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NARRATIVAS MULTIMÍDIA DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUA INGLESA: UM GÊNERO EMERGENTE Vera Lúcia Menezes de Oliveira e PAIVA (UFMG/CNPq) ABSTRACT: This paper describes the characteristics of multimedia language learning histories having as theoretical support the theory of complex adaptive system, as understood by Holland (1997); narrative studies (BRUNNER, 2002; BAZERMAN, 2005; and visual studies (KRESS and van LEEUWEN, 1996). The multimedia language learning narratives are characterized as an emergent genre which reveals in a multi sensorial way how the foreign language emerges itself from the learners’ individual and social experiences. The corpus analyzed in this study is made up of 37 multimedia texts which weave together texts, images, and sounds constituting themselves as a hybrid genre. The analysis will also point out the most privileged themes which pervade the memoirs of those learners. KEYWORDS: language learning narratives; complexity; multimedia. 1. Introdução No segundo semestre de 2005, introduzimos no curso de Licenciatura em Língua Inglesa, da Faculdade de Letras da UFMG, uma disciplina optativa com o objetivo de desenvolver o letramento digital dos futuros professores de língua inglesa. Além do letramento digital, o curso teve dois outros objetivos: a aprendizagem de língua inglesa e a reflexão sobre o processo de aprendizagem de língua estrangeira. Os alunos aprenderam a consultar dicionários eletrônicos, concordanceadores e a usar mecanismos de busca para localizar textos, imagens, sons e vídeos. Leram textos sobre hipertextos e aprenderam a criar hiperlinks para arquivos de textos e sons. Além disso, foram incentivados a usar recursos do processador word tais como capitular, WordArt, inserir e formatar imagens, colocar bordas, sombreamento, plano de fundo, caixas de texto, formas (como balões, por exemplo), efeitos 3D, sombras e outros efeitos, tais como fagulhas, letreiros luminosos e tracejados em movimento. A experiência vem sendo repetida, possibilitando, assim, a construção de um corpus com narrativas de aprendizagem multimídia doadas pelos autores para a pesquisa do projeto

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NARRATIVAS MULTIMÍDIA DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUA INGLESA: UM GÊNERO EMERGENTE

Vera Lúcia Menezes de Oliveira e PAIVA (UFMG/CNPq)

ABSTRACT: This paper describes the characteristics of multimedia language learning histories having as theoretical support the theory of complex adaptive system, as understood by Holland (1997); narrative studies (BRUNNER, 2002; BAZERMAN, 2005; and visual studies (KRESS and van LEEUWEN, 1996). The multimedia language learning narratives are characterized as an emergent genre which reveals in a multi sensorial way how the foreign language emerges itself from the learners’ individual and social experiences. The corpus analyzed in this study is made up of 37 multimedia texts which weave together texts, images, and sounds constituting themselves as a hybrid genre. The analysis will also point out the most privileged themes which pervade the memoirs of those learners.

KEYWORDS: language learning narratives; complexity; multimedia.

1. Introdução

No segundo semestre de 2005, introduzimos no curso de Licenciatura em Língua Inglesa, da Faculdade de Letras da UFMG, uma disciplina optativa com o objetivo de desenvolver o letramento digital dos futuros professores de língua inglesa. Além do letramento digital, o curso teve dois outros objetivos: a aprendizagem de língua inglesa e a reflexão sobre o processo de aprendizagem de língua estrangeira.

Os alunos aprenderam a consultar dicionários eletrônicos, concordanceadores e a usar mecanismos de busca para localizar textos, imagens, sons e vídeos. Leram textos sobre hipertextos e aprenderam a criar hiperlinks para arquivos de textos e sons. Além disso, foram incentivados a usar recursos do processador word tais como capitular, WordArt, inserir e formatar imagens, colocar bordas, sombreamento, plano de fundo, caixas de texto, formas (como balões, por exemplo), efeitos 3D, sombras e outros efeitos, tais como fagulhas, letreiros luminosos e tracejados em movimento.

