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A CONCEPAO DE TEMPO EM SANTO AGOSTINHO

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS

PR-REITORIA DE PESQUISA E PS-GRADUAO

DEPARAMENTO DE APOIO A PESQUISA-DAPPROGRAMA INSTITUCIONAL DE INICIAO CIENTFICA-PIBICO RETORNO A FREUD DE LACAN: UMA REVIRAVOLTA A PARTIR DA ANTROPOLOGIA, DA LINGUSTICA E DA FILOSOFIA

Bolsista: Andrey Marcelo de Souza Neves, VoluntrioMANAUS

2010UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS

PRO REITORIA DE PESQUISA E PS-GRADUAO

DEPARAMENTO DE APOIO A PESQUISA-DAPPROGRAMA INSTITUCIONAL DE INICIAO CIENTFICA-PIBICRELATRIO PARCIALPIB H /0090/2009O RETORNO A FREUD DE LACAN: UMA REVIRAVOLTA A PARTIR DA ANTROPOLOGIA, DA LINGUISTICA E DA FILOSOFIA

BOLSISTA: ANDREY MARCELO DE SOUZANEVESORIENTADOR: Prof. Dr.NELSON MATOS DE NORONHA MANAUS

2010SUMRIO

1 INTRODUO .................................................................................. 42. DESENVOLVIMENTO ................................................................... 91.1 . A trajetria intelectual de Jacques Lacan ........................................... 92.2. A Metapsicologia lacaniana - o simblico, o imaginrio e o real .......132.3. As condies do retorno a Freud de Lacan ......................................15 2.3.1. O Discurso de Roma ........................................................................152.3.2. Ainda o sujeito de Kojve: desejo e negatividade ...........................172.3.3. Lvi-Strauss: um inconsciente para a psicanlise de Lacan ............213. REFERNCIAS...................................................................................264. CRONOGRAMA .................................................................................28 1. INTRODUO

A presente pesquisa que est sendo desenvolvida mostra seus primeiros resultados, de onde, um sintoma se sobressai, a saber, a necessidade que o trabalho impe de explicitar durante esta investigao no somente as principais concepes que Jacques Lacan construiu em seu retorno a Freud, mas tambm os fundamentos externos psicanlise aos quais ele recorreu para alcanar seu objetivo. Retorno de Lacan que representa uma reviravolta na psicanlise e em sua trajetria intelectual a partir da lingstica, da antropologia e da filosofia, onde se destacam conceitos maiores como a ordem simblica, o sujeito e o desejo, por se tratarem de elementos inter-relacionados, que constituem uma teoria e uma clnica, que fruto de uma forma original de pensamento, mas que foi formulada por Lacan por intermdio de uma subverso e cruzamento de autores de campos dos mais diversos, reunidos muitas vezes de forma surpreendente. O que torna esta pesquisa um desafio de tentar reproduzir e compreender a complexa criao de Lacan em seu retorno a Freud. A obra de Lacan significa um passo fundamental dentro da psicanlise, mas que ultrapassa a prpria psicanlise, o que justifica o interesse crescente das cincias humanas e da filosofia no estudo da experincia intelectual lacaniana. Realizar este trabalho tambm uma aposta na hiptese levantada por diversos intelectuais, entre eles Vladimir Safatle, que em entrevista ao programa Olhar Literrio em 2007 , parte do pressuposto da impossibilidade de se compreender o sculo XX, suas aspiraes, suas utopias e seus desejos sem passar por Freud, e sugere que talvez seja tambm impossvel compreender o sculo XXI, sem passar por Lacan. O retorno a Freud de Lacan teve seu incio oficial em 1953, onde o Discurso de Roma um marco fundamental, pode-se considerar que este retorno se prolongaria at o seminrio 10 do ensino oral de Lacan A angstia (19621963), perodo onde Lacan partindo de conceitos e casos clnicos freudianos, realiza uma releitura da obra de Freud munido de novos instrumentos estruturalistas oriundos da antropologia e da lingustica. A partir do seminrio 11 Os quatros conceitos fundamentais da psicanlise (1963-1964), os objetivos de Lacan seriam ento um aprofundamento da refundao conceitual da metapsicologia , onde a releitura de casos freudianos seria cada vez menor. Sendo quase um consenso que o retorno a Freud de Lacan teria durado aproximadamente dez anos (1953-1963), possvel identificar um ponto central neste percurso, que permitir fazer uma distino necessria no interior deste perodo. Entre 1953 e 1960, o paradigma da intersubjetividade se mantm para Lacan como o melhor caminho para repensar a racionalidade da prxis analtica, no entanto a partir do Seminrio 8 A transferncia (1961-1962) possvel constatar que tal paradigma comea a ser criticado pelo prprio Lacan. A rigor, podemos dizer que Lacan no abandonou totalmente a noo de intersubjetividade, mas que a partir de 1961 coloca cada vez mais em xeque tal referncia. Por motivos metodolgicos, o retorno a Freud no perodo de 1953 a 1960, sob o paradigma da intersubjetividade, constituir um conjunto que ser o alvo desta pesquisa. O Objetivo Geral e os Objetivos Especficos da pesquisa em andamento podem agora ser enunciados com mais preciso. Surgem algumas modificaes, mas mantido o fio condutor dos objetivos traados anteriormente, quando da elaborao inicial do projeto de pesquisa. Resultante da fundamentao terica do trabalho, essas modificaes do enunciado dos objetivos, no apenas visam melhorar o seu aspecto formal, ao enunciar com mais clareza as metas a serem alcanadas, mas principalmente explicitar a lgica interna da investigao em andamento.Objetivo Geral:

- Investigar como Lacan no perodo de 1953 a 1960, construiu seu retorno a Freud.Objetivos Especficos:

- Analisar como a peculiar filiao de Lacan ao estruturalismo manteve a concepo de sujeito fundamentada a partir da filosofia.- Examinar a integrao do conceito de inconsciente teoria lacaniana proveniente do estruturalismo (antropologia e lingstica).

