St. Peter's Village

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2012 volume 01

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SINOPSE: Diana Gomes aos 16 anos foi morar com sua avó numa pequena cidade depois que seus pais foram mortos durante um sequestro relâmpago. Nessa cidade, as pessoas acreditam na lenda de uma água milagrosa, descoberta pelo professor Pedro. Quando estranhos desaparecimentos começaram a ocorrer, o barão foge com a família para dentro da floresta e passam a viver na escondida Aldeia de Santo Pedro onde acabam morrendo, deixando órfãos três irmãos que continuaram morando na floresta. Tentando se integrar à vida nova, Diana se apaixona por um rapaz misterioso que mora dentro da floresta. Este rapaz pode estar envolvido no estranho caso sobrenatural ligado à lenda do Santo Pedro. Através de seu psicólogo, ela fica sabendo de um trágico acidente envolvendo a morte da família Baleares. Determinada a investigar com sua melhor amiga, Diana pensa que Ric, o rapaz por quem ela se apaixonou, pode ser um fantasma.

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Page 1: St. Peter's Village

2012

volume 01

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Aldeia de Santo Pedro

Água

Volume 01

Suspense - Romance - Ficção – Sobrenatural.

Para maiores de 16 anos

Escrito por Danielle Sampol

Rio de Janeiro, RJ - 2012.

Page 3: St. Peter's Village

ATENÇÃO

ESTE LIVRO ESTÁ REGISTRADO NA BIBIOTECA NACIONAL

Está é uma obra original da autora,

qualquer semelhança com outras obras é mera coincidência.

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ALDEIA de SANTO PEDRO

Água

Sinopse

Aos 16 anos, Diana foi morar com sua avó numa pequena cidade

depois que seus pais foram mortos durante um sequestro relâmpago.

As pessoas da cidade acreditam na lenda de uma água milagrosa,

descoberta pelo professor Pedro.

Quando estranhos desaparecimentos começaram a ocorrer, o barão

foge com a família para dentro da floresta e passam a viver na

escondida Aldeia de Santo Pedro onde acabam morrendo, deixando

órfãos os três irmãos Ram, Edie e Ric que continuaram vivendo na

floresta.

Tentando se integrar à vida nova, Diana se apaixona por um rapaz

misterioso que pode estar envolvido num estranho caso sobrenatural

ligado à lenda do Santo Pedro.

Através de seu psicólogo, Diana toma conhecimento de um trágico

acidente envolvendo a morte da família Baleares e determinada a

investigar com sua melhor amiga, ela pensa que o rapaz por quem

ela se apaixonou, pode ser um fantasma.

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ALDEIA de SANTO PEDRO

Água

“Não sei se conseguiria contar com as mesmas palavras, mas acho que

foi isso que eu entendi. Ele falou comigo sentado no velho chafariz.

Estava lindo, de cabeça baixa olhando para o chão. Mesmo sem ter visto

uma única lágrima, eu tenho certeza que ele estava chorando”.

(Diana Gomes, 1996)

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ALDEIA de SANTO PEDRO

Água

Prólogo

Sudeste do Brasil - Rio de Janeiro.

Petrópolis, 1980.

Nenhuma tarde passava despercebida para a família Baleares, a

baronesa, sempre reunia a família na varanda para o lanche.

Os garotos com suas mãos barrentas e seus pés descalços chegavam

sempre juntos rindo e se batendo um no outro. Famintos, nem se

davam ao trabalho de lavar as mãos. Tudo isso para não perder os

pães de batata que a baronesa preparava com carinho para seus três

filhos.

O ultimo a chegar à mesa era o patriarca da família Baleares, que

todos os moradores locais o chamavam de barão, embora ele não

gostasse.

Juan Baleares nasceu na Europa, mas mudou-se para o Brasil antes

de completar vinte anos. Nascido em berço ouro, ele herdou toda a

fortuna dos pais. As pessoas da pequena cidade não estavam

acostumadas com uma pessoa rica vivendo entre delas, daí bastou

uma única brincadeira para que o apelido de barão estivesse na boca

de todos. Incluindo Celina, a esposa dele, que também foi apelidada

de baronesa.

O pequeno Ram, era o mais baixo e o mais magro dos irmãos, era

também o filho mais velho da família Baleares e o mais apegado ao

pai. Edie era o irmão do meio e Ric, o caçula da família.

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Edie era mais lento que os outros irmãos. Nunca tinha vantagem nos

treinamentos de combate, mas isso não era problema quando se

tratava na habilidade com as facas. Edie possuía uma mira perfeita.

Seus olhos verdes eram o xodó da baronesa, ela sempre fazia pães

de batata recheados somente para ele.

Edie também era o eterno apaziguador nas brigas entre Ram e Ric

pela atenção do barão, pais dos três irmãos.

Os garotos passavam boa parte do tempo com o pai, treinando lutas

de combates corpo a corpo e com espadas japonesas. O barão era

um grande admirador de artes marciais, mais especificamente as

japonesas. Os treinamentos com seus filhos eram realizados ali

mesmo, na grande propriedade que pertencia à família baleares.

Ram era chamado de magrelo pelos outros irmãos e isso gerava um

ódio enorme em seu coração. Sua pele era muito branca, seus

cabelos eram escuros e seus olhos muito expressivos. Ninguém

conseguia descrever ao certo a cor exata daqueles olhos, nem

mesmo a própria mãe, mesmo assim eram marcantes, exóticos,

misteriosos.

A personalidade forte de Ram o fazia constantemente brigar com Ric

por atitudes infantis, mas ninguém sabia se era consequência da

idade ou pirraça para atormentar o irmão.

Ric era o mais alto. Agia como se fosse abraçar o mundo com as

próprias mãos. Ele achava que poderia fazer de tudo sem medir as

consequências. Ao contrário de Ram que escondia tudo pelo olhar, os

olhos verdes de Ric eram como um livro aberto podendo ser lido por

qualquer pessoa.

Ele sempre escapava da propriedade em busca de conhecimento,

Ram e Edie eram mais tradicionais sempre seguindo o costume local

e as tradições da família, mas Ric era diferente, questionador e

eloquente.

A única característica que os irmãos compartilhavam juntos era o

gosto por cavalos. A propriedade dos Baleares era muito grande e a

família criava belos animais.

No entanto, estranhos desaparecimentos começaram a ocorrer de

uma hora para outra na pequena cidade, vizinha à floresta.

Pouco tempo depois dos milagres, alguns adultos, crianças e

adolescentes, desapareceram misteriosamente e as autoridades não

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sabiam esclarecer se era rapto, sequestro ou assassinato, mas o fato

é que estavam sumindo e as pessoas da cidade estavam apavoradas.

A baronesa, já não permitia que os meninos andassem sozinhos fora

da propriedade sem a presença dela ou algum empregado da casa,

ela tinha medo que seus filhos também pudessem desaparecer.

Em meio ao caos, o barão formou um grupo de busca com homens de

sua estrema confiança armados com espadas e facas, ele não

suportava armas de fogo, achava que era uma medida digna de um

covarde que não dá chance de defesa ao oponente, mesmo sendo um

oponente fora da lei.

O barão era uma pessoa extremamente influente nas políticas da

cidade, era um homem rico, por isso era ele quem organizava e

tomava a frente das buscas pelos desaparecidos ignorando a polícia

local.

Quando alguém comentava os desaparecimentos, o Barão alterava

completamente seu comportamento, desconversava e ficava muito

agressivo caso alguém insistisse em comunicar as autoridades da

cidade visinha.

Achando muito estranho, a baronesa perguntou ao marido por que

demorava tanto tempo dentro da floresta fechada, já toda vez que o

seu grupo de busca partia à procura dos desaparecidos, regressava

dias depois, quase semanas.

O barão, sentindo-se pressionado, não teve como esconder a verdade

da baronesa. - Eu tenho algo muito importante a lhe contar Celina. –

Melhor sentar-se.

A baronesa parecia não acreditar nas palavras dele. As lágrimas

escorriam pelas bochechas finas que emolduravam o rosto dela. O

barão, mantendo a expressão séria, revelou-lhe que ele estava

envolvido no caso das pessoas que estavam desaparecendo.

Eles começaram a discutir e o barão tomou as esposa pelos braços,

que eram fortes como ferro fundido, e a levou até o quarto deles

ordenando que ela arrumasse as malas de toda a família.

Muito abalada obedeceu às ordens de seu marido enquanto gritava

pelos filhos. –Richard, Edgard, Ramcy, venham até aqui.

Os garotos correram até o quarto da mãe assustados, ela mãe nunca

havia gritado com eles tão alto como naquela tarde.

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Quando anoiteceu começou a ventar forte parecendo que iria

arrancar árvores inteiras, até pedaços de telhado estavam voando

por toda parte e todos ouviram estrondos fortes de relâmpagos.

A família Baleares, com malas repletas de roupas e pequenos

utensílios pessoais, partia com o empregado pessoal da baronesa,

seguindo por uma estradinha que levava até a beira da floresta com

seus cavalos e uma pequena carroça de passeio enquanto o barão

permanecia na propriedade.

Era quase impossível acreditar que o empregado iria entrar com toda

a família no meio do mato, não considerando os perigos da noite que

perambulavam na floresta.

Ric e Edie estavam assustados com o que estava acontecendo, mas

Ram mantinha-se calmo à frente da caravana, ele parecia estar

ciente de tudo que estava acontecendo.

Passando algumas horas, viajando floresta adentro, a baronesa já

não sabia mais onde estava e nem por onde poderia retornar para a

cidade.De repente, quando não tinha mais estrada a caravana parou.

Eles se depararam em frente a um paredão de plantas e galhos de

árvores bloqueando a passagem e o barão atravessou por ele. Como

um passe de mágica, o paredão se abriu diante dos olhos de todos,

dando vista a uma nova estrada.

Sufocando seu pânico, a baronesa agarrou-se aos meninos que

estavam com ela na carroça tentando protegê-los, mas eles não

aceitaram. Ric e Edie desembainharam suas espadas e avançaram de

encontro ao pai, pensando que ele de alguma forma iria tentar

alguma maldade com a mãe deles. Foi à vez do pequeno Ram, que

apontou sua espada e se voltou contra os irmãos, na intenção de

proteger o pai.

A baronesa saltou da carroça de passeio e posicionou-se entre Edie e

Ric, Ram e o Barão então todos abaixaram suas espadas. A calmaria

da noite superou o ambiente enquanto o Barão falava com sua

esposa. - Calma Celina, nada de mal vai acontecer com você ou com

nossos meninos. – Ele falou limpando suas lágrimas - Estamos a

salvo e ninguém saberá onde nos encontrar.

Aceitando as palavras dele, a baronesa retornou de volta á carroça e

todos seguiram através da passagem que se abriu onde havia o

paredão.

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Os meninos ainda tensos acompanharam silenciosamente seus pais e

nenhum deles teve coragem de olhar nos olhos um do outro durante

todo o resto do caminho.

À medida que eles avançavam pela passagem aberta no meio do

nada, uma nova estrada de terra se apresentou e podia-se ver

pequenas luzes de fogo que ficaram mais intensas quando eles se

aproximavam. Então as pequenas luzes de fogo se transformaram em

tochas que estavam iluminando todo o trajeto.

Quase engasgando na própria saliva, Ric espiava de soslaio

parecendo não acreditar que tudo levava a crer que ali, no meio de

uma floresta, encontrava-se uma pequena aldeia com pequenas

casas e pessoas morando dentro.

Ele imediatamente reconheceu os rostos das pessoas que seguravam

as tochas parados nas portas das casas olhando para ele com

expressões de curiosidade e medo. Eram as pessoas desaparecidas

da cidade.

Edie Mantinha-se ao lado da mãe o tempo todo, mas o pequeno Ram

caminhava de cabeça erguida ao lado do pai, sério e com sua espada

nas mãos.O barão conduziu sua família em silêncio, ninguém se

atrevia a falar.

Chegando à porta da casa principal a família não pode deixar de

notar, quando a porta foi aberta, que a casa estava completamente

mobilhada, cada cômodo pronto esperando para ser ocupado.

Foi permitido pelo Barão que os meninos explorassem a casa

enquanto o barão conduzia sua esposa até a suíte do casal.

- O que significa isso Juan? - Perguntou a baronesa. - Não estou

reconhecendo você.

– Vamos morar aqui a partir de agora, Celina. - Ele respondeu - Esse

vai ser nosso lar.

A baronesa arregalou os olhos extremamente verdes. Abalada com

tudo aquilo ela não teve coragem para se opor ao marido. - Por que

isso? - Ela perguntou.

O barão se aproximou, colocando as duas mãos enormes sobre os

ombros da mulher. - Ela existe, Celina. - A lenda é verdadeira...

- Ela existe.

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Água

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Água

Petrópolis (1988).

Oito anos depois...

As férias desse ano foram iguais a todas as outras, com uma única

variante, Dina não voltaria para casa quando acabassem. A triste notícia

chegou aos ouvidos dela como um verdadeiro Tsunami devastando todos

seus sentidos, por pouco ela não conseguiu ficar em pé depois que

colocou o telefone no gancho.

A cidade ficou estranha depois que descobriu que era órfã de pai e mãe.

Passando ano após ano de férias na casa da sua avó ela começou a ver

tudo por outro ângulo.

Sua avó preparou todos os papeis de transferência da nova escola e para

piorar ainda mais, teria que passar por uma mudança total de ambiente

no auge dos seus 16 anos. Com certeza isso seria motivo suficiente para

algumas consultas com psicólogo da família.

O homem era lunático, ao invés dela falar sobre o que ela estava

passando era ele quem contava histórias esquisitas sobre Pedro, antigo

morador da cidade.

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Como ela não estava nem um pouco interessada em falar sobre sua vida

pessoal com o psicólogo, deixou que ele falasse enquanto o tempo

passava. Ela apenas ouvia.

Aqui na cidade, muitos anos antes de você nascer, existia uma lenda que os

antigos contavam. Uma teoria de que uma água poderia curar todas as

enfermidades. A maioria das pessoas não acreditavam que uma

determinada água que brotava dentro da floresta, ninguém sabia onde,

poderia aumentar a expectativa de vida das pessoas e até dos animais, e

quem bebesse dessa água não teria nenhuma doença, se curaria muito

rápido e poderia até viver muito mais anos de vida.

- Então quem bebesse seria imortal, como os vampiros e lobisomens? -

Ela perguntou.

- Não é exatamente desta forma, minha criança.

Na verdade, quem bebesse dessa água aparentemente se tornaria escravo

dela porque não poderia beber outro tipo de água, somente essa água

especifica. Então um professor de biologia, muito querido aqui na cidade,

começou um projeto de expedição com objetivo de descobrir o local dessa

água milagrosa.

Esse professor chamava-se Pedro, e era um homem extraordinário que

ajudava todo mundo aqui na cidade. Ministrava aulas para crianças e era

muito religioso. Professor Pedro, como lhe chamavam, junto com outros

pesquisadores, partiu numa certa manhã para dentro da floresta e nunca

mais voltou digo, não o grupo completo que partiu, os únicos que voltaram

foram Pedro e Juan.

- Nossa, que historia mais tosca. - Ela sussurrou baixinho.

A todo o tempo ela pensava que, mesmo a historia da água milagrosa

sendo tosca, era bem mais emocionante que a dela. Concluiu que a

realidade de fato, era que sua historia não tinha nenhuma emoção, era

um verdadeiro filme de terror, já que tinha morte envolvida no meio.

Enquanto o homem falava, ela o observava beber a todo o momento, um

gole de uma garrafa que ficava ao seu lado. “Bebendo em serviço à essa

hora.” Ela pensou.

Quando o tempo de análise terminou ela despediu-se do psicólogo e

marcou uma próxima sessão. “Quem sabe ele tinha outras historias mais

interessantes”, ela pensou. “Lendas definitivamente não me atraem”.

Atrasada para missa das 19hs correu tanto quanto pode aguentar. Não

estava acostumada com o tipo de ruas da cidade, embora sempre

passasse as férias por lá.

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As pedras de paralelepípedos eram muito desniveladas e cobertas com

um tipo de areia que fazia com que elas escorregassem muito, Ops!

Sentindo seus joelhos ardendo, percebeu o gosto salgado das lágrimas

quando escorreram através das bochechas até chegar aos seus lábios, o

impacto dos joelhos dela ao chão fez com que ela soltasse o maior grito

de dor que ela jamais havia sentido antes.

Se ela fosse contar a alguém não saberia como descrever a dor que

sentia naquele momento e se por acaso ela pudesse contar, descreveria

talvez, que era a própria visão do inferno.

Choramingando tentou levantar-se, mas suas pernas estavam bambas

com o tombo e a dor. “Merda”. Pensou quando reparou que havia areia

dentro da sua pele.

A coloração vermelha no joelho misturada com a areia do chão causava

arrepios, quando percebeu um rapaz se aproximando lentamente, mas

ela estava tão anestesiada com a dor que não pensou que poderia ser

um assalto ou coisa assim.

- Parece que você tem um pequeno problema ai. - O rapaz falou - Eu

posso ajudar você?

- Com a dor que eu estou sentindo, aceito qualquer ajuda, mesmo vinda

de uma pessoa estranha, assim como você...

Se antes, ela estava anestesiada com a dor, agora a paralisia tomava

conta das suas funções, quando ela olhou para ele. Ficou alguns

segundos olhando para aqueles olhos verdes sedutores, que tagarelavam

na sua frente.

Em pouco tempo a visão do inferno começou a mudar radicalmente para

o retrato do paraíso. “O cara é lindo, simplesmente mais que lindo”.

Pensou. E o sorriso seguro que ele tinha era a perfeita combinação para

aquele rosto alegre que ele exibia.

- Calma, deixe-me verificar como está o seu machucado. - Ele agachou -

se ao lado dela - Me parece que isso deverá cicatrizar em pouco tempo.

- Pouco tempo? - Ela tentou rir. - Quase dá para ver o osso ai dentro. -

Falou olhando para o joelho.

- Você está exagerando, não é tão grave. - Ele debochou do que ela

havia dito. - Você vai sobreviver, deixe-me limpar o seu machucado.

O rapaz pegou um pedaço de tecido que não parecia em nada com

lenços do tipo que os cavalheiros dos filmes costumam usar, o pano

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estava todo encardido e ela ficou com um pouco de nojinho por ele

colocar o tecido na ferida dela.

Puxando um cantil de água amarrado às suas costas, ele molhou o pano

e passou sobre machucado. O toque dele era delicado e ele foi bastante

gentil enquanto segurava o tornozelo dela para ter um melhor apoio na

assepsia do machucado.

Naquele instante ela não sentiu qualquer dor que pudesse ter uma vez

sentido, para ficar admirando o rapaz que estava ajudando.

- Obrigada, parece que a dor melhorou.

- Venha, vou ajuda-la a levantar, segure minha mão.

Ele pegou na sua mão e o toque que antes era delicado, passou a ser

firme para que ela pudesse se ancorar ao levantar-se, mas no meio do

movimento Dina sentiu o joelho ferido vacilar e desequilibrou.

Mais que depressa a outra mão dele que estava livre, avançou para a

cintura dela ajudando-a firmar-se em pé. Quando ela achou que iria cair

lançou as duas mãos sobre os ombros dele alcançando seu pescoço com

os braços, puxando-o forte para perto de si.

Ficaram encostados um no outro por alguns segundos, ele a olhava com

aqueles olhos sedutores e ela o olhava de volta. A respiração dele ficou

mais ofegante e ela pôde perceber que ele ficou tenso, foi ai que ela

cortou os olhares entre os dois pedindo desculpas. Ele apenas sorriu.

Foram caminhando juntos até o final da rua. Ela sentia uma pequena

dificuldade em andar e ele seguiu junto a ela caminhando ao seu lado,

segurando-a com a mão firme certificando que ela não cairia novamente.

Quando as luzes da igreja ficavam mais fortes eles pararam. Ele

vasculhou o resto da rua, a sua expressão já não era mais a mesma e o

seu sorriso havia sumido completamente, ele parecia rígido e

preocupado.

- Eu devo assistir a missa, minha avó esta esperando por mim. - Quer

conhecê-la?

- Acho que não é uma boa ideia. - Ele respondeu. - Eu preciso ir já

passei mais tempo aqui do que eu deveria. - Consegue andar ate lá

sozinha?

- Sim, acho que consigo. Obrigada. – A propósito, meu nome é Diana.

- Você mora aqui na cidade, Diana?

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- Sim, com minha avó.

- Se você mora aqui, então nós somos vizinhos.

- E eu posso saber o nome do meu vizinho? - Perguntou

maliciosamente.

Ele ficou observando ela por um momento e sua expressão era curiosa.

Então uma amiga de Dina aparecia na porta da igreja com intenção de

chama-la, Dina virou-se para a amiga enquanto ele disse seu nome.

- Eu sou Richard.

- Prazer em conhecer Richard... - Diana falou enquanto virava de volta o

rosto querendo agradecer por ele tê-la ajudado, mas não havia ninguém

com ela.

Ele havia sumido.

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Desavenças e verdades

Ainda mancando, Dina conseguiu andar até a porta da igreja para encontrar-

se com sua amiga Angélica que ela apelidava carinhosamente e

pejorativamente de Anja.

Ela estava parada em frente a ela com cara de muitas perguntas, mas Dina

não deixou que ela abrisse a boca, tratou de pendura-se no ombro da amiga

e pediu que ela a ajudasse a caminhar até perto da sua avó.

Dois lugares ao lado dela estavam vazios esperando para ser ocupados pelas

duas. - O que aconteceu com seu joelho, querida? - Perguntou sua avó.

- Nada de mais. Respondeu Dina. - Eu apenas caí quando sai correndo para

não perder a missa.

- E o que é isso ai amarrado no seu joelho? - Perguntou Angélica. - Que

pano sujo é esse?

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- É do Richard, ele me ajudou limpando o machucado. - Dina respondeu

enquanto sua avó ignorava as duas ouvindo o padre falar. - Ele deixou o

pano aqui.

– Quem é Richard? - Perguntou Angélica novamente.

- É o rapaz que me ajudou, já disse. - Quando eu caí na rua, vindo pra cá. -

Ela tentou explicar. - Você deve ter visto quando apareceu na porta da

igreja, não viu?

– Eu não vi ninguém com você na porta da igreja, Dina.

“Como Angélica não viu Richard”. Ela pensou. “Se ele estava bem ao meu

lado quando ela colocou a cabeça para fora da igreja”. Ficou pensando que

talvez Anja pudesse ser míope, ou estava muito escuro e realmente ela não

pode ver.

Dina achava impossível Anja não ter visto aquele homem forte, com um

sorriso lindo e olhos verdes que brilhavam mesmo na escuridão. Qualquer

garota teria ficado fascinada, assim como ela ficou. Também se achou idiota

por ter se esquecido de pedir o telefone dele.

Tá certo que aquela cidade pequena era um pouco atrasada comparada a

cidade grande, mas todos ali tinham telefone em casa e certamente aquele

“Deus gato” teria um telefone numa mesinha de em casa.

Enquanto isso na floresta...

- Mas onde diabos você estava com a cabeça para ir à cidade? - Não sabe

que isso pode ser perigoso?

- Não faça um drama a toa Edie, ninguém me viu. - Ric respondeu ao seu

irmão. - Eu tinha que ver como estava a nossa antiga cidade.

- Você tem certeza que ninguém viu você?

- Claro que tenho certeza, Edie.

- Então jure por nossos pais.

- Eu não vou jurar pelos nossos pais, não seja ridículo.

- Diabos, então alguém viu você. – Edie parecia irritado com ele. - Idiota.

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– Talvez alguém tenha me visto, mas ela não seria capaz de me reconhecer,

esta morando à pouco tempo na cidade.

- ELA? - Edie ficou preocupado com a revelação do irmão. - Você por acaso

estava com uma mulher. - Ele jogou os braços para o ar. - Diabos, seu

idiota, deixou uma mulher ver você, ele vai acabar sabendo disso, e vai

fazer da nossa vida um inferno ainda maior.

- Relaxa Edie. - Ric fazia questão de tripudiar em assuntos sérios. - Você

tem passado muito tempo com macacos e preguiças. - Ric suspirou quando

se lembrou de Dina. – Eu conheci uma garota incrível.

Edie, sempre ficava na defensiva quando Ric sumia para explorar lugares

fora dos limites do refúgio. Desde que seus pais morreram, ele cuidou dos

seus irmãos até que a grande desavença separou de vez os meninos.

O garoto gordinho com olhos verdes e bem pequenos havia se tornado um

homem alto, ágil e forte. Com seus ombros bem definidos em cima de um

belíssimo peitoral masculino. Seus cabelos costumavam cair pela testa

tampando um pouco a visão dos olhos, mas nada que pudesse dificultar.

Quando criança era muito bom com as facas e espadas curtas, mas agora

que os anos passaram e ele cresceu tornou-se muito perigoso.

Depois que Ric ouviu todo o sermão de Edie entrou em sua pequena cabana

montada sob as raízes de uma arvore. Jogou o cantil de água que estava

nas costas num canto qualquer. Não existia nenhum luxo dentro da sua

cabana, apenas uma pequena cama feita com folhas secas aglomeradas em

baixo de um pano com tecido muito grosso e pesado.

A cabana era tão pequena que só possuía um único cômodo com aporta de

entrada e nada mais. Faltava espaço até para a cama e folhas que volta e

meia era destruída quando Ric se movia durante o sono.

Ele deitou com as costas voltadas para as folhas, ficou encarando o teto e

pensando na garota que acabara de conhecer na cidade, fora dos limites da

floresta. A lembrança do rosto dela ficaria registrada para sempre na

memória dele.

Em anos, depois que saiu da cidade e foi morar na floresta, nunca mais

havia se aproximado tanto de uma pessoa que não fosse da família ou os

outros membros de seu clã. Parecia que os acontecimentos passados ainda

ecoavam em sua mente.

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Era difícil lembrar as coisas que Ram falou e fez contra ele, frequentemente

Ric era assombrado por pesadelos obscuros em que Ram o perseguia depois

que havia matado toda a sua família.

Ele acordava no meio da noite, com sua espada em punho e suas vistas

embaçadas que faziam com que ele não conseguisse distinguir a realidade

do pesadelo. Apenas uma coisa ele tinha certeza em sua mente. Ram teria

que pagar, ele não poderia ter feito todo aquele mal e ficado impune.

Na igreja...

Quase terminando a missa, as pessoas com suas cabeças baixas prestando

atenção nas palavras do padre pareciam estar em transe coletivo, não era

percebido qualquer movimento e Dina tentava adivinhar há quantos anos

aquele padre ministrava missas na mesma igreja.

Passado algum tempo o estômago dela roncava de tanta fome, ela mal

conseguia raciocinar alguma coisa quanto mais lembrar que seu joelho

estava machucado.

Olhou um estante para o lado e percebeu que sua avó dormia confortável

sentada no banco, ela achou incrível a maneira como a avó conseguia

dormir durante toda a missa sem se encostar em nada, ela até achou graça

e fiquei rindo sozinha, enquanto Anja prestava atenção absoluta nas

palavras do padre.

Quando finalmente a missa acabou todos que passavam por ela falavam

sempre a mesma coisa. - Como você está Diana? - Se precisar de alguma

coisa é só chamar. - Eu sinto muito pelos seus pais, eles eram tão jovens.

Em resposta com a cabeça, ela fazia um sinal de consentimento, mas no

fundo do meu âmago, ela não queira queria estar ali. Ela desejava sair

correndo para qualquer lugar o mais rápido possível.

Infelizmente lembrou que seu joelho estava machucado e concluiu que seria

impossível, incluindo voltar à sua casa.

Ela estava em completa negação e as pessoas falavam tanto que ela não

precisava dizer nada, apenas acenar com a cabeça.

-Boa noite Dona Augusta. - Anja despediu-se

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– Boa noite Angélica, amanha você poderia acompanhar Diana e irem juntas

para escola?

– Claro que posso. - Ela respondeu. – Estarei aqui para o café da manhã,

espero que tenha pão de batata?

Dina entrou com sua avó pela porta da frente. Elas cruzaram a sala e

sentaram na cozinha. – Agora eu posso finalmente comer um pouco. - Ela

disse. – Estou morrendo de fome desde a igreja.

“Espero que não seja pecado ter assistido a uma missa pensando em

comida”. Pensava. Ela tinha se esquecido de fazer um lanche antes de ir a

análise com o psicólogo.

O cheiro dos Paes de batata da sua avó era maravilhoso, mesmo depois da

fornada ter saído muito cedo, logo depois do almoço. Ela preparava os pães

todos os dias. Todos os dias tinha pão fresco em casa.

Vó Augusta era uma excelente cozinheira tanto para doces quanto para

salgados. Todo mundo da cidade conhecia a comida que ela preparava. Ouve

uma época em que ela ministrou um curso de culinária na pastoral da igreja

onde teve muitas alunas. Quase todas as garotas da cidade aprenderam a

cozinhar com ela.

Dentre todas as alunas que ela teve, a única aluna do curso que aprendeu a

fazer o pãozinho de batata exatamente como ela fazia, também era a mais

bonita da cidade e a que casou mais jovem. Todos pensaram que ela casou

muito cedo por que estava grávida, mas com o tempo constataram que o

casal se uniu por amor.

O marido dela era um professor que não exercia a função. Ele era um

homem muito rico, viajado, proprietário de terras na Europa. Vendeu tudo e

veio morar na pequena cidade ainda jovem. Conheceu a linda menina do

curso de culinária da pastoral e se apaixonou por ela.

- Qual era mesmo o nome dela, vó? - Dina perguntou de boca cheia.

- Quem, querida?

- A menina que foi sua aluna no curso de culinária, aquela que fazia pão de

batata igual ao que a senhora faz.

– Não me lembro direito, querida, mas acho que era Celina.

– Bem, ela pode ter feito pães iguais ao da senhora naquela época, mas eu

vou aprender a fazer melhor que ela.

Page 21: St. Peter's Village

– Claro, querida você é minha neta e certamente tem a mão da família para

culinária.

Dina subiu para o quarto enquanto sua avó arrumava os pratos, ela não

gostava que a neta ajudasse a lavar louça, ela achava que a avó tinha medo

que ela fosse quebrar algum prato do século passado.

Reirou suas roupas e só lembrou do meu joelho quando olhou o pano sujo

que estava amarrado nele. Novamente pensou em Richard e no que ele

havia feito por ela. Sentou na cama, removeu o pano e notou que o

machucado estava praticamente curado.

“Como isso é possível” Pensou. “Esse ferimento levaria no mínimo uma

semana para criar aquela casquinha verde meio marrom.” O joelho mal

parecia que havia sequer esfolado. Se ela não visse com seus próprios olhos,

poderia jurar que tudo não passou de um sonho. Um sonho bem real.

“Melhor ir dormir, isso deve ser sono”. Ela trancou a janela foi até a cama,

puxou os lençóis, ajeitou os travesseiros, deitou e fechou os olhos.

Tarde da noite, dentro da floresta...

- Você tem certeza que ele saiu da floresta?

- Sim, Eu segui os rastros dele até a margem da estrada, mas deu perceber

que ele foi à cidade.

Ele olhou a escuridão como se pudesse enxergar o que estava se passando

na floresta. Àquela hora da noite nada que não fosse bicho conseguiria ver

um palmo na frente do nariz, mas isso não impediu que Ram tencionasse as

linhas do seu rosto, mostrando sua raiva ao saber da notícia.

- Eu não vou permitir que ele exponha nosso clã. - Sua voz era séria. - Ele

foi longe de mais, não terei pena dele como venho tendo esses anos.

– Nós podemos organizar busca e invasão ao refugio deles. - Só preciso que

dê a ordem e eu reunirei os outros.

– Não Lucaar. - Não é o momento adequado. - Ram respondeu. - Mas

quando chegar a hora, eu vou cortar a cabeça dele. - Você pode ter certeza.

Page 22: St. Peter's Village

Virando as costas para a floresta, vestindo trajes negros, Ram e Lucaar

retornaram à aldeia secreta.

O mesmo silêncio avassalador de quando ele pisou pela primeira vez em

Santo Pedro ainda pairava sob as tochas acesas.

Com um aceno de cabeça e um olhar que dava arrepios na espinha, as luzes

se apagaram e Santo Pedro ficou completamente escura.

Page 23: St. Peter's Village

ALDEIA de SANTO PEDRO

Água

Conhecendo uma nova historia

3

Seus olhos se abriram antes do relógio tocar, como costumava

acontecer na sua antiga casa. Mas esta era uma vida nova, e ela não

fazia ideia de como poderia vive-la, não depois da morte dos meus

pais.

Ficou olhando para o teto do quarto novo, que ate pouco tempo era

seu antigo quarto da casa onde ela passava suas férias. O teto tinha

uma cor em tom pastel muito clara. Olhou para a lâmpada do teto

estreitando os olhos para poder ver os feches de luz que afluíam em

varias cores e em diferentes direções.

Tomou coragem e jogou o pé pra fora da cama, depois o outro e se

levantou. Penteando os cabelos, sentiu o cheiro do café da manha

Page 24: St. Peter's Village

que vó Augusta preparava lá em baixo, na cozinha. O cheiro a

animou e ela desceu o mais rápido que pode a fim de pegar os pães

ainda quentinhos.

- Vó, isso aqui esta uma delicia. – Ela disse. - Anja ainda não chegou?

- Ainda não querida, mas ela deve estar chegando. Respondeu a avó

dela. - Você levantou muito cedo, bem antes do alarme tocar,

Toc- toc. - Deve ser ela lá fora.

Dina levantou da cadeira num pulo e correu para abrir a porta

encontrando a amiga por trás dela. Anja usava saia cor de rosa claro

e uma blusa branca marcando bem a cintura, tênis rasteiros para

combinar.

Ela passou os olhos pelo meu visual despojado bem informal que

Dina usava composto de bermuda jeans, blusa baby look e tênis de

academia.

- Eu só me pergunto por que de tanto drama ontem. Disse Anja. - Se

não estava a fim de assistir a missa era só dizer.

- Bom dia Angélica.

- Bom dia vó Augusta.

- O que você está falando? Dina perguntou curiosamente. – Vamos

para o canto.

- Dina, sou sua melhor amiga, certo? Ela falava junto com suas mãos

abanando na frente de Dina. - Não precisava mentir sobre seu joelho

machucado e seu amigo imaginário de ontem à noite.

- O que? Eu não menti sobre o meu... Jo-e-lho. Ela engasgou quando

olhou para baixo.

Quase entrou em estado de choque, quando lançou seu olhar

disposta provar que não havia mentido na noite passada. Engolindo

em seco o pão que mastigava, parecendo não acreditar, viu o seu

joelho absolutamente limpo, sem nenhum arranhão. Como se eu

nunca tivesse ralado no chão.

- Anja, me dê um beliscão. Ela pediu. - Bem forte.

- Você tem certeza, eu tenho a mão pesada. Respondeu Anja

ironicamente.

Page 25: St. Peter's Village

- Merda Anja! - O machucado estava aqui, eu tenho certeza disso.

- Olha aboca querida. Gritou vó Augusta da cozinha.

- Dina, eu sei como são os machucados, eu já me machuquei muitas

vezes, principalmente quando jogava queimado com os garotos da

rua, e posso garantir que você não se machucou. Anja não parava de

tagarelar. - Não da forma que você estava mancando ontem na

igreja.

- Eu não sou mentirosa Anja, acredite em mim, por favor, Eu caí na

rua quando estava correndo. - Escorreguei e quando estava

choramingando no chão, Richard apareceu e limpou meu machucado,

você mesma viu o pano, está lá em cima, no meu quarto.

Anja parecendo não acreditar na amiga olhou para a cozinha - É

melhor nós conversarmos sobre isso depois Dina, o cheiro está

maravilhoso, sua avó fez pães de batata?

- Fez sim, vamos pra cozinha.

Observando Anja triturar freneticamente os pães na boca, Dina não

parava de olhar para meu joelho, ela ainda não acreditava que aquela

ferida enorme estava completamente curada. Decidiu por si mesma

que não tocaria mais no assunto com ninguém ate descobrir o que

realmente havia acontecido.

Cadernos na mão e pão de batata na mochila, elas partiram rumo a

escola. Dina não estava nem um pouco ansiosa para conhecer os

outros alunos da classe, nem mesmo o professor ou professora.

Anja não parava de tagarelar sobre a igreja e sobre como ela tinha

vontade de ser uma freira.

- Eu acho que essa ideia de ser freira é uma maluquice. Comentou.

- Pois pra mim não. Respondeu Anja.

- Como isso começou? Não acredito que você teve essa ideia sozinha.

Eu não acho que a vida das freiras seja muito emocionante.

- Eu gosto de Deus, e se eu for freira vou ficar mais perto de Deus.

Anja morava com os pais na pequena cidade, desde que nasceu e, os

pais dela sempre foram moradores daqui.

Page 26: St. Peter's Village

Dina nunca teve contato muito próximo com eles, por que ela só

andava na companhia de Anja quando estava passando férias.

Mas, sempre achou os pais dela um pouco esquizitos, alias todos na

cidade eram esquizitos para ela.

Os pais de Anja se casaram quando eram muito jovens, o que era

outra esquisitice da cidade, parece que todo mundo aqui se casa

cedo. Porém os pais de Anja não conseguiram ter filhos ao longo de

anos depois de casados. A mãe de Anja engravidou por acaso quando

eles haviam passado dos 40 anos de idade, depois da época dos

milagres.

“Minha avó falou que há muitos anos, as pessoas da cidade de uma

hora para outra começaram misteriosamente a ter suas doenças

curadas” ela pensou, “e mulheres que antes não poderiam ter filhos

começaram a engravidar já um uma idade avançada”.

- O que você vai fazer depois da escola? Perguntou Anja

- Consulta com psicólogo. Respondeu.

- Que sorte a sua né? Anja arrumava os cabelos enquanto falava.

- Minha avó acha que eu devo fazer algumas sessões de analise para

não me tornar uma traumatizada ou uma suicida no futuro.

Anja riu da piada retórica de Dina - Eu vou ajudar minha mãe com o

bordado e depois vou na igreja ajudar o padre com os preparativos

para a grande festa.

- Vamos ter uma festa? Ela perguntei surpresa.

- Claro que vamos, vai me dizer que você não sabia da festa do

Solstício. - Toda a cidade espera por essa festa, que acontece todo

ano em julho, principalmente depois que os milagres começaram a

acontecer.

Como toda cidade tinha um santo, essa não seria diferente. Dina

Ficou muito curiosa pra saber o que era essa tal festa do solstício.

Como ela só passava poucos dias das férias de dezembro, não

conhecia as outras tradições festivas da cidade durante resto do ano.

O caminho da escola até a casa foi tranquilo, Anja comendo o que

sobrou dos pães não pôde dizer uma só palavra, o que era difícil para

Page 27: St. Peter's Village

ela. Comer e falar ainda eram exatamente as duas coisas que ela não

conseguia fazer juntas.

Ela deixou Anja na porta de casa e continuou andando, a casa dela

ficava poucos metros adiante. Quando finalmente chegou, parou

alguns segundos na frente da sua casa e ficou pensando. “Como eu

irei levar a vida daqui para frente”, pensou. Então pôs a mão na

maçaneta, abriu a porta e sumiu atrás dela.

***

Ram caminhava todas as manhas pelas estreitas ruas da aldeia, ele

sempre gostou de controlar e saber o que as pessoas estavam

fazendo. Mesmo com tão pouca idade, Ram já pensava como um

homem. Até então, garoto magrelo e fraco havia se tornado o mais

forte dentre os irmãos. Muito hábil com as espadas e na luta corpo a

corpo, ele comandava um grande grupo que habitava a aldeia. Seu

clã.

Santo Pedro era uma aldeia secreta que existia bem no meio da

floresta vizinha à cidade. Não podia ser vista pelo lado de fora por

que não existia uma passagem de entrada, somente quem a

conheceu e seus habitantes sabiam como entrar e sair dela.

Haviam pequenas casas, bem construídas, algumas em cima das

arvores e outras em suas raízes. Não havia energia elétrica e a

iluminação era feita através de fogo, tochas e lamparinas. A água era

cuidadosamente conduzida por bambus se assemelhando muito com

o encanamento nas cidades.

A casa principal, também a mais bonita, era a casa de Ram que por

algum tempo morou com seus pais e irmãos enquanto eram crianças.

Mas seus pais morreram e somente Ram morava na casa.

A aldeia contava com grande numero de cavalos que eram criados

pelos próprios moradores. Belos animais, eram os verdadeiros amigos

de todos que ali moravam. Cada um tinha o seu próprio cavalo e

Tobruk, era o verdadeiro destaque entre eles.

Trazido da Líbia de barco com meses de nascido, o cavalo recebeu o

mesmo nome de sua cidade natal. Sendo da raça Berbere, uma das

Page 28: St. Peter's Village

mais antigas do mundo. Tobruk era gracioso, completamente negro,

orelhas medianas, pernas compridas e muito fortes e uma crina

muito abundante. Seu temperamento fazia jus a sua beleza, forte

como a de seu dono, o único que montava em Tobruk era Ram.

***

- O verdadeiro dia da minha morte foi quando que ele me fez beber

esse veneno. Falou Ric com verdadeiro ódio nas suas palavras

enquanto bebia água do cantil. - Por causa desse veneno eu não

posso ir para onde eu quero.

- O que você quer? Perguntou Edie a seu irmão mais novo.

- Eu quero minha liberdade. Ele respondeu. - Eu gostaria de sair para

conhecer o mundo ou ao menos sair dessa floresta amaldiçoada,

existe uma vida lá fora para ser vivida, por mim e por você, Edie.

- Nossa vida está aqui, temos tudo o que precisamos e somos livres

pra fazer o que quisermos.

- Isso não é vida, irmão. Ric replicou novamente. - Isso é uma morte,

lenta e triste, que vivemos, nós sequer podemos morrer.

Edie abaixou a cabeça enquanto escutava seu irmão dizer mais e

mais palavras de como a vida era ruim na floresta. Edie abriu mão da

vida na casa grande em Santo Pedro, para cuidar de Ric e os outros

que renegaram fidelidade ao irmão mais velho Ram.

Ric sempre foi o irmão mais impaciente dos três e o mais apaixonado

pela vida, mesmo com o tempo passado, ele não perdeu a

curiosidade de explorar a vida, não importava onde ele estava.

Os outros que partilhavam o mesmo acampamento constantemente

presenciavam as discussões entre Ric e Edie, mas nunca interferiram,

nem mesmo quando os irmãos ameaçavam brigar fisicamente. Eles

apenas ficavam atentos para que o outro grupo que acompanha Ram

não ficasse sabendo o local exato do acampamento.

A floresta era muito grande e podia esconder uma pessoa da outra a

um metro de distancia sendo impossível acha-la. Parecia que a

floresta conspirava a favor dos foragidos, ela ajudava a esconder

Page 29: St. Peter's Village

quem não queria ser achado e o acampamento apesar de próximo

aos limites da cidade ficava invisível assim como Santo Pedro.

Levou muito tempo para o grupo de desertores, acertarem o local do

acampamento sem se perder. A única referencia deles era o caminho

das águas da fonte que passava por baixo de uma ponte feita de

madeira e corda. A água que passava por baixo dessa ponte era a

mais pura e cristalina água que eles jamais puderam ter visto, por

mais que fosse jogada terra escura a água nunca ficava suja, era

pura magia.

Junto a essas águas cristalinas, estava o grande segredo da região.

As águas vinham da fonte milagrosa que apenas um homem foi capaz

de encontrar. Esse homem que largou sua vida na cidade para se

dedicar completamente na busca dessa água milagrosa, que as

lendas tanto mencionavam.

Pedro era um professor de biologia na principal escola da pequena

cidade. Ele frequentava a igreja todos os domingos e fazia questão de

ajudar a todos dando aulas de reforço na pastoral da igreja. Pedro

era querido por todos, apesar de ninguém conhecer seu passado

antes dele se estabelecer na cidade.

Foi coversando com os moradores mais antigos durante algumas

reuniões na pastoral que Pedro tomou conhecimento sobre a lenda da

água milagrosa.

O clã que seguia Ric e Edie, embora não fosse tão grande como do

irmão mais velho, era um clã com hábitos diferentes e mais

tolerantes.

Composto de rapazes e meninos, eles foram raptados da cidade ainda

muito jovens e trazidos para o meio da floresta. Alguns sequer

lembravam de suas famílias. Tudo que lhes fora imposto era que eles

deveriam aceitar a nova vida.

***

Dina subiu correndo as escadas se atirando em baixo da ducha, se é

que ela podia chamar de ducha, as poucas gotas de água saindo pelo

Page 30: St. Peter's Village

chuveiro. Calçou seus tênis e pegou o cardigan, já que fazia frio no

final de todas as tardes.

- Vó? Ela gritou. - Vóóóóóóóóó?

Ela caminhou a passos lentos, com um pequeno sorriso em seu rosto.

- Sim querida? Respondeu sua avó.

- Estou indo para outra sessão de analise, na volta vou parar na

praça para conversar com as garotas. Saiu em disparada em direção

à porta.

- Tudo bem querida, mande lembranças à mãe de Angélica se passar

na casa dela e, Diana...

Ela parou subitamente e girou nos seus calcanhares para ver o que

sua avó queria dizer. - Sim vó.

- Eu ti amo querida.

Imediatamente ela retornou pelo mesmo caminho em direção

contrária até chegar na frente da sua avó. Ela se banhou nos braços

frágeis, mas muito acolhedores de vó Augusta. Naquele momento ela

não desejava sair nunca mais daquele abraço e nada mais importava.

- Eu também ti amo vovó. Disse com uma lagrima nos olhos.

Sentada num divã velho e desconfortável, ela observava o psicólogo

que por sua vez a observava de volta. Era estranho para ela, vê-lo

usar aqueles óculos com duas enormes lentes grossas. “Com certeza

o próximo grau dele será uma cão guia e uma bengala”. Ela ficou

pensando.

- O senhor não vai me perguntar nada? Não vai querer saber da

minha vida? Perguntou enquanto ele bebia um gole de alguma coisa

da garrafa que não saia do lado dele.

- Eu ate posso perguntar se você parar de me chamar de senhor,

vamos acabar com as formalidades, apenas chame-me de Paulo.

- OK, vamos acabar com as formalidades, Paulo. Respondendo com a

mesma cara sarcástica de volta.

Deitando no divã ela olhou para o teto sem nenhum remorso por ter

colocado os tênis em cima do móvel.

Page 31: St. Peter's Village

- Então, Paulo, o que vamos fazer hoje? Quer que eu fale da minha

infância ou como eu era feliz quando morava com meus pais quando

eles eram vivos?

Bebendo mais uma golada do liquido que parecia ser bebida alcoólica,

ele a fitou com aquelas lentes grossas. Ela não mostrou intimidação

mas ficou desconfiada que ele pudesse contar para sua avó que ela

não estava cooperando durante as sessões de analise. Tudo que ela

não queria nesse momento seria aborrecer ou magoar sua avó.

- Poderia me falar mais um pouco da historia do tal Pedro. Eu fiquei

interessada. Ela fingiu estar interessada.

Ele desamarrou a cara e ela quase pode ver um pequeno sorriso em

seus lábios. - Certo, vou lhe falar da grande lenda da nossa cidade,

afinal o Solstício vai chegar em algumas semanas.

Pedro e o grupo de pesquisadores passaram meses dentro da floresta

procurando a água milagrosa, e eles conseguiram achar a fonte onde

brotava uma nascente de uma água muito cristalina. Para poder

estudar mais sobre as propriedades daquela água e os possíveis

benefícios, eles construíram uma pequena aldeia perto da fonte. Mas

eles não tinham certeza se aquela era a água milagrosa.

Um dos homens que acompanhavam Pedro na expedição, tropeçou em

umas das pedras no local da fonte. Ele caiu por sobre seu quadril e

desmaiou de tanta dor, ali mesmo na beira das águas da fonte. Por dois

dias ninguém sabia onde ele estava, acharam até que ele pudesse ter

retornado sozinho para a cidade.

- Nossa, ele morreu? Ela perguntou.

Não, incrivelmente o homem não morreu. Professor Pedro que era

muito religioso, orou e implorou a Deus que o homem continuasse vivo

para que pudessem voltar a tempo à cidade. E deu a água da fonte para

ele beber. Por dias eles ficaram na pequena cidade construída bebendo

e dando de beber a água da fonte. Pedro continuava a orar a Deus

confiante que aquela água seria a água milagrosa. Passando duas

semanas, o homem com o quadril quebrado levantou e andou.

- Meu Deus, a água o curou? Isso é realmente um milagre.

Todos acharam realmente que água tinha curado o homem, tudo isso

graças às orações de Pedro, que a partir daquele momento era chamado

de santo. E o local ficou conhecido pelo nome do professor santo que fez

a água curar as doenças. A pequena aldeia foi batizada de Santo Pedro,

Page 32: St. Peter's Village

assim como a fonte da água milagrosa, que agora se chamava fonte de

Santo Pedro.

“Agora sim, fazia algum sentido a lenda que o pessoal esquisito da

cidade tanto falava”. Ela pensou.

- Então a festa do solstício é uma comemoração a esse São Pedro,

digo Santo Pedro?

- Sim em parte. Ele falou orgulhoso de si bebendo mais um gole da

garrafa. – Foi na mesma ocasião.

- Paulo, você me disse na sessão passada que só retornaram para

cidade apenas dois homens certo? E também me disse que quem

bebesse da água ficaria escravo dela? Logo eu concluo que eles

voltaram pra aldeia dentro da floresta ou...

- Eles morreram Diana é exatamente isso que você está pensando,

eles morreram quando chegaram aqui e o restante dos homens da

expedição também morreu no retorno pra cidade. Ele acomodava os

óculos no rosto enquanto falava. - Pedro morreu no dia seguinte que

retornou a cidade e quanto a Juan... Viveu muito.

- Mas ele ainda mora aqui na cidade? Perguntou ainda com mais

curiosidade.

- Infelizmente não Diana. Ele morreu há alguns anos. Foi uma

tragédia familiar. Uma ventania fez com que parte da casa dele

desmoronasse sobre as cabeças da família. Os próprios empregados

fizeram questão de enterrar os corpos. Pessoas muito leais.

Ela saiu do consultório muito intrigada com a historia que tinha acabo

de ouvir. Uma casa inteira havia desmoronado sobre as cabeças dos

moradores. A partir dali, ela começou a ter uma admiração pela

historia, mas não era a história de Santo Pedro, era a historia da

família. Ela queria saber quem eram os moradores da casa e onde

ficava essa casa.

Enquanto pensava em como eu iria conseguir todas as informações

de que precisava sobre a casa desmoronada e a família que morreu

nela, desceu até a única praça onde todos os adolescentes da cidade

costumavam se aglomerar.

***

Page 33: St. Peter's Village

Ric adorava passear a cavalo pela floresta. Longas horas passavam

despercebidas quando os dois, correndo entre as arvores, pareciam

ser apenas um só. Ric conduzia seu cavalo até o limite mais alto da

floresta, onde podia ver o mar e o porto da cidade logo abaixo.

Desmontando, Ric passava longos minutos observando as nuvens que

pairavam sobre “Céu”, seu cavalo.

Céu, não parecia grande coisa, perto dos outros cavalos, mas sua

lealdade com Ric era incontestável. Céu parecia ler os pensamentos

de Ric e entendia o que ele queria somente com um aceno de cabeça.

Na maioria das vezes Céu não parecia ser cavalo.

- Ate que enfim você apareceu, estou morrendo de fome. Perguntou

Edie acendendo uma discreta fogueira. - Trouxe alguma coisa para a

janta?

- Acho que me esqueci de caçar na volta para o refugio. Respondeu

Ric um pouco sem graça por ter voltado de mãos vazias da galopada

com Céu.

- Você sabe que não vivemos somente de água e frutas. Como pode

esquecer, você não tem fome?

Edie muito irritado pegou um porco do mato que os outros habitantes

do refugio conseguiram abater na floresta.

- Esse ai parece que vai ficar delicioso, certo Edie? Espero que não

demore muito a assar.

- Por que você não come sonhos? Já que fica tanto tempo sonhando

acordado, podia ao menos se alimentar deles, isso pouparia menos

trabalho para mim.

Ric ficou sorrindo pelo canto da boca enquanto sentava-se juntos aos

outros ao redor da fogueira. Todos os dias naquela mesma hora,

conforme o refugio escurecia, o resto do grupo do clã de Ric se reunia

em volta do fogo.

As chamas tremeluziam em cores diferentes a cada labareda, os

estalos que a madeira fazia enquanto o fogo a queimava eram os

únicos sons que se podia ouvir no local. Os rostos dos homens

iluminados pela luz do fogo mostravam uma nostalgia quase

Page 34: St. Peter's Village

imperceptível. Até que a carne estivesse completamente assada e

pronta para comer ninguém falava nada.

Longe dali, o mesmo ritual acontecia em Santo Pedro. Uma enorme

fogueira na travessa principal da aldeia reunia o clã de Ram.

Todos estavam sentados em volta dela olhando para as chamas. A

nostalgia avassaladora era mutua para todos, dentro da aldeia e no

refugio fora dela.

- A carne esta pronta Ric, vamos repartir, corte os pedaços. Edie

falou ao seu irmão quebrando o silencio da noite que acabava de

baixar sobre a floresta.

Com um movimento gracioso e forte, Ric levantou a sua espada e

desferiu o primeiro golpe sobre a carne queimada pelo fogo, partindo

o corpo em dois pedaços.

O corpo de Ric, iluminado pela luz amarela das chamas, era digno de

uma pintura. Com seus músculos bem desenhados, se harmonizavam

perfeitamente dentro da calça preta, única peça de roupa que ele

vestia.

O calor da proximidade da fogueira fazia o corpo de Ric suar,

mostrando um tipo de brilho especial combinado com aquela luz

amarelada. Terminando de cortar o porco do mato em vários

pedaços, Ric deixou Edie fazer a partilha entre os demais membros

do clã.

- Será que eles ainda se lembram de nós, Edie? Não passaram tantos

anos assim depois de saímos da cidade. Perguntou Ric enquanto

mastigava a carne.

- Pode ser que sim, tenho minhas duvidas. Nosso pai disse que

provavelmente não deveriam procurar a gente depois que partimos,

mas eu nunca perguntei por que.

- Eu não me lembro dos rostos das pessoas que moravam na cidade,

Edie, não lembro os nomes das pessoas. Eu era muito novo para

registrar algo na minha memória. - Você se lembra de alguma coisa?

Diga alguma coisa de mim, como eu era em nossa casa na cidade.

- Ric, você era um garoto muito impertinente.

