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REVISTA BRASILEIRA DESADEOCUPACIONALRBSOVol.35 n 121jan/jun 2010ISSN 0303 - 7657RBSODossi:Incapacidade, Reabilitao Prossional e Sade do TrabalhadorDisability, Occupational Rehabilitation, and Workers HealthPresidente da RepblicaLuiz Incio Lula da SilvaMinistro do Trabalho e EmpregoCarlos LupiFUNDACENTROPresidenteEduardo de Azeredo CostaDiretor Executivo SubstitutoHilbert Pfaltzgraff FerreiraDiretor TcnicoJfilo Moreira Lima JniorDiretor de Administrao e FinanasHilbert Pfaltzgraff FerreiraM I N I S T R I ODO TRABALHO E EMPREGOFUNDACENTROFUNDAO JORGE DUPRAT FIGUEIREDODE SEGURANA E MEDICINA DO TRABALHOwww.fundacentro.gov.brEditores CientficosEduardo Algranti Fundacentro, So Paulo-SP-BrasilJos Maral Jackson Filho Fundacentro, Rio de Janeiro-RJ-BrasilEditor ExecutivoEduardo Garcia Garcia Fundacentro, So Paulo-SP-BrasilEditores AssociadosAndra Maria Silveira UFMG, Belo Horizonte-MG-BrasilAparecida Mari Iguti Unicamp, Campinas-SP-BrasilCarlos Machado de Freitas Fiocruz, Rio de Janeiro-RJ-BrasilClaudia Carla Gronchi Fundacentro, So Paulo-SP-BrasilIrlon de ngelo da Cunha Fundacentro, So Paulo-SP-BrasilJos Prado Alves Filho Fundacentro, So Paulo-SP-BrasilMarco Antonio Bussacos Fundacentro, So Paulo-SP-BrasilMina Kato - So Paulo Fundacentro, So Paulo-SP-BrasilRodolfo Andrade de Gouveia Vilela USP, So Paulo-SP-BrasilRogrio Galvo da Silva Fundacentro, So Paulo-SP-BrasilRose Aylce Oliveira Leite Museu Paraense Emlio Geldi, Belm-PA-BrasilEditoras do Dossi TemticoMara Takahashi editora convidada, Cerest, Piracicaba -SP-BrasilMina Kato editora associadaRose Aylce Oliveira Leite editora associadaConselho EditorialAda vila Assuno UFMG, Belo Horizonte-MGCarlos Minayo Gomez Fiocruz, Rio de Janeiro-RJDalila Andrade de Oliveira UFMG, Belo Horizonte-MGFrancisco de Paula Antunes Lima UFMG, Belo Horizonte-MGIldeberto Muniz de Almeida Unesp, Botucatu-SPLeny Sato USP, So Paulo-SPMrio Csar Ferreira UnB, Braslia-DFRaquel Maria Rigotto UFC, Fortaleza-CERegina Heloisa Mattei de Oliveira Maciel UECE/Unifor, Fortaleza-CERenato Rocha Lieber Unesp, Guaratinguet-SPSelma Borghi Venco Unicamp, Campinas-SPVilma Sousa Santana UFBA, Salvador-BAVictor Wnsch Filho USP, So Paulo-SPSecretaria ExecutivaElena Riederer coordenao e reviso de inglsMina Kato reviso de inglsKarla Machado apoio administrativoThas dos Santos Luiz (estagiria)Produo GrficaGlaucia Fernandes coordenao e criao capaGisele Almeida(estagiria) diagramao capa e mioloKarina Penariol Sanches reviso de textosMarcos Rogeri impresso grficaWalquiria Schafer (estagiria) reviso de textosNormalizaoSrgio CosmanoAlda Melnia CsarMaria Aparecida GiovanelliDistribuioServio de Documentao e BibliotecaDigitalizaoElisabeth RossiIndexao CABABSTRACTS CIS/ILO - International Occupational Safety and HealthInformation Centre/International Labor Organization DOAJ - Directory of Open Access Journals GLOBAL HEALTH LATINDEX - Sistema Regional de Informacin en Lnea para Revis-tas Cientficas de Amrica Latina, el Caribe, Espaa y Portugal LILACS - Literatura Latino-Americana e do Caribe em Cincias da Sade REDALYC - Red de Revistas Cientficas de Amrica Latina y el Caribe, Espaa y Portugal REPIDISCA/BVSDE - Red Panamericana de Informacin en SaludAmbiental/Biblioteca Virtual en Desarrollo Sostenible y SaludAmbientalCopyrightOs direitos autorais dos artigos publicados na Revista Brasileira de Sade Ocupacional pertencem Fundacentro e abrangem as publicaes impressa, em formato eletrnico ou outra mdia. A reproduo total ou parcial dos artigos publicados permitida mediante meno obrigatria da fonte e desde que no se des-tine a fins comerciais.Poltica EditorialA RBSO o peridico cientfico da Fundacentro, publicado desde 1973. Com frequncia semestral, destina-se difuso de artigos originais de pesquisas sobre Segurana e Sade do Trabalhador (SST) cujo contedo venha a contribuir para o entendi-mento e a melhoria das condies de trabalho, para a preveno de acidentes e doenas do trabalho e para subsidiar a discusso e a definio de polticas pblicas relacionadas ao tema.A RBSO publica artigos de relevncia cientfica no campo da SST. As contribuies de pesquisas originais inditas so considera-das prioritrias para publicao. Com carter multidisciplinar, a revista cobre os vrios aspectos da SST nos diversos setores econmi-cos do mundo do trabalho, formal e informal: relao sade-trabalho; aspectos conceituais e anlises de acidentes do trabalho; anlise de riscos, gesto de riscos e sistemas de gesto em SST; epidemiologia, etiologia, nexo causal das doenas do trabalho; exposio a substncias qumicas e toxicologia; relao entre sade dos trabalhadores e meio ambiente; comportamento no trabalho e suas di-menses fisiolgicas, psicolgicas e sociais; sade mental e trabalho; problemas musculoesquelticos, distrbios do comportamento e suas associaes aos aspectos organizacionais e reestruturao produtiva; estudo das profisses e das prticas profissionais em SST; organizao dos servios de sade e segurana no trabalho nas empresas e no sistema pblico; regulamentao, legislao, inspeo do trabalho; aspectos sociais, organizacionais e polticos da sade e segurana no trabalho, entre outros.A revista visa, tambm, incrementar o debate tcnico-cientfico entre pesquisadores, educadores, legisladores e profissionais do campo da SST. Nesse sentido, busca-se agregar contedos atuais e diversificados na composio de cada nmero publicado, trazendo tambm, sempre que oportuno, contribuies sistematizadas em temas especficos.O ttulo abreviado da revista Rev. bras. Sade ocup. www.fundacentro.gov.br/rbsoSumrioRespondendo a um chamamento!Jorge Mesquita Huet Machado, Francisco Antonio de Castro LacazIncapacidade, reabilitao profissional e Sade do TrabalhadorIncapacidade, reabilitao profissional e Sade do Trabalhador: velhas questes, novas abordagensMara Takahashi, Mina Kato, Rose Aylce Oliveira LeiteFacilitadores e barreiras para o retorno ao trabalho: a experincia de trabalhadores atendidos em um Centro de Referncia em Sade do Trabalhador SP, BrasilRos Colom Toldr, Maria Teresa Bruni Daldon, Maria da Conceio dos Santos, Selma LancmanReabilitao de pacientes com LER/DORT: contribuies da fisiotera-pia em grupoLuciane Frizo Mendes, Selma LancmanA sade dos msicos: dor na prtica profissional de msicos de or-questra no ABCD paulistaCamila Frabetti Campos de Oliveira, Flora Maria Gomide VezzO trabalhador com deficincia e as prticas de incluso no mercado de trabalho de Salvador, BahiaFernando Donato VasconcelosReinsero no mercado de trabalho de ex-trabalhadores com LER/DORT de uma empresa eletrnica na regio metropolitana de So PauloMaria Maeno, Victor Wnsch FilhoProposta de articulao entre abordagens metodolgicas para melho-ria do processo de reabilitao profissionalAngela Paula Simonelli, Joo Alberto Camarotto, Ecla Spiridio Bravo, Rodolfo Andrade de Gouveia VilelaA ginstica teraputica e preventiva chinesa Lian Gong/Qi Gong como um dos instrumentos na preveno e reabilitao da LER/DORTGutembergue Livramento, Tnia Franco, Alade Livramento Reabilitao profissional no Brasil: elementos para a construo de uma poltica pblicaMaria Maeno, Rodolfo Andrade de Gouveia VilelaPrograma de reabilitao profissional para trabalhadores com incapacidades por LER/DORT: relato de experincia do CerestPiracicaba, SPMara Alice Batista Conti Takahashi, Angela Paula Simonelli, Helder do Prado Sousa, Renata Wey Berti Mendes, Maria Valria de Andrade AlvarengaPrograma de reabilitao de trabalhadores com LER/DORT do Cesat/Bahia: ativador de mudanas na Sade do TrabalhadorMnica Angelim Gomes de Lima, Andra Garboggini Melo Andrade, Camila Moitinho de Arago Bulco, Esperana Maria de Carvalho Lino Mota, Francesca de Brito Magalhes, Rita de Cssia Peralta Carvalho, Sonara Machado de Carvalho Freitas, Sylvia Regina Freire de Carvalho S, Lauro Antonio Porto, Robson da Fonseca NevesArtigos10RBSOVol.35 n 121jan/jun 2010Editorial6Dossi temticoApresentao7Ensaios64Relatos de100experincia233341537487112SumrioRBSOVol.35 n 121jan/jun 2010Uma introduo CIF Classificao Internacional de Funcionali-dade, Incapacidade e SadeHeloisa B. V. Di Nubila Prevalncia de sobrepeso e obesidade em trabalhadores de cozinhas dos hospitais pblicos estaduais da Grande Florianpolis, Santa CatarinaKarine de Lima Srio Boclin, Nelson BlankExposio ocupacional a material biolgico por pessoal de sade: construo e proposio de instrumentos avaliativosPaula Muniz do Amaral, Jos Tavares-NetoAbsentismo-doena na prefeitura municipal de Porto Alegre, Rio Grande do Sul, BrasilJandira Pereira dos Santos, Airton Pozo de MattosAnlise dos fatores de riscos ocupacionais do trabalho de enfermagem sob a tica dos enfermeirosNei Santos Duarte, Maria Yvone C. MauroPrevalncia de queixas vocais e estudo de fatores associados em uma amostra de professores de ensino fundamental em Macei, Alagoas, BrasilLuciano Padilha Alves, Laura Tathianne Ramos Arajo, Jos Augusto Xavier NetoSer ou no ser um artfice uma questo para a Sade do Trabalhador?Magali Costa Guimares124Artigos131148157122Nota tcnica168Comunicao breve176ResenhaTema livreContentsRBSOVol.35 n 121jan/jun 2010Answering a request!Jorge Mesquita Huet Machado, Francisco Antonio de Castro LacazDisability, occupational rehabilitation, and Workers HealthDisability, occupational rehabilitation, and Workers Health old questions, new approachesMara Takahashi, Mina Kato, Rose Aylce Oliveira LeiteFacilitating factors and barriers for returning to work the experi-ence of workers treated at a Workers Health Reference Center in So Paulo, BrazilRos Colom Toldr, Maria Teresa Bruni Daldon, Maria da Conceio dos Santos, Selma LancmanRehabilitation of patients with RSI/WRMD the contribution of group physical therapyLuciane Frizo Mendes, Selma LancmanMusicians health: pain resulting from playing musical instruments among members of orchestras of the ABCD region, So Paulo, BrazilCamila Frabetti Campos de Oliveira, Flora Maria Gomide VezzWorkers with disability and process for their inclusion in the labor market of Salvador, Bahia, BrazilFernando Donato VasconcelosReintroduction into the job market of former workers with RSI of an eletronics industry in So Paulo metropolitan area, BrazilMaria Maeno, Victor Wnsch FilhoProposing an articulation between methodologies to improve occu-pational rehabilitation processAngela Paula Simonelli, Joo Alberto Camarotto, Ecla Spiridio Bravo, Rodolfo Andrade de Gouveia VilelaLian Gong/Qi Gong Chinese therapeutic and preventive exercise as an instrument for Cumulative Trauma Disorders prevention and rehabilitationGutembergue Livramento, Tnia Franco, Alade LivramentoOccupational rehabilitation in