- Esclarecer a utilizao da noo de intersubjetividade no perodo do retorno a Freud de Lacan.Longe de se constituir ainda um trabalho aprofundado, este relatrio resultado das dificuldades de um momento da pesquisa que precisou privilegiar a compreenso geral da trajetria intelectual lacaniana e as concepes mais abrangentes de sua metapsicologia, como tambm os fundamentos tericos em que se constroem inicialmente o retorno a Freud, sem os quais no parece possvel aprofundar na continuidade, este empreendimento lacaniano. A diviso dos captulos e sub-captulos includos no item Desenvolvimento do Relatrio Parcial, objetiva inicialmente apresentar uma viso geral do percurso de Jacques Lacan (2.1. A trajetria intelectual de Jacques Lacan), realizando uma diviso de sua obra para efeitos didticos, baseado no incio de seus seminrios (passagem do perodo do imaginrio para o do simblico) e posteriormente a efetivao do perodo do real na realizao de seus ltimos dez seminrios (do seminrio 17 ao 26). No item 2.2, a instncia do simblico, do imaginrio e do real se apresenta sinteticamente na definio destes trs registros que fundamentam a metapsicologia lacaniana. Para estas duas primeiras sees assim como para a pesquisa com um todo, o trabalho do professor da USP, Vladimir Safatle, se tem constitudo alm de um excelente guia, um manancial de questionamentos e explicaes sobre a obra lacaniana. Safatle considerado atualmente um dos principais especialistas sobre Lacan no mbito da filosofia, com destaque para seu livro, A paixo do negativo Lacan e a dialtica, fruto de seu doutorado na Universidade de Paris sob a orientao de um ilustre filsofo contemporneo francs, Alain Badiou. Nos itens destinados a anlise mais aprofundada sob as influncias de Kojve e Lvi-Strauss no pensamento de Lacan, se utiliza principalmente o livro do professor Richard Simanke da Universidade Federal de So Carlos (UFScar), Metapsicologia Lacaniana, resultante de sua Tese de Doutorado em Filosofia na USP, defendida em 1997. Assim como a contribuio dos dois autores acima destacados ir continuar nesta investigao, a utilizao de obras de outros autores tambm de grande relevncia para o trabalho executado nos primeiros seis meses de pesquisa, apenas uma pequena amostra de um aprofundamento que se pretende muito maior no decorrer dos ltimos seis meses da pesquisa em andamento. Na prtica, preciso enriquecer os captulos apresentados aqui de forma limitada, e principalmente fundamentar a necessria incluso de novos captulos para o Relatrio Final. O que se deve adiantar desta incluso de novos captulos uma anlise mais detalhada do texto de Lacan, Funo e Campo da Fala e da linguagem (Discurso de Roma), que sem a compreenso que se buscou das concepes de sujeito em Kojve e de inconsciente em Lvi-Strauss, no poderia ser realizada convincentemente. A questo do significante, estatuto principal da ordem simblica e da determinao do sujeito para Lacan, ser investigado no texto, Seminrio sobre a carta roubada que abre a obra maior de Lacan, os Escritos. O inconsciente estruturado como uma linguagem, por sua vez, ser examinado na formulao terica de Lacan encontrada em Instncia da letra no inconsciente ou a razo desde Freud e por ltimo o paradigma da intersubjetividade deve ser estudado no clebre texto lacaniano Subverso do sujeito e dialtica do desejo. Estas leituras j esto sendo realizadas, mas ainda de modo muito superficial, devido a complexidade dos temas. Acredita-se que tal dificuldade pode ser superada por uma propedutica, norteada pelo estudo em andamento do livro do psicanalista francs Joel Dor, Introduo a leitura de Lacan, onde apesar de seu carter introdutrio, a teoria lacaniana analisada com detalhes, passo a passo, devido sua complexidade. Dado o grau de dificuldade, sem o domnio dos principais conceitos lacanianos, esta pesquisa no poder alcanar suas metas.

2. DESENVOLVIMENTO 2.1. A trajetria intelectual de Jacques Lacan O psicanalista francs Jacques Lacan (1901-1981) ultrapassou os limites da clnica, tornando-se um expoente da intelectualidade francesa do sculo XX, formulando um sistema de pensamento original, capaz de manter um dilogo com diversas reas do conhecimento, onde possvel destacar em sua obra, uma relao intensa e fecunda com a filosofia. A seguinte avaliao de Michel Foucault pode servir de explicao inicial dos objetivos da complexa trajetria intelectual lacaniana: Lacan buscava na psicanlise no um processo de normalizao dos comportamentos, mas uma teoria do sujeito (FOUCAULT,1981, p.329).

Em relao prtica da psicanlise, Lacan manteve dois pressupostos fundamentais da interveno psicanaltica desde Freud: a) se restringe relao psicanalista-paciente; b) no se utiliza de medicamentos. No que Lacan no tenha se utilizado da farmacologia, enquanto mdico, em situaes extremamente necessrias, mas esta prtica nada tem a ver com o tratamento em psicanlise, apenas permitindo em alguns casos que a anlise possa ser iniciada. Por outro lado, a obra de Lacan e sua prtica psicanaltica sempre se caracterizou por uma certa rebeldia, buscando e encontrando caminhos originais por intermdio de uma espcie de programa interdisciplinar para o desenvolvimento de sua teoria e de sua clnica. Uma das questes que move a trajetria intelectual de Lacan: a crtica aplicao de um materialismo reducionista s clnicas dos fatos mentais (SAFATLE, 2007, p.12), o que na atualidade torna a crtica de Lacan ao materialismo organicista, ainda mais oportuna, devido ao avano das neurocincias e da farmacologia.

