Revista Cultural Novitas Nº 8

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    1revista cultural novitas n 8 novembro/dezembro de 2010

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    :::editorialdavid nobrega

    Editor e escritor

    davidnobrega.com.br

    Para nossos leitores de nossa verso on-line,Ol!. C estamos novamente, com uma revista recheada de prosa,verso, entrevistas e tudo mais a que vocs j esto acostumados.Porm, a partir desta edio, temos que nos apresentar a um novoleitor que, como eu mesmo, adoram poder ter nas mos o bom e velhopapel.

    Esta edio uma conquista. Pela primeira vez, a RevistaCultural Novitas impressa e distribuda alm das fronteiras dainternet. Assim conseguimos atingir a um nmero maior de leitores,fazendo com que nossa proposta primordial a disseminao dacultura torne-se concreta. Aos novos leitores, nosso Muito bem-

    vindos!. Desfrutem do potencial do escritor foco desta Editora, oainda desconhecido, o talento por trs do muro do vizinho que,escondido na calada da noite, versa a vida, proseia sobre a morteou simplesmente, tece memrias de coisas vividas por outros. Almdisso, autores j tarimbados, msicos que por algum motivo deixaramde receber a devida ateno da mdia, fotgrafos com olhar crtico, pensadores oferecendo sua viso pessoal sobre o mundo que noscerca.

    ChegouDezembroemaisumnaldeanoque,querendoouno,crendo ou duvidando, sempre tem aquele cheiro bom de renovao.Dias com cheiro de carro novo ou de beb recm-nascido. Teremosmudanas? Nossos representantes eleitos sero capazes de arcar como peso moral, que os votos recebidos lhe cobram? Ficaremos todosricos na Mega Sena da Virada? Ningum sabe, mas o que interessa ter a vontade de virar a pgina e perseguir o bem maior. Ao colocarseu real sob o prato de lentilha, na primeira refeio de 2011, una seuscompanheiros de mesa em um pedido simblico (ou no): que todosbrasileiros sejam capazes de chegar ao prximo Reveillon melhoresqueesteano,sejalograudediculdadequeatravanqueoscaminhosdesse projeto de vida.

    Porfalaremnaldeano,hoNatal,pocadoanoemque

    as trocas de presentes so o pice dos relacionamentos, sejamfamiliares, de trabalho ou de simples vizinhana. Posso dar uma dica?Dlivrosdepresente.Sabeaqueleamigosecretodemdeanodoescritrio? Ento... Vejam s que grande oportunidade de distribuirconhecimento, criando as listinhas de autores ou temas preferidos eestipulem valores. Se pensarem bem, s h o que ganhar, pois nemmesmo o risco de se ganhar meias e gravatas se correria mais.

    Comosempre, ca a disposionosso endereo de e-mail:[email protected]. Aps lerem nossa Revista, sintam-sea vontade para nos enviar seus comentrios e sugestes. Se preferir,nosso endereo para correspondncia Caixa Postal 331, Santa Cruzdo Sul, CEP 96.810-970.

    Boa leitura e at a prxima!

    Revista CulturalNovitas

    Ano II N VII

    Novembro/Dezembro de 2010

    Esta uma publicao

    da Editora Novitas em

    periodicidade bimestral.

    Todos os textos, imagens

    ou qualquer outra forma de

    manifestao aqui publicados

    foram devidamente solicitados a

    seus autores, que autorizaram sua

    utilizao por meio de mensagem

    eletrnica.

    Imagens no creditadas

    so de autoria de David Nobrega.

    Editores:

    Letcia Losekann Coelho

    David Nbrega

    Reviso:

    Andrea Lucia Barros

    Imagem da capa: David Nobrega

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    Editora Novitas: A partir de quando e do que a Letcia sedescobriu escritora? Ler prerrogativa para escrever algo quevem de bero?

    Leticia Wierzchowski: Na minha casa, se lia muito pouco.Eu fui a leitora inaugural da famlia, sempre gostei de livros, desdepequena. Assim, os livros no foram um hbito herdado, masadquirido. Evidentemente, ler prerrogativa de escrever. Isso e maiso talento. Acredito no talento, na capacidade visceral. Eu comeceia escrever por acaso tinha feito muitas coisas j, entrado e sadoda Universidade, vrios vestibulares Montei uma confecofeminina, pois eu gostava era de desenhar moda. L, um dia, poracaso, comecei a ccionar. Criei uma histria, personagens, uma

    casa. Virou mania, e a melhor parte do meu dia. Desde ento, noparei mais de escrever

    EN: Tu s uma autora de diversos livros. Em somente doislivros (A Casa Das Sete Mulheres e Um Farol No Pampa), escreveu sobreliteratura rio grandense. O rtulo fcou?

    LW: O rtulo cou por causa de A Casa Das Sete Mulheres.Qualquer rtulo sempre uma simplicao grosseira, mas cabe aoartista lidar com isso, extrapolar isso nem que seja pessoalmente.Um sucesso como o deA Casa Das Sete Mulheres sempre traz coisas

    boas e ruins, preciso aprender a equilibrar a balana Mas quemme l, quem se informa minimamente sobre meus livros, sabe queescrevo sobre vrios universos.

    EN: O livro Uma ponte para Terebin, narra a histria do teu av

    Leticia Wierzchowski escritora e reside em

    Porto Alegre com o marido e seus dois filhos. Sua

    bibliografia j ultrapassou a casa dos dez livros

    publicados, entre eles vrios com edies em outros

    pases, como o caso de Um Farol No Pampa, O

    Pintor Que Escreviae Uma Ponte Para Terebin, alm

    deACasa Das Sete Mulheres que se tornou srie

    televisiva e encontrado na Itlia, Grcia, Alemanha,

    Portugal, Srvia e Montenegro, Frana, Espanha e

    demais pases de lngua espanhola.

    Letcia escreve uma coluna no jornal Zero

    Hora e mantm textos semanais em seu site www.

    leticiawierzchowski.com.br, alm do perfil no twitter:

    @lwierzchowski

    Lanou recentemente o livro Os Getka pela

    editora Record e atualmente trabalha na finalizao

    do roteiro de uma obra baseada em O Tempo E O

    Vento, de Erico Verssimo.

    crdito de imagem : Carin Mandelli

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    amigos escritores. Hoje em dia, tambm, amaioria dos autores do Sul so publicados poreditoras nacionais. Isso resolve a questo.

    EN: A crtica nem sempre razovele justa e algumas vezes ganha tons deagressividade gratuita. Como tu lida com acrtica negativa e com a agressividade?

    LW: Falta de tica um saco. J tivealgumas experincias ruins, e lidei com elas devrias formas. Mas existe uma regra bsica:

    a parte pblica a minha obra, no a minhapessoa. Eu no me exponho, sou at mesmotmida. O meu trabalho, portanto, pode serjulgado e criticado sempre. Crticas e ofensaspessoais so outro assunto.

    Porm, no costumo pensar nissoquando estou escrevendo. Esse limite sempre muito claro pra mim

    EN: Recentemente os e-readers foramlanados no Brasil. Tu acreditas que maisuma ferramenta para aumentar o nmerode leitores ou ainda sonho distante para amaioria dos brasileiros?

    LW: Casualmente, acabamos de receber

    polons. Como foi escrever esse livro parati? uma maneira de se descobrir razes edemonstrar afetos?

    LW: Foi uma descoberta do passadoda minha famlia, que sempre foi nebuloso,discreto. Isso foi, creio, uma vontade de meuav: a famlia sofreu muito na Polnia ocupadapelos nazistas, ele botou uma pedra em cimadisso. Deixou para os lhos um futuro embranco, pra eles preencherem ao seu gostoMas o tempo passou, eu quis saber mais efui atrs. Hoje, gosto de saber que deixo paraos meus lhos e sobrinhos um olhar sobre ahistria pregressa deles. A gente no podeesquecer o passado.

    Mas escrever Uma Ponte Para Terebin foitambm uma aventura narrativa pra mim.

    Uma longa pesquisa, uma viagem histrica,emocionante. Gosto muito do romance.

    EN: Tu levastes o terceiro lugar no PrmioJabuti com um livro infantil: Era Outra Vez UmGato Xadrez. Como para ti a comunicaocom esse pblico?

    LW: Criana maravilhoso. Tenho doislhos pequenos. No posso ver criana na ruaque j estou puxando assunto, brincandoNunca passo imune a elas. Assim, escreverpara os pequenos uma coisa que faocom leveza e alegria. E que vem trazendoresultados super legais. O Jabuti apenas umdeles. A minha infncia ainda muito clara pramim (alis, um artista sempre uma criana,creio). Estar em outras infncias hoje,alimentar fantasias nossa! , um privilgio.

