Revista Louis Braille 7

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8/18/2019 Revista Louis Braille 7 http://slidepdf.com/reader/full/revista-louis-braille-7 1/13 JULHO | AGOSTO | SETEMBRO | N.7 | 2013 Todos os direitos reservados, ACAPO Louis Braille Como brinca a criança com deficiência visual? Incluir pela Dança Televisão acessível Braille eletrónico: um caso de sucesso    I    l   u   s    t   r   a   ç    ã   o    d   e   s   e   n    h   a    d   a   p   o   r    A   n   a    L   u    í   s   a    S    i    l   v   a  ,   u    t   e   n    t   e    d   a    D   e    l   e   g   a   ç    ã   o    d   e    L   e    i   r    i   a    d   a    A    C    A    P    O  .

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Todos os direitos reservados, ACAPO

Louis Braille

Como brinca a criança com deficiência visual?Incluir pela Dança

Televisão acessívelBraille eletrónico: um caso de sucesso

   I   l  u  s   t  r  a  ç   ã  o   d  e  s  e  n   h  a   d

  a  p  o  r   A  n  a   L  u   í  s  a   S   i   l  v  a ,  u   t  e  n   t  e   d  a   D  e   l  e  g  a  ç   ã  o   d  e   L  e   i  r   i  a   d  a

   A   C   A   P   O .

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  Ficha Técnica

EDIÇÃO E SEDE ACAPO, Avenida D. Carlos I, n.º 126 9º andar 1200-651 Lisboa

CONTACTO GERAL Telefone: 213244500 Fax: 213244501 E-mail: [email protected] Carlos Manuel C. Lopes ([email protected])COORDENAÇÃO Rúben Portinha ([email protected])COORDENAÇÃO ADJUNTA Pedro Velhinho ([email protected]), Rodrigo Santos ([email protected])REDAÇÃO Cláudia Vargas Candeias ([email protected]), Pedro Velhinho, Rodrigo Santos, Rúben PortinhaREVISÃO Susana Venâncio ([email protected])LAYOUT Think HighPAGINAÇÃO Think HighPERIODICIDADE TrimestralISSN n.º2182/4606

@ Louis Braille – Revista especializada para a área da deficiência visual 2013. Todos os direitos reservados. Todo oconteúdo desta revista não pode ser replicado, copiado ou distribuído sem autorização prévia. Os artigos de opiniãopublicados na Revista são da inteira responsabilidade dos seus autores. Se pretende deixar de receber a nossarevista, envie-nos um e-mail por favor para o endereço [email protected]

Os conteúdos desta revista foram escritos segundo as regras do novo acordo ortográfico.

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  Nesta Edição...

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Editorial

 

Por Rúben PortinhaCoordenador editorial LOUIS BRAILLEDireção Nacional da ACAPO

 Ana Rita Barata, Coreógrafa e diretora artística da Vo'arte

Por Ana Margarida Carvalho e Rita PereiraPsicólogas na ACAPO

Por Rui Mouta

Técnico jurista da Entidade Reguladora para a Comunicação Social

Entrevista

Brincar é um assunto sério!

Acessibilidade Televisão para todos

7 Educação Alunos com deficiência visual no Agrupamento de Escolas de Rodrigues de Freitas. Agrupamento de Referência, Experiência com Resultados de ExcelênciaPor Fernando Jorge Alves CorreiaProfessor de Educação Especial do Agrupamento de Escolas Rodrigues de Freitas (Porto)

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  É extremamente importante que este processo sejaacompanhado de perto por todos aqueles que façamparte da vida quotidiana da criança com deficiênciavisual. Esta é a base do chamado modelo ecológico,segundo o qual é privilegiada a interação da criançacom a família em que se insere, para que o processode evolução seja acompanhado de forma sincronizada,algo que permitirá à criança e a quem a rodeia uma

interação mais consistente nas relações pessoais e doindivíduo com o meio.

  Apesar de, neste campo, existir algum trabalhorelevante no nosso país, estamos conscientes de que

muito haverá ainda por fazer. Nomeadamente, énecessário desenvolver o know-how técnico, atravésdo trabalho em rede, da potenciação e do aumento dosrecursos disponíveis, nomeadamente recursoshumanos. Mas antes de tudo, é preciso discernimento,da parte de quem dirige, para perceber que apostarnuma integração e desenvolvimento eficazes dascrianças com deficiência não é um assunto secundário.Trata-se, isso sim, de uma das mais fortes vias paragerar cidadãos que estejam preparados paradesempenhar da melhor forma possível o seu papel nasociedade.

Mas antes de tudo, é preciso discernimento, daparte de quem dirige, para perceber que apostarnuma integração e desenvolvimento eficazes dascrianças com deficiência não é um assuntosecundário.

LB

 

Por Rúben PortinhaCoordenador editorial LOUIS BRAILLEDireção Nacional da ACAPO

  Tão importante como garantir o presente, tendo emconta as boas e as más experiências do passado, épreparar o futuro. Independentemente dascaracterísticas de cada pessoa, a cultura ocidental naqual nos inserimos tem por princípio o facto de cadaindivíduo ser encarado como um cidadão de plenodireito.  Eis porque é fundamental, desde cedo, dotar o ser

humano de competências que lhe permitam crescer edesenvolver-se em conjunto com os seus pares. Ouseja, é desde criança que se trabalha a perceção domundo, bem como o conhecimento das capacidades,sentidos e limitações do indivíduo.  No caso das crianças com deficiência, maisparticularmente no âmbito da deficiência visual, odesenvolvimento dos outros sentidos assume um papelfundamental com vista a colmatar aquele que nãofunciona corretamente. Através deste processo, acriança aprende a conhecer-se, toma contacto com omeio envolvente e, por via da informação que recebe,começa a construir uma ideia de um mundo ao qualpertence.

