revelw;ao esta no seio das escolas burguesas tanto laicas como religiosas. Toda a sociedade dividida em duas classes e necessariamente idea-lista: a elite esclarecida dita as normas, e a massa bruta deve segui-las sem discussao. N em sequer ha lugar para a famosa liberdade de pensamento que a revolugao bur-guesa pretendeu instaurar no mundo, dado que se trata de iluminar os espiritos a partir do monop6lio cientifico de uma minoria, cujas ideias re flectem os seus pr6prios interesses econ6micos imediatos, em oposigao aos das amplas massas que nao podem escolher a sua verdade em fungao das suas condigoes e interesses materia is so. Este

    " Cf. nomeadamente A questao filos6fica na teor.ia marxista, in Le F/1 du temps, n.0 13, pp. 133 e segs.: Polemlca sobre a 'questao da cultura' no congresso de Bolonha de Setembro de 1912.

    " Engels cite diversos exemplos da maneira como as classes dominantes ergueram barreiras em redor do seu monop61io de cultura, a fim de evitar que nao fosse comprometido por elementos safdos de outras classes socials. Estes exemplos nao podem evidentemente ser exaustivos, porque a classe privilegiada tern mil e uma maneiras de defender as suas vantagens: Parece que na Russia s6 os filhos das camadas superiores terao o direito de estudar, e para isso foi preciso reprovar todos os outros. Este destino atingiu pelo menos 24 000 jovens em 1873, e bloqueou-lhes a carreira, proibindo-os mesmo de serem instituidores. E admiram-se em seguida com a extensao do 'niilismo' na Russia. (Engels a Bebel, 15 de Outubro de 1875.)

    Para manter as massas na ignorancia e evitar, alem disso, que uma cultura geral despertasse demasiado em determinados espiritos, a Austria organizara as suas universi-dades de tal forma que s6 formavam especialistas, que podiam sempre ter exito na disciplina particular da sua ciencia, mas que nao podiam em caso algum transmltir uma cultura geral sem preconceitos que as universidades devem transmitir (Revolu{:ao e Contra-Revolu{:ao na Alemanha, cap. IV: A Austria, in Werke, 8, pp. 31-32).

  • 3$ CRfTICA DA EDUCA9AO E DO ENSING

    iluminismo} finalmente} apoia sempre os dominadores e os tiranos} e mistifica as massas pretendendo estar acima das classes.

    Vejamos agora o efeito do mesquinho ensino elemen-tar obrigat6rio sabre as amplas massas dos paises desen-volvidos, tendo em conta que o proletariado tem verda-des para as quais tende instinrtivamente pelas suas con-digoes materiais de meio} condigoes que sao di

  • APRESENTA9AO 37

    mfios da classe capitalista. Tem tendencia para dar aos jovens uma educar;fio que os torna leais e resignados ao sistema actual} e os impede de descobrir as suas contra-dir;oes internas.

    A escola burguesa e um molde que prepara para a fabrica e os escritorios} um instituto de treino para a prisfio assalariada: A crianr;a esta limitada a um unico trabalho que e estudar} empalidecer com os rudimentos da grama-ti.ca} de manhfi e de tarde} durante 10 a 11 meses por ano. Podera ela deixar de sentir aversfio pelo estudo? lsto e suficiente para enfadar mesmo aquelas que tem inclinar;fio para o estudo. A crianr;a tem necessidade de ir} quando faz bom tempo} trabalhar para os jardins} para os bosques} para os prados} so deve estudar nos dias de chuva e na estar;fio baixa} e deve ainda variar os seus estudos. (. . .)

    Uma sociedade que comete o erro de encarcerar os pais nos escritorios} pode tambem acrescentar a asneira de encerrar a crianr;a todo o ano num pensionato} onde ela se aborrece tanto com o estudo como os professo;res 41.

    Quando Marx afirma que a educar;fio deve partir da pratica e da sensibilidade propria da crianr;a} OS sentidos praticos) e sobretudo o nariz e a boca} sendo os primeiros orgfios com os quais a crianr;a julga o mundo 42; nfio faz mais do que retomar a critica de Fourier a qualquer ensino da civilizar;fio: A escola coloca a teoria antes da pra-tica. Todos os sistemas civilizados caem neste erro: nfio sabendo seduzir a crianga para o trabalho; sfio obrigados a deixa-la em f6rias ate aos 6 ou 7 anos} idade que ela deveria ter utilizado para se tornar um habil pratico }. depois} aos 7 anos} querem inicia-la na teoria} nos estudos} em conhecimentos cujo desejo ninguem nela despertou 43.