Vivia atormentando Ram e discordando de tudo que ele fazia. Não me

admira que ele tentasse ti matar cada vez que tinha oportunidade. Só

Page 35: St. Peter's Village

por que ele era mais fraco que você, não lhe dava o direito de ter coberto

os cabelos dele com e mel e depois jogado penas da galinha preferida de

mamãe em cima dele.

Demorou três dias para ele retirar por completo todas aquelas penas e o

mel. Pior foi papai ter perseguido nós três com chicote, foram três dias

dormindo escondidos com os cavalos, malditos três dias.

Nosso pai só desistiu de nos bater por que mamãe implorou que ele não

fizesse. Ela sempre tirava a gente das enrascadas causadas por você.

- fale da mamãe Edie, eu não consigo me lembrar dela assim como

você.

Ric, nossa mãe era um anjo, com cabelos cor de fogo, tipo esse aqui da

fogueira. Os olhos dela eram da cor dos seus e dos meus, verdes assim

como a cor da floresta. A pele dela era branca e pelo que eu me lembre

tinhas sardas no rosto dela. Ela me dizia que o rosto dela era como

arroz doce com canela, sardas na pele branca.

Nossa mãe fazia todos os tipos de doces que a gente gostava, e ela fazia

um pão de batata delicioso...

- Eu me lembro das sardas dela, eu acho que consigo me lembrar

disso. Edie eu lembro dos cabelos dela também eram compridos.

- Ainda bem que você consegue lembrar dela Ric. Nossa mãe não

ficaria feliz, onde quer que ela esteja agora, se soubesse que os filhos

não lembram mais dela.

- Eu fico me perguntando se ele ainda se lembra dela, Edie.

Page 36: St. Peter's Village

ALDEIA de SANTO PEDRO

Água

A casa

4

Quando ela abriu os olhos pela manha, estava completamente

determinada a conhecer mais sobre a história da casa desmoronada e

quem morou nela antes da tragédia. Curiosamente Dina criou uma

completa fascinação pela historia que Paulo havia lhe contado em seu

consultório durante a analise.

Alem da curiosidade, ela tinha muita pena das pessoas que morreram

soterradas, nem ao menos tiveram um enterro digno, já que os próprios

empregados se propuseram a fazer. “Foi muito triste”, pensou em como

deve ter sido esse enterro e se ao menos teve um velório.

Desceu as escadas, e não encontrou sua avó na cozinha e em nenhum

outro cômodo da casa. Provavelmente ela já deveria ter saído bem antes

Page 37: St. Peter's Village

do relógio tocar. De certa pensou que era o dia da feira, sendo franca,

era a única feira que acontecia na cidade.

Não era uma feira comum, do tipo que acontece nas cidades mais

modernas onde as pessoas encontram somente frutas, legumes, comida

em geral e com pessoas chamando aos gritos os fregueses para frente

das suas barracas. Na cidade grande, a feira também tem um cheiro

forte que sempre a fez enjoar, quando ela passava por perto.

Mas lá era diferente, a feira da pequena cidade era um evento semanal,

onde se podia encontrar de tudo. Começava antes do galo cantar, e

acabava com o cair da noite. Artesãos de cidades vizinhas traziam para

vender seus trabalhos manuais, donos de sítios locais exibiam suas

frutas e legumes exóticos. Queijos, manteigas, carnes e vinhos, de todas

as regiões próximas eram encontrados aqui, assim como a arte local.

Mas sua vó não tinha esquecido dela, deixou pronto o café da manha

com leite e chocolate, e uma cesta com pãezinhos ainda quentes. Dina

mordeu alguns e guardou outros para escola, certamente ela não

esqueceria de Anja, caso contrario sua mente iria ser torturada do

começo ou fim da aula.

Arrumou-se rapidamente. Vestiu seu jeans surrado combinando com

uma mini blusa em tom pastel, ela nunca gostou de cores fortes, calçou

seus tênis preferidos e não esquecendo do bloco com suas anotações

voou através das escadas.

Descer as escadas correndo, era um hábito infantil que ela não pretendia

largar tão cedo.

Encontrando Anja pelo caminho seguiram juntas em direção à escola que

não ficava muito longe. Tudo lá ficava perto, absolutamente não existia a

necessidade de fazer grandes caminhadas para qualquer lugar que fosse.

A cada duas ou três quadras sempre se chegava a algum lugar.

Na porta da escola os alunos estavam aglomerados em frente ao portão

comendo doces e falando sobre diversos assuntos, a vida alheia parecia

ser o foco principal das conversas entre eles.

O som da campainha tocou e uma correria frenética coordenada, seguiu

em diferentes direções, cada aluno entrava em sua sala correspondente.

Sentando-se ao lado de Anja como de costume enquanto a professora

tentava dar bom dia aos alunos ainda agitados.

Page 38: St. Peter's Village

- Dina, ontem à noite lá na praça, você quase não falou. Perguntou Anja

curiosamente. - Conte-me o que quer que esteva na sua cabeça, não

seja egoísta.

- Eu não estava pensando em nada de mais. Ela respondeu. - Só não

tinha assunto para falar com o pessoal.

- Qual é, sou sua amiga, lembra? - Claro que você estava tramando

alguma coisa ai na sua cabeça. Anja replicou de volta. -A propósito,

trouxe pão de batata da vó Augusta né?

- Claro, estão aqui comigo. Dina respondeu com um sorriso. - Eu jamais

esqueceria de você.

- E eu jamais deixaria você esquecer de mim Dina. As duas Sorriam

juntas.

A ultima pessoa que entrou na sala de aula, foi uma garota de estatura

mediana, aparentemente com a mesma idade que Anja e Dina. Ela tinha

um ar de antipatia e praticamente ninguém a chamou para que sentasse

ao seu lado.

- LORENA. Falou a professora. - Sente-se por favor, eu gostaria de

começar a minha aula.

Dando um suspiro debochado, ela se dirigiu para o fundo da sala onde

haviam alguns lugares vazios. Lorena era muito vaidosa, trajava um

vestido cumprido até a metade das coxas seguindo mais embaixo, uma

sapatilha combinando a mesma cor.

Seus cabelos, insuportavelmente negros como seus olhos, estavam

presos em um elegante rabo de cavalo. Anja e Dina não ficaram

reparando muito mais nela.

Ainda com um sorriso nos lábios, as amigas baixaram as cabeças para

escrever os capítulos do livro que iriam cair na prova. Estudar nesta

escola, era um pouco mais fácil que as outras escolas onde Dina havia

estudado.

Olhando pelo canto dos olhos ela reparou Anja escrevendo com atenção

profunda e a cabeça mergulhada em seu caderno, soltando um pequeno

suspiro e pensou em Richard.

***

Page 39: St. Peter's Village

Ric e Edie estavam galopando em fuga floresta adentro. O som dos

cascos se enterrando no solo era como um pulsar constante de coração

batendo em ritmo acelerado. Driblando os galhos e troncos das arvores

eles se afastavam cada vez mais de seus perseguidores. Até que a

vegetação se fechou e não era mais possível cavalgar.

O clã de Ram se aproximou e encurralou os dois irmãos, que se puseram

a frente de seus cavalos com suas espadas em punho. Céu bufando com

seus olhos arregalados, ameaçando atacar quem se aproximasse. Lucaar

foi o primeiro a levantar a espada contra Ric enquanto Edie dava um

salto lateral atacando o outro membro do clã.

Luccar era muito forte, e batia com sua espada tentando cortar algum

membro de Ric, mas Ric sabia manejar sua espada muito bem, bloqueou

todos os golpes com a sua lamina contra atacou Luccar em golpes tão

rápidos que somente uma pessoa muito bem treinada poderia fazer.

- Ele mandou você no lugar dele. Perguntou Ric batendo com sua espada

sobre o ombro direito de Luccar.

- Ele não precisa me mandar vir aqui matar você. Respondeu Lucaar com

agressividade. - Eu venho por vontade própria e com muito bom gosto.

- Então você é um tolo se acha que pode comigo.- Disse Ric. - A

propósito, como vai a sua orelha, ou o que restou dela ?

Com ódio nos olhos, Lucaar estreitou as vistas e lembrou do ultimo

combate que ele e Ric haviam travado algum tempo atrás. Ric cortou um

pedaço da orelha de Luccar com sua espada. Quase não dava para

perceber, por que o cabelo de Luccar era terrivelmente liso e comprido

até os ombros.

Edie lutava contra dois adversários ao mesmo tempo. Deste pequeno ele

sempre foi muito hábil. Edie usava duas espadas ao mesmo tempo, uma

em cada mão. Seus oponentes, apesar de estarem em maior numero,

não estavam conseguindo dar conta de Edie e foram facilmente

encurralados contra as pedras. Um deles teve seu ombro cortado por

uma das laminas de Edie, que fez com que desistissem da luta.

Lucaar, duelando com Ric, viu que estava sozinho e agora seriam os dois

irmãos contra ele. Com um salto para trás aterrissando no alto de uma

pedra apontando sua espada ainda com ódio no olhar.

Luccar também recuou. - Isso não termina aqui Ric.

Page 40: St. Peter's Village

- Pode apostar que não Lucaar. Se aproximando, Edie pode perceber que

Ric havia machucado o joelho.

- Vamos sair daqui, disse Edie. - Eles podem voltar com maior numero.

- Eu não tenho medo deles Edie, sempre estarei preparado a qualquer

hora que eles decidirem aparecer.

- Que seja, vamos embora diabos.

Montando em seus cavalos os irmãos se afastaram do local da luta, tudo

parecia calmo naquele momento. A única coisa que se podia escutar

eram os pássaros nos galhos das arvores. A vida na floresta naquela

hora da manhã era muito diversificada e muitos pássaros costumavam

cantar ali.

Acariciando Céu durante o galope, Ric reparou no seu joelho machucado

e imediatamente se lembrou de Diana. Ele jamais esqueceria dela, dos

olhos e os cabelos castanhos que ela tinha, tudo estava bem registrado

em sua mente.

Foi então que Ric decidiu que iria tornar a vê-la, ele decidira sair

novamente da floresta e tentar encontra-la. Mas seu único pensamento

era, onde ele iria acha-la. A cidade fora da floresta não era muito grande

mas seria um desafio achar Diana.

Esperando anoitecer, Ric deixou Céu esperando nas margens da floresta,

em um local discreto com mato alto. Ninguém poderia ver o cavalo ali.

Foi caminhando a passos cautelosos pelas ruas da cidade. Alguns

minutos depois ele se aproximou da igreja onde havia deixado Diana

mancando pela ultima vez. Ele tinha esperança que talvez ela pudesse

passar pelo mesmo caminho novamente.

Passeando as vistas procurando um local adequado, ele percebeu que na

lateral da igreja estava uma pequena construção ainda não terminada.

Não havia iluminação e Ric achou que seria um local bem apropriado

para esperar Diana passar.

Sentou em alguns montes de pedra de brita e ficou observando tudo o

que estava em sua volta. Ele achou o local familiar, ele já havia passado

por aquela rua antes, muito antes de encontrar Diana, muito antes de

aquela construção começar.

Ele podia lembrar daquela igreja, mas não conseguia assimilar em que

tempo ele passou por ali ou com quem ele passou por ali. Tudo aquilo

deixava Ric muito confuso então ele decidiu só pensar em Diana.

Page 41: St. Peter's Village

Duas horas se passaram e Ric acabou adormecendo ali mesmo onde teve

um sonho relâmpago com Diana.

“Os dois estavam galopando por uma grama muito verde. Ric galopava em

Céu e Diana galopava em outro cavalo. O passeio romântico dos dois não

durou muito tempo, pois um homem de capa preta e arco e flecha nas mãos

apareceu como um passe de mágica, disparando flechas na direção de Ric.”

De subido, Ric despertou do pequeno cochilo com as batidas do sino da

igreja anunciando o final da missa. De repente a rua que antes estava

deserta, agora circulavam pessoas por toda parte. Ric observou famílias

saindo da igreja, crianças de mãos dadas com suas mães, casal de

namorados voltando para casa. Toda uma vida se passando na sua

frente e foi ali, no meio dos garotos e garotas que ele pode ver Diana.

Seu coração acelerou tão rápido que ele pode senti-lo na garganta. Uma

euforia incontrolável tomou conta de todo seu corpo. Diana estava

passando exatamente na calçada da construção, onde Ric estava

escondido. Ele não pode fazer qualquer alarde por que Diana estava na

companhia de Anja e sua avó.

Decidiu então que iria segui-la. Ric precisava saber onde Diana morava,

ele foi se afastando cada vez mais e mais da floresta, ele jamais tinha

passado tanto tempo longe. À medida que elas caminhavam Ric

observava Diana falar e gesticular com os braços.

Cauteloso e paciente, Ric parou a poucos metros da casa de Diana. Anja

não entrou se despediu ali mesmo na porta e desceu rua abaixo. Elas

bateram a porta da entrada e a luz no interior do andar de baixo da casa

se ascendeu. Levou alguns minutos para que as luzes se apagassem e a

casa ficasse em silencio.

Ric olhou a casa por todos os ângulos do lado de fora e mais uma vez

sua respiração parou quando Diana abriu a janela do andar de cima. Ele

soube na mesma hora que ali era o quarto onde ela dormia. Ela ficou

olhando as ruas do alto de sua janela, cabelos balançando por causa do

vento.

Parecia que os pensamentos de Diana iam tão longe quanto o vento

podia ir. Ela olhava para frente e cada vez que virava a cabeça o vento

moldava seus cabelos de forma diferente. Lá de baixo Ric contemplava a

vista da garota que estava na janela, era uma visão que ele pensou que

talvez guardaria pelo resto de sua vida.

Page 42: St. Peter's Village

Não aguentando a tentação de ver Diana sozinha na janela, ele avançou

andando até parar na frente da casa, onde ela poderia vê-lo.

Foi exatamente isso que aconteceu, ela olhou para baixo e avistou

Richard. Os olhos dela se arregalaram no mesmo instante em que

reconheceu o rapaz. Fazendo sinal com as mãos ela pediu que ele

esperasse ate ela descer.

-Meu Deus, falando baixinho, será que estou vendo coisas, aquele ali é o

Ric ? não pode ser ... Vou me beliscar... Não, vou descer agora e falar

com ele.

Pegou o moletom e desceu tão rápido que quase caiu da escada. Sua avó

já estava no quarto, provavelmente dormindo, e Dina pensou onde ela

arranjava tanto sono depois de ter dormido na igreja enquanto o padre

falava.

Ajeitou meu shortinho e vestiu o moletom ali mesmo, por cima da

camiseta antes de abrir a porta encontrando Ric parado atrás dela.

Prendendo a respiração enquanto ele lhe dava boa noite e, foi ai que

derramou sobre ele uma serie de perguntas sobre, por que ele sumiu no

ultimo encontro, ou por que ele não apareceu no dia seguinte ou se ele

sabia explicar por que o seu joelho se curou tão rapidamente.

- Diana, Você gostaria de passear?

De súbito aceitou a proposta de Ric e bateu cuidadosamente a porta

atrás dela para que sua vó não notasse sua ausência.

Ele estendeu uma das mãos em sua direção, a principio ficou um pouco

insegura mas passou no momento seguinte que sentiu o calor da mão

dele. Naquele momento descartou qualquer possibilidade de Richard ser

um fantasma ou vampiro por que fantasmas não pegam nas mãos e

vampiros são frios, pelo menos era assim que ela lia nos livros de

fantasia.

Seguiram andando tranquilamente e ela não deu conta que ele a estava

conduzindo para perto da entrada da floresta. Pararam na frente de um

antigo chafariz onde não brotava absolutamente nenhuma água.

Richard ficou parado olhando para o pequeno chafariz e com uma voz

rouca disse a ela. - Eu costumava brincar aqui quando era pequeno,

disso eu me lembro bem.

- Richard você brincou aqui? Deve ter ficado todo empoeirado e sujo.

Page 43: St. Peter's Village

- Diana, pode me chamar de Ric se estiver tudo bem pra você.

- Sem problemas, e você pode me chamar de Dina. Adeus às

formalidades.

Com um sorriso travesso no olhar, ele apontou onde poderiam ficar

sentados. Pegou um pouco de ar e continuou falando sobre o chafariz.

- Dina, quando eu brincava aqui, havia muita água. As crianças da cidade

vinham aqui pra tomar banho de chafariz. Era muito bom.

- Você tomava banho de chafariz aqui quando era criança? Ric você esta

me surpreendendo. E o que mais?

- Eu não me lembro de muita coisa, sai da cidade ainda pequeno e não

lembro claramente.

No mesmo momento ela lembrou que na noite em que se conheceram,

Ric havia dito que eram vizinhos. - Você me disse que somos vizinhos

como pode me dizer que saiu da cidade? Perguntou impertinentemente.

Ric ficou um pouco abalado com a pergunta inesperada. Tentando

parecer o mais casual possível, ele colocou a mão sobre o ombro dela e a

olhou com aqueles olhos verdes encantadores, o que a fezeram

endurecer completamente.

- Eu mudei da cidade para um lugar mais isolado, mas ainda assim

continuamos vizinhos. Fale-me um pouco de você agora?

Distraída pelo toque da mão dele não percebendo que ele mudara de

assunto, Dina começou a tagarelar sobre sua vida. Falou sobre a morte

dos pais, sobre a vida com a avó e como ela estava se sentindo.

Ele a ouviu atentamente e algumas vezes, comentava coisas sobre a

cidade, da época em que ele era um garotinho. Ele também disse que

tinha um cavalo e ela ficou muito curiosa para poder conhecê-lo e Ric

combinou que um dia iria trazer Céu para passear com ela.

- Céu? Ela perguntou. - Ric o seu cavalo chama-se Céu?

- Sim, respondeu orgulhoso. - Quando ele galopa não tem limite que o

faça parar, então já que o céu é o limite, não tive ideia melhor do que

chama-lo de Céu.

Ela ficou encantada com as coisas que ele falava. Quando percebeu,

estava totalmente à vontade ao lado de Ric, tão a vontade que não deu

conta que a sua perna estava tão próxima a ponto de encostar na dele.

Page 44: St. Peter's Village

Ela podia sentir a respiração dele muito próxima de sua boca e ficou

envergonhada pois estava olhando diretamente para os lábios de Ric.

- Acho que esta ficando tarde, minha avó pode acordar e perceber que

eu saí, melhor eu voltar pra casa.

Ele acenou com a cabeça e se afastou lhe dando espaço para que ela

pudesse se levantar. Ficou ereta na frente dele com as maçãs do rosto

coradas, provavelmente ele não deve ter percebido pois a luz estava

muito fraca.

Ele se aproximou um pouco mais e pegando novamente na mão dela a

puxou para perto do seu corpo e me olhou novamente com aqueles olhos

verdes. - Vou leva-la em segurança ate sua casa.

- Tudo bem, mas eu posso ir sozinha se for algum incomodo para você.

- Você não vai sozinha, Dina, eu jamais deixaria você voltar sozinha para

onde quer que você fosse a essa hora da noite.

Concordando com a cabeça, voltaram de mãos dadas até a casa dela. No

caminho ela o fiz prometer que voltaria outras vezes e ele não negou.

Chegando na porta de casa, ele ficou olhando ate que ela estava lá

dentro. - Sã e salva Dina, como prometido. Falou cheio de sorrisos.

- Shhhhhh, minha avó pode acordar e você não vai querer conhece-la

agora à noite, quer?

- Não vamos apressar as coisas Dina.

Sorrindo para ele, pediu que esperasse um momento na porta enquanto

ela correu até a cozinha, separou alguns pães de batata, que sua vó

havia preparado e colocou num pano de prato bordado por Anja.

Quando voltou com o farnel, ele olhou com interesse em saber o que

tinha dentro. – O que tem ai?

- São pães de batata que minha vó sempre faz. Respondeu. - Para você

fazer um lanche na volta pra casa ou em casa. Tem bastante até para

dividir.

- Obrigado Dina.

Pegando o farnel das mãos dela eles se tocaram novamente e ela não

soube descrever o que sentia naquele momento. Ele abaixou a cabeça e

Page 45: St. Peter's Village

pousou um beijo molhado sobre sua testa, virou nos calcanhares e foi

embora, ela fechou a porta ainda sentindo a saliva de Ric na pele dela.

Subindo as escadas em direção ao quarto, jogou o moletom ao lado da

cama e se atirou sobre o colchão. Deitando de barriga pra acima

permaneceu com os olhos fechados. Dina estava completamente feliz

que eu havia conhecido Ric.

***

Descendo a rua, já na entrada para floresta, com um singelo assobio,

Céu apareceu logo após o chamado de Ric. Ao se aproximar, o cavalo

farejou o cheiro dos pães que Dina embrulhou para ele.

- Calmo ai amigão, isso não é para você. Sussurrou Ric, acariciando as

orelhas de Céu.

Logo após montar, os dois seguiram em direção ao refugio. Estava

escuro e não era seguro galopar. Ric ainda parecia intrigado com a

atitude de Dina em presentear pães. Ele nunca havia conhecido uma

garota que fizesse isso por ele, a grande verdade da historia de Ric, era

que ele nunca chegou tão perto assim de uma garota.

O coração de Ric batia tão forte que quase podia se comparar as batidas

do coração de Céu. Ele mal estava no meio da floresta e já pensava em

vê-la novamente. Com Dina, Ric se sentia livre e quase podia esquecer

que era um fugitivo, no meio de uma floresta. Com os olhos verdes

fechados, Ric pensava em Dina, queria estar com ela.

Céu parou subitamente e um relincho forte fez com que Ric sonhando

acordado desse conta que estava na frente de um pesadelo. A poucos

metros à frente, uma silhueta sinistra estava parada. Ric sacou sua

espada, estreitou os olhos e reconheceu de imediato a figura de um

homem montado em outro cavalo.

Ram se aproximou montado em Tobruk. Os dois irmãos ficaram se

encarando por um longo tempo, estudando um ao outro. Ram estava

vestido de preto da cabeça aos pés. Tobruk já era todo negro e os dois

juntos pareciam formar uma figura só.

- Olá Tobruk, você cresceu bastante. Falou Ric se dirigindo ao cavalo de

Ram ironizando a situação.

Page 46: St. Peter's Village

Tobruk respondeu bufando ferozmente enquanto sapateava seus cascos

na terra. Ram fez com que eles se aproximassem um pouco mais e os

cavalos estavam frente a frente, Céu e Tobruk... Ric e Ram.

- Veio me fazer uma visita maninho? Perguntou Ric ainda com muito

deboche nas palavras.

- Eu quem deveria perguntar a você, maninho, falou Ram. - O que você

fazia fora da floresta?

- Não é da sua conta.

- Claro que é da minha conta, Ram disse um pouco mais irritado. - Você

sabe muito bem que ninguém tem permissão para sair da floresta. –

Essa é a regra.

- Essa era a regra de nosso pai, respondeu Ric. - E ele não esta mais

aqui graças a você, claro.

- Não vamos começar uma discussão há essa hora, falou Ram com um

brilho sinistro nos seus olhos.

- E se eu quiser uma discussão?

- Então eu vou ter que matar você, infelizmente.

- As palavras querer e conseguir estão a um quilometro de distancia,

meu caro irmão mais velho, você sabe muito bem que eu sou difícil de

matar.

- Não me desafie garoto, estou tendo paciência com você há muitos

anos. Falou Ram se aproximando um pouco mais. - Não vou ser mais tão

paciente.

Ric levantou a espada e atentou um único golpe em direção a Ram, mas

Ram também era muito bem treinado e sacou sua espada bloqueando o

golpe de Ric. O barulho do aço das espadas fez com que os cavalos se

afastassem e ficassem inquietos.

Ram, era o irmão mais velho de Ric e aparentemente o mais forte dos

irmãos. A espada de Ram brilhava tanto quando os seus olhos. Um som

do que parecia ser uma coruja dispersou a tensão entre os dois, e

começaram a se afastar um do outro cuidadosamente.

- Hoje não haverá luta, Ric. Mas você sabe que não vai ser adiado por

muito mais tempo.

Page 47: St. Peter's Village

- Por que você não volta para a aldeia e meu deixa em paz senão eu

terei de matar você. Ric falou ironicamente com Ram.

- Você sempre foi à tristeza do nosso pai, e mesmo depois dele ter

morrido, continua sendo. Você não mudou nada, ainda é um garoto

egoísta que nunca pensou na família.

- Eu nunca precisei pensar na família, por que você já pensava por todos

nós, você que é o egoísta, Ram.

- Você matou nossa mãe. Ram, puxou as rédeas de Tobruk e caminhou

para longe de Ric lentamente sem nenhum remorso nas palavras ao

acusar o irmão.

Ric abaixou a cabeça e deixou Céu conduzir os dois até o acampamento

no refugio, onde Edie esperava ansioso pela volta do irmão. Os outros

homens do refugio se aproximaram para ver se Ric estava ferido, mas a

única ferida que Ric possuía no momento eram, as que foram feitas pelas

palavras de Ram.

- Eu não matei minha mãe Edie, você precisa acreditar em mim.

- Diabos eu não acredito. Você encontrou com ele?

- Sim, na volta pra acampamento. Ele me acusou de ter matado nossa

mãe. Mas você sabe que isso não é verdade.

- Claro que não é verdade, a culpa não foi de ninguém.

Ric sentou perto da fogueira apoiando os cotovelos sobre as coxas. Edie

sentou ao seu lado enquanto os outros se afastaram para dentro de suas

pequenas cabanas. Foi então que Edie reparou um pano estranho

bordado à mão.

- O que é isso?

- São pães que Dina me deu, você pode comer se quiser eu não tenho

fome.

Curiosamente Edie esqueceu do irmão que estava lamentando ao seu

lado e abriu o pequeno embrulho se deparando com pãezinhos de um

aroma maravilhoso. Levando um pedaço ate a boca ele mastigou com

calma e com os olhos fechados ele permaneceu mastigando até que se

lembrou completamente.

- Ei Edie, o que foi? Perguntou Ric com os olhos arregalados diante do

irmão.

Page 48: St. Peter's Village

- Onde foi mesmo que você disse que conseguiu isso?

- Foi Dina que me deu, já disse. O que foi?

Edie pegou mais um pães e pôs na boca, dava para perceber que seus

olhos igualmente verdes como de Ric estavam brilhando. Lágrimas

escorreram. - Você não comeu nenhum?

- Já falei que não estou com fome.

- Esses pães tem o mesmo gosto dos pães que nossa mãe fazia, parece

que eu estou voltando ao passado.

Ric arregalou seus olhos vendo que seu irmão chorava. Ele não fazia

ideia do gosto dos pães de batata que sua mãe fazia por que era muito

pequeno naquela época. Mas mesmo assim pegou um e mordeu.

Ficou mastigando e olhando para cima. Depois que engoliu, olhou para

Edie e disse. - É muito gostoso, mas eu não consigo ligar o gosto à

mamãe, me desculpe.

Ric levantou os braços e agarrou o irmão, os dois ficaram ali abraçados

por alguns segundos, naquele momento uma coruja passou voando por

cima deles e as chamas da fogueira ficaram mais fortes. A coruja voou

até um velho tronco de arvore e lá ficou observando com aqueles olhos

arregalados em tons de amarelo e marrom.

Após soltar o abraço, os irmãos olharam para o fogo durante algum

tempo e a chama do fogo era alta e as labaredas salpicavam em todos os

lados.

- Essa Dina? - Me conte sobre ela. Perguntou Edie com um pouco mais

de curiosidade sobre a garota que Ric conheceu.

Os dois se sentaram e Ric começou a falar sobre a menina que ele

encontrou sentada no chão com um enorme machucado no joelho. Ele a

descreveu por completo, falou dos grandes olhos castanhos que ela

tinha, cabelos compridos e lábios carnudos. Edie ficou encantado com a

descrição que Ric estava dando sobre a misteriosa garota que aparecera

simplesmente do nada na vida dele.

Ric era tão detalhista que a apresentação de Dina tomaria o resto da

noite. A coruja permaneceu em seu lugar no topo do velho tronco seco e

as labaredas das chamas da fogueira salpicavam cada vez mais.

Page 49: St. Peter's Village

ALDEIA de SANTO PEDRO

Água

Desafeto da escola

5

Um lindo pássaro pousou sob o galho mais próximo da cabana de

Ric anunciando o amanhecer na floresta. A ave cantava uma linda

melodia. As cores do pássaro se destacavam entre as folhas verdes

da mata.

Ric colocou a cabeça para fora da pequena cabana, seus olhos ainda

se acostumando com a claridade permaneceram cerrados até que

foram banhados pela água que estava armazenada em uma pequena

construção feita de bambus. Junto com Ric os outros homens

também se aproximaram para lavar seus corpos.

Ric apenas vestia o que antes fora uma calça cortada na altura dos

joelhos. O tecido estava velho e desgastado. Enquanto se lavava,

Page 50: St. Peter's Village

filetes de água escorriam para baixo de seu corpo, descendo primeiro

pelo seu pescoço, depois passando pelo seu peitoral e escorregando

até abaixo do abdome. Os músculos dos braços de Ric se contraiam

involuntariamente à medida que ele se movimentava para terminar

de se lavar. Compartilhando o mesmo lavabo os outros homens

faziam a mesma coisa.

Edie aproximou-se todo coberto com roupas verde escuro ordenando

a todos que se vestissem, seria dia de buscar água na fonte.

- Temos que sair agora, nós não podemos correr o risco de encontrá-

los lá na fonte ou mesmo, pelo caminho.

Os homens concordaram fazendo sinal com a cabeça e correram para

suas cabanas a fim de se vestir apropriadamente para a ocasião.

Pegar água na fonte não parecia uma tarefa assim tão fácil quanto se

imagina. A fonte, nada mais era, que a tal fonte milagrosa que Pedro

descobriu no passado. Todos precisavam beber daquela água, caso

contrário, não sobreviveriam, não por falta de água para beber, mas

que estavam condenados a beber exclusivamente daquela água.

A fonte não ficava perto do refugio e eles tinham que levar garrafas

para serem cheias com a água milagrosa, cada um armazenava sua

própria água, por questão de sobrevivência, cada um era responsável

pela sua hidratação.

O maior perigo que poderia ocorrer nessa busca, era o grupo

encontrar com Ram e seu clã, na fonte ou à caminho dela. Já que

eles também precisavam beber da mesma água.

Sorvendo vários goles da água, Edie pergunta a Ric se ele não

poderia conseguir mais daqueles pães que Dina havia lhe dado.

Estranhando a pergunta de Edie, Ric sorriu e jogou água na cabeça

do irmão. - Hei Edie, estou achando estranho você querer conhecer a

Dina, já perdeu o interesse pelos macacos e pelas preguiças? Falou

sorrindo.

Edie ficou todo molhado, mas não mostrou qualquer raiva, apesar de

não ter apreciado nem um pouco a atitude de Ric. - Eu não quero

conhecer essa tal Dina. Respondeu. - Só estou pedindo que você

arrume mais daqueles pães. Jogando água em Ric. - Estou cansado

de ter que comer a porcaria que você faz. Rebateu rindo.

Page 51: St. Peter's Village

Então Ric voltou a jogar água em cima de Edie, com um pouco mais

de força e os dois se atracaram nas margens da fonte. Estavam

prestes a cair das pedras localizadas na margem quando alguém do

clã pediu silencio. – Shhhhh ousam, outras pessoas estavam se

aproximando.

Imediatamente todo o grupo de Edie e Ric levantaram suas garrafas,

algumas cheias, outras ainda vazias e correram para baixo da ponte

que passava por cima do pequeno riacho que brotava a alguns

metros da fonte da água. A velha ponte não era o melhor

esconderijo, mas era a única opção que eles encontraram naquele

momento.

Todos ficaram amontoados em silencio e o som de cavalos puderam

ser ouvidos muito próximos. Quase todo o clã de Ram estava

chegando e passaram por cima da ponte com o mesmo objetivo de

abastecer suas garrafas com água. Eles não perceberam que havia

pessoas escondidas em baixo da ponte, então eles passaram direto

até chegar à fonte de santo Pedro.

Os cavalos do clã de Ric e Edie esperavam por eles em outro canto ali

próximo na floresta, então eles caminharam silenciosamente para

não serem vistos nem por Ram nem por quem quer que fosse. Caso

contrário haveria luta. Montando em seus cavalos todos retornaram

para o acampamento no refúgio.

***

Na escola Dina tentava chamar atenção de Anja enquanto a

professora tentava explicar trigonometria. Anja morria de medo de

ser chamada atenção por uma professora, aliás, Anja morria de medo

de tudo que era considerado errado. Anja era do tipo de garota

certinha do bem.

- Psiu, Anja. Depois da aula vamos tentar encontrar a casa

desmoronada.

- Que casa, Dina? Não vê que estamos no meio de uma aula de

trigonometria. Apesar dessa matéria já ter sido dada ano passado.

Page 52: St. Peter's Village

- Então, eu preciso que você me ajude a encontrar a casa, tenho que

descobrir o que aconteceu de verdade e como você mora aqui há

mais tempo que eu ficaria mais fácil.

- Professora, essas duas meninas estão tirando minha atenção. Falou

Lorena que estava sentada a duas cadeiras de distancia de Dina e

Anja.

A professora parou a aula e se aproximou das duas meninas que

ficaram caladas olhando cada uma para seu próprio caderno. A turma

toda voltou sua atenção para a professora, Lorena, Dina e Anja.

Lorena, com ar debochado em seu rosto apontou para as meninas

reclamando à professora que elas estavam conversando assuntos

extracurriculares, como se ela se interessasse mesmo por isso. Na

verdade ela queria ver as amigas serem chamadas à atenção.

Levando uma bronca na frente de todos os alunos, Dina e Anja não

se falaram mais durante o resto da aula. Anja com as bochechas

vermelhas de vergonha abaixou a cabeça e não tirou mais os olhos

de seu caderno enquanto Dina, com a raiva brotando através das

orelhas, permaneceu calada o resto da aula.

Lorena sorrindo ao lado de Adan, seu colega de classe, pareceu não

se importar nem um pouco com a reação de Dina ou de Anja. Longos

minutos se passaram ate que o sinal tocasse anunciando o final da

aula. Era hora de ir para casa.

Na saída da escola, Dina e Anja conversaram sobre a bronca da

professora. - O que aquela ridícula tinha intenção de fazer? Perguntou

Dina enquanto abria a mochila para alcançar um pão de batata.

- Eu não sei Dina. Respondeu Anja. - Lorena sempre foi assim, desde

pequena, ela não muda.

- Pode ser, mas se ela se meter comigo de novo, não vai prestar,

você sabe que eu não tenho sangue frio.

Anja tentou manter as coisas calmas - Espero que ela não se meta

com você mesmo. Ela disse. - Por que você vai me meter no meio

disso e meus pais vão acabar se metendo na secretaria da escola.

Dina deu um soco de leve no ombro da amiga. - Anja, não seja

covarde. Falou sorrindo enquanto Lorena se aproximava. – Falando

no diabo, lá vem ela.

Page 53: St. Peter's Village

- Ignore Dina, por favor. Implorou Anja.

Lorena passou pelas duas garotas. Estava abraçada aos seus

cadernos rindo alto para chamar à atenção para si então deu meia

volta e parou exatamente na frente de Anja. - Espero que você não

atrapalhe mais minha aula. Sussurrou Lorena perto de Anja.

- Eu não estava atrapalhando a aula. A outra respondeu.

- Quem estava falando era eu. Disse Dina apontando o dedo na

frente do nariz de Lorena.

- Oh, advogado de defesa, quem seria você? Perguntou Lorena à

Dina. - Ahhh não precisa responder, eu acho que já sei... É a pobre

órfã que acabou de vir morar na cidade. Lorena continuou falando

alto para que o resto dos alunos próximos pudesse ouvir. – Ah sim, e

que mora com a velha cozinheira da igreja.

- Ei, minha avó não é cozinheira da igreja, ela deu aulas na pastoral.

Respondeu Dina com sangue fervendo nas veias. - Tenha respeito

quando fala da minha avó.

- Ou o que? Perguntou Lorena.

Sem responder mais nada, Dina partiu pra cima de Lorena agarrando

em seus cabelos. Deixando cair todo o material que carregava nos

braços, Lorena tentou empurrar Dina, mas era tarde de mais.

Dina puxou Lorena tão forte, que ela estava com joelhos dobrados no

chão. Mesmo Dina sendo um pouco mais baixa que Lorena, parecia

ter mais força e todos os alunos da escola começaram a gritar:

BRIGA... BRIGA... BRIGA. No minuto seguinte uma aglomeração

cercava Dina, Lorena e Anja.

Conseguindo se libertar dos agarrões de Dina, Lorena conseguiu

socar a barriga dela fazendo-a recuar e quando Lorena tentou pegar

nos cabelos de Dina, Anja se colocou entre elas ameaçando Lorena

com seus cadernos de capa dura cor-de-rosa.

Concluindo que estava em desvantagem, Lorena recolheu seu

material que estava caído no chão e se afastou. Seu amigo Adan que

só chegou logo após a briga ter terminado, tentou ajudar Lorena que

o afastou dela, explodindo de raiva. - Não toque em mim seu idiota,

onde você estava quando eu precisei de você? Falou Lorena para

Adan enquanto caminhavam para longe do local.

Page 54: St. Peter's Village

Anja ajudou Dina a se recompor enquanto o inspetor dispersava os

alunos fora da escola. - Obrigada Anja, eu estava conseguindo dar

conta sozinha da vadia com rabo de cavalo, mas já que você se

meteu obrigada pela ajuda.

- Tudo bem Dina, vamos embora logo antes que ela resolva voltar.

- Ninguém fala de minha avó daquela forma... Nem de forma alguma.

E as duas saíram da escola.

No caminho de casa, Dina explicou para a Anja a historia que o

psicólogo havia lhe contado na outra sessão, foi depois disso que ela

estava disposta a encontrar a casa desmoronada.

- Eu acho que já ouvi minha mãe dizer alguma coisa sobre essa casa

Dina, não estou certa, mas posso perguntar a ela hoje à noite, depois

que voltar da igreja.

- Ótimo, já é uma grande ajuda na minha investigação. Falou Dina à

amiga. - Também vou perguntar para minha avó sobre essa casa,

talvez ela conheça, afinal é uma casa desmoronada aqui na cidade,

as pessoas devem conhecer quem morou lá.

Dina passou a tarde toda perguntando a todas as pessoas que ela

encontrava pela rua e não conseguiu descobrir nada sobre o endereço

da casa desmoronada, ninguém sabia de nada ou não queria dizer.

Ela perguntou ao dono da padaria e nada, o vendedor da casa de

aves também não sabia, mas Dina não estava disposta a desistir da

investigação. - Eu não vou descansar até encontrar alguém que me

diga alguma coisa. Dina falou com sigo mesmo baixinho. – Eu vou

saber quem morou naquela casa.

***

Mais tarde, na floresta. Ric atirou três facas na direção de Edie, mas

não conseguiu acertar nenhuma delas. Edie se movimentava como

muita velocidade ao se esquivar dos golpes. As facas arremessadas

fincaram na terra enquanto Edie executava um belo salto mortal para

trás.

Então começaram a lutar corpo a corpo, um contra o outro. Os chutes

laterais semicirculares que Edie desferia eram bloqueados por Ric

Page 55: St. Peter's Village

com seus antebraços que contra golpeava no mesmo tempo com

chute giratório acertando seu calcanhar na lateral da cabeça de Edie.

- Vá com calma, isso é apenas um treinamento. Reclamou Edie

apalpando sua cabeça.

Ric sorriu para ele. - Vai querer que eu pegue leve com você? Tudo

bem. Ele disse com as mãos na cintura. – Eu achei que o treinamento

deveria ser serio não brincadeira de criança.

Edie assumiu novamente uma posição de combate e com a guarda

alta ele esperou que Ric investisse outro golpe. Horas mais cedo, eles

haviam voltado da fonte, mais nervosos do que de costume. Poucas

vezes, houve encontros entre o clã de Ram e o deles.

Se esconder em baixo da ponte causou tamanha frustração em Ric,

que o fez ficar calado o resto da manha. Agora os irmãos estavam

treinando e Ric deixava os pensamentos negativos tomarem conta da

sua mente, fazendo com que ele se distraísse e fosse atingido pela

lamina da espada de Edie.

- Cara eu acertei você. Gritou Edie olhando para o sangue do irmão

que escorria pelo braço.

- A culpa foi minha, resmungou Ric – Eu deveria ter prestado mais

atenção, vamos continuar, fique em guarda.

- Não seja infantil, idiota, se não cuidarmos disso poderá ficar pior.

- Edie... Edie... Brincou Ric, quase desmaiando. - Sempre o irmão

protetor.

Quando Edie percebeu que Ric, enquanto falava abaixou-se na raiz

grossa de uma árvore, pálido e com lábios embranquecidos correu

para pegar uma garrafa cheia com a água que haviam trazido mais

cedo da fonte de santo Pedro. Deu de beber ao irmão e jogou um

pouco sobre o corte feito pela sua espada.

Em poucos minutos Ric retomou a cor e como um verdadeiro milagre,

o corte foi fechando, a carne aberta curando e em pouco tempo Ric

estava em pé novamente. Edie observava o braço do irmão que antes

expunha um corte profundo e agora não passava de um arranhão.

Edie mais aliviado percebeu que Ric não mostrava nenhuma gratidão,

nem pelo gesto do irmão, nem pelo milagre da água. Ric sentia

verdadeiro ódio cada vez que precisava beber água ou usa-la para se

Page 56: St. Peter's Village

curar. - Você bem que poderia se mostrar um pouco mais de gratidão

por eu salvar a sua vida. Falou Edie.

- Não faça drama, eu sabia o tempo todo que você iria me ajudar.

Respondeu Ric sarcasticamente. – você não vive sem mim. Falou,

Enquanto virava em direção a sua cabana.

- Ei, para onde você esta indo, vai escurecer em três horas.

Perguntou Edie.

- Eu vou ver a Diana.

- já que vai até lá, arriscar seu pescoço e do resto do nosso clã,

poderia ao menos trazer mais daqueles pães.

Ric não respondeu ao irmão. Continuou caminhando em direção a sua

cabana. No caminho vez uma breve pausa para acariciar Céu que

estava a poucos metros dali. Chegando à porta da cabana, olhou para

dentro e mergulhou para dentro.

***

Já anoitecendo na cidade. Anja estava em casa bordando panos de

prato. Em sua família era normal que as mulheres aprendessem a

arte de bordar. Anja adorava passar horas na poltrona da sala

bordando quando não estava na companhia de Dina falando pelos

cotovelos.

O pai de Anja trabalhava com construção civil e todos os dias, na

saída do turno esperava a mãe de Anja na porta da igreja para

voltarem juntos. Mesmo quando não era hora da missa, a mãe de

Anja sempre que podia estava na lá.

Quase anoitecendo os pais dela entraram pela porta. Anja estava

acabando de se arrumar para ir ao encontro de Dina. O pai de Anja

era um homem de aparência rústica com idade beirando os 60 anos.

Sua pele era bem queimada do sol devido ao trabalho. Construção

civil era o oficio que a maioria dos moradores da cidade exercia.

Anja entrou no quarto enquanto sua mãe guardava o terço de prata

na gaveta. A mãe de Anja era uma mulher bonita apesar da idade.

Estava vestida com uma saia comprida em cor bege e um cardigã

Page 57: St. Peter's Village

combinando em tom mais escuro. Seus cabelos eram compridos até a

metade das costas e presos em forma de trança.

Anja sentou na cama e perguntou a sua mãe se ela conhecia os

moradores que morreram soterrados numa casa que desabou sobre

suas cabeças. A mãe de Anja, franzindo a testa com desconfiança,

achando estranha, a pergunta da filha.

- Não me lembro bem filha, que casa você está se referindo, por que

você quer saber disso agora?

- Nada de mais mãe. Respondeu Anja casualmente. – Dina ficou

interessada em saber sobre o que aconteceu por lá, e curiosidade de

quem veio morar aqui na cidade recentemente.

- Filha, pelo que eu me lembre, era uma família jovem que morava

lá. Revelou a mãe dela. – Eu sempre levava bordados para vender

naquela casa, a baronesa gostava do meu trabalho. Completou

parecendo puxar pela memória.

- Baronesa, como assim? - Por acaso eram pessoas da realeza que

moravam lá?

- Seu pai saberia explicar melhor que eu. – As pessoas que moravam

lá ao que parece eram de outra terra, Europa talvez.

Anja logo deduziu que uma baronesa seria casada com um barão.

Satisfeita com a informação que sua mãe havia lhe fornecido, saiu

correndo do quarto. - Xau pai, xau mãe. Despediu-se batendo a porta

atrás de si.

Apesar de gostar de missa e bordados, Anja nunca foi uma garota

cem por cento devagar. Como toda adolescente, Anja gostava de

andar as pressas sempre que tinha um compromisso, seja ele qual

fosse.

Já era o começo da noite, mas a cidade ainda não estava

completamente escura. As pessoas estavam de deslocando do

trabalho para casa e o comercio estava praticamente de portas

fechadas. Enquanto quase todo mundo estava entrando em sua casa

anja estava saindo dela, se dirigindo para casa de Dina.

Page 58: St. Peter's Village

ALDEIA de SANTO PEDRO

Água

Beijo no chafariz

6

Ric, do lado de fora da sua cabana, assobiou chamando Céu. O cavalo

respondeu rapidamente ao chamado de seu dono. Quando Ric não

estava galopando, Céu costumava pastar por ali mesmo, sempre

próximo ao acampamento do refugio.

Céu era um cavalo branco, mas podia jurar que a tonalidade certa de

seus pelos eram de um acinzentado, quase prata. Era muito difícil

dizer a cor exata de um animal de cor clara no meio da floresta.

Especialmente à noite. O que mais chamava atenção no cavalo era a

sua crina muito comprida e muito abundante.

Ric se aproximou de Céu vestindo uma calça verde tão escura que

quase não dava para perceber a cor. Sua blusa de gola V com

mangas compridas completavam o estilo casual. Seus cabelos

Page 59: St. Peter's Village

rebeldes com mexas desordenadas trepidavam com o balanço do

galope de Céu.

Cada vez que Ric pensava em Dina, uma explosão de euforia tomava

conta do seu corpo fazendo seu coração bater em tom mais

acelerado. Ric estava tão ansioso para encontrar Dina, que não

percebeu que estava sendo seguido por Ram e Lucaar.

Eles estavam escondidos numa parte alta da floresta, onde era

possível ver, sem ser visto. Estavam vestidos com roupas

completamente pretas, incluindo capuz onde apenas os olhos

estavam à mostra. Os olhos de Ram brilhavam no escuro, como dois

vagalumes.

Já os olhos de Luccar eram negros e estreitos. Era absolutamente

impossível ver qualquer expressão naqueles olhos. Lucaar sempre foi

o braço direito Ram, desde pequeno. Eles se tornaram amigos logo

depois que Luccar chegou a Santo Pedro.

Muito rebelde, não quis fazer amizade com ninguém, mas Ram

conseguiu, não se sabe como, conquistar o coração do garoto. Hoje

Lucaar ocupa o posto mais confiável no clã de Ram.

Fora da floresta, Dina sentou à mesa da cozinha enquanto vó Augusta

preparava a janta e a massa dos pães para fornada da manhã

seguinte.

- Vó, a senhora sabe alguma coisa sobre a casa que desmoronou

matando os moradores aqui na cidade?

Vó Augusta parou um momento antes de responder. - Querida, eu

não lembro bem, isso foi há muito tempo, se você não comentasse

agora talvez eu não me lembrasse de que essa tragédia aconteceu.

- É que o psicólogo comentou por alto sobre esse acontecimento, digo

essa tragédia.

Enquanto as duas falavam, Anja bateu na porta muito ansiosa para

dizer a Dina sobre as informações que sua mãe lhe falou mais cedo,

antes de sair de casa.

- Boa noite, dona Augusta. – Oi Dina, vamos para o seu quarto,

tenho informações sobre a tal casa.

Page 60: St. Peter's Village

As duas subiram correndo as escadas e se dirigiram para o quarto de

Dina. Sentaram-se de frente uma para outra na cama e Anja

começou a falar. - Minha mãe já entrou naquela casa.

- Como é que é me explica isso direito, o que sua mãe fazia lá?

- Minha mãe vendia bordado para a dona da casa, a baronesa.

Continuou. - Minha mãe disse que a baronesa gostava muito do

bordado dela.

- Isso é uma ótima informação Anja, talvez as pessoas se lembrem

da baronesa ao invés da casa. Falou Dina euforicamente. – Vamos

descer e perguntar para minha avó sobre essa baronesa.

As duas desceram as escadas correndo juntas quase despencando lá

de cima. Era realmente incrível como adolescentes daquela idade

gostam de viver perigosamente, ainda mais quando se tratava de

escadas.

- Vó. Gritou Dina já entrando na cozinha seguida de Anja.

As duas não encontraram vó Augusta. Ficaram olhando uma para

outra, sem entender como ela desapareceu enquanto elas estavam

no quarto. Onde ela está? Perguntou Dina.

- Estou aqui em cima querida, Gritou vó Augusta do segundo andar

da casa.

- Como ela foi parar lá em cima, sem que nós pudéssemos perceber?

Perguntou Anja com espanto. – Sua avó faz ginástica?

- Se ela faz eu não sei, mas vou subir lá falar com ela. Respondeu

Dina saindo em disparada em direção às escadas novamente, Anja foi

atrás.

As duas voltaram pelo mesmo caminho que fizeram quando desceram

do quarto de Dina. Tentando pisar no mesmo degrau, o pé direito de

Dina assentou sobre o pé esquerdo de Anja, fazendo com que seu

próximo passo avançasse tropeçando nos degraus seguintes.

Desequilibradas, as duas caíram na base da escada, uma em cima da

outra.

O ruído da queda fez com que vó Augusta descesse as pressas para

ver o havia acontecido no andar de baixo. Descendo devagar vó

Augusta se deparou com as duas meninas sentadas no chão rindo

Page 61: St. Peter's Village

uma da cara da outra por causa do tombo. - Ainda bem que nós não

nos machucamos. Falou Anja quase chorando de tanto rir.

- Meninas tomem cuidado. Advertindo vó Augusta às meninas. - Por

que vocês tem que fazer tudo correndo?

- Desculpe vó, eu estava muito ansiosa para perguntar para a

senhora sobre aquela casa novamente. Falou Dina. – Anja me trouxe

informações da mãe dela.

Quando Dina se levantou vó Augusta já estava no andar de baixo

com uma fotografia nas mãos. Dina olhou para a fotografia que

parecia ser mais velha que sua própria idade. Vó Augusta mostrou a

fotografia para Dina. A neta pegou o retrato nas mãos e reconheceu

duas das pessoas que estavam na foto.

- Essa aqui é a senhora vó? Perguntou Dina e em seguida apontou

para outra pessoa na foto. – Este é o padre daqui da igreja, certo?

- Isso mesmo querida. Respondeu vó Augusta apontando para uma

terceira pessoa na foto. – Essa de vestido claro é Celina, que fez o

curso de culinária na pastoral, era ela quem morava na casa que

desmoronou.

- Será que essa Celina deve ter conhecido a tal baronesa? Indagou

Anja.

- Sim, com certeza se ela morou lá, claro que conhecia. Afirmou Dina.

Com um sorriso no olhar, respondendo em tom melancólico, vó

Augusta respondeu as meninas. - Queridas, Celina era a baronesa.

Com os olhos arregalados diante da surpresa, as meninas ficaram

caladas alguns segundos antes de perguntarem. - A senhora conhecia

a baronesa, conhecia as pessoas que moravam na casa?

Vamos sentar que eu vou explicar a vocês com mais calma. Se minha

memória não me falha...

Celina era a minha aluna e a mais aplicada na pastoral. O curso de

culinária estava tão vazio antes dela se matricular que eu quase desisti

das aulas. Mas depois que Celina se matriculou, outras meninas

também se animaram com o curso.

Muitas meninas tinham curiosidade em estar perto de uma baronesa.

Uma baronesa muito jovem, podia se dizer. Ela casou antes dos 16 anos

Page 62: St. Peter's Village

e na época das aulas ela já tinha dois filhos, o pequeno Ramcy e Edgard.

Seu marido, o barão Juan era quase 15 anos mais velho. Ele morava na

Europa e por causa das muitas terras que ele comprou aqui na cidade, os

moradores o chamavam de barão e Celina de baronesa.

A primeira coisa que Celina aprendeu comigo foi a receita dos pães de

batata. Depois de alguns dias ela me falou que depois que aprendeu, os

preparava em casa e toda família adorava, principalmente Edgard.

Quando seu ultimo filho nasceu ela parou de frequentar as aulas por que

o barão teve que viajar em um projeto científico, eu acho. Mas ela sempre

que podia, vinha aqui me ver com seu filho mais novo.

Quando o barão voltou da viagem, Celina nunca mais veio aqui. Nós nos

víamos esporadicamente na missa e festas do solstício. Os garotos foram

crescendo e, como eu quase não os via, não sei a aparência que eles

ficaram, mas tenho certeza que se estivessem vivos, hoje seriam rapazes

muito bonitos.

Depois que o barão voltou de viagem, muita coisa mudou aqui na cidade,

milagres começaram a acontecer. E alguns anos depois, numa noite de

muito vento e tempestade, a casa deles desmoronou toda em cima das

cabeças de Celina e das crianças. Os empregados disseram que o barão

ainda tentou salvar a família, mas uma coluna pesada caiu sobre ele

também. A família toda morreu ali, à noite.

Na manha seguinte os empregados, logo após terem enterrados os corpos

dos seus patrões, desceram aqui para o centro da cidade para dar a

triste noticia. Disseram que os corpos da família foram enterrados nas

terras atrás da casa, bem próximo à entrada da floresta. Nem eu e nem

ninguém daqui teve coragem de subir até lá para velar ou mesmo para

deixar flores e tributos no pequeno cemitério da família.

Dina e Anja com os olhares molhados permaneceram caladas

enquanto vó Augusta subia lentamente para o segundo andar, com o

retrato nas mãos.

- Meu Deus, isso foi uma desgraça total. Morrer soterrado em sua

própria casa. Choramingou Dina. – Isso é muito triste.

Anja levantou para ir embora. - Depois desta historia, eu acho que

vou para casa dormir, Xau Dina.

Saindo da casa de Dina, Anja seguiu silenciosa para a casa dela. Toda

aquela historia havia deixado Anja abalada e ela só tinha vontade de

deitar em sua cama e dormir.

Page 63: St. Peter's Village

Dina ficou na cozinha mais algum tempo, tentando digerir a historia

que sua avó acabara de lhe contar. Sozinha, Dina subiu as escadas

de sua casa bem de vagar, em ritmo de câmera lenta, deu boa noite

a sua avó e bateu a porta de seu quarto.

