saude_cidadania_volume02

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Planejamento em Saúde Planejamento em Saúde Francisco Bernardini Tancredi Susana Rosa Lopez Barrios José Henrique Germann Ferreira Francisco Bernardini Tancredi Susana Rosa Lopez Barrios José Henrique Germann Ferreira Para gestores municipais de serviços de saúde

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  • Planejamentoem SadePlanejamentoem Sade

    Francisco Bernardini Tancredi

    Susana Rosa Lopez Barrios

    Jos Henrique Germann Ferreira

    Francisco Bernardini Tancredi

    Susana Rosa Lopez Barrios

    Jos Henrique Germann Ferreira

    Para gestores municipais de servios de sade

  • PLANEJAMENTO EM SADE

  • Francisco Bernadini TancrediSusana Rosa Lopez BarriosJos Henrique Germann Ferreira

    PLANEJAMENTO EM SADE

    PARA GESTORES MUNICIPAIS DE SERVIOS DE SADE

    I N S T I T U T O P A R A O D E S E N V O L V I M E N T O D A S A D E I D SN C L E O D E A S S I S T N C I A M D I C O - H O S P I T A L A R N A M H / F S P U S P

    B A N C O I T A

    SO PAULO1998

  • Copyright 1998 by Faculdade de Sade Pblica da Universidade de So Paulo

    Coordenao do ProjetoGonzalo Vecina Neto, Valria Terra, Raul Cutait

    e Luiz Eduardo C. Junqueira Machado

    Produo editorial e grfica

    Editora Fundao Peirpolis Ltda.Rua Girassol, 128 Vila Madalena

    So Paulo SP 05433-000Tel: (011) 816-0699 e Fax: (011) 816-6718

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    Projeto grfico e editorao eletrnicaAGWM Artes Grficas

    Tiragem3.000 exemplares

    autorizada a reproduo total ou parcial deste livro, desde que citada a fonte.

    Distribuio gratuitaIDS Rua Barata Ribeiro, 483 6 andar

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    Banco Ita PROAC Programa de Apoio ComunitrioRua Boa Vista, 176 2 andar Corpo I

    01014-919 So Paulo SPFax: (011) 237-2109

    Tancredi, Francisco BernadiniPlanejamento em Sade, volume 2 / Francisco Bernadini Tancredi, Susana

    Rosa Lopez Barrios, Jos Henrique Germann Ferreira. So Paulo : Faculdade deSade Pblica da Universidade de So Paulo, 1998. (Srie Sade & Cidadania)

    Realizadores: Instituto para o Desenvolvimento da Sade IDS, Ncleo deAssistncia Mdico-Hospitalar NAMH/FSP USP, Banco Ita.

    1. Assistncia mdica Brasil 2. Municpios Governo e administrao Brasil 3. Poltica mdica Brasil 4. Sade Pblica Brasil 5. Sade pblica Planejamento Brasil I. Barrios, Susana Rosa Lopez. II. Ferreira, Jos HenriqueGermann. III. Ttulo. IV. Srie.

    984444 CDD362.1068

    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)(Cmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

    ndices para catlogo sistemtico:

    1. Assistncia mdica : Servios de sade : Bem-estar social 362.10682. Planejamento de sade : Servios de sade : Bem-estar social 362.1068

  • INSTITUTO PARA O DESENVOLVIMENTODA SADE

    Presidente: Prof. Dr. Raul Cutait

    FACULDADE DE SADE PBLICA DAUNIVERSIDADE DE SO PAULO FSP/USP

    Diretor: Prof. Dr. Jair Lcio Ferreira

    NCLEO DE ASSISTNCIAMDICO-HOSPITALAR NAMH/FSP

    Coordenador: Prof. Gonzalo Vecina Neto

    BANCO ITA S.A.

    Diretor Presidente: Dr. Roberto Egydio Setubal

    REALIZAO

  • CONSELHO NACIONAL DE SECRETRIOSMUNICIPAIS DE SADE

    MINISTRIO DA SADE

    ORGANIZAO PAN-AMERICANA DA SADE

    FUNDO DAS NAES UNIDAS PARA A INFNCIA UNICEF

    APOIO

  • Agradecemos s equipes das secretarias da Sade doscinco municpios que participaram dos mdulos detreinamento, que, atravs da troca de experincias e su-gestes incorporadas neste manual , enriqueceramsobremaneira o seu contedo.

    DIADEMAAgrimeron Cavalcante da CostaFelomena Elizete FernandesMarco Colli

    FORTALEZAMaria Helena Alencar de AndradeRegina Celia de Alencar Ribeiro

    VOLTA REDONDAAuxiliadora Tavares VieiraCrelzia Gratival de AguiarElizete Pacheco de SouzaMaria Cristina Guedes BayloMarina Ftima de Oliveira MarinhoPaula Hrica Rocha de Azevedo

    FOZ DO IGUAUAparecida Maria SteinmacherDilson Paulo AlvesLuiz de OliveiraMrcia Regina BittencourtMarli de Souza BernardesMarli TeixeiraRomildo Mousinho FerreiraSadi Buzanelo

    BETIMJos Luiz Rodrigues

    AGRADECIMENTOS

  • ste conjunto de manuais para o projeto Sade &Cidadania se insere no trabalho iniciado h cinco anospelo Banco Ita com a criao do Programa de ApoioComunitrio (PROAC). Voltado desde a origem paraprogramas de educao bsica e sade, o PROAC temdesenvolvido dezenas de projetos de sucesso. Um dosmelhores exemplos o Razes e Asas, elaborado emparceria com o Fundo das Naes Unidas para a Infncia(Unicef) e o Centro de Estudos e Pesquisas em Edu-cao, Cultura e Ao Comunitria (Cenpec). Com ini-ciativas como essa, o Programa de Apoio Comunitriotem recebido diversas manifestaes de reconhecimentoe premiaes.

    Os resultados positivos obtidos com os programas jimplantados levam agora o Ita a viabilizar este projetodirigido s necessidades detectadas na rea de sade. Oprojeto Sade & Cidadania resulta da honrosa parceriado Banco Ita, do Instituto para o Desenvolvimento daSade (IDS) e do Ncleo de Assistncia Mdico-Hospitalarda Faculdade de Sade Pblica da Universidade de SoPaulo (NAMH/FSP USP). A meta agora divulgar paraos municpios brasileiros o conhecimento e as expe-rincias acumuladas por especialistas na rea da sadepblica, que participaram da elaborao destes manuais,bem como os resultados advindos da sua utilizao nafase de teste em cinco municpios. Por meio deles pre-tende-se aperfeioar a atuao dos gestores municipais

    PREFCIO

    E

  • de servios de sade para a melhoria da qualidade devida das comunidades a partir de noes bsicas degesto da sade. Nos manuais, os gestores da sadeencontraro fundamentos sobre planejamento emsade, qualidade na gesto local de sade pblica, vigi-lncia sanitria, gesto financeira, gerenciamento deequipamentos hospitalares, gesto de medicamentos emateriais, entre outros.

    O trabalho de divulgao do que pode ser conside-rado um dos pilares da sade pblica a viabilizaoda otimizao dos recursos disponveis com o objetivode melhorar a qualidade do atendimento prestado populao contar com o apoio da rede de agnciasdo Ita que, sempre sintonizadas com as necessidadeslocais, podero ajudar a divulgar o material elaboradopelo projeto.

    A inteno deste programa, vale frisar, ser sempreaumentar a eficcia da ao dos gestores municipais dasade quanto s melhores maneiras de aproveitar aomximo todos os recursos que estiverem efetivamenteao seu alcance, por mais limitados que possam parecer.Os beneficirios deste trabalho sero as populaes dascidades mais carentes, e o Brasil em ltima anlise, pormeio da disseminao de tcnicas e experincias deltima gerao.

    O Banco Ita, no seu papel de empresa-cidad esocialmente responsvel, acredita que assim estar con-tribuindo para a melhoria da qualidade dos servios desade e para a construo de uma sociedade mais justa.

    ROBERTO EGYDIO SETUBALDiretor Presidente

    X

    Banco Ita S.A.

  • setor da sade no Brasil vive hoje ummomento peculiar. O Sistema nico de Sade (SUS)constitui um moderno modelo de organizao dosservios de sade que tem como uma de suas caracte-rsticas primordiais valorizar o nvel municipal. Contudo,apesar de seu alcance social, no tem sido possvelimplant-lo da maneira desejada, em decorrncia desrias dificuldades relacionadas tanto com seu finan-ciamento quanto com a eficincia administrativa desua operao. Essa situao fez com que fossemampliados, nos ltimos anos, os debates sobre oaumento do financiamento do setor pblico da sadee a melhor utilizao dos limitados recursos existentes.Sem dvida, as alternativas passam por novas pro-postas de modelos de gesto aplicveis ao setor e quepretendem redundar, em ltima anlise, em menosdesperdcio e melhoria da qualidade dos serviosoferecidos.

    Os Manuais para Gestores Municipais de Servio deSade foram elaborados com a finalidade de servircomo ferramenta para a modernizao das prticasadministrativas e gerenciais do SUS, em especial paramunicpios. Redigidos por profissionais experientes,foram posteriormente avaliados em programas detreinamento oferecidos pela Faculdade de Sade Pbli-ca da USP aos participantes das cidades-piloto.

    Este material colocado agora disposio dosresponsveis pelos servios de sade em nvel municipal.

    APRESENTAO

    O

  • Daqui para a frente, esforos conjuntos devero ser mul-tiplicados para que os municpios interessados tenhamacesso no apenas aos manuais, mas tambm suametodologia de implantao. Mais ainda, a proposta que os resultados deste projeto possam ser avaliados demaneira a, no futuro, nortear decises tcnicas e polticasrelativas ao SUS.

    A criao destes manuais faz parte do projeto Sade& Cidadania e fruto dos esforos de trs instituiesque tm em comum a crena de que a melhoria dascondies sociais do pas passa pela participao ativada sociedade civil: o Instituto para o Desenvolvimentoda Sade (IDS), que uma organizao no-governa-mental, de carter apartidrio, e que congrega indivduosno s da rea da sade, mas tambm ligados a outrasatividades, que se propem a dar sua contribuio paraa sade; o Ncleo de Assistncia Mdico-Hospitalar daFaculdade de Sade Pblica da Universidade de SoPaulo (NAMH/FSP USP), que conta com a participaode experiente grupo da academia ligado gesto eadministrao; e o Banco Ita, que, ao acreditar que avocao social faz parte da vocao empresarial, apiaprogramas de ampla repercusso social. O apoio ofere-cido pelo Conselho Nacional de Secretrios Municipaisde Sade (CONASEMS), pelo Ministrio da Sade e pelaOrganizao Pan-Americana da Sade (OPAS) refora apossibilidade de xito dessa proposta.

    O sentimento dos que at o momento participaramdeste projeto de entusiasmo, acoplado satisfaoprofissional e ao esprito de participao social, num leg-timo exerccio de cidadania. A todos os nossos profundosagradecimentos, extensivos Editora Fundao Peirpolis,que se mostrou uma digna parceira deste projeto.