    EN: Qual a tua viso sobre o meioliterrio gacho? Afnal, alguns nomesgachos despontam hoje entre os mais lidosno Brasil e em alguns casos, com tiragens noexterior como teu caso, mas parece que omeio literrio no misturado.

    LW: Sinceramente, no penso muitonisso... Em fronteiras fsicas, em divises.Moro em Porto Alegre. Fisicamente, s vezes,isso complica: para dar uma entrevista pra

    Globo, preciso pegar um avio. Mas spenso nisso nessa hora Ademais, essepapo de meio literrio no comigo. Nuncaescolhi meus amigos pela prosso que elesexercem Sucede que tenho, sim, alguns

    Estar em outras infncias hoje, alimentar fantasias nossa! , um privilgio.

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    um e-readeraqui em casa hoje. Foi o presenteque o meu marido pediu. Mas ganhouvrios livros tambm. Acho que mais umaferramenta de leitura, uma facilidade.

    EN: Somos um Pas de escritores.Hoje qualquer pessoa pode manter um bloge escrever e ainda publicar seu livro, masde contra partida ainda no conseguimosequilibrar o nmero de escritores com leitores.Na tua opinio, existe uma soluo para aleitura aumentar no Brasil?

    LW: No acho que somos um pas deescritores. Que qualquer um pode escrever,isso sim, graas a Deus. Mas voc misturaas coisas blogs e romances tm pouco emcomum , alm do fato de usarem a palavra

    escrita. E isso no uma crtica, um fato.Ademais, todo mundo navega na internet, e80% desses internautas no leem livros. Issoacontece no mundo, no apenas aqui noBrasil. So assuntos e ndices completamentediferentes, e disassociados.

    Agora, sobre a leitura no Brasil? Quemme dera responder isso em duas pginasSo tantas coisas, tantas metas a seremalcanadas antes que o povo brasileiro tenhavontade e capacidade de ler mais

    EN: Conta-nos um pouco sobre teus novosprojetos.

    LW: Estou terminando o roteiro de umlonga-metragem baseado na obra do EricoVerssimo, O Tempo e o Vento. Esse trabalhoeu comecei junto com o Tabajara Ruas, masestou nalizando sozinha. um longa queser dirigido pelo Jayme Monjardim, e vai serrodado aqui no Sul.

    Acabei de lanar um romance tambm,chama-se Os Getka, editora Record.

    EN: Algum recado ou dica para osautores iniciantes?

    LW: Se conselho fosse bom

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    Muitos pensadores contemporneos - citoapenas o Zygmunt Bauman -, tm se debruadosobre a questo da efemeridade, do quanto ascoisas, das relaes humanas aos produtos deconsumo, cada vez mais so feitas para atenderao imprio do imediato. Mais agudo do que isso a tentativa, que muitas vezes alcana xito, deanestesiar as pessoas, fazendo-as crer numasuposta amenidade livrando-as do incmodo atode pensar. Poderia tecer longas consideraessobre os digestos - termo original da jurdica e que

    serviu por um bom tempo (a partir de autores comoMuniz Sodr e Ecla Bosi) para identicar poressas bandas o que depois veio a ser classicadocomo Best-sellers -,principalmente pela etimologiada palavra, que remete quilo que facilmentedigervel, que no vai causar nuseas e enjoos.

    Acho que a questo principal quando oslivros considerados da alta literatura so jogados para um nicho de mercado e passam aser considerados difceis ou inacessveis ouporque no contam histrias. De fato, a questoda narratividade, ao longo do sculo XX, cedeu

    lugar a um intimismo e a um subjetivismo nemsempre palatveis ao leitor mdio que, obviamente,quer ler histrias. O que no signica que umlivro que conte uma histria to somente, no tragaem si questionamentos que nem sempre soprofundamente abordados em outros tipos de livros;at porque, em sua maioria, a tnica fugir deles.

    Marilena Chau comentando em ExperinciaDo Pensamento a obra do lsofo francs MauriceMerleau-Ponty, especicamente La Prose DuMonde, nos traz o conceito do livro interpelantedefendido por ele. O livro interpelante umamquina infernal, criadora de signicaes quepassam a fazer parte do mundo dos leitores a partirda aproximao entre arte e losoa, colocando-os no plano das reexes que se inscrevem noser. Imagino que seja o objetivo de qualquer livro,mas alcan-lo outra histria. At porque, creioque para iniciar tal empreendimento, o livro temde aguar a capacidade imaginativa e fazer comque ela se prolongue e no esmorea ao cotidiano,principalmente este nosso, da formao em fartura,em que o esquecimento e a memria travam

    Referncias

    BAUMAN, Zygmunt. O mal-estar na ps-modernidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1998.BORDINI, Maria da Glria & AGUIAR, Vera Teixeira. Literatura: a formao do leitor (alternativas metodolgicas). 2. ed.Porto Alegre: Mercado Aberto, 1993.BOSI, Ecla. Cultura de massa e cultura popular: leituras de operrias. 10.ed. Vozes: Rio de Janeiro, 2000.CHAU, Marilena. Experincia do pensamento:ensaios sobre a obra de Merleau-Ponty. So Paulo: Martins Fontes, 2002.SODR, Muniz.A comunicao do grotesco: um ensaio sobre a cultura de massa. 10.ed. Rio de Janeiro: Vozes, 1985.

    :::opiniolisson da hora

    O livro interpelante

    Mestrando em Teoria Literria (UFPE), professor, poeta e escritor

    uma rdua batalha.Livros interpelantes no atendem a isso,

    encomenda do momento. Nascem e permanecempor meio das perguntas que so capazes desuscitar, questes que no fenecem diante dasrespostas fceis. Da, podemos nos perguntar,tal qual Vera Aguiar e Maria da Glria Bordini emLiteratura: formao do leitor por que livros comoos de Hans Christian Andersen, Mark Twain,Robert Louis Stevenson, entre outros, no somais indicados para leituras em nossas escolas.

    E livros como os de Monteiro Lobato, quem diria,passam pelo crivo de conselheiros preocupadosem atender a exigncias at certo ponto louvveis,mas exagerando o cuidado e subestimando ainteligncia de professores e, pior, de alunos.

    Ou seria, e me permitam um pouco deexerccio de parania conspiratria, pelo fato deesses livros realmente dizerem algo mais, pelocarter de inserirem no ser de quem os leu, algoque car sempre a se remexer, de provocarnostalgia e ressignicar omundo? No lembro de algum

    aluno meu guardar devoo deum personagem ou de um livro(perdoem-me os leitores dasfamosas sagas vampirescas,mas duvido algum adultofuturamente guardar comnostalgia personagens to tacanhos, diferentementede um Pedrinho, de uma Narizinho, de um OliverTwist, um Capito Ahab...) contemporneo, que soadotados pelo Programa Nacional do Livro Didticoou os oferecidos s escolas particulares pelaseditoras, trazendo autores consagrados.

    A permanncia desses signicados, propor-cionados pelos livros interpelantes, o que faz adiferena no nosso trato com o mundo, o real e oliterrio. Eu no teria tido tanta desenvoltura ao lera Odissia ou alguns contos de Borges em queaparecem elementos mitolgicos se no tivesselido quando criana as obras de Lobato nas quaisele trata de mitologia. A capacidade de sonhare de imaginar ca mais aguada, somos maiscapazes de responder a quaisquer interpelaes e,sobretudo, camos mais aptos a interpelar.

    pontispopuli.blogspot.com

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    O incio de tua carreira foi com bandas decover, tocando em bailes e festas. Mas e antes?De onde veio Simbas?

    Na verdade comecei a cantar aos 10 anosde idade na escola, brincadeira de criana.Mas tomei gosto pela msica e a participei daformao de um grupo musical da rua onde eumorava, que se chamava Os Adolecentes. Fuimandado embora deste grupo por inveja dosoutros componentes eu j agradava muito,

    cantando, por onde o grupo se apresentava , mas como eu no tinha instrumento paratocar e naquela poca todos que participavamde uma banda tinham que possuir seu prprioinstrumento, eles me mandaram embora. Eu eramuito pobre e meu pai no tinha como ajudar.Fiquei to triste e humilhado que, chorando,prometi minha me e a mim mesmo que euseria algum no meio musical.