Agora ela estava sentada no peitoral de sua janela os braços

cruzados sobre suas pernas, cabeça baixa chorando. A tragédia da

casa a fez lembrar que seus pais também foram mortos em uma

tragédia. Nem todos os casos de sequestro resultam em morte, mas

infelizmente aconteceu na cidade onde eles moravam.

Perto da cassa dela, Ric soltou Céu no mesmo lugar da outra noite

que encontrou Diana. Andou pelas ruas cuidadosamente observando

quem poderia supostamente passar por ai. Ram e Luccar estavam em

seu encalço a metros atrás dele, mas Ric não percebeu os dois, por

que só pensava em Dina.

Quando estava quase na frente da casa de dela, Ric pode ver que ela

ainda estava sentada na janela. Dessa vez ela não percebeu Ric por

que estava chorando de cabeça baixa. Ric se agachou para pegar

pequenas pedrinhas no chão e começou a lançar em direção á Dina

certificando que somente iriam bater nas portas da janela, foi quando

Ram, de longe, viu Dina pela primeira vez.

Os olhos de Ram se estreitaram para uma melhor visualização.

Lucaar permanecia tenso ao seu lado, sair da floresta naquela hora,

ainda era uma manobra perigosa, mesmo para eles dois. Ram puxou

o capuz que cobria todo seu rosto. Deixando a brisa refrescar o suor

dos cabelos por baixo do tecido. Seu semblante permanecia sério,

impenetrável.

Dina sentiu o trepidar das janelas e olhou para baixo. Pode ver Ric

com algumas pedrinhas ainda em suas mãos. Ric fez sinal para ela

descer ao seu encontro. Ram e Lucaar observavam atentamente aos

movimentos de Ric, quando a garota abriu a porta da casa. Ric pode

perceber que Dina estava chorando e quis saber o que acontecera.

- Ei Dina, estava chorando o que houve?

- Eu estava um pouco triste. Ela respondeu. – Não se lhe contei, eu

sou órfã de pai e mãe, por isso eu vim aqui morar com minha avó.

Ric aproximou-se de Dina e pegando em sua mão, a chamou para um

pequeno passeio até o velho chafariz. - Por que não vamos andar um

pouco? Ele disse. - Assim você me conta um pouco mais.

Page 64: St. Peter's Village

Eles andaram até o chafariz, sentaram e Ric tocou o rosto de Dina.

Os olhos dela ainda estavam vermelhos por causa das lagrimas que

escorreram. Ram e Lucaar acompanharam toda a cena até o chafariz,

então decidiram voltar para a floresta.

- Você estava chorando de saudades pelos seus pais? Perguntou Ric

acariciando o rosto de Dina.

- Acho que sim. Ela respondeu. - Minha avó me contou uma historia e

eu meio que me lembrei deles. Falou com o rosto totalmente apoiado

nas mãos de Ric.

A intimidade entre os dois aumentou e Ric estava com os braços

enrolados em torno de Dina. Seu queixo sobre a cabeça dela, e a

cabeça dela descansando sobre o peito dele. Dina estava tão relaxada

que podia ouvir as batidas do coração de Ric e ritmo acelerado.

- Eu não gostaria de competir com você nesse momento, mas talvez

faça você ficar mais a vontade pra se abrir comigo se desejar, eu

também sou órfão de pai e mãe. Revelou Ric.

- Você também não tem pais? Perguntou Dina. – Então você sabe

como eu estou me sentindo.

- Meus pais morreram quando eu tinha 13 anos. Continuou Ric. – Eu

fui criado pelo meu irmão do meio daí então.

Dina se afastou dos braços de Ric e ficou interessada pelo relato da

historia dele. Eles estavam muito próximos com as mãos

entrelaçadas e as coxas encostadas, a dele na dela.

- Minha amiga acha que você não existe, ela acha que eu vi coisas na

primeira vez que nos encontramos. Falou Dina olhando nos olhos

verdes de Ric.

- Mas eu estou aqui com você, não estou?

- Sim, mas eu não sei nada sobre você, só agora descobri que é órfão

como eu. Qual seu nome, e sobrenome?

Ric pensou um segundo e dando de ombros a si mesmo, respondeu à

pergunta de Dina que o olhava com muita esperança de conhecer

mais um pouco sobre ele.

- Eu me chamo Richard Baleares, muito prazer, e o seu?

- Eu me chamo Diana Gomes e o prazer é todo meu, senhor Baleares.

Page 65: St. Peter's Village

Ric ficou tenso quando escutou a garota dizer as palavras Senhor e

Baleares. - Só retire o senhor, meu pai era chamado de senhor por

todo mundo.

- Então está bem, Ric. Melhor assim?

- Claro. Ele respondeu. - Assim e muito melhor.

Os dois ficaram rindo um para o outro algum momento, quando Ric

ficou serio em frente a ela. Olhando nos olhos castanhos que ela

exibia ele umidificou os lábios e olhou para boca de Dina, ela ficou

absolutamente imóvel sem saber como reagir. Ric se aproximou

lentamente de Dina, mais e mais perto.

Ela fechou os olhos, não conseguia encarar a situação. Ele encostou o

nariz na bochecha dela e vagarosamente foi deslizando para próximo

da sua nuca tentando sentir o cheiro dos cabelos castanhos dela.

Dina sentiu um arrepio que começou no pescoço, sob o toque da

língua de Ric, terminando nas suas coxas. Ela jamais havia ficado tão

próxima de um rapaz antes e tentou se afastar dele, mas ele então a

puxou para mais perto e encostou seus lábios nos dela. Foi um beijo

longo e carinhoso.

Quando Dina abriu os olhos, Ric estava com os braços em volta dela.

O beijo fez com que ela esquecesse completamente qualquer

pensamento ou dor. Ric passou as mãos pelos cabelos dela,

mergulhando os dedos naquele mar de ondulações castanhas. Dina

um pouco envergonhada jogou as mãos para trás da cabeça de Ric

laçando seu pescoço e puxando para perto de si.

Um som de ave passou por cima das cabeças deles fazendo com que

a corrente que os atraia se quebrasse e afastando seus corpos. Uma

coruja de grande porte piou ali perto quando fez um voo rasante,

pousando no topo do chafariz.

- Melhor eu voltar para casa, minha avó pode acordar e ficar

preocupada se não me encontrar.

- Vou levar você pra casa. Ele disse.

- Não precisa, eu posso voltar sozinha.

- Que espécie de homem eu seria se deixasse você voltar sozinha pra

casa, à noite. – Me de sua mão.

Page 66: St. Peter's Village

Dina e Ric entrelaçaram suas mãos e seguiram andando devagar em

direção a cada dela. Ric permaneceu calado todo o percurso e Dina

imaginava qual seriam os pensamentos dele. Na frente de sua casa,

Dina igualou sua altura com a de Ric quando ficou em cima do degrau

da porta. Os dois estavam com seus olhares na mesma direção.

- Boa noite Ric.

- Boa noite Dina.

Quando a garota colocou a mão na maçaneta da porta, Ric puxou-a

tão rápido para si que ela não pode ter tempo para raciocinar ao

movimento. Ele encostou Dina na porta e pressionou seu corpo

contra o dela. Aquele beijo foi diferente do beijo do chafariz, eles

estavam em pé com seus corpos totalmente encostados um no outro.

Dina pode sentir o coração de Ric batendo embaixo do peito

encostado ao dela.

- É assim que eu dou boa noite. Falou Ric afastando o peso do corpo

dele contra o dela.

Ela abriu a porta com cuidado para não acordar a sua vó e fechou a

na frente de Ric. Subiu depressa as escadas e em silencio foi para a

janela. Ric estava embaixo esperando ela aparecer. Com um aceno

de mão ele foi embora.

Já em Santo Pedro, Ram conversava com Luccar em frente à

fogueira. Comendo carne assada no fogo e bebendo suco de fruta.

- Você acha que ele conhece essa garota há muito tempo? Perguntou

Lucaar enquanto arrancava um pedaço de carne queimada com a

boca.

- Eu não faço ideia de como ele a conheceu e há quanto tempo ele a

conheceu. Respondeu Ram. – Mas ele não pode colocar tudo a

perder, não depois de tantos anos.

- Você já sabe o que vai fazer?

- Eu não sei. Respondeu Ram estreitando os olhos brilhantes

contrastando com a luz amarela da fogueira. – Mas amanha é um

novo dia. Vou resolver isso.

- Eu não acho que exista uma forma para separar o que quer que

esteja acontecendo entre os dois. Falou Lucaar. - Resolver isso não

parece ser uma tarefa fácil.

Page 67: St. Peter's Village

- Você sabe muito bem qual é a forma mais fácil que eu costumo

resolver as coisas que não me agradam. Falou Ram. – Eu vou matar

essa garota.

Luccar deu um sorriso antes de colocar outro pedaço de carne na

boca.

Page 68: St. Peter's Village

ALDEIA de SANTO PEDRO

Água

Encontro inesperado

7

Quando Dina passou pelo portão da escola depois da aula, seu rosto

ainda exibia expressões da raiva que sentia de Lorena. Ela

confrontava Dina diariamente durante as aulas. Tentando não se

concentrar em Lorena, Dina conversava com Anja sobre o endereço

da casa desmoronada que possivelmente, elas teriam que descobrir.

- O que você vai fazer depois do almoço? perguntou Anja. – vamos

andar por ai pra tentar descobrir o endereço da tal casa?

- Depois do almoço tenho consulta com psicólogo, respondeu Dina. –

provavelmente vamos perder o dia, hoje tem missa esqueceu?.

- claro que não, eu jamais esqueceria o dia de ficar mais perto de

Deus.

Page 69: St. Peter's Village

Dina fez uma cara debochada enquanto se dirigia para casa. Anja

acompanhava Dina, já que as duas moravam perto uma da outra.

Dina gostava muito de Anja e para não magoar a amiga, ela preferia

ficar calada quando Anja começava a falar em religião. Mesmo na

pequena cidade onde as duas moravam, sendo um estado laico, a

grande maioria das pessoas praticava o catolicismo e não tolerava

muito a opinião sobre outras religiões.

Dina frequentava a missa católica, mas desde pequena, ela

simpatizava pelo espiritismo, junto com seus pais. Quando tinha seis

anos, ela passou por experiências ruins, como visões de pessoas

mortas, daí então, seus pais a levaram em um local onde as praticas

espirituais ajudavam as pessoas resolverem esse tipo de problema.

Dina melhorou e eles continuaram a frequentar o local desde então.

A primeira garota a chegar em casa foi Anja, enquanto Dina seguiu

em frente. Antes de Anja abrir a porta, ele teve uma estranha

sensação de que estava sendo observada.

Tirando a mão da maçaneta, ela virou a cabeça lentamente por cima

de seu ombro direito e depois virou o resto do corpo até estar de

costas para porta.

Lucaar estava longe, escondido atrás de uma árvore, dessas que

ficam encostadas nas calçadas, para fazer sombra nas ruas. Lucaar

olhava Anja com certa curiosidade, uma garota de cabelos louros

cacheados era mesmo de se chamar atenção. Se dando por satisfeita,

comprovando que não havia ninguém por perto, Anja virou de volta

para a maçaneta da porta, abriu e entrou.

Chegando a casa, Dina jogou os cadernos em cima do sofá da sala e

subiu correndo as escadas, quando chegou ao seu quarto estava

praticamente só de calcinha e sutiã. Dina gostava de andar pela casa

a vontade, já que só moravam ela e sua avó ali.

Depois de um banho rápido Dina desceu correndo as escadas

novamente. Sua avó estava esperando para o almoço, a mesa estava

pronta. Vó Augusta cozinhava muito bem, mesmo que somente para

duas pessoas ela fazia questão de pôr um banquete sobre a mesa.

Arroz branco, salada verde, carne assada e batatas coradas. O feijão

preto era opcional, mas Dina fazia questão de colocar feijão sobre o

arroz. Era como fazia quando morava com seus pais.

Page 70: St. Peter's Village

- vou aprender a cozinhar como à senhora vovó. – isso está muito

bom.

- certamente querida, vou te ensinar primeiro a fazer arroz branco.

Enquanto Dina mastigava sua avó enchia um copo de mate gelado

com duas rodelas de limão. Era a bebida que Dina mais gostava.

Quando as duas estavam terminando a refeição, Dina recomeçou o

assunto da casa desmoronada.

- Vó, a senhora sabe o endereço da casa desmoronada?

- por que você quer saber querida, você não pretende ir lá não é ?

- NÃO... É que eu pensei que talvez pudesse passar em frente só

para matar minha curiosidade. – afinal, faz parte da historia da

cidade, não é mesmo?

- eu acho melhor você deixar esse interesse para lá querida, vamos

deixar os mortos descansarem em paz.

Dina terminou de engolir a ultima garfada e com um pequeno gesto

com a cabeça respondeu a sua vó.

- Sim vovó, vou me concentrar em outra coisa.

Elas terminaram de comer e Dina ajudou retirar os pratos da mesa.

Enquanto voltava ao seu quarto para escovar os dentes, vó Augusta

lavava toda a louça.

- estou saindo para a sessão com o doutor Paulo, xau vó.

- xau querida, mas me diga quem é esse doutor Paulo, eu não o

conheço...

Dina não escutou as perguntas da sua avó, estava mais que

apressada para chegar à sessão com o doutor Paulo, seu psicólogo.

Andar na rua naquela hora da tarde era um pouco desconfortável

para Dina, pois o sol era muito forte.

Andando sozinha pelas ruas com os olhos cerrados por conta da luz

do sol, Dina não percebeu que estava sendo seguida por Ram. Ele

estava a metros de distancia dela, sozinho na outra calçada. Lucaar

estava escondido mais atrás. Eles foram acompanhando a garota até

a porta de um prédio de dois andares.

Page 71: St. Peter's Village

Entrando no consultório, a secretaria anunciou e Paulo a recebeu

pessoalmente, convidando-a para se sentar no divã, velho.

- boa tarde senhorita Diana. Cumprimentou e logo em seguida bebeu

um gole da garrafa ao lado. – O que vamos falar hoje.

- Que tal o senhor me dizer algo sobre a casa que desmoronou sobre

as cabeças da família ?

Paulo ficou tenso, a primeiro momento, mas depois sorriu e

respondeu calmamente para Dina.

- Nós já falamos sobre essa tragédia outro dia, que tal falar em algo

mais moderno.

- E que tal o senhor me dizer o endereço da casa ? Insistiu Dina.

- Falar sobre o endereço da casa não seria assunto para nossa

sessão.

Dina percebeu que Paulo não estava querendo responder as suas

perguntas, então tentou desviar o assunto para outra investida antes

do tempo da sessão terminar.

- é que eu fiquei muito interessada pela historia da água, e já que a

casa estava relacionada a ela, eu pensei que talvez pudesse fazer um

trabalho para escola.

- que tipo de trabalho ?perguntou Paulo começando a se interessar.

- aula de artes, o professor mandou os alunos desenharem paisagens

da cidade. – eu desenho um pouco bem, e pensei em retratar o local

da casa que desmoronou tipo os escombros que restaram dela.

- Mas por que você não falou isso antes, vou lhe dar o endereço, mas

me prometa que vai me mostrar o desenho.

- Claro que sim.

- Então vamos lá, disse Paulo. - Sobre o quê você gostaria de falar ?

Uma hora depois, Dina estava a caminho de casa. Ainda restavam

algumas horas da missa começar. Dina tinha em sua mão um papel

escrito o endereço da casa desmoronada.

Page 72: St. Peter's Village

Dispersa em seus pensamentos Dina escorregou novamente no

mesmo lugar onde conheceu Ric, mas desta vez não caiu. A

derrapada fez com que Dina soltasse o papel com endereço no chão.

Mas que depressa ela abaixou para pegar, quando uma leve brisa

passou e empurrou o papel mais próximo dos seus pés. Ela agarrou

tão forte o papel que conseguiu amassar um pouco. Ao levantar com

o papel nas mãos, pronta para escorrega-lo para sua bolsa, ficou com

seu o nariz apontado para Ram.

O susto foi grande, mas Dina não pode deixar de reparar naquele

homem lindo que estava em sua frente. Com camiseta branca e

calças claras combinando. Ela reparou nos braços dele incrivelmente

fortes, assim como o resto da musculatura muito bem distribuída em

todo seu corpo.

Levantando a cabeça, ela fixou a atenção nos olhos de Ram. De

imediato ela arriscou dizer que eram de cor azul bem claro, mas logo

desistiu, pela confusão dos tons de cores que saltavam daqueles

olhos.

-Boa tarde. Falou Ram.

- Boa tarde. Respondeu Dina, se perguntando de qual paraquedas ele

havia caído.

- onde está indo com tanta pressa ?

- não estou com pressa, só estou andando rápido. Dina respondeu

um pouco mais segura. – É que eu fico com medo de encontrar

estranhos que possam me fazer mal.

- nesta cidade não existem pessoas estranhas, todos se conhecem.

- Eu não conheço você. Argumentou Dina. – a propósito, eu quase não

conheço ninguém aqui nessa cidade. Pensou.

- Eu sou Bob, muito prazer. Apresentaram-se Ram com um nome

falso.

- Muito prazer... Bob. – eu sou Dina.

Ele levantou a mão e a deixou estendida na frente de Dina. Com

muita insegurança, ela estendeu a mão dela também, e os dois se

tocaram.

Page 73: St. Peter's Village

A mão de Bob era muito pesada, grossa, com dedos fortes. Dina

achou a mão dele muito bonita, mas afastou o toque rapidamente.

Ela se apressou em dizer que tinha que voltar para casa e Bob se

ofereceu para caminhar ao seu lado, acompanhando-a.

Dina olhava para frente o tempo todo, evitava olhar para Bob. Sim,

ele era muito bonito, mas Dina tinha medo daquele homem. Que

caíra de para quedas de algum lugar. De vez em quando ela olhava

para cima curiosa se perguntando se realmente havia possibilidade

dele ter mesmo caído de paraquedas.

Enquanto Bob pensava na maneira que iria matar Dina, fixava seu

olhar na garota o tempo todo. Ele não se importava que ela estivesse

se sentindo mal por estar sendo observada por ele.

Eles foram andando até a porta da casa de Dina, o que a fez ficar

muito aliviada por ele ter que ir embora.

- Bem, chegamos. Obrigada por me acompanhar ate aqui.

- Dinaaaaa, queridaaaaa. Cuidado ai em baixo. Gritou vó Augusta da

janela de Dina. – Estou limpando as janelas.

Bob olhou para cima e viu a velha com metade do corpo para fora da

janela. Um balde antigo feito de madeira, também estava no peitoral

da janela, cheio de água.

Quando Dina chegou mais perto para se despedir dele, Bob

pressentiu algo errado e olhou para cima novamente. Viu que vó

Augusta desequilibrou e deixou o balde cair lá de cima, da janela.

Com um rápido movimento ele avançou em direção a Dina

empurrando-a contra a parede, elevando a outra mão sobre a própria

cabeça, defendendo e impedindo que o balde, pesado, partisse a

cabeça dele em dois.

Luccar pode ver tudo de seu esconderijo, mas continuou no mesmo

lugar, observando que Ram tinha total controle da situação. Dina

ficou surpresa, com o rápido movimento de Bob e caminhou

lateralmente afastando-se da frente da porta.

- meu Deussss, vocês estão bemmmmm? perguntou vó Augusta lá de

cima, ainda na janela. – vou descer... Vocês se machucarammm ?

Page 74: St. Peter's Village

- Não vó... Está tudo bem aqui em baixo, o balde não caiu em cima

da gennnnnte. Respondeu Dina, com olhos arregalados voltados para

Bob.

O balde havia aberto um enorme ferimento no antebraço de Bob,

sim, aquele era um ferimento que podia ver o osso por baixo da pele

aberta.

Bob não fez absolutamente nenhuma expressão de dor. Dina se

aproximou e tirou sua camiseta revelando um belo top vermelho por

baixa dela.

Bob ficou desconfiado com a atitude de Dina, mas deixou que ela

continuasse o que estava fazendo. Dina colocou a sua camiseta em

cima do ferimento de Bob, na tentativa de estancar o sangue.

Bob observava com muita atenção a todos os movimentos de Dina,

incluindo para o seu tronco vestido somente com um TOP vermelho.

A barriga de Dina era reta como uma tábua, sem nenhuma ondulação

e sua cintura se assemelhava muito a imagem de um violão.

Dina não percebeu que Bob olhava para ela, ela estava totalmente

concentrada em seu ferimento.

- Vamos a um hospital. Esse ferimento está profundo.

- Não precisa, isso vai curar logo. Rebateu Bob, olhando para a

camiseta de Dina enrolada em seu braço.

- Você é louco ? Isso vai infeccionar.

- Você esta preocupada comigo ? perguntou Bob olhando

profundamente para Dina.

- Claro que estou. - O balde da minha casa caiu em cima de você. -

Você poderia ter morrido, o balde é muito pesado.

Bob apertou os lábios e deu um pequeno sorriso para Dina,

aproximando-se dela, pegou na sua mão.

- Eu agradeço muito a sua preocupação moça. Disse Bob beijando a

mão dela. – Eu devolverei a sua roupa em breve.

Naquele momento Dina não sentia mais medo daquele homem que

antes fez com que ela ficasse apavorada. Dina, apesar de muito

preocupada com o ferimento dele, não pode deixar de perceber que

ele era um homem bem educado. Lindo e educado.

Page 75: St. Peter's Village

- Xau Dina, a gente se vê.

- xau Bob, cuida disso ai.

Vó Augusta abriu a porta falando muito por causa da queda do balde.

Dina voltou-se para ela tentando acalmar, mas vó Agusta estava

muito preocupada.

- Calma vó, não aconteceu nada. Bob fez uma defesa samurai e o

balde não matou ninguém.

- Quem e Bob? perguntou Vó Augusta. – Não tem ninguém aqui alem

de você e eu.

Dina girou de volta para rua e, Bob não estava mais lá. Tinha sumido.

- Ele estava aqui, agorinha mesmo. Respondeu Dina. “É a segunda

vez que isso me acontece em menos de uma semana”. Pensou.

- Ele foi embora então? - Onde está sua camisa ? - Você não andou

nas ruas assim ?

- Não vó, como eu disse, Bob cortou o antebraço quando se defendeu

do balde e eu tirei a camisa para estancar o sangue. – Ele deve ter

isso ao hospital e prometeu que vai trazer minha camisa de volta.

- OH meu Deus, ele foi ao hospital ? - Eu gostaria de poder me

desculpar com ele querida. – Você sabe onde ele mora, vamos a casa

dele nos desculpar com os seus pais.

- Não foi nada de mais, ele nem reclamou do ferimento. – Eu não sei

onde ele mora vó. - Quando ele voltar, a senhora fala com ele.

- Espero que ele volte mesmo. – Vamos entrar querida, é hora do

lanche. Mais tarde teremos encontro na igreja.

Elas entraram com a porta fechando atrás delas.

***

Ram encontrou Luccar dentro da floresta. Eles se aproximaram e

Luccar olhava para Ram com um sorriso sarcástico. Enquanto Ram

soltava a camisa de Dina do seu braço, Luccar arremessava um cantil

com água de Santo Pedro na direção dele.

Page 76: St. Peter's Village

- O que foi aquilo, perguntou Luccar. – Pensei que você iria mata-la

na primeira oportunidade.

- Eu quis investigar ate onde ela sabia, respondeu Ram enquanto

derramava água de santo Pedro em cima do ferimento.

Em poucos segundos, como mágica, o ferimento começou a fechar.

As fibras da pele começaram a se aproximar como uma costura

invisível. A água de santo Pedro curou o ferimento de Ram.

- Por que não deixou que o balde caísse na cabeça dela

- Não pensei nisso, respondeu Ram com o ferimento totalmente

curado. – O balde foi mais rápido que eu.

- É uma garota bonita, não é mesmo? - Ela tirou a camisa só pra

ajudar você.

Ram ficou olhando para a camisa de Dina em suas mãos. Era macia e

estava suja com seu próprio sangue. Realmente a atitude da garota

mexeu com os pensamentos dele. Enrolando o tecido com as mãos,

Ram o guardou com cuidado no bolso e montou em Tobruk.

- Cale a boca, disse Ram se dirigindo a Lucaar. – Vamos voltar para

santo Pedro.

E os cavalos dispararam para dentro da floresta.

***

Dina estava terminando de se arrumar, ela havia combinado com

Anja que iria passar na casa dela para irem juntas ao encontro jovem

da igreja. Vó Augusta dessa vez iria ficar em casa. Quando estava

lavando a janela, se molhou um pouco e acabou pegando um

resfriado, o que era perigoso na idade dela.

- Querida, não se esqueça de perguntar onde os pais de Bob moram.

– Eu quero me desculpar por hoje.

- Tudo bem vovó. – Estou saindo, xauuuuu.

Page 77: St. Peter's Village

Dina passou pela porta apressadamente e seguiu rua abaixo. Anja

provavelmente estaria esperando por ela na porta de casa. Dina se

lembrou do endereço que conseguira mais cedo com Paulo, e

pretendia combinar com Anja, delas irem juntas na casa

desmoronada.

Caminhando a passos curtos, Dina observou uma pequena pedrinha

rolando na sua frente, ignorou e continuou andando. Mais uma

pedrinha rolando, e depois outra. Intrigada ela olhou na direção de

onde as pedras estavam sendo arremessadas e um belo rapaz estava

parado olhando para ela.

- Oi Ric, como eu não percebi você. Falou Dina intrigada, pensando

novamente nos paraquedas. – Estou indo encontrar Anja, desse vez

você vem comigo para ela ver você.

Ric pensou um pouco, e concluiu que não havia problema em

conhecer outra garota.

- Tudo bem Dina, vamos lá conhecer sua amiga anjo.

- É ANJA. – O nome dela é Angélica.

Ric deu de ombros concordando e seguiu junto com Dina até a casa

da amiga dela. Anja estava em pé balançando freneticamente a mão

no cabelo, esperando por ela.

- Está atrasada, acusou Anja. – trouxe meus pães de batata, certo?.

Enquanto Anja tomava fôlego antes de começar a tagarelar com

Dina, ficou absolutamente imóvel. Ric saía por trás de Dina

encostando-se na mureta de entrada da porta. Cruzando os braços na

frente do peito, deu boa noite a Anja. Calada, olhou Ric da cabeça até

os pés.

Era um homem lindo, encostado olhando para ela, com aqueles olhos

verdes....

- MARAVILHOSOS.

- O que ? Perguntaram os dois juntos olhando em direção à Anja.

- Nada. – Eu disse que está na hora, o encontro vai começar em

quarenta minutos.

Page 78: St. Peter's Village

Se aproximando da amiga, Anja deu um sorriso torto para Ric e

arrastou Dina para um ângulo distante o suficiente para que ela

pudesse euforicamente falar.

- Onde foi que você encontrou esse gato? Aqueles olhos são

realmente de verdade?

- Esse é o cara que falei naquela noite, lembra? - Quando eu disse

que havia machucado meu joelho.

- Ta bom, só esqueceu de mencionar que ele é lindo. – Será que ele

tem um irmão?

Ric podia ouvir tudo o que as meninas estavam falando. Deus alguns

passos mais perto e mexeu com elas.

- Eu posso ouvir vocês, sabiam ?

No mesmo instante elas pararam de cochichar e posicionaram em

frente a ele.

- Eu só estava dizendo a Anja que eu conheci você outro dia. – Ela

mora aqui na cidade dede que nasceu e parecer não lhe conhecer.

Ric ficou calado alguns segundos pensando numa reposta convincente

quando um grupo de jovens que ia para o encontro na igreja, passou

pela porta da casa de Anja. Dentre eles estavam Lorena e Adan.

No mesmo momento Dina e Anja esquecerem completamente de Ric

e direcionaram toda sua atenção para Lorena.

- Olha só quem está ali parada na porta... A órfã. Debochou Lorena

para Adan.

- Olha só quem está passando, respondeu Dina. – A princesa vaca da

turma.

- Não fale desse jeito Dina, é feio ofender as pessoas.

- Só se a vaca estivesse aqui.

Anja olhou para Dina com expressão seria, mas rapidamente girou a

cabeça para Lorena.

- quem você chamou de vaca ?

- quem você chamou de órfã ?

Page 79: St. Peter's Village

Adan começou a rir baixinho com as replicas entre as duas e Lorena

deu uma leve cotovelada em seu ombro. Então ele se recompôs e

estreitou as vistas para Dina e Anja.

Ric não pode deixar de notar que Adan iria comprar a briga de

Lorena. Avançando um passo colocou-se na frente de Adan.

- Eu não acho legal um homem grandinho como você se meter em

conversas de meninas.

- Você acha é, eu não ligo a mínima para o que você acha.

Foi a vez de Adan se aproximar de Ric.

- receio que se você insistir em se meter com elas eu vou, ter que me

meter com você.

- Estou morrendo de Medo cara.

- Calma Ric. Disse Dina segurando seu braço. –Ele é um idiota,

vamos embora.

Adan então partiu para cima de Dina puxando-a com agressividade

para fora da varanda da casa de Anja.

- Quem é idiota ?

O puxão foi tão forte que ela tropeçou duas vezes antes de cair sobre

suas mãos e joelhos. Os outros garotos da turma de Lorena

começaram a rir de Dina fazendo com que ela fizesse cara de choro.

Quando Adan tentou se aproximar novamente sentiu uma mão

segurando seu ombro impedindo mais um passo e no segundo que

ele virou a cabeça, foi atingido no queixo por um soco de Ric.

- Eu não gosto de covardia. – Que tal alguém do seu tamanho, ou um

pouco maior?

O golpe foi tão forte que Adan cambaleou, mas Ric não o deixou cair

no chão, torcendo o braço de Adan até que ele gritasse de dor.

- Agora peça desculpas a ela.

- Não precisa Ric, já passou. Implorou Dina.

- Sim, precisa sim. – PEÇA DESCULPA. – AGORA.

Page 80: St. Peter's Village

Adan ajoelhado aos pés de Ric, uma mão no chão o outro braço

sendo torcido com um golpe de arte marcial não consegui falar nada

que fosse diferente de um chiado de dor.

- Pare Ric, por favor. – Você vai quebrar o braço dele.

- que seja então.

- PARE. Gritou Dina. – PARE AGORA OU NÃO VOU MAIS FALAR COM

VOCÊ.

Ric soltou Adan com tanta força que ele caiu de nariz sobre o chão de

terra batida. Lorena correu em direção ao corpo de Adan caído,

ajudando-o levantar. A expressão frustrada causada pelo golpe de

Ric, fez com que ele se mantivesse de cabeça baixa.

- Tire a mão de mim Lorena. Eu posso muito bem me levantar

sozinho.

O restante do grupo que os acompanhava foi se dispersando

vagarosamente em silêncio, Deixando para trás apenas Lorena e

Adan. Dina com as mãos em frente a boca, tentando sufocar o choro

olhou para Ric aterrorizada com que ele tinha feito. Anja se manteve

imóvel o tempo todo, parecendo não acreditar na situação, aquele

homem lindo também era muito forte.

Adan levantou a cabeça e fixou olhar em Dina e Ric.

- vocês um dia vão pagar por isso.

- Espero que esteja satisfeita, sua órfã vingativa. Gritou Lorena –

Covardes precisam de guarda-costas.

Virando as costas para Anja seguiu logo atrás de Adan que segurava

o braço torcido com a outra mão.

- Por que você fez isso com ele. - Podia ter quebrado o braço dele.

- Ele iria ti machucar, eu defendi você dele.

- Bem... Dina... Vou entrar enquanto vocês discutem de quem é a

culpa. Sussurrou Anja girando nos calcanhares seguindo para dentro

da sua casa.

- Mas não precisava ter feito aquilo. Que tipo de pessoa é você ?

Ric se aproximou de Dina e olhou bem dentro dos olhos dela.

Page 81: St. Peter's Village

- Sou do tipo que sobrevivi.

- É melhor você ir embora, estou atrasada para o encontro jovem na

igreja. Dina sussurrou com a cabeça baixa. – Nós podemos conversar

outro dia. – Amanha.

Ric pareceu concordar com ela, mas continuou calado. Dando um

passo para encurtar a distancia, esticou a boca na direção dos lábios

Dina, mas ela virou seu o rosto.

- Xau Ric.

Cerrando os punhos ele apenas deu as costas e andou em direção à

entrada da trilha que seguia para a floresta. No mesmo tempo Dina

entrou na casa a fim de encontrar com Anja.

Tomado de ódio Ric socava todas as arvores que estavam pela frente.

Nem Céu parecia estar por perto naquele momento. Sangrando pelos

anéis dos punhos ele não parecia se importar, continuando a bater

mais forte a cada tronco que surgia na sua frente.

Quando já estava bem longe da cidade, floresta à dentro. Ric parou

de andar e sentou numa pedra, olhando para a paisagem escura que

o cercava puxou um cantil cheio com água de santo Pedro. Bebeu um

gole e jogou o restante nos punhos sangrando. À medida que a água

caia o ferimento parava de sangrar e as suas mãos ficaram

completamente curadas.

Saindo da casa de Anja, Dina ainda estava muito abalada com a briga

de Ric e Adan. As meninas caminharam juntas a passos

sincronizados.

- Ei Dina, onde você achou esse guerreiro ninja?

- Eu o conheci na noite que machuquei meu joelho. – E você não

acreditou, lembra?

- Tá certo, agora eu acredito. Mas me conte como o conheceu. – Que

força. – Que olhos. – Que lindo.

- Ei calma ai, eu vi primeiro. – Digo ele, me achou primeiro. – Não sei

de onde nem como ele apareceu, mas na noite que eu saí do

psicólogo eu levei um tombo feio e cortei meu joelho. – Ric

simplesmente apareceu do nada me oferecendo ajuda.

- Apareceu do nada como ? - Com mágica, Como um fantasma ?

Page 82: St. Peter's Village

Um arrepio subiu pela coluna de Dina quando Anja falou aquela

palavra. Fantasmas eram muito comuns na infância de Dina. Foi uma

época tensa que e graças a Deus tinha passado.

- Não acho que ele seja um fantasma, ainda mais com aqueles olhos

verdes.

As duas garotas começaram a rir.

- Viu como ele defendeu você ? - Ele gosta de você.

- Parece que sim. – E eu o mandei embora.

- você não fez isso, fez?

- Fiz sim, eu não sabia o que fazer... Ai ele chegou mais perto, eu

achei que ele iria me beijar de novo e, eu dei XAU pra ele.

- Beijar de novo? - Ele já beijou você antes?

- Errr beijou.

- E você não me conta uma coisa dessas. – Como pode esconder isso

de mim.

- Eu ia contar pra você, só não tive tempo. – Eu estava pensando que

seria mais interessante contar a você outra coisa.

- O que pode ser mais interessante que um beijo daquele homem

lindo?

- O endereço da casa desmoronada, por exemplo. – Eu consegui.

Anja ficou calada por apenas um segundo, mas continuou a andar. As

duas tagarelaram até a entrada da igreja. O Encontro jovem havia

começado há alguns minutos antes, então elas se apressaram.

Page 83: St. Peter's Village

ALDEIA de SANTO PEDRO

Água

Os pensamentos de Ric

8

Continuei a caminhar sozinho ignorando completamente os

chamados de Céu que me seguia um pouco mais distante, sabendo

perfeitamente que quando eu estou nervoso, não gosto que fiquem

ao meu lado.

Depois que a água curou meus ferimentos, após ter socado cada

arvore que aparecia na minha frente, eu fiquei pensando no que

havia feito. Longos anos longe da sociedade me transformaram em

um homem perigoso.

Como pude ter perdido a cabeça. Como pude me expor na frente de

todas aquelas pessoas, na frente de Dina.

O que ela está pensando sobre mim agora. Eu não posso perdê-la, eu

não posso ficar longe dela. Eu me sinto sufocado, quando penso que

Page 84: St. Peter's Village

ela não vai querer me ver nunca mais. O cheiro do cabelo dela ainda

está presente nos meus pensamentos ainda posso senti-los entre

meus dedos.

Desde que mamãe morreu, nunca mais tive contato com outra

pessoa como eu tenho com Dina.

[Flashback]

A vida com meu pai em santo Pedro não era a vida que eu queria ter

tido. Todos os dias antes do café da manha nós tínhamos que treinar

duro, muito mais forte que o treinamento que tínhamos quando

morávamos fora da floresta, na cidade.

Mamãe já não possuía o mesmo sorriso, estava sempre com o

semblante triste dia após dia. À medida que o tempo passava, meu pai

parecia ficar cada vez mais louco e Ram estava ficando mais forte que

eu ou Edie juntos.

Ram já não falava comigo da mesma forma como ele falava na antiga

casa. Mesmo com nossas brigas diárias, por causa das besteiras que eu

fazia, ele sempre se aproximava, mas desde que papai prometeu dar

sua espada para um único filho, Ram decidiu que a espada tinha que

ser dele.

Minha mãe fazia de tudo juntar a gente, mas ela não conseguia de jeito

nenhum. Eu e meus outros dois irmãos, estávamos ficando distantes

um do outro. Nada podia reunir a família.

Meu pai era muito arbitrário. Obrigava todo mundo a beber da água de

santo Pedro, apesar dele odiar esse nome. Minha mãe foi a única pessoa

que ele não forçou a beber, mas eu acho que ele deveria ter forçado.

Talvez se ela tivesse bebido da água de santo Pedro, ela ainda

estivesse viva, e aqui comigo.

Talvez com minha mãe ao meu lado eu saberia como tratar melhor

Dina. Ela merece que eu a trate bem. Ela merece que eu a trate com

amor. Mas eu não sei amar, eu não sei estar com uma garota.

A única coisa que eu aprendi foi lutar e sobreviver nessa floresta

maldita, a qual eu estou condenado a ficar até minha morte.

Page 85: St. Peter's Village

Eu preciso vê-la, eu preciso estar com ela. Tenho que fazê-la me

perdoar, mas eu não sei como vou fazer. Eu não sei como falar com

ela, eu não sei como dizer a ela para não se afastar de mim.

Dina me olhou como se tivesse medo de mim. Eu não quero que ela

tenha medo de mim. Eu sei como é ter medo de alguém, eu tive

medo do meu pai, todos os dias que morávamos em santo Pedro.

Ele me obrigava a beber da água todos os dias. Ele forçava Edie a beber

também, só Ram não era forçado a beber da água, só Ram era o único

que não mostrava medo pelo meu pai. Teve momentos que mamãe

aparentava estar com medo dele também.

Ter medo é uma condição insuportável quando eu era criança, a cada

olhar e a cada passo que meu pai dava perto de mim, um arrepio

pavoroso subia pelas minhas costas.

Quando não estava satisfeito, meu pai nos cortava de propósito só pra

ver a água curando de volta. Apesar de a cura ser imediata, a dor que

sentíamos com o aço da espada dele era insuportavelmente de morrer.

Antes de chegar ao acampamento preciso esfriar minha cabeça e o

lago parece ser uma boa ideia. Não imagino alguém do clã de Ram

vindo aqui há essa hora. Edie provavelmente deve estar preocupado

comigo, mas eu não estou com paciência para ouvi-lo reclamar sobre

onde eu estive, ou o que eu fiz com aquele cara.

O lago está calmo e a temperatura da água está agradável. Na pedra

grande, ali pertinho da margem parece um bom lugar para deixar

minhas roupas. Uma das coisas que eu mais gosto aqui nesta floresta

maldita é o banho no lago.

Nadar sob a luz da lua, absolutamente nu, seria uma coisa que faria

meu pai me bater durante uma semana inteira. Mas ele está morto e

os mortos não batem em ninguém.

Eu poderia trazer Dina para conhecer o lago, pode ser que ela me

perdoe. Quem sabe ela até nade comigo. Isso me parece uma boa

ideia. Nadar com Dina aqui seria maravilhoso. Está de decidido, vou

trazê-la aqui.

QUE BARULHO FOI ESSE.... Melhor eu mergulhar e pegar minhas

roupas. Minha espada está aqui, vou desembainha-la devagar, sem

ruído.

Page 86: St. Peter's Village

AHHHHHH Céu... É apenas você. Eu podia ter machucado você, meu

amigo.

Nadar aqui e pensar em Dina me acalmou bastante, mas ainda não

estou satisfeito com o que aconteceu. Melhor voltar para o

acampamento ou Edie vai me torturar o resto da noite. Se eu chegar

em silencio talvez ele não perceba que eu cheguei.

Page 87: St. Peter's Village

ALDEIA de SANTO PEDRO

Água

Fantasmas do passado

9

- Te vejo depois do almoço então, tenho que fazer algumas

anotações sobre a festa do solstício. – Por que você não se oferece

para organizar junto comigo?

- Eu não sou muito boa para organizar festas Anja, eu acabei de

chegar na cidade, lembra? - Não esquece que você prometeu ir

comigo ver a casa desmoronada.

- Como poderia esquecer Dina. – Você comenta comigo a cada cinco

minutos.

- Certo.

Elas saíram da escola juntas abraçadas aos seus cadernos. Estavam

tão alegres com os assuntos da festa e da casa desmoronada que

esqueceram completamente de Lorena e Adan.

Page 88: St. Peter's Village

- Ei Dina, reparou como Lorena ficou calada durante toda a aula. –

Adan não apareceu na escola hoje, matou aula.

- Você tinha que me lembrar disso. – Agora acabou com o resto da

minha manhã.

Dina preferia não ter lembrado do que aconteceu na noite passada. A

lembrança de Ric quase quebrando o braço de Adan a deixava com

estomago embrulhado. Nunca tinha presenciado uma briga quando

morava na cidade grande e em menos de quinze dias morando na

pequena cidade ela havia brigado com Lorena na porta da escola e

visto Adan brigar com Ric na porta da casa de Anja.

- Vou entrar, Disse Anja mergulhando para dentro de casa. – Mais

tarde eu apareço na sua casa.

- Vou esperar.

Enquanto Dina seguia rua a cima para sua casa, Anja emergiu da

porta da casa dela e ficou observando a rua. Estava tudo calmo, mas

Anja tinha a impressão de que alguém estava vigiando.

Lucaar estava observando Anja a uma boa distancia sem que ela

pudesse vê-lo. Desta vez ele não saiu da floresta acompanhando

Ram, um impulso que nem mesmo ele podia compreender fez com

que uma imensa vontade de ver Anja surgisse em sua mente.

Anja não viu nada, estalou os lábios e entrou batendo a porta atrás

dela.

- Oi Vó, cheguei. Falou Dina entrando em casa como o próprio

furação Katrina.

- Você conseguiu descobrir quem são os pais daquele rapaz querida?

Dina sequer tinha perguntado a alguém sobre os pais de Bob.

- Não vó, ninguém conhecia os pais dele. - Não se preocupe, noticia

ruim chega rapidinho.

- Você esta com fome? - Eu preparei bife com batatas fritas.

- Obaaaa, em alguns minutos estarei ai em baixo.

Dina havia acabado de sair do banho, ainda estava com seus cabelos

molhados, mas não se importando em molhar as suas roupas vestiu

Page 89: St. Peter's Village

um shortinho jeans combinando com uma bonita blusa branca com

um cavalo estampado na frente.

O cavalo estampado na blusa era de um tom acinzentado e os olhos

estavam ornamentados com paetês azuis. Sua mãe deu a ela de

presente e Dina adorava aquela blusa.

Calçando tênis cano baixo, Dina correu em direção as escadas que

levavam ao primeiro andar da casa. Parando na frente da escada ela

olhou para baixo e com um sorriso audacioso, saltou à escada

aterrissando na metade dela, entre os degraus. Ainda sorrindo para si

mesma, outro salto e estava no andar de baixo.

Vó Augusta ouviu o barulho da aterrissagem de Dina na sala.

- Querida, você está bem? - Você caiu?

- To bem vó. – Onde estão as batatas fritas.

Embora a refeição não ter durado muito tempo, as duas

permaneceram sentadas conversando. Relembraram o tempo que os

pais de Dina eram mais jovens. Eles se conheceram ali na mesma

cidade.

A mãe de Dina era filha de costureira. Mãe solteira que trabalhava

muitas horas na frente da máquina só para poder ter o que comer

todos os dias. A conversa sobre o passado dos pais de Dina

aproximava as duas, neta e avó. Entretanto, Dina não parava de

espiar o relógio. Anja provavelmente bateria na porta a qualquer

momento.

Dina estava fascinada com a ideia de conhecer o local onde a casa da

havia desmoronado, onde a família com três filhos havia sido

soterrada viva. Depois de anos como estariam os escombros com

ação do tempo. Tudo isso era uma duvida para Dina.

Vó Augusta ouve uma batida na porta. Junto à impaciência de Anja

por trás dela. Não se sentindo ofendida pela atitude da adolescente,

dá espaço para ele entrar com sorriso nos lábios marcados com as

linhas da idade.

- entre querida, Diana está na cozinha.

Anja deslizou da porta de entrada até a porta da cozinha para ver

Dina absorta em seus pensamentos.

Page 90: St. Peter's Village

- Dina, vamos ou não ver a casa?

- shhhhh, fale baixo, minha vó proibiu de ir lá. – Vamos dizer que

vamos a biblioteca.

- Você sabe que eu não gosto de mentir.

- Não vamos mentir. – Realmente vamos a biblioteca.

- Fazer o que?

- Na volta, quero pesquisar sobre as pessoas que moravam lá, deve

ter alguma coisa que possa dar mais informações.

As duas seguiram para fora da casa e Dina retirou da sua mochila o

papel com endereço que Paulo havia lhe dado na ultima sessão. Elas

desceram ruas e subiram ruas até pararem na porta de um moinho

velho.

- Tem certeza que você sabe onde fica esse endereço. Perguntou

Dina enquanto secava o suor da testa com a gola da camisa.

- Claro que tenho, é no final daquela rua de terra ali. – Minha mãe

não quis ajudar. - Enrolou para me falar onde era a casa, mas deixou

escapar que ficava logo depois do velho moinho.

- Se sua mãe tivesse dito onde ficava a casa, me pouparia tempo e

eu não teria que ter prometido um desenho para o doutor Paulo.

- Quem é esse Paulo?

- O psicólogo da cidade ué. – Você mora aqui há mais tempo que eu

e não sabe.

- O único psicólogo da cidade é o doutor Cipriano. - Não sei quem é

Paulo. – Será que ele se aposentou?

- Não importa, vamos logo com isso.

Dina seguiu Anja e as duas subiram a rua de terra. Foi uma

caminhada longa de 15 minutos a passos cansados.

- Será que estamos chegando? - Eu não aguento mais caminhar.

- Não vim até aqui para desistir agora que estou tão perto Anja. –

Estamos quase no final do morro.

Page 91: St. Peter's Village

- Se eu soubesse que essa rua levava na subida de um morro, teria

calçado um tênis mais confortável. – Essas sandálias estão me

matando, meus pés estão imundos.

Quando chegaram lá em cima avistaram um grande portão de ferro

todo enferrujado. Compondo o portão o muro ainda cercava toda a

propriedade. Velho e com vegetação grudada nele, não se podia ver o

que realmente o muro cercava. Dina e Anja espicharam os olhos em

todas as direções admirando a imensidade que era aquilo tudo. De

um lado a descida do morro que terminava na cidade, do outro lado a

floresta quase encostando na lateral do muro.

Elas se aproximaram do grande portão e Anja observou uma letra

entalhada nele. Apesar de todo aquele ferrugem proveniente da ação

da chuva e outros fatores do tempo podia-se ler muito bem a letra B.

- O que deve ser esse B? perguntou Anja tirando pedrinhas que

entraram em sua sandália.

- Acho que deve ser a inicial de barão.

- O que?

- BARÃO. – O dono disso tudo aqui não se chamava barão?

- É pode ser. – Como vamos entrar agora.

- Pelo portão. Ou você acha que alguém se lembrou de trancar depois

que foi embora. – Depois que sepultou toda uma família.

Anja deu com ombros e abriu espaço para que Dina avançasse na sua

frente. Colocando a mão na maçaneta, deu um leve giro e empurrou

de vagar fazendo o portão ceder. Caindo do lado de dentro da

propriedade fez um enorme estrondo e os pássaros levantaram voo.

As duas levaram um baita susto e giraram suas cabeças em todas as

direções pra ver se alguém havia escutado o barulho da queda do

portão.

- Mas que merda Dina.

- Ei, olha o palavreado. – É você quem diz que não devo usar certas

palavras.

- Desculpa, mas não tinha como eu ficar calada. – Você destruiu o

portão, e agora?

Page 92: St. Peter's Village

- Quem vai reclamar com a gente ?

- Não tinha pensado nisso.

– Vamos entrar logo antes que você se arrependa.

- Merda, já me arrependi.

- Olha a boca suja.

A duas meninas seguiram para dentro rindo uma da outra. O portão

ficou lá no chão. Estava longe, mas elas puderam ver onde era à

entrada da casa. Logo depois da entrada do portão podia-se imaginar

o que antes havia sido um jardim frontal, no chão uma passadeira

feita de pedras achatadas pareciam um grande tapete cinza que

levavam até a entrada principal da casa. Nas laterais podia notar que

na época o local era destinado às baias dos cavalos.

A propriedade não parecia ser uma fazenda, nem mesmo chegava

perto de ser um sitio. Mas, era muito grande o espaço físico do lado

de fora da casa. Tão grande que cavalos podiam caminhar soltos. À

medida que elas se aproximavam da casa uma imagem triste tomou

conta do campo de visão de Anja e Dina. Os escombros da casa já

eram possíveis de ver.

Dina ficou parada ali na frente olhando tudo que estava em volta.

Anja caminhava de um lado para outro não sabendo onde colocar o

pé para firmar-se parada. Dina viu os restos de degraus de uma

escada que levava ao andar de cima, embora estivesse destruído

ainda restava uma laje onde se podia andar. Olhando mais para a

direita pode ver em baixo de uma coluna uma poltrona ou o que

parecia ser uma poltrona, por causa do resto de tecido junto com

madeira podre.

Plantas cresciam por entre os tijolos e telhas quebrados espalhados

pelo chão. Uma ou duas paredes ainda sobreviveram em pé, ou o que

sobrou delas. O escombro estava misturado á mobilha velha de

madeira estragada e acessórios que adornavam a casa. Até louça

podia ser reconhecida no chão.

Molduras quebradas também estavam espalhadas por toda parte. A

família tinha muitos quadros e perdeu tudo. Em meio a todo aquele

passado destruído, Dina e Anja caminharam para dentro pulando

cada pedra, cada tijolo e cada móvel quebrado. Passo a passo

Page 93: St. Peter's Village

conseguiram chegar num cômodo que foi reconhecido imediatamente

como a cozinha da casa.

O forno artesanal, não havia sido destruído. Construído com pedra e

argila parecia ser a única coisa que restou em pé.

- Meu Deus. Falou Anja fazendo sinal da cruz. – Realmente não tinha

como alguém sobreviver a esse desmoronamento.

- Eu fico imaginando se eles morreram na hora ou ficaram

agonizando algum tempo. – As crianças e a baronesa estavam na

casa. – Minha avó disse que o barão morreu um pouco depois

tentando ajudar.

- Venha Anja. – Vamos tentar ir lá em cima.

- Ficou louca, não tem nada lá em cima. – Só um resto de escada e

uma laje que pode desabar a qualquer momento.

- Se você não quiser eu vou sozinha. – Lá deveriam ser os quartos. –

Eu gostaria de ver.

- Eu não vou mesmo. – Irei ficar observando você daqui de baixo. –

Se acontecer alguma coisa eu dou cobertura. – Alguém terá que

buscar por socorro.

Dina transpôs os escombros até chegar na base da escada.

- Essa eu não vou poder subir correndo. Falou baixinho em tom que

Anja não pode perceber.

- tenha cuidado, por favor. Disse Anja com as mãos agarradas ao

crucifixo, baixinho sem que Dina pudesse ouvir.

Dina colocou o pé no primeiro degrau e nada aconteceu. Tomou

coragem e colocou o outro, e mais um, e mais um. Quando estava no

ultimo degrau antes de pisar no andar superior viu um objeto

brilhando em baixo de uma tábua apodrecida. Escorregou a mão por

baixo da tabua e suspendeu um cordão dourado e um pingente com

um pequeno retrato.

Era a fotografia da baronesa com uma criança no colo. Dina ficou

alguns segundos olhando a foto enquanto deu mais um passo para

estar completamente no segundo andar da casa. Sentindo um

estranho pressentimento, recuou de imediato de volta a escada. No

mesmo instante tudo o que sobrou do segundo andar da casa

Page 94: St. Peter's Village

começou a desabar. Mais que depressa Dina desceu o restante dos

degraus como descia em sua casa. Anja lá de baixo gritou o mais alto

que pode.

- Dina cuidadoooooo.

Dina parecendo um gato conseguiu passar pelo ultimo degrau com

um salto aterrissando próximo ao caminho que levava de volta a

cozinha. Agarrando Anja pela mão as duas ficaram olhando a laje

desabar.

- Não caiu completamente, veja. – Foi só aquela parte onde você

pisou.

- É depois da escada está um buraco. – Não tem como eu passar por

ali.

Anja virou-se assustada para Dina.

- Você não pretende voltar ali, certo?

- Bem, acho que agora que você comentou, não pretendo mais ir lá

mesmo.

- O que é isso na sua mão? Perguntou Anja olhando para o cordão

enrolado na mão de Dina.

- Eu achei lá em cima antes de começar a cair. – Acho que é ouro

puro. – É bem pesadinho e tem uma foto da baronesa aqui no

pingente.

Anja verificou o cordão e viu que atrás do pingente tinha um brasão

com a letra B entalhada. A imagem da letra era muito parecida com a

imagem que elas virão no portão de ferro caído na entrada da

propriedade.

- Você não vai ficar com isso Dina. – Você não pode ficar com isso.

- Claro que eu não vou ficar com o cordão. – Minha avó disse que

tem um cemitério aqui na casa, onde a família foi enterrada.

- Sim e daí. Perguntou Anja.

- Daí que eu pretendo deixar esse cordão lá.

Anja pareceu não acreditar nas palavras de Dina e começou a

tagarelar gesticulando com os braços.

Page 95: St. Peter's Village

- Dina, você é maluca. – Até ai eu sei, mas pegar um cordão e ir

atrás de um cemitério é um pouco de mais, até pra você.

- Não faz drama Anja. – Vamos lá, por favor. - Chegamos até aqui. –

Agora vamos explorar tudo.

Anja assentiu e depois balançou a cabeça inúmeras vezes até que

elas duas estava do lado de fora, nos fundos da casa desmoronada.

Seguiram andando à procura do cemitério onde a família teria sido

enterrada pelos empregados da casa.

- Como vamos achar ? - Aqui é muito grande. – Pode estar em

qualquer lugar. Resmungou Anja.