    RAUL CUTAITPresidente

    XII

    Instituto para oDesenvolvimento da Sade

  • UM POUCO DE HISTRIAAs duas ltimas dcadas foram marcadas por inten-

    sas transformaes no sistema de sade brasileiro, intima-mente relacionadas com as mudanas ocorridas no mbitopoltico-institucional. Simultaneamente ao processo deredemocratizao iniciado nos anos 80, o pas passou porgrave crise na rea econmico-financeira.

    No incio da dcada de 80, procurou-se consolidar oprocesso de expanso da cobertura assistencial iniciadona segunda metade dos anos 70, em atendimento sproposies formuladas pela OMS na Conferncia deAlma-Ata (1978), que preconizava Sade para Todos noAno 2000, principalmente por meio da Ateno Primria Sade.

    Nessa mesma poca, comea o Movimento da Refor-ma Sanitria Brasileira, constitudo inicialmente por umaparcela da intelectualidade universitria e dos profis-sionais da rea da sade. Posteriormente, incorporaram-se ao movimento outros segmentos da sociedade, comocentrais sindicais, movimentos populares de sade ealguns parlamentares.

    As proposies desse movimento, iniciado em plenoregime autoritrio da ditadura militar, eram dirigidasbasicamente construo de uma nova poltica desade efetivamente democrtica, considerando adescentralizao, universalizao e unificao comoelementos essenciais para a reforma do setor.

    Vrias foram as propostas de implantao de umarede de servios voltada para a ateno primria sade,

    NOTAS EXPLICATIVAS

  • XIVcom hierarquizao, descentralizao e universalizao,iniciando-se j a partir do Programa de Interiorizao dasAes de Sade e Saneamento (PIASS), em 1976. Em1980, foi criado o Programa Nacional de Servios Bsicosde Sade (PREV-SADE) que, na realidade, nunca saiudo papel , logo seguido pelo plano do ConselhoNacional de Administrao da Sade Previdenciria(CONASP), em 1982, a partir do qual foi implementada apoltica de Aes Integradas de Sade (AIS), em 1983.Estas constituram uma estratgia de extrema importn-cia para o processo de descentralizao da sade.

    A 8 Conferncia Nacional da Sade, realizada emmaro de 1986, considerada um marco histrico, con-sagra os princpios preconizados pelo Movimento daReforma Sanitria.

    Em 1987 implementado o Sistema Unificado eDescentralizado de Sade (SUDS), como uma consoli-dao das AIS, que adota como diretrizes a universaliza-o e a eqidade no acesso aos servios, a integralidadedos cuidados, a regionalizao dos servios de sade eimplementao de distritos sanitrios, a descentraliza-o das aes de sade, o desenvolvimento de institui-es colegiadas gestoras e o desenvolvimento de umapoltica de recursos humanos.

    O captulo dedicado sade na nova ConstituioFederal, promulgada em outubro de 1988, retrata oresultado de todo o processo desenvolvido ao longodessas duas dcadas, criando o Sistema nico de Sade(SUS) e determinando que a sade direito de todos edever do Estado (art. 196).

    Entre outros, a Constituio prev o acesso universale igualitrio s aes e servios de sade, com regionali-zao e hierarquizao, descentralizao com direonica em cada esfera de governo, participao da comu-nidade e atendimento integral, com prioridade para asatividades preventivas, sem prejuzo dos servios assis-tenciais. A Lei n 8.080, promulgada em 1990, opera-cionaliza as disposies constitucionais. So atribuiesdo SUS em seus trs nveis de governo, alm de outras,ordenar a formao de recursos humanos na rea desade (CF, art. 200, inciso III).

    No entanto, um conjunto de fatores como problemasligados ao financiamento, ao clientelismo, mudana dopadro epidemiolgico e demogrfico da populao, aos

  • crescentes custos do processo de ateno, ao corpora-tivismo dos profissionais da sade, entre muitos outros tem se constitudo em obstculos expressivos paraavanos maiores e mais consistentes. Tudo isso redundaem uma sensao de inviabilidade do SUS, apesar de ocaminho ser unanimemente considerado como correto.

    Existe um consenso nacional de que uma polticasubstantiva de descentralizao tendo como foco omunicpio, que venha acompanhada de abertura deespao para o controle social e a montagem de um sis-tema de informao que permita ao Estado exercer seupapel regulatrio, em particular para gerar aes comcapacidade de discriminao positiva, o caminho parasuperar as causas que colocam o SUS em xeque.

    Assim, necessrio desenhar estratgias para superaro desafio da transformao a ser realizada, e uma delasdiz respeito ao gerenciamento do setor da sade. pre-ciso criar um novo espao para a gerncia, comprometi-da com o aumento da eficincia do sistema e com a ge-rao de eqidade.

    Dessa forma, entre outras aes, torna-se imprescin-dvel repensar o tipo de gerente de sade adequado paraessa nova realidade e como deve ser a sua formao.

    Esse novo profissional deve dominar uma gama deconhecimentos e habilidades das reas de sade e deadministrao, assim como ter uma viso geral do con-texto em que elas esto inseridas e um forte compro-misso social.

    Sob essa lgica, deve-se pensar tambm na necessi-dade de as organizaes de sade (tanto pblicas comoprivadas) adaptarem-se a um mercado que vem se tor-nando mais competitivo e s necessidades de um pasem transformao, em que a noo de cidadania vem seampliando dia a dia.

    Nesse contexto, as organizaes de sade e as pessoasque nelas trabalham precisam desenvolver uma dinmi-ca de aprendizagem e inovao, cujo primeiro passodeve ser a capacidade crescente de adaptao smudanas observadas no mundo atual. Devem-se procu-rar os conhecimentos e habilidades necessrios e a me-lhor maneira de transmiti-los para formar esse novoprofissional, ajustado realidade atual e preparado paraacompanhar as transformaes futuras.

    esse um dos grandes desafios a serem enfrentados.

    XV

  • XVIO PROJETO SADE & CIDADANIAA partir da constatao da necessidade de formar

    gerentes para o nvel municipal, um conjunto de institui-es articulou-se para desenvolver uma estratgia quepudesse dar uma resposta ao desafio.

    Assim, o Instituto para o Desenvolvimento da Sade(IDS) e o Ncleo de Assistncia Mdico-Hospitalar daFaculdade de Sade Pblica da Universidade de SoPaulo (NAMH/FSP USP), com o apoio poltico do Con-selho Nacional de Secretrios Municipais de Sade(CONASEMS), da Organizao Pan-Americana da Sade(OPAS) e do Ministrio da Sade, com o apoio finan-ceiro do Banco Ita, desenvolveram este projeto com osseguintes objetivos:

    Apoiar, com fundamento em aes, a implantaodo Sistema nico de Sade (SUS).

    Criar uma metodologia e organizar um conjunto deconhecimentos que possam ser aplicados ampla-mente no desenvolvimento de capacitao geren-cial em gesto de aes e servios de sade presta-dos em municpios com mais de 50.000 habitantes.

    Colocar disposio dos municpios brasileiros umconjunto de manuais dedicados gesto local deservios de sade, tanto em forma de livros como emmeio magntico e ainda por intermdio da Internet.

    Gerar a formao de massa crtica de recursoshumanos com capacidade para interpretar, analisare promover mudanas organizacionais em favor deuma maior eficincia do setor da sade.

    Mediante a organizao e consolidao de um con-junto de conhecimentos j disponveis, o projeto desen-volveu uma srie de doze manuais que privilegia a reagerencial e que, alm de reunir os conhecimentos exis-tentes de cada tema especfico, articula as experinciasprticas de seus autores, gerando um produto finalcapaz de oferecer ao usurio um caminho para seuaprendizado de forma clara e acessvel. Portanto, no setrata de um simples agrupamento de manuais e sim deum projeto educativo e de capacitao em servio notradicional, destinado a criar e fortalecer habilidades econhecimentos gerenciais nos funcionrios que ocupampostos de responsabilidade administrativa nos servioslocais de sade.

  • XVIIOs manuais que compem o projeto e seus respecti-

    vos autores so os seguintes:

    1. Distritos Sanitrios: Concepo e Organizao Eurivaldo Sampaio de Almeida, Cludio GastoJunqueira de Castro e Carlos Alberto Lisboa.

    2. Planejamento em Sade Francisco BernardiniTancredi, Susana Rosa Lopez Barrios e JosHenrique Germann Ferreira.

    3. Qualidade na Gesto Local de Servios e Aes deSade Ana Maria Malik e Laura Maria CesarSchiesari.

    4. Gesto da Mudana Organizacional MarcosKisil. Colaborao de Tnia Regina G. B. Pupo.

    5. Auditoria, Controle e Programao de Servios deSade Gilson Caleman, Marizlia Leo Moreira eMaria Ceclia Sanchez.

    6. Sistemas de Informao em Sade para Munic-pios Andr de Oliveira Carvalho e MariaBernadete de Paula Eduardo.

    7. Vigilncia em Sade Pblica Eliseu Alves Waldman. Colaborao de Tereza Etsuko da CostaRosa.

    8. Vigilncia Sanitria Maria Bernadete de PaulaEduardo. Colaborao de Isaura Cristina Soares deMiranda.

    9. Gesto de Recursos Humanos Ana Maria Malik eJos Carlos da Silva.

    10. Gesto de Recursos Financeiros Bernard FranoisCouttolenc e Paola Zucchi.

    11. Gerenciamento de Manuteno de EquipamentosHospitalares Saide Jorge Calil e Marilda SolonTeixeira.

    12. Gesto de Recursos Materiais e Medicamentos Gonzalo Vecina Neto e Wilson Reinhardt Filho.

    A METODOLOGIA UTILIZADAAps a elaborao da primeira verso dos manuais,

    realizaram-se trs mdulos de treinamento com os cincomunicpios indicados pelo CONASEMS (Diadema-SP,Betim-MG, Foz do Iguau-PR, Fortaleza-CE e Volta Redon-da-RJ) com o objetivo de test-los e exp-los crtica.

  • XVIIIA proposta de aplicao desenvolveu-se da seguinte

    forma:

    Mdulo 1: apresentao pelo docente do materialproduzido e discusses em sala de aula, com aproposio de sua aplicao ao retornar para ocampo.

    Mdulo 2 (seis semanas aps o primeiro): apresen-tao pelos alunos das dificuldades encontradas nocampo e transformao da sala de aula em umespao de consultoria e troca de experincias.

    Mdulo 3 (seis semanas aps o segundo): avaliaodos avanos obtidos, das limitaes, dos contedosdos manuais e do processo como um todo.

    Cada mdulo de treinamento dos manuais 1, 2, 3 e 4prolongou-se por quatro dias, contando com cerca de cin-co participantes de cada municpio, de preferncia do n-vel poltico-administrativo. Para os manuais operacionais(de 5 a 12), os treinamentos desenvolveram-se em mdu-los de trs dias, com trs participantes por municpio.

    Na avaliao final, ficou claro que todo o processo foiextremamente positivo tanto para os participantes comopara os autores, que puderam enriquecer os contedosdos manuais mediante a troca de experincias e a cola-borao dos mais de cem profissionais que participaramdos seminrios.

    Tambm ficou evidenciado que, para o desenvolvi-mento futuro do projeto, o primeiro mdulo (didtico) dispensvel para o processo de aprendizado. Entretan-to, fundamental um momento de esclarecimento dedvidas e de proposio de solues para as dificul-dades encontradas, principalmente se isso ocorrer emum espao que permita troca de idias com outras pes-soas com experincias semelhantes.