    Lutei muito e acho que consegui contribuircom uma pequena fagulha dentro do Rock

    Nacional. Me sinto realizado e feliz pelo carinhorecebido ao longo da minha carreira.Voltando pergunta, depois dOs

    Adolescentes, entrei numa banda da ZonaLeste de Sampa; s tinha japons e como sou

    Muitos crticos musicais dizem que a dcada de 1970 foi uma poca perdidapara nossa msica, principalmente no que diz respeito ao rock nacional. Na verdade,vivamos, ento, uma transio de valores e de conceitos, fazendo com que muitas

    bandas produzissem pouco; mas, mesmo assim, de forma denitiva. Com o adventoda msica de discoteca e dos acordes simplistas do movimento punk, produzir

    msica de qualidade pode ser encarado como uma forma de herosmo artstico.Poucos foram aqueles que foram convidados a participar do Globo de Ouro

    ou a gravarem clips para o Fantstico, mdias Globais dominantes poca.Nesse contexto nebuloso algumas bandas como Aero Blues, Bacamarte,

    O Tero, Joelho de Porco, Moto Perptuo, Casa das Mquinas, etc , assim comocantores como Raul Seixas, Rita Lee, Tim Maia e tantos outros , conseguiramuma exposio maior e muitos de seus membros ainda fazem parte da msica, sejasobre, sob ou atrs do palco.

    Um dos nomes mais marcantes dessa poca , sem dvida alguma, o ex-integrante de bandas como Casa das Mquinas, Tutti-Frutti, Races de Amrica(alm de outras de menor durao) e dono de um vocal fantstico, o Simbas.

    Por e-mail e telefone, ele mostra que a atitude e disposio de antespermanecem intactas, incluindo a promessa de bebermos uma entrevistafutura em um bar qualquer. E essa, Simbas, eu vou cobrar!

    descendente de ndio, passava por mestio. Eramuito engraado, todo nal de semana l estavaeu cantando nas colnias japonesas... Foi legale graticante. Nessa poca, por eu ser muitoatrapalhado e brincalho, fui apelidado peloNardo(um amigo da Zona Leste de Simbad, oMarujo Trapalho (antiga revista em quadrinhosda dcada de 1960 nota da Editora) . Danasceu o Simbas, que depois entrou numabanda chamada The Rolling Fevers, mas logo fuipara o Grupo C.A.P.O.P. (Cagando e Andando

    Para a Opinio Pblica), e na sequncia a SomPositivo, que virou a Banda Mountry, fazendocovers em bailes. Finalmente cheguei ao Casadas Mquinas e, na sequncia, passei pelaTutti Frutti, Intelligence, Races de Amrica,A.A+1Dose, Dr. Fritz.

    Por falar na Intelligence, tem at umahistria legal, sobre minha participao nessabanda. Logo aps o m da Tutti-Frutti comeceia prestar servios a uma casa de eventosfazendo a sonorizao. Um dia me pediram para

    preparar o som para uma banda dos EstadosUnidos, que estava vindo para c para mostraro trabalho deles para um produtor brasileiro.Estava na mesa de som quando os caraschegaram, acompanhados pela Mnica, que

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    havia sido uma amiga da poca da Tutti-Frutti,que estava casada com um dos msicos dessabanda. Ela me apresentou banda e meia horae meia dzia de cervejas depois me pediramuma canja na passagem de som. Foi umabrincadeira, comigo cantando msicas do Led,do Deep Purple... Eu l, cantando com os carase um sujeito sentado quieto, eu sem saber quemera. Terminamos nossa brincadeira e a bandafez o que tinha ido fazer, se apresentar para otal produtor brasileiro que, na realidade, era osujeito ali da platia. Depois que eles zeram aapresentao foram conversar com o produtorque me apontou algumas vezes. Me chamarampara a conversa: o produtor s trabalharia coma banda se eu zesse os vocais. Depois dissoz a verso de 80% das msicas dos caras erodamos pelo Brasil chegando at Argentina

    durante mais de dois anos. Obra do acaso ou

    fatalidade essas coisas acontecem, ainda bem!No presente momento fao apenas

    participaes especiais em shows de bandasamigas, ou me apresento em reunies de fs eamigos, na companhia do guitarrista Kad, quetambm canta e toca gaita.

    Bom, da para frente acho que vocs j sabem do resto ou no, porque para falar

    de toda minha vida seria necessrio umaentrevista de horas e horas para falar semtempo para terminar

    O rock nacional dos anos 70 tem o nomeSimbas marcado a ferro e fogo na memria.Seja por teu vocal ou pela presena de palco, impossvel dissociar Casa das Mquinas por exemplo, de seu nome. Isso o faz umaboa referncia sobre a realidade musical denosso pas. A pergunta simples: O nosso rock

    brasileiro, muitas vezes debochado quando nocrtico, morreu?

    At onde eu sei, faz tempo, ou melhor,muitos anos que o rock desapareceu, acabou.

    com todo o vigor nescessrio, ou executadascom a suavidade que as canes exigiam.Letras profundas e inteligentes, motivadorasde mudanas de costumes e hbitos... meuamigo, faz muito tempo que isto acabou!!!

    Do rock s razes: Como foi para umat ento roqueiro participar de um projeto de

    latinidade, como o Races de Amrica?

    Deve ser aquelas bandas com um montede caras com poncho nas costas, tocando autasde bambu, choramingando as misrias daAmrica Latina... Me f***! No era nada disso!Me deparei com uma grande banda onde todostinham uma importncia vital na apresentaodo show, desde a tima cantora Nacha Moreto com quem tive a oportunidade de me apresentarpor todo o Brasil e tambm de gravar , at os

    excelentes msicos que faziam parte da banda,como o excepcional Maestro Willie Verdaguer,que cuidava dos arranjos vocais e instrumentais.Cada encrenca musical, amigo, que voc nemfaz idia! Se permita ver um dia para ver do

    Simbas, do Casa das Mquinas ao Races de Amrica

    No se ouve ou no se faz mais msicas ou seformam bandas tais como O Tero, Mutantes,Casa Das Mquinas, Made In Brazil, O Peso,Som Nosso de Cada Dia, Tutti Frutti, Mamonas,Tits, Paralamas do Sucesso, Legio Urbana,Baro Vermelho, Blitz e tantas outras que eucurtia e ouvia at uns anos atrs. Depois disso

    s chegaram coisas que no me agradam, nome motivam e no me emocionam. Nas rdios dicil ouvir esse tipo de msica, ou bandas quenos Inuenciaram como Led Zeppelin, DeepPurple, Kansas, Stones, Grand Funk Railroad,Edgar Winter, Steppenwolf, Credence, Blue TheRock, Emerson Lake & Palmer, Yes, HumblePie, Gentle Giant, Chicago, Blood Sweet andTears, Tree Dog Night, Procol Harum... Enm,uma innidade de maravilhosas bandas quemarcaram poca, por suas msicas belssimas,

    muito bem arranjadas e estruturadas, tocadas

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    www.simbasvocal.com

    As imagens que ilustram esta matria so do acervo pessoal do entrevistado.

    Simbas em 1978 Simbas em 2008

    que estou falando. Foi muito rico e graticante.Aprendi muito e sou extremamente agradecidoa todos eles

    Vamos s atualidades. Quais os atuais eprximos projetos?

    Como j disse, fao shows com amigos,me apresento com o Kad em eventos queconsidero especiais e dirijo minha rma deprojetos e instalaes de home theater, locaode equipamentos de som e luz para shows.Estou trabalhando para a realizao de umaturn pela Europa e, em breve, muito breve, nolanamento de um CD com msicas inditas deminha autoria e com outros parceiros, msicasque no foram gravadas l pelos anos 70 e 80,mas merecem registro, pois eu as considero

    especiais.

    Uma pergunta que sempre fazemos anossos entrevistados: A internet tem o lado pirata, agressivo, chato. Mas tambm tem obom, com a disseminao da cultura e servindode vitrine para novos trabalhos. Como seurelacionamento com essa ferramenta?

    Voc j respondeu por mim! Tem o seu ladopirata, agressivo, chato, mas tambm tem o seulado bom, com muita informao, disseminaoda cultura entre os povos. O Mundo servindo

    de vitrine para novos trabalhos. Mas h quese tomar muito cuidado, pois os jovens j noescrevem mais, tudo est ali, mastigado epronto. Meu relacionamento com a internet deuso pessoal e restrito a somente o realmentenecessrio. Tem que se tomar muito cuidado!

    Em algumas ocasies, fao

    uma brincadeira com minhas lhas em casa.Coloco tipo mil reais em cima da mesa e faodez perguntas, cada uma valendo cem reais.Sabe quanto eu perco a cada vez que issoacontece? Em torno de cem, duzentos reais.

    A internet est emburrecendo nossosjovens. A leitura cou fcil demais, com resumosdemais. Isso quer dizer que todo mundo acabasabendo um pouco de muita coisa intil. Se orock era contestao, porque a gente estudavao que queria contestar. Hoje ningum mais quer

    saber de sentar e ler um livro ler de verdade,

    entendendo o que um autor quer dizer.Outra coisa era a diculdade que a gente

    tinha de conseguir saber o que os dolos musicaisestavam aprontando por a. Era comum um carareceber visita em casa porque ele tinha um LPimportado. Atualmente comum gente ir parao bar e car no MSN pelo celular, enquanto acerveja esquenta na mesa.