- Vovó disse que estava perto da floresta, ou algo parecido. – Então é

lá que devemos começar a procurar.

Elas perambularam pelos fundos da propriedade a fim de achar o

cemitério. Dina estava determinada. Anja estava completamente fora

de sintonia. Caminhando cada vez mais distante da entrada da

propriedade, elas se aproximaram dos arredores da floresta. Onde

não existia muro dividindo as terras. A vegetação da floresta estava

praticamente invadindo a propriedade. Já não se podia definir onde

era floresta e onde era propriedade da casa.

Em meio a alguns arbustos Dina conseguiu visualizar algo muito

parecido com uma lapide. Estava coberta com musgo ou alguma

outra planta que ela não sabia qual era. Mas a única certeza que ela

tinha era que havia achado o cemitério.

- Ali. – Achamos.

- Onde?

- Ali atrás daqueles galhos. – Vamos lá Anja. – Corra.

Dina começou a correr em direção ao cemitério, Anja seguiu logo

atrás com passos mais cautelosos. Dina e Anja pararam em frente da

lápide. Ficaram em silencio alguns instantes até que Dina girou a

cabeça ao redor percebendo outras lápides.

- Cinco túmulos. – Cinco pessoas enterradas aqui. Contou Dina,

- O barão, a baronesa e os três filhos. Acrescentou Anja.

- Ótimo, me ajude a identificar qual é o tumulo da baronesa. – Vou

colocar o cordão sobre ele.

Page 96: St. Peter's Village

As garotas começaram a arrancar os galhos e plantas com as

próprias mãos. Insetos começaram a sair das raízes à medida que

elas retiravam toda a vegetação que crescia sobre as lápides.

Dina, com as mão cordadas por causa das plantas, abaixou a cabeça

na base de uma lápide. Começou a retirar a folhagem de baixo para

cima e pode perceber que havia um epitáfio. Na placa estava escrito

apenas o nome de uma pessoa, possivelmente de um dos membros

da família. Dina passou a mão por cima da placa para comprovar que

talvez o nome escrito pudesse ser da baronesa.

Enquanto Anja com medo dos insetos, limpava outra lápide ao lado

de forma mais lenta com todo cuidado para que nenhum deles

pulasse em seu cabelo.

À medida que Dina limpava a placa conseguia ver letra após letra, e

quando aplaca ficou completamente limpa ela viu que era o nome de

um homem que estava escrito nela.

Seu coração começou a bater mais acelerado, ela ficou totalmente

amedrontada e confusa Quando leu o nome. E foi ali que Dina caiu

sentada, parecendo não acreditar nas letras que formavam aquele

nome.

- Richard Baleares. – Não pode ser. Sussurrou baixinho.

Subitamente, Dina se levantou e saiu correndo para longe do

cemitério, passando por Anja que, sem entender nada correu atrás de

Dina.

Com os pensamentos confusos e uma lembrança do passado, Dina

parou, sem fôlego, próximo a um tronco de arvore seco, caído no

chão.

Anja conseguindo alcançar Dina, parecendo um pimentão vermelho

por causa da corrida.

- Dina o que ouve? Perguntou Anja com suas bochechas

avermelhadas.

Dina sentou-se no chão de costas viradas para o tronco. Com seu

corpo todo tremendo ela abraçou seus joelhos, afundou a cabeça

entre eles e começou a chorar. Tudo o que vinha na sua mente eram

duas imagens.

Page 97: St. Peter's Village

O nome na lápide: RICHARD BALEARES e Ric se apresentando na

noite em que se beijaram pela primeira vez.

... Eu me chamo Richard Baleares, muito prazer...

Anja ainda não estava entendendo a reação de Dina encolhida no

chão.

- Dina, me diz o que houve. – O que aconteceu? - Você se cortou com

um galho seco? - Algum inseto lhe mordeu?

Com os lábios trêmulos e a boca completamente seca Dina se

esforçou ao máximo para tentar explicar à amiga o que estava

acontecendo.

- Ele é um fantasma Angélica. – É um espírito. – Isso não pode estar

acontecendo comigo novamente. – Não quando meus pais não estão

por perto para me ajudar.

Anja com os pelos da nuca arrepiados levantou a cabeça achando

esquisito o que a amiga estava revelando e com as mão na cintura

perguntou impertinentemente.

- Quem é fantasma ? - Sobre o que você esta falando ?

Dina enxugou as lagrimas com as mãos sujas e tentou explicar

melhor à Anja.

- Anja, Ric é um fantasma. – Eu vi o nome dele escrito na placa de

epitáfio da lápide. RICHARD BALEARES.

- Mas o que exatamente Ric tem haver com esse Richard?

- Anja acorda. – o nome do Ric é RIHARD BALEARES. – São a mesma

pessoa.

Anja pensou um momento, coçou a cabeça e respondeu à amiga.

- Pensou na possibilidade de um homônimo? - isso acontece muito.

- Anja ele é um fantasma. – Acredite. – Quando eu era criança eu

podia ver espíritos por ai, você não se lembra?

- Sim, claro que eu me lembro sim. – Você até viu o fantasma do

falecido da sapataria, ficamos com medo de sair na rua um bom

tempo e... – Pera ai... AGORA EU ESTOU COM MEDO. – Ric é um

fannnnntasma.

Page 98: St. Peter's Village

- É que eu estou tentando lhe dizer faz cinco minutos.

- VAMOS SAIR DAQUI DINA. – Esse lugar é amaldiçoado. – VAMOS

LOGO, ANDA.

- Mas e o cordão? - Eu ainda não...

- DEIXA ESSA DROGA PRA LÁ. – Vamos embora. – Você quase

morreu no desabamento a pouco lá na casa e agora viu a lápide de

um fantasma. – Isso é um aviso de Deus. – Vamos.

Enquanto Dina se levantava, Anja começou a correr. Em pouco tempo

as duas estavam alcançando o grande portão de ferro caído no chão.

Sem olhar para trás elas saltaram sobre o portão como um cavalo de

equitação salta o obstáculo na prova.

Elas só pararam de correr quando a inclinação da ladeira de terra

tornou-se perigosa. Uma queda lá de cima não faria bem a saúde de

nenhuma das duas. Já estava quase anoitecendo quando as duas

estavam no centro da pequena cidade novamente.

- E agora o que faremos? Perguntou Anja.

- Não sei de você. – Eu vou continuar caminhando, por que não

aguento mais correr. – Acho que nenhum fantasma vai perseguir a

gente agora.

- Eu sei muito bem para onde vou. Afirmou Anja.

- Onde?

- Para a igreja. – Onde mais?

- Anja o que especificamente você vai fazer na igreja? Perguntou

Dina olhando para Anja.

- Eu vou orar pela alma de Ric ou Richard seja lá quem ele seja. –

Não quero um fantasma puxando meu pé por ter violado seu leito de

morte. – Muito menos enquanto eu durmo.

- Melhor não comentar isso com ninguém Anja. – Não queremos fazer

alarde e não queremos que as pessoas nos chamem de loucas.

- certo, vou orar em pensamento. – Xau Dina, nos vemos amanha. –

Vá pra casa, não fique na rua.

Page 99: St. Peter's Village

- Como se eu tivesse com quem ficar na rua. Dina resmungou

baixinho enquanto Anja andava depressa em direção à igreja.

Dina se dirigiu a passos rápidos em direção a sua casa, ao contrario

de Anja muito cautelosa e zelosa, Dina não parava de penar no nome

da lapide. RICHARD BALEARES.

Quando Anja estava quase na porta de igreja reparou um vulto

escuro na construção que ficava mesma rua, um pouco mais adiante.

Anja estremeceu quando o vulto se movimentou em direção a ela. A

menina de cabelos louros congelou ali mesmo.

À medida que o vulto se aproximava, a forma de uma figura

masculina surgia e a cada passo mais próximo, um homem vestido

de preto desde os calçados até a blusa gola V, aparecia diante de

Anja.

- Boa noite moça? Cumprimentou Luccar

Anja permaneceu congelada, muda.

- Desculpe se eu lhe assustei. – Não era minha intenção.

Respirando fundo e levando as mãos por entre as mechas louras

assentando os fios rebeldes. Anja conseguiu soltar uma palavra.

- Oi.

- Você está tão assustada assim por minha causa?

Um pouco mais relaxada, a loura conseguiu falar com o estranho.

- Na verdade eu estava muito assustada mesmo. – Ainda estou. –

Não queria ver um fantasma, digo espírito ahhhh deixa pra lá.

- Fantasma? - Espírito? Perguntou Lucaar intrigado com a beleza da

garota.

Anja não estava tão arrumada e suas sandálias estavam muito sujas

por causa da caminhada sobre terra com Dina até a casa

desmoronada.

Mas Lucaar fixou sua atenção nas madeixas louras quase cacheadas

que escorriam até a metade das costas dela. A pele branca queimada

de sol combinava com os olhos cor de mel que Anja exibia em seu

rosto.

Page 100: St. Peter's Village

- Desculpe, mas eu não tenho tempo agora. - Preciso urgentemente

rezar por uma pobre alma. Falou Anja em tom de desabafo.

- Tudo bem eu não pretendo atrasar a senhorita. – A propósito.

Acrescentou Luccar.

- O que? Perguntou Anja olhando para ele enquanto subia o primeiro

degrau da igreja.

- Reze também pela minha alma moça.

Anja ficou parada olhando para o rapaz que virou em direção a

escuridão da rua e caminhou até que ela não pudesse mais vê-lo.

Soltando um suspiro profundo ela virou em direção à porta da igreja

e mergulhou para dentro.

Enquanto Anja já estava segura dentro da igreja, Dina ainda

perambulava pelas ruas. Estava tão desavisada que tomou o caminho

mais longo até sua casa. Ela caminhava numa calçada com

praticamente nenhuma iluminação. Beirando a calçada a escuridão da

floresta fazia companhia para ela que não estava prestando atenção

em nada que estivesse ao seu lado.

Quando se deu conta que estava andando para mais distante da sua

casa, Dina avistou o antigo chafariz em que ela e Ric haviam se

beijado. Um arrepio eriçou os pelos do braço dela e imediatamente

fez com que ela tomasse o caminho direto para casa. Tudo que ela

menos queria que acontecesse naquele momento era ver um

fantasma.

Quando criança Dina conseguia ver coisas que outras pessoas não

viam. Espíritos de gente que ela não conhecia apareciam para ela.

Durante o dia e especialmente à noite.

Quanto os pais de Dina, após leva-la em uma serie de médicos de

varias especialidades, finalmente acreditaram nas coisas que ela

falava e decidiram levar a menina em um centro espírita para falar

com uma Yalorixá. Era um passado que ela não queria lembrar, não

quando estava passando pela mesma experiência novamente.

Decidida deixar toda a historia da casa desmoronada de lado como

sua avó havia prevenido, juntamente com a possibilidade de ter visto

o fantasma de um dos filhos de sua ex-aluna. Dina começou a colocar

os pensamentos em ordem quando topou de frente com Ric.

Page 101: St. Peter's Village

O susto foi tão grande que ela soltou um grito forte e os pássaros que

estavam dormindo nos galhos das arvores da floresta ali do lado,

começaram a voar de um lado para outro.

- Calma Dina. – O que houve? perguntou Ric tranquilamente.

- Sai daqui. – Nãoooooooo de novo não. – Gritou Dina fazendo sinal

enxotando Ric com as mãos.

- Dina, se é sobre ontem, me desculpe. – Eu não queria machucar

aquela cara.

Dina caminhou para trás dobrando os joelhos no chão.

- ME DEIXE EM PAZ. – Pai nosso, que estais no céu...

- Dina, agora você esta me deixando preocupado. – Quer se levantar,

por favor.

- Não toque em mim. – Fantasmas não tocam nas pessoas, só as

assustam. – fantasmas não beijam. Falou Dina em tom de desespero

com a cabeça mergulhada entre as mãos.

- Eu não sou um fantasma.

No mesmo momento Dina levantou a cabeça.

- Como?

- Dina, eu sou um idiota. – Mas fantasma eu não sou.

Limpando seus joelhos enquanto levantava, Dina olhou bem dentro

dos olhos de Ric. Chegou mais perto e pode ver que o verde daqueles

olhos sedutores estavam lá bem vivos e no mesmo instante

constatou que ele não era de fato, um fantasma.

- Quem é você? - Se você não é um fantasma me diga quem é você.

- Eu sou Richard, não se lembra? - Falei com você outro dia.

- MENTIROSO. – Você não pode ser quem diz que é. - Me diga a

verdade. – AGORA.

- Eu estou dizendo a verdade. – sobre o que você está me acusando?

Ric tentou se aproximar de Dina, mas ela recuava a cada passo que

ele movia na direção dela.

Page 102: St. Peter's Village

- não me toque. – Eu vi o que você fez com Adan ontem. – Não

chegue perto de mim.

- Eu jamais machucaria você Dina. – Eu vim aqui hoje exatamente

para pedir desculpas sobre o que eu fiz ontem.

- Me diga quem é você. – O que é você? - Um bandido, estelionatário

ladrão de bancos ? - Me diga a verdade.

Ric ficou parado alguns segundos antes de segurar com as duas mãos

nos ombros de Dina que se encolheu tentando se soltar do aperto.

- Dina eu sou Richard. – Você tem que acreditar em mim.

- Eu não posso acreditar em você, me solta. - Você não é Richard.

- Por que você acha isso.

- Richard Baleares está morto.

Naquele momento quem congelou foi Ric. Soltando imediatamente

Ric abaixou as mãos e fixou os olhos verdes em direção à boca de

Dina.

- O que você está dizendo? - Eu não estou morto, eu estou vivo bem

aqui na sua frente. – Você falou alguma coisa sobre mim para

alguém? - Alguém disse que eu estava morto.

- Quem faz perguntas aqui sou eu. – Richard Baleares está morto. –

Eu vi o tumulo dele hoje à tarde.

A expressão de Ric mudou para um semblante triste misturado a uma

raiva selvagem e Dina pode ver que os olhos dele estavam brilhando

por causa das lagrimas que relutavam em sair.

- Eu não estou morto. Falou Ric em tom baixo. – Por muitas vezes eu

desejei estar morto. – Por muitas vezes eu quis morrer, mas eu estou

vivo infelizmente.

- Eu não acredito em você.

- De que túmulo você esta falando Dina?

- O Tumulo de RICHARD BALEARES e do resto da família dele. –

Todos os túmulos estão lá. – Os cinco lápides correspondentes a toda

à família.

- A família? Perguntou Ric parecendo não acreditar no que ela dizia.

Page 103: St. Peter's Village

- Exatamente, a família. – O barão, a baronesa e os três filhos mortos

no desmoronamento da casa.

- Desmoronamento? A minha casa desmoronou? Ric engolia a seco

cada palavra pronunciada.

- Sua casa? perguntou Dina descrente. – Está mentindo de novo.

Ric caminhou ate o velho chafariz e sentou no degrau da base, Dina o

seguiu e ficou em pé parada na frente dele.

- Dina, onde foi que você viu essa casa?

- Subindo á rua depois do velho moinho. – Tudo aqui parece ser

velho.

- Não pode ser. Murmurou Ric. – Minha casa não caiu, ela estava em

pé quando nós saímos. – Você viu a casa errada.

- Eu vi a casa certa. – Tinha um enorme portão de ferro na entrada

com a letra B entalhada nele. Dina já parecia estar mais calma. – E

eu achei isso lá dentro. Ela mostrou o cordão com o pingente à Ric.

Ric avaliou o cordão e tomou da mão de Dina, a fazendo ficar

novamente nervosa.

- Essa é minha mãe Dina. – Onde você encontrou isso, foi meu pai

quem deu a ela.

- Estava no andar de cima... - Nos escombros.

Ric ficou olhando fixo para o pingente, Dina não tinha certeza, mas

podia jurar que ele estava chorando. Comovida com a reação de Ric,

ela sentou-se ao seu lado.

- E esse no colo dela sou eu.

Dina parecia não acreditar no que estava ouvindo, era muita

informação para processar depois do susto mais cedo no pequeno

cemitério.

- me conte a verdade Ric. – Se você quer que eu acredite em você,

precisa me contar toda a verdade.

- Agora nem mesmo eu sei o que é verdade agora Dina. – Só sei até

a parte que saímos da casa durante a noite. – Durante a tempestade.

Page 104: St. Peter's Village

Na noite da tempestade, quando eu tinha sete anos, meu pai ordenou

que nossa família fizesse as malas. Minha mãe estava apavorada, eu e

meus irmãos também. Saímos no meio da noite em uma pequena

caravana com as empregadas de minha mãe e alguns cavalos.

Meu pai levou a gente para dentro da floresta e nos obrigou a morar lá.

Nós nunca mais pudemos sair da floresta desde então.

- Eu não consigo acreditar em você, mas eu quero acreditar. – è

difícil acreditar quando se tem uma prova tão real... - quando se tem

cinco túmulos.

Ric parou de olhar para o pingente com a foto da mãe e olhou serio

para Dina. Ela deu um pequeno passo se afastando com medo

daqueles olhos verdes que não estavam nem um pouco sedutores.

Ric puxou um cantil de água pendurado em suas costas e o colocou

em cima da mureta do chafariz. Deu um passo na frente de Dina e

sacou uma faca de selva com tamanho suficiente para deixa a garota

apavorada.

- Calma Ric, o que você vai fazer com essa faca.

- Você dá mais valor a provas que palavras não é? - Eu vou lhe dar a

prova real que você deseja.

Ric levantou a faca apontando na direção de Dina. Ela fechou os olhos

e colocou as mãos na frente bloqueando a distancia entre eles

tentando se defender. Enquanto ele empunhava a faca em sua

direção, Dina soltou um grito sufocado.

- Não por favorrrrrrr.

Com um golpe certeiro Ric passou a lamina cortando a pele da sua

coxa fazendo o sangue escorrer pela sua perna. Dina piscou varias

vezes tentando compreender a atitude dele.

- O que você fez? - Por que você fez isso? Falou Dinas chorando com

as mãos nos cabelos.

Ric segurou Dina pelo braço e puxou perto dele. Ele tentou sair do

aperto das mãos dele, mas não conseguiu.

- Me solta, me deixa em paz. – Seu LOUCO.

Page 105: St. Peter's Village

Enquanto Ric segurava forte em Dina que se debatia para soltar,

alcançou o cantil que ele havia deixado no chafariz e derramou água

de santo Pedro sobre o ferimento.

- Aqui está sua prova Dina.

Dina parou de tentar escapar das mãos de Ric e ficou imóvel quando

viu que o ferimento parou de sangrar no mesmo instante que a água

tocou a pele dele.

- Eu não acredito. – isso não é possível. – Ric você esta trapaceando.

- veja com seus próprios olhos então.

Dina se aproximou de Ric e se abaixou na altura do ferimento onde a

lâmina passou. Alisando as mãos pela coxa dele por cima da calça

que ele usava, ela enfiou os polegares dentro do buraco no tecido

cortado junto com a pele e rasgou toda a perna da calça de Ric

revelando o ferimento.

- A sua pele esta curando bem diante dos meus olhos. Disse Dina.

Ela podia ver a carne vermelha com uma brecha no meio se fechando

das extremidades para o meio. Ric derramava mais água e mais o

corte se fechava.

- Ric essa água por acaso é...

- Água de santo Pedro. - Sim Dina.

- Então a lenda é verdadeira. – Termine de me contar o resto da sua

historia.

Meu pai era o barão e minha mãe era a baronesa. Eu sou terceiro filho,

na minha frente vieram Edie e Ram. Como eu disse meu pai obrigou

toda a família a viver na floresta depois que ele descobriu a água que

cura. Meu pai saiu em expedição para procurar a fonte da água

acreditando que ela existia.

Meu pai começou a ficar louco e nunca mais me deixou ou qualquer um

de nossa família sair da floresta. Ele temia que nós pudéssemos morrer

se caso bebêssemos de oura fonte de água. Então depois que minha

família abandonou a casa nunca pode voltar.

- isso e tudo que eu sei Dina. – A parte que você me contou sobre a

casa ter desmoronado ou os túmulos eu juro que não sabia.

Page 106: St. Peter's Village

- Como você não sabia?

- Eu não sabia até este momento. – Como você ficou sabendo sobre a

casa ou os túmulos.

- essa é a lenda aqui da cidade.

- Cidade tem uma lenda? perguntou Ric com olhos incrédulos.

- Sim, a lenda de santo Pedro que descobriu a água milagrosa. A

água de santo Pedro.

- Foi meu pai que descobriu a fonte da água Dina, e não esse Pedro.

Pedro trabalhou para meu pai na Europa e depois de muitos anos ele

veio morar aqui na cidade e meu pai arrumou emprego para ele na

escola. Eu não sei o que ele fazia para meu pai na Europa, mas aqui ele

era professor. Ele estava na expedição com meu pai, ele ajudou meu pai

a voltar pra cidade depois que ele foi curado depois que caiu da pedra.

Mas ele brigaram por algum motivo e logo em seguida Pedro morreu.

Minha mãe me contou isso. Minha mãe morreu na floresta pelo veneno

de uma cobra. Ela esta enterrada na floresta, perto da na aldeia.

Meu pai também morreu na floresta, não sei onde ele esta enterrado,

mas posso garantir que ele não esta no sob o tumulo na nossa antiga

casa.

- Que aldeia você esta falando Ric?

- Aldeia de santo Pedro, era assim que meu pai chamava. – eu não

fazia ideia que era o mesmo Pedro da lenda da cidade.

- Por que seu pai não contou sobre a lenda ou deixou vocês voltarem

pra cidade ?

- meu pai era insano Dina. – Ele me obrigava a beber essa droga de

água todos os dias. – Ele me cortava todos os dias só pra ver a água

curando, era o prazer dele. – Eu nunca mais pude ir a escola ou ter

amigos. – Eu nunca pude conhecer uma garota... – Como eu conheci

você.

“Coitado”. Pensou Dina. Ele era torturado pelo próprio pai.

Ric sentou novamente, mas dessa vez na mureta do chafariz. Dinda

sentou ao seu lado. Eles permaneceram silenciosos, olhando para o

céu azul escuro que a noite apresentava.

Page 107: St. Peter's Village

- Me fale sobre essa lenda Dina. – Por favor, me fale sobre a minha

casa.

Dina começou a revelar toda historia que ela acumulou desde que

chegou à cidade para morar definitivamente. A noite estava muito

calma e era possível escutar os sons dos animais enquanto ela falava.

Ric a ouvia atentamente e de vez em quando virava a cabeça e

passava a mão sobre os olhos enxugando lágrimas.

- E isso é tudo que eu sei Ric. – Minha avó não me contou mais nada

e o meu psicólogo também não abriu mais a boca pra falar nesse

assunto.

- Sempre que podia eu dava minhas escapulidas nos arredores da

cidade, mas nunca me passou pela cabeça falar com ninguém. – Por

isso eu nunca soube dessa lenda.

- Por que você nunca voltou na sua antiga casa Ric? - Está morando

tão perto.

- Eu não tive coragem de aparecer por lá. – Tive medo de que

alguém ainda estivesse morando na casa e poderia me reconhecer.

- Mas você era o único que não sabia de nada? - Alguém mais? -

Seus irmãos talvez.

- Não meus irmão não poderiam ... Saber ... De ... Nada.

Ric respondeu picando as palavras por se dar conta de um único

detalhe que ele havia esquecido. Na noite em que eles saíram às

pressas de casa, um de seus irmãos parecia estar ciente das coisas

que estavam acontecendo.

- Ram sabia Dina.

- Quem sabia?

- Ram sabia o tempo todo. – Ele apoiava meu pai o tempo todo.

Mesmo depois que fomos morar em santo Pedro ele sempre mostrou

muita segurança.

- Ric, quem é esse tal Ram?

- É meu irmão mais velho. – Ele também está vivo e ainda vive em

santo Pedro.

Page 108: St. Peter's Village

Ric deixou Dina no chafariz e dirigiu-se para perto da floresta. Céu

apareceu no mesmo instante que escutou seu assobio.

- aonde você vai Ric.

- Lidar com Ram.

Page 109: St. Peter's Village

ALDEIA de SANTO PEDRO

Água

Um banho no Lago

10

Depois que Ric entrou na floresta Dina voltou para casa um pouco

mais aliviada por ter descoberto toda a verdade, ou pelo menos uma

parte dela. Decidida a não contar nada à sua avó, a garota subiu

direto para o quarto sem jantar. No seu quarto enquanto ela olhava

através da janela, pensava na historia do rapaz.

Na floresta, Ric fazia Céu galopar irresponsavelmente por entre as

árvores. Ele estava disposto a confrontar Ram, para saber o resto da

verdade. Céu saltou por cima de alguns troncos de arvores

aterrissando na estrada ainda dentro da floresta. Fazia muito tempo

que ele não passava por aquele caminho que um dia ele havia

decidido nunca mais passar.

A estrada estava livre e Céu pode galopar com mais velocidade. À

medida que Céu galopava avançando para o final da estrada Ric

ficava mais determinado. O cavalo parou quando a estrada

encontrou-se sem saída. Ric passou a mão em sua espada que estava

atrelada aos arreios de Céu. Eles permaneceram imóveis olhando

Page 110: St. Peter's Village

para o paredão de galhos e troncos que se formavam no final da

estrada.

Outro rapaz da idade de Ric surgiu por trás do paredão empunhando

uma espada e logo em seguida outro emergiu do mesmo lugar. Os

dois rapazes vestidos de preto, lado a lado, com suas espadas

olhavam para Ric.

- Aqui é proibido. Alertou um dos rapazes em voz de comando. –

Você não pode passar por aqui.

- Não me diga o que eu posso ou não fazer. Respondeu Ric com o

polegar afastando sua espada da bainha.

- A aldeia é proibida para você. – Temos ordens para não deixar

ninguém entrar.

- Então vamos resolver isso do jeito difícil.

Desmontando de Céu, ele desembainhou a espada por completo e

ergueu de forma ofensiva fazendo os dois rapazes se separarem. Ric

começou a duelar sozinho contra os dois.

Mesmo estando em menor numero, Ric era muito bom. Todo o

treinamento de guerreiro que ele pode aprender com o pai e praticar

os seus irmãos foi superior à técnica dos rapazes que não

conseguiram impedir Ric de usar a lamina da sua espada contra eles.

Um terceiro rapaz, bem mais jovem emergiu do paredão e pode ver

os corpos dos outros dois caídos no chão enquanto Ric limpava o

sangue da lamina da sua espada. O rapazinho foi percebido por Ric e

na tentativa de voltar para dentro do paredão foi agarrado por Ric.

O pânico nos olhos do garoto não impediu que Ric estocasse sua faca

de selva na clavícula dele. Um grito de dor ecoou pelas arvores da

floresta enquanto o sangue descia pelo peito dele.

- Você vai dar um recado para ele. Falou Ric ao garoto que chorava

de dor. – Diga ao meu irmão que ele vai ter que me dar algumas

respostas. O garoto ainda chorava. – Diga que ser for preciso eu

passarei por aqui e irei buscá-lo em Santo Pedro ou em qualquer

inferno que ele esteja.

Ric soltou o garoto ainda sangrando e permitiu que ele mergulhasse

através do paredão. Ele tinha absoluta certeza que o recado seria

dado a Ram. Alguns minutos depois que o garoto sumiu pelo paredão

Page 111: St. Peter's Village

de troncos, galhos e musgos, Céu se aproximou. Ric ainda com

expressões de ódio no rosto montou e galopou em direção ao

acampamento do refugio.

Quando Céu parou no acampamento somente Edie estava em frente

à fogueira, os outros já se encontravam em suas pequenas cabanas

de um único cômodo.

Edie estava pensativo quando Ric se aproximou e sentou-se ao seu

lado. A chama amarela do fogo iluminava os dois.

- Eu matei dois membros do clã de Ram hoje. – Antes de vir para o

refugio.

- Você o que? Perguntou Edie virando-se de frente para Ric. – Eles

atacaram você?

- Não. – Eu os ataquei. Respondeu Ric singularmente. – Enviei um

recado para Ram. Quero falar com ele.

- Como sempre o pequeno Ric ainda é o irresponsável da família.

Disse Edie.

- Nossa casa esta no chão Edie, eles derrubaram ela. Ric falou. – Eles

colocaram túmulos com nossos nomes. – Ele fingiu que morremos.

- Ric você está delirando ? - Tomou sol de mais.

- Dina viu nossa casa desmoronada Edie. – Ela viu os túmulos.

- O que você contou para essa garota Ric? - Não venha me dizer que

você contou para ela sobre nós? - Sobre a água.

- Não contei nada Edie. Ela descobriu sozinha. – Você sabia que essa

cidade tem uma lenda sobre aquele cara?

- Que lenda Ric? - Que cara?

- Aquele homem que trabalhava pro nosso pai, que dava aula na

escola. – Professor Pedro. – A cidade acha que foi ele quem descobriu

a fonte milagrosa. – Esclareceu Ric ao irmão. – O professor morreu e

tornou-se santo para a cidade. – A água milagrosa é chamada de

AGUA DE SANTO PEDRO.

- Santo Pedro? Edie perguntou curiosamente. – Mesmo nome que

papai deu a aldeia?

Page 112: St. Peter's Village

- Sim. - Isso mesmo. Ric acenando com a cabeça.

- Pensei que papai só estava fazendo uma homenagem ao seu ex-

empregado. Concluiu Edie. – Já que ele ajudou a encontrar a fonte

milagrosa e a construir a aldeia.

Ric olhava para as chamas amareladas do fogo, Edie olhava para ele

com traços melancólicos e ao mesmo tempo curiosos quando afundou

a mão no bolso e puxou a joia de ouro que Dina havia encontrado na

antiga casa deles.

Edie pegou a joia e com ela o pingente com o retrato da mãe. Seus

olhos igualmente verdes como do irmão brilharam contrastando com

a iluminação das chamas.

- É a mamãe Ric. Reconheceu Edie. - É ela mesma aqui na foto e

você no colo dela.

- Eu não me lembrava dela, mas quando vi esse retato reconheci

imediatamente Edie. – Ela estava tão bonita.

- Me conte o que você sabe Ric.

Ric começou a contar a mesma historia que Dina havia contado

antes. As chamas flamejavam em tons amarelados contrastando com

a pele dos dois durante a conversa. Ric falou sobre a lenda da água

que a cidade acreditava, falou sobre o professor Pedro ser uma

pessoa querida, falou sobre a historia do desmoronamento da casa e

dos túmulos no quintal dos fundos. Edie ouviu tudo atentamente.

- Anos se passaram e só agora ficamos sabendo dessa versão da

historia. – Por que você acha que papai fez isso Ric.

- Por que ele era um insano covarde, Edie. – Aposto que foi ele quem

mandou derrubar a casa. – Não seria possível outra pessoa fazer

isso.

- Não quero mais falar nesse assunto agora. Falou Edie. – Preciso

dormir e pensar no que você me falou. – Melhor você dormir

também. – Essa Dina é de confiança ? - Ela não vai falar a ninguém

sobre a gente ?

- Claro que não Edie. – Eu confio em Dina. – Vou deitar e tentar

dormir. – Amanha vai ser um dia difícil. – Ele virá até nós.

Page 113: St. Peter's Village

Quando o sinal tocou pela manha todos os alunos se direcionaram

para suas salas de aula. Dina e anja passaram por Lorena e sentaram

nos mesmos lugares de sempre.

- Então Dina. Perguntou Anja. – O Ric já é mais um fantasma. – A

água curou mesmo a ferida dele ? - Não foi um truque mágico.

- Não Anja foi como um milagre. – Você deveria ter visto. – A pele

dele fechando à medida que ele derramava a água sobre ela.

- MENINAS, VAMOS PRESTAR ATENÇÃO NA AULA POR FAVOR. Pediu

a professora de biologia.

- A lenda é verdadeira mesmo. Sussurrou Anja. – Não são boatos.

- Sim, pelo que eu vi ate agora é verdadeira.

CLASSE,

VAMOS FAZER UM TRABALHO SOBRE BOTANICA E VAMOS FAZER A

PESQUISA NA FLORESTA. “AULA IN NATURA”. FORMEM TRIOS.

- Ah droga, trios? falou Dina. – Podia ser duplas. – Quem vamos

chamar pra ficar com a agente.

- Posso ficar com vocês no grupo? perguntou uma menina muito doce

que sentava duas cadeiras ao lado.

- Errr pode Carla, fique com a agente. Respondeu Anja olhando para

Dina que assentiu com a cabeça.

CLASSE,

VAMOS COMEÇAR A PESQUISA DEPOIS DE AMANHA.

Adan e Lorena não conseguiram achar uma terceira pessoa para

formar o trio. Então eles permaneceram em dupla.

- O que você vai fazer depois da aula Adan? perguntou Lorena.

- Vou me matricular numa escola de defesa pessoal, quer vir comigo?

- Eu não gosto de lutar, mas acho que você precisa mesmo. – Depois

daquele dia...

- Não vamos falar sobre aquele dia Lorena. – É exatamente por isso

que eu vou aprender a me defender.

Page 114: St. Peter's Village

CLASSE,

ABRAM O LIVRO NA PAGINA 87. ESSAS VÃO AS PLANTAS QUE

DEVEM PESQUISAR NA FLORESTA. COMECEM A TRABALHAR.

- Dina, eu vou encomendar meu vestido hoje à tarde, para a

comemoração do Solstício. – Vamos juntas?

- Eu não posso tenho psicólogo. Respondeu Dina com cara de

desdenho.

Naquela mesma manha bem cedo, Edie acordou antes de todo mundo

e saiu em silencio com seu cavalo. Ele foi diretamente para a fonte da

água de santo Pedro, sabia que encontraria o clã de Ram naquele

horário.

Foi exatamente isso que aconteceu. Tão logo Edie chegou na ponte

Ram pode vê-lo. Montado em Tobruk, Ram se aproximou de Edie. Os

dois estavam tensos e preparados para lutar se fosse preciso.

- Você sabe o que ele fez noite passada. Falou Ram se dirigindo a

Edie. – Ele matou dois dos meus vigilantes e feriu um garoto. – Eu

não vou tolerar isso.

- Eu sei. – Mas não foi por este motivo que eu estou aqui. – Eu sei

sobre nossa antiga casa, sobre o cemitério falso nos fundos da

propriedade Baleares. – Ric sabe também.

- Então está explicado por que o nosso caçula teve um ataque

existencial. – E a forma que ele encontrou, foi matar meus homens. -

Bem típico dele mesmo.

- Você sabia. Afirmou Edie.

- Como você acha que as pessoas não iriam procurar a gente? - papai

teve que encontrar um jeito de ninguém vir atrás de nós.

- Você sabia o tempo todo. Reafirmou Edie – Você nunca contou isso

pra gente. – Nem mesmo depois que eles morreram.

- Vocês tinham a cabeça muito fechada para entender as razoes de

nosso pai. Disse Ram. – Vocês não iam cooperar.

- Nós NUNCA iríamos cooperar com aquele doido. – Vejo que ele não

era o único doido da família.

Page 115: St. Peter's Village

- Se nossa mãe estivesse viva, falou Edie. – Ela teria morrido de

desgosto. – Você era filho dela também. Você devia ter respeitado

ela.

- Não coloque nossa mãe no meio da sua fraqueza.

- Você é louco Ram. – Tão louco quanto nosso pai foi.

- Ele vai pagar por ter matado meus homens.

- Não se aproxime do Ric. – Estou recomendando que não vá ser bom

para sua saúde que você fizer alguma coisa contra ele.

Ram não falou mais nada à partir dali. Puxou as rédeas de Tobruk e

virou de volta partindo com seu clã para longe da ponte. Edie

retornou sumindo na floresta.

O sinal de saída tocou e Anja, Dina e Carla se dirigiram para o portão.

No caminho toparam com Lorena e Adan. Os cinco ficaram se olhando

alguns segundos e Adan deu a primeira quebra de silencio.

- Xau Lorena. Disse ele. – Depois nos falamos.

Lorena com seus cabelos seguros por um impecável rabo de cavalo

assentiu com a cabeça e olhou para as três. Dina enrijeceu o corpo

esperando uma resposta malcriada de Lorena, mas ao invés disso, ela

apenas olhou-a de cima em baixo girou nos calcanhares e atravessou

o portão de saída da escola.

- UFA! – Pensei que ela iria puxar outra briga. Desabafou Anja.

- Por que a Lorena é implica com vocês? Perguntou Carla.

- Porque ela é uma vaca insuportável. Respondeu Dina. – Vamos

embora antes que ela resolva voltar.

As três meninas saíram rindo pelo portão da escola, Anja e Dina

tomaram uma direção oposta de Carla. A menina se despediu e

caminhou em direção em sua casa.

- Acho que a Carla é legal. Anja começou a tagarelar. – Pode ser que

ela seja uma peça fundamental no nosso grupo de biologia. – Será

que ela vai à comemoração do Solstício? – Com quem será que ela

vai?

Anja falava e Dina olhava para o chão enquanto caminhava. Estava

completamente, isoladamente imersa em seus pensamentos. Tudo

Page 116: St. Peter's Village

era uma grande novidade para ela... Sobre a água, sobre a lenda,

sobre a casa desmoronada... Sobre Ric.

- Dina você escutou alguma palavra que eu disse?

- o que?

- O que você acha da Carla? – Eu perguntei três vezes.

Dina ate aquele dia nunca havia reparado direito em Carla. Era uma

menina calma para falar e parecia estar sempre disposta em ouvir

mais que comentar. Era da mesma idade de Dina, tinha cabelos

crespos, castanhos. Olhos grandes em tom castanho como seus

cabelos, mas seus lábios eram enormes, parecia uma longa estrada

de curva bem sinuosa.

- Eu acho que ela deve ser legal. Respondeu Dina finalmente.

- Xau Dina. – Vou fazer a encomenda do meu vestido. – Você deveria

fazer o seu, pode não ter mais tempo para a costureira aprontar se

ficar em cima da hora.

- Xau Anja, eu tenho que ir ao psicólogo hoje à tardinha.

De tarde Dina caminhou pelas ruas em direção ao consultório do

senhor Paulo. A secretaria informou Dina que ele não estava.

- Como assim ele não veio hoje? – Ele nunca falta.

- Bem... Ele não aparece por aqui desde ontem. – Não telefonou e

não deu mais noticia.

- Ele sumiu?

- Não tem necessidade de dizer que ele sumiu. – Seria imprudente. –

Vou remarcar você para outro dia.

- Ok. Respondeu Dina.

Ela saiu com uma sensação estranha na cabeça. Não era uma atitude

comum de Paulo sumir assim. Ele nunca havia faltado uma sessão

com ela. “Bem, já que não tenho psicólogo vou ate a casa

desmoronada novamente. Pensou”.

Se apressando pelas ruas em direção aos limites da cidade, quando

ela estava quase chegando próximo ao velho moinho avistou Lorena

e Adan juntos de novo. Dina estava sozinha e temeu que eles dois

Page 117: St. Peter's Village

fizessem alguma coisa contra ela. Desta vez Ric não estaria ali para

defendê-la.

Dina se escondeu atrás de um canteiro de plantas, era alto o

suficiente para ela não ser vista enquanto os dois passavam pela

outra calçada tranquilamente.

- Adan, você tem certeza que vai se matricular nas aulas de defesa

pessoal? Perguntou Lorena incrédula.

- Claro que vou. – Agora mesmo.

Eles pararam em frente ao um estúdio de dança e artes marciais. A

aparência do imóvel era num estilo antigo com os tijolos aparecendo

em alguns ângulos. Adan entrou e Lorena continuou caminhando logo

após despedir dele.

Dina esperou que Lorena estivesse numa distancia consideravelmente

segura para sair de trás do canteiro e seguir com seu objetivo na

casa desmoronada.

Lorena continuou caminhando tranquilamente quando dobrou a

esquina esbarrou num homem alto franzino com um par de óculos

enormes. Por causa do encontro ela relaxou os braços e deixou cair o

livro da escola.

O homem abaixou imediatamente para pegar o livro no chão e

entrega-lo a Lorena.

- me desculpe senhorita.

- Eu estava distraída. – E você apareceu do nada.

Quando o homem estava com o livro de Lorena em mãos, percebeu

que ela estudava na escola da cidade. Ficou parado um instante

olhando para Lorena.

- Você estuda naquela escola indo em direção à igreja? Perguntou o

homem acomodando os enormes óculos no nariz.

- Sim. – Por quê?

- Já lecionei lá. – Mas isso foi há muitos anos. – você deveria ser uma

criancinha.

- É mesmo? – Desdenhou Lorena. - Qual matéria?

Page 118: St. Peter's Village

- Eu acho que conheço a senhorita de algum lugar. – qual seu nome?

- Veiga, Lorena Veiga.

- Você era filha do J.J? – perguntou o homem.

- Como você sabe que ele morreu?

O homem pronunciava as palavras em tom de melodia para Lorena.

- Eu conheci seu pai. - respondeu. – Um grande homem. - Morreu na

expedição em busca da água de santo Pedro.

- A maldita água milagrosa. Exclamou Lorena com raiva nas suas

palavras. – Se ele não tivesse partido nessa expedição maldita ele

ainda estaria vivo.

- meus pêsames senhorita. – Vou indo. – A gente se vê pela cidade.

- xauxinho... Respondeu Lorena fazendo a mesma cara de desdenho

que ela sempre fazia para as pessoas.

Enquanto Lorena virava as costas em direção a sua casa, Paulo

seguiu por outro caminho andando sorridente e despreocupado.

“Consegui chegar finalmente, pesou Dina.”

O portão ainda estava caído exatamente como Anja e Dina haviam

deixado no outro dia. Ela passou por ele e caminhou pela lateral

diretamente para os fundos da casa desmoronada. Enquanto dava a

volta por fora recordava as imagens das coisas destruídas de quando

passou lá dentro.

Passando pelo tronco caído o qual havia chorado depois de ter visto o

tumulo de Ric, continuou avançando em direção ao suposto falso

cemitério, encontrando novamente as lápides. Passou pela que

estava escrito o nome de Richard, deu mais uns passos e viu a lapide

escrita Ramcy Baleares.

- Ou esse é o nome do barão ou é um dos irmãos de Ric. Falou para

si mesma.

- Esse é meu irmão. Respondeu uma voz calma logo atrás de Dina.

- RIC. Gritou Dina assustada. - Não faça mais isso. – Quer me matar

de susto.

- Desculpa Dina. – Você tinha perguntado e... Eu só respondi.

Page 119: St. Peter's Village

- Eu não perguntei para você. Falou Dina se recompondo do susto. –

Eu perguntei para mim mesma.

- É que eu não tenho muito habito de falar comigo mesmo. Ric

sorrindo para ela. – Eu geralmente penso comigo. – Assim as pessoas

não me assustam.

- Você é bobo. Dina abriu um enorme sorriso para Ric.

Ele se aproximou e pegou em sua mão. Dina olhou para os olhos

dele, toda a sedução daquele verde estava ali novamente refletindo

para ela. Com a outra mão ele apontou para lapide ao lado e

conduziu Dina a ate ela.

- Esse é nome do meu irmão Edie. Apontou a lapide escrita EDIGARD

BALEARES.

- E essas são as lapides da minha mãe e do meu pai. Completou Ric.

De repente Dina ficou calada, seus lábios grudados em linha lutando

para não abrir um enorme sorriso. Ric viu como Dina fazia um grande

esforço para prender o riso e perguntou curioso.

- O que foi?

- É que você está me apresentando formalmente os túmulos. Falou

rindo escondendo com a mão na frente. – E não tem ninguém morto

ai em baixo.

Ric levantou uma sobrancelha em resposta à conclusão de Dina.

- Você está zombando de mim? Perguntou sorrindo.

- Não Ric, me desculpe. Dina não podia segurar mais o riso. – tem

que concordar que se não fosse trágico seria cômico. - me desculpe

mesmo. Ela ria sem parar.

O riso de Dina foi tão contagiante que Ric começou a rir junto com

ela. Eles sentaram sobre os túmulos falsos e gargalharam alguns

minutos. Foi contagiante.

Céu se aproximou quando Ric estava bem próximo à Dina e suas

duas mãos na cintura dela. Quando Dina viu o cavalo branco

acinzentado, parou de rir no mesmo momento.

Page 120: St. Peter's Village

- Clama Dina. Falou Ric. – Ele não vai machucar você. Fazendo sinal

chamando que Céu. – Esse é o meu melhor amigo. O cavalo chegou

mais perto. – Pode tocar nele.

Dina olhava admirada para o animal, mas não estava segura quanto

a tonar nele ainda. O cavalo se aproximou mais quando Dina

estendeu a mão. Céu cheirou a mão de Dina, a mesma que Ric tinha

tocado e reconheceu o cheiro do dono imediatamente. Soltou um

bufo e balançou o rabo mostrando que estava tudo bem.

Dina tocou no queixo do animal. Ric chegou perto e pousou sua mão

sobre a mão de Dina conduzindo-a pelo corpo de Céu. Enquanto Dina

admirava todo esplendor do cavalo pegou na mão de Ric e puxou-o

para si. Ric estava trás de Dina, uma mão no seu quadril enquanto a

outra junto com Dina alisava o pêlo do animal.

O peito de Ric tocava as costas de Dina, ela podia sentir a respiração

dele por trás de seu ombro. As palavras dele sussurravam ao pé do

ouvido dela.

- Está sentindo? Sussurrou no ouvido de Dina. – Ele gosta de você

também. - O pêlo dele é macio. Ric parava a mão dela na altura da

barriga de Céu. - Está sentindo a respiração dele? Sussurrou mais

uma vez. – sinta a respiração dele na sua mão.

Dina estremeceu.

- Eu sinto.

Ric soltou a mão de Dina e junto à outra, segurou forte o quadril dela

virando-a de frente para ele. Pressionando Dina ao corpo de Céu, Ric

olhou nos olhos castanhos dela e pousou um leve beijo sobre os seus

lábios. A noite estava chegando e ficando quente, não estava

ventando.

- Dina, eu gostaria de leva-la um lugar especial. Falou depois que

interrompeu o beijo. – Você gostaria de ir comigo?

- Claro.

Ric montou e posicionou Céu próximo a uma lápide. Fez sinal para

Dina subir na garupa usando a lapide como degrau. A principio ela

ficou insegura, mas quando encontrou os olhos dele, toda a

insegurança que existia ali foi embora.

Page 121: St. Peter's Village

- Eu vou pisar na lapide? Perguntou Dina, receosa. – Isso seria uma

profanação.

- Não tem ninguém ai em baixo. Ele respondeu. - Você mesma disse.

Esticando o braço para ela.

Dina decorou seus lábios com um sorriso e com dois movimentos

estava na garupa do cavalo abraçada à Ric. Eles galoparam em

campo livre da propriedade Baleares. Dina grudou sua bochecha nas

costas de Ric. Pelo caminho ele observou os restos da sua antiga

casa, mas rapidamente deslocou sua atenção para frente como se

estivesse virando uma pagina da sua vida.

“Onde ele estaria me levando” pensou Dina. Quando o cavalo chegou

à beirada da floresta ela suspirou achando que o passeio havia

terminado, mas Céu deu um pequeno salto para dentro na mata. Os

olhos de Dina estavam tão atentos quanto suas mãos segurando a

cintura de Ric. Medo e espírito aventureiro estavam misturados na

barriga dela.

Céu não estava mais galopando por que as plantas estavam muito

densas e Ric sabia que seria perigoso se sele tropeçasse e quebrasse

a perna. O maior pesadelo de um cavalo é ter uma perna quebrada. À

medida que Céu andava Ric e Dina apreciavam o balanço do

movimento do seu quadril. Ric soltou uma das mãos das rédeas dele

e repouso-a sobre a coxa de Dina.

Era uma experiência totalmente nova para ela. Andar á cavalo dentro

da mata, na garupa de um homem forte e lindo, assim como era a

primeira vez que alguém tocava na coxa dela daquela forma.

Finalmente eles chegaram ao lago.

Anoiteceu completamente e a única iluminação era da lua que parecia

estar conspirando em favor deles. O reflexo nas águas do lago era

perfeito, como um grande espelho no chão virado para cima.

- É lindo aqui. Comentou Dina enquanto descia do cavalo. – Que

lugar é esse.

- Eu venho aqui sempre. Respondeu ele abrindo os dois botões de

sua camisa. – Vamos nadar?

- Nadar? Pareceu espantada. – Eu não vim preparada para nadar.

Page 122: St. Peter's Village

- Nem eu não achei que iria encontrar você. – Então somos dois

despreparados.

Ele puxou a camisa exibindo a musculatura perfeita do abdômen.

Dina virou o rosto um pouco sem graça enquanto ele colocava os

polegares nas calças para retira-la.

- NÃO FAÇA ISSO. Ela gritou assustando Ric. – Não tire, por favor.

Ela continuou com as maças do rosto avermelhadas. - Eu nunca vi

um garoto tão à vontade assim.

- Tudo bem. Ric respondeu com um sorriso. – Você vem?

Dina ainda corada de vergonha se aproximou da água e um lampejo

de pensamentos passou por sua mente. “O que eu teria a perder?

Perdi meus pais, estou morando aqui nessa cidade pequena, esse

gato semi nú me chamando para nadar com ele. O que pode dar

errado?”...

Antes de tirar a camisa certificou que estava de top, e por baixo do

seu jeans ela coincidentemente usava uma calsinha box preta, muito

parecida como um short de academia. Ric não estava olhando para

Dina tirar a roupa, estava imerso literalmente sob a água do lago

tranquilamente.

Ela colocou os pés na água, não estava fria e não estava quente, a

temperatura estava agradável. Quando Ric se aproximou ela já

estava afundada ate o pescoço.

- O que você acha Dina? Ele perguntou a ela. – Está gostando do

lago?

- É lindo. Respondeu ela nadando estilo costas devagar. – por mim eu

nunca mais voltava para a cidade. Completou. – Eu ficaria aqui para

sempre.

Ric fechou seu semblante logo após ter escutado as palavras de Dina.

Ele executou duas braçadas até ficar frente a frente com ela.

- Você não sabe o que está falando. Ele disse a ela. – Você Não

gostaria de ficar aqui para sempre. Ele afirmou segurando-a pelos

quadris. – A vida tem que ser aproveitada lá fora, na cidade.

Puxando-a para um abraço debaixo d´água. – Fora dessa floresta.

Page 123: St. Peter's Village

Dina claramente entendeu a mensagem que ele estava passando. Ela

sabia que ele não podia sair da floresta por muito tempo. Ela sabia

que não existia outra água que ele pudesse beber.

- Ric, mes desculpe. Ela o abraçou. – Eu esqueci completamente da

sua situação.

- Sem problemas Dina. Ele a beijou intensamente.

Eles estavam completamente à vontade no lago, nadando e se

beijando. Então Dina sente um movimento fora do lado. Entre as

arvores.

- O que foi? Perguntou Ric em alerta. – Viu alguma coisa ?

- Não tenho certeza, mas me pareceu que eu vi um cavalo ali nas

arvores.

- Você tem certeza ? ele perguntou. – Pode ser Céu.

- Não, acho que vi um cavalo preto. Acho que tenho que certeza que

vi um cavalo preto.

- Dina vista suas roupas. Ric ordenou. – Vou leva-la para casa.

Page 124: St. Peter's Village

ALDEIA de SANTO PEDRO

Água

Faça uma oração para mim

11

Pela manha o sol iluminava o quarto completamente. Quando ela

chegou em casa noite passada “às escondidas” esqueceu de fechar a

janela antes de fechar os olhos para dormir. Andar a cavalo com Ric e

nadar com ele no lago fez Dina ter sonhos que ela teria vergonha de

contar a alguém, até mesmo para sua melhor amiga Anja.

Totalmente desperta, levantou-se e entrou no banheiro.

- Bom dia querida. Cumprimentou a avó pondo uma xícara de café na

mesa. – Dormiu bem? Perguntou capciosamente.

- ERRR... Sim vó. Respondeu Dina envergonhada. – Dormi como uma

pedra.

- Tome seu café querida. – Não vá se atrasar. Reservando pães de

batata para levar. – Anja deve bater a qualquer momento.

Ela bebeu apenas um gole de café quando Anja bateu na porta. Dina

correu para abrir.

Page 125: St. Peter's Village

- Estou saindo vó. Pegou a mochila e os pães. – Vamos. Arrastou

Anja pelo braço.

- Pra que tanta pressa? Perguntou Anja. – Calma temos tempo.

- Preciso lhe falar sobre ontem. Despertando a curiosidade em Anja.

- O que aconteceu ontem? Perguntou ela. – Aconteceu sem eu estar

presente?

- Eu não tive sessão com psicólogo. Elas caminhavam de vagar. –

Então eu voltei no cemitério.

- Você fez o que? O rosto de Anja enrijeceu. – Você está maluca? –

Voltou lá sozinha?

Elas estavam no portão de entrada da escola quando Dina parou na

frente de Anja sorrindo enquanto contava toda a experiência que ela

teve com Ric noite passada.

- Então ele me levou para o lago e nós nadamos juntos. Dina sorria

com uma pontinha de vergonha nas bochechas.

- Vocês nadaram juntos? Anja parecia não acreditar. – Nadaram sem

roupa? Anja falou mais baixo. – Vocês fizeram aquilo? Sussurrou.

- NÃOOO. Respondeu alto para a amiga. – Nós não fizemos aquilo.

Com as mãos atracadas a seus cadernos. – Anja, você tem uma

mente muito criativa, pra não falar poluída. Ela riu.

Elas entraram na sala junto com os outros alunos. Antes que a

professora surgisse pela porta da sala Anja perguntou a Dina.

- Mas você e o Ric... Cochichou. – Dentro da água não tem

gravidade, você sabe.

- Anja? Dina olhava para ela. - Está começando a me preocupar, e

aquela historia de ser freira? Perguntou sorrindo.

BOM DIA CLASSE!

ABRAM SEUS CADERNOS E COMECEM A COMPOR A PESQUISA DE

GRUPO QUE VAMOS FAZER AMANHA NA FLORESTA.

Dina voltou sua atenção para a professora. Ela não havia se dado

conta de que a pesquisa de escola seria dentro da floresta. Onde

morava Ric e Edie e... Ram.

Page 126: St. Peter's Village

- Anja, a pesquisa vai ser na floresta. Virou para a amiga. – Isso

pode ser perigoso. – Eles moram na floresta.

- Não devemos entrar tanto assim na floresta Dina. Explicou Anja. –

Vamos ficar em alguma trilha.

- Como você sabe?

- Eu já pesquisei na floresta. – É um campo perto do chafariz

desativado, não vai ter arvores, o campo é aberto.