Brazil elements for the development of public policyMaria Maeno, Rodolfo Andrade de Gouveia VilelaRehabilitation program for workers with RSI/WRMD at Cerest-Piracicaba, So Paulo, BrazilMara Alice Batista Conti Takahashi, Angela Paula Simonelli, Helder do Prado Sousa, Renata Wey Berti Mendes, Maria Valria de Andrade AlvarengaCesat/Bahia rehabilitation program for workers with RSI/WRMD a starter for changes in Workers HealthMnica Angelim Gomes de Lima, Andra Garboggini Melo Andrade, Camila Moitinho de Arago Bulco, Esperana Maria de Carvalho Lino Mota, Francesca de Brito Magalhes, Rita de Cssia Peralta Carvalho, Sonara Machado de Carvalho Freitas, Sylvia Regina Freire de Carvalho S, Lauro Antonio Porto, Robson da Fonseca NevesArticles10Editorial6 Dossier Presentation7Essays64Report on 100experience233341537487112Vol.35 n 121jan/jun 2010An introduction to the International Classification of Functioning, Disability and HealthHeloisa B. V. Di Nubila Overweight and obesity prevalence in kitchen workers of public hospitals in Florianpolis, Santa Catarina, BrazilKarine de Lima Srio Boclin, Nelson BlankHealthcare personnels occupational exposure to biological material elaboration and proposition of assessment instrumentsPaula Muniz do Amaral, Jos Tavares-NetoIlness absenteeism in the municipal administration of Porto Alegre, BrazilJandira Pereira dos Santos, Airton Pozo de MattosAnalysis of nursing occupational risk factors from nurses perspectiveNei Santos Duarte, Maria Yvone C. MauroPrevalence of vocal complaints and study of associated factors in a sample of elementary school teachers in Macei, BrazilLuciano Padilha Alves, Laura Tathianne Ramos Arajo, Jos Augusto Xavier NetoTo be or not to be a craftsman a question for Workers Health?Magali Costa Guimares 124Articles131148157122Technical note168Short communicatin176Book reviewContentsAssorted topicsRev. bras. Sade ocup., So Paulo, 35 (121): 06, 2010 6EditorialRespondendo a um chamamento!Answering a request!Jorge Mesquita Huet Machado1, 2Francisco Antonio de Castro Lacaz1, 31 Associao Brasileira de Ps-Graduao em Sade Coletiva ABRASCO / GT Sade do Traba-lhador.2 Tecnologista em Sade Pblica da Fundao Oswaldo Cruz; assessor tcnico do Departamento de Vigi-lncia em Sade Ambiental e Sa-de do Trabalhador da Secretaria de Vigilncia em Sade do Ministrio da Sade.3 Professor Associado II do Depar-tamento de Medicina Preventiva da Universidade Federal de So Paulo / Escola Paulista de Medicina.Pioneira na publicao de artigos sobre estudos e pesquisas referentes s re-laes Trabalho-Sade, a Revista Brasileira de Sade Ocupacional (RBSO), pe-ridico cientfico editado pela Fundao Jorge Duprat Figueiredo de Segurana e Medicina do Trabalho (Fundacentro), desde 1973, vem abordando temticas importantes para a difuso das prticas relativas sade dos trabalhadores.Assim, no editorial intitulado A RBSO e seu compromisso com o campo daSadedoTrabalhador(ALGRANTI,E.etal.RevistaBrasileiradeSade Ocupacional,SoPaulo,v.34,n.120,p.104-105,jul/dez.2009.Editorial.), arevistaassumeoposicionamentodeestabelecerumdilogocomocampo Sade do Trabalhador, dando sinais de uma clara abertura para novas aborda-gens. At mesmo a proposta de mudana do nome da revista e a opo por sua manuteno, embora, de fato, no fosse a questo central da discusso travada pelo seu Conselho Editorial, ressalta a abertura de escopo acima referida.Neste sentido, atenta ao aumento da produo cientfica no campo Sa-de do Trabalhador, mas tambm sua fragmentao e disperso, a polti-caeditorialagoraadotadapelaRBSO[...]visa,[...],enfrentaresteaspecto apontado,colocando-secomoumlcusdaproduoacadmicanarea (ALGRANTI, E. et al., Ibid., p. 104). Mesmo mantendo seu nome, o que importa realmente o compromisso da revista com o campo Sade do Trabalhador e em [...] consolidar seus objeti-vos e cumprir a misso de publicar artigos cientficos relevantes para o desen-volvimento do conhecimento e para incrementar o debate terico cientfico no campo da SST (ALGRANTI, E. et al., Ibid., p. 105). Este delineamento abre a perspectiva de um debate sobre a configurao das aproximaes e diferencia-es entre estes campos, tema que se coloca em especial relevncia no Brasil pela coexistncia de polticas que trazem essas denominaes.Diantedestechamamento,aAssociaoBrasileiradePs-Graduaoem Sade Coletiva (Abrasco), atravs de seu Grupo de Trabalho em Sade do Tra-balhador,posiciona-senosentidodeconsider-loumimportanteavano,o que permite um dilogo cada vez mais profcuo, seja com os grupos acadmi-cos em Sade Coletiva que se dedicam produo do conhecimento em Sade do Trabalhador, seja com os profissionais de sade, que, por todo o territrio nacional,desenvolvemsuasatividadesnosserviosvoltadosatenoem Sade do Trabalhador e que tambm expressam seus achados e reflexes nos CongressosedemaiseventospromovidospelaAbrasco,comsuasvivncias para a produo de conhecimento no campo.Dessa forma, a RBSO passa a ser um espao privilegiado de publicao para adifusodoconhecimentonacionalproduzidopelosgruposeprofissionais que vm pensando a Sade do Trabalhador no mbito da Sade Coletiva. Assim, a Abrasco, atravs do GT de Sade do Trabalhador, vem a pblico somar-se ao chamamento anunciado pelo Conselho Editorial da RBSO, visan-do estabelecer uma parceria promissora para ambos os lados, na perspectiva de contribuir para que o conhecimento produzido seja socializado, eque tal fato colabore para a elaborao de polticas sociais de abrangncia nacional embasadas nas formulaes do campo Sade do Trabalhador.Rev. bras. Sade ocup., So Paulo, 35 (121): 07-09, 2010 7Dossi TemticoApresentaoIncapacidade,reabilitaoprofissionaleSadedo Trabalhador: velhas questes, novas abordagensDisability, occupational rehabilitation, and Workers Health old questions, new approachesMara Takahashi1Mina Kato2Rose Aylce Oliveira Leite31 Editora convidada. Centro de Referncia em Sade do Trabalha-dor/Cerest, Piracicaba, SP.2 Editora associada. Fundacentro, So Paulo, SP.3 Editora associada. Ministrio da Cincia e Tecnologia. Museu Paraense Emlio Geldi/MPEG, Belm, PA.Aprticadareabilitaoprofissionalarespostapblicaquestoda incapacidadeparaotrabalho,masaquitrataremosespecificamentedain-capacidade decorrente de sequelas de acidentes de trabalho e de agravos de etiologia ocupacional.Nomundoocidentalcapitalista,aobrigatoriedadelegaldaprestaodos programasdereabilitaoprofissionalesttradicionalmentevinculadaaos sistemas de Previdncia Social, uma vez que seus resultados positivos redu-zem o tempo e, consequentemente, os custos de concesso dos benefcios pre-videncirios,bemcomoevitamaincapacidadepermanenteparaotrabalho (MOOM; GEICKER, 1998). No Brasil, com a estatizao do Seguro do Acidente de Trabalho (SAT) em 1967, os servios de reabilitao profissional foram im-plantados no ento Instituto Nacional de Previdncia Social (INPS) e, desmon-tados na dcada de 1990 pelo atual Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), transformaram-se em procedimentos administrativos de retorno s empresas aps alta pericial (TAKAHASHI; IGUTI, 2008).Aconstruotericadomodelodeatenoemreabilitaoprofissional bastanteescassanaliteraturabrasileira.Aprticamostraterpotencialmente umpapelsocialmentemaisrelevantee,atravsdeseusservioseprogramas teraputicos e de profissionalizao, realiza uma interveno estruturada com o objetivo de reduzir e superar as limitaes funcionais, emocionais e sociais, intervindo no estabelecimento da incapacidade para o trabalho e possibilitando aos trabalhadores reabilitados os meios necessrios para o retorno a um trabalho compatvel e saudvel. A eficcia e a efetividade destes programas so qualifica-es de resultados articulados diretamente a uma construo social mais ampla, permeada por interesses de classes e projetos polticos em disputa: o conceito de incapacidade. Da legitimidade deste processo depende a efetivao de polticas pblicas de seguridade social mais abrangentes e inclusivas.Se, por um lado, as mudanas nas elaboraes tericas desta concepo, ao longo dos ltimos dois sculos, refletem as transformaes histricas, po-lticasesociaisdassociedadescapitalistasocidentais,poroutro,retratam oacmulodoconhecimentocientficodefinidoreincorporadordasideias s prticas. Deste construto paradigmtico hegemnico emanam as decises consolidadasnaimplantaodepolticaspblicasenaorganizaoestatal demodelosdeatenoemserviosdeatendimentopopulaocomin-capacidades. A evoluo deste processo reflete um longo caminho de lutas polticaseconquistassociais.Partindodaconcepodetragdiapessoal, segundoaqualaincapacidadeumproblemaindividualeasvtimas, por intolerncia social e omisso do Estado, so confinadas ao ocultamento, contando apenas com o cuidado familiar e a benemerncia da parquia e da Rev. bras. Sade ocup., So Paulo, 35 (121): 07-09, 2010 8burguesia abastada, chegou-se at a concepo socioambiental que apresenta evidncias de que a incapacidade um fenmeno de relao que no se realiza num vcuo social, que as determinaes estruturais e os fatores sociais so preponderantes no seu estabelecimento e superao. Amagnitudedosdadosestatsticosdaspessoascomincapacidadesreforamaimportnciadasprticasde reabilitao profissional. No Brasil, o ltimo censo demogrfico contabilizou 24.600.256 pessoas que relataram ter algum tipo de deficincia ou de incapacidade, representando 14% da populao geral (BRASIL, 2000). Nos dados por faixa etria, o intervalo de 20 a 49 anos de idade, perodo mais produtivo da vida das pessoas e, portanto, de maior absoro pelo mercado de trabalho formal e informal, tambm onde se situaram 35% dos informantes com incapacidades, revelando o determinismo das condies de vida e de trabalho dos trabalhadores no Brasil como causa de incapacidades e no apenas como resultante do processo de envelhecimento natural da populao.Estepanoramacensitriocorroboradopelasestatsticasalarmantesdosacidentesedoenasdotrabalho no pas, como os dados apresentados pela Dataprev para o ano de 2007, que registram a ocorrncia de 653.090 casos, distribuidos por 50 CID(s) mais incidentes e que resultam em sequelas com limitaes funcionais (BRA-SIL, 2007). Destes, merecem destaque as sequelas de acidentes de trabalho (CID Grupos S e T), primeira causa de afastamento do trabalho, e as LER/DORT, que ocupam o segundo lugar (CID Grupos G e M). Marcam presena significativa nos bancos de dados da Previdncia Social os transtornos psquicos relacionados ao trabalho (algu-mas patologias do Grupo F), porm, estes casos so minimamente contemplados pelos programas de reabilitao profissional, sendo sua ateno desenvolvida no mbito dos Centros de Ateno Pisicossocial (CAPS) da Rede do Sistema nico de Sade. Cabe ressaltar que os dados previdencirios referem-se apenas ao