    O projeto Sade & Cidadania prope que, paralela-mente ao uso dos manuais, seja utilizado o projetoGERUS Desenvolvimento Gerencial de Unidades Bsi-cas de Sade, para a capacitao de gerentes deunidades de baixa complexidade. O GERUS um proje-to desenvolvido conjuntamente pelo Ministrio daSade e pela Organizao Pan-Americana da Sade quepretende institucionalizar mudanas nos padres deorganizao dos servios, com o objetivo de adequ-los

  • XIX realidade de cada localidade ou regio, e j est emuso em vrios municpios do pas.

    A IMPLEMENTAO DO PROJETOO material resultante do processo relatado pode

    ser utilizado diretamente pelas secretarias municipais daSade para a capacitao dos profissionais que ocupampostos de responsabilidade administrativa.

    Eventualmente, a simples leitura dos manuais e a dis-cusso entre seus pares podero ser consideradas pelosgerentes como insuficientes para um melhor desempenhodas atividades descritas, ou talvez haja a necessidade deum maior aprofundamento das questes levantadas.Nesse caso, o gestor municipal poder solicitar aoNcleo de Sade Pblica ligado universidade maisprxima de seu municpio ou, se houver, escola de for-mao da secretaria da Sade de seu Estado, a realiza-o de um perodo de treinamento (nos moldes dodescrito no mdulo 2), tendo como base o material ofe-recido pelo projeto Sade & Cidadania. Como j foimencionado, esse processo torna-se muito maisproveitoso quando possibilita a troca de experinciasentre profissionais de diferentes municpios.

    Uma outra proposta, ainda em fase de desenvolvi-mento, a transformao dos manuais em hipertexto,tornando-os disponveis em CD-ROM e em site na Internet,este ltimo possibilitando inclusive a criao de chatspara discusso de temas especficos e um dilogo diretocom os autores.

    Nesse entretempo, o Ncleo de Assistncia Mdico-Hospitalar da Faculdade de Sade Pblica dever realizarreunies com os ncleos de Sade Coletiva que estiveremdispostos a formar monitores para o processo. Tambmpoder realizar treinamentos em municpios que os soli-citarem. Para isso, devem entrar em contato com a Facul-dade de Sade Pblica, por meio de carta, fax ou e-mail.

    PERSPECTIVASA cultura organizacional do setor pblico brasi-

    leiro, em geral, no estimula a iniciativa e a criatividadede seus trabalhadores. Entretanto, deve-se lembrar quetodo processo de mudana implica a necessidade deprofissionais no apenas com boa capacitao tcnica,mas com liberdade de criao e autonomia de ao.

  • XX

    O projeto Sade & Cidadania oferece aos municpiosum instrumental testado de formao de gerentes. Odesafio agora utiliz-lo, tendo sempre presente a pers-pectiva de que a transformao est em marcha e aindah um longo caminho a ser percorrido no processo deimplementao e viabilizao do SUS.

    GONZALO VECINA NETORAUL CUTAIT

    VALRIA TERRACoordenadores do Projeto

  • Prembulo ............................................................................................................. 1

    Introduo ............................................................................................................. 5

    Conceitos ............................................................................................................... 11

    Fazendo um diagnstico da situao desade da populao e dos servios de sade .......................................... 19

    Mtodos de planejamento ............................................................................... 27

    Planejamento Estratgico Situacional PES ............................................. 29

    Mtodo Altadir de Planificao Popular MAPP ................................. 39

    Operacionalizando problemas e planos ................................................... 49

    Ordenando atividades no tempo ................................................................. 53

    Estimando os custos de uma operao ..................................................... 57

    Definindo normas e mtodos ......................................................................... 59

    Anexos ................................................................................................................... 61

    Bibliografia ........................................................................................................... 71

    Os autores ............................................................................................................. 73

    SUMRIO

  • sse pequeno dilogo, que faz parte do livro Alice no Pas das Maravilhas,ocorre entre Alice e o Gato, quando ela se encontra numa encruzilhada,sem saber ao certo para onde ir. Ele sintetiza, de forma singela, a essncia

    do planejamento. ao mesmo tempo extremamente reducionista e abrangen-te, porque nos conta de forma bem elegante o fosso que existe entre o deixar-se levar ao sabor do acaso e o determinar aonde se quer chegar. O planejamen-to serve exatamente para isto: determinar aonde se quer chegar (para ondequeremos conduzir um sistema) e tomar as decises pertinentes que, acredita-mos, nos levaro ao ponto desejado. No queremos fazer as coisas parecerfceis demais, porque, afinal, chegar a um acordo entre vrios atores sociaissobre aonde queremos chegar com o nosso sistema de sade no tarefa sim-ples; tampouco fcil nos organizarmos para poder alcanar os pontos vislum-brados. Contudo, temos de concordar que, do ponto de vista conceitual, o pla-nejamento no como alguns podem ter querido fazer parecer um univer-so impenetrvel para os no-iniciados. Visto sob a tica do dilema de Alice, pla-nejamento algo que fazemos todo o tempo, todos os dias, na nossa vida pes-soal e espera-se na nossa vida profissional. Possivelmente, existem dirigen-tes municipais de sade que no definiram claramente aonde desejam fazerchegar o sistema que dirigem; at possvel que administrem esse sistema dili-gentemente, sem saber para onde querem conduzi-lo; atuam como um moto-

    PLANEJAMENTO EM SADE

    1

    PREMBULOAlice Poderia me dizer,por favor, qual o caminho para sair daqui?Gato Isso depende muito do lugar para onde voc quer ir.Alice No me importamuito onde.Gato Nesse caso, no importa por qualcaminho voc v.

    E

  • rista que dirige bem seu automvel, cumpre todas as regras de trnsito, masque passeia ao lu, sem destino certo. Contudo, acreditamos que a imensamaioria vislumbra com clareza a misso do sistema, por onde querem condu-zi-lo, os resultados e efeitos desejados.

    Acompanhando as polticas nacionais de descentralizao administrativa ede resgate do poder gestor do municpio, h hoje em dia uma clara tendnciaa restringir os planos nacionais a somente grandes enunciados de metas e aosassuntos referentes ao financiamento do sistema de sade. O poder local, quepor longo tempo lutou por maior autonomia, afinal ganhou maiores responsa-bilidades pela gesto do sistema de sade.

    Anteriormente, tnhamos planos concebidos de forma centralizada e exces-sivamente normativos. H, agora, uma expectativa de que o nvel local assu-ma as responsabilidades pela definio de uma direcionalidade para o sistemaque seja harmnica e coerente com os grandes objetivos nacionais para osetor. A maior autonomia municipal vem acompanhada de uma maior respon-sabilizao. Pior do que planos centralizados e opressores a ausncia de pla-nos. Se a prtica anterior no for substituda por um processo de planejamen-to local e participativo, cairemos numa situao de anarquia administrativa, deum laissez-faire extremamente perigoso, em que as palavras de ordem passa-riam a ser apagar os incndios, atender demanda urgente, gerar consul-tas, etc. As polticas pblicas de descentralizao do nosso sistema de sadeso, sim, muito ricas e promissoras, mas trazem consigo a obrigao para opoder local de assumir um papel mais pr-ativo no processo de definio dosdestinos do sistema.

    O porte da imensa maioria dos municpios brasileiros no justifica a contra-tao de equipes de especialistas em planejamento de sade, ou nem mesmode consultorias de instituies respeitveis. Entendemos que a maioria dosmunicpios ou dos consrcios municipais de sade ser administrada por pro-fissionais da rea da sade com limitada experincia administrativa. Este mdu-lo pretende conduzir o administrador por entre os meandros da terminologia,dos conceitos-chave e das prticas de planejamento. Pretende tambm desmi-tificar o planejamento e seus instrumentos, fazendo suas tcnicas acessveisqueles que no se consideram planejadores, mas que, sem dvida, incluem-se entre os que de fato planejam e fazem as coisas acontecer no dia-a-dia domunicpio e da base do sistema de sade.

    A partir dos anos 60, quando o planejamento em sade comea a ser discu-tido de fato, um sem-nmero de autores dedicaram-se ao tema e nos legaraminmeras obras. Ao planejar este guia, nosso dilema foi eleger uma abordagemque no parecesse uma reviso acadmica de todos os autores mais impor-tantes, mas, sim, uma que oferecesse um instrumental com sentido de pratici-dade. Para tanto, vimo-nos obrigados a eleger um autor bsico e seu mtodo.Por todas as suas qualidades, o mtodo de Planejamento Estratgico Situacio-nal (PES) de Carlos Matus serviu como arcabouo para o planejamento de nvel

    PLANEJAMENTO EM SADE

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  • poltico e estratgico. E o Mtodo Altadir de Planificao Popular (MAPP), tam-bm desenvolvido sob a liderana de Matus, nos serviu para apresentar o pla-nejamento de nvel operacional. Alm disso, o mtodo de Estimativa RpidaParticipativa (ERP) adotado para orientar o processo de diagnstico de situa-o de sade.

    Nosso objetivo oferecer um instrumental que possa ser utilizado com auto-nomia pelas equipes municipais de sade e ensinado a diversos atores sociaisque sero envolvidos no planejamento local. claro que em determinadas ins-tncias, particularmente se o planejamento estiver apenas sendo incorporadoaos processos administrativos, a ajuda de planejadores mais experientes sernecessria. Contudo, vemos isso como uma transio para a autonomia. Acre-ditamos que, em havendo vontade, em pouco tempo os grupos locais poderoapoderar-se dos conceitos bsicos do processo e aprender a utilizar a ferramen-ta certa para a tarefa apropriada. No existe planejamento perfeito, nem planoirreprovvel. preciso comear e persistir.

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  • ara MEHRY (6), o planejamento pode ser utilizado como instrumento deao governamental para a produo de polticas, como instrumento doprocesso de gesto das organizaes e como prtica social. Como instru-

    mento administrativo e de polticas de governo, seu prestgio passou por vriosperodos de altos e baixos, inclusive no setor da sade. Nos anos 50, quandosurge na vida poltica da ex-Unio Sovitica e na vida administrativa de empre-sas americanas, foi vendido como mais uma das panacias das cincias pol-ticas e administrativas (assim como muitas outras so vendidas hoje em dia).Rapidamente, os governantes de vrios pases latino-americanos aderiram idia do planejamento econmico e social; a embarcou o planejamento emsade. Com o correr dos anos, os insucessos de vrios planos governamentaise empresariais trouxeram muito descrdito ao planejamento. Houve momentosem que administradores passaram a renegar as tcnicas e tratamentos propos-tos pelos planejadores e, no nvel dos governos nacionais, os planos foramencarados com ceticismo, quando no com total descrdito. Felizmente, mui-tos dos erros cometidos ao longo de quatro dcadas favoreceram um processode amadurecimento e serviram como lies bem aprendidas; o planejamento eos planejadores foram se incorporando de forma mais pertinente ao dia-a-diadas prticas administrativas e adquirindo a humildade que no tinham a princ-pio. Enfim, reconhecido no mais como panacia, o planejamento valorizadocomo um processo essencial de uma gesto moderna e eficiente.