Enquanto elas falavam Carla entrou na sala de aula um pouco

atrasada e sentou perto de Anja e Dina. Quando passou por Lorena

esbarrou em sua mesa fazendo com que uma caneta caísse no chão.

- Desculpe. Abaixou e pegou a caneta.

Lorena olhou para Carla com o mesmo desdenho que ela olhava todo

mundo, todo dia. Tomou a caneta das mãos de Carla e virou o rosto

de volta à Adan. Carla se aproximou das colegas de grupo sem graça

por Lorena ter feito aquilo com ela.

- Olá meninas. Cumprimentou Dina e Anja.

- Oi Carla. Disseram ao mesmo tempo.

Carla puxou a cadeira para completar o grupo e elas começaram a

trabalhar na pesquisa de biologia.

Quando o sinal soou os alunos se levantaram freneticamente e o

barulho das cadeiras arrastando no chão só incomodava a professora.

CLASSE, DE VAGAR POR FAVOR.

Dina, Anja e Carla se apressaram para fora da escola. Apesar de Dina

estar completamente à vontade na presença de Carla não fez

nenhum comentário sobre Ric e todo o resto. Elas caminharam juntas

até que a direção para casa de Carla ficou oposto das outras duas.

- Xau meninas, amanha é o grande dia. Carla despediu-se. – Não

esqueçam de vestir calças amanha. – Tem muitos insetos na floresta.

Dina e Anja acenaram para Carla e caminharam de volta para suas

casas. Anja tagarelava sobre o vestido para a comemoração do

Solstício quando enquadrou Dina com outra pergunta sobre ela e Ric.

Page 127: St. Peter's Village

- Lá vem você novo. Parou na frente de Anja. – Não fizemos nada e

Ric não encostou em mim. Completou. – Ele é um cavalheiro, me

respeitou o tempo todo.

- Jura?

- Juro. – Satisfeita?

- Não muito. Falou em devaneio. – Esse Ric deve ser um bocó.

Terminou rindo.

- O que você faz quando está na igreja? Perguntou boquiaberta. –

Você realmente reza? Você conta ao padre no confessionário que tem

esses pensamentos? Dina estava começando a rir.

Anja também soltou o riso e despediu de Dina. Quando eles estavam

bem distantes uma da outra, Anja parou.

- Dina, vamos preparar os nossos vestidos? Gritou. – passo na sua

casa no final da tarde.

Dina fez sinal positivo para Anja e seguiu andando quando avistou

uma figura sentada no banco de alvenaria mais adiante. Bob estava

olhando para ela. Foi reconhecido imediatamente pelos olhos que

naquela hora do dia tornavam muito claros. Dina podia afirmar que

Bob não tinha olhos se ela não o conhecesse.

- Boa tarde. Ele cumprimentou quando ela estava mais perto. – Tudo

bem moça?

- Oi Bob. Respondeu enquanto passeava os olhos no braço dele. –

seu braço melhorou? Ela já não tinha mais certeza qual braço ele

havia ferido com o balde. – Minha vó ficou preocupada.

- Meu braço está bem. Respondeu ele. – Não foi nada de mais como

eu disse naquele dia.

- Minha vó queria saber quem são seus pais para perguntar como

você estava. Ele abriu espaço para ela sentar. – Mas pelo visto, você

está muito bem. – Você trouxe minha blusa?

Ram não planejava falar com Dina, por isso não estava com a blusa

dela. Ele olhava para ela com os mesmo olhos de um animal

selvagem quando olha para sua presa.

- Eu deixei em casa. Respondeu em tom calmo.

Page 128: St. Peter's Village

- Tudo bem, mas não se esqueça de trazer. – Minha vó vai ficar

perguntando. – Você lembra onde eu moro?

- Claro que sim. Nunca me esqueço um lugar... Nunca me esqueço

um rosto.

Dina corou com a resposta de Bob. Já era hora do almoço e ela

estava com fome. Eles se levantaram e caminharam juntos em

direção à casa de Dina. Ela observava como ele andava e esqueceu-

se de Ric enquanto caminhava ao lado dele.

Bob vestia uma calça marrom bem escuro e uma camiseta preta. Por

falta de mangas os músculos dos braços dele estavam expostos. Os

raios de sol iluminavam seus cabelos escuros e seus olhos estavam

cerrados por causa da claridade excessiva. Próprio de quem possui

olhos claros e Bob tinha os olhos mais claros que Dina jamais havia

visto.

Durante a caminhada para casa Dina lembrou em voz alta que sua vó

não estaria em casa para o almoço. Bob aproveitou a deixa para

convida-la para caminhar mais um pouco em sua companhia. Eles

andaram lado a lado e quando Dina avistou o chafariz onde deu o

primeiro beijo em Ric, sentiu uma sensação que estava traindo e

puxou Bob para outro local.

Bob quase não falava e Dina, apesar de estar à vontade ao seu lado,

também sentia medo. Eles pararam em frente a uma construção

antiga. Dina não distinguia o que era aquilo, mas Bob soube

descrever. Ele contou a ela que naquele lugar era a antiga casa do

ferreiro. Ele fabricava ferraduras para os cavalos da cidade.

Dina não entendia por que aquele lugar era tão especial a ponto de

Bob ficar nostálgico. Eles se sentaram em outro banco de alvenaria

que estavam espalhados em toda a cidade. A barriga de Dina

começou a roncar de fome e ela lembrou que trazia pães de batata

na mochila.

Ela escorregou a mochila para seu colo e puxou de dentro dela o

pacote com os pães. Bob olhava Dina com atenção.

- Está servido? Dina ofereceu a ele. – São uma delicia minha vó que

faz.

Page 129: St. Peter's Village

Bob olhou para o alimento nas mãos dela e levou alguns segundo

pensando se seria prudente ou não aceitar. Logo concluiu que não

seria problema e dar algumas mastigadas no pão.

Quando Bob deu a primeira mordida reconheceu o gosto, mas não

soube identificar de onde ele conhecia. Deu outra mordida enquanto

Diana tagarelava sobre como sua vó os preparava para puxar

assunto. Bob parecia apreciar o pão quando Dina sem querer, soltou

a parte em que queria aprender a fazê-los tão bem quanto a

baronesa fazia. Bob engasgou.

- Cuidado. Engasgou com o pão? Perguntou preocupada. – Eu não

tenho uma garrafa com água por aqui. Ela deu tapinhas nas costas

dele. – Vamos procurar algo para você beber.

- Não precisa. Ainda engasgado. – Eu trouxe minha água. Ele puxou

um pequeno frasco que estava no bolso lateral abriu e bebeu.

Até aquele momento Dina não tinha reparado na pequena garrafa

que ele portava. Sentindo-se melhor depois que bebeu alguns goles,

ele abaixou a garrafa, então foi a vez de Dina querer beber também,

o sol estava forte e o tempo muito quente.

- Você não pode beber isso. Ele negou água a ela. – Essa água está

quente e com gosto ruim. Escondeu a garrafa - Melhor não beber

dela.

Dina assentiu com a cabeça.

- Vamos procurar algo para beber. Levantou. - Estou sedenta.

Bob caminhou com ela a procura do que ela pudesse beber, apesar

da preocupação em alguma outra pessoa reconhece-lo aparentava

tranquilidade todo o tempo. Numa esquina próxima Dina avistou uma

quitanda e chamou Bob para entrar com ela, ele disse que iria

esperar por ela do lado de fora.

Quando Dina saía da quitanda carregando em sua mão uma garrafa

de água de coco localizou Bob do outro lado da calçada encostado ao

muro de forma casual. Estava esperando por ela com seus braços

cruzados em frente ao seu peito. De longe ela pode reparar na

luminosidade dos olhos dele. “Acho que são azuis claros”, ela pensou.

Antes que ela pudesse estar totalmente do lado de fora da quitanda

Adan entrou e esbarrou em sua mão deixando cair toda água de

Page 130: St. Peter's Village

coco. A principio Dina olhou para chão vendo a água escorrer pela

calçada e no seguinte instante em que levantou seus olhos

reconheceu o rapaz da suas escola.

- Desculpa. Pediu com medo da reação dele. – Eu não vi você

entrando.

- Você sempre está no meu caminho. Rebateu com ódio. – Sempre

você. Lembrando à noite em que brigou com Ric.

Dina ainda que morrendo de medo, não deixou transparecer a fim

que Adan não tomasse vantagem da situação e nem precisou. Ele

segurou Dina pelo punho e puxou a garota para o lado de fora da

quitanda. Bob observou tudo e calmamente atravessou a rua na

direção deles.

Enquanto Adan intimidava Dina Bob tocou no ombro dele fazendo-o

girar a cabeça em sua direção.

- O que foi? Perguntou Adan a Bob. – Não se meta nisso.

- Eu acho que a moça não quer ser tocada por você. Bob estava frio

como uma geleira.

Pelos seus olhos eram capazes de transparecer o um instinto cruel.

Tanto Dina como Adan repararam.

- Eu vou pedir que você solte a moça. Ordenou que Adan soltasse

Dina.

Bob era bem mais alto e muito mais forte que Adan que percebeu

isso rapido, soltando Dina e se afastando lentamente sem retirar os

olhos de cima dele. Dina se posicionou ao lado de Bob e ficou olhando

para Adan.

- Por que você me persegue? Perguntou.

- Eu não persigo você. Respondeu Adan. – Eu só odeio você. Soltou

as palavras rancorosas. – Desde o dia que o seu outro guarda costas

quase quebrou o meu braço.

- Ric não iria quebrar o seu braço. Rebateu Dina enquanto Bob olhou

de soslaio para ela. – Eu pedi desculpas. - Ele não conseguiu

controlar a força dele. Continuou. – E você me empurrou no chão.

- Você a empurrou no chão? Perguntou Bob. – Eu teria quebrado seus

dois braços.

Page 131: St. Peter's Village

Adan girou nos calcanhares e saiu reclamando baixo alguma coisa

como: Esse ai também vai pagar. Dina olhou para Bob agradecido por

ele ter defendido ela e ao mesmo tempo ficou aterrorizada com a

declaração que ele tinha feito para o Adan.

- Você não quebraria os dois braços dele certo? Perguntou ela. - Era

apenas uma brincadeira, né?

- sim, era uma brincadeira. Respondeu Bob não pretendendo

estender o assunto. – Me fale sobre esse Ric.

Dina gelou diante da pergunta dele. Ela havia prometido a Ric que

não contaria a ninguém, apesar de ter contato para Anja. Mas Dina

não considerava que Anja pertencesse ao grupo dos “ninguém”,

então concluiu que se contasse uma parte, não teria problema, Bob

provavelmente não associaria Ric à lenda e muito menos a casa que

desmoronou.

- Ric é o meu namorado. Soltou sem pensar.

- Namorado? Bob levantou uma sobrancelha. – Não sabia que você

tinha namorado. Tentou mais informações. – Está namorando muito

tempo esse Ric.

- Estamos há pouco tempo. Ela tinha se arrependido.

- Então não é nada serio? Bob insistiu.

- É sim. – Eu sou uma garota seria.

- Nunca duvidei disso. Bob respondeu singularmente.

Dina já estava ficando nervosa com as perguntas dele e disse que

estava na hora de ir para casa encontrar com Anja para a prova do

vestido. Dina ainda não tinha nem mesmo feito o pedido à costureira.

Bob acompanhou Dina até a rua da casa dela.

No caminho de volta Dina ficava se perguntando em que Bob

pensava, ele era muito calado e concluiu que se ele não falava muito

seria por que estava pensando.

Ram só pensava em como Dina era impulsiva. Ele observava o jeito

dela caminhar e a forma como ela movimentava as mãos. Os cabelos

dela balançavam com o vento. Ele se lembrou do corpo que ela

revelou tirando a própria camisa para estancar uma ferida que iria

Page 132: St. Peter's Village

curar sem muita preocupação, mas ela ficou preocupada com ele, ela

quis ajuda-lo.

Agora, ele sabia que ela estava encontrando seu irmão mais novo

com certa frequência, seus pensamentos começaram a ficar confusos

Ele olhava para a garganta dela e calculava em quanto tempo levaria

para ela morrer depois que ele cortasse.

- O que você está pensando Bob? Ela perguntou. – Você está tão

calado.

Ele pigarreou algumas vezes antes de responder a ela. Estava tão

concentrado em mata-la que teve que pensar em alguma reposta

casual.

- Não tem muita coisa para fazer na cidade, não é?

- Não muita, mas teremos uma comemoração. Dina respondeu. – A

festa do Solstício será em menos de duas semanas eu acho.

- Ainda realizam esta festa aqui?

- Sim, Você já participou?

- Algumas vezes. Ele assentiu. – Mas foi há muito tempo.

- Essa será minha primeira. – falando nisso tenho que encontrar Anja

para encomendar meu vestido.

Eles continuaram caminhando de volta à casa de Dina.

Anja saiu de casa pretendendo encontrar Dina na casa dela e mais

uma vez, pelo caminho, sentiu a estranha sensação de que estava

sendo observada. Desta vez Anja parou, uniu as mãos junto ao peito,

abaixou a cabeça e começou a rezar.

“Querido Deus, sei que me põe à prova frequentemente e eu aceito meu

destino... Se por acaso esta for minha hora, estou pronta...”.

- Olá moça. Luccar estava parado ao lado dela.

- AHHHHHHHHH MERD... Gritou Anja assustada. – Diabos.

- Calma moça. Ele falou levantando as duas mãos. - Parece que você

viu um... Eu queria dizer fantasma, mas se você prefere diabo, tudo

bem.

Page 133: St. Peter's Village

- Você me assustou. Anja estava com os lábios brancos. – quando foi

que você se... Materializou aqui?

Luccar achou divertido o pânico da garota e pediu desculpas. Quando

ela ficou mais calma eles seguiram juntos, rumo à casa de Dina.

- Por que você estava de cabeça baixa? Perguntou ele quebrando o

gelo do silencio.

- Eu estava fazendo uma oração. Ela respondeu naturalmente

desconfiada.

- Você faria uma oração por mim?

- Claro, não se nega oração a ninguém. – Deus não nega a ninguém.

Lucaar parou e ficou olhando fixamente para Anja. Que garota

extraordinária, ele pensou. Reparou nos cabelos dela, nos olhos dela,

na boca dela e ficou maravilhado. Ela, seguramente ficou assustada.

- Qual seu nome? Ele perguntou.

- Anja.

- Anja? – Só?

- Angélica. Ela corrigiu. – E o seu?

- Luccar. Respondeu pegando as duas mãos dela.

- Lucaar... Luc?

- Não. Ele acariciou as duas mãos dela. - Eu não gosto de

diminutivos. – Ninguém deve ser diminuído, começando pelo nome.

Falava enquanto acariciava as mãos dela.

- Certo. Anja concordou para do mesmo lugar. – Lucaar.

- Você também deveria ser chamada pelo seu nome Angélica. – Não

se deixe ser diminuída. – Você é um anjo, e um anjo jamais é

diminuído.

Levou alguns segundos para Anja processar as palavras de Luccar,

ela parecia estar em transe enquanto ele acariciava as mãos dela. Ele

se aproximou, chegou bem perto dela. Quando passava as mãos dela

nos lábios dele, ela saiu do transe.

Page 134: St. Peter's Village

- Pare. Ela puxou as mãos com força. – Não chegue perto de mim. -

Não dessa forma.

- Eu não estava fazendo nada de mais.

- Então continue NÃO fazendo nada de mais. Ela o advertiu.

Eles continuaram andando até a porta da casa de Dina quando ele se

despediu dela. Ela ficou observando ele se afastar enquanto batia na

porta da casa.

Mesmo achando um desaforo o comportamento de Lucaar, ainda

assim ela pensava nele. Impaciente ficou ali mesmo, do lado de fora

ansiosa, esperando que a amiga aparecesse logo.

Cerca de vinte minutos se passaram quando Dina acompanha de Bob

dobraram a esquina.

Eles encontraram Anja esperando na porta impaciente. Quando ela

avistou Bob ao lado de Dina estalou os lábios e se aproximou. Ficou

paralisada olhando para o rosto de Bob. Esqueceu Lucaar de

imediato.

- Bob, essa é minha amiga Anja. – Anja esse é o Bob.

Bob sorriu para Anja, se despediu de Dina caminhou de volta para

longe delas e seguiu sozinho pela rua. Já estava quase escurecendo.

- quem é esse Deus grego que você achou? - Ele tem um irmão?

Dina confirmou em pensamento que Bob era mesmo lindo, mas que

seria impossível dele ter parentesco com Ric. A primeira diferença

entre os dois era que Ric não a amedrontava, enquanto Bob causava

calafrios profundos nela, ate quando estava sorrindo.

O Ric de Dina transparecia um sorriso alegre e fulgaz, sempre pronto

para uma aventura, mas o sorriso de Bob era uma fortaleza

impenetrável, era seguro, cuidadoso. Ate mesmo a cor dos olhos

entre os dois era impossibilitada de qualquer comparação.

- Dina você está bem?

- O que? Despertou dos pensamentos. – falou alguma coisa?

- Nós chegamos à casa da costureira. – Pode, por favor, parecer

normal?

Page 135: St. Peter's Village

Dina deu de ombros abrindo espaço e Anja pode tocar a campainha.

Uma senhora apareceu depois que a porta abriu. A costureira usava

um lenço cobrindo os cabelos, fita métrica por cima dos ombros e

alguns alfinetes espetados na manga da blusa.

“Depois ela reclama que eu não sou normal”. Pensou Dina.

- Olá queridas. A costureira apontou cadeiras para as meninas

sentarem. – Essa ai é sua amiga, Angélica?

- Sim tia. Respondeu à loura. – Essa é Dina – Também vai participar

da comemoração.

- Que cor você quer o vestido? Perguntou a costureira.

Dina ficou em duvida para responder, ela nunca havia passado por

uma prova de roupa antes e muito menos escolher a cor do vestido.

Na cidade grande onde ela morou, os vestidos já estavam prontos

para serem comprados, ela os escolhia pelo valor não se importando

a cor dele.

- Tia eu quero o meu vestido em dourado com braço. Pediu Anja –

Vai logo Dina, não temos muito tempo, está ficando tarde.

- Dourado Anja? Questionou Dina. – Não acha que chama muita

atenção. – Essa cidade é um pouco... Pequena.

- Dina. – Quando se tem oportunidade de uma festa grande, a gente

aproveita. – Tia ela vai querer o dela em tom verde.

- Verde? A costureira conduziu Dina para tomar as medidas. –

Excelente escola. Anja foi atrás.

- Por que verde. Sussurrou Dina para Anja.

- Porque verde é da cor dos olhos de Ric. Anja sorria. – Você vai com

ele não é?

Enquanto a costureira tomava suas medidas, Dina abaixou a cabeça

pensando em quanto seria bom ficar com Ric na comemoração. Ao

mesmo tempo estava preocupada que talvez ele pudesse não aceitar.

As pessoas poderiam reconhecê-lo na festa.

“Se ele não ficar perto dos mais velhos, ele não será reconhecido. Ela

pensou. Basta ele ficar perto de gente jovem e vai ficar tudo bem.

Concluiu”.

Page 136: St. Peter's Village

- Vou falar com ele sobre a festa.

Page 137: St. Peter's Village

ALDEIA de SANTO PEDRO

Água

Somos órfãos

12

As meninas deixaram a casa da costureira logo após escolherem as

cores dos vestidos e tirarem todas as medidas. Já era tarde da noite

quando elas caminhavam pelas calçadas da cidade. Anja sorria muito

e mal podia esperar pela festa de comemoração do solstício, mas

Dina não parecia satisfeita com seu vestido.

- O que foi Dina? Perguntou quando finalmente parou de tagarelar.

- Eu nunca fui numa festa assim Anja. – Não sei como usar um

vestido longo.

- Não acredito que Diana Gomes nunca foi a uma festa de vestido.

Anja ria enquanto falava. – Na cidade grande não existem festas?

- Claro que existem, mas eu não frequentava. – Eu não era muito

popular.

Anja entrelaçou seu braço ao de Dina e puxou-a para perto dela.

Page 138: St. Peter's Village

- Dina.

- O que?

- Vamos ser amigas para sempre não é? – Nunca vamos esquecer

uma da outra não é mesmo?

Dina parou e ficou frente a frente com Anja. – Claro que sempre

vamos ser amigas. – Aconteça o que acontecer, sempre seremos

amigas. – Mesmo morando longe uma da outra.

Anja abraçou Dina ali mesmo e as duas choraram. Todos os anos

quando Dina passava as férias com a avó era com Anja que ela

confiava seus segredinhos de menina. Anja também esperava ansiosa

pelas férias por que sabia que sua amiga viria da cidade. Agora por

uma fatalidade do destino que provocou a morte dos pais de Dina

elas estariam juntas definitivamente.

- Vamos logo pra casa. – Sua casa, quis dizer. Anja limpou as

lagrimas.

- Minha casa?

- É. – Não é lá que tem os melhores pães de batata da cidade?

- Eu chego lá primeiro que você. Dina já estava olhando para a rua.

- Corrida? Perguntou Anja. – Como nos tempos de criança?

- Simmmmmmmmmm.

Dina saiu correndo e Anja disparou logo atrás.

Em Santo Pedro, na grande fogueira que era acesa todas as noites,

Ram não parecia querer dizer qualquer palavra, Lucaar um pouco

mais distante ditava as ultimas orientações ao resto do clã enquanto

a luz amarela das chamas iluminava o rosto dele. Ele observava cada

labareda de fogo se movimentar em ritmo aleatório sobre os estalos

da madeira sendo queimada. Lucaar finalmente se aproximou.

- Ela disse que está namorando ele. Disse Ram.

- Mais um motivo para mata-la. – E mata-lo também.

- Essa é uma ideia que não sai da minha cabeça. Ram não tirou os

olhos das chamas. - O fato é que eu não quero mata-la.

Page 139: St. Peter's Village

Lucaar não questionou as palavras de Ram, apesar deles serem

amigos há vários anos o respeito pelo líder do clã foi uma das coisas

que ele havia aprendido desde que passou a viver em Santo Pedro.

O treinamento exaustivo contava com lições de respeito hierárquico

na aldeia. O barão fez questão de plantar nas cabeças de todos os

moradores, guerreiros ou não, de que quem mandava na aldeia

absolutamente era o líder do clã, Ram.

- Qual vai ser o novo plano? Perguntou Lucaar enquanto arremessava

um pedaço de graveto nas chamas.

- Continuar de onde meu pai parou. Ram respondeu. – E ela será o

meu bônus.

Eles ficaram conversando em frente à fogueira. Enquanto isso na

igreja da cidade, vó Augusta despedia-se de padre Santiago. Algumas

vezes depois da missa ela se trancava na sala com ele e ficavam

conversando por muito tempo.

- Boa noite Santiago.

- Boa Noite Augusta.

A noite passou tão rápido que Dina não acordou com o som do

despertador pela manhã. Ela só acordou quando sentiu o colchão

balançar com o peso de mais um corpo sentando sobre ele.

- Acorde querida. Vó Augusta passava as mãos pelos cabelos dela. –

Vai chegar atrasada na escola. – Não era hoje a pesquisa na floresta?

- A pesquisa? Levantou a cabeça se perguntando que horas eram. –

Tenho que sair rápido. – Que horas são?

Sem ficar para esperar a resposta da avó, Dina correu para o

banheiro. Passando alguns minutos ela já estava pronta na cozinha

engolindo freneticamente o café da manha. Anja também estaria

atrasada já que ninguém ouviu baterem na porta.

- Anja telefonou querida. – Ela disse que encontraria você na porta da

escola.

Dina agarrou nas alças da mochila e escorregou para fora da casa tão

rápido que mal conseguiu se despedir da avó. Vestida com uma calça

verde musgo e regata branca ela partiu a caminho da escola. Quando

Page 140: St. Peter's Village

finalmente conseguiu chegar toda a turma estava do lado de fora do

portão e a professora organizando os grupos.

CLASSE ATENÇÃO, VAMOS CAMINHAR ATÉ ENTRADA DA FLORESTA

NA PARTE NORTE DA CIDADE. UMA VEZ QUE ESTIVERMOS DENTRO

DA MATA, TODOS TERÃO QUE FICAR JUNTOS SEM SAIR DA TRILHA.

- Trilha? Dina pensou. – Mas eu pensei que a pesquisa não seria

dentro da floresta. - Anja?

- Eu não tenho nada haver com isso. – A ultima vez foi no campo.

- A professora quer que a pesquisa seja num ambiente mais real.

Respondeu Carla se aproximando das meninas.

CLASSE, VAMOS COMEÇAR A ANDAR. FIQUEM PERTO E NÃO

ABONDONEM SEU GRUPO.

A turma seguiu andando pelas ruas até o lado norte da cidade onde

começava a floresta. Avistando a trilha a professora orientou que

cada grupo formasse uma fila indiana enquanto estivesse na trilha.

Dina estava à frente do grupo e quando ia passar o pé no mato

Lorena avançou na frente batendo seu ombro em Dina fazendo-a

desequilibrar.

- Ei, olha por aonde anda. Dina se recompôs.

- E se eu não olhar? Respondeu Lorena. – Vai fazer o que?

Dina não estava com paciência para tolerar os insultos de Lorena no

começo do dia. – Eu vou arrancar seus cabelos, sua estúpida.

- Quem você esta chamando de estúpida? Lorena virou de volta

olhando para Dina com as mãos na cintura.

- Dina, calma. Choramingou Anja. – Não vale a pena. Completou

Carla.

Adan estava atrás de Lorena e quando percebeu que a situação iria

ficar tensa tratou de se afastar o mais longe possível.

- A única estúpida aqui, está com as mãos na cintura olhando pra

mim. Dina se dirigia a Lorena.

- Eu vou mostrar a você quem é estúpida.

Page 141: St. Peter's Village

As duas se pegaram na trilha e nem mesmo a professora que estava

á frente na fila não pode ver as meninas atracadas. Os outros alunos

da turma que estavam próximos ficaram parados olhando as meninas

brigarem.

Anja não sabia o que fazer para separar as meninas. Carla tentou

puxar Dina e foi arranhada por alguma unha. A briga estava igualada

para as duas até que Dina conseguiu empurrar Lorena pelo queixo

fazendo-a cair sentada na trilha, Adan observava de longe. Dina

ajoelhou sobre Lorena e segurou a gola da camiseta dela.

- Nunca mais me provoque. Dina a ameaçou.

- Solte ela Dina, por favor. Pediu Anja.

- Me larga sua órfã selvagem. Esbravejou Lorena.

Dina queria agredir Lorena, mas quando viu que os alunos estavam

olhando e Anja implorava atrás dela, levantou e deu espaço para a

outra levantar.

- Nunca mais me provoque.

Carla sorrindo arrastou Anja e Dina através da trilha deixando Lorena

pra atrás.

- Não sei por que essa menina me persegue. – Não sei por que ela

vive me chamando de órfã.

- Ela é louca. Respondeu Carla. – Ela também é órfã... De pai.

Anja e Dina ficaram olhando para Carla, curiosas.

- Como você sabe disso? Perguntaram as duas juntas.

- Como vocês duas não sabem disso, pergunto eu. Carla respondeu

enquanto seguia pela trilha. – Todo mundo sabe que o pai de Lorena

morreu na expedição com o Santo.

- Santo? Dina torceu o lábio e franziu a testa para Carla.

- O Santo, meninas... Continuou. – Santo Pedro. – Aloww.

Dina deu de ombros e continuou caminhando pela trilha, Anja ainda

tremia por causa da briga entre Lorena e a amiga. Carla tomou a

frente do grupo na trilha enquanto Dina e Anja conversavam baixo

para que ela não percebesse.

Page 142: St. Peter's Village

- Como você me esconde uma informação dessas, Anja?

- Tudo bem, eu não sabia. – Nunca passou pela minha cabeça quem

foram os filhos das pessoas que morreram na expedição. – Pra ser

sincera eu nem acreditava que essa lenda era verdadeira.

Carla virou para as meninas. – Estamos quase chegando.

A turma toda parou depois de uma caminhada de vinte minutos. Os

garotos estavam falando tão alto que a professora teve que chamar

atenção deles. Dina e as meninas sentaram nas pedras fora da trilha.

Cada grupo possuía um binóculo e uma prancheta para fazer as

anotações.

A vegetação baixa estava misturada aos grandes troncos das arvores

que eram tão altas ao ponto de tapar toda a luz do sol em cima

delas. Algumas meninas não foram preparadas para a pesquisa

dentro da floresta, seus shortinhos e saias minúsculas não impediram

que mosquitos e outros insetos fizessem a vida delas muito

desconfortável.

O grupo de Dina estava preparado, todas vestiam calças e Carla

levou consigo repetente para as partes do corpo que ficaram fora da

roupa. Os garotos da turma com seus iPods conectados a pequenas

caixas de som interromperam o silencio da mata, fazendo com que

outras pessoas soubessem que havia gente ali.

Edie estava de pé escovando Xerife, seu cavalo. Edie tranquilamente

passava as mãos na pelagem vermelha de animal. O balançar dos

braços dele fazia sua musculatura mexer de forma majestosa.

Vestindo apenas uma calça velha, desbotada e furada no joelho, Edie

expunha um tronco rígido de abdome impecável.

Toda a tranquilidade do momento acabou no segundo em que Marcos

apareceu afoito respirando forte. Edie olhou para ele ainda

escovando.

- O que foi?

- Tem gente na floresta. Marcos respondeu preocupado. - Não é o clã

de Ram. – Gente da cidade.

Foi a vez de Edie ficar preocupado. Largando o escovão no chão

vestiu uma camisa escura e um capuz cobrindo todo o rosto, só era

Page 143: St. Peter's Village

possível ver o verde dos olhos dele através do capuz. Pegou sua

espada, algumas facas curtas e saltou sobre dorso de xerife.

- Avise os outros. Ordenou. – Onde está Richard?

Dina anotava tudo que as outras meninas falavam cuidadosamente.

Qualquer planta ou bicho que fosse reconhecido por elas era

protocolado na prancheta. Já passava do meio dia e todos pararam

suas pesquisas para o almoço improvisado no meio da mata. Carla

puxou Dina e Anja para comer um pouco mais afastado onde algumas

pedras formavam uma espécie de mesa com cadeiras. As meninas

abriram suas mochilas e revelaram seu almoço.

- O que tem ai? – Eu trouxe torta salgada. Sem maionese, seca - É

politicamente correta.

- Aposto que Dina trouxe pães de batata. Anja sorriu enquanto

mastigava empanados feitos pela mãe dela.

- Eu trouxe limonada e pão de batata. – Acertou.

As meninas devoravam a comida e ofereciam uma para outra. Entre

uma mastigada e um gole de limonada Dina olhava em sua volta

pensando se Ric estaria por ali. Em meio aquele momento relaxado

todas as três garotas perceberam que um animal se aproximava, era

enorme e seu pelo completamente negro. Anja e Carla congelaram

vendo que o enorme bicho andava em direção a Dina. Soltando um

bufo ele parou na frente dela.

Tobruk abaixou a cabeça e suas narinas se alargaram tentando

aspirar o cheiro do pão nas mãos de Dina. Logo ela percebeu o

interesse do enorme cavalo e lentamente esticou o braço diminuindo

a distancia entre o alimento e a boca dele.

Ric andava ali perto e também percebeu a presença de pessoas

estranhas na floresta. Quando ele finalmente chegou próximo onde

Dina estava com as meninas, Tobruk ainda estava lá. Temendo pela

segurança delas Ric saltou de trás de uma árvore, Tobruk percebeu o

movimento e assustado levantou as duas patas dianteiras na direção

dele tentando golpea-lo.

Dina se afastou com as meninas enquanto Ric afugentava o cavalo.

Carla ficou totalmente imóvel atrás de Anja enquanto Dina gritava

com Ric.

Page 144: St. Peter's Village

- Ele não tentou me machucar. Ele só queria comer o pão.

Ric parecia não ouvir uma só palavra que ela dizia e continuou

sacudindo os braços diante de Tobruk na esperança que ele recuasse,

mas por ser o cavalo de Ram, com personalidade tão forte quanto ao

de uma onça selvagem, qualquer tentativa contra sua vontade

parecia ser inútil.

Por muito pouco Tobruk não acertou os cascos na cabeça de Ric. Os

movimentos de esquiva do rapaz eram muito ágeis e ele conseguia

driblar cada vez que o cavalo golpeava ao vento sem sucesso. Foi

uma verdadeira cacofonia de gritos dentro da mata, Dina gritava com

Ric, Ric gritava com Tobruk e o cavalo gritava ao vento dando coices

e golpeando com os cascos dianteiros.

Anja com olhos arregalados aproximou os lábios no ouvido de Carla.

– Venha. Sussurrou. – Vamos rezar.

Carla torcendo os lábios para Anja ignorou o pedido. – Você só pode

estar brincando? . Ela perguntou sem nenhuma resposta.

Em meio a todo o alvoroço, Anja olhava na direção onde estavam os

outros alunos da classe temendo que eles pudessem ter ouvido e

viessem checar o que estaria acontecendo ali, mas quem apareceu no

local foi Céu e Edie montado em Xerife. Quanto Tobruk percebeu a

presença de mais dois cavalos cessou os ataques imediatamente,

soltou seu bufo e disparou mata à dentro.

Com o silencio reestabelecido, Dina se aproximou de Ric para checar

se ele estava ferido, quando deu conta de outro rapaz encapuzado

montado no cavalo vermelho alazão. Edie estava rígido enquanto

olhava para as meninas que o olhavam de volta.

- Quem é esse Ric? Sussurrou Dina, desconfiada sem tirar os olhos

dele e do cavalo.

- Esse é meu irmão Edie. Respondeu esticando o braço sobre o ombro

dela.

Edie ainda rígido retirou o capuz, desmontou Xerife e deixou que as

rédeas deslizassem até o chão. Aproximou-se de Ric olhando fixo

para as meninas, mais precisamente em Carla que abaixou a cabeça.

Ric puxou Dina para próximo do irmão, Anja ficou calada no mesmo

lugar.

Page 145: St. Peter's Village

- Edie, essa é a Diana. – Esse é meu irmão Edgard.

- Prazer. Dina respondendo com um sorriso torto – Aquelas ali atrás

são Carla e Angélica.

Edie não mostrou nenhum sinal de satisfação ao conhecer as

meninas, virando as costas de volta para o cavalo respondeu

secamente. – O que elas estão fazendo aqui? . Montou de volta em

Xerife.

- O que vocês faziam na floresta Dina? Perguntou Ric curioso não se

importando com a frieza do irmão.

Ela olhou para Edie e ignorou completamente a expressão fria que ele

persistia em exibir. – Estamos fazendo uma pesquisa para escola.

Respondeu. – O resto da classe está mais distante, espero que não

tenham ouvido a bagunça com o cavalo preto.

- Vamos sair daqui. Chamou Edie. – Antes que mais alguém nos veja.

Puxando as rédeas de Xerife, seguiu na mesma direção que Tobruk

havia tomado sumindo por trás das arvores.

- Não liga pra ele Dina. Ric falou enquanto alisava os cabelos

castanhos de Dina. – Ele é muito mal humorado, mas é boa pessoa.

Ric sorriu também para as outras meninas. – Aquele cavalo que lhe

atacou era Tobruk. Ele falou olhando diretamente nos olhos dela. – É

o cavalo do meu irmão, Ramcy.

“O cavalo de Ram”, Dina pensou. – Ele não me atacou, ele só estava

cheirando os pães que eu trouxe de casa, só isso.

- Ele poderia ter matado você Dina. Ric respondeu de volta.

Anja e Carla perceberam que ele e ela iriam discutir um pouco e se

afastaram para dar privacidade aos dois.

- Estou dizendo que ele não me atacou.

- Dina, aqui na floresta também é o território de Ram e seu clã. Ric

parecia serio desta vez. – Ele é mau, o cavalo dele é mau, o clã dele

é mau. Ele engoliu em seco. – Se Tobruk estava aqui, provavelmente

Ram também estava perto. – É muito perigoso estar aqui e eu não

sei o que faria se Ram fizesse alguma coisa a você.

Ric não queria discutir com Dina e preferiu beija-la ao invés de falar.

Dina aceitou o beijo e o abraçou de volta. Eles ficaram algum tempo

Page 146: St. Peter's Village

abraçados quando as duas meninas voltaram interrompendo o

momento.

- A professora está convocando a classe. Disse Anja. – Nós vamos

voltar para a cidade.

- Devo ir com elas. Falou para ele ainda abraçada. – A gente

conversa mais tarde. Eles se despediram com outro beijo.

As meninas deram um aceno rápido para Ric e voltaram para junto

dos alunos. – Não vamos contar o que aconteceu para ninguém, ok?

Dina falou olhando para Carla.

- Certo, será nosso segredo. Respondeu. Anja somente concordou

com a cabeça.

Chegando ao local onde a classe se preparava para retornar à cidade,

Dina, Anja e Carla recolheram suas mochilas e fizeram o caminho de

volta. Nenhuma das três meninas comentou sobre o episodio na

floresta, assim como o resto dos alunos ficaram calados na volta para

cidade.

Quando a turma toda estava reunida em frente à escola, o dia já

estava quase acabando. Cada um despediu de seu companheiro de

grupo e aos poucos não restava quase ninguém ali.

Lorena e Adan voltaram para casa juntos. Os passos lentos indicavam

que o dia havia sido cansativo dentro da floresta. Lorena parecia não

ter se conformado em perder a briga para Dina naquela manha. – Ela

me paga. Reclamou. – Eu vou descontar a vergonha que ela me fez

passar.

Adan continuou olhando para o chão. – Eu também espero que esse

dia chegue logo. Respondeu.

- Você ainda esta praticando defesa pessoal? Ela perguntou curiosa. –

Não tenho visto mais você pela praça a noite.

- Eu venho treinando todos os dias. – Nunca mais vou deixar que

ninguém me humilhe novamente.

Eles estavam no centro da cidade, estava escuro, já era noite. –

Aquelas lâmpadas são para a festa? Perguntou Adan.

Ela olhou para cima e viu que alguns homens da prefeitura estavam

trabalhando na ornamentação da festa do Solstício. – Sim, deve ser

Page 147: St. Peter's Village

isso mesmo. Ela respondeu olhando para Adan. – Você já tem um

par?

Lorena perguntou tão casualmente não percebendo que sem querer,

estava afirmando que poderia ir com Adan à festa. Ela não negaria

que Adan era um rapaz muito bonito. Cabelos dourados, olhos claros

e feições dignas de um príncipe. Adan não era tão alto, mas seu

corpo fazia presença em qualquer lugar que fosse.

Seu pai também morreu na expedição que Pedro liderou em busca da

água. Mas assim como os outros, ninguém sabia exatamente sobre

como eles haviam morrido. Se quer foram encontrados os corpos dos

pais de Lorena e Adan.

- Então? Você já tem um par para festa? Perguntou Lorena na porta

de sua casa.

- Ainda não. Respondeu ele. – Vamos juntos? Perguntou a ela.

- Vou pensar. Ela deu um sorriso rebelde para ele quanto abria a

porta de casa. – Boa noite Adan.

Ele ficou sorrindo sozinho enquanto a via bater a porta atrás de si.

– Boa noite Lorena.

Page 148: St. Peter's Village

ALDEIA de SANTO PEDRO

Água

Segredos na igreja

13

Três dias se passaram...

Dina degustava tranquilamente seu desjejum enquanto vó Augusta

terminava de lavar a louça da primeira refeição do dia. Era uma

manhã fresca de sábado e todos os moradores da pequena cidade

esperavam pela grande comemoração do Solstício de inverno que

aconteceria em poucos dias.

- Quando vai pegar seu vestido querida? Vó Augusta perguntou

enquanto secava as mãos no avental. – Já deve estar pronto.

Dina respondeu olhando pela janela pensando há quantos dias ela

não falava com Ric. – Essa semana, eu acho. – Anja vai comigo fazer

a ultima prova.

A avó da menina assentiu com a cabeça e se dirigiu para fora da

cozinha deixando o avental na mesa em frente à neta. – Vou à igreja

falar com padre Santiago querida. – Provavelmente voltarei na hora

Page 149: St. Peter's Village

do almoço. – Você vai encontrar Angélica hoje? Dina saiu da cozinha

e foi em direção à escada. – Sim vó.

Subiu correndo os degraus e quando já estava dentro do quarto olhou

pela janela. Lá embaixo não havia ninguém olhando para cima,

esperando ela aparecer. “Onde Ric estaria?” Ela pensou. Meio minuto

depois ela estava trocando a calça do pijama pelo shortinho jeans e

camiseta de algodão. Mergulhou os pés no tênis e desceu correndo a

escada. Vó Augusta já havia saído para a igreja. “O que ela foi fazer

lá a esta hora da manha?” Pensou.

Quando abriu a porta ela pode observar que os pássaros

cantarolavam pendurados nos fios de energia assim como nos galhos

das arvores. Cada passo dado ela podia ver as pessoas com a alegria

estampada em seus rostos. As ruas estavam ficando bonitas com as

ornamentações temáticas para a festa.

Passando pela porta da igreja, Dina se dirigiu para casa de Anja.

Enquanto isso vó Augusta de reunia com padre Santiago na sacristia.

- Como estão os preparativos para a festa, Santiago? Ela perguntou.

- Você sabe o que eu penso sobre rituais pagãos. Respondeu com um

sorriso. – Mas acho que a tudo vai ficar muito bonito por aqui.

Augusta puxou a cadeira e sentou perto do padre. Soltando um longo

suspiro ela começou a falar.

– Dina uma vez me perguntou sobre a casa dos Baleares, eu disse a

ela da melhor forma que ela não deveria ir lá. O padre se sentou

próximo a ela e continuou ouvindo o que ela dizia. – Conheço minha

neta e tenho certeza que ela foi mesmo assim, e levou Angélica com

ela.

O padre pensou por um momento antes de responder. – Lá não

existe nada que possa fazê-la pensar ao contrario Augusta. Tudo

ficou perfeito. – Até os túmulos são perfeitos.

- Mas se ela cavar os túmulos, se ela descobrir? Augusta estava com

as duas mãos cruzadas em frente ao peito. – Eu não consigo falar

com o Doutor, achei que o psicólogo seria a melhor opção para

proteger Diana do passado terrível que aquele homem provocou na

cidade. – O barão quem deveria ter morrido e não o Pedro.

O padre consolou Augusta. – Eu sei que foi errado o barão ter

derrubado a casa de propósito. – E eu também sei que foi errado ele

Page 150: St. Peter's Village

ter forjado a morte de toda a família e se escondido na floresta todos

esses anos. O padre levantou os olhos para a imagem de Cristo

crucificado.

– Mas eles não devem estar vivos, quem conseguiria viver na floresta

todos esses anos? Existem animais, existem doenças na floresta e

eles nunca mais fizeram contato. Ele voltou o olhar pra ela. – Estão

mortos.

- Eu vi Ramcy com Diana outro dia. Augusta revelou ao padre.

- O que? – Não pode ser você tem certeza? O padre não podia

acreditar no que a avó de Dina estava afirmando. – Ramcy era o filho

mais velho do barão.

- Ele mesmo Santiago, o primogênito de Celina está vivo e

conversava com Diana na minha porta em plena luz do dia.

Foi a vez de Augusta levantar e tocar na imagem de Cristo. – Eu

estava limpando a janela e reconheci o rapaz de longe. – Fiquei

atordoada e deixei o balde cair. – Tenho certeza de que o balde

atingiu um deles e quando desci, Diana estava completamente

intacta. Augusta tremia enquanto falava. – Ramcy não estava mais

lá.

- Calma Augusta.

- Mas que calma você quer que eu tenha Santiago? Ramcy se

apresentou a minha neta com outro nome. – O barão está tramando

alguma coisa, ele vai fazer alguma coisa com a minha neta. –

DIABOS.

O padre alcançou as duas mãos nos ombros dela. – Eu sei que você

está nervosa, mas não esqueça que você esta na casa do Senhor. –

Eu vou tentar entrar em contato com Cipriano, fique calma mulher.

Augusta estava chorando temendo não só que Diana descobrisse

sobre a fraude da casa Baleares, mas também que ela pudesse correr

risco de vida. – Ele virá atrás de nós Santiago, ele virá atrás de mim.

- Ele nunca perdoou nós termos ficado do lado de Pedro. – Aquele

demônio dizia que o nosso santo tentou matar ele depois que matou

toda a expedição.

Ela enxugou as lagrimas enquanto continuava a desabafar com o

padre Santiago. – Tudo por causa da água que o Santo Pedro

Page 151: St. Peter's Village

descobriu. Agora ele quer vingança. Já passaram quase dez anos,

mas eu me lembro como se fosse ontem.

O barão foi o primeiro a retornar da expedição em busca da água. Ele

estava sujo e com as roupas rasgadas, não falava coisa com coisa.

Quando saiu da floresta sozinho todos perguntaram sobre os outros

homens que viajaram com ele, mas ele só sabia dizer que estavam

mortos. O barão ficou trancado em casa, isolado da cidade por dois dias

até que o professor Pedro saiu da floresta. O pobre Pedro lamentava

muito sobre a grande perda na busca da água. Ninguém aqui na cidade

acreditou que a lenda pudesse ser verdadeira, as pessoas preferiam

acreditar que Pedro era um santo, mas ele insistia em dizer que a lenda

era verdadeira enquanto o barão dizia ser falsa. As pessoas ficaram

divididas entre as duas versões e optaram que verdadeira ou não, Pedro

era um verdadeiro santo.

- Eu sempre a creditei que ele era e sempre será um santo.

Depois que ele saiu da floresta e confirmou a morte de todos os outros

membros da expedição, a cidade ficou em luto coletivo pelos pobres

homens que morreram na floresta. Pedro começou a fazer pequenos

milagres, ele curava os ferimentos das pessoas, a própria mãe de

Angélica que nunca pode ter filhos engravidou.

Foi sorte ela não ter morrido porque as outras mulheres que

engravidaram na mesma situação morreram depois que seus filhos

nasceram esse foi o maior dos milagres. A baronesa gostava muito da

mãe de Angélica, comprava todos os bordados dela.

- Celina contou tudo a você não foi Augusta? Perguntou Santiago.

Sim, quando o barão levou a família forçada para a floresta, Celina

enviou mensagem através de um empregado de confiança dizendo que

estava bem e que estava viva na floresta. Foi um tremendo susto que eu

levei quando o empregado me mostrou o bilhete, eu mesma achei que

era mentira, só acreditei quando ela falou sobre um ingrediente secreto

que eu coloco na receita do pão de batata. A partir daí eu agradeci a

Deus por ela e a família estarem vivos.

Eles estavam todos vivendo escondidos na Aldeia de Santo Pedro dentro

da floresta. A mesma que era mencionada na historia pelo próprio Pedro

antes de morrer.

- Eu juro que pensei que o barão matou nosso santo, mas quando

encontraram o corpo dele queimado por velas dentro de casa ao lado

Page 152: St. Peter's Village

de um bilhete escrito pelo próprio punho, conclui que ele preferiu

estar perto do Nosso Senhor.

- Suicídio é contra as leis da bíblia.

- O barão e Pedro eram tão amigos, nunca entendi por que eles não

se falaram mais desde que voltaram da expedição. Suspirou vó

Augusta.

Meses depois Celina conseguiu sair da floresta, nós nos encontramos

aqui mesmo, foi a ultima que nós a vimos. Ela revelou que foi Juan, o

barão quem estava por trás dos desaparecimentos dos meninos da

cidade. Celina disse que o barão estava transformando a Aldeia de

Santo Pedro em uma grande fortaleza povoada por guerreiros treinados,

ele estava ficando louco.

Padre Santiago pegou nas duas mãos de Augusta. – Tudo vai ficar

bem. – Vamos resolver isso sem precisar fazer qualquer alarde.

Augusta estava inconsolável. – Ele voltou para fazer tudo de novo

Santiago.

***

Dina e Anja passaram o dia inteiro juntas. Anja ensaiou passos da

coreografia que iria tocar na festa para os casais dançarem juntos na

frente dos juízes. Anja era graciosa, mas Dina parecia ter dois pés

esquerdos.

- Mais uma vez Dina, por favor. Anja precisaria de muita paciência

para ensinar Dina. – Agora... Um, dois, vai à frente... Um, dois, volta

a trás.

- Eu já devo ter feito isso umas mil vezes e ainda não aprendi. Dina

sentou. – Melhor a gente parar por hoje.

- OK, você quem sabe. – Mas vamos treinar mais amanha

combinado?

Dina concordou com a cabeça passando as mãos nos pés, estavam

doloridos de tanto treinar com Anja. – minha avó saiu hoje de manha

para a igreja. – O que será que ela queria falar com o padre?

Page 153: St. Peter's Village

Anja se desmontou nas almofadas ao lado da amiga e ligou o mp3

nas caixas de som. – Eu não faço ideia, talvez ela esteja se

confessando ou programando algum curso para o próximo verão. O

som que saltava das pequenas caixas estava em volume baixo mais

pode chamar atenção de Dina.

- Eu adoro essa musica Anja. – Me faz lembrar Ric. – Não o vejo há

vários dias. Ela deitou a cabeça na mesma almofada da amiga. –

Como vou falar com Ric sobre a nós irmos juntos a festa se não sei

onde ele está. - Será que devo ir na floresta procura-lo?

Anja se levantou e andou até a porta principal da casa. Os ouvidos da

loura eram simplesmente ótimos para perceber as coisas. – Acho que

ouvi alguém bater palmas lá fora. Dina ficou esperando deitada nas

almofadas da sala com o mp3 da amiga.

Anja voltou correndo – Dina... Você não imagina quem está lá fora,

adivinha.

Dina deixou cair o mp3 sobre as almofadas e ficou sentada. Seu

coração começou a acelerar esperando que a amiga dissesse as

palavras que ela queria ouvir. Os olhos de Anja estavam brilhando

tanto quanto da amiga correspondendo à felicidade entre elas. – O

Ric está ai fora? - Me diga que é ele.

Anja sorrindo balançou a cabeça para cima e para baixo concordando

com a amiga. – Sim - O gato está ai fora esperando por você amiga.

– Vai lá, o que está esperando?.

Dina levantou por completo enterrando os pés de qualquer jeito nos

tênis. Arrumou as mechas castanhas e no segundo seguinte estava

do lado de fora da porta encontrando os olhos verdes sedutores que

há dias ela não via.

Ric estava olhando para ela com o mesmo sorriso libertino de

sempre, como se ele tivesse se despedido dela na mesma manha

daquele mesmo dia. Ela desceu o degrau da varanda e parou em

frente a ele, agora a distancia entre os dois era menor que um

palmo. O calor do corpo de Ric era capaz de evaporar toda a

transpiração dela naquele espaço, mas ela ficou no mesmo lugar

completamente hipnotizada pelo brilho verde do olhar dele.

Ric segurou Dina pela cintura e trouxe-a para junto do seu corpo e

ela pode sentir de fato todo o calor daquele homem. – Onde você

esteve? Ela perguntou. – Porque você sumiu?

Page 154: St. Peter's Village

- Eu tive que lidar com Ram, estive procurando ele na floresta.

Respondeu Ric agora com as duas mãos no rosto dela.

- Eu pensei que você tinha se esquecido de mim. Ela sussurrou para

ele.

Ele pousou os lábios nos dela com leveza fazendo com que ela

fechasse os olhos. Delicadamente ele beijou a curva do queixo dela e

sussurrou de volta em seu ouvido. – Eu jamais esqueceria você Dina.

– Você é presença constante nos meus pensamentos.

Ela virou a boca em direção à dele e o beijou forte. Foi um beijo

longo entre os dois. Anja estava observando tudo do lado de dentro

da janela da casa, ela estava sorrindo sozinha pela alegria da amiga.

- Como você sabia que eu estava aqui? Ela perguntou para ele.

- Eu fui até sua casa e as luzes estavam apagadas.

- A casa estava apagada? Dina perguntou. – Minha avó também não

está em casa?

- Não tinha ninguém em casa Dina.

De repente Dina se abateu de preocupação com vó Augusta, já

escurecera e ela ainda estava na igreja, ou ela poderia estar em

outro lugar.

Ric percebeu no mesmo instante a preocupação da garota e sugeriu

acompanha-la até casa. – Vamos à sua casa Dina, eu levo você até

lá. Ele disse. – Céu está aqui perto.

Dina suspirou um segundo se lembrando do passeio com Ric pela

floresta montada em Céu. Foi um momento maravilhoso que ela

gostaria muito de repetir.

– Não vai dar. Respondeu ela. – Antes vou passar pela igreja e falar

com padre, se minha avó estiver lá pretendo descobrir porque ela

passa tanto tempo com ele.

Ric tombou a cabeça para o lado e retorceu um sorriso de resposta a

ela. – Você é uma garota que gosta de fazer as coisas por si própria,

não é mesmo? – Não tem medo de andar sozinha por ai?

- Não, o que pode acontecer comigo? Ela respondeu sorrindo de

volta. – A igreja é logo ali depois das ruas de terra. Nada vai

acontecer comigo.

Page 155: St. Peter's Village

Ric passou as mãos nos cabelos dela. – Você é incrível Dina, eu

jamais poderia imaginar que iria encontrar uma garota assim como

você. Agora ele estava com as duas mãos nos cabelos dela.

– Você me faz sentir livre e me ajuda esquecer o pesadelo da floresta

e do meu passado. Já com o corpo encostado ao dela, mal havia

espaço entre eles. – Sinto que com você eu poderia sair daqui, dessa

cidade. Ele a beijou.

Depois que Ric sumiu na floresta, Dina despediu de Anja e caminhou

pelas ruas semi-iluminadas em direção à igreja. Fazia frio e ela havia

deixado o cardigan junto com a bolsa na casa de Anja.

Ela envolvia seu corpo com os próprios braços, a respiração estava

mais ofegante. À medida que ela apressava os passos percebeu um

vulto na outra calçada.

Uma imagem escura que destoou na pouca iluminação que dividia

espaço com a folhagem, a calçada estava encostada na floresta, um

local muito convidativo para que algum animal ou pessoa com más

intenções surgisse inesperadamente.

Dina apressou os passos, estava quase correndo quando escutou um

bufo e parou. Imóvel, virou a cabeça lentamente e depois o corpo

deparando com a imagem de um animal grande e negro.

“É o cavalo de Ram”, ela pensou. “Ric disse que o nome dele é

Tobruk”.

Menos tensa, Dina virou de volta e continuou a caminhar. Tobruk,

majestoso, seguia atrás dela lentamente. Os quatro cascos no chão

soavam uma melodia pertinente, e a garota começou a ficar

preocupada.

Dina virou novamente para o cavalo, o movimento assustou o animal,

mas sua reação foi bufar forte para ela. Ele arrastava uma pata

dianteira no chão provocando um som arranhado com o casco.