mercado formal e so divulgados atravs do Anurio, restritos ao perodo de doze meses.EstedossitemticoIncapacidade,reabilitaoeSadedoTrabalhadorressaltaodesenvolvimentodas polticas e prticas de reabilitao no pas e pretende contribuir para minimizar a carncia de literatura sobre o tema, apresentando experincias de servios, proposio de novas prticas e estudos observacionais. OartigodeMaenoeVilelatrazumhistricodareabilitaoprofissionalnoBrasil,coordenadapelaPrevi-dnciaSocial,eressaltaaineficinciadoservioemdiferentesmomentos,fundamentandoanecessidadede construo social de um modelo capaz de superar a situao de excluso de uma parcela significativa de trabalha-dores que sofrem restries fsicas, psicolgicas e sociais decorrentes de acidentes traumticos e de adoecimento crnico, como os acometidos por leses por esforos repetitivos (LER/DORT).Embuscadecaminhosalternativospara tratarereintegrarestestrabalhadoresnomercadodetrabalho, surgiram experincias no mbito da Renast/SUS, como as relatadas por Takahashi e cols. e Lima e cols., im-plementadas por intermdio de programas de reabilitao profissional de trabalhadores com LER/DORT, res-pectivamente no CRST de Piracicaba, So Paulo, e no Centro de Estudos da Sade do Trabalhador (CESAT) da Secretaria de Sade do Estado da Bahia.Surgem ainda propostas metodolgicas como a apresentada por Simonelli e cols., com o objetivo de identificar as potencialidades do trabalhador reabilitado utilizando, de forma integrada, a CIF (Classificao Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Sade) e a avaliao do ambiente de trabalho por meio da Anlise Ergonmica do Trabalho (AET), objetivando a uma maior aproximao entre as exigncias do trabalho e as potencialidade do trabalhador, numa viso social do problema da reinsero. Na mesma linha, uma aplicao prtica do uso da CIF como critrio para avaliar as condies de sade dos trabalhadores e identificar fatores facilitadores e barrreiras para o retorno ao trabalho apresentada por Toldr e cols.. As autoras apontam a importncia do acolhimento e do suporte dos profissionais de sade como facilitadores e, como principais obstculos, a ausncia de programas adequados de reabilitao profissional e a desarticulao dos diversos atores sociais envolvidos. Uma nota tcni-ca de Nubila ao final do dossi esclarece sobre a CIF e as potencialidades de seu uso. O artigo de Mendes e Lancman apresenta uma abordagem integrativa para o tratamento dos acometidos de LER/DORT, na qual se associou um grupo de apoio cinesioterapia, promovendo um espao onde os pacientes puderam expressar e compartilhar seus problemas e sentimentos. Os resultados da experincia, mesmo com as limitaes de nmero de sesses e do tamanho reduzido dos grupos, reforam o pressuposto de que as vivncias grupais permitem ao trabalhador transformar percepes individuais em percepes coletivas. Ao conhecerem outras experincias semelhantes, os participantes, alm de se identificarem com os outros trabalhadores, reco-nhecem o seu adoecimento como um processo decorrente do prprio trabalho e compreendem que sua situao no nica, passando a se reorganizarem individulamente a partir do pertencimento grupal.Livramentoecols.contribuemcomumareflexointerdisciplinar,propondoumaintegraodaMedicina Tradicional Chinesa (MTC) com a Ateno em Sade do Trabalhador, mais especificamente para potencializar as possibilidades de preveno, tratamento e reabilitao da LER/DORT a partir da terapia do Qi Gong. Mostra que a MTC, numa viso holsitica do indivduo, permite uma abordagem mais global do processo de adoecimento que favorece a recuperao e a reabilitao do trabalhador.Rev. bras. Sade ocup., So Paulo, 35 (121): 07-09, 2010 9Muitos dos artigos deste dossi tratam da LER/DORT, uma sndrome que estritamente relacionada ao tra-balho e prevalente em trabalhadores de diversos ramos de atividades, como lembra o artigo de Livramento e cols.. A dor e as limitaes funcionais podem estar presentes no exerccio de atividades, mesmo naquelas consideradas leves ou no relacionadas com linhas de produo. o caso dos msicos, como ilustrado pelo artigo apresentado por Oliveira e Vezz. Os resultados [de seu estudo] indicam que, para os msicos, a dor faz parte do negcio. A sade desses profissionais, assim como de outros trabalhadores, que continuam em suas atividades apesar da dor e das limitaes funcionais, no uma questo que pode ser resolvida apenas comconscientizaocorporaleconhecimentodaetiologiaocupacional.Acompreensodainterligaode vrios fatores de ordem biolgica, psicolgica, social e do ambiente fsico que vai trazer a possibilidade de prevenir os agravos e intervir para a promoo de sade do trabalhador como indivduo. Para que os trabalhadores mantenham-se no controle de suas condies de sade, alm da busca de uma in-terveno de preveno primria, imprescindvel discutir as relaes sociais de emprego e as polticas pblicas de incluso de pessoas com incapacidades. As medidas de proteo social relativas incluso dos trabalhadores reabilitadosedaspessoascomdeficinciaestoestabelecidaspelaleiquetratadosbenefciosdaPrevidncia Social. A lei n 8.213, de dezembro de 1991, refere-se s cotas de emprego a ambos os segmentos. O artigo de Vasconcelos mostra a complexidade da prtica de incluso social atravs de falas de trabalhadores deficientes de Salvador, Bahia, identificando os mitos e os estigmas sociais associados a sua implementao. O artigo de Maeno e Wnsch versa sobre a realidade oposta, a de excluso social e econmica, retratada na experincia de algumas trabalhadorasdoramoeletroeletrnicodeSoPauloacometidasporLER/DORTaolongodevriosanos.Os autores analisam as dificuldades de reinsero profissional desses trabalhadores aps demisso pela empresa e constatam a ineficcia da poltica estatal de reabilitao profissional. As entrevistas foram realizadas j h algum tempo, mas a questo permanece e os dados refletem-se na atualidade.Os artigos aqui apresentados reafirmam que a sociedade, com suas formas de organizar a produo e o trabalho, permitidas ou no, que vai imprimir, nas relaes sociais, as atitudes de acolhimento ou discrimi-nao e, nas relaes institucionais, as ofertas de modelos de ateno pautados pela proteo social ou pela segmentaodadesvantagemedaexcluso.Aspropostasexitosas,assimcomoaspropostasdemudana, podem servir de referncia para atuao dos profissionais de sade e reabilitao, assim como subsidiar o planejamentodeaeseodesenvolvimentodecompetnciasnagestodepolticaspblicasdaSadedo Trabalhador, da Previdncia Social e do Trabalho.E, finalmente, completando a dinmica de contribuio, tais experincias, quando socializadas e apropriadas pelos usurios e suas instncias de controle social, podem produzir o empowerment (empoderamento) que legiti-ma e garante a efetividade das intervenes e a permanncia dos servios.RefernciasBRASIL. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica. 2000. Disponvel em: . Acesso em: 12 jan. 2006.______. Ministrio da Previdncia Social. Anurio estatstico de 2007. 2007. Disponvel em: . Acesso em: 17 mar. 2009.MOOM, W.; GEICKER, O. Disability: concepts and definitions. In: Disability and work. Encyclopedia of occupational health and safety. Geneva: OIT, 1998. p. 17.14-17.18. CD-ROM.TAKAHASHI, M. A. B. C.; IGUTI, A. M. As mudanas nas prticas de reabilitao profissional da Previdncia Social no Brasil: modernizao ou enfraquecimento da proteo social? Cadernos de Sade Pblica, Rio de Janeiro, v. 24, n. 11, p. 2661-2670, 2008.Rev. bras. Sade ocup., So Paulo, 35 (121): 10-22, 2010 10Facilitadores e barreiras para o retorno ao trabalho: aexperincia de trabalhadores atendidos em um Centro de Referncia em Sade do Trabalhador SP, BrasilFacilitating factors and barriers for returning to work the experience of workers treated at a Workers Health Reference Center in So Paulo, BrazilRos Colom ToldrMaria Teresa Bruni DaldonMaria da Conceio dos SantosSelma Lancman4 Docente do Curso de Terapia Ocupacional do Departamento de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional da Faculdade de Medicina da Universidade de So Paulo e do Laboratrio de Investigao e Interven-o em Sade e Trabalho. Terapeuta Ocupacional do Centro de Referncia em Sade do Trabalhador,Freguesia do , Secretaria Municipal de Sade de So Paulo. Docente do Curso de Terapia Ocu-pacional do Centro Universitrio So Camilo e Terapeuta Ocupacional do Laboratrio de Investigao e Inter-veno em Sade e Trabalho do Curso de Terapia Ocupacional da Faculdade de Medicina da Universidade de So Paulo.4 Professora Titular do Departamento de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional do Curso de Terapia Ocupacional da Faculdade de Medicina da Universidade de So Paulo e Coordenadora do Laboratrio de Investigao e Interveno em Sade e Trabalho.Contato:Professora Doutora Ros Colom ToldrRua Cipotnea, n 51 Cidade Univer-sitria. Cep: 05360-160 So Paulo SPE-mail:[email protected]: 30/06/2009Revisado: 01/03/2010Aprovado: 15/03/2010ResumoOstrabalhadoresacometidospordoenasocupacionaistmvivenciadomuitas dificuldades para retornar ao trabalho devido s limitaes funcionais e aos obst-culos vivenciados junto s empresas, previdncia social e aos servios de sade. Restrio laboral e retorno ao trabalho so aspectos dos mais complexos nas po-lticas de ateno sade do trabalhador. Visando identificar os facilitadores e as barreiras para o retorno ao trabalho de trabalhadores com longo perodo de perma-nncia e sem resolutividade no servio, em 2008, realizou-se um estudo explora-trio, de natureza emprica, com abordagem qualitativa, desenvolvido a partir de estudo documental de 10 pronturios de trabalhadores acompanhados em grupo pela terapia ocupacional de um Centro de Referncia em Sade do Trabalhador da cidade de So Paulo. A organizao e a anlise dos dados foram realizadas segun-do os componentes da CIF. O uso da CIF favoreceu ampliar a viso das condies desadedostrabalhadoresecompreenderainflunciadeservios,sistemase polticasnasdiferentesreas.Asprincipaisbarreirasaoretornoaotrabalhofo-ram: ausncia de adequados programas de reabilitao profissional e insuficiente comunicao entre os atores dos diferentes nveis administrativos e polticos. Os principaisfacilitadoresforamasatitudeseoscomportamentosindividuaisdos profissionais de sade do CRST, que forneceram acolhimento e suporte.Palavras-chave: sade do trabalhador; retorno ao trabalho; reabilitao profis-sional; barreiras e facilitadores; terapia ocupacional.AbstractAfterbeingaffectedbyoccupationaldiseases,workersfacedifficultiestoreturn to work due to their functional limitations and obstacles presented by employers, social welfare and health services. Labor restrictions and return to work are complex aspects within