The use of urban, peri-urban and rural land by agricultural activities in the
municipality of Álvares Machado (SP)
O uso do solo urbano, periurbano e rural pelas atividades agrícolas no
município de Álvares Machado (SP)
Claudinei da Silva Pereira1, Antonio Nivaldo Hespanhol
2
1 Doutorando em Geografia na Universidade Estadual Paulista - UNESP, Campus Presidente Prudente - SP,
email: [email protected] 2
Professor dos Cursos de Graduação e Pós-Graduação em Geografia na Universidade Estadual Paulista –
UNESP, Campus Presidente Prudente - SP, email: [email protected]
Abstract: Urban, peri-urban and rural agriculture is analyzed in the municipality of Álvares Machado, in the
state of São Paulo (SP), with an emphasis on the understanding of the spatial and economic relations that
permeate the production of vegetables and their interactions with the city while highlighting the transformations
in soil use resulting from the expansion of urban areas. It was verified that the performance of incorporating
agents in conversion processes of rural soils into urban soils, depending on the type of land plotting carried out,
constitutes a factor that potentiates or restricts the expansion of certain agricultural crops, particularly in peri-
urban areas.
Keywords: Urban and peri-urban agriculture; horticulture; land market; marketing channels.
Resumo. Analisa-se a agricultura urbana, periurbana e rural no município de Álvares Machado (SP), com ênfase
na compreensão das relações espaciais e econômicas que permeiam a produção de hortaliças e suas interações
com a cidade, evidenciando as transformações no uso do solo decorrentes da expansão das áreas urbanas.
Constatou-se que a atuação dos agentes incorporadores nos processos de conversão dos solos rurais em urbanos,
dependendo do tipo de parcelamento realizado, num fator que potencializa ou restringe a expansão de
determinados cultivos agrícolas, notadamente nas áreas periurbanas.
Palavras-chave: Agricultura urbana e periurbana; horticultura; mercado fundiário; canais de comercialização.
Introdução
A alimentação é um dos direitos previstos na Constituição Federal Brasileira, contudo,
tem se tornado cada vez mais frequente o aumento da vulnerabilidade alimentar de parcela
considerável da população, tanto urbana quanto rural. Na cidade, observamos nas últimas
décadas um movimento de retomada das práticas de cultivo agrícola e criação de pequenos
animais, em grande parte direcionados ao autoconsumo, em função de restrições financeiras
das famílias em adquirir, via mercado, parte da alimentação necessária. Por outro lado, vem
aumentando a produção de hortaliças nos espaços urbanos com finalidade comercial realizada
por pessoas com dificuldades para se inserirem no mercado de trabalho urbano, que
encontram na agricultura uma possibilidade de ter acesso aos alimentos e obter renda por
meio da comercialização dos produtos. Há, também, uma terceira razão que tem favorecido a
expansão da agricultura urbana que é a crescente mercantilização da alimentação e uso
massivo de agrotóxicos nos cultivos convencionais realizados nas zonas rurais, resultando em
alimentos com níveis cada vez mais acentuados de resíduos tóxicos. Para se contrapor a este
modelo de produção, um conjunto de produtores e movimentos sociais tem buscado valorizar
técnicas de cultivo agroecológicas ou orgânicas, refletindo no aumento de praticantes da
agricultura urbana para fins de autoconsumo ou voltada a comercialização, ao aproveitarem
de forma positiva a proximidade dos consumidores, e estes tendem a adquirir as hortaliças por
saberem a procedência das mesmas.
A partir destes fatos, o presente trabalho tem por objetivo analisar elementos
relacionados aos espaços urbano e rural que têm possibilitado a existência da agricultura em
Álvares Machado (SP). O texto está dividido em dois tópicos, no primeiro analisamos as
lógicas de produção da cidade na atualidade, que ao ser transformada em produto e
mercadoria no capitalismo, um conjunto de agentes vem a produzindo com finalidades de
extração da renda da terra, resultando num tecido urbano descontínuo e com muitos vazios
urbanos. No segundo tópico, abordamos a presença da agricultura urbana e rural a partir dos
resultados do mapeamento que realizamos no ano de 2016, além dos estabelecimentos que
produzem hortaliças direcionadas ao mercado local/regional, a partir dos formulários
aplicados com produtores em 2017. Neste contexto, propomos a delimitação do espaço
periurbano, no qual vinculamos as novas formas de expansão da cidade e a
permanência/aumento de praticantes da agricultura neste espaço.