Em 1932, o mdico Lacan estria no universo intelectual francs com a sua tese de doutorado intitulada: Da psicose paranica e suas relaes com a personalidade, que no teve grande repercusso na rea mdica, mas que foi elogiada principalmente pelos expoentes do Surrealismo, entre eles Salvador Dali. O motivo desta acolhida pode ser justificada pelo intuito de Lacan em construir uma teoria reunindo a clnica, a reflexo social e a tematizao da produo esttica (SAFATLE, 2007). Lacan desde o incio busca na clnica uma relao entre o mental e o social, em vez da relao entre o mental e o orgnico.

Costuma-se dividir a trajetria intelectual psicanaltica de Lacan em trs fases: a) do imaginrio; b) do simblico; c) do real. No por coincidncia, so segundo Lacan, as trs instncias registradas no campo das experincias subjetivas. Trata-se de constatar a primazia na obra de Lacan de uma instncia em relao as demais, em determinados perodos cronolgicos da obra de Lacan. Evidentemente, esta diviso realizada por motivos didticos e carece de perfeio especialmente nos momentos de transio de um perodo a outro. O perodo do imaginrio no percurso intelectual de Lacan, que corresponde as dcadas de 1930 e 1940, teve seu incio aps a sua tese de doutorado, a partir de dois fatos fundamentais que guiaram sua trajetria, a saber, incio de uma anlise didtica com Rudolph Loewenstein que durou seis anos, para que pudesse se tornar psicanalista; a participao de Lacan nos Seminrios de Alexandre Kojve sobre uma importante obra da histria da filosofia, a Fenomenologia do Esprito de Hegel. Por influncia de Kojve, Lacan se deter a uma teoria do desejo, que fundamentar seus estudos sobre a personalidade, que contribuir para construo de um importante conceito lacaniano, caracterstico deste perodo, a noo de estdio do espelho, que segundo Safatle (2007, p.27) visa demonstrar como a formao do Eu depende fundamentalmente de um processo ligado constituio da imagem do corpo prprio. Lacan se refere ao estgio que a criana entre seis meses e um ano e meio de idade desenvolver um esquema mental capaz de dar contar da unidade do seu prprio corpo. Em 1966, foi publicada a grande obra de Lacan intitulada Escritos, que teve grande repercusso no meio intelectual, onde Lacan pde finalmente apresentar ao pblico em geral, uma coletnea de mais de 30 textos do perodo de 1936 a 1966. Selecionados e revistos por ele, estes textos representam o que h de mais importante em seu perodo do imaginrio e do simblico. Ainda que seja natural por motivos editoriais, que alguns textos significativos tiveram que ficar de fora desta coletnea. Relativo a este primeiro perodo do imaginrio temos como principais textos reunidos nos Escritos: 1. Para-alm do Princpio de realidade de 1936; 2. O tempo lgico e a assero de certeza antecipada de 1945. 3. Formulaes sobre a causalidade psquica de 1946; 4. A agressividade em psicanlise de 1948. 5. O estdio do espelho como formador da funo do eu de 1949 (conceito exposto pela primeira vez em 1936).

Como se sabe, o perodo do simblico o mais importante da trajetria intelectual de Lacan, onde foi realizado os seus primeiros 16 primeiros seminrios. nesta poca que se realiza o seu famoso retorno a Freud, cujo marco inaugural o Discurso de Roma de 1953. Este perodo do simblico na trajetria intelectual de Lacan tem incio na dcada de 1950, marcado por um texto denominado O mito individual do neurtico de 1951,onde j se percebe a influncia do estruturalismo de Lvi-Strauss, poca do incio dos seminrios em sua casa em 1951 e posteriormente dos Seminrios oficiais que surgem em 1953. Este perodo continuar aproximadamente at o final da dcada de 1960, ou seja, at o Seminrio XVI De um ao outro (1968-1969) do ensino oral de Lacan.