A experiência vem sendo repetida, possibilitando, assim, a construção de um corpus com narrativas de aprendizagem multimídia doadas pelos autores para a pesquisa do projeto AMFALE [http://www.veramenezes.com/amfale.htm]. Para este trabalho, utilizo um conjunto de 37 narrativas, 20 coletadas em 2005 e 17 em 2006. A análise das narrativas será feita ao longo da exposição teórica de forma a facilitar a leitura.

2. A narrativa

Bruner (2002, p. 46) define a narrativa como “uma seqüência singular de eventos, estados mentais, ocorrências envolvendo seres humanos como personagens ou atores”. Ele defende que viemos ao mundo equipados “com um conjunto de predisposições para interpretar o mundo social de uma forma particular e para agir sobre as nossas interpretações”, ou seja, equipados com o que ele chama de “aptidão para o significado” (p. 69). A narrativa é, pois, para o autor, uma forma de pensar, de organizar a experiência humana, de organizar a apreciação de si mesmo, dos outros e do mundo onde se vive.

A definição de Bruner pode ser complementada por Todorov (1979, p. 138) que afirma que uma narrativa ideal começa por uma situação estável que uma força qualquer vem

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perturbar. Disso resulta um estado de desequilíbrio; pela ação de uma força dirigida em sentido inverso, o equilíbrio é restabelecido; o segundo equilíbrio é semelhante ao primeiro, mas os dois nunca são idênticos.

As narrativas de aprendizagem de línguas estrangeiras descrevem seqüências de ações, estados mentais, eventos educacionais, experiências pessoais, crenças, medos, desejos, preferências, relações pessoais e institucionais, situações estáveis, perturbações e desequilíbrios característicos do processo de aprendizagem. Esse gênero joga luz sobre o processo de aquisição ao revelar experiências de aprendizagem que, geralmente, não têm merecido muita atenção da comunidade de pesquisadores em Lingüística Aplicada. As compreensões individuais de como a língua é aprendida, além de revelarem experiências singulares, podem ressaltar aspectos comuns em uma série de histórias e acionar insights importantes sobre fenômenos recorrentes na aquisição da língua.

As narrativas conferem significados a contextos de aprendizagem na perspectiva dos próprios aprendizes, pois são eles que explicam como aprendem ou aprenderam uma língua. Novos significados emergem em um texto narrativo quando diferentes elementos multimídia são agregados. Os sentimentos adquirem novas dimensões e o uso de signos de diferentes naturezas para a construção do texto estimula os sentidos do leitor. Um elemento – texto, imagem ou som – amplia o significado do outro e juntos restringem a ambigüidade, dando ao produtor do texto a possibilidade de construções de sentido mais próximas de sua intenção. Além disso, como lembram Gerard e Golstein (2005, p. 18),

as imagens são interfaces naturais para a comunicação”, ou seja, não precisam nos ensinar como absorver imagens; isso ocorre naturalmente. Em um dado período de tempo, muito mais informação pode ser comunicada através de imagens do que através da fala ou do texto escrito.

Os textos multimídia têm a vantagem de gerar uma ampla rede de significados, pois conectam diferentes textos, imagens e sons. Kress e van Leeuwen (1996, p. 45) acrescentam que

[A]s estruturas pictóricas não se limitam a reproduzir as estruturas da ‘realidade’. Ao contrário, elas produzem imagens da realidade que estão ligadas aos interesses das instituições sociais nas quais as imagens são produzidas, circuladas e lidas. Elas são ideológicas. As estruturas pictóricas nunca são meramente formais: elas têm uma dimensão semântica muito importante.

Os textos multimídia permitem que o autor agregue no seu texto pelo menos parte do oceano de textos que utilizamos quando produzimos um texto. Como diz Bazerman (2006, p. 88), “[c]riamos os nossos textos a partir de um oceano de textos anteriores que estão à nossa volta e do oceano de linguagem em que vivemos. E compreendemos os textos dos outros dentro desse mesmo oceano”.