    Os filhos dos proletarios} habituados a viver nas ruas} sfio mais atingidos pela inversfio iluminista da escola. Em consequencia} Marx defendeu} no proprio seio da socie-dade capitalista} a ligar;fio entre pro.dur;fio} exercicio fisico

    " Cf. Ch. FOURIER, Le Nouveau Monde industrie/ et soclttalre, in CEuvres completes, t. VI, relmpressao anastatica, Anthropos, p. 219.

    " Cf. mais adiante, p. 230. 43 Ibid., pp. 213-214.

  • 38 CRfTICA DA EDUCA(;AO E DO ENSINO

    e intelectual) por uma formagao especifica a classe opera-ria 44 Este sistema de educagao de estrito caracter de classe nao esta de modo nenhum em oposigao com o sis-tema comunista: baseando-se no movimento econ6mico estimulado na produgao capitalista) a acgao politica e consciente do proletariado leva-a para alem das suas limi-tagoes actuais) ao preparar imediatamente as condigoes para abolir as especialidades profissionais) intelec,tuais ou manuais nos produtores.

    Educagao e promogao social

    Apresentar o ensino como um meio que se oferece a todos) como uma oportunidade de subida social) oferecida no alvorecer da vida) independentemente da origem social dos individuos) e tipico da abstracta e oca democracia burguesa e procede de uma dupla mistificagao) que s6 tem influencia sabre os pequeno-burgueses que oscilam entre as classes exploradoras e a classe explorada:

    Para a maioria) que s6 nos interessa numa visao de classe) o ensino apenas reproduz para o futuro as condi-QOes de saber e de ignorancia) indispensaveis ao bom anda-mento do capital 45 Daqui result a a sua divisao funda-mental em ensino elementar obrigat6rio e ensino superior) abandonando as criangas mais favorecidas o primeiro a partir da idade de 10-11 anos. A selecgao feroz (que explica a angustia e por vezes a revolt a nos jovens) e feita por grosso a partir da base econ6mica e nao da inteligencia) igualmente repartida potencialmente em todas as classes) dispondo as criangas dos ricos de um meio material que as prepara muito naturalmente para a ideologia e as reac-QOes dominantes) e as pobres vivendo no est ado que reproduz a pobreza) nao condizendo as suas condigoes com o que lhes e ensinado na escola.

    44 Cf. mais adiante, pp. 203-224. 45 Nos seus cadernos de extractos de Bruxelas de 1845, Marx notava que a deslgual-

    dade dos conhecimentos e urn meio de manter todas as deslgualdades socials, que a educa

  • AP RESENT A9A.O 39

    Em seguidaJ a escola afirma-se um meio hip6crita de atribuir a mais-valia e o tempo livre a expansfio a unsJ e o trabalho assalariado cego aos outros: Se o operario faz sobretrabalhoJ e porque 0 tempo de trabalho necessaria do capitalista e tempo livre, porque nfio precisa dele para a sua subsistencia imediata. Dado que todo este tempo livre permite um livre desenvolvimentoJ 0 CAPITALIST A USURPA 0 TEMPO LIVRE CRIADO PELO OPEif-A..R/0 PARA A SOCIEDADEJ ou seja a civilizaQfio. E neste sen-tido que Wade tem toda a razfio quando afirma que capital e sin6nimo de civilizaQfiO 46 .

    No VI Capitulo Inedito do Capital 47 , Marx afirma que por meio desta usurpaQfioJ O capital torna-se a paten-cia democraticaJ filantr6pica e igualitaria por excelencia. Em seguidaJ graQas ao ensinoJ pago pela mais-valia extor-quida aos operarios d~trante o tempo livre monopolizado pela classe privilegiadaJ O capitalista torna-se o homem social por excelencia ( desabrochado em condiQoes alienadas) J e representa a civilizaQfio 48. A fim de que nfio subsista nenhuma duvida sabre a natureza infecta e alienada desta civilizaQfio das sociedades de classeJ Engels precisa a pro-pr6sito da redacQfio do programa socialista de Erfurt de 1891: E e preciso dizer que) dado o antagonismo social) tambem as classes dominantes sfio estropiadas tanto inte-lectualmente como fisicamenteJ e repito: ainda mais do que as classes oprimidas 49.