    Amigos rockeiros, tem que ler e escrevermais, mas muuuuito maaaaaiiisssss!!!

    Beijos a todos!

    Est saindo do forno mais uma Coletnea Scriptus, a terceira da srie, desta vez chamada de Palavrao.Visite editoranovitas.com.br e fque por dentro de nossos lanamentos

    :::lanamento

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    10 revista cultural novitas n 8 novembro/dezembro de 2010

    :::opinioeduardo c. braga

    Graduao em Educao Artstica, graduao em Filosofa, mestrado em Filosofa

    pela Universidade de So Paulo. Doutorado em Comunicao e Semitica pela PUC/SP.Professor do Centro Universitrio SENAC. natural da Vila Madalena, So Paulo, Brasil

    E:mail: [email protected]

    Um dos principais aspectos metafsicosda fenomenologia em geral, e da losoa

    existencialista em particular, a superao daoposio epistemolgica entre sujeito e objeto.Para a fenomenologia e o existencialismo, desdesempre o sujeito est no mundo e guarda relaescom este. So essas relaes que denem tantoum como o outro, ou seja, sujeito e objeto sodeterminados por uma relao fundamentalexistente entre eles. Cabe arte revelar esse atooriginrio de desvelar um sujeito e um mundo pormeio dessa relao.

    Na prpria losoa de Sartre existe umaimplicao esttica em sua tese fundamentalde que o mundo depende de nossos

    atos de conscincia. Assim, o objetivofundamental do trabalho de arte , deforma deliberada e consistente, exerceresse ato, essencialmente humano,de introduzir ordem e regularidadesignicativas para o mundo. Em nossaatitude natural este ato de conscincia,que organiza o mundo, aconteceinconscientemente na forma de nossaspercepes e conhecimentos prticos.Entretanto, na expresso artstica, aordem, regularidades, perspectivas e

    relaes de sentido com o mundo so formalizadas,enfatizadas, sistematizadas e intencionalmenteorganizadas. Com isso, o artista pode revelaras caractersticas signicativas do mundo ecompreender-se como um ser originrio com acapacidade de revelar o mundo e manifest-lo.Esse ato de conscincia, que se relaciona com omundo e o revela por meio dessa relao, desvelae intensica nosso senso de liberdade. Como dizSartre:

    Um dos principais motivos da criaoartstica certamente a necessidade de nossentirmos essenciais em relao ao mundo. Esteaspecto dos campos ou do mar, este ar de umrosto, por mim desvendados, se o fxo numa telaou num texto, estreitando as relaes, introduzindoordem onde no havia nenhuma, impondo a

    unidade de esprito diversidade da coisa, tenhoa conscincia de produzi-los, vale dizer, sinto-meessencial em relao minha criao. (Sartre,1989, p. 34)

    Assim, o primeiro aspecto do prazer esttico a dupla alegria de desvelar o mundo e tornar-nos conscientes para o exerccio de nossa radicalliberdade. Trata-se de um aspecto estticometafsico, pois ele nasce de nossa fundamentalrelao com o mundo. O alcance metafsicoda liberdade humana consiste no fato de que atentativa de revelar uma parte ou um aspecto domundo implica em revelar a totalidade dos seres

    e conseqentemente desse prprio

    mundo. Assim, vivncias fragmentadase sem sentido tornam-se signicativasquando desveladas na totalidade,ganhando uma dimenso universal.O subjetivo e o objetivo se entrelaamnuma dana signicativa, superando asparcialidades e atingindo um todo comsentido.

    Como Husserl (2000) em suafenomenologia j havia insistido, apercepo mais parcial ou fragmentriasempre implica em uma refernciaa um horizonte mais amplo das

    percepes futuras dadas por uma expectativade sentido. Muitos escritores existencialistasenfatizaram essa funo primordial, metafsicada obra de arte, ou seja, como uma percepoparcial, mas que pretende desvelar a totalidadedo Ser. Esta idia , por exemplo, defendidapor Simone Beauvoir (2008) em suas reexessobre o romance metafsico. Essa profundaligao entre a metafsica e a arte acrescentauma certa dimenso losca para os escritorese artistas existencialistas. Ela est presentemuito fortemente em Camus, Sartre e Beauvoir.

    Segundo eles, no existem diferenas reais entremetafsica e prtica artstica, pois ambas soformas de revelar aos seres humanos a sua prprialiberdade e a responsabilidade acarretada por ela.As dimenses metafsicas e ticas da liberdade

    A arte como revelao do mundo e da liberdadeO mundo inseparvel do sujeito, mas de um sujeito que s projeto do mundo, e o sujeito

    inseparvel do mundo, mas de um mundo que ele mesmo projeta.(Merleau-Ponty, 1971, p. 443).

    Liberdade o que voc faz com o aquilo que aconteceu com voc.(Jean-Paul Sartre)

    [email protected]

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    11revista cultural novitas n 8 novembro/dezembro de 2010

    humana esto intimamente relacionadas. Osexistencialistas compreendem que o poder derevelar o mundo para os seres humanos apontapara as formas que uma pessoa tem para dirigirsua vida e seus valores. O conceito de existnciadesigna precisamente esta dimenso tica da vidahumana. Os existencialistas sustentam que, entre

    todos os seres existentes no mundo, o homem onico que pode determinar o que dever ou poderser. Na verdade, ele forado permanentementeem sua vida a faz-lo, dado que o homem nopossui nenhum carter xo. Segundo Sartre, ohomem um projeto, ou seja, algo que no , masdeve ser construdo por toda a sua vida, deixandode se construir somente com a morte. O espaoentre a vida atual e a morte deve ser preenchidona existncia segundo uma idia de liberdadeque responsabiliza o projeto de cada um. Isso claramente expresso na paradoxal frase de Sartre:o homem est condenado a ser livre. Liberdadeno deve ser entendida ento como independncia,mas como a capacidade de determinar o que osujeito deve ser, a capacidade de decidir a formade sua subjetividade, seus atos e valores na vida.Nietzsche j apontava essa dimenso existencialao propor a construo de uma vida, ou de umasubjetividade, como se fosse uma obra de arte, naqual o aleatrio e acaso so armados como tal,tornando-se assim signicativos e necessrios.Trata-se do amor fatinietzschiano, ou seja, amorao prprio destino.

    Essa dimenso tica da liberdade

    como o poder de autodeterminao, o qualimplica sempre a dimenso do dever, explicaa importncia da noo de engajamento naesttica existencialista. Assim, o engajamentono se refere somente a necessidade de escolherem situaes particulares, mas, principalmente,refere-se posio fundamental do ser humano,cujo verdadeiro ser consiste em fazer usode sua liberdade. Para os existencialistas, anica caracterstica verdadeiramente humana a responsabilidade para com os outros e,principalmente, para com si mesmo. Muitos

    seres humanos fogem dessa responsabilidadeontolgica, considerando-a um enorme peso. Elesaceitam papis predeterminados e vivem suasvidas em torno deles. Eles entendem o destinocomo algo imposto, uma cruz que deve ser

    carregada. Sartre chama essa atitude perante avida de m-f.

    A relao originria entre homem e mundorevela a liberdade humana em sua possibilidadede construir sua subjetividade. Assim se explica adenio de Sartre da obra literria, que pode seaplicar para todas as obras de arte:

    E uma vez que leitores e autor sreconhecem essa liberdade para exigir que elase manifeste, a obra pode se defnir como umaapresentao imaginria do mundo na medidaem que exige a liberdade humana.(grifo nosso).(Sartre, 1989, p. 51).

    A arte assim tem como propsito nos fazersentir essenciais em relao ao mundo. A obra dearte revela a totalidade do mundo e a possibilidadede construo da subjetividade humana, por meioda revelao de uma relao essencial entrehomem e mundo.

    Em sua prtica artstica e losca, osexistencialistas interpretam a misso da artecomo revelao da totalidade do mundo eda construo do sujeito em relao a essatotalidade, sujeito tanto individual como coletivo.Nesse sentido, enfatizam a representao, secolocando em contraposio s tendncias maisabstratas, puristas e formalistas da modernidade.So cticos em relao concepo da artecomo independente e apenas responsvel porsuas prprias regras formais. Essa insistncia na

    dimenso representativa da arte pode parecerantiquada pela perspectiva moderna, maspodemos constatar sua permanncia e recorrnciaem diversos movimentos ps-existencialismo.