3. Texto como sistema complexo

Neste trabalho, concebo linguagem como um sistema semiótico dinâmico e complexo, composto de elementos bio-cognitivos, sócio-históricos e político-culturais que se inter-relacionam em um constante agir e reagir, constituindo-se em uma ferramenta que nos permite refletir e agir na sociedade. Esse conceito nos leva a optar pela definição de texto como um sistema adaptativo complexo (SAC), “como uma propriedade da mente que constrói e reconstrói sentidos através do acionamento de outros textos” (PAIVA e NASCIMENTO,

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2005, p.177-8). Os SACs, segundo Holland (1997), possuem sete elementos básicos, divididos em quatro propriedades e três mecanismos. As propriedades são: agregação, não-linearidade, fluxos, e diversidade; e os mecanismos são: marcação, modelos internos, e blocos constituintes.

A propriedade da agregação consiste na reunião de vários elementos. Holland (1997, p. 35) cita como exemplo de agregação o produto interno bruto que é a reunião dos produtos da empresa 1, empresa 2, empresa 3, etc. Ou ainda o sistema nervoso que é composto pela agregação do neurônio 1, neurônio 2 e neurônio 3. No texto, podemos dizer que há várias possibilidades de agregação através de elementos lingüísticos, cognitivos e sócio-culturais.

Um texto é formado pela agregação de palavras 1, 2, 3, etc., de orações, parágrafos e também de diferentes tipos de texto. Nas narrativas multimídia, por exemplo, encontramos histórias escritas; letras de música; imagens em forma de fotografia e desenhos; sons de choro, gritos, buzina, aplausos, canções, etc.; e vídeos que reunidos formam uma unidade de sentido multisensorial.

Na Figura 1, temos um excerto de uma das narrativas multimídia que pode exemplificar o fenômeno da agregação. A autora reúne vários elementos: a cor de fundo, o laranja que simboliza energia, vibração e vitalidade, sentidos que são reiterados nos demais elementos: o texto, as imagens e os hipertextos que remetem o leitor a outros textos a arquivos sonoros.

A long journey…

Well, I dare say my interest in English was born on February 12, 1984 (oh yes, that’s my birthday!). I say that because I remember very clearly the time when I would ask my father how to say such-and-such words in English. I don’t know exactly how old I was then, but I ’m sure I was very young. I also remember I had loads of fun turning my father into a walking-talking dictionary. As he himself has always been a language fancier, he would feel pleased to notice my interest in English and would always answer my plausible questions.

One of the first phrases I learned was ‘the end’. Can you guess why??? Just because of the Woody Woodpecker cartoon. This phrase would always appear at the end of the cartoon – which, st i l l nowadays, is one of my favorites!

http://www.veramenezes.com/multi12.htm

Fig. 1 – Exemplo de agregação

Ao falar do pai, a narradora insere um hiperlink que nos conduz à um site onde é possível ouvir efeitos e trilhas sonoras de vários filmes, incluindo a trilha sonora do filme Zorro. Em interação por e-mail, a autora me disse que quando ela era criança, ela e o pai costumavam assistir juntos a esse filme. Ao clicar em Woody Woodpecker, pode-se ouvir a tradicional gargalhada do pica-pau. A agregação desses sons nos remetem a filmes, demonstrando como o cinema foi importante para sua experiência de aprendizagem da língua inglesa. O link em loads of fun conecta o leitor a uma gargalhada de uma criança e, junto com a imagem do bebê recém nascido, reforça sua afirmação de que ela tem interesse pelo inglês

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desde criançinha. A escolha das gravuras e suas posições na página podem ser interpretadas como representações visuais de períodos iniciais de sua “longa jornada” de aprendizagem: de bebê não letrado à criança que é conduzida ao mundo do letramento pelo pai.

