ANÁLISE DOS ALAGAMENTOS E USO E OCUPAÇÃO DA TERRA NO
CÂMPUS CUIABÁ DA UFMT 2004 até 2015
Jepherson Correia Sales
Universidade Federal de Mato Grosso
Ariel Costa dos Santos
Universidade Federal de Mato Grosso
1. INTRODUÇÃO
O uso da terra na produção do espaço urbano nas pequenas e médias cidades
ocorreu sem o devido planejamento socioambiental durante as ultimas décadas. Esse
fato tem acarretado diversos problemas de grande impacto para as populações urbanas e
a dinâmica da natureza.
Uma forma de analise que corrobora a essa perspectiva é a da apropriação dos
componentes geomorfológicos nas cidades, assim Casseti, (1995) afirma que a natureza
é apropriada e, consequentemente, privatizada para atender a demanda do capital,
entendendo o relevo como suporte das interações naturais e sociais. Nesse contexto, as
analises urbanas socioambientais devem ter não só caráter mercadológico, mas sim
partir de um entendimento sobre as dinâmica da natureza e da sociedade nela inserida.
O planejamento urbano e ambiental surge como ferramenta de gestão
governamental para aplicar o entendimento dessas dinâmicas geomorfológicas e
hidrológicas que ocorrem nas cidades, a fim de evitar um dos grandes problemas da
atualidade urbana nas cidades brasileiras, as enchentes e alagamentos. TUCCI, (1993)
entende que as enchentes constituem-se em um importante impacto sobre a sociedade,
ocorrendo devido à urbanização desordenada ou à inundação natural da várzea
ribeirinha.
As intervenções urbanas no regime hidrológico ocorreram de forma acentuada
no Córrego do Barbado na Cidade de Cuiabá-MT na última década acarretando em
graves problemas socioambientais. O mesmo apresenta despejo de esgoto doméstico,
depósito de resíduos sólidos, retirada de sua vegetação natural de sua área de
preservação permanente, alteração do seu percurso natural, invasões irregulares e
outros, acarretando enchentes no período chuvoso. (Souza, 2012). A Universidade
Federal de Mato Grosso fica localizada as margens do Córrego do Barbado no seu
médio curso e tem sofrido com os problemas relativos à enchentes do córrego, além de
outros alagamentos no interior do campus.
Sendo assim para compreender esses problemas de ordem socioambiental, se
faz necessário a compreensão da área estudada, afim de subsidiar, e ajudar a sanar esses
problemas.
2. OBJETIVOS
O presente artigo tem como objetivo analisar os alagamentos e o uso da terra
no campus devido às políticas de ampliação de vagas, e também devido às obras da
Copa de 2014 no interior da universidade no período de 2004 a 2015.
3. METODOLOGIA
O desenvolvimento desta pesquisa teve como base metodológica os
fundamentos dos geossistemas, buscando analisar por meio das várias condicionantes
ambientais e humanas atuantes nos processos espaciais da área de estudo. O
aprofundamento nos processos naturais e artificializados levará ao conhecimento sobre
os fluxos de matéria e energia no sistema. Tais medidas abarcaram explicações
cientificas dos problemas relativos ao aparecimento de região alagadas no interior e
áreas próximas ao campus da UFMT em Cuiabá.
Christofoletti (2000) afirma que os estudos geográficos devem atingir uma
visão totalizadora dos fenômenos ambientais, analisando os processos espaciais atuantes
(naturais e artificiais) e as correlações entre os elementos, funções e atributos desses
fenômenos.
O fluxograma representado na figura 1 apresenta as fases metodológicas da
pesquisa baseadas em duas etapas.
Figura 1 – Fluxograma com etapas metodológicas
Elaboração: Sales, J. C. (2015)
1ª fase: Foi realizado um trabalho de gabinete com base em métodos de
geoprocessamento no Softaware ArcMap 9.3 da Empresa ESRI:
- O mapeamento das curvas de nível foi realizado pelo Modelo Numérico do Terreno
(MNT) da SRTM (Shuttle Radar Topography Mission) obtido no site USGS (United
States Geological Survey). Realizado correção de altitude através de 35 pontos obtidos
por GPS e calculado o desvio padrão da altura obtido no MNT com o GPS. Este
procedimento visou obter os padrões altimétricos da área de estudo e obtenção dos
fluxos de escoamento superficial do terreno e do escoamento artificializado pelas
construções e arruamentos.
- Mapeamento do uso da terra: as imagens para classificação do uso da terra foram
obtidas pelo Software Google Earth (imagens Spot 02/11/2004 e 04/08/2015). As
imagens foram georreferenciadas e classificadas pelo método de máxima
verossimilhança por meio de 03 classes (área construída, grama/solo exposto e área
verde). Este procedimento visou obter de forma aproximada os padrões de uso do solo
dentro do campus e sua variação no período de estudo, além de analisar o coeficiente de
impermeabilização e permeabilidade.