Ela ficou absolutamente imóvel, quase não respirava de tanto medo

que estava sentindo.

Deslizando as pernas para o lado Dina caminhou lateralmente, tão

lento que quase não se percebia que ela saia do lugar, Tobruk a

olhava com desconfiança. “Calma Dina.” Pensou consigo mesma.

“Lentamente, vire-se e ande com calma”... Ela começou a correr em

direção a sua casa, que não estava muito longe.

Page 156: St. Peter's Village

Sem olhar para trás era possível ouvir o som dos cascos galopando e

cada vez chegando mais perto. “Ele é mau, o cavalo dele é mau...”

Ela pensava nas palavras que Ric dissera.

Quase na porta de casa Dina tropeçou, mas dessa vez não caiu,

conseguiu equilibrar e continuou correndo como se sua vida

dependesse disso. Talvez dependesse.

Ao alcançar a maçaneta ela lembrou que deixara sua bolsa na casa

de Anja, com a chave dentro. Tobruk já estava a um metro de

distancia dela. Com medo do monstruoso animal, Dina grudou as

duas mãos no rosto e virou para a madeira antiga da porta, Tobruk

alongou o pescoço e com as duas narinas enormes, começou a

cheirar Dina. Cheirou as costas causando cócegas na garota, depois

subiu para o cabelo e, finalmente estacionando no bolso do short

jeans que ela vestia.

Mais aliviada ela virou-se cautelosamente e deixou que o cavalo a

cheirasse. – O que você quer? Ela perguntou. – Gostou do meu

cheiro? O cavalo tentava sem sucesso enfiar a língua dentro do bolso

do short dela.

Dina, muito cuidadosa, escorregou a mão devagar e mergulhou no

bolso trazendo para fora migalhas de pão de batata. “O pedaço que

caiu no chão na casa de Anja” ela pensou. “Eu enfiei no meu bolso ao

invés de jogar no lixo, é isso que ele quer.” Ela concluiu.

Tobruk lambeu as migalhas de pão na mão dela e quando acabou

soltou um bufo. – Você quer mais? Ela perguntou. – Vou pegar mais

lá dentro, assim que minha avó abrir a porta.

Após algumas batidas ela se conformou que não havia ninguém em

casa, e o cavalo não parava de cheirar e bufar para ela. Dina já

estava ficando nervosa diante da expectativa do animal, já não havia

mais migalhas em seu bolso e ele se mostrava cada vez mais

agitado.

Quando o desespero estava aparente, Dina temia que o cavalo a

mordesse. Ela pensou em tirar o short e deixa-lo no chão para

distrair o animal. “Isso é ridículo” ela pensou, “não vou ficar de

calcinha na porta de casa por causa de um cavalo que gosta de

comer pães”.

Foi ai que Tobruk começou a mordiscar as alças do short dela, o

desespero a dominou totalmente e ela começou a abaixar o short,

Page 157: St. Peter's Village

tirou uma perna após a outra ate estar completamente, só de

calcinha.

Deixando o short caído no chão, sendo inspecionado por Tobruk, Dina

foi andando de vagar pela da lateral da casa, “espero que ele não

venha atrás de mim” ela não parava de pensar.

Com toda a sua atenção voltada para o cavalo destruindo seu short,

ela já estava alcançando a rua dos fundos da casa, mas Dina só

percebeu que não estava sozinha quando esbarrou em Bob.

- Ahhhhhhhhhhhh. Gritou de susto

- Calma, sou apenas eu. Falou Bob tranquilamente enquanto Dina se

recompunha do susto. – O que houve? Ele perguntou.

Pensando em como iria descrever a razão por ela estar do lado de

fora da casa vestindo blusa e calcinha ela falou sem pensar - Tem um

cavalo na porta da minha casa, ele é perigoso. Ela sabia qual era o

cavalo e a quem ele pertencia. – Fiquei com medo e vim aqui atrás.

“Não acredito que eu disse isso” ela pensou.

Levantando uma sobrancelha enquanto olhava para ela de forma

curiosa. – E você veio aqui atrás desse jeito? Ele apontou o indicador

para baixo da cintura dela. – Vermelha é uma cor muito bonita. Ele

ignorou completamente o fato dela ter dito que um cavalo estaria na

porta da casa dela.

Foi a vez das bochechas de Dina ficarem vermelhas. – Ai merda, não

olhe, vire pra lá. Falou vergonhosamente enquanto tentava puxar a

blusa mais abaixo tentando esconder o que ele já havia visto. “Como

ele apareceu aqui?” Pensou. “Ai que vergonha, isso não pode estar

acontecendo”.

- É a segunda vez que você me mostra suas roupas intimas. Ele

soltou um risinho maldoso enquanto olhava para ela. – Primeiro da

cintura pra cima e agora da cintura pra baixo. – Está tentando me

seduzir? Foi a primeira vez que Bob pareceu ser um rapaz normal.

Dina já não sabia mais o que fazer e resolveu voltar para a porta de

casa. “Antes o cavalo me ver seminua do que ele”, concluiu.

Bob retirou a blusa revelando toda a musculatura por baixo dela,

Dina por um segundo esqueceu a situação e passou os olhos no mapa

musculoso do tronco dele. Era simplesmente lindo, perfeito.

Page 158: St. Peter's Village

Quando caiu em si, seu rosto ficou corado novamente enquanto Bob

entregava sua blusa a ela num gesto de solidariedade.

- Pegue, é mais comprida do que a sua. Ele voltou a ficar serio

novamente.

- Obrigada. Ela vestiu a blusa dele rapidamente. – Quando o cavalo

sair de lá eu entro e devolvo sua blusa.

- Não tem nenhum cavalo lá Dina. Ele apontou para a entrada da

casa dela. – Cavalos não perambulam pelas ruas a essa hora da noite

e não ficam na porta das casas das pessoas.

“Não tem cavalo?” Ela pensou. “Mas tinha um cavalo enorme lá na

porta, o cavalo de Ram”. Ela avançou em direção a entrada da casa

encontrando apenas o short mordido no chão. “Ele foi embora”

Concluindo que era melhor não explicar mais nada à Bob e esquecer

a historia do cavalo, ela o agradeceu. – Obrigada pela camisa, eu

devo ter me enganado. – Acho que foi um cachorro. Ela bateu na

porta depois que percebeu que as luzes internas estavam acesas. Sua

avó, enfim estava em casa.

Bob estreitou os olhos em direção a ela. – Você confundiu um

cachorro com um cavalo? Ele perguntou entendendo que ela estava

escondendo o que tinha visto. – Parecem ser de tamanhos diferentes.

Dina tentou explicar o que parecia inexplicável. – Eu devo ter

confundido, foi de repente... O cachorro me assustou.

- Deve ter sido um cachorro bem grande.

Ela pegou o short no chão enquanto vó Augusta caminhava na casa

em direção à porta. – Obrigada mais uma vez, mas só vou devolver

sua camisa quando você devolver a minha. Ela tentou mudar o

assunto

- Tudo bem. Ele respondeu bem serio. A vó da garota destrancava a

porta – Combinado. Acenou com a cabeça e caminhou em direção as

ruas sumindo na escuridão.

- Oi vó. Ela entrou correndo em direção as escadas.

- Querida isso ai é um vestido?

Page 159: St. Peter's Village

Dina, bastante nervosa pensou numa reposta convincente para

aquele momento, mas acabou gritando do andar de cima. – Onde a

senhora estava até agora?

- Amanha conversaremos querida. Vó Augusta não sabia o que

responder a neta. Dina já estava em seu quarto sentindo-se mais

aliviada. – Tudo bem vó, boa noite. Trancou a porta do quarto e

retirou a camisa de Bob.

A camisa era de um tecido rústico, parecia ter sido feita a mão. Ela

reparou os pequenos botões de madeira e então aproximou a peça de

roupa em direção ao seu nariz. “Será que tem o cheiro dele?” Ela não

parava de pensar. No mesmo segundo ela afastou a roupa. “Não seja

ridícula Dina.” Ela soltou a camisa no chão, fechou a janela e

caminhou para o chuveiro.

Ram já estava longe suficiente da casa dela. Atravessou para a

calçada próxima à floresta, sua pele clara contrastava com o reflexo

da baixa iluminação que a cidade exibia à noite. Não se ouvia ruído

ou piar de qualquer animal e Ram ficou à vontade para soltar um

pequeno chamado em forma de assobio.

Em poucos instantes Tobruk emergiu da mata e se aproximou de

Ram. Alisando o cavalo com uma das mãos enquanto a outra retirava

pequenas folhas da crina do animal.

– Comparar você a um cachorro não foi legal meu amigo. Ram

montou no cavalo. – Você gosta dela? O cabalo bufou trotando para

dentro da mata. – Quando ela estiver na Aldeia você poderá brincar o

quanto quiser.

Eles galoparam floresta à dentro para encontrar com Edie esperando

na entrada secreta de Santo Pedro.

- É um pouco tarde para uma visita, ainda mais quando não é

desejada. Ram falou primeiro.

Tobruk bufava para Xerife e este o ignorava completamente.

- Tenho percebido que você está perambulando pela cidade. Foi a vez

de Edie falar. – E quanto a historia do perigo da exposição?

- Perambulando não seria o termo correto caro irmão do meio. –

reconhecendo o campo soaria melhor.

Page 160: St. Peter's Village

- O que você quer dizer com reconhecendo? Edie falava calmamente

enquanto olhava serio para Ram. – Você já conhece a cidade muito

bem.

- As coisas mudaram caro irmão. O olhar de Ram era frio, seguro,

profundo. – Existem pessoas novas morando na cidade, mais

meninos... Garotas que gostam de passear pela floresta.

- O que exatamente você está pensando? – Me fale agora.

- Não é óbvio?

- Diga logo. Edie estava impaciente.

- Está na hora de renovar a população da minha aldeia.

- Sua aldeia?

Ram ignorando a pergunta continuou. – Minha aldeia está precisando

de novos guerreiros e principalmente novas garotas. Os guerreiros

andam muito solitários.

- Você não pode estar falando serio. Edie já havia concluído o

propósito do irmão. – Ele morreu, e eu espero muito que aquele

sonho insano esteja lá, debaixo da terra, junto com ele.

- Nosso pai pode estar morto, mas o desejo dele de fundar um

povoado perfeito, livre de qualquer doença que já existiu, ainda está

bem vivo. Os olhos de Ram brilharam no meio da escuridão. Os

cavalos pareciam mais agitados. – Vou continuar de onde meu pai

parou.

- Você está ficando louco igual a ele. Edie começou a se afastar. – Eu

não vou permitir que você comece todo aquele pesadelo novamente.

- Quem não está comigo é meu inimigo.

Edie puxou as rédeas de Xerife - Então vamos ser inimigos. E os dois

galoparam para longe deixando Ram sozinho com Tobruk.

Ram antes de passar pela entrada secreta olhou para trás e seus

olhos brilharam novamente.

– Pode apostar com isso irmão.

Page 161: St. Peter's Village

ALDEIA de SANTO PEDRO

Água

A cidade se prepara

14

Incrivelmente a cidade começou a ficar a agitada com os

preparativos da festa do Solstício de inverno que aconteceria em

poucos dias. Todos os moradores ajudavam a enfeitar as ruas das

suas casas, até o prefeito da cidade que quase não dava as caras

apareceu com seu discurso memorizado e politicamente correto.

Uma grande fogueira estava planejada para ser montada na praça

principal. Era tradição acender a fogueira pouco antes da meia noite.

As pessoas que moravam na cidade tinham o habito de colocar

bilhetes entre a madeira com pedidos e agradecimentos para que

pudessem ser queimados no momento em que fogueira fosse acesa.

Bandeiras e lampiões eram pendurados nas arvores e nos postes e

ate a igreja ficou bonita. O padre apesar de não gostar nem um

pouco do apelo da festa, organizava barracas com comidas típicas da

região. Tudo estava ficando perfeito e ao que parecia essa festa era

muito esperada.

Page 162: St. Peter's Village

Infelizmente na mesma ocasião, as pessoas aproveitavam para

homenagear seus mortos, mais precisamente as pessoas que

morreram durante a busca da água milagrosa e as que

desapareceram anos atrás. Todos os parentes dos mortos e

desaparecidos também colocavam bilhetes da fogueira.

Até a escola estava enfeitada, os próprios alunos se encarregavam da

decoração para o evento. Dina e Anja estavam na aula de educação

física treinando com arco e flecha.

Anja não gostava nem um pouco de manusear armas, muitos menos

as antigas. – Não entendo porque a professora gosta que a gente

aprenda a usar isso. Anja largou tudo no chão. – Eu definitivamente

vou reprovar em educação física.

Dina ergueu o arco posicionou a flecha por baixo do anel da corda e

puxou-a para trás usando os três dedos do meio. Quando a corda

estava próximo à sua bochecha, mirou no alvo quase 20 metros de

distancia e disparou. Por pouco a flecha não acertou o alvo central,

mas foi um bom tiro.

A professora e os outros alunos bateram palmas para ela. – Excelente

tiro Diana. Falou a professora. – Que acha de entrar para o time de

arco.

- Obrigada, mas não estou interessada. Dina respondeu lembrando

quando treinava arco com seu pai. Ele frequentava um clube de arco

e flecha antes de morrer no sequestro relâmpago.

- Se mudar de ideia me avise garota. A professora soprou forte o

apito e gritou. – ACABOU NOSSO TEMPO - TODOS PARA O

CHUVEIRO, você não Adan. Ela apontou para o material. – Você vai

arrumar isso tudo.

Adan olhou torto para a professora mais não falou nada,

silenciosamente recolheu tudo e depois encontrou os outros garotos

no vestiário.

Depois que Dina e Anja estavam fora da escola, conversavam com

Carla sobre os vestidos que iriam usar na festa.

- Quem vai ser seu par? Perguntou Carla.

- Eu não tenho um par. Anja pensava em Luccar vestido de traje

combinado com o vestido dela.

Page 163: St. Peter's Village

- Eu vou com Ric.

As duas garotas olhavam para ela. – Você já falou com ele?

Perguntou Anja. – Quem é Ric mesmo? Perguntou Carla.

Dina ficou um pouco tonta olhando para as duas e respondeu

prontamente. – Ric é o cara da floresta que assustou o cavalo preto,

de olhos verdes. Falou olhando para Carla. - Ainda não falei com ele

Anja, mas falarei hoje.

Carla desconversou e despediu das meninas. – Preciso ir pra casa,

minha mãe está me esperando.

- Xau Carla. – Xau Carla.

As duas meninas que ficaram continuaram conversando depois que a

outra saiu. - Como você vai fazer para encontrar com ele? Perguntou

Anja.

- Eu vou à floresta procurar por ele. Ela respondeu.

- E como você espera encontrar ele na floresta. Anja parecia

preocupada com Dina.

- Eu pretendo ir dentro da floresta, onde fizemos a pesquisa da escola

e simplesmente vou gritar o nome dele.

- Você está louca? Perguntou Anja. Seu coração estava batendo mais

forte. – Você não vai fazer isso, vai?

- Claro que vou, tem uma ideia melhor?

Anja estava certa de que Dina pretendia realmente ir à floresta

procurar por ele, então tentou convencê-la a não ir sozinha. - Irei

junto com você. Ela falou.

Dina não queria colocar Anja em perigo, pois sabia que Ram também

estaria na floresta. – Tudo bem. Respondeu. – Mais tarde eu passo na

sua casa. Dina estava determinada a encontrar Ric, mesmo que isso

significasse contar uma mentira para sua melhor amiga.

No caminho de volta pra casa, depois da escola, elas caminhavam

juntas. Anja tagarelava sem parar enquanto Dina a ouvia

atentamente, em meio às palavras da amiga loura, ela reparou um

homem familiar que caminhava rapidamente por trás de alguns

andaimes na calçada que eram usados para enfeitar a cidade.

Page 164: St. Peter's Village

Reconhecendo Paulo imediatamente, agarrou no braço de Anja e a

chamou. – Vamos ali comigo, rápido.

- Ir para onde? Perguntou Anja quase engasgada com suas próprias

palavras. – Eu estava no meio da descrição do meu vestido de festa

e...

- Anja, eu preciso correr. Interrompendo a amiga. – Você vem

comigo ou não?

- Eu não posso. Ela respondeu. – Tenho que ir à igreja encontrar

minha mãe, ela esta fazendo os bordados do altar.

- Nos encontramos mais tarde Anja, xau. Dina se despediu não dando

chance de resposta para amiga.

- Aonde ela vai com tanta pressa? Anja nunca entedia a velocidade

com que Dina resolvia as coisas.

Quase na porta da Igreja Anja viu Lucaar na calçada lateral

encostado com os braços cruzados olhando para ela. Naquela hora do

dia ela percebeu o quanto Lucaar era bonito, seus cabelos brilhavam

com a luz do sol e a pele dele era muito branca, contraste perfeito

para seus olhos escuros.

Ela caminhou em direção a ele, seus passos eram temperados e

desconfiados. – Oi. Ela teve coragem de falar. – O que você esta

fazendo aqui?

- Estava passando e resolvi parar aqui para ver você. Ele respondeu

se aproximando dela. – Lhe dar um beijo de boa tarde, talvez. Ele já

estava tão perto que sua mão alcançou uma mecha rebelde de cabelo

louro e escondeu atrás da orelha dela.

Anja de afastou não permitindo que suas mãos fossem além da

mecha de seu cabelo. – Eu não vou beijar você. Ela respondeu.

- Mas poderia. Ele a devorava com seus olhos.

- Não conte com isso. Ela rebateu de novo. – Eu não conheço você,

apenas sei o seu nome e isso não é suficiente para eu beijar você.

- Está indo para igreja. Ele mudou de assunto. – Fez aquela oração

para mim?

Anja abaixou a guarda e respondeu com um sorriso orgulhoso.

Page 165: St. Peter's Village

– Claro que fiz, mas hoje eu não vim aqui para fazer oração alguma.

Ela continuou. – Vim ajudar nos preparativos para festa.

- O solstício? Ele perguntou.

- Sim, o Solstício. Respondeu caminhando em direção à porta de

entrada da igreja. – Xau Luccar, eu tenho que ir agora.

- Mais uma coisa.

Ela parou no meio da escadaria da igreja e virou-se para ele. – Vai

me pedir para fazer outra oração para você?

- Não. Ele respondeu sério. – Vou pedir que guarde uma dança para

mim no dia da festa. Virou de volta para a rua e foi embora deixando

Anja sem poder falar qualquer palavra de resposta.

Anja piscou duas vezes pensando em dançar com Lucaar na festa,

caindo em si deu de ombros e desapareceu atrás das portas da

igreja.

Enquanto isso, Dina percorria as calçadas onde estavam os

andaimes, na esperança de não perder Paulo de vista. Ele caminhava

tranquilamente não percebendo que estava sendo seguido por ela.

- PAULO. Ela gritou.

O homem parou de andar no mesmo instante em que ouviu seu

nome sendo pronunciado pelo grito da garota. – Diana. Ele disse

abrindo um sorriso sarcástico. – Posso ajuda-la com alguma coisa?

Suas palavras eram quase sussurros.

- Não vai mais fazer analise comigo? Dina se aproximou

ingenuamente do homem. – Sua secretária disse que o senhor sumiu.

- Eu não sumi. Ele respondeu. - Minha secretária não informou

direito, eu precisei viajar e não tive tempo de cancelar as consultas.

- Tá certo. – Quando vejo o senhor então?

Ele acomodou os enormes óculos no rosto. – As consultas estão

canceladas por tempo indeterminado. Ele respondeu.

- Mas Paulo, minha avó disse que...

- Eu telefono para ela depois Diana. Interrompeu. – Agora me deixe

ir, preciso visitar um amigo que está doente.

Page 166: St. Peter's Village

“Ele está estranho”. Ela pensou, mas fez sinal com a cabeça

parecendo concordar e despediu-se.

- Então está certo, você fala com minha avó e remarcamos quando

estiver disponível.

- Sim. Ele respondeu apressadamente. – Aproveite o Solstício, é uma

bonita festa. Adeus.

- xau. “Com certeza ele é um estranho”. Pensou.

Enquanto voltava pelas ruas adornadas com bandeiras e enfeites, ela

percebeu que estava perto do velho chafariz e lembrou que havia

esquecido completamente de Ric. “Vou à floresta falar com ele”.

Quando ela notou uma imagem branca acinzentada flutuando por

dentro das folhagens próximas à calçada.

“É o Céu”. Ela reconheceu o cavalo de Ric. “Se ele esta por aqui, Ric

também está aqui”. Concluiu que ele estava por perto.

- Céu, venha aqui. Ela chamou o cavalo que prontamente

reconhecendo – a se aproximou. – Bom garoto.

Ela deslizava as mãos sobre o pelo do cavalo sentindo uma conexão

entre os dois. Estava maravilhada em poder tocar naquele enorme

animal. – Você sabe onde está o Ric.

- Desse jeito vou ficar com ciúmes. Ric falou enquanto emergia das

árvores.

Dina abriu um enorme sorriso em resposta a ele. – Ele gosta de mim,

me deixou toca-lo sem que você estivesse aqui.

Foi a vez de Ric se aproximar dela. – Não é difícil gostar de você

Dina. Ele tocou a cintura dela com as duas mãos. – Difícil seria estar

longe de você.

Ela pousou as mãos nos ombros dele enquanto o ouvia falar.

– Eu senti sua falta. Ele disse e finalmente a beijou.

O tempo que eles passaram juntos voou e logo anoiteceu. Dina

resolveu falar com Ric sobre eles irem juntos à festa.

- Sabe que logo estaremos comemorando o Solstício aqui na cidade,

não é? Ela iniciou o assunto. – Você já participou alguma vez?

Page 167: St. Peter's Village

Ele pensou um pouco antes de responder a ela. – Eu me lembro

vagamente, era pequeno demais para sair sozinho nessas festas,

minha mãe nunca me deixou participar sem que ela estivesse me

acompanhando. – Acho que somente Ram frequentou essa festa.

- Mas você já foi? Mesmo com sua mãe? Ela insistiu.

- Sim, lembro que havia barracas de comidas e uma fogueira muito

grande no centro da praça.

Dina abaixou a cabeça e começou a falar sobre o vestido que ela e

Anja encomendaram. – A costureira está terminando meu vestido.

- Você vai à festa Dina? Com um vestido? Ric pareceu se interessar.

- Sim eu vou com Anja, nós não temos um par e...

- Eu vou com você. Ele a interrompeu antes que ela pudesse terminar

de falar.

- Você quer ir comigo?

Ele alcançou a mão dela e trouxe em direção a sua boca, seus lábios

tocaram a pele dela fazendo-a tremer por dentro. – Nada me deixaria

mais feliz que estar com você no Solstício.

O vento soprava fraco e balançava os cabelos dela lentamente. Dina

se encolheu por causa do frio, mas logo foi acolhida pelos braços dele

em torno de seu corpo. Ela se aninhou na imensidão do peito de Ric e

teve a sensação de que poderia ficar ali para sempre.

Os dois permaneceram sentados no velho chafariz se abraçando e se

beijando. Apenas um poste de luz muito fraca iluminava Dina e Ric.

Quando o acaso parecia estar em favor dos dois, fez a lâmpada do

poste queimar convenientemente.

A única iluminação do local era da lua que não estava na sua fase

mais forte. Ric olhou para Dina e ela pode perceber que seus olhos

estavam brilhando. “Lindos” ela pensou. Com o braço muito forte ele

conseguiu puxa-la para o seu colo e ela não fez nenhuma objeção,

pelo contrario segurou-o pelos cabelos de leve e jogou um beijo

sedutor nos lábios dele.

Ric deslizava as mãos pelas costas dela e o toque dele fez com que

ela sentisse arrepios. Quanto mais eles se apertavam um no outros

mais queriam diminuir o espaço entre eles, que já não existia.

Page 168: St. Peter's Village

Em meio a toda aquela paixão, Céu se aproximou bufando e os dois

se soltaram com certa resistência.

- O que ele tem? Ela perguntou enquanto Ric acariciava o cavalo.

- Ele sentiu a presença do inimigo. Ele respondeu. – Estão por perto.

- Você tem inimigos? Dina não entendia que o clã de Ram era o

inimigo direto dele, de Edie e de seu clã.

- Dina. Ele se aproximou dela e tocou o arco do seu queixo com as

duas mãos. – Ram e seu grupo são meus inimigos desde o momento

que eu fui embora de Santo Pedro para viver no acampamento

refugiado, Ram jurou que se eu não voltasse para ele e para a Aldeia

ele iria me caçar e me matar.

A partir daquele momento Dina entendeu a preocupação de Ric com

sua segurança e a dela. – Como eu consigo achar você? Ela

perguntou antes que ele pudesse sumir na escuridão da mata.

Ele desceu do cavalo e retornou para ela. – Eu sempre estarei por

perto a partir de agora e vou observar você de longe para garantir

sua segurança. Ele a beijou depois disso e montou novamente no

cavalo.

- Vá para casa, vou vasculhar a área.

Dina voltou para casa e trancou a porta. Andou pelo interior da casa

até achar sua avó lendo um livro tranquilamente na cama.

- Boa noite querida.

- Boa noite vovó. Ela respondeu. – Outro dia a senhora passou muito

tempo na igreja.

Augusta pensou um pouco antes de responder a neta. – Estive

conversando com Padre Santiago sobre os preparativos para a

comemoração. Vou preparar doces para as barracas. Por que o

interesse?

- Nada, é que eu fiquei preocupada com a senhora.

- Como está o seu vestido? Quando fica pronto?

- Anja vai comigo experimentar antes da costureira fazer o

acabamento. Ela sentou ao lado da avó na cama. – Vó, como é essa

festa?

Page 169: St. Peter's Village

Augusta suspirou olhando para a janela fechada do seu quarto, as

cortinas balançavam com o pouco de vento que passava por ela.

– A festa é uma comemoração muito bonita, querida. O Solstício

anuncia o nosso inverno e simboliza o renascimento. As pessoas da

cidade lembram-se de seus filhos e maridos que desapareceram anos

atrás. Ninguém nunca mais os viu novamente.

Dina abaixou a cabeça e lembrou-se de Ric. “Ele foi uma das pessoas

que desapareceram”, ela pensou, “ele e sua família”.

- Eu preparei pães de batata para você querida, estão na cozinha.

- Obrigada. Ela falou enquanto derramava um abraço apertado na

sua avó e foi para a cozinha.

Parando na beirada da escada que levava para o primeiro andar olhou

para baixo e deu um sorriso. “Dessa vez eu vou me superar”. E ela

desceu as escadas em três movimentos.

Page 170: St. Peter's Village

ALDEIA de SANTO PEDRO

Água

Ram

15

Toda a escola estava em ritmo de festa, os alunos ansiosos e os

professores preocupados. Só Dina não mostrava qualquer tipo de

preocupação com o Solstício, ela não parava de pensar em Ric e por

sua vez, Ram também participava dos pensamentos dela.

Anja quando não estava tagarelando estava rezando. Lorena parecia,

mesmo que de longe, ter dado uma trégua e Adan, depois que

começou a praticar defesa pessoal, nunca mais passou por perto. Ele

sempre ficava de longe observando as coisas, a única pessoa com

quem ele falava na escola era Lorena.

- Amanha vamos experimentar nossos vestidos, disse Anja muito

eufórica. – mal posso esperar para vesti-lo, e você? Não está louca

para se ver num vestido de festa?... – Dina, acorde?

Dina parecia estar em outra dimensão. – O que foi? Desculpe-me, eu

não ouvi você falar. – Ric vai comigo sim, já falei com ele.

- Eu disse que amanhã nós vamos experimentar nossos vestidos, eu

não perguntei sobre o Ric, ela retrucou. – Espere ai, você foi à

floresta ontem? Sozinha?

Page 171: St. Peter's Village

- Não, respondeu Dina. – Ric encontrou comigo aqui na cidade, não

precisei ir procura-lo.

O sinal tocou e os alunos levantaram enquanto a professora tentava

falar. CLASSE, TODOS SABEM QUE HAVERÁ RECESSO DE UMA

SEMANA NA ESCOLA POR CAUSA DO SOLSTÍCIO. APROVEITEM O

TEMPO E NOS VEMOS SEMANA QUE VEM.

Anja adorava quando não havia aula. - Uma semana sem escola, que

beleza. Ela achava que poderia se dedicar mais na igreja, fazendo

orações extras.

- Você é louca, Anja. Dina respondeu torcendo os lábios para o canto

da boca. – Só mesmo você pra falar uma coisa assim, achar bom não

ter aula pra ficar na igreja.

Elas saíram da escola para encontrar o dia cinza do lado de fora. –

Acho que vai chover, falou Anja. – Olhe aquelas nuvens.

Dina olhou para cima, viu o céu em tom cinza e lembrou-se do cavalo

de Ric. – O Céu é assim, cinza, ela disse.

- Geralmente o céu é azul, respondeu Anja. – Mas hoje está cinza por

causa da chuva que vem por ai.

Dina olhou para Anja e lembrou que não havia comentado com a

amiga sobre o cavalo de Ric. – Anja, Céu é o cavalo de Ric, a cor dele

é branco acinzentado.

Anja olhou para ela com sorriso retórico. - Não brinca que seu

príncipe tem um cavalo branco? Perguntou. – Você esqueceu-se de

falar isso comigo? Dando um tapa carinhoso no ombro da amiga.

- Sei lá, acho que foi. E as duas começaram a se estapear uma na

outra como duas crianças brigando por causa de boneca.

Enquanto as meninas trocavam tapas, puxões e beliscadas de

amizade, uma carroça passou por elas e o homem gritou para as

duas abrirem espaço. Elas pularam na calçada quase no mesmo

segundo em que ouviram o grito do homem.

Dina olhou para o cavalo preto atrelado a carroça e o comparou com

Tobruk. “É bem mais baixo e mais magro”, ela pensou. “Claro que

não é ele”. No mesmo momento ela havia se lembrado de que não

comentou com Ric na noite passada, o fato de que Tobruk a seguiu

até a porta de sua casa, claro que se tivesse comentado, não

Page 172: St. Peter's Village

mencionaria a parte em que ela retirou o short e ficou só de blusa e

calcinha na rua. – Eu preciso contar para ele isso.

- Contar o que? Perguntou Anja.

- Esqueci-me de contar para Ric que o cavalo de Ram me seguiu

outro dia até a porta de casa.

- Cavalo de Ram?

- Tobruk, o cavalo preto da floresta, lembra? Que Ric pensou que

estava nos atacando.

- Agora me lembro. Ele foi até sua casa? Perguntou anja assustada

Dina rapidamente se apressou para ir ao encontro de Ric. – Tenho

que ir, minha avó está me esperando.

- Calma eu vou com você esqueceu que estávamos indo juntas?

Reclamou Anja.

Dina mais uma vez se lembrou que não poderia colocar a vida da

amiga em risco e encontrar Ric representava perigo, já que Ram

poderia estar passeando pela cidade também.

- Anja, vamos nos encontrar mais tarde, ela tentou convencer à

amiga. – Tenho que fazer umas coisas com minha avó, eu me

esqueci de falar com você mais cedo.

Deixou a amiga para trás falando sozinha e andou rápido na direção

de casa.

- TÁ BOM, gritou Anja para Dina. – Nos vemos mais tarde então.

Ao invés de Dina ir direto para sua casa tomou o caminho da rua de

baixo e seguiu direto para entrada da floresta, a mesma que a

professora havia levados os alunos para pesquisa em campo. Dina

percorreu a estreita trilha entre a vegetação. Minutos após ter

entrado na floresta conseguiu chegar onde o grupo da escola havia

parado.

Sozinha e rodeada por arvores e plantas ela circulou o olhar em volta

tentando escolher qual direção ela iria a partir dali. Dentro da floresta

tudo parecia dar em lugar algum e tudo era igual.

As pedras cobertas com uma fina camada verde, folhas secas no chão

contrastando com folhas recém-caídas, troncos de arvores de

Page 173: St. Peter's Village

diversas espessuras e muito mosquito, ela estava tão decidida em

encontrar Ric para falar sobre Tobruk que esqueceu completamente

de usar calças e aplicar repelente no corpo.

Quando estava no limite da sua paciência Dina simplesmente fez o

que dissera a Anja no dia anterior. Tomou um bom fôlego e quando ia

gritar o nome de Ric percebeu uma movimentação entre as

folhagens.

Novamente ela vislumbrou o que parecia ser a imagem de um animal

muito grande andando pela floresta. Estava claro e ela teve certeza

que o animal realmente era grande e preto. Paralisada ela observou o

animal se aproximar de onde ela estava.

Não havia nenhum local que ela pudesse correr para se esconder, ela

estava completamente cercada por árvores e plantas. O animal se

aproximou e ela o reconheceu imediatamente. Olhou para cima e

pensou em tentar agarrar algum galho de arvore para se defender,

mas nada parecia favorável.

Tobruk saiu da mata fechada e apareceu diante dela. “Oh meu Deus,

eu não tenho nenhum pão de batata aqui comigo”, ela pensou

enquanto caminhava lentamente para trás tentando ficar longe do

cavalo. Tobruk estava inquieto, bufava forte e relinchava, ela nunca

havia escutado o cavalo relinchar. – Calma ai rapaz, ela disse

baixinho para ele. – Só me deixe ir embora.

O cavalo parecia saber o que estava fazendo, cada passa que ela

dava para trás o cavalo dava um passo a frente e balançava forte a

cauda. “O que eu vou fazer agora?” Ela estava completamente

dominada pelo medo do animal, que talvez pudesse atacar com uma

das patas, ou até mesmo morde-la de verdade.

Tobruk sem dar qualquer alarde empinou as duas patas dianteiras e

relinchou forte, foi ai que Dina não se aguentou no lugar e tentou

correr para dentro da mata onde a vegetação era mais densa e talvez

o cavalo não fosse capaz de segui-la.

No mesmo instante que ameaçou correr foi interceptada por um

rapaz vestindo calças pretas e camisa da mesma cor. Ela parou na

sua frente e levantou a cabeça estacionando o olhar no rosto dele.

Era Bob.

Page 174: St. Peter's Village

Ela estava não agradecida por não estar sozinha ali na floresta com o

cavalo que não percebeu como ele a havia encontrado e o que ele

estaria fazendo lá.

- Bob? Ela falou pousando as duas mãos na própria barriga, todo o

medo que ela estava passando fez com que sentisse dores

abdominais. – Cuidado com o cavalo, vamos correr pra dentro da

mata.

Bob estava calmo e impediu com o seu corpo que ela tentasse dar

mais um passo tentando fugir. – Calma Dina viu outro cachorro? Ele

perguntou.

- Não, dessa vez é serio Bob, o cavalo é perigoso saia da frente,

VAMOS LOGO.

Tobruk se aproximou obrigando Dina a recuar... Agora era Bob que

estava perto do cavalo e ela sentiu que ele estava em perigo. –

Cuidado Bob, não se mexa. Ela levantou os braços para o alto

tentando chamar atenção do cavalo para que o rapaz pudesse

escapar do animal.

- Dina, ele não vai atacar. Bob respondeu. – Ele só ataca quando está

em perigo... Na maioria das vezes.

Dina não estava entendendo por que Bob estava agindo daquela

forma, ele não parecia ter medo do cavalo, pelo contrario ele parecia

conhecer Tobruk. – O que você quer dizer, ela perguntou enquanto

jogava a bolsa com os cadernos no chão. – Ele não vai atacar?

Bob se aproximou de Tobruk, o cavalo bufou e empinou as patas

dianteiras novamente, dessa vez na frente dele, mas ainda assim ele

continuou se aproximando do animal. “Ele vai tocar no cavalo”, ela

pensou. “Isso é loucura, a menos que...”.

Ela engoliu em seco quando ele passou uma mão na crina de Tobruk

e a outra coçou o focinho dele. “Se ele está fazendo carinho no cavalo

de Ram... Então... Ele só pode ser...” ela pensava.

– Você é o Ram. Ela finalmente disse as palavras quase sufocadas

pelo nó em sua garganta.

- Muito Bem Dina. Ram respondeu com um leve sorriso nos lábios. –

Matou a charada.

Page 175: St. Peter's Village

- Você é o Ram. Ela falava enquanto um flashback passava em sua

mente. – Você me enganou esse tempo todo. Lembrou-se de quando

ele apareceu e levou-a até a porta de casa. - Você mentiu para mim.

Lembrou-se quando o balde caiu em seu braço. – Você... me fez

pensar que era outra pessoa.

- Eu tive que usar outro nome para me aproximar de você. Ele falou

enquanto soltava Tobruk e caminhava na direção dela. – Bob é um

nome que eu odeio, eu poderia ter inventado outro, mas agora que

você já sabe quem eu sou...

- NÃO SE APROXIME DE MIM, ela gritou. – ME DEIXE IR EMBORA.

Ram estava quase um passo de proximidade de Dina quando ela

correu pelo lado para encontrar Ram a encurralando novamente.

- Me deixe em paz, eu não tenho medo de você. Ela falou a mentira

tentando acreditar nela.

Ram segurou Dina pelos braços e trouxe-a de volta para sua frente,

atrás deles estava um grande tronco de uma velha arvore e ela não

teria como sair dali. Ram estava olhando fixo para ela, encarando-a

com seus olhos sinistros em tom que ela jamais poderia descrever.

Sua expressão mostrava que ele estava falando serio. – Você vai

comigo, ele disse.

- NÃO. Ela gritou enquanto olhava nos olhos dele.

- Então não tenho outra escolha, vou leva-la à força.

- Ela disse não, Ram. A voz de Ric ao longe ecoou até os ouvidos

deles. Céu emergia da mata com Ric montado nele. - Solte ela,

agora.

Ram olhou dois segundos para Dina antes que voltar-se para Ric com

a espada desembainhada. Ela pode reparar no brilho da lamina da

espada dele e mesmo com as mãos por cima, conseguiu ver o cabo

preto todo trabalhado. Era uma linda Katana, como a que Ric

empunhava só que muito mais imponente.

Ric saltou de Céu que correu para a floresta a fim de provocar

Tobruk. Os dois irmãos estavam encarando um nos olhos do outro

com os braços rígidos empunhando cada um, sua espada.

Page 176: St. Peter's Village

Dina estava chocada com a imagem de dois homens que estavam

prestes a lutar entre si, na frente dela. “Eles vão se matar” ela

temeu.

- Ric, cuidado. Ela temia por ele, mas também temia por Ram, ela

não queria ver ninguém sangrar.

Eles chocaram suas laminas, uma vez e depois outra. Ric levantou a

espada e lançou-a sobre a cabeça de Ram sendo bloqueada pela

espada dele. O contra golpe veio no mesmo caminho com muito mais

potencia e agressividade fazendo com que Ric deslocasse todo seu

corpo para trás formando uma ponte, e a espada de Ram passou

direto, ao vento.

Dina estava tensa e não sabia o que fazer correr ou ficar ali era uma

decisão que ela não sabia a qual tomar. Ram usou um golpe marcial

chutando a perna de Ric fazendo com que ele caísse no chão soltando

sua espada.

Ram firmou-se em cima do irmão colocando suas duas pernas uma

em cada lado - Está na hora de você aprender a ultima lição

irmãozinho, disse Ram estocando a ponta da espada na direção da

cabeça de Ric.

Deitado, deslocou a cabeça para o lado tão rápido que a ponta da

espada fincou no chão. – Errou, gritou Ric. Ele estava tão perto da

lamina que pode reconhecer a Corta-Relâmpago nas mãos de Ram. –

Você está tentando me matar com a espada do nosso pai? Ele falou

rangendo os dentes com raiva. – Você está usando *Kaminari Wo Kiru

contra seu próprio sangue?

*Tradução em Japonês para Corta-Relâmpago.

No segundo em que Ram relaxou os músculos, Ric golpeou-o por

baixo agarrando seus ombros revertendo a posição entre o dois. Era

Ram que estava em baixo de Ric, mas isso não o fez entregar a luta,

muito pelo contrário, ele puxou uma segunda arma que

aparentemente estava escondida em sua cintura.

Ric por cima desarmado, forçando Ram sobre o chão que estava por

baixo, espada numa mão e uma faca na outra, Dina ainda não sabia o

que fazer. Ela nunca, jamais, havia presenciado uma luta entre duas

pessoas. “Eles vão se matar”, ela pensou novamente.

Page 177: St. Peter's Village

Ela tentou procurar por alguma coisa pesada que talvez pudesse

bater ou jogar sobre Ram na tentativa de dar alguma vantagem para

Ric, mas quando voltou à atenção novamente para os dois, eles já

estavam lutando em pé e Ric conseguiu, como ela não soube,

recuperar a sua espada.

Uma segunda pessoa emergiu das arvores, ela não conhecia, mas

sabia que não estava do lado de Ric porque se posicionou contra ele

também desembainhando uma espada. Ela não viu seu rosto porque

estava atrás de um tecido preto, só conseguia-se ver os olhos que ela

nem tentou adivinhar o tom da cor, mas reparou que os cabelos dele

eram lisos, pretos e compridos até quase os ombros.

Lucaar atacou Ric. Eram dois contra um, a luta estava desigual. Dina

ficou ainda mais desesperada do que já estava, ela não podia fazer

nada e isso a estava sufocando por dentro. Ela não sabia lutar com

espadas, não conhecia nenhum golpe marcial para ajudar Ric. “Sou

uma inútil”, ela pensou, “o que posso fazer?”.

Ric já demonstrava sinais de cansaço e Ram estava disposto a matar

o irmão. Mas era Lucaar que desferia os golpes mais fortes, ele

sempre odiou e prometeu acabar com Ric, principalmente depois que

Ric cortou um pedaço de sua orelha em outra luta entre os dois.

Dina estava pensando em arremessar pedras em Ram e Lucaar, ela

estava disposta a ajudar Ric, que já estava ferido, as lâminas dos

dois haviam cortado em três ou mais locais do seu corpo. Quando

Ram conseguiu ferir Ric gravemente no pescoço ela soltou um grito.

– RIC... NÃO.

Tudo parecia estar perdido, Dina chorava baixo sem poder fazer nada

e Ric lutava até as ultimas forças, mas um objeto foi lançado de

dentro da mata aterrissando no ombro de Lucaar fazendo-o deixar

cair sua espada. Edie e o resto do seu clã saltaram por trás dos

troncos das arvores. Ram e Luccar estavam em desvantagem

numérica. Acuados decidiram fugir, mas Ram ainda ficou para

encarar os dois irmãos.

- Hoje foi declarada a guerra entre nós, ele disse. – Vocês não vão

me impedir de continuar de onde meu pai parou.

Ric ainda consciente e não pode ficar calado. – Então é esse seu

plano? Você vai começar o pesadelo novamente? Ele sangrava muito

Page 178: St. Peter's Village

e Dina se aproximou para ajuda-lo. – Calma, ela disse. – Eu estou

aqui, e eles vão embora.

- O pesadelo só existe na sua cabeça sonhadora, falou Ram. – Vou

duplicar o numero de habitantes em Santo Pedro e vou transformar

todos em guerreiros. Parou um segundo para olhar Dina. – E esposas

de guerreiros.

Ric tentou levantar sem muito sucesso, estava muito cansado e

ferido. – Não se atreva a tocar nela, ele ameaçou Ram. – Vou matar

você se chegar perto dela.

- CHEGA, gritou Edie. – Os idiotas acabam aqui, vá embora Ram, eu

não vou conseguir segurar meus homens por mais tempo.

Todo o clã de Ric e Edie estava a posto para atacar Ram, eles o

odiavam porque o pai dele era o Barão, que os raptou de suas casas,

ainda pequenos e os levou para Santo Pedro.

Ram ajudou a treinar todos e alguns ainda guardavam marcas pelo

corpo feitas por ele. Nem todos puderam usar a água para curar, por

que Ram dizia que as marcas o fariam memorizar e não deixariam

esquecer quem mandava ali.

- SAIA, gritou Edie novamente. - Saiba que não vamos deixar que

você siga em frente com seu plano.

- É mesmo? Perguntou Ram em tom debochado. – Não tem como

vocês estarem em vários lugares ao mesmo tempo. Não quando o dia

acaba tão rápido.

Ram virou para a mata e sumiu nela sem deixar qualquer rastro que

pudesse ser seguido. Edie por sua vez, não deixou que os homens do

seu clã o seguissem.

- Você está bem Ric? Perguntou Edie ao irmão.

- Ele está ferido, respondeu Dina segurando a cabeça de Ric

enquanto eles falavam.

- Edie, você trouxe a água? Perguntou Ric, quase sem poder falar.

Edie ordenou que um dos homens do clã trouxesse seu cantil preso

na cela de Xerife. Abriu a tampa e derramou uma porção da água

sobre a garganta de Ric. Imediatamente a água começou a fazer seu

Page 179: St. Peter's Village

papel e o ferimento lentamente começou a curar. – Beba um pouco,

falou Edie. – Vai ajudar a curar mais rápido.

Esperaram um momento até que Ric começou a sentir-se melhor, já

podia ficar sentado sem que Dina apoiasse a sua cabeça.

- A culpa é toda sua, falou Edie a ela.

- Desculpe, perguntou Dina. – Como?

- O que você estava fazendo aqui? Ele trouxe você aqui? Edie

perguntou secamente para Dina.

- Não, ele não me trouxe aqui, ela respondeu. – Eu via aqui procurar

por ele, completou.

- Como eu disse a culpa é sua Edie afirmou. – Desde que você

apareceu, só causou problemas na cabeça desse idiota.

- Ei, vai com calma Edie, falou Ric tentando se levantar. – A Dina não

tem nada haver com isso.

- Acho que o idiota aqui é ele, ela respondeu para Ric enquanto

olhava torto para Edie. – Ao invés de reclamar deveria estará

ajudando você.

Edie virou-se para Dina expressando raiva no olhar, ela percebeu que

Edie havia puxado o mesmo tom de cor dos olhos de Ric. Verdes. O

resto do clã se aproximou de Dina e os homens começaram a olhar

para ela, ela teve a impressão que estava sendo observada.

- Você vai ficar parado ai ou vai ajudar o Ric? Perguntou a Edie com

autoridade.

- Você é insuportável, falou Edie.

- Eu tenho personalidade, ela respondeu de volta.

Ric já estava bem melhor e tentou apaziguar a discussão entre Edie e

Dina. – Calma, vocês dois, não briguem por mim. Ele se aproximou

de Dina e abraçou-a. – Obrigado por se preocupar comigo e Edie,

obrigado por chegar na hora certa.

- Temos que ir embora, AGORA, falou Edie sem paciência. – Você vai

lavar ela daqui ou eu levo?

Page 180: St. Peter's Village

- Eu não vou com você a lugar nenhum, falou Dina se recusando a ir

com Edie. – Prefiro dormir na floresta.

- Como quiser, respondeu Edie virando as costas para os dois

caminhando de volta para o refugio, o resto do clã o seguiu.

- Eu vou leva-la, falou Ric assobiando para chamar o cavalo. – Venha

Dina, Céu desta por perto.

Edie voltou de repente. – Cuidado, eles podem estar esperando

exatamente isso, falou ao irmão.

- Vamos ter cuidado Edie. Eu prometo.

Ric segurou Dina pela mão e a puxou para dentro da mata onde Céu

os aguardava. – O que ele tem contra mim? Ela perguntou para Ric.

- Ele e assim desde sempre Dina. Respondeu Ric enquanto montava

no cavalo. – Sempre tenso e todo certinho, e ele não tem muito

contato com garotas. Ric puxou Dina pelo braço ajudando ela montar

na garupa de Céu. – Ele deve estar com ciúmes por eu estou com

você.

- Ele nunca vai ter uma garota, ela falou enquanto agarrava forte a

cintura dele.

Quando eles chegaram à beirada da floresta próxima a casa de Dina,

desmontaram e continuaram a caminhar a pé. – Eu preciso falar com

você uma coisa. Falou Dina à Ric com uma expressão triste.

- O que foi? Perguntou ele.

- Eu fui enganada por Ram, ela respondeu. – Eu o conhecia, quer

dizer, eu o conhecia por outro nome há bastante tempo.

- Você o que? Ele perguntou enquanto parava em frente a ela.

- Ram se apresentou com o nome de Bob, e nós passeamos pela

cidade.

- Você passeou com ele?

- Passeamos... Algumas vezes, ela respondia as perguntas dele com

ar de arrependimento. – E nós conversamos na porta da minha

casa...

- Ele foi à sua casa? Ric estava perplexo.

Page 181: St. Peter's Village

- Sim, ele foi, mas só duas vezes. Ela disparou sem pensar. – A

primeira vez foi quando o balde da minha avó caiu em cima dele

contando-lhe o braço, ai eu tirei minha blusa e enrolei no braço

dele...

- VOCÊ TIROU SUA BLUSA PARA ELE? Os olhos de Ric estavam

mudando o tom de verdes para quase vermelhos, e ele rangia os

dentes.

- Retirei, ela respondeu arrependida por ter revelado o episódio do

balde e da blusa. – Mas foi por que ele estava sangrando muito, eu

tentei ajudar, eu não sabia que ele era o Ram quer dizer, eu não

sabia que Bob era o Ram...

- Você tirou a blusa na frente dele, Ric continuava a repetir o fato de

ela ter tirado a blusa. – E a segunda vez que ele foi lá?

Já consciente que não deveria revelar que teria retirado o short, ela

preferiu esconder essa parte. – A segunda vez, foi quando o cavalo

dele me seguiu até a porta de casa.

- Tobruk seguiu você? Ric achou estranho. – Por que ele seguiria

você?

- Eu acho que ele gosta de pão de batata, na floresta, aquela vez que

você tentou espanta-lo, ele havia farejado o cheiro do lanche que eu

levei. Ele foi direto aos pães de batata.

“Pães de batata”, Ric se lembrou de quando Edie disse que a mães

deles fazia pães de batata para os filhos. Ram já era dono de Tobruk

e deve ter dado para ele comer. “Ele cresceu e lembrou-se do gosto,

por isso foi atrás dela”. – Dina, não ande mais por ai com pão na

bolsa.

Ric estava irritado com o fato de Ram ter se passado por Bob para se

aproximar de Dina e mais irritado ainda com o fato dela ter retirado a

blusa para estancar a ferida dele. – Ele usou a água na sua frente?

Perguntou Ric. – Quando você retirou a blusa na frente dele. Ele

odiava isso.

- Não, por isso mesmo que eu retirei minha blusa, ele estava

sangrando e eu tentei ajudar. Ela colocou as mãos na cintura e olhou

para ele com raiva. – Richard Baleares, vamos esquecer a parte que

eu retirei minha blusa, por favor.

Page 182: St. Peter's Village

- É difícil esquecer esse fato, ele retrucou. - No outro dia, lá no algo,

você ficou envergonhada em tirar a roupa na minha frente e...

- QUER PARAR, ela gritou com ele.

- Tá bom.

Eles ficaram calados um segundo, cada um olhava em uma direção

diferente. – Ric me desculpe, ela quebrou o silencio. – Eu não contei

nada para você porque julguei o fato sem importância. Ela olhou para

ela enquanto ela continuava a falar. – Além disso, eu nunca tive

qualquer empatia com ele, pelo contrario, ele me causava medo, um

medo que eu não sabia de onde vinha.

- O Ram causa medo nas pessoas desde pequeno, Ric respondeu. – O

esporte preferido dele era aterrorizar quem estivesse ao lado dele.

- Então, por isso mesmo que eu o ignorei completamente, ela disse. –

Bob, digo Ram, aparecia do nada e nós conversávamos um pouco,

depois ele ia embora, nada mais.

- Sobre o que vocês conversavam?

- Sobre nada, ele perguntou onde eu morava, e depois perguntou se

eu iria à comemoração do Solstício. Nada importante.

Ric achava muito estranho Ram se aproximar de Dina sem nenhuma

razão. – O que ele quis dizer antes de fugir? Ela perguntou. – O que

ele quis dizer quando mencionou que o dia acabaria rápido?

- Eu não faço ideia Dina. Ele deixou escapar uma pista, mas eu não

sei o que ele quis dizer.

- Bem, quando o dia acaba, já é noite, certo? Ela concluiu. – Mas os

dias acabam sempre na mesma hora...

- Não no Solstício de inverno, ele a interrompeu. – É quando a noite é

mais longa... Espere, Se a noite é mais longa, então...

- O dia é mais curto, Dina completou a frase de Ric. – É isso.

- Ram vai atacar a cidade no dia da comemoração do Solstício. Ric

matou a charada. – Dina, você não pode ir nessa festa, vai ser

perigoso.

Dina arregalou os olhos e lembrou-se de sua avó perguntando sobre

o vestido e também se lembrou de Anja que estava muito feliz com a

Page 183: St. Peter's Village

festa que iria acontecer. – Ric, as pessoas que eu amo vão estar na

festa, minha avó, Anja. Eu não posso deixa-las correrem risco.

- Mas você é quem não pode correr esse risco, ele segurou nos

ombros dela com as duas mãos. – Ram atacará a cidade com seu clã,

vai querer levar você, vai rapta-la e leva-la para Santo Pedro. Como

meu pai fez com nossa família, como fez com minha mãe.

- Calma Ric, ela o interrompeu. – Isso não vai acontecer.

- Como você sabe? Ele continuou. - Meu pai fez isso e Ram vai fazer

isso com você também. Vai leva-la a força para Santo Pedro, vai

obriga-la a beber da água e você nunca mais poderá sair, não só da

aldeia, mas da floresta e estará aprisionada para sempre.

Dina não havia pensado e tão pouco analisado as consequências por

aquele ângulo. Realmente ela não gostaria de ficar aprisionada em

qualquer lugar que fosse e muito menos por um homem como Ram.

Por outro lado ela não podia abandonar as pessoas que ela gostava,

seus amigos. Ela precisava fazer alguma coisa. – Mas você vai estar

lá para me proteger.

Ric olhou para ela e começou a rir enquanto falava. – Você acha

mesmo que eu posso proteger você de Ram e um clã inteiro de

homens maus?

- eu acho que você pode com a ajuda do seu clã e de seu irmão mal

humorado. Ela respondeu de volta.

- Dina não me provoque, você sabe que eu não fujo de uma boa

aventura, ele olhava para ela com um sorriso irônico. – Quer mesmo

fazer isso?

Dina sabia que a resposta certa não era a opção que ela estava

dando a ele, mas ela tinha certeza de que era dever dela proteger a

amiga e a avó das maldades de Ram. – Quero fazer isso. Ela

respondeu.

Quando eles estavam na quase em frente à casa dela, notaram as

luzes acesas. – Melhor eu não passar daqui, sua avó pode me ver.