A imagem do pai e filha retrata um processo reacional, que Kress e van Leeuwen (1998, p.64) descrevem como a conexão de dois participantes pelo olhar que forma um tipo de vetor. Amparada pelo texto, posso interpretar essa imagem de pai e filha como o pai que ensina e a filha como uma admiradora e aprendiz.

A Fig. 1 exemplificou a agregação no nível textual, mas a produção de sentido não fica restrita à materialidade do texto. Assim, são, também, exemplos de agregação, a participação da produtora do texto, nossa participação como leitores desse texto, a soma de nossas leituras prévias e de nossas afiliações teóricas e as várias vozes tanto da narradora como dos autores dos outros textos que ela agregou e que nós também agregaremos no nosso processo de construção de sentido. Os produtores e os leitores somos também sistemas complexos, fruto de nossa configuração biológica, de nossas historicidades, de nossas culturas, de nossas formações culturais, sociais e políticas.

A não-linearidade é a segunda propriedade dos sacs. Holland (1997, p.39) explica que a linearidade “significa que podemos obter um mesmo valor para o todo somando os valores das partes”. Paiva e Nascimento (2006, p.160), argumentam que “ se o texto tivesse uma propriedade linear, todas as leituras seriam iguais”. Esses autores concluem que o sistema complexo textual “não é a simples soma dos agregados, mas o produto desses agregados que é sempre maior do que sua soma devido às interações entre todos os elementos do sistema”.

Nas narrativas multimídia, essa não lineariedade se materializa nos hiperlinks que os autores incluem em seus textos ampliando a complexidade da construção de sentido e no processamento de cada leitor. Os textos e imagens que compõem o excerto na Fig. 1 são frutos das escolhas da narradora e comprovam a tese de que o texto é um sistema complexo. O leitor, provavelmente, acionará outros textos que serão agregados à sua produção de sentido. Eu mesma, ao ler o texto, lembrei-me das inúmeras sessões de cinema que assisti com meu pai e outros filmes foram hipertextualmente resgatados de minha memória.

A terceira propriedade, o fluxo se caracteriza por uma rede de nós e ligações. Segundo Holland (1997, p.47-48) “[d]e um modo geral, os nós são os processadores – agentes – e as ligações designam as interações possíveis”. Esses fluxos, segundo ele, variam ao longo do tempo e não são entidades fixas, podem ser acionados ou não e sofrem adaptações e constantes mudanças em decorrência da experiência que vai se acumulando. Os nós e ligações podem aparecer e desaparecer.

Nas narrativas multimídia, a rede é formada pelos diversos hiperlinks que conduzem a outros textos e aos arquivos de áudio que servem de gatilho para as ações de cada leitor no processo de produção de sentido. Esses outros textos e arquivos de áudio podem ser acionados ou não. Cada leitor fará uma leitura diferente e pode ampliar sua produção de sentido por meio de hiperlinks ou fazer apenas uma leitura “linear”, apesar de que nenhuma leitura é, de fato, linear. A leitura também é um processo hipertextual, ou seja, o leitor, para compreender o que lê, ativa seus esquemas mentais e aciona os textos que sua experiência acumulou na memória.

Na Fig. 2, temos um exemplo de fluxo quando a autora narra sua experiência como candidata a um estágio na Associação Cristã de Moços (YMCA) nos Estados Unidos. Ela inseriu nove hiperlinks, As duas primeiras conduzem o leitor para a homepage da referida associação e a uma seção específica que descreve os programas da YMCA – Internacional camp councellor program (ICCP). Em seguida, é oferecida ao leitor uma seqüência de links para atividades de recreação: uma página para escoteiros com um arquivo de canções próprias para camping; um site que oferece inúmeros desenhos para imprimir e colorir; uma página da

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Biblioteca do Kingwood College que reúne uma coleção de sites sobre a cultura americana do século vinte; e um site com links para atividades diversas: desenhos para colorir, rimas, jogos, histórias, rituais indígenas, canções, e peças de teatro infantil.