Nos Escritos, a maior parte dos textos so deste perodo, se pode destacar entre tantos textos fundamentais, alguns textos mais comentados e que so de grande relevncia para a compreenso do pensamento de Lacan , praticamente obrigatrios para os estudiosos do lacanismo, relacionados aqui em ordem cronolgica: 1. Funo e campo da fala e da linguagem em psicanlise de 1953 (mais conhecido como o Discurso de Roma e considerado o grande marco inicial do retorno a Freud de Lacan); 2. Seminrio sobre a Carta Roubada de 1955 e 1956 (escolhido por Lacan para abrir a coletnea, no se pode confundir este termo seminrio utilizado aqui, com os seminrios do ensino oral de Lacan, pois apesar do estudo deste tema ter sido inicialmente realizado no seminrio 2, trata-se nos Escritos de redao prpria); 3. A instncia da letra no inconsciente ou a razo desde Freud de 1957 (onde se apresenta, talvez, de forma mais sistemtica o inconsciente estruturado como uma linguagem, Lacan recomenda sua leitura para os que desejam compreender o seu Seminrio 5 As formaes do inconsciente). 4. Subverso do sujeito e dialtica do desejo de 1960 (um dos mais clebres textos de Lacan, onde a presena da filosofia hegeliana bastante explcita) 5. Kant com Sade, escrito em 1962 e publicado inicialmente em 1963 (texto importante porque revela uma crtica noo de intersubjetividade, paradigma central da psicanlise lacaniana na maior parte do perodo de seu retorno a Freud). O perodo do real na trajetria de Lacan inicia-se a partir do final da dcada de 1960, com o Seminrio XVII O avesso da psicanlise (1969-1970) e ir at o Seminrio XXVI A topologia e o tempo (1978-1979) ou ao final da carreira de Lacan em 1981. Nos dez ltimos seminrios possvel distinguir uma mudana importante nos objetivos intelectuais de Lacan. Como explica Safatle (2007, p.87): neste momento que Lacan se dedicar de maneira mais sistemtica a uma anlise de discurso que visava fornecer um novo quadro de objetividade da psicanlise atravs de sua confrontao com os procedimentos de formalizao da matemtica, da lgica e da topologia. Se uma elaborao mais sistemtica sobre o registro do real j se percebe em anos anteriores, justamente a partir do Seminrio XVII (1969-1970) que tal instncia ter a supremacia na elaborao terica de Lacan. 2.2.A Metapsicologia lacaniana:o simblico,o imaginrio e o real Assim como se viu na trajetria intelectual de Lacan, a metapsicologia lacaniana composta fundamentalmente pelas instncias do imaginrio, do simblico e do real. Inicialmente cabe diferenciar o modo em que ocorre a metapsicologia em Lacan da metapsicologia encontrada na obra de Freud. Como bem diferencia Christian Dunker (2007, p. 217): Na obra de Freud possvel separar, com razovel preciso, os momentos de teorizao metapsicolgica dos momentos de teorizao clnica. O mesmo no se d em Lacan. Suas consideraes sobre o mtodo de tratamento e suas ilustraes clnicas combinam-se ao longo da obra com uma seqncia de debates e incorporaes cruzadas da metapsicologia com a cincia, a filosofia e a arte. Efeito desse cruzamento o que poderamos chamar de migrao clnica de conceitos. Ou seja, noes tradicionalmente ligadas teoria do conhecimento so gradualmente trazidas para a prtica clnica, assumindo, finalmente, um determinado valor tico, a partir do qual se desdobram em procedimentos clnicos.

Feito isto, se pode encontrar uma definio, grosso modo, do que significa para Lacan os trs registros nos quais se desenvolve a experincia humana. importante lembrar que para Lacan o campo freudiano (a psicanlise) constitui o terreno mais indicado para que se possa apreender esta experincia. necessrio compreender que para Lacan, as trs dimenses da realidade humana esto sempre presentes em uma relao de articulao conjunta:

- Imaginrio: o que o homem tem em comum com o comportamento animal. Imagens ideais que conduzem o desenvolvimento da personalidade do indivduo e a relao que este tem com o seu prprio meio ambiente. (SAFATLE, 2007, p. 30-31).

- Simblico: o domnio da organizao estrutural da vida social. Como Lacan subordina a sociedade e a cultura linguagem, a ordem simblica ser um conjunto de significantes que determina os lugares que cada um pode ocupar na vida social. (SAFATLE, 2001, p.1)

- Real: No , como poderia parecer, a dimenso da experincia imediata. Sua definio negativa: ele aquilo que no pode ser representado por um significante nem pode ser formalizado por uma imagem (SAFATLE, 2001, p.1 ). O real para Lacan, no sinnimo de realidade.

O filsofo esloveno Slavoj Zizek em seu livro Como ler Lacan, utiliza uma interessante analogia com o jogo de xadrez para ilustrar os trs registros de Lacan, que por seu valor didtico merece ser citado mais longamente: Essa trade pode ser belamente ilustrada pelo jogo de xadrez. As regras que se tem de seguir para jog-lo so a dimenso simblica: do ponto de vista simblico puramente formal, o peo definido apenas pelos movimentos que essa figura pode fazer. Esse nvel claramente diferente do nvel imaginrio, ou seja, a forma como cada uma das diferentes peas so moldadas e caracterizadas por seus nomes (reis, rainha, peo) e fcil conceber um jogo com as mesmas regras, mas com um imaginrio diferente, no qual esta figura poderia ser chamada de mensageiro ou corredor ou qualquer outro nome. Finalmente, real o conjunto complexo inteiro de circunstncias contingentes que afetam o curso do jogo; a inteligncia dos jogadores, as intromisses inesperadas que podem perturbar um jogador ou diretamente interromper um jogo (ZIZEK, 2007, p. 8-9). 2.3 As condies do retorno a Freud de Lacan Simanke (2002, p.527), comenta sobre a projeo que Lacan teria feito ao se aproximar do estruturalismo em seu retorno a Freud: a releitura lacaniana de Freud, que caracteriza o seu projeto psicanaltico, vai consistir basicamente na redefinio dos conceitos metapsicolgicos, com vistas a apagar aquele estranhamento e revelar a identidade simblica entre o sujeito e a teoria. O estranhamento a que se refere Simanke, trata-se da estranheza entre a clnica e a metapsicologia, alvo da crtica politzeriana psicanlise. Uma dicotomia entre uma metapsicologia, herdeira de um cientificismo naturalista e uma clnica que se ocupa, acima de tudo, com um sujeito humano histrico. Movimento intelectual hegemnico na Frana das dcadas de 1950 e 1960, que se convencionou chamar retroativamente de estruturalismo, tem como seu fundamento segundo Safatle (2007), considerar que o objeto das cincias humanas no o homem em sua intencionalidade ou como produtor de sentido, mas as estruturas sociais que o determinam. Para o estruturalismo, a linguagem fato social fundamental. Mesmo no perodo do retorno a Freud, Lacan no deve ser considerado um estruturalista clssico, pois em sua teoria do sujeito esto presentes questes de reconhecimento que esto fora da racionalidade estruturalista. 2.3.1 O Discurso de Roma