workers health policies. The purpose of this qualitative exploratory study conducted in the second half of 2008 was to identify the facilitating factors and the barriers for returning to work of workers with long unsuccessful treatment. It was based on the documental analysis of 10 clinical records of participants in a occupational therapy group at a Workers Health Reference Center (CRST) in the city of So Paulo. Data were organized and analyzed according to ICF (International Classification of Functioning, Disability, and Health) components. Working within ICFframeworkwidenedourviewsonworkershealthconditionsandhelpedus understand the influence of services, systems, and policies in different areas. Main barriers for returning to work were the lack of adequate occupational rehabilitation programs and the miscommunication among actors at different administrative and political levels. The main facilitator was the individual attitude and the behavior of the CRST staff, providing holding and support to workers. Keywords: workers health; return to work; occupational rehabilitation; barriers and facilitating factors; occupational therapy.ArtigoRev. bras. Sade ocup., So Paulo, 35 (121): 10-22, 2010 11Introduo Muitas so as dificuldades dos trabalhadores acome-tidos por doenas ocupacionais para retornar ao traba-lho, tanto devido s limitaes funcionais decorrentes dosadoecimentos,quantoaosobstculosvivenciados junto s empresas, ao INSS e aos servios de sade. O mundo do trabalho tem sofrido intensas mudanas nos ltimosanoscomaintroduodenovastecnologias, com as mudanas na organizao da produo, com o processodeglobalizaoeanovaordemestabelecida nasrelaesentrecapitaletrabalho,abrindoespao para novas e conflituosas relaes de trabalho, que por sua vez originaram novos processos de adoecimento e novas dificuldades para reabilitao, retorno e, sobretu-do, permanncia no trabalho.Comoconsequncia,assituaesdedesemprego, desubempregoedetrabalhoinformaltornam-seper-manenteseestruturaisnassociedadesatuais,favore-cendorelaesdetrabalhoprecriasqueterminam poratingircadavezmaisascondiesdetrabalhoe sadedaquelesquepermanecemempregados.Esta nova ordem social induz os trabalhadores assalariados acederemprecarizaodascondiesdetrabalhoe sperdasdedireitostrabalhistasquedeladecorrem, deixandoaostrabalhadoresaescolhaentreummau trabalho ou trabalho nenhum (LANCMAN; GHIRARDI, 2002). Esta lgica de restries provoca um impacto na subjetividade dos trabalhadores, ou seja, estes passam a conviver em um mundo onde se perdeu uma srie de garantiastrabalhistas,direitosadquiridos,conquistas que protegiam no s socialmente, mas psiquicamente as pessoas (LANCMAN; UCHIDA, 2003).Essas transformaes provocam um conflito na vida dos indivduos que so obrigados a conviver com lgi-cas de mercado extremamente mutantes, criando uma situaodeconstanteinstabilidadeeameaas,que vivenciada como um mal inevitvel dos tempos moder-nos, cuja causalidade atribuda ao destino, economia ou, ainda, s relaes sistmicas (DEJOURS, 1999).Ocontextosocioeconmicoimpemudanasno perfil epidemiolgico das doenas relacionadas ao tra-balho, alm de exigir um debate renovado acerca da g-nese dessas doenas e de sua gravidade, seja em relao aonmerocrescentedetrabalhadoresacometidos,ou em relao ao gradativo processo de excluso que elas tendem a propiciar.Valedestacaraimportnciadesecompreendera organizaodotrabalhoeosseusreflexosnaproble-mticadeadoecimentoseagravossadedostraba-lhadoresparapensaraintervenonosambientesde trabalho,otratamentoclnicoeareabilitaoprofis-sional,areadaptaoeareinseronotrabalho,uma vez que o aumento de adoecimento e de invalidez nos trabalhadores decorrente de um conjunto de fatores, tais como: carga de trabalho, processos de trabalho in-salubres e perigosos, uso de equipamentos e tecnologias obsoletas,ambientesdetrabalhoinspitos,problemas relativos organizao do trabalho e s novas formas de diviso do trabalho.No Brasil, os dados pecunirios do INSS, no ano de 2007,assinalamque23,38%doauxliodoenaprevi-dencirioconcedidosodedoenasdosistemaoste-omuscularedostecidosconjuntivose11,86%sode transtornosmentaisedecomportamento.Comrela-o ao auxlio doena acidentrio, no mesmo perodo, 34,72% so de doenas do sistema osteomuscular e dos tecidos conjuntivos e somente 2,8% so de transtornos mentais e de comportamento. Destaca-se que as infor-maesapresentadaspeloINSSreferem-seaosdados pecunirios e no epidemiolgicos e, portanto, s con-tabilizam os trabalhadores cadastrados junto a esse r-go,oquecorrespondeacercade50%dapopulao economicamenteativa.EmrelaoaosgastosdaPre-vidnciaSocial,em2007(BRASIL,2008),foramR$5 bilhes em pagamento de auxlios por doena, acidente e aposentadoria.A restrio laboral e o retorno ao trabalho esto en-tre os aspectos mais complexos das polticas de ateno sadedotrabalhador.necessriopensarareabili-taoprofissionalparaalmdoquefeitonoprogra-ma de reabilitao profissional da Previdncia Social e da clssica reabilitao clnica oferecida em diferentes serviosdesade,mas,tambm,consider-lacomo umprocessodinmicodeatendimentoglobaldotra-balhadorquedeveenvolverasempresasnoprocesso depreveno,tratamento,reabilitao,readaptaoe reinsero no trabalho. Para melhor compreender a situao vivida por tra-balhadores que possuem longo tempo de afastamento e semresolutividadeemumserviodesade,optou-se por utilizar a Classificao Internacional de Funciona-lidade, Incapacidade e Sade (CIF) como ferramenta. O modelo da CIF foi proposto pela Organizao Mundial deSadeem2001(ORGANIZAOMUNDIALDA SADE, 2003). Este modelo faz uma crtica ao modelo mdico,centradonapessoaenadeficinciaeprope um modelo biopsicossocial. No campo da sade do tra-balhador, a CIF permite identificar que as condies so-ciais, econmicas e polticas observadas nas inmeras transformaesdotrabalhosodeterminantesparaas condies de capacidade e incapacidade laborativa. O objetivo geral da CIF proporcionar uma lingua-gem unificada e padronizada e uma estrutura que descre-va a sade e os estados relacionados sade. Prope um modelo de funcionalidade que abrange as estruturas e as funes do corpo, as atividades e a participao, influen-ciadas pelos fatores ambientais e pessoais. As funes do corpo so consideradas funes fisiolgicas dos sistemas orgnicos, tais como, mentais e sensoriais, enquanto que as estruturas do corpo so consideradas partes anatmi-cas: rgos, membros e seus componentes.A classificao entende a incapacidade como um fe-nmeno que envolve limitaes de atividades ou restri-onaparticipaoemconsequnciadeumconjunto complexo de condies, muitas das quais criadas pelos fatores ambientais. Rev. bras. Sade ocup., So Paulo, 35 (121): 10-22, 2010 12A atividade refere-se execuo de tarefas ou aes, e as limitaes de desempenho so as dificuldades que umindivduopodeencontrarnaexecuodeativida-des.Participaooenvolvimentoemumasituao de vida e as restries so as barreiras que uma pessoa pode experimentar nesse envolvimento. Os fatores ambientais compem os ambientes: fsi-co,socialedeatitudes,nosquaisaspessoasviveme conduzem suas vidas. Os fatores pessoais so as carac-tersticas particulares de um indivduo e de suas situa-es de vida, como, por exemplo: gnero, idade, estilo devida,hbitos,origemsocial,nveldeescolaridade, formao profissional, entre outros.A funcionalidade abrange todas as funes do cor-poeacapacidadedoindivduoderealizaratividades e tarefas relevantes da rotina diria e aquelas relativas participaonasociedade.Aincapacidadeenvolve asconsequnciasnegativasdeumadoenaouestado desade,como:deficincianasfuneseestruturas corporais,limitaesnodesempenhodasatividadese restries na participao social. Os processos de inca-pacidadeefuncionalidadesoconsideradoscomore-sultantes da interao de uma condio de sade com os fatores do contexto.Assim,opresenteestudovisou,pormeiodouso da CIF, identificar os facilitadores e as barreiras para a reinseronotrabalhodetrabalhadores,acompanha-dos em grupo pela terapia ocupacional de um Centro de Referncia em Sade do Trabalhador (CRST), com um longo perodo de afastamento sem resolutividade e con-tribuir com o uso desta ferramenta para o levantamento e a compreenso das demandas dos trabalhadores. Material e mtodosTrata-sedeumestudoexploratrio,denatureza emprica,comabordagemqualitativadesenvolvidaa partir de um estudo documental de pronturios de tra-balhadores que foram acompanhados em um CRST na cidade de So Paulo.Oestudodocumentalanalisouosregistrosdos pronturios de trabalhadores atendidos em grupo pela terapia ocupacional, no segundo semestre de 2008, que visava auxiliar a transio entre os longos perodos de afastamento,potencializaroretornoeareinserono trabalho. O critrio de escolha deste grupo foi o longo tempodepermannciadeseusintegrantesnoCRST semresolutividade.Apopulaodoestudofoicons-titudapor10trabalhadoresemsituaoocupacional como afastados ou desempregados, de ambos os sexos, com idades entre 35 e 55 anos.Para iniciar o levantamento dos dados nos prontu-rios criaram-se 8 categorias, a priori, baseadas nas tem-ticas recorrentes que emergiram nos encontros do gru-po durante o acompanhamento: (i) dificuldades para o retorno ao trabalho; (ii) expectativas para o retorno ao trabalho; (iii) potencialidades para o trabalho; (iv) fato-res nocivos sade passveis de transformao; (v) es-tratgias de enfrentamento; (vi) perspectivas de retorno ao trabalho, formal ou informal; (vii) aspectos positivos do processo de retorno ao trabalho; (viii) aspectos nega-tivos do processo de retorno ao trabalho. Aordenaodasinformaescoletadasfoidistri-budaemquadrossegundoascategoriasdaCIF(OR-GANIZAO MUNDIAL DA SADE, 2003, p. 22): (i) funeseestruturasdocorpo,(ii)atividadeseparti-cipao, (iii) fatores ambientais e (iv) fatores pessoais (idade,gnero,graudeescolaridade,ocupao).Foi usado o checklist da CIF para a codificao em primei-ronvel.Paraavanarnosdemaisnveisdecodifica-o foi usada a CIF completa.AscategoriasdaCIFlevantadasnoestudoforam identificadasporestruturass(structure),asfunes por b (body function), as atividades e a participao por d (domain) e os fatores contextuais (ambientais e pes-soais) por e (environment), segundo a classificao. ResultadosNosresultadosdoestudosoapresentadososdo-mnios e os componentes da CIF mais relevantes para descrever a experincia de sade destes trabalhadores. Dosdadosdisponveisnospronturios,foipossvela codificao at o segundo nvel.ConformeoQuadro1,consideraram-seosdados pessoaisquemelhorindicavamasrepercussesnas condies de vida dos trabalhadores.Dentreostrabalhadoresdogrupo,6sodosexo masculino e 4, do sexo feminino, com idade que variou de35a55anos,combaixaescolaridade,sendoasua maiorpartecom1grauincompletoesemformao profissional qualificada.Quanto ao ramo de atividade