Como o curso foi ministrado pela Cruz Vermelha, há também um link para a homepage dessa instituição, outro para uma página sobre a Serra do Cipó, local de um acampamento durante o curso e, finalmente, um link para uma página com informações sobre atividades ao ar livre: ciclismo, alpinismo, visita a grutas, caminhadas e aventuras.

I was too anxious to turn 18! When I finally was of age, I went to the YMCA branch in Belo Horizonte and started training as a candidate to go to the USA in the summer of 2000. The ICCP training had English as its first language and it started on September 1999 and it finished on March 2000. It was divided into three parts: Part 1 was an interview in

English, which I did really badly! Part 2 was the tough one; the candidates had to go to the YMCA every Saturday AND Sunday to learn recreation techniques, camp songs, arts and crafts, American culture, American games… it was fun but at the same time very tiring and stressful because we were supposed to speak English all the time! Part three was for the selected candidates, and it included specific courses such as First Aid and Lifeguard. All these courses were given by The Red Cross. There was a camp trip to Serra do Cipó to learn outdoor activities such as horse back riding, canoeing and rappelling. This training was very important to my learning process because even though it was an artificial environment to speak English, we were exposed to the language in different situations and we had to use it. http://www.veramenezes.com/multi14.htm

Fig. 2 – Exemplo de fluxo

Como se pode perceber na Fig. 2, são inúmeras as possibilidades de leitura para esse parágrafo. Cada leitor escolherá um percurso, pois o fluxo ou rede de nós materializado no texto pela narradora é apenas um cardápio de opções para cada um de nós. Cada uma das nove homepages oferece outros fluxos em um processo que pode variar ao longo do tempo, pois as publicações na web têm como característica textual a dinamicidade. Hiperlinks podem aparecer e desaparecer, pois variam ao longo de tempo, não são entidades fixas. Essa dinamicidade acontece tanto pelas alterações e inserções de novos dados e hiperlinks como também pelos percursos escolhidos pelos seus visitantes/leitores.

Na Fig. 3, apresentamos as primeiras páginas dos nove hiperlinks onde se pode ver a multiplicidade de opções de navegação.

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Fig. 3 – Hiperlinks

A quarta propriedade dos SACs é a diversidade, frutos das diversas adaptações que o sistema sofre ao longo do tempo. Um SAC é composto por diversos elementos cujas funções dependem do contexto composto pelos demais elementos do sistema. Segundo Holland (1997, p. 52) “[S]e retirarmos um tipo de agente do sistema, criando uma <<lacuna>>, o sistema responde tipicamente com uma cadeia de adaptações que resultam em um novo agente que <<preenche a lacuna>>”. Podemos exemplificar essa propriedade com os excertos das figuras 1 e 2. Se a narradora do primeiro texto, retirasse o hiperlink em Woody Woodpecker ou se a narradora do segundo texto, retirasse o hiperlink em YMCA, ainda assim teríamos como produzir sentido além do que está escrito ao acionar nosso conhecimento de mundo.

Paiva e Nascimento (2005, p. 166) argumentam que a coesão por elipse é também um exemplo de diversidade, pois “omite-se um elemento e o processamento do texto se reorganiza através das ações cognitivas do leitor”. Em uma das narrativas, a autora diz “I came back to Belo Horizonte in August, 1999, and decided to start teaching”, omitindo-se o objeto “English” após o verbo, mas o leitor é capaz de preencher essa lacuna pelas informações retiradas do contexto e também pelo nome da escola (Greenwich) que aparece na linha seguinte.

No nível dos leitores, cada leitura é uma nova leitura, pois mudam-se o tempo, o espaço, e os conhecimentos prévios, muda-se o leitor e muda-se também a leitura, pois cada leitor produz um texto diferente, fruto de adaptações do sistema. Se o contexto é sonegado ao leitor ou ouvinte de determinado texto, ele tratará de buscar algum outro contexto que possa suprir essa ausência para dar sentido ao texto.

