Plataforma Internacional Do Anarquismo Revolucionario

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Livro de Bakunin sobre a plataforma internacional do anarquismo.

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    Fotos Capa: Funeral de Buenaventura Durruti. 22 de novembro de 1936, Barcelona, Espa-nha. Verso: Revolta, 1899. Quadro de Kthe Kollwitz.

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    Plataforma Internacional Do Anarquismo Revolucionrio

    1 de Maio de 2011

    Organizao Popular Anarquista Revolucionria e Unio Popular Anarquista

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    NDICE

    Apresentao 07

    Introduo 07

    1 - A luta terico-ideolgica: critica geral das concepes revolu-cionrias estatistas e do revisionismo no anarquismo

    11

    1.1 - Fundamentos histrico-universais do Bakuninismo 11

    1.2 - Posio dos anarquistas frente ao pensamento de Marx e Engels

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    1.3 - Diferenas e contradies entre a concepo Estatista e An-ti-estatista da Revoluo

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    1.4 - O revisionismo no Anarquismo 21

    2 - As grandes derrotas da revoluo social: Rssia, Espanha e A-mrica Latina

    25

    2.1 - Revoluo russa e a degenerao do marxismo 25

    2.2 - Guerra civil espanhola e a degenerao do anarco-sindicalismo e anarco-comunismo

    30

    2.3 - A crise do sindicalismo revolucionrio na Amrica Latina e as sucessivas capitulaes de anarco-comunistas, comunistas e nacionalistas

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    2.4 - Sobre o fracasso histrico do comunismo/social-democracia e do anarco-comunismo/anarco-sindicalismo e sua condio atual

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    3 - Teoria e Programa: os sujeitos revolucionrios e as tarefas do anarquismo no centro e na periferia

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    3.1 - A estrutura de classes e a diviso internacional do trabalho no Sculo XXI

    50

    3.2 - As contradies de classe e os sujeitos da revoluo 51

    4 - A Conjuntura: O Capital, O Estado e a Luta de Classes na atuali-dade

    56

    5 - luta de classes hoje: a criao de uma oposio autnoma no movimento de massas

    64

    5.1 - O problema das crises do capitalismo, da crise de organiza-o do proletariado e da linha de massas internacional

    70

    Programa Reivindicaes Econmicas Gerais (Rurais e Urbanas) 72

    Programa de Reivindicaes Econmicas Indiretas (Educao, Sa-de, Moradia e etc.)

    73

    Programa de Reivindicaes Polticas Gerais 73

    Programa de Reivindicaes Agrrias 74

    Programa de Reivindicaes Econmico-Polticas Anti-discriminatrias

    74

    Programa Ambiental 75

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    Apresentao

    Ao operariado, campesinato e trabalhadores do setor de servios

    Aos desempregados e trabalhadores informais

    Aos trabalhadores migrantes em todas as regies do mundo

    Aos povos indgenas, nacionalidades, etnias e minorias oprimidas

    Juventude e as mulheres trabalhadoras

    Introduo

    Em junho de 1926, a publicao na Frana de um documento intitulado A Plataforma de Organizao dos Comunistas Libertrios (assinado pelo grupo de exilados russos Dielo Trouda), causou um profundo impacto e mal estar entre anarco-comunistas, anarco-sindicalistas e individualistas, especialmen-te na Europa.

    Entre os que assinavam o documento estavam o campons Nestor Makh-no, principal liderana do Exrcito Insurgente da Ucrnia, e Piotr Archinov, um operrio e guerrilheiro, ambos veteranos da revoluo e da guerra civil russa (1917-1921). O documento convocava a reorganizao do anarquismo revolucionrio, a luta ideolgica contra o individualismo desorganizador e criao de uma organizao anarquista internacional.

    Errico Malatesta, um dos principais anarco-comunistas da poca, se pro-nunciou de maneira clara e categrica contra os pressupostos estabelecidos pela Plataforma: Ora, sendo a organizao proposta tipicamente autoritria, no s no facilitar a vitria do comunismo anarquista, como falsificar o esprito anarquista e resultar no contrrio do que esperam seus organizado-res. Vline, um anarco-comunista russo exilado na Frana escreveu o seguin-te: Concluindo, o nico ponto original na Plataforma seu revisionismo em direo ao Bolchevismo, escondido pelos autores...