de origem, predomina-ram aquelas relacionadas aos esforos fsicos e repeti-o de movimentos. Quanto situao ocupacional dos trabalhadores, 5 estavam em situao de desemprego, 5 estavam com afastamento do trabalho pelo INSS, sendo que 1 retornou ao trabalho em situao considerada favo-rvel, aps afastamento, enquanto participava do grupo. Os trabalhadores estudados apresentaram alteraes das estruturas do sistema nervoso central e das relacio-nadasaomovimento.Emrelaosfunesdocorpo encontraram-se afetadas as funes mentais, sensoriais, a dor e as funes neuromusculoesquelticas e relacio-nadas com o movimento. Os qualificadores em relao gravidade do problema variaram de grave (50%-95%) a um problema completo (96%-100%), conforme escala negativa proposta pela CIF para indicar a extenso ou a magnitude de uma deficincia. As afeces das funes mentais aliadas s altera-es das funes neuromuscolesquelticas e relaciona-das ao movimento e funo da dor (Tabela 1) revela-ram que os acometimentos so mltiplos. Rev. bras. Sade ocup., So Paulo, 35 (121): 10-22, 2010 13Quadro 1Componentes e domnios da CIF segundo os fatores pessoais, a situao ocupacional e pecuniria e a condio de sade dos trabalhadores dos participantes do estudo do CRST-SP, 2009Sexo Idade EscolaridadeFormaoprofissionalRamo de atividadeSituao ocupacionalBenefcio recebido*Situao do benefcioTempo de afastam. (meses) CID 10**1 M 49 1 grau inc. NenhumaCortador de rvoreDesempregadoB-91B-31Cessado 68S33.5,M99.8, M79.8, M79.1, M77.1, M51, M51.2, M51.8, R25.22 M 49 1 grau inc. Nenhuma Padeiro Afastado B-91 Cessado 43M17, M23.5, M23.6, M25.4, M25.8, M51,M51.8, M79.41,S83.2, S83.5, M85.6,M94,M99.83 F 41 1 grau inc. Nenhuma Costureira Desempregado B-31 Cessado 60 M51, M79.14 M 35 1 grau inc. NenhumaAjudante geral em construo civilAfastado B-91 Cessado 27M19.1, M43.1,M51.1, M51.2, M54.5, M54.4, M65.5, M79.15 M 55 1 grau inc. NenhumaAjudante de expedioDesempregado B-31 Ativo 33 M51.8, M79.16 F 44 2 grau comp. Curso tcnico auxiliar de EnfermagemAuxiliar de enfermagemDesempregado B-31 Cessado 31M48.9, M51.8, M79,7 M 38 1 grau inc. NenhumaAlimentador de linha de produoAfastadoB-31B-91Ativo 28M48.0, M51.8,M79.1, M99.58 M 50 2 grau comp.Nenhuma Digitador Afastado B-91 Ativo 84M51.8, M65.8, M79.1,E56.0 F32.11, F33.2, F34.1, F439 F 45 1 grau inc. NenhumaAuxiliar de limpezaTrabalhando B-31 Cessado 8M17, M19, M51.8, M54.5, M79.0, M79.110 F 45 1 grau inc. NenhumaLinha de produo - montagem de rdiosDesempregado B-31 Cessado 76M51, M67.0, M70.8, M75.1, M75.5, M79.1, F32, F43* Benefcio recebido: B31= Doena comum, B91= Doena Ocupacional ou Acidente de Trabalho** CID 10 = cdigos da Classificao Internacional de Doenas, 10 versoRev. bras. Sade ocup., So Paulo, 35 (121): 10-22, 2010 14Componentes e domnios da CIF NEstruturas do corpoEstruturas do sistema nervosos 120 Medula espinhal e estruturas relacionadas 2/10Estruturas relacionadas ao movimentos710 Estrutura da regio da cabea e do pescoo 4/10s720 Estrutura da regio do ombro 7/10s730 Estrutura do membro superior 7/10s740 Estrutura da regio plvica 4/10s750 Estrutura do membro inferior 5/10s760 Estrutura do tronco 7/10s770Estruturas musculoesquelticas adicionais relacionadas ao movimento10/10Funes do corpoFunes mentaisFunes mentais globaisb126Funes do temperamento e da personali-dadeEstabilidade psquica, disposio para viver novas experincias, otimismo, confiana, confiabilidade.10/10b130 Funes da energia e dos impulsosFunes mentais que produzem vigor e fora e que produzem os incentivos para agir; a fora motriz consciente ou inconsciente para a ao.8/10b134 Funes do sono Qualidade do sono. 10/10Funes mentais especficasb140 Funes da ateno Manuteno da ateno. 1/10b152 Funes emocionaisRelacionadas ao sentimento e aos componentes afetivos dos processos mentais.3/10Funes sensoriais e dorDorb280 Sensao de dorSensaes de dor generalizada ou localizada em uma ou em mais partes do corpo, dor em um dermtomo, dor aguda, dor em queimao, dor imprecisa, dor contnua e localizada; deficin-cias; como mialgia, analgesia e hiperalgesia.10/10Funes neuromusculoesquelticas e relacionadas com o movimentoFunes das articulaes e dos ossosb710Funes relacionadas mobilidade das articulaesFunes relacionadas amplitude e facilidade de movimento de uma articulao.6/10b715Funes relacionadas estabilidade das articu-laesFunes de manuteno da integridade estrutural das articulaes. 1/10Funes muscularesb730 Funes relacionadas fora muscularFunes relacionadas fora gerada pela contrao de msculo ou de grupos musculares.10/10b735 Funes relacionadas ao tnus muscularFunes relacionadas tenso presente nos msculos em repouso e resistncia oferecida quando se tenta mover os msculos passivamente.3/10b740 Funes da resistncia muscularFunes relacionadas sustentao da contrao muscular pelo perodo de tempo necessrio.6/10Tabela 1Componentes e domnios da CIF segundo as funes e as estruturas do corpo afetadas nos trabalhado-res participantes do estudo do CRST-SP, 2009Rev. bras. Sade ocup., So Paulo, 35 (121): 10-22, 2010 15As condies de sade apresentadas pelos trabalhado-res,diagnosticadassegundoaCID10(ORGANIZAO MUNDIAL DA SADE, 1997), de acordo com o Quadro 1,deveram-seatranstornosdediscosintervertebrais, transtornos dos tecidos moles relacionados ao uso exces-sivo e presso, mialgias, cervicobraquialgias, lombociatal-gias,lesesemombro,transtornosinternosdosjoelhos, sinovitesetenossinovites,confirmandoatendnciade predomniodasdoenasosteomuscularesrelacionadas ao trabalho (DORT), e corresponderam s alteraes das estruturas e das funes do corpo relacionadas ao movi-mento. Alm das DORT, estavam presentes nos trabalha-dores diferentes alteraes de funes mentais, conforme descritas pela CIF, das quais se destacaram: as funes de temperamentoepersonalidade,asfunesdeenergiae impulso, as funes do sono, as funes de ateno e as funes emocionais (Tabela 1).As atividades e a participao que se encontraram li-mitadas para os trabalhadores em funo das consequn-ciasdasdoenasrelacionadasaotrabalho(Tabela2)ti-Componentes e domnios da CIF NMobilidadeCarregar, mover e manusear objetos d430 Levantar e carregar objetos 10/10d440 Uso fino da mo 2/10Andar e mover-sed450 Andar 5/10Deslocar-se utilizando transported470Utilizao de transporte 9/10d475 Dirigir 4/10Cuidado Pessoald520 Cuidado das partes do corpo 2/10d540 Vestir-se 1/10Vida domsticaAquisio do necessrio para viverd620 Aquisio de bens e servios 7/10Tarefas domsticasd630 Preparao de refeies 2/10d640 Realizao das tarefas domsticas 6/10Cuidar dos objetos da casa e ajudar os outrosd6-60 Ajudar os outros 1/10Relacionamentos interpessoais particularesd770 Relaes ntimas 2/10 reas principais da vidaEducaod820 Educao escolar 5/10d830 Educao de nvel superior 2/10Trabalho e empregod850 Trabalho remunerado 9/10Vida econmicad870 Autosuficincia econmica 9/10Vida comunitria, social e cvicad920 Recreao e lazer 9/10d940 Direitos humanos 10/10Tabela 2Componentes e domnios da CIF, segundo as atividades e a participao nas reas da vida afetadas nos trabalhadores participantes do estudo do CRST-SP, 2009Rev. bras. Sade ocup., So Paulo, 35 (121): 10-22, 2010 16veramreflexonarealizaodasatividades,oquecom-prometeuaparticipaodapessoanasesferasfamiliar, social e de trabalho.Nas atividades, destacaram-se mais especificamente asrelacionadascomamobilidade,presentesemdife-rentes aes e tarefas e que podem dificultar ou invia-bilizar uma jornada de trabalho de oito horas, visto que a maioria dos trabalhadores exercia atividades que exi-giamesforofsicoelevado,repetiodemovimentos, manutenodeposturasantinaturaiseritmointenso/acelerado com exigncia de produo.As atividades da rotina de vida domstica, familiar, trabalhoelazerficaraminfluenciadaspelasalteraes nasestruturasenasfunesdocorpodamaioriados trabalhadores e levaram a restries na participao nas principaisreasdavida.Ainter-relaoentreasreas principaisdavida(educao,trabalhoeemprego)ea vidaeconmica,comosaspectospessoais,apontaram que a baixa escolaridade e a falta de preparo profissional da maioria dos trabalhadores, somada s limitaes fun-cionaisdecorrentesdadoena,impemumarealidade no promissora para o retorno ao trabalho e, consequen-temente, para a autosuficincia econmica.Para complementar o espectro dos componentes da CIFnosfatoresambientais(Tabela3),foramconside-radasasbarreiraseosfacilitadoresparaacapacidade laborativa e o desempenho no retorno ao trabalho dos participantes do estudo. Para tanto, foi utilizada a esca-lanegativaepositivapropostapelaCIF,quedenotao impactodeumfatorambientalcomoobstculooufa-cilitador,alcanando,nesteestudo,qualificadoresen-tre moderado (25%-49%) a completo (96%-100%) para asbarreirasedemoderado(25%-49%)aconsidervel (50%-95%) para os facilitadores.Tabela 3Componentes e domnios da CIF, segundo os fatores ambientais, caracterizados como facilitadores e como barreiras para os trabalhadores participantes do estudo do CRST-SP, 2009Fatores AmbientaisFacilitadores BarreirasN NProdutos e tecnologiase135 Produtos e tecnologias para o trabalho 10/10Ambiente natural e mudanas ambientais feitas pelo homeme225 Clima 1/10Apoio e relacionamentose310Famlia imediata 1/10 3/10e320 Amigos 1/10 1/10e325 Conhecidos, companheiros, colegas, vizinhos e membros da comunidade 2/10 3/10e330Pessoas em posio de autoridade 2/10 4/10e340Cuidadores e assistentes pessoais 1/10e355 Profissionais da sade 7/10 3/10e360 Outros profissionais 10/10Atitudese410Atitudes individuais de membros da famlia imediata 2/10e420 Atitudes individuais dos amigos 1/10 2/10e450 Atitudes individuais dos profissionais de sade 6/10 6/10e455 Atitudes individuais dos profissionais relacionados sade* 10/10e460Atitudes sociais 1/10 2/10e465 Normas, prticas e ideologias sociais 1/10 1/10Servios, sistemas e polticase525 Servios, sistemas e polticas de habitao 1/10 3/10e540 Servios, sistemas e polticas de transportes 1/10e570 Servios, sistemas e polticas da previdncia social 1/10 8/10e575 Servios, sistemas e polticas de suporte social geral 1/10 3/10e580 Servios, sistemas e polticas de sade 2/10 5/10e585 Servios, sistemas e polticas de educao e treinamento 1/10 7/10e590 Servios, sistemas e polticas de trabalho e emprego 1/10 8/10Rev. bras. Sade ocup., So Paulo, 35 (121): 10-22, 2010 17Ascondiesdetrabalhoreferentesaosprodutose s tecnologias para o trabalho (gerais e de assistncia) fo-ram classificadas como barreiras em todos os casos, bem como quanto aos apoios e relacionamentos destacaram-seaquelesrelativosaosprofissionaisdoINSStambm classificadoscomobarreiras.Quantoaosfacilitadores, os apoios e os relacionamentos de profissionais da sa-de, bem como as atitudes individuais de profissionais da sade foram os