A produção da cidade na contemporaneidade
O mercado de terras urbanas tem entre uma de suas características o constante
aumento dos preços das terras, fazendo com que a cidade seja palco e produto de diversos
agentes que buscam valorizar seus capitais, refletindo as disputas entre eles para apropriarem-
se de maior parcela da renda da terra. O entendimento da cidade como um produto é
pertinente para o entendimento de que esta na contemporaneidade é espaço e mercadoria no
capitalismo, pois suas parcelas são compradas, especuladas e vendidas como qualquer outra
mercadoria, com o diferencial que a mercadoria terra carrega consigo outros atributos, tais
como a localização e as qualidades físicas (GONZÁLEZ, 2009; HARVEY, 2013).
A partir do estudo da morfologia urbana é possível identificar um conjunto de formas
no tecido urbano que se expressam por meio das construções, dos espaços não edificados, das
infraestruturas, usos do solo e elementos simbólicos. As formas são resultantes de processos
históricos e sociais, no qual é possível partir das formas espaciais para chegar aos agentes que
as construíram (CAPEL, 2013).
Para a formação e apropriação da renda da terra urbana, um conjunto de agentes atuam
na conversão dos usos da terra de rural para urbana, implantando diferentes produtos
fundiários que resultam na expansão do tecido urbano. Este, nas últimas décadas, tem
expandido de forma descontínua, em função dos interesses político-econômicos que
permeiam as disputas dos agentes e da conveniência do Estado ao permitir ou fazer parte
deste processo. Dentre estes agentes há os proprietários fundiários e, destaca-se o capital
incorporador, que é o responsável por organizar os investimentos privados na transformação
dos usos do solo de rural para urbano com a finalidade de auferir lucros. Para isso, atua na
diferenciação espacial e na produção de diferentes produtos fundiários e imobiliários
(SMOLKA, 1987).
A conversão da terra de rural para urbana eleva de forma considerável o seu preço,
permitindo que o proprietário fundiário venda a propriedade ou se associe ao capital
incorporador, buscando a valorização fundiária ao colocar esta mercadoria no mercado com
expectativa de obter renda maior, caso contrário não o faria. Isto possibilita compreender as
razões que levam os proprietários fundiários a comercializarem as terras em determinado
momento e lugar, enquanto em outros há certa resistência na transformação dos tipos de uso,
pois dependendo da renda que a atividade agrícola gera e do porte econômico deste agente,
não haverá o interesse em transformar seu uso para urbano (SPOSITO, 1990).
Em Álvares Machado, para demonstrarmos como a cidade se expande seguindo a
lógica do mercado fundiário, utilizamos dois momentos: 1) o ano de 2010 e 2) o ano de 2017.
Mostramos a expansão do tecido urbano e os diferentes tipos de parcelamento do solo
realizados por agentes incorporadores. Importante destacar que parte do processo de
crescimento urbano deve ser vinculado a proximidade com a cidade de Presidente Prudente,
compondo a aglomeração urbana que apresenta descontinuidade territorial da mancha urbana,
mas com continuidade espacial (SPOSITO, 2004), em que há um fluxo significativo de
pessoas deslocando diariamente de Álvares Machado para Presidente Prudente para atividades
laborais, lazer, consumo e educação.
No mapa 1 que representa os tipos de uso do solo no entorno da cidade em 2010,
distinguimos três formas dos agentes incorporadores converteram o solo rural em urbano. A
primeira, é a área urbana consolidada, mais antiga, que indica o parcelamento do solo para
usos residencial e comercial e se constitui no tecido urbano contínuo, com exceção do setor
leste onde há duas manchas urbanas formadas pelo Parque dos Pinheiros e Jardim Panorama,
com continuidade territorial com o tecido urbano de Presidente Prudente e outra pelo Jardim
São Francisco. A segunda, são os loteamentos de chácaras que têm maior dispersão e
caracterizam-se, do ponto de vista urbanístico, pela ausência de um conjunto de
infraestruturas básicas, tais como sistema de abastecimento de água por rede, coleta de esgoto,
pavimentação das vias públicas e calçamento, estabelecimentos comerciais de abastecimento
cotidiano (padaria, açougue, mercadinho de bairro etc.) e do ponto de vista do parcelamento
dos lotes, estes têm dimensões que variam de 700 m² até 5.000 m² dependendo do loteamento.