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    A Plataforma de Organizao era um documento que apontava para trs tarefas fundamentais: o desenvolvimento de uma teoria anarquista co-mo base da organizao internacional; a maior preciso da estratgia e pro-grama globais para a revoluo socialista a partir da crtica da experincia da degenerao burocrtica da revoluo russa de 1917; a crtica da funo que os anarquistas tinham desempenhado no movimento de massas e a apresen-tao de uma linha revolucionria de ao.

    Essas tarefas colocadas pelos autores da Plataforma de Organizao no foram realizadas. E nisso reside em grande parte as razes do declnio histrico do anarquismo, que assim como Makhno e Archinov apontaram, continuaria sendo marginal em relao s lutas das massas camponesas e operrias caso no enfrentasse tais tarefas.

    A Plataforma tinha tambm os seus limites. A reao dos anarco-comunistas, individualistas e anarco-sindicalistas denunciava os Plataformis-tas como algo estranho ao anarquismo. Os plataformistas foram acusa-dos de desviarem-se do anarquismo, de trilharem uma perigosa fronteira com o bolchevismo e com as ideologias autoritrias.

    Mas na realidade, os Plataformistas, ao contrrio do que seus crticos a-firmavam, no estavam rompendo com o anarquismo em geral. E sim com o revisionismo (representado pelas auto-proclamadas correntes). Os plataformistas tambm achavam que estavam criando uma proposta nova. Na realidade, eles apenas estavam recuperando, de forma parcial, a concep-o bakuninista originria da Primeira Internacional que foi renegada pelo anarco-comunismo de Errico Malatesta e Piotr Kropotkin, pelo anarco-sindicalismo e seus tericos como Rudolf Rocker.

    A Plataforma de Organizao foi recusada por ela conter em seu interior um movimento em direo aquilo que os anarco-comunistas, individualistas e anarco-sindicalistas haviam negado: o bakuninismo. Mas a Plataforma ape-nas delineou as tarefas. Os seus autores no tiveram as condies histricas para realiz-las. Eles mostraram que seria preciso construir uma organizao anarquista internacional. Que esta deveria ter unidade terica, unidade tti-ca, responsabilidade coletiva e federalismo. Mas eles, por motivos de fora maior, deixaram esta tarefa incompleta.

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    A experincia anterior de crtica e os esforos hericos de indivduos e pe-quenos grupos que fizeram criticas parciais e reflexes que antecedem a anlise aqui apresentada devem ser reconhecidas. A crtica plataformista nos anos 1920 na Europa; as crticas de pequenos grupos de bakuninistas no Brasil e a defesa mesmo que confusa da Makhnovitischina no Brasil por Jos Oiticica; a critica e oposio do Grupo Antorcha a capitulao dos anarco-comunistas liderados por Santillan na Argentina. Tambm nos anos 1930 a critica a degenerao do anarco-sindicalismo e comunismo espanhol por Makhno e Jaime Balius e Los Amigos de Durruti. As crticas de Georges Fon-tenis nos anos 1950 e da FAU-histrica nos anos 1960 so fundamentais. Mas preciso tambm reconhecer que todas essas criticas foram incompletas e parciais. No conseguiram se consolidar, porque no caminharam em direo ao bakuninismo.

    Esse documento visa exatamente assumir responsabilidade de executar as tarefas delineadas pela Plataforma de Organizao e pelos demais camara-das. Continuar de onde pararam: avanar na nica direo possvel ao plata-formismo, o bakuninismo. Nesse sentido, ele tenta apresentar os traos es-truturais da teoria anarquista o bakuninismo e convocar a reconstruo da organizao internacional bakuninista e da organizao internacional dos trabalhadores. Essa tarefa hoje central.

    A degenerao das revolues socialistas e de libertao nacional, a inte-grao dos sindicatos de orientao social-democrata e anarco-sindicalistas dentro do sistema capitalista mostram que o proletariado tem sido levado a sucessivas e gravssimas derrotas histricas. A capitulao dos anarco-comunistas a anarco-sindicalistas tambm um trao importante dessa his-tria. Foi em grande parte o resultado dos erros de teoria, do empirismo e oportunismo que marcava a formao das organizaes polticas e as organi-zaes de luta dos trabalhadores.