Em 1953 ocorre uma diviso no movimento psicanaltico francs aps a ciso na Sociedade Psicanaltica de Paris (SPP), resultando a criao da Sociedade Francesa de Psicanlise (SFP), onde Lacan assume uma posio de liderana. Neste mesmo ano no clebre Discurso de Roma, intitulado Funo e campo da fala e da linguagem em Psicanlise, Lacan apresentava a comunidade psicanaltica, seu programa de retorno a Freud, uma reviravolta que marcar profundamente a histria da psicanlise e a prpria obra lacaniana.

O retorno a Freud significava no somente retornar a leitura dos textos freudianos, mas efetivamente representava a incorporao teoria lacaniana de um conceito fundamental de Freud, o inconsciente. Lacan que estivera at ento distante desta concepo, agora por intermdio de seu encontro com a antropologia estrutural de Lvi-Strauss, poder dizer-se freudiano, como se pode notar em um trecho do Discurso: No patente que um Lvi-Strauss, ao sugerir a implicao das estruturas da linguagem e da parte das leis sociais que rege a aliana e o parentesco, j vai conquistando o terreno mesmo em que Freud assenta o inconsciente? (LACAN,1998, p.286). Nessa conferncia, Lacan destacar a importncia da lingustica para as cincias humanas: A lingustica pode servir-nos de guia neste ponto, j que esse o papel que ela desempenha na vanguarda da antropologia contempornea, e no poderamos ficar-lhe indiferentes. (LACAN,1998,p.286). Sobre a terminologia utilizada para construo de conceitos por Freud, Lacan indica um caminho a ser percorrido: [...] parece-nos que esses termos s podem esclarecer-se ao estabelecermos sua equivalncia com a linguagem atual da antropologia ou com os mais recentes problemas da filosofia, onde, muitas vezes, a psicanlise s tem a se beneficiar. (LACAN,1998,p.241).

Ao adentrar o campo do estruturalismo, o rebelde Lacan, fiel ao seu estilo, realiza o que ser cada vez mais presente em sua futura trajetria intelectual, ou seja, introduz um modo bastante peculiar de apropriao e subverso de modelos tericos dos mais variados campos do conhecimento. O desafio a ser enfrentado por Lacan a tarefa de reuni-los em um sistema de pensamento original. Em seu percurso anterior, verifica-se que a concepo de sujeito kojviana se afirma como uma referncia importante na construo da teoria lacaniana, agora com a incorporao da concepo de inconsciente de Lvi-Strauss, a concepo de sujeito baseada em uma leitura bastante singular da Fenomenologia do Esprito de Hegel por parte de Kojve, se mantm como fundamento da construo terica lacaniana, como percebido no Discurso. La Sales (2004) identifica trs temas no Discurso: o sujeito, a dialtica e a dimenso histrica envolvida na experincia psicanaltica, que somados a centralidade da linguagem, constituem os fundamentos desta conferncia. A questo do sujeito e a dialtica apontam a continuidade da influncia de Kojve na obra de Lacan e a dimenso histrica parece indicar a presena de Heidegger. Sales (2004, p. 50) sintetiza o que essencial no Discurso: a estrutura da linguagem, sendo o prprio inconsciente, se articula na fala do sujeito que, em sua historicidade e finitude, entra, com o psicanalista, num processo de troca dialtica que se direciona para a verdade de seu desejo. Simanke (2002), ressalta que Kojve e Lvi-Strauss so reconhecidos como fundamentais para a elaborao terica de Lacan. Nos prximos sub-captulos do trabalho, ser apresentado uma descrio das influncias de Kojve (2.3.2) e Levi-Strauss (2.3.3) na construo do retorno a Freud de Lacan. 2.3.2 Ainda o sujeito de Kojve: desejo e negatividade Uma gerao de intelectuais franceses foram influenciados pelo curso ministrado por Kojve sobre a Fenomenologia do Esprito de Hegel no perodo de 1933 a 1939. Alm de Lacan, filsofos como Merleau-Ponty, Georges Bataille e Raymond Aron, entre outros, freqentaram os seminrio de Kojve. Alm disso, tal influncia se estende a textos de Jean-Paul Sartre, apesar deste no freqentar o curso de Kojve. Um ensino de Kojve que se fez passar por comentrio de texto segundo Safatle (2007, p.25): [...] no difcil demonstrar os desvios de leitura conscientemente produzidos no texto hegeliano, embora seja tambm inegvel o carter preciso de algumas de suas chaves de compreenso. A leitura Kojviana da obra de Hegel fundamentada principalmente pela filosofia de Karl Marx e tambm por Martin Heidegger. O captulo sobre Kojve encontrado no livro de Simanke, Metapsicologia Lacaniana devedor do trabalho de Descombes: como aponta Descombes, Kojve , sem dvida, um dos principais mentores da ressureio de Hegel como um autor de vanguarda nos anos 30 da inteligentsia francesa (SIMANKE, 2002, p.399).