Os usos diferem desde primeira residência ou segunda para lazer de final de semana, até
aqueles com finalidades mercantis que são alugadas para eventos (casamentos, festas e
confraternização em família). No aspecto jurídico, alguns loteamentos foram implantados de
forma irregular, sem a licença de órgãos ambientais ou mesmo da prefeitura. Assim, os
proprietários não possuem títulos de propriedade, apenas contratos informais de compra e
venda.
A terceira forma, que é sintomática dos novos produtos fundiários mais recentes no
município, são os espaços residenciais horizontais fechados (que simplificamos para o termo
loteamento fechado, apesar de possíveis diferenças jurídicas) direcionados para a população
de poder aquisitivo médio-alto, que redefine a lógica de expansão do tecido urbano, em
muitos casos descontínuos, ou mesmo em função de sua localização, que define uma
seletividade espacial, tanto do ponto de vista da homogeneização no quesito socioeconômico
e do padrão construtivo das residências dos futuros moradores. Há deslocamento diário para
atividades laborais ou de consumo, pois são de uso prioritário ou exclusivo para residência.
Estes empreendimentos são resultantes de novas lógicas de atuação do capital incorporador,
que busca diversificar os produtos fundiários e ampliar a extração da renda fundiária, ao
acentuar as diferenças espaciais no intraurbano e fomentar a fragmentação socioespacial. Uma
discussão sobre estes aspectos encontra-se em Sposito e Góes (2013).
Mapa 1 - Álvares Machado: cobertura e uso do solo (2010)
Fonte: Autores (2018)
Entre os anos de 2010 e 2017 foram feitos vários loteamentos chácaras, loteamentos
fechados e os loteamentos de bairro sem restrição de acesso. A Tabela 1 indica a expansão
dos novos loteamentos entre 2010 e 2017.
Tabela 1. Relação de loteamentos existentes por tipo de empreendimento
Tipo de loteamento Existentes em
2010
Entre 2010 a 2017 -
Implantados
Em 2017 – em fase
final de implantação Total
Loteamento fechado 2 2 4 8
Loteamento* 42 1 3 46
Loteamento de chácaras 13 5** 1 19
Fonte: Dados dos autores e prefeitura municipal de Álvares Machado. * Refere-se aos bairros, que podem
ter tido mais de um loteamento para sua formação. ** 2 loteamentos não estão representados no mapa 2.
O Mapa 2 representa os novos loteamentos. O setor sul apresenta a área prioritária da
expansão urbana, com dois loteamentos fechados implantados, acrescenta-se outros quatro em
fase de implantação. Os agentes incorporadores promovem a seletividade espacial ao situar
este tipo de produto fundiário ao longo das duas vias principais que conectam Álvares
Machado e Presidente Prudente, cidade de onde provem a maior parte destes novos
residentes.
Dos loteamentos de bairro implantados após 2010, um encontra-se parcialmente
edificado no setor norte, enquanto três estão em fase de instalação, são descontínuos à área
urbana consolidada, intercalados por áreas com atividades agropecuárias. Enquanto os
loteamentos de chácaras, cinco foram criados e parcialmente edificados, com tamanhos e
estruturas bem diferentes. Um novo está em fase de implantação.
Mapa 2 - Álvares Machado: cobertura e uso do solo (2017)
Fonte: Autores (2018)
Ao analisarmos a superfície do solo ocupada por diferentes usos, destacam-se os
loteamentos fechados e de chácaras situados nos setores sul e sudeste que são as áreas que
apresentaram a maior expansão da mancha urbana. Enquanto os estabelecimentos produtivos
ligados à indústria, comércio e serviços, assim como as áreas de lazer, têm se expandido ao
longo dos eixos viários principais, ou mesmo, dentro dos loteamentos de chácaras, a
agricultura ocupa área pouco expressiva dispersa por toda a cidade e no seu entorno, em
contraposição às pastagens que ocupam áreas maiores situadas principalmente na zona de
transição com o rural.
Ao ampliarmos a escala cartográfica sobre o intraurbano, há outra variável da
morfologia urbana que são os espaços não edificados (CAPEL, 2013), que neste trabalho
estamos considerando apenas os lotes não edificados ou glebas não parceladas dentro da
malha urbana consolidada. Esta escolha deve-se ao fato de que, quando nos propomos a
mapear a agricultura urbana, em 2016, não tivemos acesso aos loteamentos fechados e
também devido à lógica de administração do empreendimento presar por um tipo de trato
paisagístico dos lotes não edificados com o plantio de gramíneas. Enquanto nos loteamentos
de chácaras, optamos por pesquisar apenas uma forma de cultivo agrícola, as hortas
comerciais.