    Pretendemos ento aqui convocar a construo de uma Rede Anarquista Internacional (RAI) e de uma Tendncia Classista-Internacionalista (TCI). Essas formas organizacionais visam dar incio ao processo de reconstruo da Aliana e da AIT. Mas para delinear de forma mais concreta as caractersticas dessa organizao poltica e de massas preciso antes de tudo uma apresen-tao do contedo do bakuninismo e uma profunda crtica da teoria que foi dirigente das lutas dos trabalhadores no ltimo sculo: o marxismo. E preciso

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    tambm uma crtica sria das experincias de luta dos trabalhadores e de como os desvios de teoria foram determinantes para as derrotas dos traba-lhadores.

    A plataforma de organizao do anarquismo revolucionrio aqui apresen-tada visa ento fixar as bases tericas e programticas de tal construo in-ternacional. A primeira parte do documento uma crtica terica e histrica das diferentes teorias e experincias de organizao e luta dos trabalhadores. A segunda parte uma aplicao da concepo bakuninista de teoria e revo-luo ao atual estgio de desenvolvimento capitalista. A partir disso, apre-sentamos uma proposta de organizao dos revolucionrios e dos trabalha-dores para a luta pelo socialismo.

    Os indivduos e grupos que quiserem discutir a adeso a esta Plataforma de construo de Sees da RAI e TCI em seus pases devem escrever para se engajar e desenvolver o dito processo: as orientaes adicionais e detalhadas sero repassadas pela Comisso de Construo.

    UNIPA Brasil

    OPAR Mxico

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    1 - A luta terico-ideolgica: critica geral das concepes revolucionrias estatistas e do revisionismo no anarquismo

    1.1 - Fundamentos histrico-universais do Bakuninismo

    Na segunda metade do sculo XIX o proletariado d origem primeira ex-presso orgnica de luta internacional por sua emancipao: a Associao Internacional dos Trabalhadores (AIT), fundada em 1864. Em seu seio se reu-niam diferentes correntes que tinham como fim a emancipao social do proletariado. neste contexto que surge nossa corrente, fundada pelo pen-samento e a prtica do revolucionrio russo Mikhail Bakunin.

    O pensamento de Bakunin marcado pelo mtodo materialista de anlise do mundo natural e social, capaz de produzir uma anlise crtica da sociedade e orientar uma prtica revolucionria. Tomando todos os fatores envolvidos na determinao da vida social com o fim de destruir integralmente a socie-dade burguesa e emancipar a humanidade inteira em um grande processo de transformao social, se constitui como uma das principais cosmovises filo-sficas de interpretao da realidade das que o proletariado se utilizou e utiliza em sua luta por libertao.

    O materialismo predominante no pensamento dos revolucionrios do s-culo XIX est em oposio direta ao idealismo da burguesia, continuando o antagonismo existente nas classes sociais engendradas pelo capital no terre-no da ideologia. Enquanto a burguesia busca disfarar sua dominao de classe mediante as idias religiosas, a metafsica e o pensamento idealista em geral, o proletariado, mediante seus intelectuais e pensadores revolucion-rios, proclama o mtodo materialista de anlise da realidade, considerando as relaes concretas, circunscritas a determinadas condies materiais de existncia no tempo e no espao. O proletrio proclama o fim dos sistemas absolutos e definitivamente moldados, em oposio, proclama um sistema dialtico que implica no conhecimento sistemtico do mundo natural e social na sua totalidade, perfectvel a cada momento, sempre sujeito a implacveis crticas e correes com base na experincia coletiva da humanidade.

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    O materialismo proletrio est em oposio concepo burguesa do di-reito do valor e lucro, considerando o dito direito como um argumento hip-crita dos capitalistas para explorar o trabalho das foras coletivas da humani-dade. Em oposio proclama que a nica fonte de valor o trabalho coletivo da humanidade; proclama a superioridade do trabalho coletivo sobre o indi-vidual; proclama sua oposio ao pagamento individual sob a forma capitalis-ta de salrio, que unicamente permite a reproduo da linhagem proletria para continuar com a explorao burguesa; proclama que unicamente sob a socializao dos meios de produo que os trabalhadores tero domnio sobre suas prprias atividades e tero acesso aos frutos de seu trabalho.