2ª Fase: Foi realizado pesquisa bibliográfica e de documentos para obter informações
sobre os aspectos fisiográficos relativo à pedologia e geologia da área de estudo nas
cartas do RADAM BRASIL, folha SD 21-z-c e dados Seplan-MT. Essas informações
serviram para obter as composições mineralógicas e granumétricas da área de estudo e
seu comportamento natural no escoamento superficial. Foram levantadas informações
na Pró-reitora de Planejamento da UFMT (PROPLAN) sobre as construções novas
realizadas no período de 2004 a 2015 no campus Cuiabá. Essas informações serviram
para entender quais as politicas responsáveis pela modificação no uso da terra na área de
estudo.
4. RESULTADOS
O planejamento urbano, embora envolva fundamentos interdisciplinares, na
prática é realizado dentro de um âmbito mais restrito do conhecimento. O planejamento
da ocupação do espaço urbano no Brasil, não tem considerado aspectos fundamentais,
que trazem grandes transtornos e custos para a sociedade e para o ambiente. (TUCCI,
1997)
Nessa pesquisa constatamos que as diversas obras de intervenções foram
realizadas na UFMT no período de 2004 ate 2015, essas visavam atender as demandas
recentes de politicas de ampliação de curso e de vagas do REUNI, as obras da Copa
2014, entre outras medidas dentro do Campus Cuiabá.
Por meio de técnicas de geoprocessamento com a classificação digital do uso
da terra pudemos mensurar o total de perda de vegetação e aumento de áreas de
grama/solo exposto e área construída durante esse período. Figura 2 e Tabela 1.
Figura 2 – Mapa de uso da terra da UFMT 2004 e 2015
Fonte: Google Earth (2015)
TABELA 1 – Evolução do uso da terra Campus UFMT – Cuiabá 2004 e 2015
TABELA DE USO DA TERRA - 2004 2015
Área
construida
M²
%
Grama/Solo
exposto
M²
%
Área
verde/Úmida
M²
%
229284.91 27,90 243634.47 29,60 348499.91 42,50
323721.87 39,4 269070.00 32,7 228555.57 27,9
∆ + 11,5 ∆ + 3,1 ∆ - 14.6 Fonte: Google Earth
Elaboração: Sales, J. C. (2015) & Nogueira, A. M. (2015)
Em analise as informações acima, nota-se que houve um considerável aumento
de área construída, tendo o campus no ano de 2015 cerca de 40% de área construída,
aumentando em 11,5% no período pesquisado.
Quando observamos o percentual de área verde verificamos o inverso, houve
uma perda de 14,6% dá área vegetada no período observado. Ao analisarmos os motivos
dessa perda de vegetação verificamos que as maiores incidências ocorreram nas
proximidades do Córrego do Barbado e do campo de futebol (obras da Copa de 2014) e
na região centro-norte do campus onde ocorreu a construção de novos prédios nesse
período do Instituto Nacional de Áreas Úmidas, Instituto de Direito, Instituto de Física
Ambiental, Instituto de Computação, diversas obras relativas à Política do REUNI,
politica de ampliação de vagas, conforme expõe o relatório do Ministério da Educação e
Cultura: Análise sobre a Expansão das Universidades Federais 2003 a 2012 foram
realizadas 1.588 obras que foram concluídas, perfazendo 3.065.735,17m2 (MEC, 2012).
Levando em consideração á área de permeabilidade os mapas nos mostram
que em 2015 temos cerca de 60% da área total da UFMT sendo propicia para
infiltração. Apesar dessa grande quantidade de área não pavimentada observamos
pontos de alagamentos dentro do campus e nas suas proximidades, em períodos de
chuvas intensas.
A partir do modelo numérico do terreno foram produzidas as curvas de níveis
com as altitudes da área de estudo a fim de analisar os fluxos de drenagem superficial
naturais e os fluxos artificializados pela construção das pavimentações e arruamentos
dentro do campus. Dessa analise aliadas as experiências vividas em períodos de chuvas
no campus foi possível verificas três áreas passíveis de alagamentos em períodos
chuvosos. A figura 3 apresenta essas áreas.
Figura 3 – Curvas de nível e áreas com risco de alagamento
Elaboração: Sales, J. C. (2015) & Nogueira, A. M. (2015)
Os principais fluxos de escoamento superficial que estão provocam
alagamentos temporários em períodos de chuvas no campus da UFMT como descritos
na figura 4 abaixo são oriundos de duas fontes a primeira natural proveniente da própria
característica de altitude do terreno e a segunda principal o do seu arruamento que
conduz.
Figura 4 - Mosaico com imagens dos fluxos de escoamento superficial nas áreas de alagamento
Elaboração: Sales, J. C. (2015) & Nogueira, A. M. (2015)
Na primeira área de alagamento frequente vemos que os principais fluxos
superficial de água encontram-se próximo as áreas pavimentadas, e que parte desse
fluxo é canalizado pelo arruamento. Verifica-se também que trata-se de uma zona de
confluência para calha do Córrego do barbado que encontra-se parcialmente canalizado
e sem cobertura vegetal na sua área de preservação permanente. Na segunda imagem
também se trata de uma zona de confluência de escoamento superficial onde os dutos de
galeria pluvial não estão sendo suficiente para dar conta da vazão necessária para o
escoamento. A terceira zona de alagamento esta recebendo uma grande contribuição do
estacionamento próximo do dos arruamentos, também verifica-se a incapacidade das
galerias pluviais.