    A literatura beat recupera essa dimensoexistencialista e representacional da arte.Representar signica tomar o mundo fragmentadoe recuper-lo numa totalidade signicativa, na qualo homem e o mundo se revelam mutuamente. Narelao fundante entre homem e mundo se revelaa dimenso da liberdade ou da capacidade deconstruir sua subjetividade como uma obra de arte.

    Essa dimenso nos torna responsveis de nossosdestinos, acrescentando uma dimenso tica paraa arte e uma necessidade de engajamento navida. Sob esse aspecto, Big Surde Jack Kerouac paradigmtico.

    RefernciasHUSSERL, Edmund.A ideia da fenomenologia. Traduo de Arthur Mouro. Lisboa: Edies 70, 2000.KEROUAC, Jack, Big Sur. Traduo de Guilherme da Silva Braga. Porto Alegre: L&PM, 2009.MERLEAU-PONTY, M. Fenomenologia da percepo. Trad. de Reginaldo de Pietro. So Paulo: Freitas Bastos, 1971.SARTRE, Jean-Paul. Que a literatura? Traduo de Carlos Felipe Moiss. So Paulo: Editora tica, 1989.BEAUVOIR, Simone de, LExistentialisme et la Sagesse des Nations, Paris: Gallimard, 2008.

    Para adquirir produtos Novitas no interior de So Paulo (Regio Sorocaba):

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    13revista cultural novitas n 8 novembro/dezembro de 2010

    CHEIRO DE INFNCIA

    Lucia Helena O. Cavichioliretratosemdegrade.blogspot.com

    Embaixo do p de laranjaeu vivi os melhores anos de minha vida.Sentvamos, aproveitando a sombra,nossa cmplice, que ouvia nossas histrias,

    nossas piadas e brincadeiras.

    ramos crianas, e como tal,despreocupadas com o resto do mundo.Porque para ns, o mundo tambm era criana.E nossas pieguices, permitiam rir e sorrirbrincar e sonhar no quintal de terra vermelhafuando no toco das rvores, lavando os psno riacho.

    Lembro da gritaria quando soava o chamadopara o almoo

    via-se o alvoroo dos ces farejandoo aroma do feijo com linguia e louro...Das batatinhas fritas na hora...

    No fogo fumegando, as panelas recheadasda melhor comida que comi em toda a minhavida.No pomar, encontro com a sobremesafruta do p, doces em compotas.

    A tarde passava, e com ela as pipas,o esconde-esconde, a amarelinha...Ah, o cheiro de sonho com creme...Que saudades!- Olha a revoada - gritava vov.

    Eram as andorinhas que pintavam o cu de azulmatizado pelas cores quentes do por do solmais bonito que j pude contemplar.

    E no alpendre as vozes alegres trazidas pelabrisa.Vozes que hoje j no ouo maisperderam-se no tempo, no espao,no infinito...

    Vozes veladas e amadasde pessoas queridas que fizeram parte daminha histria.Das minhas tardes,das tardes da minha infnciaembaixo do p de laranja.

    Mara

    Cristiano Melocristianooliveirademelo.blogspot.com

    Desde o dia em que Mara despencouDa janela escura e funda de dentroPra o cho pudo e plido cimentoSua fantasiosa vida empacou.

    Fustigada na luz dura do espaoViolentada, ters verdades nuasCega e surda pelas camadas cruasMomento inusitado no percalo.

    Mara escorria um qualquer sonhodbil

    Por entre belas e pasmas lilceasIluminada com o ventre infrtil.

    Asas brotam das costas violceasQuimera do fadado mito infantilAlma revigorada das terrqueas.

    Maria Bonita e o galope dopistoleiro

    Glria Digeneslinhasaovento.blogspot.com

    rdeas soltastamanho sem beirasilncio na ponta da lnguaolho certeiro de cangaceirocompondo a retina

    o alvo se esgueira

    mos ao altocorpo sem fronteirasussurro sobre ombrosdesejo armado da presafurando vereda

    estampido grito do vaqueiro

    pernas livres de esporascavalo sem celagalope de dois em desatinodedos molhados da pequena morteinvadindo a fera

    cheiro de fmea no tem cancela

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    14 revista cultural novitas n 8 novembro/dezembro de 2010

    Silncios

    Flvia Braunfbbraun.blogspot.com

    Sou feita de silncios...Que me acompanham com a marcante presenaDe palavras no ditas, no ouvidas...Mas o no falado mais forteO no escutado, se torna retumbanteNesse corao to sofrido...

    Sou movida a silncios...Que me perseguem tal qual vendavalEcoam em meus tmpanos...Com msicas de fora brutal...( sim... na maioria das vezes, suave como s...)

    E o silncio me cai bem...O observar, me atrai..

    O mundo passando minha frenteComo um filme assim... cinema mudo

    O silncio muito que valeTal qual ouro brutoQuando insiste o velho peitoA sentir a saudade desse mundo...

    Meu silncio me acalentaMe protege, me amparaDas armadilhas dessa vidaDos amores que me dem...

    Mas, no final, o silncio se vaiDando lugar msica que vem dalmaE me percorre todo corpoMe faz flutuar com o vento..

    Nas lembranas e delcias de voc...

    Resilincia da Alma

    Simone Mascarenhasmasquerade-sissym-blog.blogspot.com

    Acho que eu preciso lembrarde como bom poder danarde como bom saber sorrirde como bom voltar a amar

    A minha porta est encostadaa janela deixei apenas passara melodia da musica preferidaraios de sol insistem iluminar...

    Os recncavos da minha mente- hoje silenciosa e introspectiva,clamam diria-incessantementemanifestos de atitude assertiva

    Lembranas...

    Conjunto bem ordenado, um todoprofundo desejo de fazer algo maisde ser musa e inspirao no perodovigente... antes de ser tarde demais

    Calo-me, entrego-me resilincia...a minha alma como um passarinhoque precisa ser livre da ignorncia,porm presa ao seu nico destino:

    Apaixonar...

    Ento, eu simplesmente existi!

    Feitio de porcelana

    Madalena Barranco

    flordemorango.blogspot.com

    Na janela:sempre-vivasamarelas.Na varanda:sempre atentasao tempo.Na casa de boneca:porcelana

    trincada sobre a cama.No rosto da mulher:o matiz da feiticeira.

  • 8/8/2019 Revista Cultural Novitas N 8

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    15revista cultural novitas n 8 novembro/dezembro de 2010

    Letras Poticas

    Giselle Zamboniserescoletivos.com

    Imagino seu sorriso, por detrs da tela fina.busca eterna de menina,colhendo girassis

    Arquiteto suas mos, desenhos de muitas pontas.so de entrega, palmasestendidasdesejos de mulher, colhendo razes

    Esquadrinho seu peito, fortaleza de meninoguarda os segredos coronrios domundo

    Tateio sua face, beleza cermicaconstruo de barro e guafora danatureza, chovendo em mim

    Encontro vocinteireza de simmemrias de mimum s ponto, tua linha reta

    nas minhas arestas curvasenfim.

    Cada um tem um corao que bate na cara

    M.M.Sorianooescrevivente.blogspot.com

    As lavadeiras tm corao de bater roupa.As fofoqueiras tm corao de bater boca.Os fotgrafos tm corao de bater retratos.Os sambistas tm corao de bater caixas-de-fsforos.Os compadres tm corao de bater papo.Os construtores tm corao de bater pregos.

    Os operrios tm corao de bater ponto.As cozinheiras tm corao de bater claras em neve.O mar tem corao de bater contra as rochas.Os teimosos tm corao de bater na mesma tecla.Os escritores tinham corao de bater a mquina.

    Ventrloquo

    Simone Brichtasubindoemarvores.blogspot.com

    Vem o vento que vi ventrloquo. Vai que move o p,a boca, e a mo do boneco.

    Desmiolado, o fantoche refm do ventrloquo, que sem ser

    ningum.E quantos ventam no ar que outros movem,sem saber, quem so?

    Que continuam, apenas querendo, ser aquele que omovimenta?Os seus membros moles, e sem pensarquem manda

    e mexe o fio que comanda o poder. to louco, sem sentido.E os comandados, pelo ventrloquo, sem emoo prpriaso sombras do comando.

  • 8/8/2019 Revista Cultural Novitas N 8

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    16 revista cultural novitas n 8 novembro/dezembro de 2010

    Fiz uma pesquisa rpida no blogda Editora e sessenta e quatro pessoasresponderam. um nmero pequeno,levando-se em considerao a quantidadede leitores usuais do blog. Mas euprecisava de resultados da pesquisa parafazer este texto e pelo sim, pelo no, avai...