    O Proletariado toma como sua tarefa solucionar as contradies entre a produo coletiva das riquezas, bens sociais, e a explorao expressa ideal-mente no direito do lucro que fundamento e obra da sociedade capitalista, mediante um processo de Revoluo Social Integral, iniciando a ao de ex-termnio e abolio no s do direito de lucro e explorao, como tambm da prpria propriedade privada e do Estado, que se constituem nos fundamen-tos materiais da diviso de classes na sociedade.

    Herdado de gerao a gerao, o direito de explorar o trabalho da maioria trabalhadora por uma minoria opressora, se constitui como o fundamento ideolgico das sociedades de classe que justificam a existncia da proprieda-de privada e do Estado, base material da dominao da humanidade pela humanidade, estabelecendo com isto uma relao dialtica entre o domnio material e o direito ideal que engendra uma crescente misria e desigualdade para as amplas massas trabalhadoras.

    No seio do proletariado as diferentes correntes que confluem na defesa da emancipao humana como fim histrico e universal, no convergem quanto aos meios e os mtodos pelos quais o proletariado se emancipar. Enquanto as diferentes correntes cometeram o equvoco de extrapolar as tarefas histrico-universais da burguesia ao proletariado, Bakunin, continu-ando com as acertadas crticas de J.P. Proudhon ao estatismo, pontua que a tarefa histrica do proletariado no s no imitar a burguesia na tomada do Estado para o desenvolvimento do Socialismo, como demonstra que a condi-o essencial para que a humanidade se emancipe do governo do homem sobre o homem precisamente a abolio, a destruio revolucionria dos Estados e sua substituio por uma grande Confederao Universal de ho-

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    mens livres e associaes internacionais de trabalhadores que coordenem a produo.

    A principal contribuio terica e poltica do bakuninismo como fenmeno de organizao, foi a compreenso do lugar do estatismo na histria e a cen-tralidade do problema da explorao das foras coletivas pelo capitalismo na sociedade moderna. A raiz da concepo de Bakunin est na compreenso da inter-relao entre a evoluo do estatismo e a intensificao da subordi-nao das foras coletivas.

    A propriedade privada e o Estado so as bases sobre a qual se erguem s sociedades de classes, o proletariado, sendo a classe histrica chamada a sepultar a explorao, afirma que para transformar a sociedade, para avanar do reino da necessidade para o reino da liberdade equivocado valer-se de programas e criaes de outras transformaes sociais de grande escala e de outras tarefas histrico-universais.

    O conceito bakuninista de estatismo designa por sua vez um processo: o de extenso do Estado e formao de uma razo do Estado e de diversas doutrinas de sua legitimao (teoria do direito divino dos reis, contratualis-mo, nacionalismo). O conceito de estatismo supe uma anlise histrica em que o Estado Moderno antecede a formao do capitalismo, e a tomada des-te Estado pela burguesia consolida a transformao econmica capitalista da sociedade feudal. Por outro lado e dialeticamente este Estado Moderno sur-gido da Reforma Protestante, Estado emancipado da Igreja e que a subordi-nou, foi condicionado pelas mudanas econmicas e sociais, como as trans-formaes do feudalismo, expanso comercial, que antecederam a possibili-taram a reforma religiosa.

    Considerando a dialtica existente entre as relaes sociais concretas, o Estado, enquanto estrutura jurdico-poltica o produto de relaes desiguais entre as classes, e tambm produz e reproduz relaes sociais desiguais. As-sim, o Estado possui uma importante dinmica estruturante responsvel pela produo e reproduo de novas relaes de explorao e opresso.

    A dialtica entre centralizao/monoplio expresso e conseqncia do carter burgus do Estado Moderno, que no um mero fenmeno do de-senvolvimento da produo capitalista, se no que, se constitui numa condi-o intrnseca e, inclusive, em um agente poltico e econmico fundamental

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    para o surgimento, expanso e consolidao do capitalismo por todo mundo at os nossos dias.

    Transformado pelo carter burgus, o Estado capitalista, sua economia e o prprio sistema internacional de Estados, se desenvolve em uma implac-vel competio pela hegemonia, pela mesma supremacia que elevar sempre o Estado mais vasto ao controle de territrios, mares, ares, espao e povos. A centralizao de poderes no Estado levar tambm no sistema de Estados a uma centralizao de maiores poderes nos maiores Estados, que ento as-sumiro a forma de Imprios, conceito no qual descansa a verdadeira nature-za dos Estados que so potncias militares e geopolticas em determinado momento histrico. O Imprio um tipo particular de Estado que consegue a hegemonia de uma regio e que disputa a supremacia no sistema mundial. O desenvolvimento do estatismo sempre leva, no sistema internacional de es-tados e pela lgica da concorrncia e conquista que lhe inerente, a forma-o de um Imprio que detenha a supremacia sobre outros Imprios e Esta-dos rivais.