Analisando as características naturais na área de estudo existe a ocorrência de
Solo pEc6, constituem solos bem drenados e de pouca profundidade contendo uma
camada de silte e argila, sobreposta em rochas de fílito, (Bordest, 2003). Essas
características somadas fornecem um rápido encharcamento do mesmo, fazendo
predominar o escoamento superficial após pouco tempo de chuva. Figura 5 e 6
Figura 5/6 – Mosaico de imagem com perfil do solo encontrado no campus da UFMT- Cuiabá
Fonte: Sales, J. C. (2015), 05/01/2016
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao finalizarmos a pesquisa notou-se que a ocorrência de áreas de alagamentos
na UFMT é derivada da falta de planejamento e mau uso da terra no campus. Ficando
constatada a perda de áreas verdes, a construção dentro de áreas de preservação
permanente as margens do Córrego do Barbado, tudo isso aliadas às características
naturais (solo/geologia/geomorfologia) do local que favorecem o escoamento
superficial, aumentando a velocidade e concentração dos fluxos de águas em região
mais baixas e também pela incapacidade de drenagem das galerias pluviais. Sendo
assim muitos problemas ambientais poderiam ter sido evitados se fossem adotados
politicas publicas de planejamento do crescimento do campus.
Em contrapartida aos problemas de alagamentos e ambientais citados, ressalta-
se que a área da UFMT não é utilizada somente por professores, funcionários e alunos,
este local também é de usufruto comum por grande parte da comunidade cuiabana para
pratica exercícios e passeios no zoológico, justamente por ser uma área verde dentro da
Cidade tão densamente urbanizada em sua redondeza. Assim vemos como contraditória
as ações de construções novas dentro do campus.
Para realizar o enfrentamento dessa realidade vemos ser necessária a realização
das seguintes medidas:
- Não realização de novas obras no interior do campus, com também transferir
alguns laboratórios e departamentos para os Campus Santo Antônio do Leverger e
Várzea Grande.
- Reflorestamento das áreas desmatadas com o replantiu de árvores não
exóticas nos canteiros e áreas abertas, para melhoria das condições de infiltração no solo
e melhoria do microclima local.
- Manutenção e melhoria do sistema de drenagem artificial para garantir um
escoamento rápido das águas pluviais.
- Instalação de faixas de revestimentos permeáveis nos estacionamentos para
melhoria da infiltração em áreas construídas e armazenamento de água nos solo .
- Construção de lago artificial para contensão da água da chuva na área
próximo ao campo de futebol e aumento da capacidade do lago do zoológico.
6. REFERÊNCIAS
BORDEST, S. M. L. 2003. A bacia do Córrego do Barbado, Cuiabá, Mato Grosso.
Cuiabá: Gráfica Print, 116p.
CASSETI, V. Ambiente e apropriação do relevo. São Paulo. Contexto, 2ª Ed. 1995.
CHRISTOFOLETTI, A. Modelagem de Sistemas Ambientais. São Paulo: Edgar
Blücher, 2000.
Galdino, Y. da S. N.; Andrade, L. M. S. de. Interações entre a cidade e paisagem ao
longo da Sub-Bacia do Barbado, Cuiabá – MT. Anais do IV Encontro Nacional da
Anppas, Brasília-DF, 2008.
GUERRA, A.J.T. (2009a). Processos erosivos nas encostas. In: GUERRA, A.J.T. e
CUNHA, S.B. (orgs.). Geomorfologia - uma atualização de bases e conceitos. Rio de
Janeiro, Editora Bertrand Brasil, 8ª edição, p. 149-209.
MORALECO et al. Relação entre a qualidade ambiental do córrego do barbado e a
saúde da população do jardim renascer, Cuiabá-MT. Revista Biodiversidade – V.
13, N2, 2014. Disponível em:
http://periodicoscientificos.ufmt.br/index.php/biodiversidade/article/viewFile/1959/145
5.
SOUZA et al. Aspectos hidrológicos e socioambientais do córrego do barbado, em
Cuiabá-Mato Grosso. III congresso Brasileiro de gestão ambiental. Disponível em:
http://www.ibeas.org.br/congresso/Trabalhos2012/VIII-014.pdf. Goiânia-GO, 2012
VALE, C. C. Teoria Geral Do Sistema: HISTÓRICO E Correlações com a
Geografia e com o estudo da paisagem. Revista Entre-Lugar, UFGD, Dourados-MS,
n.6, p 85-108. 2012
VENTURA, R. M G. Caracterização Ambiental e Hidróloga da Bacia do Córrego
Barbado em Cuiabá-MT. Dissertação de Mestrado. Cuiabá: UFMT, 2011. 112 fls.
TUCCI, C. E. M. A água no meio urbano. Rio Grande do Sul, 1997.
TUCCI, C.E.M., 1993. Controle de Enchentes, in: Tucci, C. (org). Hidrologia
ciência e aplicação. Porto Alegre: Ed. da Universidade: ABRH cap 16, p621-658.:
952p.
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