Desta forma, em 2017, na área urbana consolidada havia centenas de lotes não
edificados, refletindo um dos aspectos mercantis da cidade, ou seja, a terra urbana
funcionando como reserva de valor ou mesmo para práticas especulativas por parte de seus
proprietários, visto que o lote permanece por anos ou décadas sem edificação
(SMOLKA,1987; VILLAÇA, 2001). O Mapa 3 ilustra este processo de produção da cidade
contemporânea, com loteamentos descontínuos e internamente com os ditos vazios urbanos.
A abertura de novos loteamentos em si não visa necessariamente suprir a demanda por lotes
não edificados, mas está de certa forma vinculado aos agentes produtores da cidade, em
especial, o capital incorporador, visando reproduzir o capital no ambiente urbano através da
ampliação do tecido urbano. Assim, na área urbana consolidada, a quantidade de lotes não
edificados é expressiva, reforçando nosso argumento de que a cidade cresce mais em termos
territoriais, vinculados às lógicas do mercado fundiário, do que propriamente pela demanda
por novos lotes para a edificação.
Mapa 3 - Álvares Machado: lotes não edificados (2017)
Fonte: Autores (2018)
Ao mapearmos os lotes não edificados em 2017, excluímos os loteamentos fechados,
as chácaras e os novos loteamentos em implantação, estes últimos por ainda não estarem
aptos a edificação. A mancha urbana no setor leste correspondente aos bairros Parque dos
Pinheiros e Jardim Panorama, que começaram a ser implantados em meados da década de
1980, mas que ainda possuem centenas de lotes não edificados. Na área central da cidade, que
corresponde a área de ocupação mais antiga, há poucos lotes não edificados. A proporção de
lotes não edificados é maior nas áreas periféricas da cidade, com destaque para os
loteamentos de implantação mais recente.
A perspectiva da cidade como mercadoria ou como negócio (SANTOS, 2006)
vinculada à nova frente de acumulação de capital, é importante para a compreensão do urbano
contemporâneo, produzido por diferentes agentes produtores do espaço, com destaque para o
capital incorporador e o poder público, responsáveis pela escolha da direção da expansão
urbana, cada vez mais descontínua, como também pelo padrão de ocupação, reforçando, deste
modo, o processo de diferenciação socioespacial.
A inserção da agricultura nos espaços urbano e periurbano
Na tentativa de desvendar as diferentes formas que a agricultura é praticada nos
espaços urbano e rural, em outro trabalho propusemos uma tipologia de análise da agricultura
do ponto de vista da diversidade da produção, áreas utilizadas para os cultivos, técnicas
adotadas e finalidades da produção (PEREIRA e HESPANHOL, 2017). Ao discutimos no
presente trabalho como a agricultura é inserida nos espaços urbano, periurbano e rural,
partimos do pressuposto de que a compreensão da morfologia é de suma importância para se
analisar onde a agricultura é realizada neste município.
No Mapa 4 são representadas as áreas com agricultura urbana mapeadas em 2016,
quando realizamos pesquisa de campo. A partir disso, selecionamos os cultivos com maior
área de produção para aplicarmos formulários com os produtores responsáveis. Este mesmo
procedimento foi realizado na área rural. Para os cultivos existentes nos loteamentos de
chácaras, priorizamos aqueles com fins comerciais, exceção para o loteamento Arthur Buigue,
representado no mapa, que devido à maior proximidade com a área urbana consolidada e da
estruturação interna relacionada a densidade construtiva e tamanho dos lotes, optamos por
mapeá-lo. Assim, após o levantamento de campo realizado em 2016 e aplicação de
formulários a 58 produtores, tanto na área urbana como na rural, construímos a tipologia de
análise da agricultura1.
Os mais de 400 pontos com agricultura urbana estão situados predominantemente nos
lotes não edificados e em menor escala nos quintais das residências. As hortas comerciais no
espaço urbano consolidado totalizam sete casos, com tamanho e capacidade produtiva
distintas.
Mapa 4 - Álvares Machado: agricultura urbana (2016)
1 Esta pesquisa também engloba o município de Presidente Prudente, no qual adotamos os mesmos
procedimentos metodológicos. Assim, a tipologia foi elaborada tendo um universo de mais de 1400 pontos
mapeados (espaços urbano e rural) e 108 formulários aplicados com produtores nos dois municípios.