- Certo, ela respondeu. – Amanha nos encontraremos depois do

almoço, esperarei no chafariz. Ela se despediu enquanto ele se

afastava. – A propósito... Ele virou para ouvir o que ela iria dizer. –

Page 184: St. Peter's Village

Quem era o outro cara que escondia o rosto? Com cabelos pretos na

altura do ombro?

- Aquele e Lucaar, braço direito de meu irmão. Ele respondeu. – Acho

que o cargo de irmão se encaixaria perfeitamente a ele com Ram,

Fique longe dele.

- Certo.

- Estou falando sério, Dina. Fique longe ele. Ric falou apontando o

dedo para ela. – Há um tempo passado, eu multilei um pedaço da

orelha dele, e ele jurou se vingar de mim. Isso significa fazer mal a

você.

- Tudo bem Ric, não vou me aproximar dele. Prometo. Ela caminhou

até quase perto da porta de casa quando Ric a chamou. – Dina...

Ela virou para ele. – O que foi?

- Se um dia decidir retirar a blusa novamente não se esqueça de me

chamar, ele disse enquanto corria de volta para dentro da mata.

Dina agachou rapidamente e tentou arremessar uma pedra na

direção dele, mas ele já havia sumido. “Miserável”, ela pensou com

graça e sorrisos no rosto. Abriu a porta da casa cuidadosamente e

entrou. Para seu alivio sua avó estava tomando banho e ela pode ir

direto para o quarto.

Enquanto tirava as roupas muito sujas de terra e plantas da floresta,

caminhou até a beirada da janela e suspirou um segundo. Não havia

ninguém lá baixo, na frente da casa e muito menos na rua onde ela

morava. Puxou um lado da cortina e quando esticou a mão para

puxar a outra estreitou os olhos novamente para a rua e pode ver

mais adiante um cavalo preto caminhando tranquilamente ao lado de

uma pessoa, um homem.

“Ram está rondando minha casa”, ela pensou enquanto continuava

observando pela janela. O homem montou no cavalo e, com apenas

um único galope rápido, entrou na mata próximo onde Ric também

havia entrado e sumiu do alcance da visão dela.

“Amanha é outro dia”. Deitou na cama do jeito que estava sem vestir

roupas limpas e sem tomar banho. Ela apenas fechou os olhos e

tentou dormir, os acontecimentos na floresta ainda estavam na sua

Page 185: St. Peter's Village

memória, a imagem de Ram ferindo Ric não parava de repetir na

cabeça dela.

- Amanha é outro dia. Ela falou alto para si mesma.

Page 186: St. Peter's Village

ALDEIA de SANTO PEDRO

Água

Uma manhã de surpresa

16

Já eram quase onze da manha quando Anja abriu os olhos, outra

vantagem de quando não se tem aula, era acordar mais tarde que o

de costume. “Hoje é dia de ir à costureira”, ela pensou. Espreguiçou-

se um pouco mais na cama e levantou de vagar.

Sentando numa pequena cadeira em frente ao espelho que

completava a cômoda, passou a escova nos cabelos loiros e deslizou-

a com movimentos lentos e graciosos. Vestiu uma saia de tecido fino

na medida dos joelhos combinando com uma blusa em tom amarelo

claro, mergulhou os pés nas sapatilhas para encontrar com sua mãe

na cozinha.

- Meu pai chegou em casa muito tarde ontem à noite? Ela perguntou

a mãe. – Ele não foi se encontrar com a senhora na porta da igreja,

não e?

- Filha, ontem nós tivemos um pequeno desentendimento.

Page 187: St. Peter's Village

- Outra vez? Anja perguntou enquanto bebia um copo de leite.

- Mas já passou. A mãe dela respondeu. – Está tudo certo agora não

se preocupe.

Anja deu um suspiro retórico para a mãe e levantou-se da mesa.

Quando saiu pela varanda da sua casa percebeu que algo estava

estranho. Olhou para as calçadas enquanto andava na direção da

casa de Dina e viu uma pequena aglomeração de moradores da

cidade em frente à casa dela. Uma viatura da policia também se

encontrava no local.

Assustada, Anja começou a correr na mesma direção, “Dina”, ela

pensava, “Aconteceu alguma coisa com Dina ou com a avó dela”.

Chegando quase na porta da amiga, ela avistou vó Augusta do lado

de fora da casa conversando com um policial e o padre Santiago, os

rostos deles não mostravam qualquer satisfação com o que quer que

houvesse acontecido, em alguns momentos vó Augusta escondia a

boca com uma das mãos enquanto padre Santiago tentava consolar.

Anja tentou sem sucesso aproximar-se da casa porque as pessoas

curiosas não davam qualquer espaço para que a loura passar.

- VÓ AUGUSTA, ela gritou. – O QUE ACONTECEU? ONDE ESTÁ DINA?

Vó Augusta virou a cabeça para encontrar Anja, nadando entre a uma

pequena multidão que estava começando a se formar na frente da

casa. – Angélica, respondeu vó Augusta.

- DINA... ONDE ELA ESTÁ?

Anja estava prestes a iniciar uma confusão para tentar se aproximar

da casa quando pode ver entre as pessoas uma figura conhecida de

cabelos castanhos. Dina estava lá, parada na porta perfeitamente

bem, sem qualquer arranhão.

- Dina.

- Anja.

A loura conseguiu, depois de alguns empurrões e cotoveladas chegar

perto de Dina que estava com os braços esticados prontos para o

abraço da amiga. – O que aconteceu? Ela perguntou. – Você está

bem, não está?

Page 188: St. Peter's Village

- Sim estou bem, respondeu Dina choramingando. – Encontraram um

corpo na mata, próximo a estação rodoviária.

Anja paralisou quando escutou a palavra corpo. – Você quis dizer

uma pessoa morta?

- Isso mesmo, respondeu enquanto limpava as lagrimas que

escorriam pela bochecha. – Quem morreu foi meu psicólogo. Ela falou

pensando nas palavras que Ram disse antes de fugir pela floresta.

“Foi ele”, ela pensou.

- Santo Deus, quem mataria um psicólogo?

Vó Augusta se aproximou das amigas junto ao policial. – Meninas, é

perigoso andar por ai, disse o homem fardado.

- Nós vamos tomar cuidado, respondeu Dina não tão conformada. –

Nós podemos ir agora? Temos hora marcada com a costureira.

- Está tudo bem policial? Perguntou vó Augusta. – Elas podem ir?

- Podem, ele respondeu.

As meninas subiram para o quarto de Dina enquanto o policial se

afastou. Vó Augusta permaneceu ali conversando com o padre.

– O homicídio aconteceu há muito tempo, mas o policial disse que o

responsável ainda pode estar andando pela cidade. Disse Augusta

muito nervosa. – É ele Santiago, é aquele mostro de novo, eu disse a

você que ele iria fazer alguma coisa.

- Calma Augusta, foi a vez do padre falar. – Eu prefiro pesar que foi

ao acaso, uma mera e infeliz coincidência.

- Ele era o medico da minha neta Santiago, isso foi um aviso.

Os dois tentavam conversar baixo sem deixar qualquer impressão

que sabiam informações sobre a morte do psicólogo. As meninas

desceram do quarto e se despediram da avó e do padre.

- Xau vó, disse Dina enquanto passava com Anja às pressas pela

porta da frente. – Vamos ver meu vestido.

- Certo querida, cuidado. O enterro acontecerá antes do anoitecer.

Dina parou um instante e olhou para sua avó com uma lembrança na

cabeça. “Enterro”, ela pensou. Lembrando que antes dos seus pais

Page 189: St. Peter's Village

serem mortos, a levaram para fazer um tratamento espiritual, ela

mal conseguia passar na frente de um cemitério, quanto menos ir a

um enterro.

- Vó, se a senhora não se incomoda, eu prefiro não ir ao enterro. Ela

pediu com expressão tímida das lembranças do passado.

- Tudo bem querida, não tem problema.

Dina abriu um enorme sorriso para responder a avó. – Obrigada.

Girou nos calcanhares e saiu agarrada ao braço de Anja. – Mas eu

prometo que Anja vai me ajudar a fazer uma oração para o Paulo.

Augusta achou estranho Dina ter mencionado o nome Paulo a ela. –

Você ouviu direito Santiago? Ela perguntou ao padre. - Quem é

Paulo?

O padre coçou a pouca barba e pensou antes de responder. – Eu não

sei quem é Paulo, ela está se confundindo.

- Como pode se confundir com o enterro do medico dela. Não haverá

outro enterro aqui não é?

- Claro que não Augusta, vamos fazer apenas um enterro. De onde

ela conhece esse Paulo? É o medico dela também.

- Santiago, ela chamou atenção do padre. – O psicólogo de minha

neta chama-se Cipriano, eu não conheço nenhum Paulo.

- Então ela deve ter confundido os nomes Augusta, ele respondeu. –

Adolescentes são assim, avoados.

- Pode ser mais ainda estou preocupada que essa morte aconteceu

inesperadamente. Foi ele Santiago, foi o barão quem matou ele. Ela

abrir a porta da casa e convidou o padre para entrar. – vamos tomar

uma xícara de café e falamos lá dentro.

As meninas estavam á caminho da casa da costureira. Antes de tocar

a campainha Dina puxou Anja pelo braço. – Eu preciso falar com

você.

- O que foi? Perguntou Anja.

- Eu sei quem matou meu psicólogo. Ela respondeu à amiga. – Foi

Ram quem o matou?

Page 190: St. Peter's Village

Anja ficou piscando algumas vezes antes de abrir a boca. – Como

você sabe disso? Ela parecia não acreditar. – Ram é o irmão de Ric,

certo?

- Certo.

-Será que Ric sabe disso?

Foi então que Dina se deu conta de toda a situação. Ric era seu

namorado, Ram era irmão de Ric e Ram havia assassinado

covardemente seu psicólogo. Um momento de angustia assolou seu

coração e imediatamente ela começou a chorar.

- Foi culpa minha, ele morreu por minha culpa.

- Claro que não foi. Falou Anja tentando consolar a amiga. – Você

não tem nada haver com isso. Ela abraçou Dina com força. – pare de

chorar.

Foi a segunda vez que Dina estava com medo. A primeira vez que ela

passou por tamanha emoção foi quando encontrou o tumulo com o

nome de Ric escrito na lapide. Completamente abalada e com medo

do que poderia acontecer dali para frente ela sentou na caçada, Anja

sentou-se junto a ela.

- Calma Dina, vai ficar tudo bem.

- Não vai ficar, Anja. Ela respondeu enquanto secava as lagrimas. –

Eu lhe contei como foi, se não se lembra eu conto novamente.

Quando o barão, pai de Ric, Ram e Edie, achou a fonte da água

milagrosa, queria ficar com ela somente para ele, então ele construiu

uma aldeia secreta no meio da floresta para ficar perto da localização da

fonte dessa água. Só que a aldeia precisava ser povoada então ele

começou a raptar as pessoas aqui da cidade.

Quando as pessoas começaram a desconfiar ele pegou toda a família, e

fugiu para a aldeia escondida na floresta. Como estratégia para que

ninguém desconfiasse, ele derrubou a casa e forjou a morte de todos, a

dele também. Até túmulos ele mandou colocar no fundo do quintal para

dar realidade à falsa morte.

Ele era maluco, maltratava a família, batia nos filhos, Ric me disse que

era esfaqueado pelo pai varias vezes, só não morria por que a água era

usada para curar as feridas. O barrão obrigava as pessoas a beber da

água para não poderem voltar para a cidade.

Page 191: St. Peter's Village

Mas ele morreu depois de alguns anos e Ram, o filho mais velho tomou

a cidade. Ric e Edie junto com mais alguns homens não concordaram e

fugiram da aldeia para viver no refugio escondido dentro da floresta. Por

isso Ram prometeu que iria matar Ric e quem estivesse contra ele.

- Dina eu me lembro, falou Anja. – Mas não entendo a ligação do seu

psicólogo ao Ram.

- Eu conheci Ram ontem. Dina revelou

- Você o conheceu? Como?

Dina mais uma vez deu um suspiro profundo, quando lembrou que

havia sido enganada por Ram que a fez acreditar que ele era Bob, um

amigo.

- Anja, lembra-se do Bob?

- Claro que eu lembro, aquele gato maravilhoso que você me

apresentou de olhos cor de...

- Anja, ele é na verdade se chama Ram.

- Nossa, que coincidência, ele tem o mesmo nome do... O QUE? Foi a

vez da loura ficar preocupada.

Dina a olhava com um mar de lagrimas nos olhos e lábios apertados,

balançava a cabeça em sinal positivo para a amiga acreditar no que

ela havia pensado sobre Bob.

- Bob é o Ram, irmão de Ric.

- Não pode ser, Dina. Anja se levantou e começou a andar na calçada

de um lado para o outro. – Você ficou perto dele e estava correndo

risco, como você soube?

- Eu fui á floresta ontem sozinha. Ela respondeu e de imediato viu a

decepção no rosto da amiga. – Me desculpe por não ter lhe contato e

não ter levado você comigo.

- Como você pode fazer isso? Você prometeu para mim que iríamos

juntas à floresta.

- Anja, me desculpe. Ela tentou se explicar. – Eu decidi por acaso, e

eu não queria que você corresse algum risco, jamais me perdoaria se

algo ruim acontecesse a você.

- Estou irritada com você. Você me traiu, sou sua amiga.

Page 192: St. Peter's Village

- Por você ser minha amiga que eu não te levei comigo. Estava

procurando Ric e o Tobruk apareceu, logo depois Bob apareceu, digo

Ram apareceu, e foi ai que eu descobri.

- Estou quase lhe perdoando, continue.

- Ele queria me levar forçada para a aldeia, para Santo Pedro. Ele

queria que eu fosse com ele, mas Ric apareceu e houve luta, Ram

quase afundou a espada na cabeça de Ric, na minha frente. Imagine

se você estivesse lá.

Anja olhou-a com expressão triste depois abriu os braços e enrolou-

os em torno de Dina. – Oh amiga, obrigada por me proteger.

- Quando Ram fugiu, disse que iria continuar a fazer o que o pai dele

fazia quando era vivo. Dina continuou falando. – Ele iria voltar a

raptar pessoas, e deu a entender que iria matar se fosse preciso.

Depois que Anja finalmente entendeu a gravidade sobre o que sua

amiga estava falando não se deixou abalar. – Temos vestidos para

experimentar. Levantou e se recompôs junto à amiga. – Não vamos

deixar que eles acabem com nossa festa. Esticou o braço, caminhou

até a porta e tocou a campainha.

Foi ai que Dina lembrou que não havia mencionado que Lucaar

também estava na floresta ao lado de Ram, e que eles eram amigos.

Mesmo ela não ter conseguido ver o rosto dele, ela precisava alertar

a amiga.

- Anja, tem uma coisa que eu preciso falar com você.

- Tem mais?

- Sim, tem mais. Outra pessoa estava lá com Ram, pertencia ao

mesmo grupo que ele...

De repente a porta se abriu e atrás dela estava a costureira

sorridente em ver as meninas. – Olá garotas, vieram ver

experimentar as belezinha que eu fiz?

Quando Dina deu por si, estava sendo empurrada por Anja para

dentro da casa. Ela não pode falar mais sobre o assunto da floresta,

não na presença da costureira.

As duas puderam reconhecer seus vestidos ali mesmo, na sala.

- Lindos. Disse Anja.

Page 193: St. Peter's Village

Dina olhou de cima a baixo para o seu vestido verde em tonalidades

claras e escuras. Ela se aproximou da peça e tocou nela

delicadamente. O tecido era fino, macio e ela nunca havia vestido

uma peça de roupa assim. Pela primeira vez ela desejou estar bonita,

e vestida para uma festa, não importava que fosse uma festa de rua

numa pequena cidade. Ela queria estar bonita para Ric. “Lindo”, ela

pensou.

Quando deu conta Anja já estava dentro do vestido dela e estava

perfeitamente, deslumbrantemente bonita. O vestido era branco com

tons dourados adornando as curvas e siluetas de Anja, ela realmente

parecia um anjo.

- Como eu fiquei? Perguntou a loura.

- Está perfeita, está linda.

- Experimente o seu, vamos, quero ver como você fica vestida de

menina.

Dina ficou rindo sem graça e minutos depois estava vestida com a

peça da mesma coir dos olhos de Ric. Quando Anja virou do espelho

para ela abriu a boca e fez um gracioso elogio. – Uau, você está...

Simplesmente... Maravilhosa.

Dina andou de um lado para o outro pela sala imitando um manequim

de passarela. – Gostou mesmo? Por algum momento ela havia

esquecido a recente morte do seu médico.

- As duas estão ótimas. Disse a costureira enquanto apalpava os

vestidos delas procurando algum defeito. – Acho que não preciso

fazer nenhum arranjo, sempre acerto no tamanho.

- Não precisa mesmo. Falou Anja. – Estão perfeitos, o que você acha

Dina?

Ela estava distraída olhando seu reflexo no espelho, segurava as

saias e fazia pequenos movimentos ondulados. O tecido verde parecia

um oceano se movimentando levemente.

- Dina, ela quer saber se você gostou do seu vestido. Perguntou Anja

novamente quebrando a distração da amiga.

- Ahh... Sim, eu gostei muito. Ela respondeu. – Podemos leva-los

para casa?

Page 194: St. Peter's Village

A costureira sorrindo deslizou uma gaveta para fora da estante da

sala. – Só deixe-me empacotá-los.

As meninas despedirem-se e retornaram cada uma com seu vestido

nos braços. Ainda era dia. No caminho de casa Dina tentou

novamente falar com amiga sobre Luccar.

- Anja, você precisa saber mais uma coisa sobre o que aconteceu na

floresta, sobre Ram.

Anja estava radiante pensando na festa e como ela ficaria com seu

vestido novo, mas lembrou que teria um compromisso. – Dina eu

preciso ir para a igreja, vou ajudar com os preparativos do velório.

- Mas eu preciso lhe falar...

- Agora não Dina, por favor. Ela interrompeu a amiga. – Toda essa

historia com morte e com esse Ram psicopata andando por ai me

deixou muito confusa, ajudar no velório vai desgastar ainda mais,

depois você me fala o que mais eu preciso saber.

Conformada que Anja não estava disposta a ouvir, Dina não teve

outra escolha senão em concordar, ela falaria sobre Luccar em outro

momento. – Tudo bem, amanha falamos. Vou para casa.

- Você não vai mesmo aparecer no velório?

- Não mesmo, não quero correr o risco de ver mais um fantasma.

Respondeu Dina. – Vou para casa e ficar trancada no quarto.

Dina tomou o caminho de sua casa deixando Anja ainda falando -

Então combinamos falar amanhã... Vou fazer uma oração para o

doutor Cipriano por nós duas.

Dina já estava longe, mas pode escutar o nome que Anja havia dito.

“Quem é Cipriano?” Ela pensou. Anja só pode estar delirando por

causa da morte. Mesmo assim continuou caminhando até chegar em

casa. Estava tudo tranquilo, nem parecia o mesmo local tumultuado

pela descoberta do corpo naquela manhã.

Na porta estavam sua avó Augusta e o Padre Santiago. “Ele ainda

está aqui?” Ela se perguntou. – Oi vó.

- Olá querida, já voltou?

- Olá Diana. Cumprimentou o padre.

Page 195: St. Peter's Village

Dina apontou para o vestido enquanto entrava em casa. – Trouxe

meu vestido, a senhora quer ver?

- Mas tarde eu vejo com você querida. Ela respondeu a neta. – Estou

terminando de falar com o padre, tem comida no fogão.

Dina achou estranho sua avó não querer abrir o pacote e ver o

vestido de festa que ela encomendara, mas foi por pouco tempo, logo

depois de comer foi para o quarto. Deixou o vestido ainda no pacote

em cima da cama, retirou as roupas e entrou no chuveiro. Vó

Augusta ficou conversando com o padre na porta de casa.

- Não podemos facilitar para ele, Santiago. Ele matou o doutor e virá

atrás de nós. Ela temia pela vida da neta. – Ele descobriu que nós

sabíamos sobre a aldeia e sobre a fonte, aquele empregado que

Celina mandou trazer a mensagem deve ter falado com ele, agora ele

vai nos matar.

- Não posso pensar nisso agora Augusta, tenho um velório antes do

anoitecer. Falou o padre.

- Você viu como estava o corpo dele, Santiago? Você viu o doutor?

- Infelizmente eu vi. O corpo estava um pouco enegrecido, mas deu

para perceber que ele havia sido atacado por trás, alguém bateu na

cabeça dele com alguma coisa pontuda.

O padre fez um sinal da cruz e despediu-se de vó Augusta enquanto

ia embora. – Nos vemos mais tarde na igreja? No velório?

- Sim até mais tarde.

O padre voltou-se para o caminho da igreja enquanto vó Augusta

fechava a porta atrás dela.

Page 196: St. Peter's Village

ALDEIA de SANTO PEDRO

Água

Quatro dias para a festa

17

Ram passeava pelas ruas de Santo Pedro todas as manhas antes do

sol nascer. Era um ritual que ele adquirira com seu pai desde que

foram morar na aldeia. Era uma caminhada isolada, nem mesmo

Luccar o acompanhava. Passos lentos e cuidadosos, através do chão

batido de terra misturado com areia. Por cada porta que ele passava

a certeza de que tudo ali estava sob seu domínio.

Os primeiros raios de sol penetravam por entre a vegetação da

floresta de encontro à pele dele. Fazia frio todas as manhas, mas

Ram fazia questão de caminhar trajando apenas uma calça expondo o

tronco musculoso ao sereno. No final da caminhada, onde a estrada

principal da aldeia acabava, ele mantinha-se parado observando tudo

em sua volta.

De onde ele estava era possível ver Santo Pedro mesmo que de

longe. Seus olhos em tom muito claro estreitavam-se para aumentar

o campo de visão. Conforme o dia ia clareando, os moradores da

aldeia saiam de suas casas para executar as tarefas incumbidas a

Page 197: St. Peter's Village

eles. A maior parte das pessoas que habitavam a aldeia era

masculina, apenas quatro mulheres residiam ali, mas estavam velhas

de mais para o trabalho duro que a aldeia impunha aos seus

moradores. “Está na hora de começar de onde meu pai parou” ele

pensou.

Quando Ram retornou da caminhada encontrou Lucaar na porta da

sua casa. - Eu gostaria de trazer a amiga da garota para cá.

Perguntou Lucaar. – Para viver comigo.

- A loura? Perguntou Ram.

- Sim, ela mesma. Respondeu Lucaar.

Ram subiu os degraus de acesso à porta de entrada de sua casa

enquanto pensava. Parando diante de Lucaar respondeu. – Tem

minha permissão, é bom que Dina não fique sozinha aqui.

Lucaar sorriu enquanto Ram virava as costas ao entrar em casa. “Vou

procurar Angélica”. Ele pensou.

Na cidade...

Anja terminava seu café da manhã. Ela estava pronta para encontrar

Dina logo cedo. Dessa vez quem iria encontrar com ela em sua casa

seria a amiga de cabelos castanhos. A mãe de Anja estava muito

ocupada preparando os bordados para a festa do Solstício. O pai de

anja havia saído muito cedo para finalizar os últimos acertos da

construção onde ele trabalhava.

Anja escovou os dentes após terminar o café e foi para a varanda da

casa esperar pela amiga. Distraída do lado de fora, a loura percebeu

que alguém estava na calçada poucos metros adiante, quase na

esquina da rua de onde ela morava.

Anja imediatamente reconheceu o homem que estava parado na

calçada com meia parte do corpo encostado no muro, de braços

cruzados. O cabelo dele era preto, liso, brilhoso, quase encostando

nos ombros. Desta vez ele não estava vestindo roupas escuras.

Incrivelmente Lucaar havia combinado uma calça cor de areia bem

larga e camisa branca. Anja desceu os degraus que conduziam a

saída da varanda da frente para rua, enquanto Lucaar caminhava de

encontro a ela.

Page 198: St. Peter's Village

- O que você está fazendo aqui a essa hora da manhã. Ela perguntou.

– Não está muito cedo pra você?

Lucaar tentando parecer casual arriscou um singelo sorrio entre os

lábios. – Não existe hora quando se tem vontade de encontrar

alguém. Ele respondeu.

Anja fez cara de quem não se importava com a resposta dele, mas no

fundo sabia que estava gostando do cortejo de Lucaar. De longe

conseguiu avistar Dina chegando.

- Não posso ficar conversando. Falou Anja. – Minha amiga e eu temos

assuntos a tratar.

Lucaar voltou-se para a rua e deparou com Dina descendo pela

calçada. “Ela não vai me reconhecer”, ele pensou. “Ela não viu meu

rosto”.

Quando Dina estava bem próxima percebeu que Anja falava com um

rapaz em frente a sua casa. “Com quem ela está falando?” Pensou.

Continuou a caminhar em direção da amiga e do rapaz e foi ai que

seus passos começaram a ficar mais lentos e sua respiração ficou

mais forte.

- Oi Dina, Venha conhecer meu amigo. Chamou Anja.

Dina respondeu com um aceno de cabeça e continuou andando

normal. Ela parou na frente dos dois e deu bom dia.

- Bom dia moça. Cumprimentou Lucaar. “Ela não me reconheceu”.

Pensou ele.

- Oi Anja, nós combinamos de sair juntos agora de manhã, não é?

- Sim. Respondeu a amiga, nós vamos assim que eu despedir do meu

amigo aqui.

Dina estava certa de que conhecia aquele rapaz de algum lugar, ela

estava muito desconfiada. “O cabelo dele é muito parecido com o

cabelo de Lucaar”, ela pensou.

- Vocês se conhecem de onde mesmo?

- Nós nos conhecemos daqui. Respondeu Anja.

Lucaar estava certo que Dina não o reconheceria, mas preferiu não

apostar tanto nisso e tentou uma pequena desculpa para sair dali.

Page 199: St. Peter's Village

- Preciso ir. Tenho que lidar com algumas pessoas. Ele disse a elas.

Dina aproximou-se dele muito suspeita. – Você tem que ir agora? Ela

perguntou chegando cada vez mais perto. “Ric disse que mutilou

orelha de Lucaar”, ela se lembrou das palavras dele.

- Eu volto em outra hora. Respondeu Lucaar tentando se afastar de

Dina.

- Seu cabelo é muito bonito, você deixou ele crescer bastante. Disse

Dina já com o braço esticado em direção à orelha de Lucaar.

Sem dar chance de ele responder qualquer coisa, ela passou a mão

levantando os cabelos dele fazendo aparecer a orelha mutilada.

Lucaar imediatamente afastou a mão dela, mas Dina já havia

comprovado que o rapaz que estava diante dela era o mesmo da

floresta que ajudou Ram.

Agora Lucaar sabia que ela o havia reconhecido. Dina ficou enrijecida

olhando para Lucaar enquanto Anja não entendia a situação.

- O que está acontecendo? Perguntou Anja. – Vocês dois se

conhecem?

Lucaar ficou calado olhando para Dina e ela teve medo que expor a

amiga. – Não, eu apenas gostei do cabelo dele. A resposta de Dina

surpreendeu Lucaar.

Eles permaneceram se olhando nos olhos por alguns instantes até

que Lucaar quebrou o silencio. – Vou deixar as duas resolverem o

compromisso, falamos outra hora. Ele disse.

- Certo falamos outra hora, respondeu Dina olhando pra ele.

Anja também se despediu do rapaz. - Xau, de noite podemos

conversar...

- NÃO... Interrompeu Dina.

- Não? Perguntou Lucaar tranquilamente.

- Por que não Dina? Também perguntou Anja. – Por quê?

Dina tentou pensar numa resposta convincente para que Anja não

insistisse em encontrar Lucaar à noite. “Pense rápido Dina”, ela

pensou. – Bem... Eu gostaria que você fosse à igreja comigo...

Page 200: St. Peter's Village

- Igreja? Perguntou Anja quase não acreditando nas palavras dela.

- Sim... Igreja, respondeu Dina quase gaguejando. – Eu queria fazer

uma oração pela morte no meu médico e, você sabe que eu não sei

fazer isso sozinha Anja.

Dina sabia que a amiga nunca trocaria a igreja por alguém. A loura

abriu um sorriso e imediatamente desmarcou com Lucaar, ele

concordou prontamente sorrindo para Dina. – Tudo bem, você venceu

por hoje, Dina. Prazer em conhecê-la, ele disse. – Mas outro Dina

você não poderá impedir que eu veja sua amiga.

Anja ficou envergonhada e puxou Dina com ela. – Vamos lá pra

dentro comer algo, ainda tem café da manha na mesa. Xau, Lucaar.

Ele acenou com a cabeça e foi embora, enquanto elas desapareciam

pela porta, Dina olhando para trás sendo puxada pela amiga.

- Onde você o conheceu? Ela perguntou.

- Dina, não e só você que pode conhecer garotos. Respondeu Anja

indignada. – Ele simplesmente apareceu na rua e falou comigo, como

todo garoto normal faz quando quer conhecer uma garota.

Dina temia pela amiga, ela não suportaria se algo acontecesse com

ela e agora Lucaar estava por perto. – Ele sempre vem aqui falar com

você? Perguntou.

- Nós nos encontramos algumas vezes, acho que vou chama-lo para

a festa.

- Não...

- Lá vem você de novo, por que não? Por acaso está com ciúmes, de

mim ou dele?

- Não é isso Anja.

- Você quer ser o centro das atenções sempre, tá na hora de deixar

alguém ter um relacionamento, já que você tem o Ric.

Dina tentou acalmar a amiga, ela nunca havia brigado com Anja. –

Calma, é que você não o conhece, pode ser perigoso encontrar

estranhos...

Page 201: St. Peter's Village

- Você encontrou um estranho também... Até beijou ele se não me

falha a memória e ainda foi com ele para um lago nadar sem roupas

e...

- Tá bom, não vamos entrar nesse assunto. Interrompeu Dina. – Só

estou preocupada com você, mas se você quer ir com ele à festa

vamos fazer um encontro juntas, eu e Ric e você com...

- Lucaar. Completou Anja mais calma e parecendo que havia

esquecido completamente a briga com Dina.

- Ótimo, disse Dina. – Vamos fazer isso.

- Ótimo, respondeu Anja de Volta. – Agora vamos.

Elas estavam a caminho da porta quando Dina parou bloqueando a

saída. “Eu não posso fazer isso com ela”, pesou. “Eu tenho que contar

tudo para ela poder se defender se ele tentar algo”.

- Ande logo Dina, está parada ai por quê?

- Anja, vamos para seu quarto, eu preciso lhe contar algo.

Elas retornaram para dentro fechando a porta, chegando no quarto

de Anja, sentaram e Dina contou tudo sobre Lucaar acrescentando ao

que ela já havia contado antes sobre a briga dos irmãos na floresta.

Longas horas se passaram e elas finalmente saíram da casa, Anja

muito abalada por ter chorado o dia inteiro depois que ficou sabendo

a verdade sobre Lucaar.

- Mas ele nunca fez nada comigo. Ela disse. – Até pediu para eu fazer

uma oração por ele.

- Ele perigoso, Anja. Dina consolou a amiga. – Ele estava tentando

ganhar sua confiança pra depois fazer alguma coisa.

- O que ele queria fazer comigo?

- Eu não sei. Respondeu Dina. – Ram quer me levar para algum lugar

e eles são do mesmo grupo, deve quer levar você também.

- Levar para onde?

Enquanto isso na floresta...

Ric discutia com Edie sobre Ram querer raptar as pessoas. – Eu não

vou permitir que ele leve Dina para Santo Pedro.

Page 202: St. Peter's Village

- Não é somente sobre ela que estamos falando. Disse Edie. – Ele não

pode levar mais ninguém para lá. O idiota, agora quer bancar o barão

e raptar pessoas.

- Nosso pai era louco, Edie, agora Ram está ficando louco também.

Disse Ric com raiva do irmão mais velho. – É essa maldita água

envenenada, acabou com a sanidade do nosso pai.

Edie tentava acalmar Ric inutilmente, ele temia que o irmão mais

novo influenciasse os outros membros do grupo a entrar em

confronto direto com Ram e seu clã. – Você não vai fazer nenhuma

idiotice? Perguntou.

Ric encarou Edie engolindo em seco. – Ele tentou me matar com a

Corta-Relâmpago, se eu não tivesse sido rápido ele teria afundado a

espada na minha cabeça. A raiva de Ric tomou conta de todo seu

corpo, ele cerrou os punhos enquanto dizia. – Eu nunca vou me

esquecer disso.

Edie saiu batendo os calcanhares para longe de Ric reclamando baixo

alguma coisa sobre “é claro que ele vai fazer alguma idiotice ou não

seria meu irmão”...

Ric chamou Céu, o cavalo logo atendeu ao assobio dele. Ric montou

no cavalo e os dois galoparam para longe do acampamento do

refúgio.

Edie também estava caminhando para longe do acampamento, Xerife

o acompanhava. Os dois andavam lado a lado até se aproximarem

das margens da cidade. Já estava escuro e Edie deixou Xerife

escondido dentro da mata enquanto caminhava pelas ruas da cidade.

Fez uma pausa quando se aproximou do velho e aposentado chafariz,

o mesmo em que Dina e Ric haviam se beijado. Continuou

caminhando para longe até o final da rua. Estava bem escura e Edie

avistou uma imagem muito familiar, sentada no banco, esperando

por ele.

- Pesei que você não viesse hoje.

- Eu nunca deixei de vir, hoje não seria diferente. Respondeu Edie.

- Está aborrecido?

- Qual dia eu não em aborreço com aqueles dois idiotas? – Eu

preferia ter sido filho único.

Page 203: St. Peter's Village

- Disso eu sei bem, venha aqui perto, senti sua falta.

- Eu também senti sua falta, Carla. Respondeu. – Não consigo passar

um dia longe de você.

- E não foi isso a nossa vida toda? Ela respondeu. – Desde pequeno,

você sempre foi atrás de mim.

Edie sentou ao lado dela e os dois se abraçaram. – Eu sempre irei

atrás de você. Depois que falou eles se beijaram ardentemente.

Page 204: St. Peter's Village

ALDEIA de SANTO PEDRO

Água

Três dias para a festa

18

Logo pela manha, Anja saiu de casa, correndo em direção à casa de

Dina. Pelo caminho, andando tranquilamente na mesma calçada

estava Lorena. Anja passou por ela tão próximo que a fez assustar.

- Ei, olha por onde anda. Reclamou Lorena.

Anja por um segundo olhou para trás, mas não deu absolutamente

nenhuma atenção à menina alta de cabelos negros, seguiu correndo

para a casa da amiga.

“Lá vai a santinha do pau oco”, pensou Lorena enquanto ajeitava os

cabelos presos em um irritante rabo de cavalo que ela insistia em

usar todos os dias. Ignorando Anja, Lorena atravessou à rua e entrou

numa porta que conduzia a um sobrado.

Subindo a pouca escadaria que terminava em uma enorme sala de

artes marciais, estavam o instrutor e alguns rapazes treinando

movimentos de defesa pessoal. A turma era pequena e Lorena

identificou Adan entre eles. O rapaz louro estava usando calça de

Page 205: St. Peter's Village

moletom azul escura e camiseta branca, muito suada a camiseta

transparecia o tronco bem musculoso.

- ATENÇÃO TURMA, ordenou o instrutor. - FORMAÇÃO.

Todos os alunos perfilaram-se em frente a ele e executaram um

movimento com a cabeça em sinal de cumprimento.

- DISPENSADOS... NÓS VEMOS DEPOIS DO SOLSTÍCIO.

Os rapazes apertaram as mãos uns dos outros e Adan foi para perto

de Lorena. – Não fique muito perto, está suado. Disse ela com as

duas mãos levantadas impedindo que ele se aproximasse.

Adan sorriu, revelando uma enorme acarada branca - O que a trás

aqui? Perguntou ele enxugando-se com uma toalha de rosto.

- Eu quis ver com meus próprios olhos onde você se escondia todos

os dias.

Adan alcançou a bolsa e mergulhou a toalha dentro dela. Os dois

sentaram na recepção do Dojô*

(*local de prática de artes marciais, pode ser chamado também de Dojan

ou Tatame. Pode ser considerado apenas o piso onde se pratica a arte ou

todo o local propriamente dito, variando de arte para arte e país de

origem).

- A festa acontecerá daqui a quatro dias. Disse Lorena. – E nós

vamos nos candidatar a rei e rainha da festa.

- Outra vez? Perguntou Adan.

- Claro, vou inscrever nossos nomes. Xau.

Adan segurou pelo braço dela impedindo que ela fosse embora. –

Dessa vez você não vai me fazer de bobo como ano passado. Lorena

piscou para ele, puxou o braço de volta e foi embora sem falar nada.

Parando na porta de saída olhou de soslaio e viu que ele estava

olhando para ela rindo sozinho.

Enquanto isso na casa de Dina...

- Calma Anja, ele vai aparecer. Tentou consolar vó Augusta junto

com Dina. – Ele sempre fez isso, brigava com sua mãe e sumia.

Page 206: St. Peter's Village

O pai de Anja havia brigado com a mãe dela, recentemente e era de

costume sair de casa e passar alguns dias dormindo fora até esfriar a

cabeça antes de retornar.

- Mas ele nunca passava tanto tempo fora, ele não voltou até agora.

Respondeu Anja soluçando. - Eu tenho medo que alguém tenha feito

alguma coisa contra ele...

Dina fez uma careta para que Anja não revelasse nada sobre Lucaar

ou Ram ou até mesmo Ric. ”Ela não pode falar nada, minha avó está

aqui”, pensou. Anja entendeu a careta da amiga e se conteve não

falando mais nada.

- Por que você acha que alguém fez alguma com seu pai Angélica?

Perguntou vó Augusta desconfiada.

- Errr... Nada vó. Interrompeu Dina. – Ela está assim por causa da

morte do meu médico.

Anja olhou para a amiga indignada com a desculpa que deu a avó

dela. – Sim dona Augusta, eu estou abalada por causa disso. Falou

enquanto olhava para Dina.

- Vou até a sua casa ficar com sua mãe, enquanto isso vocês duas

comam um pouco. Disse vó Augusta enquanto pegava seu cardigã. –

Ele vai voltar logo, Angélica, não se preocupe.

Depois que ela saiu, as duas começaram a conversar. – Foi ele Dina.

Falou Anja primeiro. – Foi ele quem pegou meu pai, depois que você

reconheceu, foi Lucaar.

- Também pode ter sido Ram quem fez isso. Preciso falar com Ric

sobre isso.

- Eu vou com você.

- Anja, isso pode ser perigoso, não quero que você se arrisque.

- É o meu pai.

A Dina lembrou-se de como foi a sensação em perder um pai e

concordou com a amiga. – Certo, marquei com Ric no velho chafariz

depois do almoço, vamos esperar aqui e quando der a hora certa,

vamos prá lá.

A duas almoçaram lá mesmo na casa de Dina, vó Augusta ainda não

havia retornado da casa de Anja. – Vamos logo. Pediu Anja.

Page 207: St. Peter's Village

Quando chegaram ao chafariz encontraram Ric sentado na beirada,

esperando sorridente. – Olá Dina... Hei Anja, tudo bem com você...

Ele percebeu imediatamente que alguma coisa estava acontecendo e

logo seu semblante mudou. – Me conte o que aconteceu.

As duas sentaram ao lado de Ric e quando Dina acabou de contar

sobre a morte do seu psicólogo, o estranho interesse de Lucaar em

Anja e agora o sumiço do pai dela, ele finalmente falou. – Vocês

acham que Ram é quem está por trás disso?

- Eu também pensei a mesma coisa. Disse Dina.

- Não, aquele mostro pegou meu pai. Falou Anja choramingando. –

Por que isso está acontecendo meu Deus, por quê?

Dina abraçava Anja tentando consola-la, mas parecia impossível

consolar a loura. Ric mostrava muita raiva enquanto Dina não saia de

perto da amiga. – Pensando bem, eu tenho um palpite de que seu pai

não foi pego por Ram ou por Lucaar. Falou Ric.

- Você acha mesmo isso Ric? Perguntou Anja cheia de esperanças.

- Sim, eu pensei melhor. Ele respondeu. – Não é o estilo de Ram

fazer uma coisa assim, não quando existe risco.

- Mas Lucaar pode ter feito isso. Disse Dina.

- Sim, depois que soube que Dina o reconheceu lá na porta da minha

casa. Completou Anja.

- Pouco improvável. Disse Ric. – Lucaar pode ser o que for, mas ele

obedece às ordens de Ram, definitivamente, ele não faria uma ação

isolada assim.

- Então, se não foram eles os responsáveis pelo sumiço do meu pai,

quem foi?

Dina passou a mão no ombro da amiga. – Anja, seu pai sempre

some, você mesma me disse isso. Pode ser apenas uma coincidência,

só isso.

Ric também se aproximou de Anja e enxugou uma lágrima que

escorria pela bochecha dela. – Eu também acho que seja isso, Anja.

Depois que Dina e Ric conseguiram acalmar Anja, caminharam em

direção a casa dela. Pele caminho, já na rua onde as meninas

Page 208: St. Peter's Village

moravam avistaram de longe, vó Augusta retornando da casa de

Anja, mas pela direção que ela estava indo, não parecia que ia pra

casa. – Ela está indo para a igreja? Perguntou Dina.

- Sim. Respondeu Anja. – Pelo menos a igreja fica por aquele lado.

Elas tentaram esconder Ric para que vó Augusta não o reconhecesse,

mas era tarde de mais, ela já havia visto as meninas e estava

caminhando em direção a elas. – Olá queridas, está ficando tarde.

Falou vó Augusta. – Quem é o rapaz que está com vocês duas?

Dina e Ric endureceram, sem saber o que responder. “Tomara que

ela não o reconheça”, pensou Dina. – Boa noite senhora.

Cumprimentou Ric. – Eu estava acompanhando as duas meninas até

a casa delas.

Anja e Dina gelaram enquanto vó Augusta falava com ele. – E você

quem é?

- Sou da cidade vizinha. Respondeu ele. – Vim para o enterro do

doutor que encontraram morto, mas chegamos tarde demais, já

enterram ele.

- Ele era seu doutor?

- Sim, meus pais estão retornando está noite, por isso eu devo me

apressar.

- Pode deixar, eu levo as meninas para casa. Disse vó Augusta.

- Sim senhora, boa noite.

As meninas se despediram dele. - Boa noite – Boa noite. E ele seguiu

rua abaixo caminhando até que elas não puderam mais vê-lo.

Dina suava frio e Anja engolia em seco. “Ainda bem que ela não

perguntou o nome dele e nem o nome dos pais dele”, pensou Dina.

- Qual é o nome desse rapaz? Perguntou vó Augusta.

- Marcos, disse Anja. – Vinicius, disse Dina logo em seguida.

As duas se olharam sem saber o que falar enquanto vó Augusta

esperava uma resposta. – Marcos Vinicius. Respondeu Dina

finalmente. – Nós o encontramos ali na pracinha onde toda a turma

jovem se encontra, vó. O conhecemos hoje e ele se voluntariou para

nos trazer até a casa de Anja.

Page 209: St. Peter's Village

- E os pais...

- Eu não perguntei quem eram os pais dele. Interrompeu Dina. - Ele

é inofensivo.

Vó Augusta olhou para as duas e pensou por alguns instantes antes

de responder. - Tudo bem querida, agora vamos. “Muito estranho,

esse rapaz me parece familiar”, pensou vó Augusta.

Elas caminharam de volta para a casa de Anja, deixando a menina

bem na porta de entrada. – Falei com sua mãe Angélica, ela disse

que sabe onde seu pai pode estar.

Mais aliviada Anja abriu um sorriso. – Graças a deus. Respondeu

enquanto se despedia de Dina e da avó dela. – Depois falamos e,

obrigada por ser minha amiga, Dina.

- Agora vamos Diana. Chamou vó. Elas caminharam de volta pra

casa.

- Onde a senhora estava indo quando nos encontramos, vó?

- Estava indo à igreja falar com padre Santiago, mas falo com ele

amanha. Agora vamos.

As duas caminharam de volta para casa. No caminho, dava para

perceber na rua transversal, que em frente à prefeitura estava um

aglomerado de pessoas. Dina ficou curiosa para saber o que estava

acontecendo lá. – O que é aquilo lá na frente da prefeitura?

Perguntou.

- Não sei bem o que é querida, vamos lá matar nossa curiosidade.

Respondeu vó Augusta sorridente.

Elas já estavam em frente ao prédio, onde se encontrava a secretária

do prefeito carregando um tipo de urna em suas mãos. Havia muitos

jovens no local e Dina conseguiu reconhecer uma garota alta de

cabelos escuros, presos a um rabo de cavalo, era Lorena.

As duas se encararam por alguns segundos antes do prefeito sair do

prédio e acomodar-se em frente a grande mesa, sobre ela a urna que

a secretária dele havia colocado.

- O que está acontecendo? Perguntou Dina novamente à vó. – Para

que serve aquela urna ali na mesa, haverá uma votação?

Page 210: St. Peter's Village

- Sim. Respondeu uma moça desconhecida que estava próxima. –

Mas não hoje, estão penas recolhendo as cédulas dos candidatos a rei

e rainha da festa.

- Haverá um rei e rainha da festa do Solstício? Perguntou Dina à

desconhecida.

- Sim, todos os anos escolhemos os candidatos, sua neta vai se

candidatar, Augusta?

- Não sei, Elisa. Respondeu vó Augusta. – Você quer colocar seu

nome lá, Diana?

Por alguns segundos, Dina sonhou com ela sendo eleita rainha da

festa e Ric o rei, mas logo caiu em si respondendo a sua vó. – Acho

que não quero, fica para ano que vem.

Dina não conseguia pensar em outra coisa que não fosse em Ram, ou

em Lucaar ou água de Santo Pedro. Ela temia pela segurança da

amiga, agora que sabia que Lucaar mostrou interesse por ela.

Lorena se aproximou da urna e depositou duas cédulas, uma com o

próprio nome e a outra provavelmente com nome de Adan. Logo em

seguida passou por entre as outras pessoas e foi embora ignorando

Dina completamente.

- Vamos para casa, vó. Pediu Dina

Avó e neta entraram pela porta e foram até a cozinha. – Vou fazer a

janta, querida, vai querer franco ou peixe?

Dina não mostrava muito interesse pela comida. – Não estou com

fome, vó. Respondeu. – Vou subir e tentar dormir.

- Ainda é cedo para dormir.

- Mesmo assim vou ficar deitada. Falou enquanto saia da cozinha. –

Como Anja deve estar agora? Perguntou à avó. – Espero que ela

esteja bem.

Chegando ao primeiro degrau da escada, ela olhou para cima e dessa

única vez, ela subiu bem devagar, degrau por degrau até chegar ao

seu quarto.

Na casa de Anja...

Page 211: St. Peter's Village

- Vou ficar esperando ele voltar. Disse Anja à sua mãe. – Pode ir pro

seu quarto se quiser, eu vou ficar aqui na sala.

- Angélica, eu já falei com você. Disse a mãe dela. – Seu pai

provavelmente deve estar na antiga casa dos teus bisavôs, é longe,

por isso ele não voltou ainda, deve estar esfriando a cabeça.

Anja temia pelo pai dela por que sabia que a casa dos bisavôs ficava

muito perto, quase dentro da floresta, e a casa estava em péssimo

estado. – Aquilo não é uma casa, é uma cabana. Ela respondeu à

mãe. - Ele pode estar com fome e com frio.

- Filha, amanhã eu vou atrás dele. Disse sua mãe. – Vou trazê-lo de

volta para casa.

-Promete, mãe?

- Prometo.

Page 212: St. Peter's Village

ALDEIA de SANTO PEDRO

Água

Dois dias para a festa

19

No acampamento do refúgio...

Ric treinava com seu irmão e outros poucos rapazes que compunham

seu clã. Era uma manhã calma e todos praticavam os ensinamentos

que aprenderam quando crianças, os mais jovens seguiam os mais

velhos. Ric orientava o treino com as espadas e Edie orientava o

treino com as facas.

As árvores locais com troncos grossos eram os alvos. Tudo ali era

improvisado e precário, não existia um local adequado, eles

praticavam entre as árvores no meio da floresta. Folhas e cipós

enrolados, pendurados em galhos, simulavam os sacos de pancadas

que as academias da cidade possuíam em suas salas de treino de

Page 213: St. Peter's Village

artes marciais. Mas, nada disso era motivo para que eles ficassem

abalados, ao que parecia eles preferiam estar ali, naquelas condições,

do que estar sob o comando de um arbitrário.

Quando Edie dava o comando finalizando o treinamento, todos eles

apertavam as mãos cumprimentando uns aos outros. Ric fazia

questão de apertar a mão de todos sem exceção, ele era muito

querido entre o grupo.

- BOM TRABALHO AMIGOS, falou Ric a todos. – HOJE O TREINO FOI

MUITO PRODUTIVO, PARABENS, FAMÍLIA.

- Alguém saiu machucado? Perguntou Edie. – Precisam de um pouco

de água, perguntou rindo.

Todos os membros do clã responderam sorrindo à Edie. – NÃO

SENHOR. Disseram juntos.

Voltaram para o núcleo do refugio conversando e brincando entre

eles. A grande maioria era composta por rapazes da mesma idade de

Ric e Edie, eles cresceram juntos em Santo Pedro, mas antes de

serem levados à força para a lá, eram filhos de moradores comuns na

cidade, estudavam na mesma escola e brincavam na praça quando

eram crianças.

Quando foram raptados de suas famílias, a vida deles girou cento e

oitenta graus, não podiam mais brincar, não podiam mais ser

crianças comuns. Foram submetidos a treinamentos severos que o

barão impunha a todos os moradores da aldeia.

Quase não havia mulheres em Santo Pedro, as poucas que existiam

eram, além da baronesa, algumas empregadas e duas mães que

ajudavam a cuidar dos garotos quando o barão não estava

atormentando eles. Sem falar que todos foram obrigados a beber da

água da fonte para que nunca mais pudessem voltar para cidade.

Depois que a baronesa morreu por causa do veneno, muito tóxico, de

uma aranha, não demorou muito para que o barão também viesse a

falecer e seu filho mais velho tomasse o controle de Santo Pedro.

Essa foi a deixa para Ric e Edie organizarem uma fuga coletiva, e

quem não estava disposto a ficar debaixo do comando de Ram iria

sair da aldeia. Ele ficou muito irritado e considerou desertores os que

saíram acompanhando os irmãos, jurando todos de morte.

Page 214: St. Peter's Village

- AMIGOS, PEÇO ATENÇÃO DE TODOS, falou Ric ao clã. – Em alguns

dias haverá luta, na cidade. Todos do grupo voltaram os olhares para

Ric. – Meu irmão, Ram, está tramando contra os moradores da

cidade, ele vai raptar pessoas e leva-las para Santo Pedro assim

como meu pai fez com vocês há anos, eu não vou permitir que isso

aconteça.

Os rapazes permaneceram em silencio enquanto Ric falava. Edie

estava apreensivo, ele não podia prever a reação deles, mas Ric

continuou. – Nenhum de vocês é obrigado a confrontar Ram e seu

clã.

- Eu quero ir confrontar Ram. Falou um dos rapazes. – Eu não quero

que ele faça outra pessoa passar o que eu passei naquela maldita

aldeia. – Eu também quero ir, disse outro rapaz. – Eu também vou,

disse outro.

Então todos os membros do grupo do clã de Ric estavam dispostos a

confrontar Ram fora da floresta. Seria a primeira vez que eles, desde

que foram raptados, retornariam à cidade. Edie ficou com medo de

que algum deles pudesse ter alguma recaída caso encontrasse ou

fosse reconhecido por algum parente lá.

Ric temia por Dina e por Anja, ele sabia que os alvos principais do

irmão mais velho seriam elas duas.

Enquanto isso, em Santo Pedro...

Existia uma sala especifica para os treinamentos de todo o clã de

Ram. O local era impecável, o barão fez questão de montar um dojô

tipicamente japonês na aldeia, no meio da floresta. Todas as práticas

com facas e espadas, assim como os combates corpo a corpo eram

realizados lá.

Lucaar coordenava o treinamento e Ram participava diretamente dos

combates com os membros do clã. Volta e meia ele combatia contra

dois ao mesmo tempo, ninguém conseguia derrotar Ram. Os

habitantes de Santo Pedro o obedeciam não por que ele era o filho

herdeiro do barão, mas por ele ser um excelente e habilidoso

guerreiro.

Nos combates com espadas, toda atenção era voltada para a

magnífica Corta Relâmpago, que brilhava a cada golpe desferido.

Page 215: St. Peter's Village

Depois que o barão morreu, Ram apoderou-se da espada, alegando

que por ser o filho mais velho, teria o direito legal. Ric nunca

manifestou qualquer vontade de ter a espada, já Edie sempre a

desejou e esse poderia ser o único motivo de desavença entre eles

dois.

Quando Ram não estava usando a espada, a Corta Relâmpago

descansava escondida numa pequena sala em seu quarto,

absolutamente ninguém tinha permissão para entrar lá. Nem mesmo

Lucaar.

Ao terminar o treinamento, Ram deixava o clã e caminhava para sua

casa, mantinha-se calado até estar sozinho no seu quarto. Era um

cômodo grande, com cama para duas pessoas. Móveis velhos,

rústicos, pesados, que o pai dele havia deixado como herança.

Assim que ele entrou retirou a camisa suada e jogou no chão em

frente à cama. Caminhou até a parede ao lado da cômoda, lá havia

uma porta de correr que mal podia ser percebida. Ram deslizou a

porta lateralmente revelando outra sala dentro do quarto. Então

conduziu a Corta Relâmpago para dentro, colocando-a em cima de

um pedestal especifico para espadas.

Ele voltou fechando a porta atrás de si, e antes de mergulhar em sua

cama retirou a única peça de roupa que havia em seu corpo,

deixando a calça junto à blusa suada no chão. Seu corpo exibia além

das curvas musculares, marcas de luta cicatrizadas que ele não fez

questão que a água curasse. Então ele fechou os olhos, e repousou.

Lucaar aproveitou a ausência de Ram, pegou seu cavalo e foi para

cidade, ele queria encontrar Anja, mais uma vez. Ela estava em casa

quando ele apareceu na porta da casa dela. Ficou parado do lado de

fora algum tempo antes que a garota notasse sua presença. A mãe

de Anja havia lhe dito que sabia onde o pai dela poderia estar e que e

que iria atrás dele e que logo ele estaria em casa.

Anja teve medo de sair, mas Lucaar não mostrou nenhum

comportamento que justificasse que a garota tivesse medo dele. Ela

abriu a porta com calma, um pouco insegura, tímida e ao mesmo

tempo curiosa.

- O que você está fazendo aqui. Perguntou. – Eu não quero mais falar

com você, minha mãe pode vir aqui e ver você, vá embora.