Neste processo, o ato de brincar, enquanto meio deexperimentação e de lazer, ajuda ao desenvolvimentode uma série de competências essenciais a umcrescimento equilibrado.

Editorial

“O ato de brincar, enquanto meio deexperimentação e de lazer, ajuda aodesenvolvimento de uma série de competênciasessenciais a um crescimento equilibrado”

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na quantidade que nós desejaríamos ou equiparandoao que é o dito parâmetro normal cultural não existemmilhares de espectáculos de pessoas com deficiênciavisual em palco a um nível profissional. Por isso, nessesentido até se poderia chamar inovadora ouimpulsionadora. Mas conseguimos uma novalinguagem artística porque quem faz o projeto incute-lhe uma dinâmica diferente e, por isso, nova. Ou seja,cria-se com estas pessoas e com o seu potencial, umalinguagem absolutamente única porque é delas, porqueelas adquirem competências e fórmulas paradesempenharem aquilo que lhes é dado como umatarefa, neste caso, com parâmetros muito desenhados,porque a peça não tinha muitas margens - se calhar aocontrário de algumas peças que gosto de coreografar e

que têm componentes da improvisação. E foi essaautenticidade de cada espectáculo que todos nós, daequipa portuguesa, sentimos. E isso é mesmo novo nosentido da linguagem artística.Uma das conclusões a que todos nós chegámos foique nunca sabíamos o que ia acontecer. Cada noiteera sempre diferente. Porquê? Porque as informaçõeseram de tal forma precisas para o Luís como para aJoana que nem sempre as coisas duravam da mesmamaneira ou nem sempre iam na direção que nósqueríamos. Ou seja, a componente de não ver, sentirde outra maneira, incutiu ao espectáculo umaautenticidade única. Então éramos todos nós

agarrados à cadeira a ver se o Luís não saia de cena,se ele acertava na luz, se a Joana conseguia tocar-lhena mão porque havia também esta exploração deprocurarem ver com o seu próprio corpo. E isso secalhar incutiu-lhe uma autenticidade única, umasensibilidade dentro dessa linguagem artística que lhepermitiu um tom dentro do espectáculo muito forte. Masisto principalmente porque foi feito por estas pessoas. Acho que se tivessem sido outras quatro… Não houveum espectáculo igual ao outro apesar de identificarmoso percurso da peça e de saber se aquele dueto eraigual ao outro. E isso fazia com que se vivesse ascoisas de uma forma que eu diria mesmo nova paramim e acho que para o público também porque sentiaessa tensão.

L.B.: Colocaram em palco lado a lado artistas come sem formação e com e sem deficiência visual.Para quem dirigiu e coreografou estasperformances qual destas duas desigualdades foimais desafiante? A.R.B.: Quando partimos para um projeto que é só eexclusivamente profissional, não de diversão, estamosnum patamar de entendimento que estamos a trabalharcom um objetivo comum. Eu encaro estas pessoascomo um bailarino. Dou-lhe as mesmas ferramentasque a um bailarino. Claro que estas pessoas que não

têm formação levam mais tempo a aprenderem anoção de espaço, tempo e ritmo. Portanto, nãodominam uma série de componentes como umbailarino que dança a sua vida toda. E neste casoestamos a falar de dois bailarinos, principalmente, o

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Ana Rita BarataCoreógrafa e diretora artística da Vo'arte

  Entre 2011 e 2013, a Associação Vo'arte, em

parceria com a Estónia e Noruega, desenvolveu umprojeto ímpar que abriu os palcos de dançacontemporânea a pessoas com deficiência visual.Com o experimentalismo caraterístico de qualquerprojeto pioneiro e o profissionalismo de umacompanhia de dança contemporânea, o FRAGILEveio afirmar a dança como um meio privilegiado dereabilitação abrindo portas à possibilidade deprofissionalização de pessoas com deficiênciavisual nas artes performativas. Após dois anos depesquisa que envolveu dezenas de intérpretes comdeficiência visual, Joana Gomes e Luís Oliveira,ambos associados da ACAPO, foram selecionadospara integrar uma performance inclusiva que teve a

sua estreia mundial em março passado. O projetoterá o seu culminar em outubro com a estreia detrês documentários, realizados por Pedro SenaNunes, onde está documentado todo o processo.Mas representará esse momento o ponto final doFRAGILE? 

Por Redação Louis Braille

Louis Braille: Desenvolveram um projeto artísticoque reuniu um conjunto de diferentespersonalidades, qualidades de movimento, desejose perceções. Desta combinação surgiu uma nova

linguagem artística? Ana Rita Barata: Cada projeto é identificado por quemo faz. Ou seja, ele resulta sempre numa novalinguagem artística mas não no sentido de inovadora.Se calhar não existem muitos projetos ou pelo menos

Entrevista

Integrar pela Dança

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Bernardo Gama que fez ballet Gulbenkian, teve umacarreira internacional muito forte é uma pessoa com

uma noção de palco muito intrínseca e a SofiaSoromenho também. Enquanto o Luís [Oliveira] e aJoana [Gomes], um muito diferente do outro, comdisponibilidades muito diferentes, mas os dois muitoávidos de perceber o que é isto da composição docorpo, da dança contemporânea, de ter um gesto atrásdo outro… Por isso, eu não senti essa senti essadesigualdade e acho que eles sentiram essafrontalidade de pô-los todos no mesmo patamar. Porexemplo, uma coisa fascinante era o início doaquecimento, sempre na base do yoga porque tambémsou professora de yoga. Eles tiveram uma hora deyoga todas as manhãs, claro que para lhe ensinar a

sequência demorei muito mais tempo do que a umapessoa que me vê a fazer e copia. Por exemplo, umacoisa que aprendi é que quando estamos com umapessoa com deficiência visual temos de falar que«nunca mais acaba». E portanto isso foi uma coisamuito interessante do ponto de vista da linguagem. Adificuldade para mim, sempre em todos os projetos,seja com pessoas com ou sem deficiência, é sentir quetudo isto faz um sentido, para se pôr em palco e paraalguém poder desfrutar e ver que aquela componenteartística passa para o lado de lá.