    " Cf. MARX, Fundamentos da critlca da econom/a po/itlca (Grundrlssel. 10/18, t. 3, p. 22.

    Uma abordagem multo sumaria das estruturas da base econ6mlca e das superstruturas jurfdlcas, politicas, artisticas e ideol6gicas permite ja delimitar nitidamente a natureza das classes da sociedade capitalista. Eia contradiz de forma flagrante as analises das classes feitas palos partidos comunistas oficiais, cujo marxismo e grosseiramente deformado com fins oportunlstas e eleitoralistas que implicam lisonjear as camadas privilegiadas, par vezes assala-r;adas, para as conquistar. Cf. par exemplo a obra mais recente de Claude QUIN: Classes soc/ales et union du peup/e, Ed Sociales. Este simples titulo e uma heresia, porque se a nor;:ao de c/asse implica urn antagonismo social, a nor;:ao de povo significa a abolir;:ao de todas as classes numa amalgama hfbrida monstruosa de caracter tlplcamente burgues e anticlentfflco, dado que apaga qualquer determinar;:ao .econ6mica, polftica e social na sua definlr;:ao, que nao e mais do que mlstificadora.

    47 Op. cit., p. 254. " ibid., pp. 254-255. Engels a Kautsky, 28 de Setembro de 1891.

  • 40 CRfTICA DA EDUCA9A.O E DO ENSING

    A escola da ociosidade au da superficialidade Esta civilizagao) par muito brilhante que se pretenda

    que. seja) niio pode ser separada das suas condigoes mate-rriais de produgiio que sao) para n6s) determinantes. S6 pode ser uma falsa civilizagiio) tal como e a ciencia apro-priada pelo Capital) que pode evidentemente servir as seus fins de produgiio e de exploragiio) mas niio pode se'r consi-derada como o nee plus ultra da humanidade presente e futura.

    Marx) como as socialistas que o precederam) niio se satisfez com isto. Owen) que combinara na sua Cidade modelo o trabalho produtivo com o estudo) compreendera ja que o ensino escolar iluminista era o futuro necessaria da civilizagiio de classes ociosas e niio valia mais do que essas mesmas classes. Em 0 Capital, Marx cita um outro dos seus precursores ingleses: Aprend.er na ociosidade nao e melhor do que aprender a ociosid31de ... 0 sofrimento que u.m homem poupa em prazeres, encontra-lo-a em doengas. Uma ocupagiio idiota das criangas (aqui John Bellers pres-sente ja as frivolidades de Basedow e dos seus imitadores modernos 50) torna pateta o espirito das criangas 5\

    E Marx) ap6s ter comparado o sistema proletario ao burgues) dira com desprezo) nas suas instrugoes para o congresso da Internacional em 1868: Se a burguesia e a aristocracia desprezam os seus deveres para com a sua des-cendencia) e za com eles. A crianga que goza dos privil6-gios destas classes est a condenada a so frer com os seus preconceitoS52 .

    A ciencia ociosa) revelada nas escolas da burguesia) e essencialmente abstracta) livresca) escolar) estando sepa-rada da base - as condigoes materiais de vida e de produ-giio pretensamente cegas) que o socialismo pretende justa-

    50 Marx faz alusao ao sistema pedag6glco de Basedow (1723-1790), que propunha escolas do amor dos homens e dos bons costumes, incorporando ao ensino escolar trabalhos de can3cter artesanal, sistema hoje completamente ultrapassado pela grande industria. Cf. p. 210, nota 33.