Fonte: Autores (2018)
A reestruturação territorial que vem ocorrendo nas últimas décadas tem provocado
mudanças nas relações entre campo e cidade, com o aparecimento de novas realidades
espaciais, dentre as quais aquelas vinculadas às interações que ocorrem nos limites entre estes
dois espaços, que a literatura tem denominado de periurbano (SÁNCHES, 2004; VALE,
2005; ZULAICA e FERRARO, 2013).
A maior facilidade e mobilidade das pessoas possibilitada pelos sistemas de
transporte, notadamente o particular, tem permitido que as pessoas residam em áreas distantes
do local de trabalho, favorecendo a implantação de novos produtos fundiários (chácaras,
loteamentos fechados), os quais têm se expandido sobre as áreas rurais, conformando, assim,
maior indefinição tanto nos limites com o urbano, como também dos tipos de uso do solo,
seja para atividades industriais, comerciais/serviços, lazer ou agropecuárias.
Durán (2004) ao analisar as diferentes perspectivas na literatura sobre a compreensão
das transformações espaciais, salienta que
Los límites de lo periurbano son imprecisos, no sólo porque física o
geográficamente sea difícil establecer con nitidez una separación clara entre
la ciudad y sus territorios periurbanos próximos, o entre éstos y lo que se
considera como rural, sino también porque en tales territorios suelen
manifestarse formas de sociedad cuyas características sociales y económicas
se encuentran a menudo en proceso de cambio y de redefinición (DURÁN,
2004, p. 48).
A partir das proposições anteriores, mapeamos os diferentes usos do solo no entorno
da cidade de Álvares Machado, com a intenção de propor a delimitação do espaço periurbano,
tendo como parâmetro as lógicas de transformação e parcelamento do solo rural para fins
urbanos e as diferentes formas de permanência de atividades rurais. No mapa 5 são
incorporados os elementos presentes nos anteriores, acrescentando as áreas com plantio de
hortaliças (cultivo comercial e horta comercial) que são realizadas nas chácaras e na área
rural.
Mapa 5 - Álvares Machado: usos do solo no espaço periurbano (2017)
Fonte: Autores (2018)
A produção hortícola de maior perecibilidade, tais como as de folhosas, realizada nas
chácaras tem importância ao possibilitar maior diversificação dos cultivos, geração de
trabalho e renda e é direcionada ao abastecimento urbano nos municípios de Álvares
Machado e Presidente Prudente, pois este é o maior mercado consumidor da região, com mais
de 200 mil habitantes. Da mesma forma, na área rural por ter estrutura fundiária com índice
de concentração da terra médio, permite que agricultores familiares possam produzir em suas
terras, ou daqueles em que o acesso ocorre via arrendamento, abasteçam os mercados locais.
As formas de comercialização se dão por via direta quando o produtor vende seus
produtos diretamente ao consumidor final, seja nas feiras-livres, venda no próprio local de
produção, em bancas de rua, como também do comércio de porta em porta em Álvares
Machado, mas principalmente em Presidente Prudente. Ocorre também através dos
intermediários, que compram para revenda em bancas de rua, feiras-livres, sacolões, pequenos
mercados de bairro e supermercados.
Há, contudo, uma importante diferença das hortas comerciais em relação ao que
chamamos de cultivos comerciais, pois estes são plantados em médias a grandes áreas, com
uma ou duas safras ao ano (por exemplo, tomate, pimentão, pepino, jiló, quiabo, berinjela) e
sua destinação se faz preferencialmente para os entrepostos comerciais (Ceasa), o que amplia
a escala espacial dos possíveis mercados consumidores, seja na região ou mesmo em outros
estados. Para tanto, devido o maior tempo no ciclo de crescimento e colheita, estes cultivos
são mais rentáveis quando realizados em maior escala de produção, o que restringe sua
possibilidade de produção nas pequenas áreas, tais como nos lotes urbanos e em chácaras.
Também deve ser levada em consideração a maior variação dos preços no mercado, em razão
de coincidir com o período de safra, em que predomina a lei da oferta e da procura, que tende
a reduzir a capacidade da pequena produção ser viável economicamente.