L.B.: De que forma vê que este projeto possa estar

a contribuir para profissionalização de pessoascom deficiência visual nas artes performativas? A.R.B.: O projeto pode contribuir momentaneamentena vida destas duas pessoas, ou seja, umapercentagem muito baixa. Para uma profissionalizaçãodesta área, eu acho que para verdadeiramente aspessoas com deficiência visual acreditarem que atépodiam estudar para serem bailarinos era preciso quenos meios educativos, nas escolas, houvesse essasensibilização e se partisse do princípio que umapessoa com deficiência visual tem todas ascapacidades de autonomia físicas. Há muito trabalho afazer nesta área. Em março quando a Clara Antunes[Produtora Cultural na Associação Vo'Arte] me disseque se tinham inscrito cento e tal pessoas parasessenta vagas eu pensei “Mas como é que épossível?”. Depois quando eu falava com estaspessoas elas diziam que não existiam coisas destas,que havia danças de salão, por exemplo, mas destegénero, onde podiam descobrir o corpo e outras coisasque lhes dão valências para a vida diária, como aperceção do espaço ou do som, não existia nada. Eessa é a parte que considero absolutamenteimportante que são estas pessoas que perderam avisão do nada. O pânico, a dificuldade de aceitação e obloqueio do corpo, tudo isso a dança ou este tipo deabordagem do trabalho do corpo permitiria reinserção

profissional, possibilidade de voltarem a agarrar osseus filhos, voltarem a acreditar… Porque é muitodifícil falar em reinserção social se as pessoas não têmautonomia, se as pessoas nem sequer conseguem sairà rua, se precisam sempre de alguém que as agarre,se não conseguem movimentar-se dentro de uma

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casa. E acho que este trabalho do corpo lhes permiteacreditar que o corpo tem outras potencialidades,

outras valências apesar de não verem.

L.B.: Portanto mais do que a profissionalizaçãoestamos a falar sobretudo numa reabilitação… A.R.B.: Sim, isso sim. E depois de aprender a dançatalvez descobrir uma via profissionalizante. Porquenem toda a gente quer se bailarino, nem toda a gentetêm o know-how para ser bailarino. Uma coisa élibertar o corpo mas depois nem toda a gente querfazer disso a sua vida. Eu imagino, por exemplo, se àJoana Gomes lhe fosse dada a oportunidade de elapoder estudar e lhe dessem garantias financeiras paraque ela se pudesse dedicar oito horas por dia à

atividade, eu acho que ela não tinha opção. Mas paraisso é preciso criar condições para que estas pessoaspudessem fazer este género de trabalho e não é só aeles, às estruturas culturais também, porque estasmuitas vezes não têm autonomia para poder criarpostos de trabalho. Companhias em Portugal comtrabalho fixo há muito pouco. E falo da Joana, comofalo do Luís, como falo de muitos outros…

L.B.: E entre dezenas de participantesselecionaram dois associados da ACAPO, a JoanaGomes e o Luís Oliveira. O que encontraram nestesdois jovens? A.R.B.: Primeiro uma vontade muito grande de quereraprender mais, aprofundar mais. Diferentesmaturidades, porque a Joana é muito jovem e o Luístem uma vida profissionalizante. É um homem queestuda, muito cerebral e com uma maturidade muitodistinta. São duas gerações distintas que secomplementavam muito um ao outro e isso foi umacoisa muito interessante. É muito difícil dizer “porqueforam aquelas duas”. Foi muito intuitivo. Apeteceu-memuito trabalhar com estas perspetivas diferentes, duasgerações diferentes, o jogo de ser um homem e uma

mulher, e uma sensibilidade muito à flor da pele dequem procurava essa oportunidade.

L.B.: Que mais-valias encontraram nodesenvolvimento de uma parceria internacionalcom a Estónia e Noruega? Tal como ainda sucede

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em Portugal, nestes países a inclusão de pessoascom deficiência visual nas artes performativasapenas é feita por via de projectos específicos deinclusão social?  A.R.B.: O facto de ser estarmos ligados a níveleuropeu deixa contactos para todo o sempre. Por maisque haja uma desconexão, uma vez que o projetoacabou, ficarão sempre os contactos, a possibilidadede voltar, de trabalhar, há sempre uma porta aberta.Outra mais valia é a oportunidade de estas pessoasconhecerem outras realidades. E nós também.Conhecemos outros parâmetros, outros meios de

trabalhar. Poder ir em viagem, poder estar numadinâmica absolutamente profissional, num projetoeuropeu, tal e qual como ele é, sair em digressão…Isto é o que qualquer Companhia quer: fazerespectáculos. A partilha com o público, com asrestantes equipas, a língua, os costumes. Viajar econhecer o mundo é sempre uma riqueza brutal. Fazê-lo então numa via profissionalizante é fantástico! Atéporque isto deixou sementes para outras coisas sedesenvolverem (espero eu!). No que respeita àrealidade dos outros países, em Portugal não há umaoferta clara, óbvia, pelo menos nesta área da dança.Volto à mesma questão, se calhar há outras ofertas,por exemplo, uma pessoa com deficiência visual pode

ir a um ginásio fazer aulas do que ela quiser. Cada paístem realidades diferentes mas não existe uma práticade oferta global. No entanto, na Estónia como naNoruega existem também trabalhos muito específicosdentro das universidades e dentro das respetivas«ACAPO» mas muito pontuais. Agora há aqui um