    51 Cf. MARX, Das Kapital, l, in Werke, 23, p. 513. 52 Cf. mals adiante, p. 223.

  • APRESENT AQA.O 41

    mente humanizar) revivificarJ tornar inteligiveis e tao falantes como a crianQaJ evoluindo e agindo ai) apropriar--se-a da heranQa espiritual objectivada nas maquinas e nas coisas pelas geraQoes anteriores) ap6s as barreiras da pro-priedade privada das pessoas) dos grupos) das socie.dades an6nimas ou nao) e das classes terem sido abolidas: A exis-tencia objectivada que a industria atingiu sera entao o livro aberto das forQas e das aptidoes do homem),a psi-cologia do homem no est ado sensivel ~a.

    N ao e certamente introduzindo o trabalho manual de tipo artesanal) mais ou menos atraente) mas completa-mente fora de usa hoje) nas escolas renovadasJ onde as crianQas sao evidentemente mais felizes do que nas rebar-bativas escolas iluministas da Ciencia da ociosidadeJ que se familiarizara a crianQa com os meios de produQao reais da sua vida e as leis cientificas que ai sao objectivadas ou com a natureza social do homem e mais simplesmente o meio ambiente) a natureza.

    A escola do parasitismo

    As escolas iluministas cultivam na crianQa a simula-Qao e uma falsa pieguice que sao a forQa do abstracto saber alienado: ela deve descrever) par exemplo) uma noite de Natal na ProvenQaJ onde nunca pos os pes. Segundo Engels 5 \ o espirito universitario) afirmando-se produtivo a sua maneira) faz mais com menos) ao abordar um tema com uma documentaQao insuficiente) realizando a ginas-tica da inteligencia o todo e cobrindo-o com o seu brilho. Nao compete aos professores par definiQao esgotar todos os conhecimentos da sua materia? A escola ensina deste modo a pretensao e a suficiencia do especialista e do peri to: a escroqueria intelectual.

    A escola forma tambem todos os que tem falta de inspiraQaOJ nao por falta de talento proprio- coisa COrrente e espalhada- mas pelas determinaQoes da vida de uma

    53 Cf. mais adiante, p. 235. 54 Cf. mais adiante, pp. 179-180.

  • 42 CRITICA DA EDUCA9A.O E DO ENSINO

    sociedade capitalista em plena decadencia com o seu con-formismo esclerosado e as suas audacias galhofeiras, pr6-prias das sociedades senis. No ambiente de negociata e de venalidade, a escola prepara os que exercerao as funQoes do capital para explorar a ciencia e a arte acumuladas por todas as geraQoes do passado e do presente - e no mundo inteiro.

    Toda a arte nao passa de habil pldgio, imitaQfiO e reprodur;ao levados a perfeir;iio tecnica, com variar;oes sobre temas mais do que gastos, desde a arte pre-hist6rica ou negra, a musica religiosa. Uma ponta de violencia muito actual, enxertada num tema de tragedia antiga, produz um policial, um formidavel wes:teTn, um filme de amor ou, mais a moda ainda, um porno. A televis{io prepara um grande publico para estas produr;oes, cerceando e embo-tando OS sentimentos para ja SO deixar lugar a forr;a mecanica do suspense e do sensacional no consumidor corrompido, sentado na sua cadeira a lareira no isolamento da vida privada onde mais nada e vergonhoso, dado que solitario e escondido.

    0 segredo de fabrico de todos estes produtores modernos e aquilo a que n6s, marxistas ortodoxos, chama-riamos um revisionismo sistematico, tornado a ideologia das classes burguesas, a partir de agora parasitarias, que exploram o trabalho e as obras de outrem, compondo-as a seu gosto. Este espirito burgues, ensina-o a escola demo-craticamente aos individuos de todas as classes da socie-dade- a uns longamente para o aplicar, aos outros bre-vemente para o sofrerem. Os mais inteligentes, assim que se libertam de escrnpulos e sao oportunistas, fazem disso questao e sobem na escala social para forma rem a elite, que monopoliza e transacciona a cultura, fazendo dela sua propriedade privada; 0 processo e simples: agarra-se no melhor dos outros- nos cldssicos- e mistura-se ai, como contribuir;ao individual, o que tem interesse no mer-cado de grande serie: a vulgaridade que atinge e lisonjeia as massas.