que obtiveram a maior frequncia dentre os facilitadores destacados pelos trabalhadores.Ostratamentos/acompanhamentosdosparticipan-tesdoestudoforamrealizadosemdiferentesservi-os, em geral na rea de Fisioterapia e Medicina, e no CRST em atendimentos multiprofissionais. No entanto, apesardealgunsreferiremmelhorasdossintomas,a maioria manteve a maior parte das queixas iniciais e a incapacidade para desempenhar as mesmas atividades exercidas antes do acidente ou do incio da doena.O longo perodo de afastamento dos trabalhadores (84 meses a 8 meses, mdia de 45,8), de tratamento (96 a 8 meses, mdia 49,8) e a demora no encaminhamen-toparaareabilitaoprofissional,deat54meses, bem como o no encaminhamento de outros denotam uma falha de interlocuo e de diretrizes entre servi-os,sistemasepolticasdaprevidnciasocial,8/10; de sade, 5/10; de suporte social geral, 3/10; de educa-o e treinamento, 7/10; e de trabalho e emprego 8/10, classificados como barreiras. Discusso O modelo da CIF, ao relacionar estruturas e funes docorpocomatividade,participaoecontextosam-bientais, permite aos profissionais de sade e de gesto de servios uma viso ampliada das condies de sade dostrabalhadores,quepodesertilnaconduode servios, sistemas e polticas das diferentes reas.A CIF enquanto instrumento de uso na prtica dos profissionaispodeserbenficaparaadescriodos fenmenos(CHAN;ALBUQUERQUE,2006),pois proporcionabasesparaacriaodemodelosexpli-cativosevalorizaosdiferentesaspectosdoprocesso (VZQUEZ-BARQUEROetal.,2001).Permiteainda umaabordagemteraputicamaisabrangente,contri-buindo na qualidade e na individualidade da ateno, como tambm na descrio e na classificao de todo o processo sade-doena (SAMPAIO et al., 2005). A clas-sificao fornece elementos para avaliaes mais objeti-vas, que podem auxiliar tanto na criao de evidncias entre os processos de adoecimento no trabalho, quanto na avaliao de restries laborais e potencialidades de retorno ao trabalho. Colabora tambm como indicador para as demandas e as aes de reabilitao do afasta-mento crnico do trabalho.Noestudo,verificou-sequeasalteraesnasfun-es e nas estruturas do corpo levaram a incapacidades nasatividadesdemobilidade,cuidadopessoal,vida domstica e nas reas principais de vida em decorrn-cia dos acometimentos gerados e/ou agravados pelo tra-balho. As reas principais da vida (educao, trabalho eemprego,vidaeconmicaevidacomunitria,social e cvica) ficaram profundamente afetadas nestes traba-lhadoresdevidoaoafastamentoprolongadoouper-da do emprego, sendo agravadas pela falta de acesso a programas de melhoria de escolaridade, treinamento e (re)capacitao profissional. Estas condies afetaram a capacidade de manter o emprego atual ou de conseguir umnovo,oquerepercutiunegativamentenapartici-paosocial,denotandoodesrespeitocomosdireitos destes trabalhadores como cidados.A trajetria do grupo de trabalhadores mostrou que a procura tardia pelo tratamento, muitas vezes ocasio-nadapelomedodeperderoempregoouatpeladi-ficuldade de acesso ao tratamento adequado, conduz, emgeral,aoagravamento,cronificaoeaotrata-mento tardio, tambm, encontrado em outros estudos (TOLDR, 1997). Esta situao seguida de tratamen-tos sintomticos, paliativos, iniciados na empresa sem a modificao das condies de trabalho.A situao destes trabalhadores mostrou um percur-so de sofrimento, frustrao e baixa resolutividade dos problemas de sade e de reabilitao profissional e co-locou em evidncia a necessidade de aes preventivas nos ambientes do trabalho, bem como a necessidade de repensar o retorno ao trabalho sem comprometer ainda maisasade,evitandoodesempregoeaonerosidade ao sistema previdencirio.Odecreton4.729,de9/06/2003(BRASIL,2003), assinala que aos segurados elegveis para o programa de reabilitao profissional deve-se assegurar a articulao com a comunidade, inclusive mediante a celebrao de convnio para a reabilitao fsica.Ademoranoencaminhamentodaperciamdica para a reabilitao profissional de 6/10 trabalhadores e o no encaminhamento de 4/10 denota a desarticulao entre os diferentes setores (da sade e da previdncia-reabilitaoprofissional).Estaconstataoreafirmao no cumprimento do decreto com vistas ao reingresso no mercado de trabalho, o que contribuiu para a croni-ficao das condies destes trabalhadores, dificultan-do seu retorno e os levando a excluso.Asituaovivenciadapelostrabalhadorescontra-diz o que enuncia o decreto, que segundo a Previdncia ampliaria o alcance e as aes atravs de parcerias e da diversificaodoatendimento,procurandoenvolvera comunidade no processo de reintegrao do reabilitado no mercado de trabalho atravs da revitalizao do Pro-grama Reabilita. Os profissionais deste programa limi-tam-se aos profissionais mdicos peritos e a um orienta-dor profissional (OP) de formao em reas da sade ou humanas. Cabe ao perito centralizar a avaliao do po-tencial laborativo do segurado e ao OP, algumas aes de formao de rede. Este modelo deu margem a inmeras crticas, principalmente no que se refere diluio das equipes multiprofissionais e inespecificidade profissio-nal dos OPs (MAENO, 2001; TAKAHASHI; IGUTI, 2008). Estudos indicam que aes de reabilitao e de retorno Rev. bras. Sade ocup., So Paulo, 35 (121): 10-22, 2010 18ao trabalho desenvolvido por equipes profissionais, sob a perspectiva de diferentes saberes tcnicos cientficos, tiveram resultados positivos (TAKAHASHI; CANESQUI, 2003; SAMPAIO et al., 2005).Nos casos estudados, o programa de reabilitao pro-fissional vigente demonstrou falta de efetividade. Os tra-balhadores que passaram pela reabilitao profissional, noentanto,notiveramaexperinciaderealizaode cursosparaa(re)capacitaoprofissionale,tampouco, ocorreramnegociaes/intermediaesdoINSScoma empresa para a reintegrao destes. Houve apenas o en-viodeofciosrelatandoaincapacidadeesolicitandoa readaptao com ausncia de aes presenciais.Alein8.213,de24/07/1991,art.89(BRASIL, 1991b),prevqueahabilitaoeareabilitaopro-fissionalesocialdevemproporcionaraobeneficirio osmeiosparaa(re)educaoea(re)adaptaoprofis-sional e social, o que no foi constatado nos casos dos trabalhadoresdoestudo.Bernardo(2006),empesqui-sa realizada em uma agncia da previdncia social em BeloHorizonte,relataqueosbeneficiriosavaliaram que os cursos realizados pelo INSS no os reabilitava e, inclusive, alguns se mostraram inadequados s seque-lasapresentadas.Istoapontouqueareabilitaopro-fissional dever ser repensada a partir do interesse e da capacidade laborativa dos trabalhadores.A carncia de recursos materiais e humanos nos ser-vios do INSS e nos servios de sade, assim como a falta de integrao dos diferentes servios, sistemas e polticas dasdiferentesreas,criambarreirasparaasmudanas dascondiesdetrabalhoquecausamadoecimentoe paraaassistnciasadeedereabilitaoprofissional, mostrando a contradio entre a legislao e a realidade.Oafastamentodotrabalhoportempoprolonga-do, segundo alguns autores (tempo acima de 3 meses) (LOISELetal.,1994;ARNETZetal.,2003;SHAWet al.,2009),torna-sepreditivodedificultadoresparao retorno ao trabalho, principalmente devido ao impacto psquico do afastamento e do retorno, quando esses im-plicam em mudanas de posto de trabalho, de funo e de status (SCOPEL, 2005).No presente estudo, o tempo de afastamento mdio foi de 45,8 meses (Quadro 1), configurando-se em mais umaspectodeimpactoparaafaltaderesolutividade dos casos. Este um dado de extrema importncia a ser considerado nos servios e nos programas de ateno sade do trabalhador, cuja meta deve ser de minimizar as barreiras para um retorno precoce ao trabalho, quer sejam estas de ordem diagnstico-assistencial, quer se-jamdaspolticasprevidenciriasou,ainda,degesto de recursos humanos das empresas. Estas aes devem favorecer o retorno teraputico e precoce ao trabalho.De maneira geral, quando os trabalhadores retornam ao trabalho so, por vezes, lotados em funes incom-patveiscomoseuquadroclnico-funcionale/oucom asuaformaoequalificao,ousosimplesmente deixados margem do processo produtivo, ou encos-tados,reforando,svezes,experinciasdefracasso vivenciadas pelos trabalhadores do estudo.Ostrabalhadoresdopresenteestudomanifestaram descrdito em si mesmos e na empresa qual dedicaram sua fora de trabalho, vivenciando o impasse entre o de-sejo de ter sade e de viver sem limitaes com o medo de retornar a se submeter quilo que os fez adoecer.Tendo em vista estas experincias, os participantes do estudo manifestaram receio em retornar s situaes detrabalhoqueprovocaramadoena,almdeincer-tezaeansiedadepeladificuldadedevislumbrarmu-danas nas perspectivas de vida. Os mesmos revelaram sofrimentotantofsico,quantopsquico,geradopelas condieserelaesnotrabalho,pelaincapacidade paratrabalhardecorrentededoenasesequelas.As-sim, a incapacidade transcende o aspecto corporal/indi-vidual e afeta, conforme Takahashi e Canesqui (2003), a dimenso social/relacional e psquica.Parte das empresas optou pelo desligamento do tra-balhador, ora pelo desinteresse e pela falta de proposta de reinsero do trabalhador com restrio laboral, ora pela racionalidade econmica que provocava uma srie de dilemas e dificuldades para esta reinsero. Segundo Vasconcelos e Oliveira (2004), grande par-te dos trabalhadores tem no trabalho o nico elo social fora do convvio familiar, assim, quando o trabalhador encontra-seforadoseumeiodetrabalho,podehaver consequnciasparaasuasademental,pelosignifi-cado e reconhecimento social do mesmo e, por conse-guinte,asuafaltapodelevardesvalorizaosocial. O sentimento de impotncia provoca um alto nvel de sofrimento,quevivenciadopelotrabalhadoratravs de dores fsicas e psquicas (MENEZES, 2007).Os achados corroboram os dados dos autores acima, queapontamqueotrabalhopossuiumafunops-quica. Segundo Sznelwar et al. (2004), o trabalho um dosgrandesalicercesdaconstituiodosujeitoeda sua rede de significados, uma vez que processos como reconhecimento,gratificao,mobilizaodainteli-gncia,almdeestaremrelacionadosrealizaodo trabalho, esto vinculados constituio da identidade e da subjetividade. E o contrrio, a ofensa, a suspeita, a desqualificao da incapacidade, a violncia e a injus-tia interferem de forma negativa na identidade pessoal e social do trabalhador (BERNARDO, 2006).Estes elementos se sobressaram no estudo quando se verificaramqueoscomprometimentosmanifestadosre-ferentes s funes mentais globais e especficas acompa-nharam as alteraes nas funes sensoriais de dor e nas funes neuromusculoesquelticas, conforme demonstra a Tabela 2, bem como os fatores contextuais referentes ao ambiente:apoioerelacionamentos,atitudeseservios, sistemas e polticas, de acordo com a Tabela 3.Desta forma, as pessoas que passam por longos pero-dos de afastamentos do trabalho ou os desempregados de longa durao