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quarto parceiro muito importante que é o Reino Unidoque esteve com a Isabel Jones a organizar oSymposium na Estónia. Aí sim temos uma perpetivaartística completamente diferente e do ponto de vistano know-how também. Ou seja, há toda uma estruturaeducativa para apoia que estas pessoas venham aseguir uma via profissionalizante. Há profissionais daárea cegos, há coreógrafos cegos, há artistas cegosque lideram. Por exemplo, agora no In'Arte trouxemoso Patrick, da Irlanda que dirige o Instituto Nacional daReabilitação, e que tem baixa visão. Existem no ReinoUnido exemplos de liderança na área política, social,

artística, de outro nível. Isto vem de onde? Vem dosistema educativo. Vem da base e nós não temos essabase.

L.B.: Terá o FRAGILE a si associada umasustentabilidade que lhe permitirá ter continuidadesem o apoio do seu principal financiador, oPrograma Cultura da União Europeia? A.R.B.: Sim, tem sustentabilidade sem o programaCultura. A continuidade a longo tempo tem a ver com aforma como poderemos promovê-lo porque vamosvendê-lo. Vamos vender um produto que custa «x» evamos ver quem o compra. Tem essa sustentabilidadeporque a Vo'Arte é apoiada pela Direcção Geral das Artes a quatro anos, portanto, ganhou o quadriénio, enós vamos fazer esse investimento daqui para a frentedentro das nossas capacidades, também financeiras,obviamente. Se calhar se houvesse mais dinheiropoderíamos fazer outro género de trabalho maisrápido, célere, mais profundo. LB

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Matemática, não quer dizer que se possa abandonar aGrafia Matemática Braille, muito pelo contrário. Deacordo com a nossa experiência, o trabalho dos alunossó é possível com sucesso se a utilizarem. Osdocentes apresentam alguma relutância ao seu usonestas condições, afirmando que continuam a nãoperceber o que o aluno escreve. Tenho realçado que secontinua a utilizar o braille, apenas mudaram osequipamentos e os suportes.

  A maior parte dos alunos utiliza a linha braille aomesmo tempo que a síntese de voz. Dizem queconseguem trabalhar mais rapidamente. Quando setrata da leitura de textos, é possível ouvi-los a umavelocidade maior, demorando menos tempo narealização da tarefa. Se precisarem de ver a grafia dealguma palavra ou ler algo de mais difícil entendimento,recorrem ao braille.  Diminuiu o uso de papel durante as minhas aulas deBraille. Quando se trata de alunos em início deaprendizagem, privilegio o braille de seis pontos, sendomeu objetivo que haja uma familiarização com osprincípios que presidiram à criação do sistema. Apenas

mais tarde será abordado o de oito.  Parece-me útil que, quando o aluno passe para aleitura do braille de oito pontos, a tabela não apresenteos sinais básicos diferentes, o que viria a ser umretrocesso na sua aprendizagem.  Por que razão não começar a aprendizagem com aleitura de células de oito pontos? Já experimentei e osalunos demonstraram uma aprendizagem mais lenta,dado ser mais difícil conjugar combinações de pontosnum espaço com maior amplitude. Não discriminambem o ponto final e a vírgula, não detetam ocorrênciasde números (que se fazem acrescentando o ponto 8 àsletras tradicionalmente usadas), nem de maiúsculas(conseguidas pelo acrescento do ponto 7).  Quando é necessário ensinar braille a crianças dos1º e 2º Ciclos, que, em geral, não dominam as TIC, asituação complica-se, dado que não são autónomas nautilização de terminais braille. Essa dificuldade impedeo seu uso em sala de aula, para já. Veremos o que nosreserva o futuro. Será necessário que tanto osequipamentos, como as tabelas, permitam quecrianças possam ler de forma cómoda. Faço notar queuma criança de seis anos nunca poderá começar pelobraille de oito pontos.  É por isso que o dilema da escolha do braille de seisou de oito pontos deve ser refletido sob o ponto devista pedagógico, como vimos, mas também sob o

anatómico. Se há crianças cujas pontas dos dedos nãoabarcam os oito pontos da célula, quero que saibamque encontrei raparigas de dezasseis anos queexperimentam também dificuldades nesse campo, oque torna muito mais lenta a leitura no terminal em

“Diminuiu o uso de papel durante as minhas aulasde Braille”

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Agrupamento de Referência,Experiência com Resultados deExcelência

Por Fernando Jorge Alves CorreiaProfessor de Educação Especial do Agrupamento de

Escolas Rodrigues de Freitas (Porto)  Neste artigo relato a minha experiência de utilizaçãode braille eletrónico nas aulas, que tem sidogratificante. Tenho usufruído da oportunidade de utilizarterminais e linhas braille em contexto escolar,especialmente equipamentos com quarenta células.Foi, até agora, privilegiada a leitura, embora hajaalunos que gostem de escrever.  Alguns usam os equipamentos apenas nas aulas deBraille e nas de TIC, outros em mais disciplinas.Quanto ao primeiro caso, não se observaram grandesdificuldades. Quanto ao segundo, em Matemática eFísico-Química, não tem sido fácil conseguir que osalunos utilizem estes equipamentos com eficácia.Quando se trabalha com expressões matemáticascujos enunciados ultrapassam as quarenta células, osalunos perdem muito tempo na sua resolução, o quenos levou a recorrer a exemplares em braille dosenunciados aquando da realização de fichas e detestes, mesmo que escrevam as respostas nocomputador. Há alunos que preferem respondertambém da forma tradicional, utilizando a máquinadatilográfica braille. É de realçar que não podemdesperdiçar tempo em determinadas atividades, o quetem sucedido quando recorrem ao computador. Bastapensarmos no tempo que se perde entre ler o

enunciado, trocar de janela, escrever na folha derespostas, além de que o espaço de leitura se reduz aquarenta células.  Ao contrário do que muitas pessoas julgam, usar ocomputador e uma linha braille nas aulas de