    0 totalitarismo fascista, que conquistou o mundo inteiro diluindo-se nos paises vencedores da ultima guerra, planifica nao s6 a produr;ao mundial, mas ainda a politica

  • APRESENTAQAO 43

    e a ideologia} por meio dos mass media, cuja rede e a partir de agora mais densa ainda do que os esgotos das lojas e das mercearias que carregam o dinheiro e a pro-dugao comercial atraves de todas as cidades e ate para as aldeias aos mais calculados pregos} sempre em subida. 0 fascismo comegou} impondo brutalmente as suas hierar-quias e elites. Estas expandem-se hoje espontaneamente por meio do mecanismo econ6mico que monopqliza a ciencia} a tecnica e a cultura de forma corporativista nos corpos especializados de professores} de artistas} de enge-nheiros, de arquitectos} etc.} que gozam privilegios de casta.

    Para se apropriarem das obras das geraQoes passa-das} os nossos contemporaneos chafurdam como porcos perante dais idolos: em primeiro lugar o Estado, que garante a ordem social} com a sujeiQao dos produtores e a hierarquia quase burocratica dos privilegiados} em se-guida o individuo, que faz neg6cios por sua propria conta. Esta sociedade} cada vez mais esclerosada e autoritaria} desenvolve mais do que nunca a teoria hitleriana e racista da segregaQao das massas, por um lado} e da elite} do homem de excepQao, do genio} por outro. Sempre social} chega a admitir a preeminencia do trabalho} mas unicamente para explorar os seus frutos} a obra. A pira-mide- base produtiva} depois esferas politica e ideol6gica - s6 e reconhecida para ser derrubada} sendo o trabalho feito pelos Sacanas J e a obra apreciada e apropriada pela elite} a mafia dos privilegiados} com a mistijicagao do genio, de que nao se sabe de onde tira as suas virtudes. Nunca o trabalhador foi tao injuriado.

    No capitalismo senil esclerosado} as funQoes do capital sao desempenhadas por assalariados e desenvolve-se ai uma enorme aristocracia operaria. Nestas condiQoes, a louca hierarquia dos salarios- maior em FranQa do que noutro lado qualquer} o que testemunha a fraqueza dos sindicatos operarios- exprime a sua maneira o parasi-tismo burgues que esfola o trabalho produtivo: quanta mais penoso e um trabalho e se situa na esfera profunda da produQao} mais mal pago e menos respeita.do e} enquanto quanta mais se abstrai do esforQo} mais rende. lsto tam-bem se veri fica no ensino- sem no entanto fazer dos pro-

  • 44 CRfTICA DA EDUCA(:A.O E DO ENSING

    fessores em desvantagem proletarios. N a parte inferior da escala) ha os que sairam do primario) trabalham mais horas e SaO OS mais mal pagosJ depois vem OS diplomados (certifies) e finalmente os efectivos (agregis)J fora do rebanho: menos horas) mais dinheiro!

    Uma verdadeira escroqueria foi desenvolvida com o conceito de especializa

  • APRESENTA9AO 45

    z.ismo esta a educaqao directamente integrada no Estado) sendo ao mesmo tempo apropriada por grupos de indi-viduos.

    Nunca a ciencia tera estado tao infectada pela vena-lidade e corrupqao mercantil. Ap6s o ascenso da fase inicial do capitalismo) torna-se mais falsa do que as intuiqoes ingenuas dos modos de produqao anteriores. Alguma vez se viu antes aplicar-se a ciencia a corrupqao da alirnenta-qao? A louca caqa Cientifica a produtividade tornou OS cereais praticamente impr6prios e perigosos para consumo humano) e substitui-se muitas vezes o parco por soja nas latas de presunto que se vendem! Algumas medidas de au:taridade muito simples fizeram mais do que todos os institutos de investigagao medica do Ocidente desenvolvido) fazendo desaparecer) por exemplo) na China) as doengas 'venereas) que se espalham cada vez mais nos paises desen-volvidos) apesar dos antibi6ticos.

    A ciencia nem sempre foi superior a forqa ( politica e econ6mica) _, e sera assim enquanto for idealist a e comer-ciante. Ora se a ciencia burguesa nao tivesse sido inver-t-ida e fetichista desde os seus inicios) nao teria evoluido deste modo na sua fase senil. Einstein e Oppenheimer envergonharam-se- no fim da sua vida- por terem em-prestado o seu saber a tecnologia avanqada da morte.