A leitura de Kojve da obra de Hegel se transforma em uma antropologia filosfica e desta forma participa efetivamente da formulao das teses lacanianas: uma teoria no-psicolgica da constituio do sujeito que Lacan encontra em Kojve, no s porque tudo se passa no interior do territrio da filosofia, mas tambm porque essa filosofia particular o Hegel da Fenomenologia do esprito foi a galantemente traduzida para os termos de um drama humano, histrico e social, no qual se joga a possibilidade da constituio da conscincia de si. (SIMANKE,2002, p. 398-399) Kojve no somente forneceu elementos para Lacan construir sua teoria do imaginrio, mas tambm contribuiu para a reviravolta que ocorrer na dcada de 1950: [...] no j citado texto de abertura da Introduction la lecture de Hegel, publicado ainda em 1939. Examinado de perto, esse texto apresenta-se como uma espcie de programa para a teoria lacaniana do sujeito poca, assim como daquelas que ainda esto por vir. Esse exame pode, assim, fazer surgir no detalhe esse iderio terico bastante abrangente que Lacan foi buscar em Kojve (SIMANKE, 2002, p. 407 ) O texto de Kojve que tanto influenciou Lacan denominado: guisa de introduo, abertura do livro: Introduo leitura de Hegel, que trata-se da traduo comentada da Seo A do Cap. IV da Fenomenologia do Esprito de Hegel, intitulada Autonomia e dependncia da conscincia-de-si: dominao e servido. O grande mrito de Kojve no retorno a Freud de Lacan, pode ser considerado o que Simanke sugere: talvez se possa atribuir a Kojve a faanha de ter preservado a referncia lacaniana ao sujeito no contexto de um estruturalismo que tem a sua aniquilao como projeto. (SIMANKE, 2002, p. 499) Joo Jos Almeida defende em seu artigo intitulado, O desejo do desejo de Kojve, a tese que o principal na teoria lacaniana a hiptese que o desejo falta: O principal operador da teoria lacaniana a hiptese de que desejo falta uma concepo subsidiria da ontologia negativa de Alexandre Kojve. A idia de falta, de perda, de corte, de limite constitui a existncia como tenso permanente, como luta infinita pela recuperao de um gozo definitivamente perdido. Para Lacan, o corte ocasionado pela linguagem. Sua concepo de linguagem idealista, porque esta no se refere seno a si mesma; nada diz sobre o mundo, pois o exclui, nem sobre o sujeito, por subordin-lo aos seus liames e deslocamentos (ALMEIDA, 2004, p. 101). 2.3.3 Lvi-Strauss: um inconsciente para a psicanlise de Lacan

A noo de inconsciente oriunda da antropologia permitiu a Lacan a possibilidade de incluso em sua teoria de uma concepo fundamental da psicanlise, mas isso somente foi possvel, quando Lvi-Strauss definiu o sentido do conceito de inconsciente, at ento disperso no campo da antropologia. (Simanke, 2002). A peculiaridade desta reformulao no interior da teoria lacaniana evidenciada na manuteno da concepo de sujeito, quando do advento na teoria de Lacan do inconsciente proveniente do estruturalismo: ser preciso, ainda, que Lacan cruze Kojve com Lvi-Strauss para que possa haver sujeito e desejo nesse inconsciente doravante estruturado como uma linguagem (SIMANKE, 2002, p. 431). O que torna Lacan um rebelde no s no campo do freudismo, mas tambm no movimento estruturalista, pois conciliar projetos que parecem a princpio to antagnicos no interior da teoria, parece ter sido mesmo a tarefa lacaniana no incio de um retorno a Freud. O que se destaca nesse momento uma singular coerncia interna na trajetria de Lacan, pois quando resolve incluir novas concepes em sua teoria, costuma manter o que h de essencial em sua trajetria anterior. Considerado o grande nome do estruturalismo, Lvi-Strauss, com sua obra As estruturas elementares do parentesco, publicada em 1949, apresenta uma nova metodologia para a pesquisa antropolgica: ele vai eleger um novo modelo de cientificidade o modelo lingstico oferecido pela lingustica estrutural impulsionada por Jakobson (SIMANKE, 2002, p, 432-433). importante compreender que o papel desempenhado pelo modelo lingstico na antropologia, est diretamente ligado a noo de inconsciente. A investigao de Lvi-Strauss (2003) sobre as estruturas do parentesco marcada pela lei cultural (e no natural) da proibio do incesto. Este fato cultural, instaurador da ordem social promove uma ruptura entre natureza e cultura. Por outro lado a apropriao do mtodo da fonologia, proveniente de Roman Jakobson, ser explicitada: tal como os fonemas, os termos de parentesco so elementos de significao: como eles, s adquirem essa significao sob a condio de se integrarem em sistemas (LEVI-STRAUSS apud DOSSE, 1993, p. 43). os sistemas de parentesco, como os sistemas fonolgicos so elaborados pelo esprito no estgio do pensamento inconsciente(LVI-STRAUSS apud SIMANKE, 2002, p. 434).

A adoo do modelo lingstico implicar uma reformulao do conceito de fato social por parte da antropologia, o que vai resultar: na eleio do smbolo como objeto da antropologia e na equiparao da cultura a um conjunto de sistemas simblicos passveis de uma descrio formal nos mesmos moldes que a anlise fonolgica (SIMANKE, 2002, p. 435). O homem est necessariamente atrelado a um registro do simblico, que lhe permite possuir idias sobre as coisas e no as prprias coisas, ou seja, o sujeito constitudo primordialmente pelo simblico . Lvi-Strauss segue a linguistica de Saussure, na distino entre o significante e o significado, entretanto: adapta-a ao terreno antropolgico, ao atribuir ao significante o lugar da estrutura e ao significado o do sentido, ao passo que em Saussure trata-se, antes, de opor som e conceito (SIMANKE, 2002, p. 435). A utilizao por Lacan de fundamentos da lingstica de Saussure, de fato, intermediada por Lvi-Strauss, sendo este, a fonte direta para a formulao da teoria lacaniana do simblico. Como a antropologia estrutural tem um projeto, cuja racionalidade exclui a concepo de sujeito, isto justamente permite que Lacan configure a psicanlise como a cincia desse novo sujeito, o sujeito determinado pelo simblico: Na medida em que tanto a cultura quanto o sujeito esto organizados pela linguagem, este ltimo configura to somente o modo de expresso individual da funo simblica, uma traduo, como dir Lvi-Strauss, do simbolismo coletivo no plano individual. dessa verso particular do simbolismo social que ao qual ainda se pode dar o nome de sujeito que vai-se ocupar a psicanlise reescrita por Lacan, que se apresenta assim como a contraparte subjetiva da antropologia estrutural (SIMANKE, 2002, p. 438-439).

