Vaso 15p

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Alguns livros, em especial os romances, podem ter duas histórias para contar. Uma é aquela que os leitores leem, a outra é secreta. No entanto, Allan e Charles revelam aqui esse lado oculto. Trata-se de um mundo mágico. Diz a lenda, que é para lá, que um escritor se vai todos os dias encontrar com seus personagens, a fim de escrever a história que lhe foi confiada. Às vezes, ele fica meses, ou até mesmo anos, conectado a esse mundo encantado. Até que um dia a história chega ao fim. Mas, a magia da literatura não termina nunca. Porque do mesmo modo que uma história escolhe seu autor, o livro também escolhe seu leitor.

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Vaso com Cinco Girassóis

São Paulo – 2015

Neide Baptista

Vaso com Cinco Girassóis

Copyright © 2015 by Editora Baraúna SE Ltda.

Capa Jacilene Moraes

Ilustração Vaso com Cinco Girassóis, Vincent Van Gogh, 1888

Diagramação Camila C. Morais

Revisão Rejane Costa Barros

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTESINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ

________________________________________________________________B175v

Baptista, Neide Vaso com cinco girassóis/Neide Baptista. - 1. ed. - São Paulo: Baraúna, 2015.

ISBN 978-85-437-0445-6

1. Romance brasileiro. I. Título.

15-25229 CDD: 869.93 CDU: 821.134.3(81)-3________________________________________________________________03/08/2015 03/08/2015

Impresso no BrasilPrinted in Brazil

DIREITOS CEDIDOS PARA ESTAEDIÇÃO À EDITORA BARAÚNA www.EditoraBarauna.com.br

Rua da Quitanda, 139 – 3º andarCEP 01012-010 – Centro – São Paulo – SPTel.: 11 3167.4261www.EditoraBarauna.com.br

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Dedicado à memória de Francisco Bap-tista Das Chagas, meu querido pai.

Cinco Girassóis

Gira o mundo, girassolGira amarelo, gira carmimGira para você, gira para mimGira, gira, girassol e sempre te encontro aquiMeu vaso feito de amor e cetim Gira, gira, girassol abrindo caminhos sem fimGira o que é belo dentro de mimGira o tempo, adianta o ventoDeixando fluir o que estava escrito para mimGira, gira, meu querido girassol

Rosina Romano

Desejo que Vaso com Cinco Girassóis traga ao meu leitor a mesma alegria que tive em conhecer lugares fan-tásticos, personagens admiráveis, fatos históricos e cien-tíficos incríveis.

Foi assim, sem sair de casa, a partir da tela do com-putador, que imaginei o enredo desse livro, deslizando meus dedos sobre o teclado. Escrevendo e lendo, lendo e escrevendo, às vezes lendo mais do que escrevendo.

Envolvida em uma disciplina criativa, pesquisei bas-tante. Recolhida em minha doce solidão, não me preocu-pava com o mundo lá fora. A expansão da minha mente me transportava para um universo paralelo de muitas des-cobertas, que me faziam preencher páginas e páginas com letras, que formando palavras, davam sentido a frases.

O ritmo, ora frenético como a batida de uma mú-sica eletrônica, ora suave como o violino de Vivaldi, so-mente descansava por alguns segundos no ponto final de algum parágrafo.

O universo transcendental da literatura não é exclu-sividade dos autores. Eles apenas habitam primeiro.

Tenha um lindo dia, e divirta-se!

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O ESCRITOR INGLêS ALLAN MEAD, causava o maior frisson nos eventos de lan-çamento. Leitoras do mundo inteiro faziam

filas nas livrarias e feiras literárias para conseguir um autó-grafo e tirar uma foto com ele. A imprensa se aglomerava e disputava uma entrevista, ou ao menos uma declaração.

Criativo, afável, e muito bonito, embora os ingleses não sejam tão belos assim, Allan era uma exceção. Porte atlético, alto, olhos e cabelos castanhos claros, semblante de menino, certa vez ele brincou com a pergunta de uma jornalista que desejava saber se a semelhança com o can-tor Michael Bublé o ajudava a fazer tanto sucesso junto ao público feminino.

— Com certeza, mas acho que Deus foi mais gene-roso com ele.

— Por quê?— Porque Michael Bublé canta. — Você acha que os CDs de Michael Bublé vendem

mais do que seus livros?— Não falo de cifras, é uma questão de talento mesmo. Ao longo de quase uma década de sucessivos best-

sellers, Allan alcançou fortuna, antes de completar trinta anos de idade, e soube usufruir de maneira inteligente da ascendente prosperidade. Comprou uma residência em

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South Kensington, onde o arquiteto George Basevi proje-tou na Pelham Crescent belas casas brancas ao estilo Geor-giana. Anos depois, adquiriu um hotel SPA na pitoresca cidade de veraneio inglesa Dartmouth1, e um magnífico Dufour 485 Grand Large com o qual costumava velejar na companhia da filha.

Dotada de uma personalidade eloquente, a menina tinha um nome que a todos surpreendiam. Hypátia era bela como uma modelo de uma pintura Renascentista. Alva, cabelo cumprido, ondulado, loiro escuro, nariz fino, boca pequena, olhos da cor de mel.

Quando sua filha nasceu, Allan era um rapaz de vin-te e dois anos, recém-formado em Literatura. Poliglota, trabalhava com tradução, e nas horas vagas escrevia seu primeiro romance, num humilde apartamento no bairro de Enfield, situado no subúrbio londrino de Southgate. Meses depois de lançar seu livro, a obra já estava na lista dos mais vendidos.