    Por muitos dos erros anteriores, o planejamento deixou mitos e fantasias queprecisam ser esclarecidos e eliminados do imaginrio do administrador, a fimde que no se repitam atitudes e crenas inadequadas. Por isso, falar de plane-jamento e ajudar as pessoas a aplic-lo como prtica administrativa muitasvezes obriga o expositor a comear por desmitific-lo e explicar o que ele no ou no deveria ser.

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    INTRODUO

    P

  • O que o planejamento no

    O planejamento no deve ser confundido com plano O plano um dos produtos de um amplo processo de anlises e acordos; eledocumenta e enuncia as concluses desses acordos, indicando para onde que-remos conduzir o sistema (objetivos gerais ou estratgicos) e como pretende-mos agir para que nossas metas sejam alcanadas (estratgias e objetivos espe-cficos ou de processo). Em verdade, o plano deveria ser encarado como umapea de vida efmera o processo de planejamento, em si, que deve ser per-manente porque rapidamente vai perdendo sua atualidade face ao desenro-lar da realidade. O plano deve ser permanentemente revisado para se manteratual. Muitas experincias fracassaram ou foram traumticas porque as pessoasaderiram de forma inflexvel a um documento. A riqueza do planejamento estno processo em si de analisar o ambiente e os sistemas e chegar a definir os oque queremos e os como alcan-lo. esse processo que deve ser perma-nente e envolvente dentro da instituio. Contudo, embora pea secundria, oplano escrito deve existir, at porque preciso documentar os acordos e a dire-cionalidade do trabalho. Ele deve ser preparado em linguagem clara e conci-sa, de forma que todos os que o leiam compreendam claramente a viso defuturo e os objetivos perseguidos.

    O planejamento no tarefa dos planejadores; ele deve ser feitopelos atores envolvidos na ao Houve tempo em que os ditos planejadores eram agrupados em unidadesou departamentos de planejamento, a partir dos quais pretendiam ditar ofuturo do sistema e o curso da administrao. Ainda nos lembramos dos casosde planos centralizados que, de cima para baixo, ditavam at os detalhes daexecuo do trabalho. Muitos casos so hoje lembrados como caricatura, masa triste realidade que vrios dirigentes locais sofreram nas mos de planosque no compreendiam sua realidade e de planejadores arrogantes, distancia-dos da prtica. O planejamento deve ser feito pelos atores envolvidos na ao,e a figura do planejador, hoje em dia, deve ser vista como a de algum queatua como facilitador do processo. Cada vez mais as organizaes se do con-ta de que perfeitamente possvel apropriar-se dos conceitos e ferramentas doplanejamento, bem como das vantagens decorrentes do envolvimento das pes-soas nesse processo.

    No existe a teoria ou o mtodo de planejamento H uma vasta literatura sobre planejamento; h, tambm, uma vasta terminolo-gia. Uma fantasia freqente que exista o mtodo de fazer planejamento.Todas as teorias e os mtodos no escapam muito do dilema de Alice: defi-nir qual o futuro desejado, isto , aonde queremos chegar com o nosso sistemae como apont-lo naquela direo, ou seja, que programas e decises imple-

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  • mentar para preparar a instituio/sistema a direcionar-se para um determina-do rumo e a produzir resultados que nos levem ao futuro desejado. Muitosautores fizeram largas digresses sobre essa coisa to simples, porque, obvia-mente, o jogo de foras, interesses e ideologias faz com que no seja semprefcil definir esse norte e tampouco as formas de chegar l. O melhor mto-do aquele que melhor ajudar numa determinada situao. Veremos maisadiante que um mtodo bom para o planejamento operacional de um proble-ma especfico de sade no se presta para o planejamento de nvel poltico. Damesma maneira, um planejamento municipal que toma por base o mtodo doPES de Matus para a sua fase de anlise poltica sai bastante enriquecido quan-do a ele agregamos tcnicas de ERP ou do MAPP. O mtodo CENDES/OPS atualmente abandonado por sua baixa praticidade e seu mecanicismo legou-nos importantes conceitos sobre custo-benefcio das aes em sade ou,por exemplo, sobre a transcendncia social dos agravos sade. Em suma, pouco provvel que na prtica algum siga ipsis litteris um determinado mto-do; mais provvel que na seqncia do trabalho v incorporando diversosinstrumentos de trabalho retirados de muitas partes.

    Planejar no fazer uma mera declarao de intenesDRUCKER (12) diz que o futuro, para acontecer, no depende de que algum odeseje com intensidade; requer decises e aes imediatas. O verdadeiro pla-nejamento no uma lista de desejos ou boas intenes. Ele deve enunciarobjetivos factveis e alcanveis, caso contrrio perder a credibilidade. Plane-jar exige a ousadia de visualizar um futuro melhor, mas no simplesmentesonhar grande. Exige maturidade para se acomodar s restries impostaspelo ambiente ou pelo grau de desenvolvimento da organizao. Alm disso, oplanejamento obriga a selecionar as aes concretas necessrias para alcanaro objetivo desejado.

    O que o planejamento deve ser

    O planejamento um instrumento de gesto que promove o desenvol-vimento institucional Hoje em dia, fala-se muito em organizaes aprendizes, como instituiesque esto constantemente permeveis a mudanas que as fazem desenvolver-se de forma a melhor cumprir sua misso. O planejamento uma arma pode-rosa para apoiar o desenvolvimento e sofisticao administrativa das organiza-es e dos sistemas. Promover uma cultura institucional em que os agentesesto habituados a refletir sobre a finalidade das aes empreendidas umaexcelente forma de melhorar a qualidade e efetividade do trabalho. Na medidaem que o planejamento educa os agentes sociais a analisar de forma sistem-tica as organizaes, os sistemas e as variveis significativas do contexto, asnecessidades e as possibilidades de atend-las, a pensar estrategicamente vis-

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  • lumbrando os rumos e caminhos possveis, ele exerce forte influncia sobre ocompromisso das pessoas com os objetivos institucionais. Nas organizaesonde os funcionrios so introduzidos misso institucional, aos objetivosestratgicos e aos programas de trabalho, observa-se um maior compromissocom os resultados concretos do trabalho (por exemplo, com a satisfao dosusurios e com a resoluo efetiva dos problemas de sade), ao contrrio deorganizaes onde os funcionrios somente se preocupam em cumprir as tare-fas que lhes so destinadas (por exemplo, realizar tantas consultas por jornadade trabalho ou preencher de forma correta um formulrio). Assim sendo, o pla-nejamento tambm uma forma de educao para a qualidade.

    Planejar uma atitude permanente da organizao e do administradorO planejamento no uma mera ferramenta de trabalho, uma coleo de tc-nicas e frmulas que podem ser aplicadas a uma determinada situao. Plane-jar toda uma viso administrativa e envolve um variado nmero de atoressociais. Numa organizao como um hospital ou um centro de sade , podeenvolver seus diretores, chefes de departamentos ou setores, profissionais pres-tadores de servios e, no raro, os prprios usurios ou clientes. Na administra-o municipal, alm da equipe dirigente da Secretaria da Sade, pode envolveruma variada composio de atores sociais, representando a administraomunicipal, o governo estadual, o conselho local de sade, outros representan-tes da sociedade civil, representantes dos prestadores de servios, etc. Nessascircunstncias, claro que o planejamento um processo poltico de busca dospontos comuns das distintas vises de futuro e de acordos sobre as estratgiaspara alcan-los. Muitos dos grandes objetivos do sistema de sade so igual-mente compartilhados por representantes de variadas correntes polticas;porm, a forma de atingi-los quase sempre varia muito e o cerne das dispu-tas de poder. Aqueles que detm o poder num determinado momento obvia-mente tm mais chances de fazer prevalecer sua viso de futuro e seus mto-dos para alcan-lo; mas, numa sociedade democratizada, auscultaro e faroacordos com seus oponentes e com os vrios segmentos da sociedade, atcomo forma de reduzir a incidncia de resistncias ao seu plano de trabalho. sobejamente sabido em administrao que a implementao de decises mui-to mais gil e eficiente quando as pessoas conhecem suas razes e origens e,em particular, quando tomaram parte na sua elaborao. Objetivos amplamen-te discutidos e em que h consenso so mais facilmente aceitos e compreendi-dos por aqueles que, de alguma forma, participaro da execuo das tarefasnecessrias para atingi-los.

    A maior riqueza do planejamento est no processo em si de planejarTodos os que alguma vez se envolveram em um planejamento sabem que a suariqueza est no processo de anlise e discusso que leva ao diagnstico, visodo futuro desejvel e factvel e ao estabelecimento dos objetivos e programas

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  • de trabalho. Adotado como prtica social, envolvendo uma ampla gama de ato-res da sociedade civil, o planejamento participativo exerce um forte poder deaglutinao de pessoas e grupos, os quais passam a compreender e convivercom os anseios dos outros atores sociais. A negociao entre grupos torna-semais fcil e o compromisso de todos com a concretizao dos ideais fica muitoampliada. Dentro de organizaes, o planejamento participativo tem o poderde criar uma nova cultura de compromisso com a instituio. Tem-se observa-do que, em todas as organizaes e ambientes onde se estabeleceu o planeja-mento como uma prtica permanente de participao, desenvolveu-se umacultura em que h maior compromisso das pessoas para com a instituio. Basi-camente, planejar consiste em questionar e procurar responder s perguntasdecorrentes desse questionamento, ou seja, o qu, por qu, como, quan-do, com quem e com o qu.

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  • ntes de entrar na discusso propriamente dita sobre o planejamento, intro-duziremos, de forma breve, alguns conceitos que embasam essa discus-so. O objetivo deste captulo familiarizar o leitor com a linguagem que

    estar sendo utilizada nos captulos seguintes, nos quais sero abordados mto-dos de anlise e planejamento do sistema de sade.

    UM CONCEITO AMPLIADO DE SADEDurante muito tempo, predominou o entendimento de que sade era

    sinnimo de ausncia de doenas fsicas e mentais. Nesse sentido, os serviosde sade privilegiaram na sua organizao a ateno mdica curativa.

    A Organizao Mundial de Sade define que sade o completo bem-estarfsico, mental e social e no a simples ausncia de doena. Essa definioaponta para a complexidade do tema, e a reflexo mais aprofundada sobre seusignificado nos leva a considerar a necessidade de aes intersetoriais e inter-disciplinares no sentido de criar condies de vida saudveis.

    Atualmente, senso comum entre a populao e os militantes desse setor queo processo sade-doena um processo social caracterizado pelas relaes doshomens com a natureza (meio ambiente, espao, territrio) e com outros homens(atravs do trabalho e das relaes sociais, culturais e polticas) num determina-do espao geogrfico e num determinado tempo histrico (1). A garantia sa-de transcende, portanto, a esfera das atividades clnico-assistenciais, suscitando anecessidade de um novo paradigma que d conta da abrangncia do processosade-doena. Nesse sentido, a promoo sade aglutina o consenso polticoem todo o mundo e em diferentes sociedades como paradigma vlido e alterna-tivo aos enormes problemas de sade e do sistema de sade dos pases (2).