Educação

Alunos com deficiência visual noAgrupamento de Escolas deRodrigues de Freitas

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relação à que fazem em papel. Condições anatómicasimpedem-nas de retirar todas as vantagens das TIC.

  Recorremos à leitura utilizando braille de seis pontos,mas, como as tabelas existentes são insuficientes paraas suas necessidades, algumas vezes retornamos àleitura em papel.

  Há raparigas (felizmente, poucas) que consideramque deslizar os dedos na superfície de leitura daslinhas braille é mais abrasivo que ler em papel. Penso

que os fabricantes destes equipamentos deverãoreflectir sobre os materiais a utilizar, uma vez que setrata de pessoas que se servirão deles por largosperíodos de tempo. No caso dessas alunas,infelizmente, tal “desconforto” serviu para justificar asua rejeição.

  Quanto à velocidade de leitura, como é costume, eladepende do treino. Há mesmo alunos que conseguemler melhor no terminal braille. No entanto, verifico que,na maior parte dos casos, mudar de linha acarretaalguma perda de tempo. Lembremos que se trata delinhas de quarenta células, enquanto as dos seusmanuais, impressos em papel, não atingem os trintacarateres. Esta diferença obriga-os a uma readaptaçãode movimentos. Experimentei a leitura com linhas decomprimento semelhante às dos manuais em papel e avelocidade tornou-se idêntica.  Há alunos que apenas utilizam as linhas para realizaras tarefas escolares, mas outros servem-se delas nosseus momentos de lazer, tanto para ler, como paranavegar na Internet ou para jogar.

  Há ainda outro conjunto de pontos que joga a favordo uso de terminais braille: a leitura de manuais emsuporte digital (exceto o de Matemática e o de Físico-Química), acesso a dicionários e enciclopédias (háainda muitos casos de inacessibilidade nesta área),criação de cadernos diários mais «flexíveis»,

“Quanto à velocidade de leitura, como é costume,ela depende do treino”

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possibilidade de aceder a plataformas digitaiscolaborativas disponíveis na escola (Moodle, por

exemplo), leitura cómoda de páginas da Internetescritas em língua estrangeira, diminuição no consumode papel...

  Apesar da sua versatilidade, podendo ligar-se adiversos dispositivos ou, em alguns casos, trabalhar deforma autónoma, as linhas braille carecem de

melhoramentos, começando pela necessidade detornar mais barata a célula, como forma de diminuir oseu preço. É preciso caminhar para os ecrãs táteis oumatriciais, os quais apresentem áreas mais bastaspreenchidas com pontos em relevo. A não ser assim,será necessário, pelo menos na Matemática, continuara utilizar o papel.  Além disso, subsiste o problema da representação degráficos, tabelas e mapas. As linhas braille atuais nãopermitem uma análise fácil deste material, o que setorna num óbice à sua utilização a tempo inteiro.  Na minha Escola, em termos do trabalho dos alunos,verifica-se que houve uma grande melhoria.

Os terminais braille têm vindo a substituir, comsucesso, o caderno diário tradicional, melhoraram emmuito o acesso à informação em texto, mas quanto arepresentações gráficas, fica claro que estamos comodantes, isto é: o melhor é a representação em papelatravés dos chamados "relevos"!  No prazo de dez anos, se continuar o investimentoem equipamentos que permitam a leitura braille,teremos muitos mais leitores que escritores. Haverámuitas pessoas que lerão em braille, mas escreverãoem teclados comuns de computador ou de outrosdispositivos electrónicos. E é preciso prepararmo-nospara este desafio.  Por outro lado, as linhas braille atuais ainda nãoesgotaram todo o seu potencial ao nível do acesso àinformação. Contudo, ficou bem patente pelo expostoque, se não se apostar em "ecrãs táteis", o braille empapel ainda será a melhor alternativa em algumassituações. Não estarei a sugerir, aliás, que sedesenrole o mesmo processo que se verificou ao nível

da escrita impressa a tinta com os leitores de livroselectrónicos, que tentam imitar a leitura em papel?

“Subsiste o problema da representação degráficos, tabelas e mapas. As linhas braille atuaisnão permitem uma análise fácil deste material”

“No prazo de dez anos, se continuar o investimentoem equipamentos que permitam a leitura braille,teremos muitos mais leitores que escritores”

LB

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Por Ana Margarida Carvalho e Rita PereiraPsicólogas na ACAPO

  Brincar é uma necessidade natural partilhada portodos os mamíferos. Para o Homem, brincar é sinónimode divertimento, de distração, de fuga da realidade edas obrigações sociais inerentes ao trabalho.Contrariamente para a criança, brincar é um assuntomuito sério. Brincar está então para a criança, como otrabalho está para o adulto. Do mesmo modo que oadulto procura realização pessoal através do trabalho,a criança, quando brinca, também se realiza porque sepõe à prova, porque se experimenta em conquistas efrustrações, descobre os seus limites e potencialidades,aprende, comunica e estabelece relações de afeto.