    Este o erro de extrapolar as tarefas histrico-universais de uma classe a outra precisamente quando a ltima tem como fim supremo a abolio das sociedades de classe. O Bakuninismo descobre e formula este princpio e o constitui como seu elemento componente, do que se desprendem os demais princpios e teorias relacionadas com a emancipao do proletariado e todo o que relativo a ttica e a poltica revolucionria.

    1.2 Posio dos anarquistas frente ao pensamento de Marx e En-gels

    O proletariado porta em seu seio, vrios pensadores que se constituem como suas fraes intelectuais. Independente da corrente poltica que de-fenderam, todo socialista revolucionrio honesto deve reconhecer aos auto-res suas contribuies ideolgicas ao proletariado, deve cerrar fileiras contra os ataques capitalistas a ditos pensadores e assumir a crtica-correo dos erros destes intelectuais como parte de nossas tarefas internas, como parte do movimento socialista do proletariado mundial, segundo nossos princpios cientficos e introduzindo as respectivas emendas.

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    Para os anarquistas revolucionrios, Carlos Marx e Frederico Engels pro-porcionaram ao proletariado 2 descobrimentos dignos de se reconhecer:

    a) O materialismo histrico, que permite a interpretao da histria como um processo dialtico de produo-reproduo da vida social com base na vida material, formado por uma recproca relao entre as manifestaes da vida intelectual, cultural e social e a vida econmica da sociedade humana.

    b) A teoria da mais-valia, que desvela e demonstra o processo de acumu-lao capitalista baseado na explorao e opresso das massas trabalhado-ras.

    Para os anarquistas, o materialismo um mtodo cientfico que pode ser aplicado para resolver as distintas tarefas que a revoluo exige. Todo prole-trio revolucionrio deve reconhecer o correto e o vigente do materialismo se considera desde suas importantes contribuies como mtodo cientfico para a observao, a anlise e a resoluo das tarefas das massas trabalhado-ras.

    Marx e Engels tiveram uma acertada aplicao do mtodo que eles mes-mos descobriram e formularam a respeito da anlise e interpretao que realizaram das lutas de classe do passado, a respeito da crtica revolucionria da sociedade capitalista e o apontamento da necessidade de sua destruio pelo proletariado revolucionrio. De maneira magistral ensinaram ao proleta-riado a forma correta de entender o passado e a realidade imediata, formu-lando pela primeira vez na histria uma teoria capaz de estabelecer uma realidade multiforme, com relaes de causalidade, criando assim as bases para uma acertada crtica-prtica, quer dizer, de uma militncia poltica con-creta das classes exploradas e oprimidas conscientes da necessidade de sua emancipao. Esta uma contribuio que ningum poder disputar com Marx e Engels e que os mantero vigentes at o triunfo total sobre a explora-o burguesa.

    No entanto, conceberam, desenvolveram e mantiveram muitos erros que custaram muitas derrotas ao proletariado ao longo do sculo XX, cujas con-seqncias sofremos ainda hoje. Se foram grandes pensadores que nos de-ram grandes lies na Histria e na Economia Poltica, tambm foram autores de pr-determinaes anti-dialticas do prprio mtodo que corretamente haviam formulado em relao interpretao do passado e do presente, apresentando condues mecnicas e unidimensionais para as novas tarefas

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    histrico universais das massas exploradas. Fundamentadas no campo da teoria em um erro de princpio da aplicao do Materialismo Histrico sobre as tarefas proletrias referentes ao que fazer no dia seguinte da derrocada da sociedade burguesa, quer dizer, sobre as tarefas da poca ps-revolucionria que se condensam na teoria da Ditadura do Proletariado, ttica mxima do marxismo revolucionrio.

    Cabe aqui apresentar a crtica s duas fontes de erro e degenerao teri-co-poltica do marxismo. A primeira delas reside num dos ncleos centrais do materialismo histrico, um erro de teoria. O segundo reside no centro do programa e estratgia, um erro de poltica. Ambos os erros explicam as derrotas e degeneraes dos marxistas.