Ao que se deve acrescentar a isso, uma concepo de sujeito da qual Lacan continuar se servindo para seus objetivos, vinda da peculiar releitura hegeliana de Kojve. O que faz surgir a seguinte questo: como conciliar dentro da teoria lacaniana, o sujeito kojviano o sujeito do desejo, com um sujeito determinado pelo simblico? Este imenso desafio de manter a subjetividade com tamanha determinao do sujeito, nortear todo empreendimento lacaniano de retorno a Freud. A concepo de inconsciente em Lvi-Strauss que interessar a Lacan, formulada de duas formas: objetiva correspondente ao plano da estrutura social e subjetiva que corresponde ao indivduo.A mediao da passagem entre o objetivo e o subjetivo realizado pelo inconsciente. O primeiro aspecto, subjetivo, que a noo de inconsciente adquire na antropologia:

Este inconsciente , portanto, um sistema de formas universais de operaes lgicas, e no outra coisa, por enquanto, seno a funo simblica. Suas leis determinam o comportamento de todos os homens em magia, em religio, em Lingstica. Ele determina as modalidades de apreenso subjetiva, pelo etngrafo, dos fenmenos sociais revividos por ele, e garante que esta vivncia coincidir com a conscincia indgena. Ele um princpio efetivo de organizao da vida interior; sob este aspecto, constitui um princpio subjetivo que determina nossas atividades mentais (LPINE apud SIMANKE, 2007, p. 440-441). O segundo aspecto a objetividade da estrutura social, reafirmando o seu carter inconsciente em um plano estritamente cientfico. Resumindo os dois momentos do mtodo estruturalista e a funo que neles desempenha o inconsciente:

[...] Na primeira fase, a da investigao etnogrfica, o inconsciente possibilita a comunicao entre o observador e seu objeto; o princpio subjetivo de organizao da vida mental de ambos. Agora, sob seu aspecto objetivo, ele possibilita a passagem dessa primeira fase da apreenso subjetiva de uma significao para a apreenso objetiva, ao nvel da anlise cientfica, da infra-estrutura. Precisamente por ser inconsciente, ele fica fora da apreenso subjetiva, e suas leis s podem ser conhecidas como objetos, no nvel cientfico. Este duplo carter do inconsciente, subjetivo por ser um princpio efetivo de estruturao da vida mental, e objetivo por ser inconsciente e conhecido apenas atravs da anlise cientfica, o que lhe permite, em primeiro lugar, estabelecer a comunicao entre o sujeito e o objeto e, em segundo lugar e , em segundo lugar, realizar a passagem entre os dois momentos da investigao antropolgica (LPINE apud SIMANKE, p. 442).

Analogamente, a investigao psicanaltica de Lacan ser constituda de dois momentos: um momento clnico, que corresponde a uma concepo de contexto analtico, como relao intersubjetiva, para o qual contribuem Lvi-Strauss e principalmente Kojve; e um momento metapsicolgico, com a condio de se entender esse alm da psicologia como um passo em direo ordem antropolgica, e no a um limite entre o psquico e o neurolgico, como em Freud (SIMANKE, 2002, p.442). Em Lacan, o inconsciente ser efetivado em sua teoria, graas ao novo registro do simblico e a estrutura da linguagem. Assim como a introduo do livro de Kojve, Introduo a leitura de Hegel, representa obra fundamental na construo do pensamento lacaniano, o texto Introduo a obra de Marcel Mauss, de Lvi-Strauss, publicado em 1950, exerce profunda influncia na obra de Lacan, por isso este texto merece uma anlise. Ao contrrio do que o ttulo possa transparecer, no se trata de um mero prefcio a uma obra importante, mas difusa, como a de Marcel Mauss. uma oportunidade que Lvi-Strauss aproveita para definir seu prprio programa estruturalista constitudo de uma rigorosa metodologia. Lacan com este texto, apreende os princpios fundamentais do estruturalismo, numa verso muito prxima de suas prprias idias, constituindo um verdadeiro programa para a obra lacaniana dos anos 1950. (SIMANKE, 2002). Em um primeiro momento, j se percebe neste texto de Lvi-Strauss, que se abordar frequentemente questes de patologia mental, incluindo um debate com a psicanlise. Tal aproximao e parentesco com a psicanlise creditada a Mauss:

[...] Mauss no apenas estabelece o plano de trabalho que ser, de forma predominante, o da etnografia moderna ao longo dos dez ltimos anos, mas percebe ao mesmo tempo a conseqncia mais significativa dessa nova orientao, isto , a aproximao entre etnologia e psicanlise(LVI-STRAUSS, 2005, p. xi).

necessrio destacar que o inconsciente que Lacan incorpora sua teoria, no possui nada de psicolgico e determinado por um processo social, a linguagem:[...] o psicolgico, em sentido tradicional, coincide justamente com aquilo que aparece em Freud como o psiquismo consciente ou pr-consciente, traduo Freud tambm emprega essa metfora de um inconsciente que representa a realidade psicolgica fundamental. S que, neste momento, o inconsciente deslocado para o plano social, no o de um realismo social ingenuamente formulado, mas para o de uma estrutura que forma o esqueleto lgico da fenomenologia social e que, na medida em que os sujeitos singulares da derivam, pode fornecer a chave para a explicao dos fatos da subjetividade (SIMANKE, 2002, p.448).