Quando a criança brinca espontaneamente está aexpressar e a pôr em prática o seu imaginário,

reproduzindo não só o mundo exterior que vaiconhecendo, mas também o seu mundo interior. Destemodo também comunica, estabelece ligações afetivas,transmite e recebe informação essencial, numa faseem que ainda não domina a linguagem das palavras.

Brincar para a criança tem diferentes e importantesfunções: é fonte privilegiada de prazer, permite-lheacalmar angústias, organizar a agressividade,experienciar as mais diversas situações, colecionarvivências e integrar regras da vida em sociedade.

Sabemos que o primeiro sorriso de um bebé aparecegeralmente em resposta a um rosto humano. Estareacção é automática e significa que temos uma

predisposição inata para nos relacionarmos com ooutro. As tentativas de comunicar da parte da criançasurgem inicialmente pelo choro e pelo sorriso, pelossons que emite quando palra.

É a boa resposta do outro a estas manifestações quepermite o desenvolvimento global do bebé logo desde

Educação

Brincar é um assunto sério!

os primeiros meses de vida, organizando as suasinterações e transformando-as em comunicação. Osprimeiros passos neste domínio dão-se assim atravésdo estímulo que as “gracinhas” e as primeirasbrincadeiras de interação provocam e são elas quegeram na criança o prazer desta fase. Nesta altura umaboa gargalhada da criança pode resultar devocalizações e sorrisos do adulto, do toque ou do jogode lançar ou agitar a criança que muitos gostam defazer.

Posteriormente, próximo do final do primeiro ano devida, o aumento gradual de conhecimento sobre omundo e a forma como este funciona traz à criançafrustrações e angústias normais e necessárias porquea impelem a crescer. Por exemplo, a consciência de

que o mundo tem muito de desconhecido e de que amãe não está sempre presente é extremamenteassustadora e geradora de uma das primeirasangústias – angústia de separação. Esta angústia levaa criança a procurar descobrir, através das suasbrincadeiras, formas de compreender que a ausênciada mãe não significa o seu desaparecimento definitivo.Nesta altura, o ato de esconder-se e voltar a aparecer,como fazê-lo com brinquedos ou com outros é, não sóum jogo altamente prazeroso para a criança, comoextremamente necessário para a aquisição da noçãode que os objetos ou pessoas existem, mesmo que nãoestejam ao seu alcance. Esta capacidade é um fator-

chave do desenvolvimento cognitivo mas tambémafetivo na medida em que a sua angústia de separaçãoserá, a partir desta altura, muito melhor tolerada. Domesmo modo, esta capacidade ajuda a criança asentir-se mais segura e a tolerar a impossibilidade deter sempre os seus desejos imediatamente satisfeitos.Obriga-a a perceber que terá que resistir às frustraçõespor mais difíceis que sejam.

 A tristeza e a zanga são sentimentos que surgemnestas alturas, ligadas a um outro processo essencialno desenvolvimento e que o ato de brincar permite

organizar - a agressividade. A agressividade podeexprimir-se de forma natural através, por exemplo, dos«jogos de faz-de-conta» em que se pode lutar, morrer ematar sem consequências reais. Pode tambémencontrar-se nos jogos de competição em que seexperimenta a sensação de conseguir ganhar algo ou

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   I   l  u  s   t  r  a  ç   ã  o   d  e  s  e  n   h  a   d  a

  p  o  r   A  n  a   L  u   í  s  a   S   i   l  v  a .

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  a .

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perceber que é possível perder sem se sentiremdestroçados. Deste modo, a criança aprende aconhecer-se melhor, experimenta-se em diferentespapéis, conhece e aplica regras e sobretudo estruturaa sua agressividade, criando condições para vir a serum adulto combativo e ambicioso, corajoso epersistente, que cumpre regras e respeita os outros.

Com a aquisição da linguagem a criança inicia odesenvolvimento da capacidade simbólica, é atravésdela que pode brincar “fazendo-de-conta”. Esta é outracapacidade essencial ao desenvolvimento afetivo erelacional, à criatividade e à aprendizagem, porque lhe

permite perceber os símbolos. A criança consegue comeste tipo de jogo, imitar os outros, procurando assimcompreender melhor a realidade e em particular omundo dos adultos, assimilando, entre outros, modelosde comportamento e relações e regras de convivência.  As crianças com deficiência visual, como quaisqueroutras crianças, gostam e precisam de brincar para sedesenvolverem saudavelmente. Têm as mesmasvontades, os mesmos interesses e desejos quequalquer outra criança da sua idade, embora possamencontrar dificuldades no seu desenvolvimentoquando, por falta da visão, não têm acesso ao meioenvolvente e à informação que as circunda, que ésobretudo visual.

O mundo das crianças com deficiência visual éaquele que elas «alcançam com as suas mãos» e comos restantes sentidos. Por isso, necessitam de ummediador que leve até estas o mundo que nãoalcançam. Por exemplo, a criança com deficiênciavisual não consegue saber de forma independente eimediata a que distância é que estão as nuvens, que osol é redondo e amarelo, que o João é mais gordinho ebaixinho do que o Pedro, que às vezes a noite éestrelada, que o parque tem um escorrega…

Na criança com deficiência visual, os restantessentidos não se ativam espontaneamente de forma acompensar a falta de visão, pelo que é essencial serem

estimulados. Neste sentido, para estas crianças anecessidade de brincar é ainda mais importante porqueo brincar permite ligarem-se aos outros e ao mundo. Éfundamental que o adulto acompanhe a criança nanarrativa das suas descobertas, promova o seusentimento de segurança e controle sob o ambiente

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que a rodeia, de modo a que a esta sinta o desejo, acuriosidade e a iniciativa de brincar e de conhecer cada

vez mais, características essenciais para o seu futurocomo pessoa.  Ao brincar, a criança com deficiência visual está acaminhar no sentido da apreensão dos significados,está a respeitar as suas necessidades e a alimentar osseus desejos. Desenvolve a sua espontaneidade, asua capacidade de fantasiar e de estar em relação,estimulando os seus sentidos. Tal como qualquer outracriança, integra-se no mundo, organizando-seemocionalmente e cognitivamente.