    Na interpretao do materialismo histrico existe um componente fun-damental que a idia da determinao do econmico em ltima instn-cia. Esse conceito refletia uma subestimao terica tanto do papel do Esta-do quanto da prpria luta de classes, de maneira que o desenvolvimento das foras produtivas em termos abstratos era considerado assim como critrio fundamental. Esse primado do econmico como determinante em ultima instncia rapidamente se transformou em uma pr-determinao mecanicista dentro da social-democracia internacional.

    Ao mesmo tempo em que em teoria as foras produtivas eram considera-das como centrais, subestimando a ao das classes e do Estado, na poltica o Estado ocupava o lugar central. Exatamente porque em teoria o Estado era somente determinado pela economia (e no dialeticamente determi-nante dela), se considerava que o Estado era neutro e que o proletariado poderia apropriar-se dele enquanto um instrumento ( como se as tcnicas e ferramentas fossem neutras, e a burguesia e o proletariado pudessem usar quaisquer ferramentas) para fazer reformas progressivas e mesmo revolu-es.

    A teoria da Ditadura do Proletariado se constitui como uma extrapola-o anti-histrica e anti-dialtica do programa burgus da poca pr-capitalista ao programa proletrio da poca capitalista, como uma transposi-o das tarefas histricas da burguesia em sua luta por sua emancipao do feudalismo s tarefas histricas do proletariado em luta pela emancipao integral humana e sua prpria aniquilao como classe explorada. um con-

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    trabando ttico e estratgico de uma experincia coletiva de uma classe para a outra.

    Observando a luta da burguesia por implantar o sistema capitalista de produo, Marx deduziu com acerto as condies necessrias para implantar qualquer domnio de classe, o que se desenvolver ao grau de se conformar na teoria geral da Ditadura do Proletariado, ainda que depois se omitiu abordar o que este domnio implica para as classes no poder e se estas pode-riam se sustentar sem se corromper ou tergiversar. No seio mesmo da socie-dade feudal o capitalismo desenvolveu suas foras que culminaram com a supremacia da produo industrial sobre a agricultura feudal, as novas divi-ses do trabalho, a predominncia da cidade sobre o campo, e a superao de todas as formas de produo e reproduo da vida at ento conhecidas (a supremacia da produo sobre o consumo). Estas mudanas foram enten-didas e interpretadas em seu conjunto pelo mtodo do materialismo histri-co e dialtico, que impressionaram profundamente a Marx e Engels levando-os a extrapolar as tarefas histrico-universais que a classe burguesa havia realizado a classe que esta mesma havia engendrado e que estava chamado a sepultar: o proletariado; incorrendo assim, no erro de princpio que falva-mos mais acima.

    Marx extrapolou tais tarefas ao proletariado baseado em suas interpreta-es do curso das lutas burguesas e qual eram as condies necessrias a concretizar para estabelecer o domnio de classe; e este s pode se efetuar mediante a tomada do Estado (a nvel histrico) por uma classe, retendo o poder em suas mos e consolidando seu regime social, de cuja mxima e mais desenvolvida expresso temos, na classe burguesa, as repblicas demo-crticas inspiradas no modelo Francs, no qual, de acordo com Marx, deve se desenvolver a confrontao final e decisiva entre a burguesia e o proletaria-do.

    Alm disso, a Frana considerada por Marx como modelo de evoluo da burguesia representava mais uma exceo do que uma regra: na Inglaterra, na Alemanha e em outros pases, a burguesia fez uma srie de compromissos com o Ancient Regime, se incorporando nas ou incorporando as antigas oli-garquias como fraes de classe dentro do novo modo de produo que se expandia.

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    E esta tomada do Estado, esta conquista-reteno do Poder nas mos de uma classe (neste caso, do proletariado) este princpio assimilado como eixo terico orientador de todas as suas aplicaes gerais e particulares a todas e a cada uma das reas de luta do proletariado, levaram contradies de to grandes dimenses em seu seio que, levadas at suas ultimas conseqncias no campo terico e confrontadas com a experincia histrica (quer dizer, com sua comprovao experimental objetiva) dos ltimos sculos, no resta mais que as explicar e as descartar por conter em si, os germes de sua pr-pria aniquilao como mtodo terico-prtico em relao com a luta moder-na pela emancipao social humana que demanda (e demandou desde os tempos destes pensadores alemes) novas e inovadoras realizaes.