possuem dificuldades de estabelecer projetos para seu futuro e perdem relaes de pertinn-cianosomentenosambientesdetrabalho,mastam-bm muitas vezes na sua vida privada. Rev. bras. Sade ocup., So Paulo, 35 (121): 10-22, 2010 19Nestesentido,Seligmann-Silva(1994)colocaque o sofrimento fsico, o sofrimento social e o sofrimento mental so indissociveis e esto intimamente relacio-nados com a psicopatologia do desemprego.Acondioderetornoaotrabalhopodeprovocar nostrabalhadoresumsentimentodefrustraooude penalizao pelo adoecimento do qual foram vtimas e umprocessodeexclusotardia,demonstrando,como pode ser entendido pelo modelo multidirecional e mul-tidimensional da CIF, que as funes mentais podem ser afetadaspelasdificuldadesemvivernovasexperin-cias, pela falta de otimismo, de confiana, de motivao (ORGANIZAO MUNDIAL DA SADE, 2003) e de re-sistncia para enfrentar as diversidades das exigncias do trabalho, criando, assim, barreiras.Estudos mostram que os apoios e os relacionamen-tos,compreendidosnaCIFcomofatoresambientais, so colocados como aspectos facilitadores para o retor-noaotrabalho.Considera-sequearelaodosprofis-sionaisdaequipecomaschefiasdostrabalhadores,a aceitao e o apoio dos colegas de trabalho, bem como dafamlia,soconsideradoscomofatoresessenciais para o processo de reinsero no trabalho (SAMPAIO et al.,2005;WATANABE,2004;GRAVINA;NOGUEIRA; ROCHA,2003).Nopresenteestudo,constatou-seque a nica trabalhadora que retornou ao trabalho relatou compreenso da chefia e de seus colegas em relao s restries laborais e que, com o apoio recebido, voltou inclusive a estudar. As barreiras que apareceram como mais significati-vas para o processo de reabilitao e de retorno ao tra-balho foram relativas s atitudes, ao apoio e aos relacio-namentos dos profissionais do INSS e dos profissionais de sade, que reforavam as incapacidades, mostrando acontradiodeservios,sistemasepolticas.Estes, por sua vez, tornavam-se barreiras para que os trabalha-dores pudessem acessar os seus direitos, a manuteno do estado de sade, de condies de trabalho e de sub-sistncia, de educao e treinamento.Noentanto,nosepodedeixardeconsiderarque outros autores (LIMA et al., 2008) apontam que, dentre osdiferentescomponentesquefazempartedaCIF,o componente fatores ambientais considerado o mais limitado para a descrio das barreiras e dos facilitado-resrelativosaocontextodotrabalho,poisnosufi-ciente para descrever as condies de trabalho que le-vam ao desenvolvimento e ao agravamento das DORT. No presente estudo, os fatores ambientais considera-dos foram: apoio e relacionamento, atitudes, servios, sis-temas e polticas, que possibilitaram identificar aspectos relevantes para a descrio e a compreenso das variveis pesquisadas.Nofoicontemplado,nopresenteestudo, osdemaiselementos(produtosetecnologia;ambiente natural e mudanas ambientais feitas pelo ser humano), dadas as caractersticas da pesquisa realizada.Relatosdestacaramqueomelhormomentododia paraotrabalhadoreraquandoesteseencontravano Servio de Sade, pelo acolhimento e o sentimento de pertencimento advindos das possibilidades de conver-sardeigualparaigualnosgruposdetratamento,tais como grupos de LER/DORT, raquialgia, Liang Gong, do-rescrnicas,biodana,enastrocasocorridasnasala de espera. Assim, o CRST era visto como um elemento facilitador para o enfrentamento do processo de exclu-so vivido pelos mesmos, tendo em vista que a atitude profissional no discriminadora de escuta e de cuidado foi identificada pelos trabalhadores como positiva. Ostrabalhadores,almdaperdadasade,docar-gonaempresae,porvezes,doemprego,nicafonte de renda, conviviam com outras perdas: da identidade profissional, dos vnculos com colegas de trabalho, do status de trabalhador e das perspectivas de vida. Conseguir um novo emprego para os trabalhadores do estudo no lhes parecia possvel diante do reconhe-cimento de suas limitaes funcionais, da desqualifica-o profissional e do baixo grau de escolaridade. Desta forma, restava-lhes tentar garantir a sobrevivncia atra-vsdoschamadosbicos,abrircomrciocomfami-liares, vender salgados, bordar e conseguir prorrogar o recebimento do benefcio por afastamento do trabalho ou alcanar a sonhada aposentadoria por invalidez.Comainterrupodaperspectivaprofissionalna ocupao original, a reabilitao e a adaptao para um novocotidianotmsedadocustadeapoiodarede familiar.Oapoiodasredessociaisparareinserono trabalhovemsendoconsideradoumelementoimpor-tante,quersejanocampodotrabalhoformal,sejano informal (MAENO, 2001; AZEVEDO et al., 1998).Para uma poltica de reabilitao profissional, de re-torno ao trabalho e permanncia no trabalho, prope-se umconjuntodeprincpiosediretrizesnaperspectiva dapolticadehumanizaodoSUS(BRASIL,2006) com aes nos diferentes setores e nas prticas profis-sionais,naformadeconstruocoletiva,envolvendo osdiferentessujeitosimplicados,osvnculossolid-rios, a autonomia e o protagonismo dos trabalhadores, reconhecendo-oscomosujeitoseparticipantesativos no processo de produo de sade e de trabalho.Aodiminuirosfatoresnocivosestruturaiseorga-nizacionais do trabalho e as suas consequncias nega-tivas,est-secontribuindoparaamelhoriadascondi-esdesadedostrabalhadores,paraacompreenso dos mecanismos que levam s aposentadorias precoces e excluso do trabalho, repercutindo de forma positi-va na economia nacional e nos sistemas de sade e de previdncia social.Asaesdevemservoltadasparaatransformao desituaesdetrabalho,sejamelasdirigidasparaa prevenodedoenasvinculadasaotrabalho,parao tratamento e/ou reabilitao, ganhando um novo olhar a partir da compreenso de que, se o trabalho gerador de doenas e sofrimento, qualquer ao que vise a sua transformao ou vise amenizar o sofrimento dos traba-lhadoresadoecidosouemriscodeadoecimentodeve ser pensada a partir de mudanas na relao das pessoascom o seu trabalho, ou seja, com o ato de trabalhar.Rev. bras. Sade ocup., So Paulo, 35 (121): 10-22, 2010 20Esseprocessoderetornoaotrabalhodeveenvol-vermudanasnaorganizaodotrabalho(comoare-duo do ritmo de trabalho, o aumento do nmero de trabalhadores,amodificaodocontedodastarefas, a mudana na dinmica das relaes interpessoais e da estrutura hierrquica), que, na perspectiva da CIF, cor-respondem aos fatores ambientais.Na perspectiva de cuidar e resguardar a sade do tra-balhador, em casos de adoecimento e de retorno ao tra-balho, deve-se considerar a compatibilidade das tarefas a serem realizadas e as restries do trabalho s condies clnicas.Naprtica,issoimplicaem:estabelecimento detarefasdeacordocomacapacidadedotrabalhador; adequao do ambiente de trabalho e da organizao do trabalho; envolvimento efetivo das empresas (atravs da equipe de sade e segurana no trabalho e dos recursos humanos); informao, orientao e apoio das chefias e dos colegas a respeito das restries do trabalhador e o acompanhamentonarealizaodastarefas.Valedizer que o retorno a mesma situao de trabalho ou os casos de mudanas de funo sem o respaldo de uma adequa-da poltica de readaptao podem levar piora da sinto-matologia e a novos afastamentos.Cabemencionaroslimitesdocentrodereferncia onde se deu o estudo quanto contribuio no processo de retorno ao trabalho, uma vez que legalmente o papel de(re)adaptao,reabilitaoprofissionaledenego-ciaodecompetnciadaPrevidnciaSociale,ain-da,quantonecessidadedeampliaodasaesdos CRSTs em vigilncia em sade do trabalhador nos am-bientesdetrabalhodosusuriosatendidosparacriar umamelhoriadascondiesdetrabalho.Noentanto, observa-se que nem sempre as vigilncias em sade do trabalhadorcontemplamasempresasdeorigemdos trabalhadores afastados atendidos no servio, o que im-pede um processo continuum de preveno e de promo-o de sade nestes locais.Apesardaslimitaesdeumestudodescritivoe comnmerorestritodeparticipantes,acredita-seque seus dados permitem refletir sobre as questes que po-demsercomunsaostrabalhadorescomdemandasse-melhantes, atendidos em outros servios de sade.Outrolimitedetectadonoestudofoiaausnciade normatizaonosregistrosdospronturios,oqueim-possibilitou avanar na codificao da CIF no terceiro e noquartonveisparaafuncionalidadeeaincapacida-de (parte 1), bem como, na parte 2 (fatores contextuais) avanar nos cdigos dos qualificadores.Consideraes finais ACIFforneceu,nesteestudo,subsdiosparauma visomaisabrangente,integral,articuladaesistema-tizada das informaes referentes aos diversos compo-nentes de sade e funcionalidade humana que afetam a vida dos trabalhadores, sendo teis para o desenvolvi-mento de servios, sistemas e polticas de reabilitao e para o retorno ao trabalho nas diferentes reas.Os resultados mostraram que as principais barreiras para o retorno ao trabalho foram a ineficincia do atual programa de reabilitao profissional, os mecanismos de comunicao insuficientes entre os servios, sistemas e polticas preventivas, assistenciais e previdencirias. Destaca-sequeoapoioeosrelacionamentoseas atitudesindividuaisoferecidospelosprofissionaisde sade do CRST foram os principais facilitadores, bem como funcionaram como barreiras falta de apoio e re-lacionamentos e s atitudes discriminatrias por parte dos profissionais da Previdncia Social.Oestudomostrouqueaprecariedadedecondies socioeconmicasedeescolaridadedossujeitospar-ticipantessomadosaosfatoresambientaisdificulta-rama(re)educao,a(re)qualificaoprofissionalea (re)adaptaoprofissionalesocialedenunciaramaca-rncia de polticas de valorizao da classe trabalhadora.O longo perodo de afastamento e de desligamento darotina do trabalho d lugar a uma nova rotina, a trajetria de incapacitado para o trabalho, que deve cumprir uma s-rie de compromissos junto aos rgos de sade e previden-cirios, correndo o srio risco de perpetuao da situao deafastamento e cristalizao no papel de doente/segurado.Nas aes de ateno sade do trabalhador, o aco-lhimentoeoreconhecimentodosofrimentopresente noprocessosade-doena-trabalhopodemelhorara autoestima e a autoconfiana dos trabalhadores, o que essencial para a criao de mecanismos positivos de enfrentamento, que refletiro na melhora do desempe-nho e da funcionalidade.Aosegarantircondieseambientesdetrabalho adequados,previnem-seosurgimentodenovasdoen-aseaocorrnciadeacidentes,ouseja,aconstruo de uma poltica de retorno ao trabalho implica em uma poltica de preveno de incapacidades. A articulao eficiente entre os diferentes atores en-volvidos, os servios, os sistemas e as polticas criaro condiessatisfatriasparaoretornoaotrabalhodos trabalhadores em fase de readaptao profissional.RefernciasARNETZ, B. B. et al. Early workplace intervention for employees with musculoskeletal-related absenteeism: a prospective controlled intervention. Journal of Occupational and Environmental Medicine, v. 45, n. 5, p. 499-506, May 2003. AZEVEDO, J. T. et al. As estratgias de sobrevivncia e de busca de emprego adotadas pelos desempregados. Cadernos de Psicologia Social do Trabalho, So Paulo, v. 1, p. 15-42, dez. 1998.Rev. bras. Sade ocup., So Paulo, 35 (121): 10-22, 2010 21BERNARDO, D. L. Os significados do trabalho e da reabilitao profissional para o trabalhador incapacitado para o exerccio da profisso habitual. 