    E efectivamente na tecnica que as relagoes fetichistas do capitalismo se manifestam mais cinicamente: os espe-cialistas) que devem a sua vantagem a mais-valia extor-quida aos operarios e com a qual se constroem as univer-sidades e institutos onde se concentra o tempo livre criado pela produtividade crescente do trabalho para desenvolver a Oiencia) esses proxenetas defendem que o trabalho produtivo dos operarios e cego e que s6 eles_, com a sua tecnica aprendida na escola_, podem esclarece.;.los e fazer deles o que quiserem_, comanda-los.

    N a massa cada vez mais ignorante e embrutecida enxertam-se parasitas sempre mais numerosos) cuja pro-

    cipac;;iio dos trabalhadores, a classe mais numerosa e a mais inculta: Tendo todas as muti-lac;;oes nascido historicamente, seriio de novo abolidas historicamente. Entretanto, o desen-volvimento das crianc;:as faz-se segundo o desenvolvimento dos pals (Ibid., p. 403).

  • 46 CRITICA DA EDUCAQA.O E DO ENSING

    mogiio e individual e privada. Qualquer talento e qualquer energia particulares se viram a partir dai para o parasi-tismo: trabalhar menos e ganhar mais) extorquindo uma vantagem particular para o individuo que sabe aproveitar os seus dons pessoais para viver em detrimento dos pro-dutOTes e do desenvolvirmento geral !das dencias e das artes.

    E os operarios?

    Com o seu oportunismo) o reformismo social-demo-crata) que se combina hoje com o estalinismo degenerado, levou todos os vicios do capitalismo senil para a classe operaria dos paises desenvolvidos) e niio e por acaso que toda a acr;ao comum dos dois partidos culmina no gesto jetichista do eleitoralismo 57 Os revolucionarios autenticos niio deixaram, esses, de repetir que a via para o socialismo implica um parto dificil, e que niio e possivel mudar todo um mundo sem um so frimento infinito- o que salta aos olhos de todos aqueles que estiio habituados ao esforr;o do trabalho. Em principia, o partido revolucionario evita qualquer decisiio e qualquer escolha que poderiam ser ditadas pelo desejo de obter grandes resultados por meio de um trabalho e um 'Sa;crificio minimos. Esta norma e evidente para quem quer que considere a sociedade como um campo de forg.as materiais em movimento, e pretenda uma mudanr;a real.

    0 opor:tunismo, esse, traduz a tendencia dos pequeno--burgueses para a preguir;a e obedece a lei fundamental do capitalismo: obter o maximo de lucro com o minima de despesa,s.

    "' Nao e de ontem que data este fen6meno, cuja amplitude evidentemente nunca foi tao grande como hoje. Engels conheceu-o multo bern e descreveu-o de maneira inexcedfvel: Na lnglaterra e na America, em Fran9a como na Alemanha, a pressao do movimento proletiirio deu aos economistas burgueses a colora9ao quase uniforme do socialismo da ciitedra fllan-tr6pica (cf. as teorias do bem-estar do capitalismo popular), e suscita urn eclectismo bem-pensante e despido de espfrito critico que em todo o lado prevalece. !: como uma especie de gelatina mole, viscosa e maleiivel que consegue insinuar-se em todo o lado e forma uma excelente terra nutritiva para desenvolver como em estufa quente os arrivistas, assim como a gelatina verdadeira serve para criar bacterias. 0 efeito desta marmelada de urn pensamento inconsistente e desvirtualizante faz-se sentir- pelo menos na Alemanha e nos Germano-America nos- ate no seio do partido, mas pulula exuberantemente nas suas fronteiras . (Cf. Engels a Georg Heinrich von Vollmar, 13 de Agosto de H184.)