    Pegando esse gancho da pesquisa,

    fao aqui consideraes gerais: Pergunteise as pessoas compravam livros deautores novos, como as pessoascostumavam comprar livros, se liame-book, quanto investiam por ms e

    qual leitura preferiam.Para minha surpresa,a maioria esmagadorarespondeu quecomprava livros deautores novos.

    Livrarias fsicas,sites e portais literriosempataram na comprapor livros. A maioria daspessoas no l e-book,grande parte investemais de R$ 45,00 porms em livros e uma

    pequena parcela dos entrevistados lpoesia, sendo que a maioria prefere osoutros gneros literrios entre eles livrostcnicos.

    Alguma novidade at aqui? Pensoque no, pois boa parte das pessoas queconheo em papos sobre livros pensamdessa maneira. A diferena que todosque conheo fazem a leitura de poesias...

    Vendo o resultado dessa pesquisarpida, creio que declararam gostar depoesia porque me conhecem e sabem queescrevo poesia. Ser? Deve bater aqueleconstrangimento na hora que falo queescrevo poesia e pergunto se a pessoal algo. As respostas so sempre muitoparecidas: Leio, sim! Li ms passado umlivro lindo da Clarice, vou ler semana quevem um do Mario Quintana.

    Umas das respostas mais sincerasque recebi sobre a pergunta que faocom frequncia (Voc l poesia?), foi ada secretria de minha ginecologista.Ela perguntou o que era poesia... Assimna cara! Penso que quando a gentetrabalha com educao no se espantatanto com as perguntas, logo levei umlivro meu de presente e ela comentou:

    Ah, poesia isso? Livro bom de ler nobanheiro! Emendei: mesmo!, poisno existe nada melhor que ter leituraboa no banheiro. Quem nunca leu umaembalagem de pasta de dente? Ou overso do shampoo por falta de leitura boa?Poesia livro de banheiro, de bolsa, decabeceira, de la em banco, de sala deespera em mdico. Por sinal, eu gostariaque as salas de espera dos mdicostivessem livros de poesias invs das

    revistas que nos ensinam em 100 passosa ser mais bonita ou sexy.Sou leitora de poesias! Leio Hilda

    Hist, lisson da Hora, Augusto dosAnjos, David Nobrega, Mario Quintana,L Cavichioli, Monica Saraiva, CamilaPassatuto, Van Luchiari, Emily Dickinson,Cristiano Melo, Flvia Braun, CarolineFreitas, Florbela Espanca, Andrea LuciaBarros, Drummond e mais uma montanhade vivos e mortos, sejam eles em blogs

    que tenho prazer em seguir ou em livrosadquiridos e que esto presentes no meudia a dia, me presenteando com poesia detima qualidade!

    A pesquisa mostrou, por enquanto,que poesia lida por poucos. Talvez apoesia tenha-se reduzido pressa, aoscento e quarenta caracteres ou mesmo adois ou trs poetas j nados.

    Alguns devem achar difcil deentender... Quem sabe, por no saber

    que poesia carece de explicao ouentendimento. No precisa ser doutorou mesmo professor para ler, pode serentretenimento e por qu no? , leiturade sala de espera e de banheiro.

    :::opinioletcia losekann coelho

    Leia no banheiro!

    Pedagoga, editora e escritora

    leticiacoelho.com.br

    Umas das respostasmais sinceras querecebi sobre apergunta que faocom frequncia,

    foi a da secretriade minhaginecologista. Elaperguntou o queera poesia... Assimna cara!

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    Noite imensa, com ares de interminvel. Chovia l dentro. Mas s l dentro. Do ladode fora, apenas a ventania da tal primavera que no colore essas cercanias e cujas oresenfeitam somente a poesia que gravita. Vento, muito vento a remexer as ideias, a testar feito

    quebra-cabeas a pea correta no lugar ideal e formar alguma imagem, alguma paisagem,quem sabe de um campo de ores. Mas o vento voltava e a tudo desorganizava, comoquem desdenha do desejo lrico de encontrar a verdade, os por qus, as sadas.

    Junto com o sol, apenas uma resposta veio clarear: o motivo dos seus braos tocansados. De olhos fechados pde ver que nadara demais. Foram dias, horas, estaes,folhas de calendrios vividas em mar aberto, com braadas que apontavam para qualquerlugar que no fosse o que estava. Era preciso tomar distncia em grandes goles,embebedando o corpo com a iluso de que havia calmaria no cais. De que haveria calmaria.De que haveria cais. De que haveria.

    Houve erro de direo, houve tormenta e houve descoberta. Sem bssola, semastrolbio, sem Sagres e sem inteno. Sem cais e sem calmaria tambm. Nadarapraticamente uma vida e sem qualquer esforo, seus ps tocavam o cho. Sim, o tempo,a distncia, as braadas no levaram profundidade. Tantas noites de cu com menosestrelas que o comum e a permanncia no raso, no supercial, no epidrmico. A peleressecada, o gosto de sal compartilhado entre o mar e os olhos e a praia como nicacerteza, a terra: o lugar menos rme que j pde conhecer.

    No se sabe onde o rumo foi perdido. Ou talvez a conscincia tenha partido de umarajada de vento, de uma onda mais violenta. A disposio de chegar profundidade incluaa possibilidade de afogamento e isso era sabido. O que no sabia, que ainda estavacompletamente submersa e talvez no sobrevivesse a mais uma imerso sem garantia,num espao de tempo incontvel, que no cabe em si nem no mar.

    H fortes possibilidades de no ter sido em vo.

    O

    nadOe

    On

    ada

    MonicaSaraiva/blogdamoni.blogspot.com

    TerapuT

    ica

    LetciaPalmeira/leticiapalmeira.b

    logspot.com

    :::contos

    Siga meu conselho. Procure um terapeuta. E um que seja, de preferncia, recm-formado. Que tenha fome de ouvir e procurar n em chifre de cavalo. Entende? Eu encontrei

    o meu. homem. Faz dois anos que frequento sesses quinzenais que muito me ajudam aviver a semana inteira esperando por outra sesso. perfeito. No tomo medicao algumaporque, segundo meu terapeuta, no preciso. Estou bem. Ele ainda no me diagnosticou,mas j arriscou alguns palpites e, sempre que arrisca, volta atrs e diz que precisamoscaminhar mais e buscar mais respostas. Por mim est tudo maravilhoso. Adoro caminhar.E, ao lado daquele homem, subo at escadaria da Penha. No que ele que seja bonito.No . Mas botei na cabea que ele me ajuda e pronto. Minha cabea feita de tudo queacredito. E eu engano o terapeuta bonitinho. H dias em que invento de chorar porque digoestar me sentindo trada. Ele me passa uns lenos e eu choro de me deitar no sof e cofeliz com aquele homem olhando para mim com seus olhos semicerrados e sua expressode Freud Explica. No incio pensei que as sesses seriam gravadas como nos lmes. Masno. Ele sempre anotou tudo. Em papel mesmo. Eu falo e, vez por outra, ele anota e diz que

    entende muito bem. Ele tudo. Homem de armadura que fatura de mim 150 reais a cada15 dias. O consultrio dele era localizado na Rua General Osrio quando comecei a metratar. Agora ele atende em um belssimo prdio empresarial na Avenida Edson Ramalhoa dois passinhos do mar. Que alegria sair de casa, ver o azul do mar, o sol tostando ospobres miserveis que transitam pelas ruas e entrar no edifcio onde darei de cara comigoem uma sesso de terapia. Sento na sala de espera e vejo que a recepcionista usa sapatosapertados que lhe causam inchao nos tornozelos. Mas nada digo. Cumprimento a mulhercom um breve sorriso, sirvo-me de gua e sento a lerMarie Claire. Assim deve ser o cu.Msica ambiente, aroma de lavanda, poltronas confortveis e muitos loucos que entram esaem do consultrio do meu terapeuta. A janela tem uma bela vista de toda a via litornea.Posso at ver a frica se eu zer pensamento positivo. E o dia est lindo perolado deum sol forte e nuvens distantes. O mar murmura suas ondas de forma angelical. Comoestou feliz por ser maluca e poder fazer terapia com este homem que veste calas muito

    justas e deixam as partes ntimas muito espremidas e bem volumosas. Tento no olhar,mas impossvel. Ele ca como aqueles bailarinos e suas roupas apertadas. Ele deveriaesconder mais aquele troo para que eu no o veja. E olha que no sou a paciente maislouca. H outras. Devem agarr-lo. Provavelmente algo mais deve ocorrer. Mas no meimporto. Entro em sua sala, respondo que estou bem e sento no aconchegante sof que me