Considerações finais
O mapeamento da agricultura urbana e rural, quando analisado na perspectiva da
existência do espaço periurbano, deve levar em consideração os componentes da morfologia,
dentre os quais os tipos de loteamento, tamanho dos lotes e dos espaços não edificados,
notadamente aqueles lotes que não são edificados pelo proprietário, pois vem cumprindo uma
função de reserva de valor ou para práticas especulativas. Assim sendo, a implantação de
novos loteamentos, em descontínuo com a malha urbana consolidada, relaciona-se tanto a
novos produtos fundiários para públicos específicos, como também do embate entre agentes
incorporadores e proprietários fundiários sobre quem extrairá a maior renda da terra, seja esta
baseada na produção agropecuária ou sua transformação em terra urbana.
Desta forma, para a compreensão da agricultura urbana, periurbana e rural deve ser
levado em consideração o tipo de cultivo e as formas de inserção no mercado, seja ele local
ou regional. Portanto, as hortas comerciais são importantes no provimento do abastecimento
local, pela possibilidade de comercialização direta pelo produtor ao consumidor, reduzindo a
participação do agente intermediário, como também por ser praticada em pequenas áreas,
permitindo que um conjunto maior de indivíduos tenha nesta atividade uma forma de trabalho
e obtenção de renda, tanto nos lotes urbanos quanto nas chácaras.
Referências
CAPEL, Horácio. La morfología de las ciudades: sociedad, cultura y paisaje urbano. Barcelona: Ediciones del
Sebral, 2013.
DURÁN, Francisco Entrena. Los limites difusos de los territorios periurbanos: una propuesta metodológica para
el análisis de su situación socioeconómica y procesos de cambio. Sociologias, Porto Alegre, ano 6, n. 11,
jan/jun, p. 28-63, 2004.
GONZÁLEZ, Samuel Jaramillo. Hacia una teoria de la renda del suelo urbano. 2 ª ed. – Bogotá: Universidad
de los Andes, Faculdad de Economía, CEDE, Ediciones Uniandes, 2009.
HARVEY, David. Os limites do capital. São Paulo: Boitempo, 2013.
PEREIRA, Claudinei Silva; HESPANHOL, Antonio Nivaldo. Agricultura urbana e a construção de tipologia de
análise. In: X Jornadas Interdisciplinarias de Estudios Agrarios y Agroindustriales Argentinos y
Latinoamericanos, 2017, Buenos Aires. Anais das X Jornadas Interdisciplinarias de Estudios Agrarios y
Agroindustriales Argentinos y Latinoamericanos. Buenos Aires: UBA, 2017. v. 1. p. 1-20.
SÁNCHEZ, Héctor Ávila. La agricultura en las ciudades y su periferia: un enfoque desde la Geografía. In:
Investigaciones Geográficas, Boletín del Instituto de Geografía, UNAM, n. 53, p. 98-121, 2004.
SANTOS, César Ricardo Simoni. Dos negócios na cidade à cidade como negócio: uma nova sorte de
acumulação primitiva do espaço. Revista Cidades, v.3, n.5, p. 101-122, 2006.
SMOLKA, Martin Oscar. O capital incorporador e seus movimentos de valorização. In: Cadernos
IPPUR/UFRJ, ano 2, n.1, jan/abr, p. 41-78, 1987.
SPOSITO, Eliseu Saverio. Produção e apropriação da renda fundiária urbana em Presidente Prudente.
Tese (Doutorado em Geografia) Faculdade de Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, São
Paulo, 1990.
SPOSITO, Maria Encarnação Beltrão. O chão em pedaços: urbanização, economia e cidades no Estado de São
Paulo. Tese (Livre Docência em Geografia), Faculdade de Ciências e Tecnologia, Unesp, P. Prudente, 2004.
SPOSITO, Maria Encarnação Beltrão; GÓES, Eda Maria. Espaços fechados e cidades: Insegurança urbana e
fragmentação socioespacial. São Paulo: Editora Unesp, 2013.
VALE, Ana Rute do. Expansão urbana e plurifuncionalidade no espaço periurbano do município de
Araraquara (SP). Tese (Doutorado em Geografia) Instituto de Geociências e Ciências Extas, UNESP, Rio
Claro, 2005.
VILLAÇA, Flávio. Espaço intraurbano no Brasil. São Paulo: Studio Nobel Fapesp: Lincoln Institute, 2001.
ZULAICA, Laura; FERRARO, Risana. Lineamientos para el ordenamiento del periurbano de la ciudad de Mar
del Plata (Argentina), a partir de la definición de sistemas territoriales. Revista Geografia em Questão, v. 6, n.
1, p. 202-230, 2013.
Top Related