Lacan adotar uma concepo de Lvi-Strauss sobre as relaes entre indivduo e sociedade, que contribuiu para a renovao de seu estudo dos fenmenos psicticos: da natureza da sociedade que ela se exprima simbolicamente em seus costumes e em suas instituies; ao contrrio, as condutas individuais normais jamais so simblicas por elas mesmas: elas so os elementos a partir dos quais um sistema simblico, que s pode ser coletivo, se constri. So apenas as condutas anormais que, por serem dessocializadas e de certo modo abandonadas a si mesmas, realizam, no plano individual, a iluso de um simbolismo autnomo. (LVI-STRAUSS apud SIMANKE, 2002, p.449). 6. REFERNCIASALMEIDA, Joo Jos. O desejo do desejo de Kojve. In Revista Impulso. Piracicaba, 2006.DOR, Joel. Introduo leitura de Lacan: o inconsciente estruturado como linguagem. Trad. de Carlos Eduardo Reis. 3. ed. Porto Alegre: Artes Mdicas 1992.

DOSSE, Franois. Histria do Estruturalismo, v.1: O campo do signo, 1945/1966. Trad. de lvaro Cabral. So Paulo: Editora Ensaio,1993.DUNCKER, Christian. Ontologia negativa em psicanlise: entre tica e psicanlise. In Discurso n. 36, Revista do departamento de Filsofia da USP, 2007. FOUCAULT, Michel. (1981) "Lacan, o liberatore da Psicanlise" (p.329-330) In Ditos e escritos I Problematizao do sujeito: psicologia, psiquiatria e psicanlise. Trad.de Vera Lucia Avellar Ribeiro. Rio de Janeiro: Forense Universitria, 1999.KOJVE, Alexandre. Introduo leitura de Hegel. Trad. de Estela dos Santos Abreu. Rio de Janeiro: Discurso Editorial, Editora da UERJ, 2002. LACAN,Jacques. Funo e campo da fala e da linguagem em psicanlise. In Escritos.Trad. de Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998. LVI-STRAUSS, Claude. Introduo obra de Marcel Mauss. In MAUSS, Marcel. Sociologia e Antropologia. Editora Cosaf Naify, 2005.

LVI-STRAUSS, Claude. As estruturas elementares do parentesco. Traduo de Mariano Ferreira. 3. ed. Petrpolis: Vozes, 2003.SAFATLE, Vladimir. Glossrio de Lacans. In MAIS, Folha de So Paulo, 8 de abril de 2001.SAFATLE, Vladimir. Lacan. So Paulo: Pubifolha, 2007.

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SALES, Lea Silveira. Linguagem no Discurso de Roma: Programa de Leitura na Psicanlise. Revista Psicologia: Teoria e Pesquisa, vol. 20, n.1, p. 49-58, 2004. Disponvel em www.scielo.br/pdf/ptp/v20n1/a07v20n1.pdf

SIMANKE. Richard. Metapsicologia Lacaniana. So Paulo: Discurso Editorial; Curitiba: Editora UFPR, 2002. ZAFIROUPOLOS,. Mark. Nossa arqueologia crtica da obra de Lacan: Lacan e as cincias sociais. Lacan e Lvi-Strauss. Revista Estudos Lacanianos, Ano II, num.3. 2009. Disponvel em http://www.fafich.ufmg.br/estudoslacanianos/art_03.html

ZIZEK. Slavoj. How to read Lacan. New York: Norton Company, 2007. 7. Cronograma

NDescrioAgo

2009SetOutNovDezJan

2010FevMarAbrMaiJunJul

01Levantamento bibliogrfico X

02Leitura e anlise do material bibliogrfico selecionado

X X X X X

03Redao dos primeiros captulosXX X

04Apresentao oral parcial

X

05 Redao do Relatrio parcial X X

06Continuao da redao dos captulosXXX X X

07- Elaborao do Resumo e Relatrio Final (atividade obrigatria)

- Preparao da Apresentao Final para o Congresso (atividade obrigatria) X

Cabe aqui ressaltar pela relevncia, que o prprio Lvi-Strauss em sua obra Tristes Trpicos se reconheceu como devedor do antroplogo Frank Boas, como destaca Franois Dosse: a mais importante contribuio de Boas e sua influncia sobre Lvi-Strauss tero sido a nfase que deu a natureza inconsciente dos fenmenos culturais e a colocao das leis da linguagem no centro da inteligibilidade dessa estrutura inconsciente (DOSSE, 1993, p.37) ou como lembra Mark Zafiroupolos:[...] Lvi- Strauss acrescenta que, contrariamente ao que ele escreveu algumas vezes, no Saussure, mas Boas 'que enunciou esse princpio capital em 1911: As leis da linguagem funcionam no nvel inconsciente, precisamente em seu clebre prefcio ao Handbook of American Indian Languages (ZAFIROPOULOS, 2009, p.12).

Lacan tambm atribui ao significante o lugar da estrutura, porm em sua teoria o sentido proveniente da cadeia significante.

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