  • APRESENTA9.AO 47

    0 estalinismo oportunista despojou as massas da sua iniciativa e mandou as urtigas a regra da Primeira Inter-nacional de Marx: a emancipagao da classe opera ria sera a sua obra propria. Sob Estaline, o Estado russo pretendeu edificar, com os seus planos quinquenais, o socialismo no lugar dos trabalhadores, e o impulso das massas foi inter-rompido pela fetichizagao do partido governamental e a personalizagao que fazia crer que um individuo genial encontraria solugoes-milagre na luta de classes. Ao trans-formar a politica de classe em politica de Estado e de pessoas, empurrou-se os operarios para uma via pretensa-mente comoda, que os conduziu de derrota em derrota. Foram obrigados a aplaudir servilmente a potencia do chefe genial sempre vitorioso, a grandeza dos textos de ilustres autores 58, a eloquencia de oradores bem-falantes e demagogos.

    Esta verdadeira degenerescencia que atinge a classe operaria dos paises desenvolvidos tem um caracter nitida-mente romantico e idealista, e macaqueia as inversoes do

  • 48 CRfTICA DA EDUCAQA.O E DO ENSINO

    individuo uma policia de Estado secreta ~9. A partir do momenta em que estes dois idolos complementares sao abolidos) acabaram-se as concepgoes proprietarias e para-sitarias.

    Este parasitismo s6 podera ser extirpado quando ja nao houver apropriag{io individual) quando Gada um der segundo as suas capacidades e receber segundo as suas necessidades 60) sem ja manter uma contabilidade da con-tribuigao do individuo) tornado quantidade desprezivel em relagao as enormes forgas produtivas sociais) em movi-mento da produgao. Em vez de considerar que o motor da actividade eo incentivo do lucro) o homem social do comu-nismo considerara que o seu objectivo e a sua activagao) que permite o seu desenvolvimento em todos os sentidos) possivel unicamente numa sociedade colectivista que nao poe qualquer entrave ao desenvolvimento dos individuos) Sendo ai a livre expansao de cada um a condigao do livre desenvolvimento de todos (Manifesto).

    " A concepvao an6nima e materialista do militante de partido que antecipa o homem comunista, desinteressado e alergico ao dinheiro, reflecte-se directamente no metoda de trabalho de Marx. !:: assim que Lafargue relata que, se o autor de 0 Capital teve imenso trabalho para encontrar os iniciadores autenticos dos grandes pensamentos econ6micos e nao simplesmente os seus autores mais reputados, nao foi porque pensasse render homenagem ao culto absurdo das criav6es pessoais, nem porque pretendesse o pedantismo universitiirio, mas para demonstrar que nas viragens da evoluvao e em ligavao com o desenvolvimento material da humanidade, nasciam tambem as ideias, devolvendo assim ao corpo social de cada epoca o que lhe competia par merito .

    Seria precise todo urn livro para explicitar a ligavao entre os metodos de trabalho de Marx que trabalhava , nao par dinheiro, mas pelo partido que visa a libertavao da especie humana, e as suas concepG6es sabre a educaviio. Par falta de espavo. nao podemos repro-duzir nesta colectiinea interessantes testemunhos de pessoas que viram Marx viver e trabalhar. Claro que, frequentemente, as suas descriv6es sao feitas atraves de urn prisma deformante, mas e sempre possfvel separar o trigo do joio.

    Como verdadeiro revolucioniirio que antecipa com audacia o homem universal da socledade comunista futura, Marx passava muitas vezes de urn tema de estudo para outro, sabendo pertinentemente que o flo do seu metoda materialista ligava o todo de manelra coerente, opondo-se assim a concepvao vulgar e proprietaria dos universitarios, que pretendem de cada vez esgotar urn assunto numa disciplina particular- para esgotar toda a questiio, ilusao de cretino especialista, avido de se tornar senhor ate mesmo das ideias!

    60 Toda a questao da educaviio se reduz no fim de contas a relaviio entre trabalho necessaria e tempo de trabalho livre (para se expandir e nao para fazer nada, como o sugere irresistivelmente a presente sociedade de sobretrabalho), ou seja a apropriaviio do tempo livre pela burguesia ou o proletariado. Nao se podera resolver o antagonismo entre tempo de trabalho e tempo livre senao generalizando para todos o trabalho manual, o que dara a cada urn tempo livre para se expandir. No que diz respeito a dialectica desta passagem, que corres-ponde a instauraviio do socialismo, o leitor podera remeter-se a antologia de MARX-ENGELS, Le Syndicalisme, Petite Collection Maspero, 1972, t. 2, pp. 92-107: A reduviio do tempo de trabalho, que e essencialmente a tarefa das organizav6es econ6micas das massas.