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    19revista cultural novitas n 8 novembro/dezembro de 2010

    d

    ez

    cenTavOs

    HugoCrema/

    calopsitaescapista.b

    logspot.com

    O corcunda que sabe como deita.Ditado popular

    Estava amarrando um cadaro como gostava de fazer, corpo curvado meio escondidoatrs do balco. Procurava um original que deixaram na semana anterior. Gostava defazer porque dava pra limpar as impresses digitais das fotos trs por quatro com algumapontinha do jaleco que estivesse menos manchada de tinta. Quase bateu a cabea nobalco quando a voz que o chamou era a mesma do telefone, ou seja, a voz que nocondizia com a gura que sonhara. A mulher no era a mesma, no obstante. Ao que parece,todas as duas ou trs mulheres que reincidiam em ser sonhadas por ele tinham jeito de tera mesma voz e sotaque. Essa tinha essa voz, esse sotaque e pastas de documentos quequeria fotocopiados para aquela tarde. Tanto o terninho ajustado ao corpo, quanto o tompomposo com que parecia querer afavelmente mandar sugeriam advocacia, mas ele sabiaque quem tirava cpias dos documentos nas reparties pblicas eram estagirios, o queos rebaixava a ser menos que operadores de fotocopiadoras. Apesar de o patro no estarna loja, prontamente atendeu. Limpando os dedos no jaleco, no escondeu o bocejo coma mo em frente boca. A boca dela crispou-se visivelmente contrariada e largou de alturaconsidervel o montante das pastas sobre a madeira do balco. O estalo o fez acordar devez.

    O que deseja?Preciso disso. Trs vias encadernadas, s trs da tarde na pressa ela percebeu

    que os documentos estavam fora da ordem, comea a espalh-los ao longo do balco;conforme identica o nmero do requerimento e data de expedio forma uma pilha esquerda. Ele mexe quase imperceptivelmente nos cartes postais que o patro posicionouno balco pra alavancar as vendas.

    Ele j decorou todas as paisagens e at as mensagens que escreveria em cadacarto postal, mas ainda assim: sempre bom por o dedo em lugares a que o salrio nolhe permitiria chegar eu passo aqui pra recolher.

    Tudo bem. Pagamento agora ou na hora da entrega?Na entrega. Quero tambm revelar uma foto. Fica pronto at a hora de buscar ascpias?Enquanto conrma que possvel sim entregar os servios no prazo que ela imps,ele pensou nas esparsas cpias que entraram at aquela hora do dia.Uma certido de bito, um atestado mdico, uma carteira de motorista e um passaporte

    de um bigodudo que pediu duas vias. Tudo mixaria que mesmo assim provvel quealgum se interessasse em roubar. Se a boca banguela do caixa registrava vinte e trsreais ganhos em quatro horas e meia de funcionamento, a culpa era do homem de boinaque pedira para ele fotocopiar cento e vinte vezes um mesmo pedao de papel de jornal

    TerapuTica

    LetciaPalmeira/leticiapalmeir

    a.b

    logspot.com

    espera. J z de tudo neste sof. Hipnose, exerccios de respirao, preenchi questionriose minto minha vida a cada quinze dias. Hoje decidi dizer a verdade. S por hoje falarei averdade feito um bbado evitando o primeiro gole. Conto de meus relacionamentos. Masele j sabe. J falamos muito a respeito de tudo e do homem com o qual me deitei algumasvezes. Meu terapeuta no pode dar opinies. No diretamente. Mas sempre faz uso dafamosa psicologia reversa. Ele me questiona por que ainda me deixo guiar por tal homemquando eu bem poderia ter muitos cavalos mais rpidos e velozes. Por que se envolve com

    algum de to baixa estirpe? Por que ainda se deixa fazer parte da vida de uma pessoaque simplesmente no tem vida? Por que se importa com um tolo que mal consegue sairdo lugar? Por que ca a se punir se envolvendo com um mundo inferior ao seu? E porque se preocupa com coisas to nmas quando o mundo imenso e cheio de outraspossibilidades? Voc chora sem motivos, mulher. Sacudo a cabea confusa. No entendo afala do interlocutor. Como pode um terapeuta falar com uma paciente dessa forma? Desdequando ele passou a falar comigo assim? Estranho o comportamento do homem a quemsempre menti uma verdade e agora ele me fala como se me conhecesse. Voc no meconhece, eu digo. Ele me olha de forma feroz e me manda sair. Sua hora acabou. Pegovoc s nove. E esteja pronta. E no me venha dizer que no acha certo o que fazemos.Ele ento beija minha boca com fora e eu saio do consultrio congestionada e confusafeito uma girafa em uma manada de elefantes. Mas sinto-me bem. Ao menos hoje ele metratou de forma diferenciada. Hoje, nalmente, meu terapeuta no me deixou mentir e faloua lngua que eu precisava ouvir.

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    rasgado de qualquer jeito. Sem foto, o papel tinha um nmero de telefone rabiscado comcaneta grossa. Uma notcia com inteno de direcionar a uma provvel reportagem maiordentro do jornal, que contava em poucas palavras a histria de um homem que sabia deum irmo gmeo seu que morrera durante o parto. O que esse homem, rfo de pai eme desde que nascera, no sabia de que na verdade a me carregara trs meninos nabarriga. A me frustrou-se com a morte de um deles e resolveu manter s um, dois seriamuma recordao amarga demais da morte do terceiro. Por isso, entregara um dos bebs

    que sobreviveu s freiras para adoo. O beb que deixou compulsoriamente a divisode proteo ao menor da Santa Casa aos dezoito anos era o homem que as cento e vintecpias noticiariam aos quatro cantos da cidade. O homem de boina armou veemente quedevia ser ele o irmo que havia sido criado por pais, que era seu dever por ser cidadoencontrar o seu irmo gmeo que fora abandonado no mundo. Embora os pais o tivessemcriado muito bem, nunca mencionaram nada a respeito desse irmo dado adoo. Ohomem da boina acreditava piamente em que esconderam a verdade em prol de preservara formao de sua identidade.

    Ao ouvir do homem da boina que quer as cpias rpido, ele apenas assente coma cabea. Justo ele assente e justo nele no di ouvir aquela histria, por mais que noguardasse boas recordaes do orfanato. L dentro era proibido usar essa palavra, porisso ele a repetia com tanto gosto. Bater no batiam, mas o abuso sexual entre internos erafrequente e respeitador de uma hierarquia clara, ligada fora e ao desenvolvimento fsicodo menor enclausurado. O rateio da comida escassa tambm respeitava essa hierarquia.Brinquedos s chegavam a ele j sem um olho, com uma roda empenada. A melhor parteera quando no meio da noite, sob a sua cama de ao, se escondia acompanhado de seulenol. Com um espelhinho de maquiagem roubado de uma das mes que quase o levaradali, canaliza a luz da lua para uns recortes de jornal que encontrava vasculhando o lixo.Com cuidado tentava recortar com os dedos os rostos nas fotos; os equiparava, viessemeles da coluna social ou do caderno da polcia. Quem sabe um sorriso estampado ou mosalgemadas em cima de uma cabea no encerravam uma resposta? Ficou feliz de carvelho ao descobrir que a estadia ali tinha prazo de validade. Ao sair de l no dia do seudcimo oitavo aniversrio, expulso por exceder o limite de idade de permanncia, sua sortegrande foi um velho com cara de safado que lhe oferecera esse emprego no cubculo emque agora trabalhava. Ainda bem que at agora o patro tentara nada. A bem da verdade,

    nunca entendeu as razes de ter nascido j connado e sem pais. E no atentaria para elasat depois que o homem de boina recolheu o pedido. A ordem do patro no caso de grandespedidos de cpias era sempre entregar dez por cento a menos, ningum contaria mesmo.O homem colocou as cento e dez folhas de papel sob o brao e depois de um suspiro curtoadmitiu que colaria cada cpia daquelas em um poste, quem sabe algum se pronticassea ser seu irmo. Saiu da loja num passo pesado de quem talvez se incomodasse com umaverdade improvvel.

    Obrigado.Volte sempre e boa sorte, saiba o que faz poucas certezas sobre se ele disfarava

    ou no ter entendido a extensa lengalenga do revolucionrio de jaqueta.Tenho certeza de que meu irmo e de que as foras do produtivas impetraram mais

    uma injustia que deve ser reparada.

    Ele aproveitou a sada do homem e o vazio da papelaria/loja de fotograa/fotocopiadoraem que trabalhava para sentar-se em um banquinho baixo e amarrar um cadaro. A alturado banquinho s deixava mostra o topo da cabea dele por trs do balco. Esfregou opolegar no dedo mdio, limpando a tinta na borda do jaleco. Procurando em vo por serviodeixado para trs, viu a ponta de um papel em uma das prateleiras sob o balco que usavapara acumular o servio. Ao perceber que esquecera uma cpia das do homem de boina,chegou a pensar em sair da loja, deixando-a ainda mais vazia para ir devolver, mas aindolncia venceu. Reordenou algumas fotos, as deixava em uma dessas prateleiras sobo balco para depois guard-las em uma caixa de sapato em casa. Caixa esta abarrotadade caras annimas que ele gostava de imaginar que sorriam para ele. Pela primeira vezindagou por que no tirar uma foto sua para por ali, tinha a mquina fotogrca da loja suadisposio. Depois talvez zesse isso.