    Na realidade concreta, no campo da ao revolucionria, qualquer teoria conseqente leva em si implicaes poltico-prticas, implicaes que a teo-ria da Ditadura do Proletariado no deixou de ter e as quais nos opomos to firmemente no s por engendrar em seu seio o germe de sua prpria aniquilao como teoria com uma mnima consistncia interna, se no pelas conseqncia das suas polticas concretas e os resultados to pobres que nos levaram a respeito da emancipao humana, sendo seu contedo essencial, sua composio elementar, um aburguesamento da poltica-prtica do prole-tariado revolucionrio, o reforo do estatismo e o abandono voluntrio das inovaes prtico-experimentais das massas em ao. Se somos os primeiros a reconhecer as contribuies do pensamento marxista, somos tambm os primeiros a demonstrar os erros e iniciar as correes ante a necessidade histrica de seus formuladores. Opomo-nos ao aburguesamento do Materia-lismo Histrico que os mesmos Marx e Engels permitiram e sua converso em idealismo revestido.

    Assim, existem limites para apropriao do materialismo histrico de Marx e Engels e a necessidade de interpretar sua contribuio a partir dos parmetros crticos de teoria e poltica aqui estabelecidos. E a concepo bakuninista do materialismo tendo vrios pontos de concordncia com o materialismo histrico de Marx se diferencia deste ltimo em vrios aspectos importantes.

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    1.3 - Diferenas e contradies entre a concepo Estatista e Anti-estatista da Revoluo

    Entre a concepo estatista da Revoluo de Marx e Engels e a concepo anti-estatista de Bakunin, existe um antagonismo inconcilivel. Enquanto Marx e Engels toleraram e participaram do aburguesamento do Materialismo Histrico, Bakunin incorporou e reconheceu o mtodo materialista e sua concepo filosfica do mundo. Enquanto Marx e Engels interpretaram de modo equivocado as tarefas histrico-universais do proletariado com base na extrapolao da experincia coletiva da burguesia ao proletariado, reconhe-cendo a necessidade do desenvolvimento do capitalismo e adotando tal ne-cessidade como bandeira poltica, Bakunin fundou e desenvolveu uma teoria que fortaleceu e ampliou o campo de interpretao da histria e permitiu desenvolver amplamente a natureza das tarefas histrico-universais do pro-letariado em sua luta pela destruio das relaes de explorao, fundou e desenvolveu a teoria do estatismo.

    A partir da teoria do Estatismo no s possvel ampliar a interpretao da histria e esclarecer a relao existente entre o Capital e o Estado na o-presso e explorao das massas trabalhadoras na atualidade e na realidade imediata de uma situao histrica especfica, como, alm disso, resolver a questo relativa tarefa histrico-universal proletria, do que fazer no dia seguinte da derrocada da sociedade burguesa, quer dizer, diz respeito as tarefas da poca ps-revolucionria que se condensam na teoria da Aboli-o do Estado, ttica do proletariado anarquista.

    As contradies entre o pensamento de Bakunin e o de Marx e Engels ul-trapassa o campo da ttica e se eleva a concepes gerais sobre a Revoluo. Marx e Engels fundamentam suas concepes em uma interpretao parcial da Histria, realizada s com base na anlise do Capital, caindo em mecnico e parco determinismo econmico, desestimando o papel do Estado, reduzin-do esta maquinaria a um mero instrumento que bem pode servir a tanto a uma quanto a outra classe para cumprir suas tarefas histrico-universais. E uma interpretao desta natureza tem como resultado a concepo de que simplesmente necessrio valer-se do domnio de classe para atacar parci-almente, por graus e etapas a sociedade burguesa, a propriedade privada, a famlia e o Capital, deixando intacta precisamente a instituio histrica na

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    qual se fundamenta e produz-reproduz a explorao e a opresso das massas trabalhadoras, deixando intacto a Estado.

    A concepo estatista da revoluo, representada pela teoria geral da Revoluo Permanente defendida pelo marxismo revolucionrio como o programa histrico do proletariado, abre indefinies to nefastas como a quase teoria do perodo de transio que encobre o aburguesamento re-formista desta concepo, deixando para depois a resoluo da questo da explorao das massas, questo que deve resolver uma autntica Revoluo Social que se pretenda enquanto tal.