  • APRESENTA9AO 49

    Nest a sociedade) ja nao se falara de educar;ao ilumi-nista) edificada sabre as formas reificadas e alienadas que sao as escolas e os manuais que permitem uma apro-priar;ao privada e uma promor;ao individual) porque a cien-cia e as artes) de que as massas sao privadas) estao ai con-signadas ao abrigo) para proveito das classes privilegiadas.

    A socializar;ao .da apropriar;ao e do usufruto) em har-monia com a socializar;ao ja atingida da produr;iio) permi-t-ira abolir as classes dominantes e o proprio proletariado. E isto que implica a eliminar;ao de todos os entraves ao desenvolvimento fisico e intelectual do homem) ou seja antes de tudo a abolir;ao da .divisao do trabalho que suscita as classes e as mutilar;i5es que tanto a especializar;ao como a nfio-especializar;ao dao aos individuos. 0 homem novo) nascido do revolucionamento das condir;i5es materiais da sociedade) e nao do treino e da educar;ao iluminista 6 \ podera entao desenvolver-se a escala da sociedade inteira e sera um homem social.

    61 Em oposi9ao as concep96es educacionistas que colocam sempre o acento sobre o espfrito e a psicologia-policia desembocando no treino do homem, Marx-Engels exprimem o seu ponto de vista revolucionario: Os operarios continuariam a ser homens do passado se procurassem 'o erro em si mesmos', como faz o santo Sancho. Mas sabem multo bern que so deixarao de o ser em condi96es transformadas- e e por isso que estao decididos a alterar essas condi96es na primeira ocasiao que se apresentar. 10 na actividade revolucionaria que a sua propria transforma9ao coincide com a transforma9ao das circunstancias. (Cf. A Ideo-Jog/a A/emii.)

    Daqui a tese formulada em A Santa Famflia da aboli9ao necessaria do proprio prole-tariado: .Quando o proletariado tiver vencido, nao se tornara de forma alguma o modelo absoluto da sociedade, porque so tera triunfado a partir do momenta em que se tenha abolido a si mesmo, bem como o seu contrario. 4

  • DO

    I

    CRITIC A ENSINO BURGUES

    Os trabalhadores das manufacturas inglesas foram os primelros campeoes da classe operarla moderna em geral, e os seus te6rlcos foram os primelros a opor-se a teoria do capital.

    Quando Robert Owen, imedlatamente ap6s os dez primeiros anos do seculo XIX, ao defender a necessidade de uma limltac;:ao da jornada de trabalho nao s6 em teoria, mas alnda na pratica, instaurou a ]ornada de trabalho de 10 horas na sua fabrlca de New-Lanark, troc;:aram desta inovac;:ao como de uma utopia comunista. Em seguida, troc;:ou-se igualmente da sua combinac;:ao do trabalho produtivo com a educac;:iio das crianc;:as e das cooperativas operarias de produc;:ao a que fol o primeiro a dar vida. Hoje, a primeira destas utopias e uma lei do Estado, a segunda figura como frase oficlal em todas as legislac;:oes fabris e a terceira serve ate de cobertura a operarios reaccionarlos.

    MARX, 0 Capital,

    I, cap. A jornada de trabalho

  • P ARTINDO DA INTUI
  • 54 CRiTICA DA EDUCAQA.O E DO ENSINO

    de urn adolescente, no alvorecer da sua carreira, se nao pretender deixar ao acaso os seus a'SE!Uni:Jos caJpitais.

    Cada urn tern urn objectivo, e este parece grande, pelo menos para ele, quando a convicQao mais profundae a voz mais intima no coraQ3Jo iho sugerem 2 , porque a Divindade nunca a;bandona sem guia o nos:so mundo: fala discreta-mente, mas com ,certezas.

    Mas facilmente a sua voz se cobre de clamores, e aquilo que consideramos com e'Ilftusiasmo pode apenas ser engendrado pelo instante que urn outro instante destruira. A nossa imaginaQao talvez se exalte, os nosaos sentimen-tos inflamam-se, imagens enganadoras dangam perante os nossos olhos, e precipitamo-nos avidamente sobre o obj