2006. 72 f. Dissertao (Mestrado em Sade Pblica)-Faculdade de Medicina, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2006.BRASIL. Ministrio da Previdncia Social. 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Sade ocup., So Paulo, 35 (121):23-32, 2010 23Reabilitao de pacientes com LER/DORT: contribuies da fisioterapia em grupo*Rehabilitation of patients with RSI/WRMD the contribution of group physical therapy Luciane Frizo Mendes1Selma Lancman21 Docente do Curso de Fisioterapia da Universidade Metodista de So Paulo SP, Brasil.2 Docente doDepartamento de Fisiote-rapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocu-pacional da Faculdade de Medicina da Universidade de So Paulo SP, Brasil.*Artigo baseado em tese para obteno de ttulo de doutor de Luciane Frizo Mendes, intitulada A contribuio da fisioterapia em grupo na recuperao e reabilitao de pacientes com LER/DORT, defendida na Faculdade de Medicina, Universidade de So Paulo, em 2008.Contato:Luciane Frizo Mendes Rua Ribeiro do Amaral, 585 apto. 106. CEP: 04268-000, So Paulo, SP.E-mail: [email protected]: 30/06/2009Revisado: 18/03/2010Aprovado: 23/03/2010ResumoObjetivo: Avaliar os benefcios da associao do tratamento cinesioteraputico com as dinmicas de grupo, numa abordagem mais integral do processo sade-doena, na recuperao e na reabilitao de portadores de LER/DORT em relao funcio-nalidade e ao retorno ao trabalho. Mtodo: vinte e quatro pacientes diagnosticados com LER/DORT foram distribudos aleatoriamente em intervenes individuais e grupais, em 2008. O protocolo de cinesioterapia foi o mesmo nas duas intervenes e durou 10 sesses. Aps os exerccios, foram abordados aspectos psicossociais im-portantes para o tratamento. A anlise das intervenes ocorreu atravs da avaliao da funcionalidade pelo Questionrio DASH e por uma entrevista semiestruturada paraavaliarqualitativamenteoimpactodessasintervenesnoquadroclnicoe na qualidade de vida aps o tratamento. Resultados: A avaliao da funcionalida-de identificou que em nenhuma das intervenes houve alterao das funes dos membros superiores. Na anlise das entrevistas, observou-se que os participantes relataram uma percepo de melhora do quadro clnico e da funcionalidade em suas vidas, mas que no foi suficiente para assegurar o retorno ao trabalho. Concluso: As reflexes criadas nas duas intervenes permitiram uma abordagem mais global do processo de adoecimento, recuperao e reabilitao do paciente com LER/DORT, mas no foram suficientes para garantir o retorno ao trabalho.Palavras-chave:sadedotrabalhador;transtornostraumticoscumulativos/reabilitao; modalidades de fisioterapia; grupos.AbstractObjective: Assess the benefits of associating kinesiotherapeutic treatment to group dynamics in a more integrative approach for the health-illness process of recovering andrehabilitatingRSI/WRMDpatients, regarding theirfunctionalityandreturn towork.Method:In2008,24RSI/WRMDpatientswererandomlydistributedfor individual and group interventions. The kinesiotherapeutic protocol was the same for both interventions and took 10 sessions. After the exercises, psychosocial aspects consideredimportanttothetreatmentofRSI/WRMDpatientswereaddressed individuallyandingroups.Theimpactoftheinterventionsonpatientsclinical condition and on their quality of life was evaluated by using DASH Questionnaire for patients functionality and semi-structured interviews. Results: The assessment ofpatientsupper-limbfunctionalityrevealedthattherewasnochangeintheir functionalstateinnoneofinterventions.Theinterviews,ontheotherhand, indicated that the participants improved their clinical condition and functionality, but this improvement was not enough to assure their return to work. Conclusion: Thepossibilityofreflectionduringbothtypesofinterventionallowedamore comprehensiveapproachtodealwithRSI/WRMDpatientsillness,recoveryand rehabilitation processes, but it was not enough to ensure their return to work. Keywords:occupationalhealth;cumulativetraumadisorders/rehabilitation; modalities of physical therapy; groups.ArtigoRev. bras. Sade ocup., So Paulo, 35 (121): 23-32, 2010 24IntroduoAsaesdesadedotrabalhadornaredepblica de servios de sade estavam inseridas, at a dcada de 1980, nos Programas de Sade do Trabalhador. Com a institucionalizao do SUS (Sistema nico de Sade), foramreorganizadaseintegradasemCentrosdeRefe-rncia,tornado-seumaestruturadeapoionaredeb-sica para os problemas de sade do trabalhador. Esses Centros garantem desde a assistncia s aes at ativi-dades em vigilncia nas empresas, privilegiando tanto a preveno de agravos e promoo da sade, quanto a assistnciasadedostrabalhadoresacometidospor doenas relacionadas ao trabalho (BRASIL, 2001).A Leso por Esforo Repetitivo ou Distrbio Osteo-muscular Relacionado ao Trabalho (LER/DORT) uma dasmaisimportantescausasdeafastamentoedesta-ca-seentreasmaioresrepercussesnasadedotra-balhadordecorrentesdastransformaesdotrabalho, principalmentedosnovosmodelosorganizacionaise de gesto (BRASIL, 2001). Os servios de referncia em sade do trabalhador de diversas regies do pas recebem uma alta demanda detrabalhadoresportadoresdeLER/DORT,quebus-cam associar legalmente o diagnstico com o trabalho, orientaesprevidenciriaserecursosteraputicos (SETTIMI et al., 1998).O tratamento desses trabalhadores no deve conside-rar apenas aspectos clnicos e deve incluir tambm uma preparao para o retorno ao trabalho, algumas orienta-es para a melhor forma de realizar as atividades labo-rais e a prpria modificao do trabalho. Nesse sentindo, necessriaaatuaodediversosprofissionais,como mdicos, engenheiros, psiclogos, terapeutas ocupacio-nais,fisioterapeutas,ergonomistas,assistentessociais, dentreoutros,paragarantiraanliseglobaldaproble-mtica (SATO, 2001; SETTIMI et al., 1998).Asatividadesemgruposcomplementandoos procedimentosteraputicoscompacientescomLER/DORTtmsidoutilizadasdesdeoinciodosanos 1990 (LIMA; OLIVEIRA, 1995). Elas tm possibilitado que os trabalhadores acometidos saibam lidar de for-ma mais autnoma com o seu quadro clnico e com as limitaes associadas, que eles modifiquem sua forma de trabalhar e de realizar as atividades de vida diria equetambmpossamamenizarosofrimentoadvin-do da doena e da culpabilizao a eles atribuda pelo adoecimento do qual so vtimas.Asvivnciasgrupaispermitemaotrabalhador transformar percepes individuais em percepes co-letivas,apartirdaidentificaodeseusprpriospro-cessos com os dos outros participantes. Dessa forma, fa-vorecem o estabelecimento de relaes do seu prprio adoecimento com o processo de trabalho e facilitam a compreenso de que o processo de adoecimento mais doqueumprocessoindividuale,sim,decorrentedo prprio trabalho (SATO et al., 1993).Apesar dos programas de tratamentos e reabilitao depacientescomLER/DORTindicaremumaaborda-gemmultidisciplinar,afisioterapiamuitasvezeso primeiroenicoprocedimentoteraputicoacessvel e pode ser uma etapa de longa durao no tratamento desses trabalhadores (ASSUNO, 2001).Autilizaoderecursosfsicosimportanteparao controle da dor dos pacientes com LER/DORT. Os recur-sosanalgsicosdevemserassociadoscinesioterapia para proporcionar a reduo do edema e da inflamao, a melhora das condies circulatrias, o relaxamento da musculatura, a amenizao da dor e uma potencializao da capacidade funcional destes pacientes (YENG, 1995).Acredita-seque,notratamentofisioteraputico,a abordagememgrupotambmpoderiapotencializar os efeitos dos recursos fsicos utilizados, acentuando a melhoradoquadroclnicodospacientes(SIQUEIRA; QUEIROZ, 2001).Acinesioterapiaemgrupofazcomqueopacien-te aprenda a assumir parte da responsabilidade de seu prprioexerccio,adquiraconfiananotratamento, compreenda a dimenso coletiva do seu adoecimento, rompa com o isolamento, muitas vezes provocado pela doena,epercebaque,aomesmotempoemquepre-cisa de ajuda, pode auxiliar outros membros do grupo (GARDINER,1993;ZIMERMAN,1997).Dessaforma, num tratamento fisioteraputico dos trabalhadores com LER/DORT, se restabeleceria o carter social do proces-sodeadoecimento,reduzindoofoconosintoma,tal como feito nos tratamentos tradicionais.Aparticipaonosgruposoferece,ainda,maior reconhecimentosocial,quepodeauxiliaroportador de LER/DORT a ficar mais confiante em si, a conviver melhor com sua situao clnica durante o tratamento, com suas limitaes, a se preparar melhor para o retor-no ao trabalho ou a procurar novas formas de insero profissional (LIMA; OLIVEIRA, 1995).O objetivo deste artigo avaliar os benefcios da as-sociaodotratamentocinesioteraputicocomasdi-nmicas de grupo em uma abordagem mais integral do processosade-doenanoprocessoderecuperaoe reabilitao de pacientes com LER/DORT, em relao funcionalidade e ao processo de retorno ao trabalho.MtodoTrata-se de um estudo clnico comparando dois tipos detratamento:aintervenocinesioteraputicaindivi-dual com a interveno cinesioteraputica em grupo. Local e sujeitosEste estudo foi desenvolvido em 2008, em dois Cen-tros de Referncia em Sade do Trabalhador, um locali-zado no municpio de Santo Andr e o outro, no muni-cpio de So Paulo, no Estado de So Paulo, Brasil.Rev. bras. Sade ocup., So Paulo, 35 (121): 23-32, 2010 25Oscritriosdeinclusodossujeitosnestapesquisa foram: trabalhadores (homens e mulheres) que possuam umaoumltiplaspatologiasemmembrossuperiores, com nexo com trabalho estabelecido (diagnstico clni-co de LER/DORT) e com a Comunicao do Acidente de Trabalho emitida, independentemente da situao ocu-pacional em que se encontravam (empregados, afastados ou desempregados).Foram selecionados 44 pacientes com diagnstico cl-nico de LER/DORT em membros superiores, que aguar-davam atendimento fisioteraputico nestes servios, ca-racterizandoumaamostradeconvenincia.Destes,24 pacientes concordaram em participar do estudo e foram aleatoriamentedistribudosparaosdoistiposdeinter-veno: tratamento cinesioteraputico em grupo (n=12) e tratamento cinesioteraputico individual (n=12). Todos os pacientes assinaram um termo de consen-timento livre e esclarecido, conforme resoluo 196/96 do Conselho Nacional de Sade. O estudo foi aprovado pelo Comit de tica em Pesquisa do Hospital das Clni-cas, da Faculdade de Medicina da Universidade de So Paulo, e pelo Comit de tica em Pesquisa da Secretaria Municipal de Sade da Cidade de So Paulo.ProcedimentosOs procedimentos realizados nesta pes