A marcação é um mecanismo que, segundo Holland (1997, p.36) “facilita sempre a formação de agregados”. A marcação é um mecanismo por trás da organização hierárquica. Ele cita como exemplo mais comum a bandeira que é usada para agrupar membros de exército ou de um partido político. Como lembra Holland, “as marcas conferem aos agregados coordenação e seletividade” (p.37). Em nossas narrativas, funcionam como marcação, os títulos, subtítulos, e os hiperlinks.

Os narradores geralmente utilizam metáforas de viagem ou de aventura para descreverem a experiência de aprendizagem da língua inglesa. Algumas dessas metáforas aparecem no próprio título – “A long Journey...”; “The adventure of learning English”. Um outro grupo equipara as experiências de aprendizagem a contos de fada e marcam isso nos

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títulos com sintagmas que nos remetem ao gênero das histórias infantis: “Once upon a time...”, “My Little Story of English Learning”, “How I learned English, a tale not yet finished”; “A long time ago”. Outros títulos enfatizam eventos inesperados que funcionaram como elementos de motivação iniciação – “How it all started…”; “By an accident”; “The first contact”. Esses títulos agregam as experiências narradas em forma de viagem, aventura contos de fada; ou marcam os estágios iniciais que funcionaram como perturbações a uma ordem estabelecida para gerar aprendizagem

Um segundo mecanismo é denominado por Holland (1997) de modelos internos, equivalente a mecanismo de antecipação ou esquemas. Segundo ele, “um exemplo por excelência da antevisão de cenários é a exploração mental de seqüências possíveis de xadrez antes de movimentar uma peça”. No processo de leitura, acionamos mecanismos de antecipação textualmente marcados através de sinalizadores lexicais, separadores (ex. dois pontos, interrogação, etc.); enumeradores e antecipadores (ver Motta-Roth, 1997) e acionamos nossos espaços mentais definidos como “pequenos pacotes conceituais construídos enquanto pensamos e falamos” (FAUCONNIER e TURNER, 2002, p. 102).

Na Fig. 4, os dois pontos antecipam o próximo evento assim como “the music” antecipa que existe uma música especial que deu ao narrador o insight, metaforizado na última imagem, que a música poderia ser mais efetiva do que a escola.

But something happened: the TVE had a program called “Aprenda Inglês com Música” and I started following its presentations. The presenter was Marcia Kriegel, I guess, and the music was the very pop music at the time, including Madonna, Beatles and Carly Simons etc .

And I‘ll always remember the day and the music that opened up my eyes to the fact that I REALLY COULD UNDERSTAND this language, despite the classes on the schools that were very less effective.

http://www.veramenezes.com/multi1.htmFig. 4 – exemplo de modelos internos

As duas imagens representam dois processos narrativos, denominados por Kress e van Leeuwen (1996) de estruturas vetoriais. Na primeira. O ator, de quem parte o vetor, está em um processo transacional com o aparelho de televisão, alvo do vetor. Na segunda, o processo é reacional e não mostra uma ação, mas uma reação do participante, com um sorriso de alegria pela descoberta da música como fonte de aprendizagem. A lâmpada no alto da cabeça é um índice de luz que, por sua vez, funciona como metáfora para o conhecimento, o insight

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ou uma boa idéia. Essa imagem também funciona como um indicador do mecanismo de modelos internos que antecipa seqüências possíveis no processo de aprendizagem desse narrador. Ou seja, a partir dessa boa idéia, podemos prever que o narrador passou a usar as músicas para aprender inglês.

O terceiro mecanismo é denominado por Holland de blocos constituintes. O autor explica que a capacidade que o ser humano possui de decompor uma cena complexa não é algo arbitrário, pois, através da aprendizagem e da seleção, recorremos a elementos já testados e os reutilizamos . Assim como as crianças reutilizam várias vezes as peças de seus jogos de pequenos blocos, nós também procuramos elementos já experimentados, para reutilização. Diz ele: “[A]dquirimos nossa experiência através da utilização recorrente de blocos, ainda que estes possam nunca aparecer duas vezes na mesma combinação exata”. (HOLLAND, 1997, p.60). Como exemplo, o autor menciona as notas musicais e suas infinitas possibilidades de composição musical.