    Sentou de novo no banquinho, s ao comear a ler pela terceira vez que percebeu.Leu tantas vezes que quase chegou ao ponto de corromper os sentidos das frases danotcia; decorou tudo que estava escrito no papel aps trs passadas de vista e trs leiturasem que forou a ateno. Para e pensa nas possibilidades que a notcia acarreta, semimaginar que seria meio difcil que escrevessem uma notcia sobre ele sem consult-lo ouavis-lo. E ainda mais difcil porque as feies dele e do homem da boina no coincidem,

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    HugoCrema/calo

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    Adquira j o seu!

    um dos dois deveria estar errado. Hesitou em voltar a seu apartamento; um cubculo cujajanela cava colada ao muro do cemitrio, erguido de tal maneira que s era possvel veros rostos das pessoas que andavam entre as lpides. Os rostos e um ou outro pssaro,que pousava nas ores que levavam para depositar. Hesitou em deixar ali o que faltava nom do salrio do ms. Num mpeto de ousadia vai ao cmulo de largar sobre o balco todoo dinheiro que tem no bolso, uma moeda de dez centavos que fez girar com um petelecomelanclico dos dedos. Desejou a sua foto trs por quatro ampliada numa capa de revista,

    a oportunidade de ouro. E viu a chance de, ao sair da loja, ao virar celebridade, outroso copiarem. Contudo, para sermos sinceros, s d pra dizer que depois de desfazer aexpresso de idiota que reteve no rosto durante quase trs segundos, ele ouviu o sininhoque anunciava que algum entrou na loja. E cou satisfeito por conseguir mais servionaquele dia to magro no mais que os outros de dinheiro. Entrou a pessoa que pediuo atestado de bito.

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    HugoCrema

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    Nas entrelinhas daquilo que nunca foi dito, estava l quieta e recolhida ,a necessidadede pintar as unhas de Pink melancia para me libertar da minha prpria priso. Tudo intacto,tudo como todos os dias, desde o primeiro.

    As horas no relgio da cozinha, passando na calma do nosso tempo e, o tempo domundo, a gente jogou no esgoto para ele ter que prender a respirao e parar uns poucos.Mil minutos slow down recheados de restos mortais e emocionais, misturados no monte de

    roupa no canto quase sujo do quarto. A minha urgncia contamina o corpo tranqilo dele.No meio de mil convices e valores intocveis encontrava-se a certeza de que tudo isso mesmo que a gente refaz a cada bom dia, que a gente arranca junto com a sua camisaque passa pela cabea, mesmo com os botes fechados.

    Tudo para ontem e para sempre e s para mim.Nos instantes denitivos das entrelinhas que s os grandes amores trazem, tudo

    muito transparente. Eu no sei, eu no quero saber nunca. Viver sem a gente vai me daruma insnia to mortal que eu acabo morrendo antes da hora.

    Mesmo que, s vezes, o destino insista em colocar tudo em xeque e a direo nafrente da rotatria que bem confusa. Precisa de bem pouco, pode acreditar.

    s isso que a gente vive sem explicar, mesmo sem lgica, que se teoriza na prtica ese pratica com tanto charme. E uma dose incrvel de selvageria para car menos constante,por favor.

    No barulho da chave virando a segurana da volta. Quando todo o resto aula de artesno jardim da infncia, to, to fcil. A gente volta para ns sempre.

    Eu s aprendo na dor e tem que doer muito, seno capaz da incapaz aqui nem notar.Quando di chacoalha, percebe. J viu louco em surto? Toma um tapa na cara que para como escndalo. Tudo que chacoalha assim restaura meu sistema do ponto em que deu pau.

    Nos silncios atormentados de quem no tem o que dizer por total falta de argumento,aprender que a sabedoria ter o controle dos impulsos parece maduro. S que eu no queroser mais madura. Eu quero s uns minutos de uns dias para ngir que sou irresponsvel parano precisar justicar todas as coisas.

    Eu travo e ele ui, eu quero morrer e ele me ressuscita no abrao que parece massagempara o meu corpo no parar e acabar dragado pela minha prpria conscincia. Ele me erguenos ombros fortes da segurana para ver se, de cima, o mundo ca mais fcil e eu co

    menos pesada para ele.S nas entrelinhas, porque no grosso mesmo isso nunca vai ser diferente. No frigir dos

    ovos, o amor nada mais do que um bicho que a gente tem que alimentar de entrelinhas. Oproblema que elas so para poucos e bons entendedores. O resto, no mximo, vive algoparecido com o amor.

    Compra-S

    e

    entrelinhaS

    TatiCavalcanti/taticavalcanti.c

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    contos que ningum contade David Nobrega

    contos que ningum conta

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    Sempre que se avistava o vulto,A serpentear na coxilha no lombo do cavalo,gritava-se para a vizinhana e para os de casa: L vem o homem!Aviso de respeito, no de temor.Era negro forte, na aparecncia do que se via,Contava-se pelos bolichos e galpes das estncias que fora um bravo e mui leal

    combatente,Peleou na guerra farrapa ao lado do major Teixeira Nunes,Que comandava os mitolgicos Lanceiros Negros.No havia vivalma que no conhecesse as histrias daqueles centauros,seres de olhar destemido de quem sublima uma misso,Liberdade...Este campo to vasto que os olhos no abraam e que chega a doer dentro da gente.Ele chegava, apeava do cebruno e sentava em torno do fogo de cho.Falava em silncios,Sorvia uns trs ou quatro matezitos com a peonada, ouvia atento algumas histrias,

    ele mesmo personagem, e partia,Apenas dizendo: Gracias pela companhia, at mais ver.Todos se olhavam, um sinal com as mos e viam aquela grandeza de existncia ir

    embora.Sina de quem foi feito para ser solto na vida, amaldioado vento-homem, sem identidade

    nem fronteira... Mas meu av, isso lenda, mito. Jamais se soube de onde veio e para onde foi.

    No tinha nome nem prole. apenas uma prece na boca dos crentes.E com lgrimas nos olhos, o velho que tem a sabedoria das lonjuras, sentenciou: Meu neto, somos causos contados ao redor do fogo, que nos embelezam e justicam

    o mundaru que nos rodeia. O rio segue seu curso, sem se importar de onde veio nem paraonde vai, ele sabe que rio.

    Corre a tarde e o vento aqui neste pedao do mundo, enquanto seu Altair passa pela

    janela montado em seu burrico, levando um balaio de pasto e, a tiracolo, uma bolsa de couroque de certo carrega a pistola.

    Penso que a montaria leva sua prpria alimentao e me ocorre que no venhofazendo o mesmo. Verduras compro de dona Virginha, solteirona do m da rua, ou ganhoda lha de seu Dimas, a Vanderlia, atirada que s. Gros mando comprar no armazmde seu Coutinho, junto com os vinhos e a aguardente. De Atajiba vem as guloseimas e asespeciarias. De mim mesmo s produzo as goiabas que, uma vez por ano, colho no fundodo quintal, depois do riachinho.

    De guarda-chuva muito grande e vestida at o pescoo, dona Lira me desconcentrade minhas divagaes:

    - Bas tardes seu Timteo, como lhe vai a famlia? Passa com o passo curto e ligeiro,mas me dando o tempo de resposta. Vai igreja confessar com Pe. Antnio. Nunca vi pessoa

    para ser temente a Deus como dona Lira! Dizem que no passado tomou erva braba e tirouum menino, mas isso coisa que o povo fala no armazm beira da caninha. De verdade, uma mulher religiosa, viva, no gosta de fofocas e est sempre pronta a ajudar qualquerum.

    Quando a lha do prefeito foi atacada noite na rua, foi ela que abrigou a meninaenquanto o pai corria atrs do meliante. Sua casa na esquina da Ilhus com a Santa Marta a mais imponente da cidade, mas nem por isso dona Lira se sente superior, fala com todomundo, oferece suas louas para o ch benecente da Igreja e, uma vez, at emprestoudinheiro a seu Antenor, um sujeito tido como vagabundo e mau pagador.

    Grito para a negra, dentro, para me preparar o banho, tenho que estar pronto paraa missa. E digo que me acompanhe, e ela ri, eu a aperto pela cintura e vamos os dois cozinha ver a gua no fogo de barro.

    DuaS

    SombraS

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