O adulto, se por um lado deve estar atento àsadaptações que a falta de visão exige, deverá tambémter consciência do limiar que existe entre o adaptar

«saudável» e as atitudes de superproteção quenascem do seu próprio medo e insegurança.  Do ponto de vista da psicologia, o medo e ainsegurança têm origem nas dificuldades que aspessoas encontram na gestão dos seus própriossentimentos perante alguém com deficiência. Estasatitudes relacionam-se com a visão tradicional dasociedade que olha com «pena» para estas pessoas.Por isso, é comum encontrá-las ainda em alguns pais eprofissionais que lidam com estas crianças.

No entanto, e na verdade, atitudes como estas levamà superproteção e à fuga da realidade no que toca àscapacidades e limites das crianças. «Fazer a papinha

toda» à criança é dizer-lhe que ela não é capaz, éfomentar a sua insegurança, baixa autoestima,imaturidade e consequente dependência, travando oseu processo de desenvolvimento e de aprendizagem.  Brincar espontaneamente, brincar ao «faz de conta»,brincar com objetos mais mecânicos ou outros queconjugam diferentes materiais e texturas num apelo àimaginação e à criatividade, é tão importante comobrincar com os utensílios da vida diária (mediando operigo das suas utilizações). Estes que, à partida, paraum adulto, não são encarados como brinquedos,poderão ser para qualquer criança, em particular comdeficiência visual, uma brincadeira especial e que lhefornece mais imagens do mundo.  Brincar não tem limites. Ao brincar, a criança está adesenvolver-se e a crescer sem se aperceber que estánuma situação de aprendizagem. Para a criança comdeficiência visual é especialmente importante que ooutro promova o seu sentimento de segurança, bemcomo o seu dinamismo e o poder de fantasiar atravésde brinquedos, materiais e métodos que respondam àssuas necessidades e, acima de tudo, através derelações gratificantes que combatam o isolamento e afalta de contacto com o ambiente envolvente.

Dar a oportunidade e estimular a atividade de brincarnuma criança é, assim, permitir-lhe construir as basespara que venha a ser um adulto proativo e com a

capacidade de criar e recriar-se ao longo da sua vida. LB

 A Revista Louis Braille agradece a Ana Luísa Silva, utente daDelegação de Leiria da ACAPO, pela criação das ilustraçõesdeste artigo.

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dispositivos que não foram concebidos expressamentepara o efeito, como o computador. Numa família épossível que cada um dos seus membros esteja a verum programa diferente num aparelho diferente. Umacada vez mais numerosa franja dos telespetadoresacompanham as emissões de televisão ao mesmotempo que acedem a conteúdos na internet através de

um dispositivo móvel. Os conteúdos televisivos deixamde ser fruídos em conjunto e passam a serfragmentados, divulgados e comentados através dasredes sociais.

  Se hoje se questiona o futuro da televisãogeneralista, esta realidade de pulverização da oferta de

televisão e de multiplicação de plataformas reforça anecessidade de defesa daqueles princípios deuniversalidade e coesão nacional. Princípios que nãopodem deixar de refletir a garantia de acesso daspessoas portadoras de deficiência às emissões detelevisão, disponibilizando as acessibilidades que opermitam.  Este admirável mundo novo oferece-nos realizaçõestecnológicas notáveis, que nos abrem as portas àesperança de uma sociedade menos exclusiva, logomais justa para todos, na mesma medida em que noscria outras dificuldades a ultrapassar. Assim é quandonos apercebemos das potencialidades das novas

plataformas digitais, incluindo a Televisão DigitalTerrestre (TDT), cuja largura de banda nos oferece apossibilidade de aceder a canais de áudio ou de vídeopassíveis de conter a audiodescrição ou ainterpretação por língua gestual, ao mesmo tempo queenvolve novos problemas com a gestão dos recursos e

“Este admirável mundo novo oferece-nosrealizações tecnológicas notáveis, que nos abremas portas à esperança de uma sociedade menosexclusiva”

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Por Rui MotaTécnico jurista da Entidade Reguladora para aComunicação Social

  Há uns anos atrás, a oferta televisiva em Portugalresumia-se a um canal de televisão. Estávamos nosprimórdios dessa atividade no nosso país. Nos lares

com meios para esse investimento, existia um únicoaparelho de televisão. Esse aparelho,independentemente dos méritos dos conteúdosoferecidos, constituía um fator agregador do núcleofamiliar. A determinadas horas, os membros da famíliasentavam-se defronte do aparelho para verem ecomentarem em conjunto o seu programa favorito. Osprogramas populares, fossem de cariz lúdico, culturalou informativo, seriam depois também objeto deconversa nos locais de trabalho, nas escolas e nosmais diversos grupos sociais.  Este retrato aligeirado do papel da televisão sublinhaalgumas das suas qualidades que nos importa agora

destacar. Falamos do seu estatuto de serviço universal,disponível para todos os cidadãos, e da suacapacidade para promover a coesão nacional, emtorno de uma língua e de uma cultura. E se estesvalores constituem o núcleo fundamental do serviçopúblico de televisão, a verdade é que são também, aoutra escala, referências incontornáveis para os canaisprivados, sobretudo para os canais generalistas deacesso não condicionado livre.