    A carta de intenes da Primeira Conferncia Internacional sobre Promooda Sade, realizada em Ottawa, Canad, em 1986, denominada Carta de Otta-wa, assim define a promoo sade:

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    CONCEITOS

    A

  • ...o processo de capacitao da comunidade para atuar na melho-ria da sua qualidade de vida e sade, incluindo maior participaono controle desse processo. Para atingir um estado de completo bem-estar fsico, mental e social, os indivduos e grupos devem saber iden-tificar aspiraes, satisfazer necessidades e modificar favoravelmen-te o meio ambiente... Assim, a promoo sade no responsabi-lidade exclusiva do setor da sade, e vai para alm de um estilo devida saudvel, na direo de um bem-estar global. (10)

    A Carta de Ottawa advoga que a sade constitui o maior recurso para odesenvolvimento social, econmico e pessoal, e que somente atravs dasaes de promoo que as condies e recursos fundamentais para a sade setornam cada vez mais favorveis. Considera que esses recursos so (6):

    paz: reduo da violncia;

    habitao: condies dignas de moradia, tanto em relao ao espaofsico quanto ao assentamento legal;

    educao: cumprimento do ensino compulsrio, reduo da evasoescolar e reviso da qualidade de ensino;

    alimentao: garantia de poltica municipal de gerao e de mecanis-mos de troca de produtos alimentcios e, principalmente, garantia dealimento na mesa da famlia;

    renda: a gerao de renda para todos e com volume compatvel coma vivncia;

    ecossistema saudvel: ar salubre; gua potvel disponvel 24 horas pordia; alimentos existentes em quantidade suficiente e de boa qualidade;

    recursos renovveis: o mais importante o prprio homem, que serenova cada vez que se recupera de um mal-estar... Os servios de sa-de devem estar aptos para atender o homem em todos os seus nveisde complexidade, seja com recursos prprios ou em parceria comoutros municpios;

    justia social e eqidade: a iniqidade caracterizada pela diferenade velocidade com que o progresso atinge as pessoas... avaliada indi-retamente pela rea geogrfica em que o cidado reside. Dessa forma que se busca, atravs do esquadrinhamento do municpio em territ-rios homogneos, observar os determinantes e suas conseqncias aobem-estar. A promoo da eqidade feita pela reduo dos efeitosnocivos salubridade e pelo reforo dos fatores positivos.

    A essa Conferncia seguiram-se outras trs que aprofundaram o conceito depromoo sade. Assim, a Declarao de Adelaide (Austrlia, 1988), a Decla-

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  • rao de Sundsvall (Sucia, 1991) e a Declarao de Bogot (Colmbia, 1992)reforam a crtica organizao dos servios de sade, reafirmando sua respon-sabilidade no desenvolvimento de aes de promoo, alm da oferta de servi-os clnicos e de urgncia (10).

    Nos captulos seguintes, sero abordados mtodos de planejamento e anli-se da situao de sade, que podero ser aplicados a um dado territrio, sejalocal, regional ou municipal, coerente com o conceito de sade e as considera-es aqui apresentadas.

    O QUE PLANEJARPlanejar a arte de elaborar o plano de um processo de mudana. Com-

    preende um conjunto de conhecimentos prticos e tericos ordenados de modoa possibilitar interagir com a realidade, programar as estratgias e aes neces-srias, e tudo o mais que seja delas decorrente, no sentido de tornar possvelalcanar os objetivos e metas desejados e nele preestabelecidos. Merhy defineplanejamento como o modo de agir sobre algo de modo eficaz (4).

    Para Levey e Loomba (13), planejamento o processo de analisar e entenderum sistema, avaliar suas capacidades, formular suas metas e objetivos, formularcursos alternativos de ao para atingir essas metas e objetivos, avaliar a efeti-vidade dessas aes ou planos, escolher o(s) plano(s) prioritrio(s), iniciar asaes necessrias para a sua implantao e estabelecer um monitoramento con-tnuo do sistema, a fim de atingir um nvel timo de relacionamento entre o pla-no e o sistema. (Os grifos so nossos)

    No setor da sade, o planejamento o instrumento que permite melhorar odesempenho, otimizar a produo e elevar a eficcia e eficincia dos sistemasno desenvolvimento das funes de proteo, promoo, recuperao e reabi-litao da sade.

    O planejamento nesse setor surge na Amrica Latina na dcada de 60 com omtodo CENDES-OPS de Programao em Sade. Nele se prope uma metodo-logia de gerenciamento da escassez de recursos, de modo a desenvolver aescom maior efetividade. Em suma, frente impossibilidade, nos pases subdesen-volvidos, de atender simultaneamente ao conjunto de necessidade de sade, oCENDES-OPS estabeleceu uma srie de critrios para orientar a intervenosobre um problema e no sobre outro, no sentido de otimizar os recursos exis-tentes. Estabeleceram-se, assim, critrios objetivos que orientavam e legitima-vam a eleio de prioridades, com base em padres econmicos e tcnicos. Pri-vilegiava-se a interveno sobre os problemas que respondiam melhor tecno-logia existente, queles mais expressivos numericamente e cuja soluo teriauma suposta ao em outros setores da sociedade. O mtodo CENDES-OPS teveo mrito de, pela primeira vez, trazer para as mesas de discusses do setor dasade a preocupao com o uso eficiente dos recursos pblicos, atravs de umacuidadosa anlise de prioridades e do clculo prvio dos resultados esperadoscom o uso de cada instrumento de ao.

    CONCEITOS

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  • As primeiras crticas ao mtodo surgem no incio dos anos 70 e referem-se sua desvinculao com a produo de polticas na sociedade e com a historici-dade dos atores envolvidos e ao seu carter prescritivo e normatizador. A par-tir dos questionamentos que o mtodo sofreu ao longo desses anos, outrasalternativas de planejamento do setor da sade tm sido apresentadas. Desta-cam-se o Pensamento Estratgico em Sade, de Mario Testa, e o PlanejamentoEstratgico Situacional (PES), de Carlos Matus.

    PLANEJAR E GERENCIARGerenciar funo administrativa da mais alta importncia o proces-

    so de tomar decises que afetam a estrutura, os processos de produo e o pro-duto de um sistema. Implica coordenar os esforos das vrias partes desse sis-tema, controlar os processos e o rendimento das partes e avaliar os produtosfinais e resultados. Numa organizao, o gerente se responsabiliza pelo uso efe-tivo e eficiente dos insumos, de forma a traduzi-los em produtos (servios, porexemplo) que levam a organizao a atingir os resultados que se esperam dela.

    O planejamento um processo que depende fundamentalmente de conhe-cer intimamente a situao atual de um sistema e definir aquela a que se pre-tende chegar. O plano, portanto, constitui-se no detalhamento do processo demudana entre a situao atual e a desejada, sendo o gerente o responsvel porexecutar essa tarefa.

    possvel gerenciar sem planejar ? Sim; em princpio, aparentemente possvelgerenciar sem planejar. Um gerente pode coordenar o trabalho de um sistema emanter a sua homeostase, isto , obter um produto positivo em termos de usoeficiente dos insumos e recursos disponveis para esse sistema, sem ter uma visode como conduzir o sistema a um ponto mais alto de desenvolvimento. comoter um motorista conduzindo bem um carro, obedecendo a todas as regras detrnsito e sabendo utilizar-se do potencial do carro, mas que no sabe para ondequer ir. Isto , ele no tem plano; simplesmente administra o status quo. No raro,encontramos no setor da sade pessoas que fazem o papel de gerentes eficien-tes, mas cujo objetivo apagar incndios e fazer a mquina funcionar.

    Como j havamos apontado, apropriado e necessrio destacar, nestemomento, o que o plano no :

    no uma receita feita por uma nica pessoa;

    no uma camisa-de-fora;

    no permanente ou imutvel.

    necessrio ter sempre em mente que o mundo contemporneo se caracte-riza por processos muito intensos e constantes de mudana, seja pela ao doser humano sobre os fatores ambientais, seja pela busca de maior bem-estar. Asalteraes de ordem social, econmica e tecnolgica exigem grande habilida-de dos gestores para acompanh-las e evitar a obsolescncia(8). Portanto,

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  • imprescindvel manter um olhar crtico e constante sobre o que foi planificadoinicialmente e propor as estratgias adequadas nova situao.

    Assim, esse processo tambm exige do gerente um leque de habilidades quepermitam viabilizar solues imediatas aos problemas emergentes e de com-plexidade varivel. Entre elas, podemos incluir criatividade, flexibilidade,viso, liderana, autoridade, destemor de correr riscos e ousadia de inovar.

    Essas habilidades devem se somar aos conhecimentos especficos em admi-nistrao; muitas vezes, isso fica relegado em favor da confiana pessoal ou dodestacado desempenho tcnico do indivduo como profissional de sade. Bonsmdicos e enfermeiras (geralmente esses so os profissionais designados paraassumir o papel de gerente) no so, necessariamente, bons administradores,uma vez que sua formao voltada ao cumprimento de tarefas especficas. Aprtica tem demonstrado que os profissionais sem formao prpria para agerncia, geralmente, no tm sensibilidade para as tarefas caractersticas des-sa funo, o que constitui um empecilho ao seu bom desempenho como diri-gente. Por outro lado, uma bagagem adequada de conhecimentos e habilida-des contribui para que as pessoas que ocupam esses cargos desenvolvammaior autoconfiana e ajudem a criar um clima organizacional positivo desegurana e credibilidade no xito do futuro (8).

    PENSAR ESTRATEGICAMENTEA realidade muda muito e rapidamente, alm de ser pouco previsvel. Os

    planos, conseqentemente, valem muito pouco, ou melhor, sua validade limi-tada ao momento especfico de sua coerncia com a realidade. Por isso o pro-cesso de planejamento deve englobar a capacidade de produzir tantos planosquantos necessrios quando a realidade muda.

    O planejamento a ferramenta que nos possibilita alcanar um ponto dese-jado no futuro, atravessando um caminho desconhecido entre o presente e omomento almejado. Esse processo nos permite tornar concreto esse caminho,mediante a anlise das nuances da atual situao, da avaliao dos recursos dis-ponveis, sejam polticos, econmicos ou cognitivos, e da nossa atitude emrelao ao plano que os atores que dominam esses recursos fazem, seja deapoio, oposio ou indiferena. Essa anlise dever viabilizar o clculo dasaes mais adequadas para atingirmos nossos propsitos.

    Certamente, sempre haver distintas opes de agir no sentido de lograr nos-sos objetivos, porm algumas mais factveis que outras, seja pela viabilidade derecursos, ou pela oportunidade de desenvolver a ao, ou pelo prazo em que osresultados sero obtidos. E nesse sentido que se planeja, para explicar cadauma das possibilidades e analisar suas respectivas vantagens e desvantagens (4).

    Assim, devemos ter sempre em mente que toda a energia aplicada no plane-jamento do funcionamento dos servios de sade deve convergir para gerarresultados e no apenas produtos. Isto , quando planejamos o funcionamen-to de uma unidade do sistema municipal de sade, com programas de atendi-

    CONCEITOS

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  • mento a grupos de risco especficos, por exemplo, o objetivo no as consul-tas produzidas, mas, sim, o resultado que esses procedimentos tero sobre asade dos indivduos e o impacto que as aes planejadas tero sobre os indi-cadores de sade da populao.