Page 216: St. Peter's Village

- A sua amiga lhe contou, não foi? Disse Lucaar fazendo sinal com a

mão para que ela saísse de casa.

- Você me enganou. – Você...

- Está errada. Ele interrompeu. - Eu não enganei você.

- Você e aquele Ram mataram o medico de Dina. Ela afirmou.

- Sobre o que você está falando?

- Você me pediu para fazer uma oração e eu fiz, você estava aqui

comigo o tempo todo e você... Vocês mataram uma pessoa.

- Angélica, nós não matamos ninguém. Quem morreu?

- Fique longe de mim, nunca mais chegue perto de mim, ou da minha

casa ou da minha família ou... De Dina.

Ela bateu a porta deixando Lucaar do lado de fora. Muito intrigado ele

decidiu se concentrar na morte do tal medico que Anja mencionara.

Ele desconhecia completamente a morte dessa pessoa. “Melhor voltar

para a Aldeia, contar isso”, ele pensou.

Enquanto isso no refugio...

Edie falava inutilmente com Ric sobre ele ir à festa com Dina. – É

arriscado você ficar com ela lá no meio das pessoas. – Sem falar que

você pode ser reconhecido por alguém.

- Ninguém vai me reconhecer, Edie. Retrucou Ric. – Eu era muito

novo quando deixamos a cidade, as pessoas não vão me reconhecer,

e eu acho que você também não seria reconhecido.

Edie parou um instante e perguntou. – Você acha mesmo que eles

não me reconheceriam?

- Claro, eles lembraram-se de um gordinho e desajeitado. Falou

rindo. - Ou você esqueceu-se de como era sua forma quando criança.

Edie ficou irritado com Ric e arremessou uma faca, fincando no tronco

de uma arvore ao lado da cabeça do irmão, fazendo irmão rir cada

vez mais alto.

- Ahhhhh, você se lembra de quando era gordinho...

Page 217: St. Peter's Village

- Eu vou ti matar, idiota.

Ric começou a correr pelo refugio enquanto Edie tentava acerta-lo

com facas, pedras ou que ele conseguisse pegar. – Errou. – O

gordinho do pão de batata da mamãe não consegue me pegar.

Edie com certeza já estava irritado com Ric quando finalmente

conseguiu acerta-lo com uma pedrada atrás da cabeça.

- Ai, isso doeu. Reclamou Ric. – Está sangrando.

- Agradeça por não ter acertado você com uma faca, idiota.

Edie não falou mais nada e enquanto caminhava de volta, reclamava

do irmão mais novo. – Eu não tenho mais obrigação de aguentar, as

infantilidades dele. – Era só o que me faltava, ele ficar me lembrando

de como era meu corpo quando eu era um garoto. – Ainda arranco

aquela língua, só fala besteiras. – Estamos falando de coisas sérias e

ele só tripudia...

Ric mesmo sangrando na cabeça ainda sorria com as reclamações do

irmão. – EU TAMBÉM TI AMO. Gritou.

Sentou-se num tronco seco e alcançou seu cantil com a água e

derramou sobre sua cabeça. A água imediatamente fez seu papel e

curou a ferida. Olhando para as folhas das árvores ele pensou em

Dina, e como ela ficaria bonita em um vestido. Quando caiu em si

lembrou-se que não tinha o que vestir para festa. “Preciso arrumar

uma roupa para acompanhar Dina”, pensou.

Em Santo Pedro...

Luccar se reuniu com Ram e outros membros do clã, ele falou sobre a

morte de uma pessoa na cidade e todos negaram dizendo que não

sabiam do que se tratava.

- Ninguém aqui fez nada contra alguém da cidade, nem mesmo

sabíamos dessa morte. Falou Patrick, um dos membros mais velhos

do clã de Ram. – Aposto que foram os refugiados.

- O que mais você sabe sobre esse homem que morreu, Lucaar?

Perguntou Ram.

- Não sei muita coisa, a informação que tenho é que ele era o médico

da garota.

Page 218: St. Peter's Village

Patrick levantou-se da mesa onde estavam reunidos. – Por isso

mesmo, foi o Richard que fez isso, ele estava envolvido com ela...

- Como você tem tanta certeza? Perguntou Lucaar encarando-o. –

Você sabe de alguma coisa que nós não sabemos?

- Você está duvidando de mim? Perguntou Patrick encarando de

volta. – Quer resolver isso lá fora?

Enquanto os dois discutiam, Ram pensava sobre o assunto, parecia

não importar-se com a troca de ameaças entre Lucaar e Patrick.

Quando os dois estavam prestes a começar brigar, ele teve que

intervir.

- Calem-se os dois, precisamos descobrir mais sobre esse homem

que morreu, por que ele morreu e quem o matou.

Patrick não gostava de Lucaar e muito menos da calma com que Ram

conduzia as coisas. – Mas senhor, eu apenas gostaria de...

- Eu já dei minhas ordens, e espero que elas sejam obedecidas.

Interrompeu Ram. - Agora vá.

- Certo senhor, me desculpe, irei até a cidade.

- Não, Lucaar é quem vai à cidade, você não sairá da aldeia.

Respirando fundo Patrick assentiu com a cabeça e saiu da sala de

reuniões que ficava atrás do Dojô. – Sim, senhor.

Lucaar ficou olhando para Patrick até que ele estava fora da sala

junto com os outros membros que participavam da reunião. – Não

confio nele, nunca confiei. Ele disse a Ram. – Não entendo por que

ainda o deixa estar aqui.

- Aprendi uma coisa com meu pai. Respondeu Ram. – Devemos

manter nossos amigos perto e os inimigos mais perto ainda.

Ram estava muito pensativo. – Não acho que foi alguém do clã de

meus irmãos, eu penso que existe outra pessoa por trás disso.

- Alguém em mente?

- Não, por isso precisamos saber mais informações sobre esse morto.

Respondeu Ram. – Não podemos deixar de nos preocupar com a

segurança da Aldeia e a fonte da água, se alguém estiver tramando

alguma coisa, nós poderemos morrer, todos nós.

Page 219: St. Peter's Village

ALDEIA de SANTO PEDRO

Água

Um dia para a festa

20

Era véspera do Solstício e uma euforia coletiva pairava sobre a

cidade. Fazia frio, mas ninguém estava preocupado com a

temperatura, o único assunto comentado era a festa, e o grande

chamariz do evento seria, além da eleição do rei e rainha, a grande

fogueira que seria acesa pouco antes da meia noite.

Dina colocou seu vestido verde de festa no cabideiro fora do guarda

roupa. Os sapatos que ela iria usar foram emprestados por Anja, que

calçava o mesmo número que ela. Dina não podia deixar de pensar

em como seria estar ao lado de Ric, sozinha ela arriscou alguns

passos que havia ensaiado com Anja, para não passar vergonha se

caso Ric a chamasse para dançar. Ao mesmo tempo ela lembrou que

ela não estaria na festa para se divertir, já que Ram iria tentar

alguma coisa durante o Solstício.

“O que será que ele vai aprontar?” Ela pensou.

Page 220: St. Peter's Village

- Você estará muito bonita amanhã, querida. Falou vó Augusta

encostada na porta do quarto de Dina.

- Obrigada, vó. Respondeu ela. – Eu nunca participei de uma festa

assim, minha mãe alguma vez participou?

Vó Augusta pensou por uns instantes e pediu que Dina a seguisse até

seu quarto. – Venha querida, vou lhe mostrar uma coisa.

A neta seguiu até o quarto da avó e sentou na cama enquanto vó

Augusta arrastava um enorme baú posicionando-o ao lado. Ela abriu

o baú e começou a retirar peças antigas de roupa de cama. Lá no

fundo, começaram a surgir roupas masculinas e femininas.

- De quem são essas roupas, vó?

Vó Augusta sorrindo começou a abrir as roupas e espalha-las por

cima da cama. Um lindo vestido curto azul foi primeiro e depois

algumas blusas decoradas em crochê, todas em tom pastel e,

finalmente um belo traje de festa masculino.

Dina olhava todas aquelas roupas em silêncio sem perceber uma

lágrima escorrendo. Ela estava certa que aquelas roupas foram

usadas por pessoas que ela amou muito.

– Eram dos meus pais? Perguntou emocionada.

- Sim. Respondeu a avó. – Quando eles eram mais jovens, da sua

idade. - Cresceram e deixaram as roupas aqui, eu guardei tudo.

A garota pegou uma das blusas, levou até o rosto e ficou alisando a

bochecha com o tecido fino. – Minha mãe usou isso na minha idade?

- Ela usou tudo isso, querida. E esse traje aqui, foi seu pai quem usou

quando dançou com sua mãe pela primeira vez no Solstício. Ela deu

uma pequena pausa antes de continuar. – Depois disso, eles nunca

mais se desgrudaram.

Dina soltou a blusa e voltou à atenção para o lindo traje escuro de

festa que o seu pai havia usado para dançar com sua mãe. “Foi ai

que eles se apaixonaram”, pesou.

- Diana, com quem você vai à festa, quem vai ser seu par? Perguntou

Vó Augusta.

Page 221: St. Peter's Village

Ela ficou nervosa com a pergunta repentina e antes que pudesse

pensar numa resposta convincente, elas ouviram alguém batendo na

porta da frente da casa.

- OLÁÁÁÁ, HOW DE CASA. Gritou Anja do lado de fora.

A interrupção de Anja foi muito bem vinda pela amiga. ”Salva por um

anjo”, ela pensou.

- JÁ ESTOU INDO. Respondeu Dina com um grito tão forte que fez

sua avó assustar. – Combinei de encontrar com Anja, vó. – Depois

falamos.

Ela saiu correndo do quarto da avó, mergulhou os pés nos tênis cano

curto e se atirou escada abaixo descendo o mais rápido que pode

para encontrar Anja ansiosa para entrar. - Por que demorou tanto,

estou horas esperando aqui fora.

Dina riu e tentou puxar Anja para rua, mas a loura escorregou para

dentro da casa da amiga. – Preciso falar com sua avó.

- Falar o que? Perguntou Dina. - Acho que não é uma boa hora.

- Por que não? Insistiu Anja.

- Ela estava me perguntando sobre a festa. Falou sussurrando. - E

quem seria meu par...

- Olá Angélica, tudo bem com você? Como vai sua mãe?

- Olá dona Augusta, é sobre isso que eu vim. – Minha mãe vai atrás

de meu pai hoje, ela disse que ele pode estar na antiga cabana dos

meus avós, na floresta.

- Você disse floresta? Perguntou Dina nervosa. – Onde fica essa

cabana?

- Era a antiga cabana onde os avós de Angélica moravam, querida. –

Eles morreram e a cabana ficou lá vazia.

- É Dina, meu pai toda vez que briga com minha mãe, vai lá e fica

alguns dias até esfriar a cabeça para voltar para casa. – Minha mãe

decidiu que vai lá buscá-lo.

- Você acha mesmo que não é perigoso? Perguntou Dina esquecendo

que a avó estava ao lado. – Você sabe que temos que tomar cuidado.

Page 222: St. Peter's Village

- Cuidado com o que querida? Perguntou vó Augusta.

As duas amigas ficaram se encarando sem saber o que responder. Vó

Augusta ficou parada com os braços cruzados esperando por uma

resposta quando Anja finalmente falou.

- É aquele rapaz do outro dia que estava nos acompanhando até

minha casa, a senhora lembra?

- O Rapaz dos olhos verdes? Perguntou vó Augusta olhando para a

neta. – Por que não me disse antes?

Dina ficou gelada ali mesmo onde estava, não acreditando que Anja

havia dito aquilo. “Como ela pode ter dito isso” pensou.

Tentando parecer o mais natural possível, Dina respondeu a avó. - É

que a senhora sempre fica perguntando quem são os pais dos

garotos que eu encontro, e eu fiquei com medo de responder.

- Não precisava ter medo de falar comigo, querida. - Eu achei aquele

rapaz muito educado e acho que ele seria um bom acompanhante

para você na festa.

Dina e Anja ficaram olhando uma para a outra desconfiadas com a

reação de vó Augusta. Ela simplesmente aceitou que sua neta fosse à

festa acompanhada por um rapaz desconhecido sem ao menos fazer

perguntas sobre a família dele.

- Vamos para o meu quarto Anja, quero lhe mostrar meu vestido.

- Mas eu já sei como é seu vestido. Respondeu Anja. – Nós pegamos

juntas na casa da costureira...

- Mas eu quero lhe mostrar como ele combina com os sapatos.

Interrompeu Dina.

- Dina, eu também seu como são os sapatos, eu que emprestei...

- ANJA... Vamos logo.

- Tá bom, não precisa gritar, xau Dona Augusta.

Enquanto as meninas subiram para o quarto, vó Augusta telefonou

para o padre Santiago.

- Alô, Santiago?

– Sou eu. Respondeu o Padre do outro lado da linha.

Page 223: St. Peter's Village

– É Augusta quem está falando, preciso encontra-lo agora na igreja.

- Estarei esperando na sacristia.

Ela desligou o telefone e subiu para trocar as roupas. Antes de entrar

no seu quarto avisou as meninas que iria sair.

- A senhora vai demorar muito?

- Não sei querida, preciso acertar com o padre os últimos detalhes

das barracas de festa, tem comida pronta na cozinha, não me

esperem.

- Tudo bem. Respondeu Dina enquanto sua avó desaparecia da porta

do seu quarto.

Voltando a conversar com Anja, Dina perguntou à amiga. - Como

você teve coragem de falar para ela que eu iria com Ric?

- Eu fiquei nervosa e achei que ela não iria se lembrar dele, já que o

conheceu ainda bebê. Respondeu Anja enquanto ligava o walkman de

Dina. – Foi tudo que eu consegui pensar.

Dina não estava chateada com a amiga, ela só pensava em como iria

aparecer na festa com o Ric ao seu lado. Mesmo que sua avó não o

reconhecesse, outras pessoas poderiam reconhecê-lo. Eles teriam

que ficar longe das pessoas mais velhas enquanto estivessem na

festa e ainda sim, vigiar caso Ram tentasse alguma coisa.

- Lucaar me encontrou ontem. Falou Anja.

Dina engoliu em seco quando ouviu a amiga pronunciar o nome dele.

– Ele tentou alguma contra você? Perguntou.

- Não, ele queria falar comigo, mas eu não saí de casa, estava de dia

e ele nem tentou se aproximar da porta.

- Ainda bem que ele não tentou nada contra você.

- Eu o mandei ir embora, não quero vê-lo nunca mais.

- Por que eu tenho a ligeira impressão que vamos vê-lo novamente.

Falou Dina suspirando. – Eu preciso encontrar Ric, lá no chafariz e

contar isso a ele.

Page 224: St. Peter's Village

As duas se levantaram e foram para a rua. No caminho elas

avistaram vó Augusta caminhando de vagar, quase na porta da

igreja.

Dina apressadamente puxou Anja para atrás do muro. – Ela não pode

ver você passando sozinha, ela vai perguntar onde eu estou. Falou

Dina à Anja.

- Certo, vou para casa por outro caminho, pela rua de trás. Se por

acaso sua avó for à minha casa e perguntar sobre você, direi que

você foi à costureira levar uma peça de roupa para mim enquanto eu

espero minha mãe voltar.

Dina sorriu para a amiga e assentiu com a cabeça. – Obrigada, se

cuide no caminho de volta, Vou encontrar–me com Ric.

Elas separaram-se e tomaram caminhos opostos. Enquanto isso na

igreja, vó Augusta conversava com padre Santiago na sacristia.

- Ainda bem que Diana vai estar na festa com um rapaz muito

educado. – Assim eu fico despreocupada com a segurança dela.

- Você acha mesmo que o barão vai aprontar alguma coisa durante o

Solstício, Augusta? Perguntou o padre. – Haverá muitas pessoas, até

o prefeito estará na festa.

- Eu espero tudo daquele homem, Santiago. – Acho que você deveria

estar preocupado também.

-Calma Augusta, vamos estar atentos. – Agora me fale sobre esse

rapaz que vai estar com sua neta na festa.

- Eu não o conheço, mas olhei bem nos olhos dele e tenho certeza de

que é um bom rapaz. – Você sabe que eu não me engano com as

pessoas, não sabe?

- Se você acha que ele é um bom rapaz, então é.

- Alguma coisa nos olhos daquele rapaz era familiar. Disse vó

Augusta enquanto limpava os óculos. – Aqueles olhos verdes me

fizeram lembrar alguém.

- Vamos para o pátio ver como andam as montagens das barracas.

O padre e Vó Augusta foram para o pátio da igreja onde outras

senhoras estavam coordenando os homens que estavam pré

montando as barracas para a festa. A igreja estava linda.

Page 225: St. Peter's Village

Enquanto isso, no chafariz...

Dina e Ric se abraçavam intensamente, parecia que eles não se viam

fazia dias. Dina com os braços em volta do pescoço dele e Ric

passando a mão pelos cabelos dela.

- Eu senti muitas saudades de você. Disse Ric a ela. – Cada minuto

que eu fico na floresta longe de você, parece uma eternidade.

- Eu também conto os momentos para estar com você. Ela disse. –

Hoje mesmo quando eu estava olhando para o meu vestido...

Ela parou de falar quando percebeu que Ric desviou o olhar para os

pássaros que estavam nas arvores. – O que houve? Ela perguntou.

- Dina, eu não tenho uma roupa de festa para acompanhar você.

Respondeu Ric. – Todas as roupas que eu tinha, estão em Santo

Pedro, só tenho roupas velhas e surradas que consegui carregar para

floresta.

Os dois ficaram em silêncio por um momento, quando Dina lembrou-

se que havia uma roupa que Ric poderia usar na festa. “O baú da

minha avó”, pensou, “A roupa que meu pai usou na festa do Solstício

podem caber em Ric”.

- Eu acho que posso resolver isso. Falou Dina com entusiasmo. –

Amanhã antes de começar a festa, minha avó vai estar ocupada com

as barracas da igreja, então você vai à minha casa, encontrar comigo

e Anja, nós combinamos de nos arrumar lá.

- Você vai me deixar ver o seu quarto? Perguntou Ric cheio de malicia

no olhar.

Ela sorriu para ele enquanto tentava dizer alguma coisa. Os olhos de

Ric faziam com que ela ficasse sem palavras, o brilho verde malicioso

que ele exibia fazia o tempo parar e nada mais importava.

Infelizmente Dina criou coragem para quebrar o encanto do

momento. - Preciso lhe falar.

- O que foi?

- Lucaar foi à casa de Anja ontem, durante o dia.

- Ele teve coragem de ir lá? – O que ele fez a ela?

Page 226: St. Peter's Village

- Ele não fez nada a ela. Respondeu Dina. – Ela o mandou embora, e

simplesmente ele... Foi.

- Estranho, ele foi embora muito fácil.

Dina segurou o arco do queixo dele com as duas mãos e perguntou

seriamente.

– Ric, me diga a verdade. – O que Lucaar pode querer com Anja?

Ric olhou de volta para ela, pegando as duas mãos e levando ao seu

peito e, com certo receio ele respondeu. – Eu acho que ele quer

raptar Anja e leva-la para Santo Pedro.

Dina puxou as mãos para si e olhou para o lado. “Não”, ela pensou.

Page 227: St. Peter's Village

ALDEIA de SANTO PEDRO

Água

Solstício

21

Acabara de amanhecer na cidade, e tudo estava pronto. Os enfeites

pendurados nas ruas, barracas armadas no pátio da igreja e na praça

central e a madeira empilhada para compor fogueira.

Um pequeno palanque estava montado ao lado da igreja, certamente

ali seria um bom o local para os músicos tocarem. As poucas pessoas

que andavam pelas ruas àquela hora da manhã, eram os homens que

viraram a noite trabalhando para que tudo estivesse pronto logo

cedo. Enquanto isso, o resto da cidade ainda dormia.

Na floresta...

Todo o clã de Ric estava acordado. Seus rostos estavam muito sérios,

e seus corpos tensos. Eles não sabiam o que poderia acontecer a

partir daquele dia. Edie estava pensativo, temia que algo de ruim

Page 228: St. Peter's Village

acontecesse, temia pelos homens que há muito tempo não saiam da

floresta. A possibilidade de algum deles encontrar conhecidos na

cidade era grande. Ele precisava tomar conta daquele grupo.

Edie separou uma quantidade de facas para escondê-las pelo seu

corpo e limpou sua espada. Não era exatamente a espada que ele

gostaria de ter em suas mãos, mas era uma excelente espada.

A espada que ele queria ter, era a mesma espada que Ram havia

tomado para si, que seu pai trouxe do Japão em uma de suas

viagens. A Corta Relâmpago estava escondida em Santo Pedro e Edie

sabia que Ram a levaria para fora e lutaria com ela se fosse preciso e

ele pretendia tomar a espada das mãos de Ram a qualquer custo.

Absorto em seus pensamentos demorou um pouco para perceber que

Ric estava próximo, conversando com Marcos, outro membro do clã.

Eles estavam combinando qual seria o melhor caminho para retornar

a floresta se caso fosse necessária uma fuga.

Edie caminhou para perto do irmão e colocou uma mão no ombro

dele, Ric virou para falar com Edie enquanto Marcos se afastava para

aprontar suas armas. Os dois irmãos se olharam algum tempo e

depois caminharam juntos para o centro do acampamento. Sentaram

num velho tronco de árvore e permaneceram em silêncio. Somente

era possível ouvir o som da mata.

Após algum tempo Ric quebrou o silêncio. – Hoje o dia vai ser curto.

- E a noite vai ser longa. Respondeu Edie.

- Não sabemos o que pode acontecer hoje à noite, Edie. Falou

enquanto olhava para a vegetação à sua volta. – Não sabemos o que

ele será capaz de fazer.

- Eu me pergunto o que você será capaz de fazer. – Não nossa mãe

não iria gostar caso um irmão ferisse o outro.

- Nossa mãe não está aqui, Edie. – E eu não vou pensar duas vezes

se ele machucar Dina.

- Não é somente sobre ela que estamos falando, existem outras

pessoas na cidade que ele pode ferir e eu quero saber até onde você

será capaz de chegar.

- Se for necessário, Edie. Ele parou um instante antes de continuar. –

Se for necessário, eu afundarei minha espada em Ram.

Page 229: St. Peter's Village

- Eu imaginei que você responderia isso. Disse Edie lamentando. – Eu

sabia que um dia vocês dois iriam se matar. – Desde crianças vocês

se odiavam e agora vão ter a chance de tirar suas diferenças.

Ric abaixou a cabeça enquanto ouvia o irmão. Ele sabia que Edie

estava certo, mas não concordou, apenas continuou calado mais

alguns instantes antes de mudar o foco do assunto.

- Você acha que eles têm alguma coisa haver com a morte do médico

da cidade?

- Sinceramente, Ric. Respondeu Edie. – Eu acho em parte que eles

possam ter matado o médico, mas só se o médico ultrapassou o

limite da floresta perto de Santo Pedro.

- Também pensei a mesma coisa. – Não acredito que eles tenham ido

até a cidade matar o médico sem motivo aparente. Concluiu Ric. – O

pai de Anja também sumiu, ela e Dina estão pensando que foram

eles.

- Isso é muito estranho, Ric. – Uma morte e um desaparecimento

recentes, não é o estilo de Ram.

- Mas se não foram eles, foi outra pessoa. Concluiu Ric - Quem está

por trás disso? – Qual é a ligação entre o médico de Dina e o Pai de

Anja?

- A única ligação que eu consigo pensar é que eles eram velhos e

conheciam nossos pais. Conheciam a gente. Respondeu Edie.

- Você se lembra do pai de Anja, como ele era, porque eu não me

lembro dele.

- Eu tenho uma vaga lembrança, acho que ele trabalhou na nossa

antiga casa...

- Que foi derrubada! Interrompeu Ric, lembrando com raiva dos

escombros da casa onde ele viveu quando era criança.

- Sim, isso é mais uma coisa que eu pretendo saber, quem derrubou

nossa casa.

- Ele deve saber.

- Ric, você atribui a culpa de tudo em cima de Ram.

Page 230: St. Peter's Village

- Ele é o mais velho, Edie. – Ele não saia do lado do nosso pai, aposto

que ele sabe muito mais coisas do que você imagina.

Os dois irmãos continuaram conversando quase toda à manhã,

enquanto o clã preparava-se para o que fosse necessário. Muitos

deles partilhavam uma vingança em comum, Ram e Lucaar.

Os dois haviam torturado os rapazes do clã quando eram crianças

motivadas pelo barão, agora eles estavam grandes o suficiente para

devolver a tortura em forma de vingança.

Ric levantou-se e chamou Céu. O cavalo prontamente atendeu o

chamado.

- Aonde você vai? Perguntou Edie curiosamente, mas já sabendo

onde o irmão pretendia ir.

- Vou ver a Diana. – Xau Edie, nos encontraremos durante a festa.

Respondeu enquanto montava no cavalo

- Idiota. – Por que eu ainda pergunto. Reclamou Edie enquanto Ric já

havia sumido na mata.

Na cidade...

Dina aguardava ansiosamente que as horas passassem o mais rápido

possível. Assim sua avó iria para a igreja aprontar as barracas da

festa, deixando a casa livre para que ela recebesse Ric.

- A que horas você vai se arrumar para sair, vó?

- Logo depois do almoço, querida. – Por quê?

- Só curiosidade, Anja vai se arrumar aqui em casa e nós vamos

juntos para festa.

- Aquele seu amigo estará esperando você na lá?

- Sim.

Dina não parava de olhar para o relógio, ainda faltava muito para a

hora combinada com Anja. Ela andava de um lado para o outro no

quarto, ansiosa e inquieta.

Ela temia pela amiga, mas não estava certa se deveria revelar o que

Ric lhe dissera no dia anterior. A possibilidade de Lucaar estar

Page 231: St. Peter's Village

tramando levá-la para Santo Pedro à força a deixava tensa. Então por

fim, ela decidiu que não iria contar nada.

Deitou-se na cama e enquanto esperava, fez uma pequena reflexão

de tudo o que havia acontecido desde a chegada dela até agora.

Lembrou-se do primeiro dia na escola e da primeira consulta com

Paulo, seu psicólogo. Lembrou-se do tombo na rua de paralelepípedo,

quando viu Ric pela primeira vez e o banho no lago juntos.

Lembrou-se da primeira briga que ela teve com Lorena na porta da

escola e Ric quase ter quebrado o braço de Adan. Lembrou também

da primeira vez que andou sobre os escombros da casa desmoronada

e do susto que levou quando leu o nome de Ric numa lápide no

cemitério nos fundos da casa. Ela começou a rir sozinha quando

achou que Ric era um fantasma, mas o sorriso foi breve porque

lembrou que Ram a havia enganado se fazendo passar por Bob.

Em suas lembranças não pôde esquecer-se de Céu e Tobruk, dois

cavalos belíssimos com personalidades completamente diferentes.

Lembrou-se da lenda da água de Santo Pedro que Paulo lhe contara e

da sua morte repentina há poucos dias. Ela começou a chorar com

remorso por não ter ido nem ao funeral nem ao enterro dele.

Enxugando as lágrimas ela lembrou que avó abriu um baú revelando

as peças de roupas que foram usadas pelos seus pais. Agora ela

estava ali, deitada na cama, esperando que Anja emergisse pela

porta para retirá-la da inquietude do clima.

Finalmente vó Augusta despediu-se. Estava arrumada para festa,

mas antes iria à igreja aprontar as barracas. – Estou saindo, querida.

– Você vai ficar bem em casa, sozinha?

- Sim, vó. Respondeu alegremente. – Estou esperando Anja.

Vó Augusta bateu a porta da rua e seguiu em direção à igreja, Dina a

observava pela sua janela. Quando não pode mais acompanhar a

caminha da sua avó que já estava distante, virou os olhos para o

outro lado e seu coração quase parou.

Ela reconheceu, não tão longe, um certo rapaz alto, musculoso com

um sorriso no rosto, então desceu o mais rápido que pode para

encontrá-lo mais próximo a sua casa.

Page 232: St. Peter's Village

Ele ficou parado do outro lado da calçada e Dina fez um sinal com a

mão chamando Ric. Ele atravessou à rua e a encontrou na porta da

casa dela. – Entre. Convidou Dina.

Ric estava sorrindo, mas ficou receoso ao entrar na casa de Dina. –

Você está sozinha em casa. Perguntou.

- Sim, minha avó acabou de sair. – Vamos logo, não vai ficar parado

ai fora tanto tempo, alguém pode ver você entrando e contar para

ela.

Ric respirou fundo e entrou na casa de Dina. Ficou olhando para a

sala, encostado na porta, enquanto a garota tentava puxá-lo para

dentro, mas ele a ignorou enquanto caminhava pela sala. Olhou os

móveis com cuidado, tocou na televisão e ascendeu a luz de um

pequeno abajur ao lado da poltrona de leitura no canto da sala.

- O que houve Ric? Perguntou Dina curiosamente. – Você está bem?

Ele não respondeu, mantilha o olhar fixado nos quadros que a avó de

Dina exibia na sala, então se aproximou de um e alongou o braço

para tocar na moldura dourada. Delicadamente ele alisou a madeira

da moldura com a ponta dos dedos.

- Ric. Dina o chamou novamente.

Quebrando o transe ele olhou para ela, seus olhos brilhavam com

possíveis lágrimas que se controlaram para não saltar deles. – Dina,

esse quadro.

- Você está bem? Perguntou novamente. - O que tem esse quadro?

Ela andou até o quadro e olhou a imagem pintada nele. Era um

quadro velho em pintura a óleo, com traços fortes de um garoto bem

jovem junto a um cavalo preto. Ela nunca havia reparado nos

quadros da casa, muito menos naquele quadro antigo que ficava na

parede mais distante da sala.

- O que tem esse quadro?

- Quem o pintou foi minha mãe. Revelou Ric para surpresa de Dina.

Ela recuou um pouco e sentou-se no sofá Ric sentou ao lado dela e

pegou em sua mão. – Foi minha quem pintou, mas eu não sei como

ele veio parar aqui na sua casa.

- Como você sabe que foi ela quem pintou?

Page 233: St. Peter's Village

Ele levantou e apontou com o dedo para as duas letras no canto da

pintura. C.B. – Está vendo essas iniciais, são da minha mãe. –

Celina Baleares.

Dina olhou para as letras pintadas no quadro e fez um gesto com as

duas mãos mostrando que não sabia como o quadro havia parado na

casa dela. – Eu não imaginava que esse quadro fosse da sua mãe,

Ric. – Também não sei como minha avó o conseguiu. – Quem é o

garoto na tela?

Ric cerrou os lábios antes de responder com certa decepção. – É o

Ram e Tobruk.

- O que, não pode ser. Ela disse incrédula. – Ai já é de mais para

minha cabeça, como pode um quadro que sua mãe pintou estar na

minha casa e com o retrato de Ram nele? – Você viu sua mãe

pintando esse quadro?

- Dina, quando Ram tinha essa idade eu era muito pequeno e se ela

pintou na minha frente, eu não me lembro. – A única lembrança que

eu tenho é que ela gostava muito de pintar.

Dina olhou mais uma vez a imagem de Ram na tela do quadro

enquanto Ric continuava a contar. – Quando fomos para Santo Pedro,

ela disse a meu pai que o quadro havia ficado em nossa antiga casa.

Ele fez uma pausa ao se aproximar de Dina. – Meu pai ficou muito

chateado, porque era da época em que ele trouxe Tobruk da Líbia

para dar de presente para Ram.

Eles ficaram parados olhando o quadro mais alguns instantes antes

de Dina chamar Ric para seu quarto. – Vamos subir.

Os dois subiram juntos as escadas até chegarem ao segundo andar

da casa. Ric ainda tenso continuou cautelosamente seguindo atrás

dela. Quando entraram no quarto de Dina, ela pegou na mão dele e o

levou até a janela onde ela podia ver toda a movimentação da frente

da sua casa. – É por aqui que eu vejo você lá embaixo. Falou sorrindo

tentando deixa-lo mais relaxado.

Ele sorriu de volta e encostou-se no parapeito da janela. Dina estava

ao seu lado e ele segurou em sua cintura puxando-a para perto. Os

dois admiraram juntos toda a paisagem que ficava à frente da janela

do quarto até que Dina sentou na cama.

Page 234: St. Peter's Village

Ric sentou ao lado dela e tocou as mechas do cabelo que

cascateavam até os ombros, depois com a outra mão tocou com o

polegar os traços de todo o queixo dela e os dois começaram a se

beijar.

Dina abraça Ric com desejo e ele retribuía cada caricia que ela fazia

com um pouco mais de vontade. Eles estavam inclinados até que

Dina deixou seu corpo tombar sobre o colchão. Ric acompanhou o

movimento mantendo seu peito sobre o dela. Os dois estavam tão

juntos que pareciam apenas uma pessoa uma pessoa deitada. A

ingenuidade do corpo deles dava lugar a uma paixão ardente que

ambos sentiam um pelo outro. Ric retirou a camisa quando o clima já

estava quente entre eles, então Anja bateu á porta.

Ric e Dina se levantaram rapidamente da cama. - Quem está

batendo? Perguntou Ric. – Será que sua avó voltou?

- Não. Respondeu Dina tentando tranquilizar Ric. – É Anja quem está

lá embaixo.

- Como você sabe?

- Minha avó tem a chave da porta, ela não iria bater. – Não do jeito

que ela está batendo lá embaixo. – JÁ VOU, ESPERE...

Ric ficou rindo sozinho enquanto acompanhava Dina até o andar de

baixo. Quando a porta foi aberta Anja entrou tagarelando através

dela. – Por que demorou tanto? – Você sabe que odeio ficar

esperando na porta e...

Calou-se subitamente quando viu Ric encostado numa das paredes

com braços cruzados. – Estou interrompendo alguma coisa?

Perguntou Anja quando percebeu que ele estava sem camisa.

Ric abriu a boca para responder. - Na verdade...

- Não interrompeu nada, Anja. Respondeu Dina antes que Ric

pudesse completar. – Estávamos esperando você chegar.

Anja levou a mão até a boca tentando esconder um sorriso

debochado. – Tudo bem, eu volto mais tarde...

- NÃO... Gritou Dina. – Não precisa ir embora, não estávamos

fazendo nada, só esperando você chegar.

Page 235: St. Peter's Village

- Tá bom. Falou Anja ainda sorrindo. Então ela pegou as bolsas que

havia trazido de casa e os três subiram para o quarto de Dina.

Ao entrar no quarto, Anja jogou as bolsas no chão e começou abrir o

zíper da maior, lá de dentro puxou seu vestido e o pendurou no

cabideiro junto ao vestido da amiga. Ric estava pouco à vontade, mas

tentou agir o mais natural possível enquanto esperava sentado na

cama de Dina.

- Dina eu vou tomar um banho. Falou Anja. – Minha mãe saiu cedo

para encontrar meu pai na casa da floresta, então preferi tomar

banho aqui.

- Certo. Respondeu Dina. – Quer uma toalha?

- Eu trouxe a minha. Respondeu enquanto trancava a porta do

banheiro.

Mais uma vez eles estavam sozinhos no quarto e Dina sentou-se na

cama junto ao Ric. – Estou curiosa.

- Com o quê?

Ela apertou os lábios, respirou fundo e continuou falando. – Quando

você entrou em casa, agiu de uma forma estranha, o que foi aquilo?

- Dina. Sussurrou o nome dela. – Quando meus pais morreram eu

fugi de Santo Pedro. – Deixei tudo o que me pertencia lá, e vivi na

floresta desde então. Ele parou de falar para olhar seu reflexo no

espelho em cima da penteadeira. – Passei muito tempo na floresta e

quando entrei na sua casa recordei da vida que eu tive. Ele abaixou a

cabeça e continuou falando. – Haviam móveis na minha casa, nas

duas casas em que morei, uma aqui na cidade e a outra na Aldeia. –

Haviam quadros... Eu possuía uma vida, assim como você.

- Ric.

- Eu tinha uma vida normal, como qualquer outro garoto, mas meu

pai com sua estupidez tirou isso de mim. – Eu não achava que

sentiria tanta falta disso enquanto estava na floresta, mas quando

entrei aqui, percebi que sinto falta dessa vida que me foi roubada.

Dina percebeu o quanto Ric sofria por causa da loucura do pai dele,

então o abraçou. Estavam juntos quando Anja abriu a porta do

banheiro.

Page 236: St. Peter's Village

- Ei, eu estou aqui. Interrompendo o casal. – Vocês disseram que eu

não estava atrapalhando.

- E não está. Respondeu Dina ainda olhando para Ric. – Fique aqui,

vou pegar uma coisa para você.

Ela deixou Anja tagarelando com Ric em seu quarto enquanto corria

para o quarto da avó. Arrastou o baú e abriu a fechadura. Procurou o

traje de festa masculino que havia sido usado pelo seu pai e o levou

para Ric.

- Experimente isso.

- O que é isso, Dina? Perguntou Anja.

- É uma roupa para Ric usar na festa.

- Dina? Perguntou Ric. – Onde você arrumou isso?

- Experimente primeiro, depois falamos.

Ric entrou no banheiro com as roupas e a vestiu. Já estava

escurecendo e as meninas começaram a se arrumar também. Quando

finalmente ele saiu do banheiro as duas garotas arregalaram os

olhos, não parecia ser a mesma pessoa que havia entrado no

banheiro minutos antes.

Ele vestia uma calça preta em tecido fino, um pouco mais justa que

as calças que ele costumava usar, combinando uma camisa social

com mangas compridas de linho azul claro, e por cima de tudo um

belíssimo blazer masculino cor grafite. Ric estava lindo.

- E ai, como eu estou?

As duas demoraram alguns segundos para responder e Anja foi a

primeira a falar. – Ric, você está perfeito. Não está, Dina?

- Sim, ficou ótimo. Falou enquanto circulava ao redor dele. – Coube

direitinho em você.

- De quem é essa roupa, Dina? Ele perguntou.

Ela ficou receosa ao responder, mas tomou coragem e revelou que

pertenceram ao pai dela.

- Dina eu não posso usar isso. – São as roupas do seu pai, você

deveria guardar.

Page 237: St. Peter's Village

- Eu prefiro que você as use. Falou limpando uma pequena lágrima

que relutava em sair dos olhos. – Ele não vai usar isso onde ele está.

Ele segurou na mão dela e a fez girar em círculos. – O que está

fazendo? Ela perguntou enquanto ele a girava.

- Está tão preocupada comigo que se esqueceu de você. – Está linda.

Os dois ficaram se olhando enquanto Anja pigarreava para chamar à

atenção. – Lembrem-se que eu continuo aqui.

Os três começaram a rir. Dina ligou o rádio e direcionou a antena

para a janela, terminaram de se arrumar enquanto ouviam as

baladas de sucesso na radio local.

As meninas penteavam seus cabelos, mas Ric parecia estar prestando

mais atenção na bela canção que estava tocando no radio.

- Você gosta? Perguntou Anja.

- Sim. Respondeu Ric. – É uma boa musica, quem está cantando?

- Não acredito que você não conheça.

- ANJA. Falou Dina. – Ele mora na floresta, não existe energia elétrica

lá.

- Oh, me desculpe Ric. – É que eu não me acostumo com esse

detalhe, você vive numa floresta...

- Tudo bem, Anja, sem problemas.

- Nunca me imaginaria vivendo numa floresta...

- ANJA. Gritou Dina novamente.

Ric balançou a cabeça sorrindo em sinal que estava tudo bem com as

observações de Anja. – Fique tranquila, Dina. – Eu vivo na floresta

escondido do mundo, é normal que ela pense assim. Ele aumentou o

volume do radio. – Quem está cantando?

- É um grupo que está fazendo maior sucesso do momento, são

estrangeiros. Respondeu Anja. – Você fala inglês?

- Compreendo um pouco, meu pai nos ensinou quando era vivo.

- Seu pai falava inglês? Perguntou Dina.

- Sim. – E também falava espanhol e libanês.

Page 238: St. Peter's Village

- Você também?

- Não. Respondeu rindo. – Só inglês e apenas compreendo, qual é o

nome dessa música?

Dina olhou para Anja esperando que ela revelasse o nome da música,

mas a loura pensou e não sabia dizer. – Desculpem-me.

- Sem problemas. - É linda. Repetiu Ric. – Você também gosta, Dina?

Ela gostava da musica, mas não era a sua preferida. – Eu gosto de

outra que eles cantam, mas é velha e não me lembro do nome,

quando tocar aviso a vocês.

- Já está na hora. Anunciou Anja. – Vamos

Os três, prontamente arrumados para a festa do Solstício, saíram da

casa de Dina e caminharam cautelosamente para a praça central.

Dina, durante toda à tarde, havia esquecido completamente de Ram.

Agora ela estava tensa e a cada passo que ela dava para frente um

arrepio lhe subia pela espinha à medida que eles se aproximavam.

Já haviam pessoas circulando por toda parte, todas arrumadas

apropriadamente para a ocasião. As barracas completamente

enfeitadas iluminavam a praça principal da pequena cidade. Era

possível encontrar todo o tipo de comida e bebida, mas o atrativo

principal da festa era a banda composta de jovens da cidade vizinha.

Dina, Ric e Anja misturaram-se junto às outras pessoas e tentaram

parecer o mais casual possível, sempre atentos a qualquer

aproximação de alguém mais velho. Ric não poderia ser reconhecido

por ninguém.

Quanto mais tarde ficava mais pessoas chegavam à praça. Dina falou

com sua avó no portão lateral da igreja, onde estava o pátio, e lá

haviam mais barracas vendendo mais comidas, bebidas não alcoólicas

e prendas confeccionadas pelas próprias senhoras da pastoral.

- Está tudo bem, querida? Perguntou vó Augusta. – Quer alguma

coisa para comer?

- Não estou com fome, só vim avisar que já estou na festa com Anja

e...

- Aquele rapaz está com você? – Ainda não me falou o nome.

Dina pensou um pouco e respondeu. – Ricardo.

Page 239: St. Peter's Village

- Tudo bem, divirta-se. Falou enquanto observava o movimento das

barracas do pátio.

Ela retornou o centro da praça para encontrar Ric e Anja, havia

deixado os dois próximos à fogueira ainda apagada. Pelo caminho

esbarrou em uma garota alta com cabelos escuros. – Me desculpe.

A garota havia desequilibrado, mas logo se recompôs, então se virou

para encará-la. – Vê se olha por onde anda. Falou Lorena para

surpresa de Dina que não respondeu à grosseria dela, apenas ficou

olhando com expressão séria.

Lorena estava usando um vestido um azul marinho, justo na cintura,

decorado com pedras brilhantes bem pequenas. Desta vez seu cabelo

não estava preso a um rabo de cavalo irritante, estava solto e muito

bem penteado. Uma fivela discreta um pouco acima da orelha

terminava a combinação.

- Você pode me dar licença, eu quero passar. Pediu Dina

impertinentemente.

- Vá pelo outro lado, estou bem aqui. Respondeu Lorena.

- Um dia vou descobrir, porque você é assim.

- Assim como?

“Insuportável”. Pensou Dina, mas antes que pudesse responder,

Adan, muito bem vestido, estacionou-se ao lado de Lorena. – Algum

problema? Perguntou enquanto a encava.

- Eu não tenho medo de você. Falou para Adan.

- É mesmo? Onde está seu guarda costa agora?

Antes que Dina pudesse responder, reconheceu em meio à multidão

aglomerada uma figura conhecida. Um rapaz alto com cabelos

compridos passeava tranquilamente entre as pessoas. “Lucaar”. Ela

pensou e logo concluiu que Ram também poderia estar perto.

- Não tenho tempo para vocês dois, estúpidos. Falou para Lorena e

Adan enquanto virava as costas para seguir por outro caminho que a

levasse até Ric e Anja.

- Quem ela pensa que é? – Como ela teve coragem de nos chamar de

estúpidos?

Page 240: St. Peter's Village

Adan deu de ombros e puxou Lorena para próximo à urna com os

nomes dos candidatos. Eles estavam mais preocupados com a eleição

do rei e rainha da festa que com Dina.

Ela finalmente chegou ao local onde a amiga estava tranquilamente

conversando com Ric. – Anja eu vi Lucaar andando por ai.

A loura virou-se para Dina quase não acreditando. – Você tem

certeza, meu Deus.

- Se Lucaar está por aqui, então Ram também está. Disse Ric.

Os três começaram a caminhar entre as pessoas, tentando achar

Ram ou quem quer que fosse de seu clã. Ric havia deixado sua

espada duas ruas depois da praça, mas não estava desarmado,

estava com facas escondidas por baixo do blazer.

A banda começou a tocar músicas românticas e cada casal que

estava na festa se aproximou para dançar fazendo com que Anja se

separasse de Ric e Dina, ela não estava mais conseguindo vê-los, não

com tanta gente tão próxima.

Anja ficou parada onde estava no meio dos casais agarrados se

movimentando em ritmo romântico. Ela estava com medo que Lucaar

pudesse fazer alguma coisa contra ela. Estava atenta a qualquer

pessoa que se aproximasse de forma estranha. Então sentiu uma

mão em torno de sua cintura, leve o suficiente e firme o suficiente

para que ela não pudesse se afastar.

- Você... Ela sussurrou.

Lucaar estava em sua frente olhando-a diretamente. Ele estava serio,

mas não aparentava hostilidade em seu olhar. Ela engoliu em seco e

quando pensou em gritar, ele pousou dedicadamente o dedo

indicador sobre os lábios dela, impedindo que soltasse qualquer

palavra.

- Lembra-se que eu pedi que guardasse uma dança para mim? Ele

perguntou enquanto direcionava a outra mão entrelaçando seus

dedos nos dela.

Puxou-a para perto dele e começaram a se movimentar. Anja estava

dançando com Lucaar ao som romântico da banda, ela não tentou

falar mais nada. Calada, apenas acompanhou a dança.

- O que você quer? Ela perguntou.

Page 241: St. Peter's Village

- No momento, quero terminar esta dança com você. Respondeu

Lucaar.

- E depois?

- Só quero pensar nesse momento. – Que tolo perderia a

oportunidade de dançar com um anjo.

A banda continuou tocando...

Dina e Ric não conseguiam achar Anja. Ric segurava forte na mão de

Dina para não perdê-la também. Estava escuro e a única iluminação

era das lanternas artesanais que enfeitavam a festa.

- Onde ela está? Perguntou Dina, aflita.

- Calma, vamos achá-la. – Edie está por aqui, ele está observando

tudo.

Num canto escuro qualquer da festa...

Edie beijava Carla ardentemente, os dois encostados no muro. Ele a

apertava entre seu corpo e o cimento, ela com as duas pernas

entrelaçadas na cintura dele. Os dois pareciam não se importar com o

que se passava na festa, nem a música romântica fazia com que Edie

soltasse as mãos das coxas de Carla. – Temos que voltar para festa,

eles podem sentir nossa falta. Ela disse.

- Só mais um pouco. Ele falou enquanto passava os lábios pelo

pescoço dela. – Eu gosto quando você fica nessa posição.

Ela abriu as pernas separando os dois e ficou em pé na frente dele

enquanto fechava alguns botões que foram abertos durante os

abraços. – Está na hora de nós voltarmos.

- Tá bom. Falou Edie mal humorado. – Vamos voltar, mas antes eu

quero mais um. Ele segurou-a pelos cabelos e a puxou aproximando

suas bocas para um ultimo beijo.

A banda ainda soava lindas músicas românticas, mas Ric junto com

Dina perambulavam entre os casais à procura de Anja. Logo perto da

fogueira, ainda apagada, Anja continuava dançando com Lucaar e

Dina conseguiu avistá-los.

- Achei ela. Falou com Ric.

- Onde?

Page 242: St. Peter's Village

- Ali, daquele lado da fogueira. – Ela está com Lucaar, meu Deus.

Ric soltou a mão de Dina e seguiu apressadamente para a direção em

que Anja estava. Lucaar havia percebido e se antecipou, beijou a mão

de Anja e saiu andando calmamente dentre as pessoas.

Dina ficou sozinha, parada no mesmo lugar em que Ric havia soltado

sua mão quando a banda parou de tocar dando espaço para o

prefeito da cidade subir ao microfone e pedir atenção.

Foi que ai que todas as pessoas da cidade pareciam querer se

aproximar do palanque onde o prefeito estava. Todo mundo se

apertando e Dina não sabia nem onde Anja estava e nem onde Ric

estava, ela mal conseguia se mexer no meio daquela pequena

multidão que se aglomerou de repente à sua volta.

Então o prefeito começou a falar...

“Boa noite a todos, eu espero que estejam gostando do Solstício de

1988. Esta noite, escolheremos o rei e a rainha da festa, mas antes

falaremos um pouco do passado...”.

Enquanto o prefeito falava, Dina sentiu a presença de alguém

próximo, ela virou a cabeça devagar e percebeu que Ram estava a

dois corpos dela. Então ela começou a andar desconfortavelmente

entre as pessoas, Ram a seguia da mesma forma.

“Há muito tempo atrás, nossos moradores mais ilustres da cidade

partiram busca da água milagrosa...”.

Dina fugia de Ram, mas parecia impossível tentar qualquer passo

mais rápido no meio da multidão. Empurrões e cotoveladas não

faziam efeito, então ela decidiu andar abaixada na altura da canela

das pessoas enquanto ouviam atentamente o prefeito falar. Ram

ficou confuso, mas logo conseguiu encontrar por onde Dina havia

passado.

Ric já estava com Anja e os dois olhavam para todos os lados

procurando por onde Dina poderia estar. Ela continuava abaixada,

quase engatinhando na tentativa de confundir Ram.

Após ter falado sobre toda a historia da lenda da água milagrosa, o

prefeito chamou sua secretaria e pediu que ela trouxesse a urna com

os nomes dos candidatos. A urna foi aberta e os nomes foram

anotados em papeis separadamente para que fossem distribuídos aos

Page 243: St. Peter's Village

jurados. Enquanto os jurados conversavam entre si o prefeito tornou

a falar novamente, desta vez sobre a família de Ric.

“Meus amigos, o Solstício também relembra à morte de uma família

muito estimada aqui na cidade. É de conhecimento de todos que os

Baleares tiveram suas vidas abreviadas por uma fatalidade...”.

Naquele momento o qual o prefeito falava Ram, Edie e Ric pararam

instantaneamente por um momento para ouvir as condolências do

prefeito. Foi a oportunidade para Dina distanciar-se ainda mais de

Ram. Ela levantou-se por uns minutos e esticou o pescoço para ver

onde ele estava, mas não conseguiu encontrá-lo. Procurou em volta e

pôde reconhecer Ric e Anja, mas os dois estavam longe o suficiente

para ela demorar algum tempo para aproximar-se deles. – RIC. Ela

gritou chamando por ele.

- DINA. Ele respondeu de volta enquanto tentava ir de encontro a ela.

Nesse meio tempo Ram pode ver a localização de Dina e retomou a

perseguição. Edie identificou Ram de longe e começou abrir caminho

agressivamente entre as pessoas.

Logo que o prefeito acabou de fazer as condolências lembrando a

família Baleares que morreu soterrada em sua própria casa, chamou

os jurados para anunciar o novo rei e rainha da festa.

“Nosso júri já tem o resultado da votação... Nós já temos o rei e a

rainha do Solstício de 1988. Vou abrir o envelope”.

Dina já estava muito próxima à fogueira da festa que iria ser acesa

um pouco antes da meia noite. Pessoas haviam colocado bilhetes

entre a madeira com pedidos e agradecimentos, era uma tradição

local.

“O rei a rainha da festa são... Esperem eu abrir o envelope”.

Dina estava ao lado da fogueira onde havia mais espaço para andar

livremente, já que as pessoas estavam amontoadas mais próximas

do palanque onde estava o prefeito. Ram conseguira achar o local em

que ela estava e Ric, com mais sorte, estava muito mais próximo.

Edie tentava freneticamente correr para perto de Ram.

O prefeito abriu o envelope e retirou o papel com os nomes.

“E o rei a rainha da festa do Solstício de 1988 são...

Lorena Veiga e Adan Àvila... Palmas para eles”.

Page 244: St. Peter's Village

Todos bateram palmas para o novo casal enquanto Lorena e Adan

subiam no palanque para serem coroados. Dina circulava a fogueira

fugindo de Ram quando tropeçou em uma lata de liquido inflamável.

A lata vazia estava bem ao lado da fogueira, mas ela ignorou. – Ric,

me ajude. Ela gritou.

Ram estava próximo à fogueira e levantou o braço como se fizesse

um tipo de sinal para alguém. Ric conseguiu sair do meio da multidão

e estava correndo na direção de Dina. Lorena e Adan haviam sido

coroados rei e rainha da festa. Vó Augusta batia palmas de longe ao

lado do padre tranquilamente sem perceber que Dina estava em

perigo.

Ram viu que Dina havia corrido pra trás da fogueira e fez outro sinal

com o braço. Ric conseguiu finalmente chegar ao centro da praça

onde estava a fogueira e Dina atrás dela. Todo o resto das pessoas

da cidade estavam felizes, quando um som estrondoso fez com que

toda a atenção em Lorena e Adan fosse dispersa.

Uma explosão de dentro da fogueira fez com que a madeira usada

para sua construção saltasse contra tudo o que estava ao seu redor.

Um corre-corre tremendo, e a pequena multidão da cidade não sabia

o que fazer. Pessoas foram atingidas pelos estilhaços da madeira e

ficaram feridas. Ric havia caído por causa da explosão, mas levantou-

se apressadamente. Um enorme pedaço de madeira queimada

acertou Dina por trás da cabeça fazendo com que ela desmaiasse.

- DINAAAAAA. Gritou Ric.

EPíLOGO

Na manha seguinte, as pessoas ainda se perguntavam se alguém

sabia responder por que a fogueira havia explodido misteriosamente.

Padre Santiago tentava consolar vó Augusta, mas ela parecia estar

inconsolável.

Lorena e Adan não mostraram qualquer pesar pelo que havia

acontecido na festa da cidade. O prefeito foi ferido, mas nada que

pudesse interferir em sua saúde.

Page 245: St. Peter's Village

Quando a policia apareceu, quase meio dia, não foi para averiguar a

ocorrência da noite passada. Eles estavam ali para chamar alguém

que pudesse reconhecer dois corpos encontrados numa velha casa na

floresta.

- Oh meu Deus. Falou vó Augusta. – O senhor tem certeza policial?

- Sim senhora, foram encontrados mortos, os dois corpos juntos.

- Como eles morreram, policial?

- Ao que parece... Alguém cortou a garganta deles. – Podemos ir

agora para fazer o reconhecimento?

- Sim, vou pegar minha bolsa e avisar ao padre Santiago que os pais

de Anja foram assassinados.

Continue acompanhando a história no segundo livro “Refúgio”

da

Trilogia Aldeia de Santo Pedro

Danielle Sampol