  Entretanto, o modo como vemos televisão muda auma velocidade vertiginosa. Em nossas casaspassámos a dispor de vários aparelhos de televisão,espalhados pelos vários compartimentos, para além detambém acedermos às emissões através de outros

Acessibilidades

“O modo como vemos televisão muda a umavelocidade vertiginosa”

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a democratização do acesso aos mesmos. No caso daaudiodescrição, que interessa em particular, mas não

exclusivamente, às pessoas portadoras de deficiênciavisual, a onda média da RDP, tal como é atualmenteexplorada pela RTP, seria substituída, com toda avantagem e conforto, pela utilização de um canal áudioque a licença da TDT prevê, nomeadamente para ouso desta funcionalidade.  Mas se as soluções tecnológicas estão aí à nossadisposição, prenhes de promessas, não deixa de sercruel como de repente tudo parece ficar mais distante.É verdade que é possível a uma pessoa cega, junto doseu filho, acompanhar um filme que passa na televisão,entendendo-o nas suas várias dimensões, com a ajudada audiodescrição. Mas então, qual a razão pela qual,

quanto a esta matéria, não passamos da limitada ofertada RTP, que nos proporciona uma hora por semana deaudiodescrição numa série de ficção?  Para mais quando a Entidade Reguladora para aComunicação Social (ERC), ao abrigo do n.º 3 doartigo 34.º da Lei da Televisão e dos Serviços Audiovisuais a Pedido (Lei n.º 27/2007, de 30 de julho,alterada pela Lei n.º 8/2011, de 11 de abril), aprovouem 2009 (Deliberação 5/OUT-TV/2009) o PlanoPlurianual que definiu o conjunto de obrigações quepermitiriam o acompanhamento das emissões porpessoas com necessidades especiais, nomeadamenteatravés do recurso à legendagem, à interpretação por

meio de língua gestual, à audiodescrição ou a outrastécnicas que se revelem adequadas.

  O Plano Plurianual veio a ser impugnado nosTribunais pelos operadores SIC e TVI, por razões quenão cabem no espaço deste artigo, pelo que, naprática, não veio a ser executado. Todavia, no queconcerne à audiodescrição, importa ter presente que,no essencial, os operadores de televisão invocavam justificações de natureza económica e de naturezatécnica para não investirem na produção e difusão deconteúdos com audiodescrição. As primeiras tinham etêm a ver com a acentuada quebra da receitapublicitária e a conjuntura de crise que atravessamos. As de natureza técnica reconduziam-se ao argumentode os operadores privados, ao contrário da RTP, nãodisporem de frequências de rádio disponíveis para atransmissão da audiodescrição.  Se é certo que os argumentos de natureza

económica não podem ser ignorados, oscondicionalismos técnicos não existem hoje em dia.Temos pessoas capazes de produzirem conteúdos deaudiodescrição e espaço nas diversas plataformas detelevisão, seja na TDT, cabo, ADSL ou satélite. Faltasobretudo, é esta a minha opinião, uma total

“Importa ter presente que, no essencial, osoperadores de televisão invocavam justificações denatureza económica e de natureza técnica para nãoinvestirem na produção e difusão de conteúdoscom audiodescrição”.

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compreensão desta problemática da parte dosoperadores de televisão.

  De acordo com o Censos 2011, cerca de 23% dasrespostas da população residente em Portugalreferiram dificuldade em ver, mesmo usando óculos oulentes de contacto. Com os problemas relacionadoscom o envelhecimento da população, este é um sectorsignificativo que pode e deve beneficiar de conteúdoscom audiodescrição. Os operadores de televisão, paraalém da responsabilidade social que lhes cabeenquanto empresas, não podem deixar de atender aestes números numa perspetiva de captação depúblicos, logo de receitas. Quando são apontadasobrigações aos operadores de televisão, todas asvertentes devem ser equacionadas, entre elas as

vantagens. As de natureza económica mas também asde natureza mais imaterial, que se traduzem noprestígio e reconhecimento de uma marca ou produto.  Mas quando a ACAPO, em nome das pessoas querepresenta, pede atenção para a necessidade deadotar a locução em língua portuguesa de peçasinseridas nos serviços noticiosos que contenhamexcertos falados em idiomas estrangeiros, e se verificauma grande resistência da parte dos operadores detelevisão para aceitar esta medida, mais dos jornalistaspara sermos totalmente justos, já não é o custoeconómico que está em jogo. Está em causa acoragem para ultrapassar uma pequena linha, que nem

sequer é uma barreira. Ou quando os operadores detelevisão insistem em dedicar os seus já escassosrecursos à acessibilidade aos programas deentretenimento, em prejuízo dos programasinformativos ou culturais, desconhecem,provavelmente, a avidez com que esses cidadãosdesejam aceder à informação e ao conhecimento.

  A ERC iniciou já o procedimento tendo em vista aaprovação de um novo Plano Plurianual. Desejo quesejamos todos mais sábios, que tenhamos todos umaconsciência mais aguda do que representa o serviçode televisão para os cidadãos, especialmente paraaqueles que têm necessidades especiais paraacederem aos conteúdos, e que saibamos entenderque as mudanças positivas na nossa sociedadetambém começam por estas pequenas coisas.  Tudo isto não para voltar ao princípio da velha

televisão única na sala das nossas casas, em que tudoera aparentemente mais simples, mas sim parapodermos partilhar todos, em igualdade, a riqueza dadiversidade.

“Desejo que sejamos todos mais sábios, quetenhamos todos uma consciência mais aguda doque representa o serviço de televisão para oscidadãos, especialmente para aqueles que têmnecessidades especiais para acederem aosconteúdos”.

LB

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