    NVEIS DE PLANEJAMENTOPodemos entender que o planejamento se d em trs nveis, segundo o

    grau de complexidade do processo de tomada de decises, o nvel hierrquicono sistema em que esse processo ocorre e a amplitude das decises decorrentes:

    planejamento normativo ou de polticas;

    planejamento estratgico;

    planejamento ttico/operacional.

    O planejamento de polticas responsabilidade do nvel central do sistema;no caso do setor da sade, de competncia do secretrio municipal. SegundoDever (2), destinado a promover mudanas sociais deliberadas ou pretendi-das projetadas para o futuro. Como possvel perceber, nesse nvel de plane-jamento ser necessrio lidar com os distintos interesses de diferentes atoressociais e sua postura em relao ao plano, de oposio, indiferena ou adeso.

    O planejamento estratgico indica os meios estratgias pelos quais sejulga que seja possvel atingir as metas desejadas de mdio e longo prazo;define a estrutura sistmica para a ao organizacional e as medidas de efeti-vidade indicadores para anlise dos resultados.

    Ao definir essas estratgias, fornece a estrutura para o planejamento opera-cional, que, como veremos, dever prever todo o detalhamento para sua imple-mentao, assim como o dimensionamento da estrutura necessria e o clculodos insumos.

    O planejamento operacional, como seu nome j diz, refere-se ao desenvol-vimento de aes (planos) que permitam organizar a execuo das estratgiasplanejadas em outro nvel de planejamento. Indica como colocar em prticaas aes previstas. Em nosso setor, utiliza-se esse tipo de planejamento na exe-cuo dos programas de assistncia sade por exemplo, o programa paracontrole da hipertenso. Independentemente do modelo adotado para o plane-jamento das polticas de sade ou das estratgias de interveno, o planejamen-to operacional mostra-se coerente e necessrio para organizar a fase de implan-tao. No ltimo captulo deste manual ser abordado esse tipo de planejamen-to com mais detalhes.

    TERRITRIO importante lembrar que est sendo adotado neste manual um concei-

    to de territrio coerente com o mtodo de planejamento sugerido. Sendoassim, no compreendido apenas como um espao geogrfico, mas, sim,

    PLANEJAMENTO EM SADE

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  • como o local em que se d o processo de vida da comunidade, a interao dedistintos atores sociais com qualificaes sociais, econmicas, culturais, polti-cas, epidemiolgicas e histricas distintas.

    MICROREA DE RISCODefine-se uma microrea de risco como a rea de menor extenso ter-

    ritorial onde possvel afirmar que a populao tem condies de vida homo-gneas.

    A INFORMAO COMO INSUMO PARA O PLANEJAMENTOS possvel planejar tendo conhecimento do sistema sob nosso coman-

    do e do contexto em que ele se insere. O sucesso do planejamento, ou seja, a efe-tividade dos resultados mantm relao direta com a qualidade das informaes.Na sade, as informaes necessrias dizem respeito tanto caracterizao dosequipamentos unidades de atendimento como das pessoas que os utilizam.

    Dispe-se de uma srie de indicadores e tcnicas que permitem estimar aquantidade de consultas, procedimentos, internaes e exames demandados aosistema de sade por uma certa clientela e calcular a capacidade instalada neces-sria dos servios para garantir aquele atendimento. Em relao aos servios,permitem calcular a capacidade instalada atual. Esses dados do suporte an-lise da adequao do sistema s necessidades da clientela. No captulo que abor-da o planejamento operacional sero apresentados alguns desses parmetros.

    A epidemiologia tem sido uma ferramenta bastante utilizada para definir asnecessidades de sade e auxiliar o planejamento dos servios. de vital impor-tncia constituir dentro da Secretaria Municipal da Sade um servio de informa-es em sade que sistematize dados demogrficos, de morbidade e mortalida-de, num grau de desagregao cuja anlise alimente o processo de planejamen-to e tomada de decises do gestor local.

    No prximo captulo, iremos aprofundar um pouco mais essa questo eintroduzir uma metodologia de anlise das necessidades de sade.

    CONCEITOS

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  • planejamento e o gerenciamento de um sistema de sade dependem deum conjunto de informaes adequadas que orientem o planejadorquanto s necessidades de sade da populao e a ordem de priorida-

    de dessas necessidades, assim como da oferta de servios existentes e sua capa-cidade de atendimento.

    Essas informaes devem expressar as diferentes caractersticas que eviden-ciam as condies de vida dessa populao, sejam culturais, sociais, econmi-cas e epidemiolgicas, e que so responsveis pela gerao de suas demandasde sade.

    Para que essa anlise se viabilize, necessrio dispor de dados que sejambastante especficos em relao aos diversos grupos populacionais que se pre-tende atingir. Essa tem sido uma tarefa difcil, pois os dados, normalmente,esto disponveis nos municpios num grau de desagregao que no o sufi-ciente para permitir distinguir essas diferenas.

    Dados demogrficos e epidemiolgicos coletados rotineiramente pelosrgos oficiais, como das secretarias estaduais de sade e do IBGE, nos do,simplesmente, uma idia genrica do perfil demogrfico e epidemiolgico emrelao ao total de indivduos. A crtica que deve ser feita aos resultados dessasanlises, base de clculo dos coeficientes e indicadores de sade, em relao aparente homogeneidade de condies que se imputa a uma dada populaoe igualmente em relao s necessidades demandadas aos servios de sade.Esse fato vem mascarar as desigualdades s vezes gritantes nas condies devida e sade da populao, obstruindo a identificao de objetivos operacio-nais e alvos bem especficos.

    possvel conhecer a distribuio da populao segundo nvel de renda,idade, grau de escolaridade e causas de morte numa regio da cidade. Pode-mos afirmar que essas informaes compem o perfil do universo dos indiv-duos residentes naquele territrio? Sabemos que no. At mesmo numa rea

    PLANEJAMENTO EM SADE

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    FAZENDO UM DIAGNSTICO DASITUAO DE SADE DA POPULAO

    E DOS SERVIOS DE SADE

    O

  • geogrfica pequena como a de um bairro, por exemplo, possvel verificar aexistncia concomitante de favelas e de condomnios de luxo. Como podemos,ento, concluir que as necessidades de sade dessas pessoas possam ser seme-lhantes? Qual o impacto que tero as aes planejadas sob essa tica? Estare-mos desperdiando recursos? E o nosso cliente, ficar satisfeito? Qual o saldopoltico da administrao municipal? Responder a essas questes significa reco-nhecer a diversidade, o direito do cidado a ter atendidas suas necessidades e,em relao aos servios, a otimizao dos recursos, a eficincia das aes.

    No devemos nos esquecer de que no setor da sade gerenciamos recursosescassos para necessidades ilimitadas. Gerenciar esses recursos de forma ade-quada nos remete responsabilidade de planejar adequadamente, de modoque os objetivos operacionais convirjam em direo realidade sanitria doscidados que utilizam esses servios.

    A seguir, abordaremos com detalhes uma metodologia que, pelas caracters-ticas que rene, se mostra pertinente para o momento de anlise das condiesde sade e o gerenciamento de sistemas locais, sob a tica da vigilncia sa-de e do Planejamento Estratgico Situacional.

    ESTIMATIVA RPIDA PARTICIPATIVAA Estimativa Rpida Participativa (ERP) um mtodo que apia o plane-

    jamento participativo no sentido de contribuir para a identificao das necessi-dades de sade de grupos distintos, inclusive daqueles menos favorecidos, apartir da prpria populao, em conjunto com os administradores de sade.

    Esse mtodo de anlise rene algumas vantagens:

    simplicidade;

    baixo custo;

    rapidez;

    informaes especficas de populaes definidas.

    Apia-se em trs princpios:

    coletar dados pertinentes e necessrios;

    coletar informaes que reflitam as condies locais e as situaesespecficas;

    envolver a comunidade na definio de seus prprios problemas e nabusca de solues.

    Permite dessa forma conciliar o conhecimento terico com o saber prtico,de modo a facilitar ao tomador de deciso desenvolver o planejamento localem conjunto com a prpria comunidade que recebe e avalia o servio.

    PLANEJAMENTO EM SADE

    20

  • O mtodoA ERP propicia a identificao das condies de vida da populao do munic-pio e a maneira como ela se distribui pelo territrio. Sua importncia maior resi-de no fato de evidenciar os problemas que afetam a populao e seus determi-nantes sociais, econmicos e ambientais. Apresenta como resultado um mosai-co de necessidades especficas a determinados grupos populacionais. Esserecorte, a partir das informaes coletadas, transportado para o mapa do terri-trio, permite e orienta sua diviso em reas menores denominadas micro-reas de risco.

    Conforme discutido no manual Distritos Sanitrios: Concepo e Organiza-o, o conceito deste tem diferentes acepes. Vamos adotar, neste manual, amesma opo feita no outro, pela concordncia poltica com os mtodos deanlise e planejamento aqui apresentados. Sendo assim, entende-se que os Dis-tritos Sanitrios compreendem a definio de um certo espao geogrfico,populacional e administrativo em consonncia com as instncias de coordena-o do sistema de sade que lhe corresponde.

    importante destacar que esse conceito traduz a poltica que alicera aimplantao dos DS como um processo social em construo, onde sero ges-tacionadas as mudanas das prticas sanitrias, no sentido de atender snecessidades de sade dessa populao e em permanente negociao com osatores sociais envolvidos nesse processo. Pressupe, portanto, o compartilha-mento de informaes, o respeito pelo saber do outro e a elaborao de umplanejamento participativo.

    O mtodo se fundamenta na anlise da distribuio espacial das caractersti-cas scio-econmicas, culturais, demogrficas e epidemiolgicas. Isso muitoimportante, porque auxilia a identificao das particularidades e evidencia asreas de maior prioridade, permitindo orientar o planejamento das aes de sa-de realizadas pela administrao municipal segundo a especificidade de cadamicrorea, de modo que os resultados alcanados venham a ser mais efetivos.

    A estimativa rpida trabalha, fundamentalmente, com trs fontes de dados:

    registros escritos, tanto de fontes primrias quanto de secundrias;

    entrevistas com informantes-chave;

    observao de campo.

    Para garantir o sucesso da pesquisa preciso fazer um planejamento cuida-doso de todas as etapas, realizar uma seleo criteriosa dos informantes-chavee zelar pela coordenao do trabalho de campo.

    Recomenda-se organizar a ERP em trs etapas (11):

    1. Um momento inicial de organizao dos detalhes e das demais etapas dapesquisa: coleta e sistematizao dos dados das diferentes fontes; preparaodos questionrios; seleo e treinamento dos pesquisadores; organizao da

    DIAGNSTICO DA SITUAO DE SADE

    21

  • explorao do campo. importante coletar todos os dados existentes no muni-cpio relacionados ao perfil demogrfico censo e epidemiolgico da popu-lao e, tambm, os registros das empresas pblicas sobre a estrutura urbanaexistente abastecimento de gua, rede de esgotos, fornecimento de energiaeltrica, instalaes telefnicas, pavimentao de ruas, oferta de equipamentosde sade e educao.