Respeitado pela crítica, os romances do jovem Allan não apenas abordavam temas sobre Antigas Civilizações, períodos da História Medieval e Moderna, mas também priorizavam questões polêmicas sobre poder, guerra, cons-piração, política. Mais que desenvolver uma boa trama com esses temas, embasados numa vasta pesquisa docu-mental em museus, bibliotecas, o escritor ainda possuía um diferencial – suas personagens eram sempre grandes protagonistas. Ele exaltava o ser feminino em toda sua gló-

1 Dartmouth é um município localizado no condado de Devon, e tam-bém destino turístico do Reino Unido. Situado a margem ocidental do es-tuário do Rio Dart, o longo e estreito corredor de água correr ao encontro do Oceano Atlântico.

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ria. Fiel aos fatos históricos, e um fenômeno literário, Allan era cobiçado por cineastas famosos, por essa razão alguns dos seus livros ganharam as telas do cinema, e outros ins-piraram seriados para a TV. No entanto, uma inexplicável sensação de vazio, tomou conta de Allan, após suas férias no Oriente. Ainda que considerasse a viagem maravilhosa, rica em cores, sabores, música, dança, paisagem, arquitetu-ra, nada disso o inspirava. Era como se tudo que teria de escrever para suas leitoras já havia sido publicado.

Porém, seu editor, não pensava assim, insistia para que ele trabalhasse no novo livro e entregasse ao mesmo a sinopse.

A filha do escritor percebia esse momento do pai, igual de uma criança que já não se interessa mais por uma brincadeira porque perdeu a graça. Querendo entender melhor o que a menina tentava lhe dizer, durante um passeio de barco, Allan perguntou:

— Mas como uma brincadeira perde a graça? — Quando não se tem mais nada para aprender. — E o que se faz quando isso acontece? — Procura-se por novas brincadeiras.Nesse instante, Allan percebeu que a filha tinha razão,

era preciso encontrar uma nova brincadeira, que o levasse a um desafio, que o fizesse recuperar o entusiasmo de escrever.

Percebendo que Allan precisava mesmo de um tempo, seu editor resolveu parar de lhe pressionar. Mas a mídia, o perseguia. Afinal, um ano e meio sem lançar um romance era tempo suficiente para que a impressa notificasse a “crise” do autor. Um tabloide inglês che-gou a dizer que a criatividade de Allan havia se esgota-

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do. Essa notícia gerou grande polêmica, especialmente quando um oportunista fez o maior sucesso ao iniciar um movimento que bombou na Internet. O blog ques-tionava sobre o que teria acontecido para que o autor Allan Mead não mais escrevesse. Muitos internautas ti-nham uma opinião. Entre as inúmeras mensagens, três impressionaram o escritor. Um autor americano, des-conhecido, escreveu: “Acho que a obrigação de ter que publicar um livro por ano estressou Allan Mead, que não consegue mais criar histórias interessantes”. Ou-tra mensagem hostil era de um romancista canadense. Querendo aparecer, o mesmo, postou esse comentário: “Ao sair de cena, no auge da fama, sem dar a menor explicação aos seus leitores, Allan Mead apostou na aposentadoria precoce, para não assistir a própria deca-dência. Mas será que conseguiu?”

Porém, entre as opiniões negativas, Allan, final-mente leu uma mensagem de alguém que dizia se cha-mar Girassol e que fez o seguinte registro: “Desejo que Allan Mead, encontre forças e supere essa fase difícil que todos nós em algum momento da vida atravessamos e, tão breve volte a escrever!”

“Girassol, Girassol, Girassol quem é essa pessoa tão espirituosa?” Perguntava-se o escritor. Embora quisesse muito conhecer Girassol, Allan sabia que só era possível se a própria pessoa se apresentasse.

O período em que ficou sem escrever, Allan se dedi-cou aos afazeres domésticos. Depois que sua governanta se aposentou, ele não quis contratar outra. Com mais tempo livre, administrava as compras da casa, preparava as refei-

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ções, levava e buscava a filha no colégio, e na escola de futebol. Nos momentos de ócio praticava yoga com um grupo de amigos. O equilíbrio mental e espiritual ajudava o escritor a superar a crise da página branca.

Um dia quando tomava o café da manhã, e lia o jor-nal, a filha de Allan concentrava a leitura na Revista Na-tional Geographic2 que acabara de chegar pelos Correios. O artigo falava sobre o trabalho da cientista Roberta Guccia, uma importante vulcanóloga que havia publicado recente-mente um livro sobre a Islândia. A obra resultava de uma longa expedição a Ilha de Surtsey, no Oceano Ártico.

A última erupção do vulcão submarino Surtsey ocor-reu em 1963, vindo à tona com uma grande ebulição de vapor e lava. Diversas pesquisas identificaram cerca de 200 vulcões na Islândia. Atualmente, os estudos se concentram nas zonas vulcânicas submarinas, aonde as chaminés cos-pem água quente carregadas de elementos minerais. Essas zonas vulcânicas são responsáveis pela produção de 50% da energia geotérmica que abastecem as cidades3.

Além do seu trabalho como pesquisadora, e autora de vários artigos, Roberta ainda encontrava tempo para realizar palestras nas universidades, contanto sobre as expedições realizadas em diversos vulcões. Entre eles, o vulcão de Vesúvio na Itália.

2 O primeiro exemplar da National Geographic, foi lançado nos Estados Unidos em 1888. Hoje a Revista se faz presente em trinta e dois países, incluindo o Brasil, desde o ano de 2000, pela Editora Abril. A publicação de tiragem mensal prioriza fotos inéditas, linguagem científica, reporta-gens e entrevistas nas áreas de Geografia, Ciência, História, e Natureza. 3 Formando nosso planeta - Não é Mágica. Log On Editora Multimídia – SP, 2007.