Em sistemas abertos, como é o caso das narrativas multimídia, as possibilidades de combinação de seus blocos constituintes e os percursos de produção de sentido são incontáveis. As palavras, imagens e sons juntos ultrapassam a soma de suas partes, pois esse tipo texto potencializa tanto a criatividade e a imaginação dos narradores quando a dos leitores. Vejamos a cena descrita na Fig. 5.

,

One day, I asked a friend if she would like to study with me, in order that we

both could refine our English. Then she answered: "No, thank you. I don’t want

to study with someone that knows less than I do. It’s no use." I got so embarrassed that I could hardly

find an answer to this. Then I said: Ok, thank you anyway.

Nevertheless, I decided to face the challenge and began studying like a crazy to catch up with

the other students who had had the opportunity to begin their studies in private schools since their

early childhood. I used my rights as an underprivileged

student and enrolled myself in the CENEX English

course. At the same time, I used the Internet, films,

songs, books, and everything else I could think about as a

way to improve my English skills. Surprisingly, I was able

to go on taking my graduation course, whereas some of

my friends - even some who had studied in private

English schools - had given it up long before.

Later, I was selected to work as a trainee at MAI English, which helped me to improve my English

even more. I won a scholarship to take a course in advanced English and this also

helped me a little bit. http://www.veramenezes.com/multi15.htm

Fig. 5 Exemplo de blocos constituintes

children45.wavDouble Click here to listen to the sound

effect

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Neste excerto, o aprendiz demonstra como reagiu à falta de colaboração de um colega. Como muitos de seus colegas eram mais proficientes, ele pediu ajuda a um deles, mas obteve uma resposta negativa. Os blocos constituintes desse excerto são: a narrativa de suas ações de aprendizagem; o hiperlink para a homepage do Centro de Extensão da Faculdade de Letras da UFMG; uma narrativa visual de um processo reacional na forma de um gif animado de um rosto masculino vertendo lágrimas; uma mistura de sons de choro e riso de crianças, sinalizando a tristeza do narrador e a alegria dos colegas. A isso, somam-se narrativas visuais de ações: a cena da biblioteca e a pilha de livros indicando o empenho em aprender e o desenho de uma criança brincando com blocos. Essa última imagem metaforiza não só o processo de construção de texto como também o de aprendizagem como construção de conhecimento que também se caracteriza como um sistema complexo.

4. Conclusão

Os trinta e sete textos examinados demonstram que as narrativas multimídia constituem um gênero híbrido emergente em dois sentidos. O primeiro sentido é o do senso comum, da novidade, pois, acredito que ainda não há produções textuais desse tipo no contexto escolar. O segundo sentido está relacionado à noção de texto como sistema complexo cujas conexões e interações entre suas diversas partes faz emergir algo que é maior do que a soma de suas partes (JOHNSON, 2003).

A produção de textos é um sistema complexo aberto e as novas tecnologias, ao serem incorporadas ao processo de escrita e de leitura fazem emergir novas possibilidades multisensoriais de construção de sentidos que vão além da mera justaposição de imagens, textos e sons.

Todos os textos do corpus analisado contam histórias de aprendizagem de inglês e exemplificam como a língua estrangeira emerge das experiências dos aprendizes dentro e fora da escola. Cada experiência é única e imprevisível, mas, em todas elas, fica claro que a cultura de massa têm um grande impacto nesse processo complexo de aprender uma outra língua. A cultura de massa está presente nos arquivos sonoros (músicas, trilhas sonoras de filmes), nos vídeos (trailers de filmes; videoclips), nas imagens dos cantores e das capas de seus discos, nas letras de música, nos poemas e nas inúmeras páginas da web que registram a vida e a obra de cantores e de artistas do cinema.

Referencias

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