    2. Sistematizao da rea: para facilitar a observao do territrio aconselh-vel que primeiro se percorra a rea munido de um mapa. Esse reconhecimen-to inicial dar uma idia, mesmo que superficial, importante para uma divisoemprica em microreas, que na prxima etapa ser aprimorada. Sem isso, otrabalho de observao de campo propriamente dito se torna mais difcil, assimcomo a diviso do territrio. Essa diviso inicial dever orientar a distribuiodas equipes em campo para a observao e entrevistas, assim como para a an-lise dos dados estatsticos.

    3. Trabalho de campo: realizar a observao do territrio e as entrevistas comos informantes-chaves.

    Como aplicar a ERP

    I Escolha da equipe1. Deve-se dar preferncia formao de uma equipe multissetorial. A possi-bilidade de mesclar indivduos de setores distintos sade, saneamento, habi-tao, educao, por exemplo enriquecer o trabalho, pelo fato de propiciaruma anlise da situao sob distintos pontos de vista.

    2. importante que os membros da equipe tenham algumas habilidades (11):

    determinao para descobrir e examinar registros escritos;

    disposio de aprender da gente do local e dos recursos locais;

    ouvir atentamente durante as entrevistas e as conversas informais;

    ateno e sensibilidade a tudo o que possa ser observado;

    uso do bom senso na anlise das informaes.

    II Escolha dos informantes-chavesIdentificar indivduos que por sua insero na comunidade sejam capazes derepresentar os pontos de vista da coletividade.

    1. Sugesto de informantes: funcionrios da sade formais e informais ben-zedeiras, curandeiros , professores, crecheiras, lderes comunitrios, dono dafarmcia local, moradores antigos, moradores que participam ativamente davida da comunidade.

    2. necessrio estar atento situao e organizao de cada territrio para defi-nir, em cada caso particular, o elenco de informantes adequado.

    PLANEJAMENTO EM SADE

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  • III Desenvolver um cronograma1. Programar o tempo que se julga necessrio, em dias ou semanas, para:

    seleo dos membros da equipe;

    treinamento dos membros da equipe;

    anlise dos dados existentes;

    reconhecimento inicial do campo;

    elaborao dos questionrios;

    seleo dos informantes-chave;

    aplicao dos questionrios;

    observao de campo;

    anlise do conjunto de dados coletados das distintas fontes;

    definio das microreas de risco e das necessidades de sade.

    2. Organizar essas atividades na seqncia ideal sugerimos a ordem apresen-tada neste manual e ordenadas no tempo. Isso permitir saber quanto temposer dispensado a essa atividade.

    IV Elencar os dados pertinentes anlise1. Dados sobre a comunidade: composio, movimentos migratrios, organi-zao comunitria.

    2. Descrio do ambiente: fsico, scio-econmico, distribuio dos problemasde sade.

    3. Avaliao dos servios e de suas condies: tipos de servios existentes sade, educao, centros sociais, creches , condies de acesso e suficinciada oferta em relao demanda.

    4. A equipe de trabalho dever discutir o que considera relevante investigar,para que se acrescente isso ao rol de dados a serem coletados. necessrio res-saltar que essa pesquisa deve respeitar a especificidade da necessidade de cadamunicpio, territrio ou microrea.

    V Fontes de dados1. Censo: analisar com cautela os dados censitrios em relao ao territrio.Considerar o impacto dos movimentos migratrios externos de outros muni-cpios ou de outros Estados e os internos. Esses movimentos costumam sermais significativos em municpios de grande porte, particularmente aquelesque, por seu perfil scio-econmico, atraem pessoas de fora com a expectati-va de ascenso social. Ou, contrariamente, aqueles que favorecem o xodo

    DIAGNSTICO DA SITUAO DE SADE

    23

  • para outros municpios mais atrativos em relao oferta de empregos e pos-sibilidade de melhoria das condies de vida.

    Algumas polticas pblicas municipais tambm podem propiciar movi-mentos migratrios internos, como, por exemplo, construes de vias deacesso inter ou intramunicipais quando associadas desocupao do solo.Populaes de baixa renda, quando obrigadas a se transferir para outrolocal, geralmente passam para uma condio social pior, ocupando a perife-ria da periferia, disputando os recursos escassos, com a agravante do desco-nhecimento dos recursos do novo territrio e da desagregao social nonovo ambiente.

    Tais movimentos no ficam evidenciados nos dados censitrios, sendonecessrio provocar o comentrio das lideranas locais ou mesmo dos infor-mantes-chaves.

    2. Relatrios e outros documentos (11):

    registros de planejamento municipal;

    gastos oramentrios;

    pesquisas realizadas;

    registros histricos;

    registros de hospitais e/ou unidades de sade do municpio;

    registros de outras secretarias Habitao, Meio Ambiente, Educao,Servios Sociais;

    outros documentos disponveis.

    VI Observao de campoFazer as anotaes no ato da observao e a anlise no mesmo dia. A observaode campo tem uma tcnica peculiar nesse mtodo de pesquisa. Cada dia deve serpreviamente planejado, de acordo com as observaes do dia anterior e as pistasdas entrevistas que vo sendo realizadas. O objetivo do trabalho de campo odelineamento das fronteiras das microreas de risco e a definio desses riscos.Compete s duplas de entrevistadores, ao trmino do trabalho de campo do dia observao e entrevistas analisar os dados coletados, classific-los em tipolo-gias e organizar a continuidade do trabalho para o dia seguinte. As notas deobservao dizem respeito s impresses que o pesquisador tem durante aobservao de campo referente aos itens do roteiro. So, portanto, subjetivas.

    1. Examinar o ambiente fsico da rea: caractersticas locais de infra-estruturaurbana rede de esgoto, arruamento, limpeza urbana, condies de habitao.

    2. Perfil dos moradores: scio-econmico, cultural, nvel de escolaridade,demogrfico, epidemiolgico e o que mais se julgar importante.

    PLANEJAMENTO EM SADE

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  • 3. Examinar os tipos de servios pblicos oferecidos: quanto acessibilidade,qualidade, adequao demanda.

    4. Atitudes dos informantes em relao entrevista: se o entrevistado transmi-te sinceridade ou se parece ter algum interesse em manipular a entrevista emfavor de interesses de grupos agenda oculta.

    VII Elaborao dos questionriosO modelo indicado pelo mtodo o de roteiro de entrevista semi-estruturada.Considera-se um modelo muito apropriado para obter o tipo de informaoque se pretende, ou seja, uma orientao quanto ao tipo de problema e suacausalidade e no somente a quantificao dos fenmenos.

    A entrevista semi-estruturada constitui-se de um guia roteiro que orientao entrevistador em relao s questes consideradas relevantes investigaoe que no devem ser esquecidas. Porm, tudo se passa como se fosse uma con-versa informal, em que o entrevistado deve ser deixado vontade para comen-tar o tema abordado. nesse contexto que podem, inclusive, ser abordadaspelo informante questes no pensadas pela equipe tcnica. O entrevistadordeve estar atento s surpresas e dar corda ao informante quando o assuntoparecer pertinente.

    Deve-se ter sempre em mente que o objetivo da entrevista no conhecera opinio pessoal do entrevistado, mas apreender seu conhecimento sobre oterritrio.

    1. Cada questo deve focar uma nica idia.

    2. A questo deve ser simples e objetiva.

    3. Evitar palavras que possam induzir ou influenciar a resposta, como: Vocno acha que..., No verdade que...

    4. Usar linguagem acessvel ao entrevistado, evitar termos tcnicos.

    5. Dados de identificao: data, local (microrea hipottica), nome, idade, ocu-pao, tempo de residncia, insero na comunidade.

    6. Dados sobre o territrio: sugere-se que sejam elaborados pelo conjunto dosmembros da equipe da ERP. No h uma receita pronta do roteiro; ele deve sermoldado a cada territrio. Independentemente disso, recomenda-se que seincluam algumas questes gerais, como referncias histricas, caractersticas dosolo, do meio ambiente, scio-econmicas e polticas, necessidades de sade,doenas identificadas e riscos percebidos.

    7. Perfil dos entrevistadores:

    nvel profissional mdio ou superior;

    se possvel, com experincia prvia;

    DIAGNSTICO DA SITUAO DE SADE

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  • boa comunicao;

    motivao para o trabalho de campo;

    capacitao fsica para caminhar no campo.

    VIII Anlise dos dados1. Identificao das categorias: agrupar as respostas a cada questo segun-do sua semelhana. Por exemplo, em relao a uma priorizao da comuni-dade quanto falta de coleta pblica de lixo, podemos encontrar respostasdo tipo os moradores jogam o lixo nos terrenos porque desconhecem osriscos que isso causa sua sade; o caminho de coleta no consegue pas-sar em determinada regio porque as ruas so muito estreitas; algumascaambas de coleta ficam muito distantes das residncias, construdas noalto do morro; o lixo produzido no cabe nas caambas do centro; a coleta feita duas vezes por semana. Essas respostas podem ser agrupadas nascategorias: informaes de sade, falta de infra-estrutura de limpeza pbli-ca. A definio das categorias deve ser compartilhada pelos membros daequipe. No necessrio analisar todos os questionrios para definir ascategorias. Lembrar-se de que elas devem ser coerentes com o objetivo quemotivou a elaborao da questo.

    2. Classificao das respostas: uma vez definidas as categorias, devem ser lidosos questionrios e fazer a classificao das respostas.

    3. Interpretao das descobertas:

    tomar a deciso sobre a necessidade de fazer outras entrevistas;

    confrontar os resultados das entrevistas e da observao de campocom os dados dos registros. Se houver diferenas gritantes, o grupodever definir o estudo a ser feito e a metodologia mais apropriadapara elucidar a questo;

    analisar os dados de cada categoria, condens-los em documento finalque contenha as principais concluses e submet-lo aprovao daequipe.

    IX Desenvolvimento de um plano de ao

    1. Definio de prioridades.

    2. Identificao e planejamento de pesquisas consideradas necessrias aoprocesso.

    3. Monitorao e avaliao.

    PLANEJAMENTO EM SADE

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  • PLANEJAMENTO EM SADE

    27

    seguir, iremos introduzir como proposta para o planejamento do setor dasade o Mtodo de Planejamento Estratgico Situacional Mtodo PES.

    A adoo do PES neste manual se justifica pela sua coerncia com osconceitos e abordagem anteriores, referentes ao processo social em que se pro-duz e contextualiza a sade na sociedade. Contrariamente ao planejamento tra-dicional, dito normativo, o Mtodo PES trabalha com a complexidade da reali-dade e admite que no h um conhecimento nico e que a explicao da rea-lidade depende da insero de cada ator que participa do problema, sendoassim parcial e mltiplo. O outro diferencial que apresenta em relao ao mto-do tradicional a abordagem de outras dimenses alm da econmica, comopoder, capacidade administrativa e conhecimento (7).

    Esse sistema constitui-se da combinao de trs mtodos de planejamento: oPES, o ZOPP e o MAPP. A escolha de um ou outro desses mtodos deve consi-derar o nvel no qual se pratica o planejamento, a natureza do trabalho, a com-plexidade dos problemas e a capacidade de governo.

    Neste manual, optamos por abordar sucintamente o PES, a ttulo de apresen-tao do mtodo, que sugerimos aplicar ao planejamento estratgico do siste-ma de sade em municpios de mdio e grande porte. Isso porque esse mto-do responde fundamentalmente s questes de ordem poltica, com envolvi-mento de outros atores alm daqueles diretamente relacionados com as aesde assistncia sade, como, por exemplo, representantes da sociedade civil,empresrios, polticos, secretrios da Sade e prefeitos de outros municpios,etc., o que faz com que o jogo tenha, naturalmente, fortes matizes polticos e,portanto, maior complexidade na negociao.

    J o MAPP, apresentado mais detalhadamente, aplica-se planificao ttico-operacional de unidades, de sistemas locais menos complexos, ou de progra-mas especficos de ao. Acreditamos que a aplicao do MAPP mais perti-

    MTODOS DE PLANEJAMENTO

    A

  • nente a sistemas municipais de cidades de pequeno porte e situaes de menorcomplexidade.

    Cabe ressaltar que os mtodos aqui apresentados guisa de contribuiono devem ser tomados como verdade absoluta. Em que pese a sua alta potn-cia para o enfrentamento dos problemas de sade, o gestor no deve se consi-derar escravo dos mtodos, mas, sim, estar acima deles e utiliz-los de formacoerente com sua realidade local, como ferramentas que so.

    Carlos Matus, autor do PES e do MAPP, alerta para o fato de no ser adequa-da nem prtica a adoo do mesmo mtodo de planejamento para os diferen-tes nveis do sistema. Recomenda que se combinem mtodos distintos, confor-me o nvel de hierarquia e de complexidade dos problemas.

    PLANEJAMENTO EM SADE

    28

  • PLANEJAMENTO EM SADE

    29

    mtodo PES , segundo Matus, particularmente potente para o nvel dedireo central, onde se enfrentam problemas de alta complexidade.Ainda segundo esse autor, o mtodo MAPP combina simplicidade e

    potncia, porm para enfrentar poucos problemas de baixa interao e baixacomplexidade, onde domina o processo prtico-operacional, sendo, ento,bastante adequado para a planificao de aes regionais e locais.

    O MTODOPara melhor abordar este tema, inicialmente mostramos o quadro extra-

    do de Matus, que compara as diferenas entre o planejamento tradicional e oPlanejamento Estratgico Situacional (5).

    PLANEJAMENTO TRADICIONAL PES

    Determinista (predies certas) Indeterminista (predies incertas)Objetivo (diagnstico) Subjetivo (apreciao situacional)Predies nicas Vrias apostas em cenriosPlano por setores Plano por problemasCerteza Incerteza e surpresasClculo tcnico Clculo tecnopolticoOs sujeitos so agentes Os sujeitos so atoresSistema fechado (metas nicas) Sistema aberto (vrias possibilidades)Teoria do controle de um sistema Teoria da participao em um jogo

    Quadro 1Algumas caractersticas que diferenciam oplanejamento tradicional do PES

    Fonte: O Mtodo PES Roteiro de Anlise Terica (material elaborado para o curso Governo e PlanejamentoFUNDAP Fundacin Altadir).

    PLANEJAMENTO ESTRATGICOSITUACIONAL PES

    O

  • PLANEJAMENTO EM SADE

    30

    Matus advoga que o planejamento tradicional impotente para lidar com acomplexidade da realidade social, por ter sido concebido com princpios deter-ministas, em que o clculo se baseia na predio e no considera a capacidadede planejamento de outro ator nem a ocorrncia de surpresas ou a existncia deincertezas, enquanto a realidade um sistema complexo de incerteza dura, comproblemas quase-estruturados (quadro 2). Chama-se de incerteza dura pela pre-cariedade de previso do futuro, uma vez que, dada a complexidade do contex-to de um determinado problema, o leque de desdobramentos, assim como asconseqncias das atitudes do gestor, so inmeros: alguns conhecidos, outrospossveis de prever e grande parte desconhecidos. Alm disso, h situaes ini-maginveis que ocorrem no meio de um processo e que freqentemente pegamde surpresa o gestor menos avisado, os chamados incndios, e at mesmo osacidentes e as catstrofes naturais. O mtodo nos reporta a encarar a realidadecom todas essas nuances em que, obviamente, no possvel trabalhar comrelaes diretas de causa e efeito, pelo que acabamos de expor.

    MODELOS DE SISTEMAS

    I Determinista puro

    II Estocstico

    III Incerteza quantitativa

    IV Incerteza dura

    CARACTERSTICAS

    Um s passado, um s futuro, segue somente leis. A predio exata possvel.Ex.: movimento de um astroem rbita.

    Segue leis probabilsticas, a cada possibilidade associada uma probabilidade conhecida.Ex.: leis de Mendel sobre hereditariedade.

    As possibilidades podem ser enumeradas, mas no possvel atribuir-lhes umaprobabilidade objetiva. Ex.:no jogo do coelho num cr-culo de 10 casinhas, sabe-seo nmero de possibilidades,mas no a probabilidade deele entrar em cada casa.

    Somente algumas possibilidades podem ser enumeradas e no possvel atribuir nenhumaprobabilidade objetiva. Ex.: qualquer prognsticosobre o futuro dentro do contexto social.

    TIPO DE PROBLEMA

    Bem-estruturado

    Bem-estruturado

    Bem-estruturado

    Quase-estruturado

    Quadro 2Modelos de sistemas e suas principais caractersticas

    Fonte: O Mtodo PES Roteiro de Anlise Terica (material elaborado para o curso Governo e PlanejamentoFUNDAP Fundacin Altadir).

  • 31

    O PES mostra-se adequado para lidar com os problemas quase-estruturados1

    dos sistemas de incerteza dura, por respeitar os requisitos bsicos necessriosao planejamento em sistemas complexos. Dessa forma:

    reconhece a existncia de outros atores em situao;

    reconhece sua capacidade de planejamento;

    explica a realidade a partir dessa tica.

    Dispe de mtodos para lidar com surpresas e diferenciar os problemasbem-estruturados dos quase-estruturados, reconhece, a existncia de recursosescassos poltico, econmico, cognitivo e organizacional , til para tomadade decises no presente e preparado para renovar o clculo sobre o futuro, deacordo com as mudanas da realidade.

    Antes de discutirmos o mtodo propriamente dito, necessrio uma abor-dagem das condies a que o gestor municipal deve estar atento, no sentidode garantir efetividade s aes desenvolvidas em seu governo, quais sejam:

    o projeto de governo;

    sua capacidade para governar;

    sua governabilidade.

    Entende-se por capacidade de governo o elenco de qualificaes reunidaspelo gestor e seu staff administrativo que lhes conferem a competncia neces-sria compreenso, elucidao e enfrentamento de problemas:

    bagagem intelectual;

    experincia;

    expertise;

    capacidade pessoal e institucional de governo.

    O projeto de governo ou proposta de governo consiste na seleo de proble-mas que o gestor se dispe a enfrentar durante seu perodo de governo e aestratgia escolhida para esse enfrentamento. A escolha dos problemas deveser criteriosa, estratgica, pois implica a capacidade de resolv-los e a viabili-dade poltica desse enfrentamento, assim como a obteno de resultados den-tro do perodo de governo do gestor.

    A governabilidade diz respeito relao entre o peso das variveis que o atorcontrola e o das que no controla somada capacidade de percepo que o ges-

    PLANEJAMENTO ESTRATGICO SITUACIONAL

    1. Consideram-se problemas bem-estruturados aqueles para os quais se podem enumerar todas as variveis,precisar todas as relaes entre elas e cuja soluo objetiva. Os problemas quase-estruturados podem ter ape-nas algumas de suas variveis e as relaes entre elas enumeradas, sua soluo situacional, discutvel segun-do interesses e posies.

  • tor tem dessa relao, ou seja, de sua limitao quanto ao controle majoritrio dedeterminada situao. essa capacidade de percepo que lhe possibilita identi-ficar entre os atores envolvidos aqueles que tm maior controle da situao, asalianas possveis, os enfrentamentos inevitveis, as operaes mais viveis;enfim, abre a possibilidade de uma anlise estratgica da seleo de problemas.

    O gestor no pode se esquecer da necessidade constante de garantir umbalano positivo ao seu governo, ou seja, um saldo politicamente satisfatrioda sua gesto, decorrente das medidas mais ou menos simpticas ou aceitas noambiente poltico e pelo eleitorado. Esse balano depende do manejo dos cha-mados trs cintos:

    poltico: legalidade e representatividade poltica, tica, representativi-dade dos partidos, equilbrio dos poderes, sintonia poltica do projeto;

    econmico: manejo da economia;

    intercmbio de problemas: saldo do enfrentamento de problemas demaior valor para a populao.

    importante lembrar que nunca se deve apertar os trs cintos ao mesmotempo. Os efeitos negativos de um devem ser compensados com os efeitospositivos de outro.

    COMO APLICAR O MTODO

    I Identificao, seleo e priorizao dos problemas Neste passo necessrio fazer a anlise da situao. O autor utiliza esse con-ceito para expressar a existncia de diferentes explicaes da realidade a par-tir da interpretao dos distintos atores sociais e dos conflitos gerados peladiferena de interesses. A tcnica de Estimativa Rpida Participativa mostra-se bastante coerente com o PES e tem sido utilizada nas experincias dediversos pases. Essa tcnica foi apresentada pormenorizadamente no captu-lo anterior.

    A seleo dos problemas deve atender aos seguintes critrios (5):

    1. Valor poltico do problema:

    para o ator central e outros atores;

    para o partido poltico do ator central;

    para a populao em geral;

    para a populao afetada.

    2. Tempo de maturao dos resultados:

    resultados fora ou dentro do perodo de governo;

    PLANEJAMENTO EM SADE

    32

  • maturao em tempo humano;

    maturao em tempo social.

    3. Vetor de recursos exigidos pelo enfrentamento do problema em relao aovetor de recursos do ator:

    poder poltico;

    recursos econmicos;

    recursos cognitivos;

    capacidade organizativa.

    4. Governabilidade sobre o problema:

    controle dos ns crticos de maior peso no problema;

    fraco controle dos ns crticos;

    ns crticos fora do jogo.

    5. Resposta dos atores com governabilidade:

    colaborao dos atores com governabilidade;

    rejeio dos atores com governabilidade;

    indiferena dos atores com governabilidade.

    6. Custo de postergao:

    imediato e alto;

    mediato, lento e baixo.

    7. Exigncia de inovao e continuidade:

    problemas que exigem inovao;

    problemas que exigem continuidade.

    8. Impacto regional:

    equilibrante;

    desequilibrante.

    9. Impacto sobre o balano poltico de gesto ao trmino de governo:

    da gesto poltica;

    do balano macroeconmico;

    de intercmbio de problemas especficos.

    33

    PLANEJAMENTO ESTRATGICO SITUACIONAL

  • Sugere-se que, para facilitar a visualizao e a anlise desses critrios, sejaelaborado um protocolo de seleo dos problemas em forma de grfico no qualas colunas enumeram os critrios, os problemas so listados nas linhas e noquadro de interseo anota-se o resultado da anlise:

    II Descrio do problemaO problema deve ser declarado por um ator a partir da anlise situacional dopasso anterior.

    Segundo Matus, a diferena entre um pr