    Em contrapartida, Bakunin demonstrava desde os tempos da AIT esta con-tradio, apontando no s a ttica correta de abolir o Estado, como tam-bm elabora toda uma teoria geral sobre o carter integral da Revoluo Social. Esta teoria no s incorporar a necessidade colocada pelo marxismo de destruir o Capital, como tambm apontar que uma de suas condies e conseqncias precisamente destruir o Estado e no s esperar por sua extino, como tambm lutar de forma consciente por sua abolio.

    O prprio Bakunin teve oportunidade de presenciar uma capitulao tti-ca de Marx frente a um acontecimento gigantesco para a vida social, aonde no s se demonstrou a possibilidade de destruir o Estado Burgus, como tambm abolir gradualmente o Estado como instituio histrica da socieda-de de classes e substituir-la por organismo baseados nos princpios funda-mentais do pensamento de Bakunin, o Federalismo e o Socialismo, este acon-tecimento que entrou para a Histria como a grande Comuna de Paris de 1871.

    Contrariamente aos pressupostos da Revoluo Permanente, a Revoluo Integral considera como condio necessria para a destruio do capitalis-mo a destruio e abolio do Estado; que no outra coisa, se no, a des-centralizao gradual (gradual, em relao com o processo vivo mesmo e no com etapas metafisicamente definidas), a substituio dos Estados pela Con-federao Universal dos Trabalhadores Livremente Associados, com o pref-cio poltico-prtico da destruio violenta do Estado Burgus. De nenhuma maneira este princpio se contrape a necessria centralizao econmica que supe o socialismo.

    A abolio do Estado como primeiro passo efetivo na realizao do Socia-lismo, entendido como princpio ttico, explica da melhor forma questes to

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    importantes como a relao do proletariado com as classes, e o incio de um processo inteiramente novo na histria da humanidade na qual os proletrios revolucionrios de hoje pouco ou nada tem a imitar aos jacobinos de 1789. Temos de inventar e criar tudo.

    Esta concepo da revoluo s possvel por que Bakunin v que o m-todo materialista no pode ser rebaixado a uma interpretao unidimensio-nal da evoluo histrica, e que sendo o fator econmico o determinante, tal fator s poderia ser determinante de forma relativa, sendo em contrapartida um processo de movimento permanente: uma relao dialtica na qual a poltica tambm determinante em relao economia.

    Estas questes prticas compem a integralizao da revoluo, que parte de uma integralizao da dialtica dentro da estratgia poltica, que havia sido negada pelos erros de princpios de Marx e Engels, induzidos pelo esta-belecimento de um esquema unidimensional de evoluo em direo do desenvolvimento do capitalismo e a extrapolao das tarefas histrico-universais da burguesia ao proletariado.

    1.4 - O revisionismo no Anarquismo

    Uma vez consolidada a necessidade do Socialismo, seu carter cientfico e emancipador e suas primeiras tentativas prticas, a burguesia teve que reco-nhec-lo e empreender uma luta de contaminao ideolgica. O Anarquismo no foi uma exceo. Depois do retiro e morte de Bakunin, as derrotas do proletariado na Frana, Espanha, Itlia e Rssia produziram uma desorienta-o nos anarquistas revolucionrios da poca. Como conseqncia disto, muitos deles comearam um processo de reviso nas teorias de Bakunin que, junto com a deficiente difuso e sistematizao de seu pensamento, resultou no nascimento histrico do revisionismo, um desvio programtico genuina-mente burgus do Anarquismo Revolucionrio desenvolvido e defendido por Bakunin.

    O revisionismo o produto histrico da influncia ideolgica burguesa nas filas das correntes socialistas proletrias que se sobrepe aos indivduos e se constitui em uma verdadeira ofensiva burguesa em nossas prprias fileiras. O revisionismo adquire diversos aspectos e apresenta diferentes aparncias, no

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    entanto, no fim seu carter o mesmo. O revisionismo no um simples desacordo de opinies de autores clssicos, no um capricho dogmtico dos revolucionrios socialistas por um desacordo entre essa ou aquela opini-o, se trata de uma reviso, uma negao dos fundamentos histrico-universais do Socialismo, por tanto, uma luta do proletariado contra a bur-guesia em seu prprio terreno, a luta pela independncia ideolgica e poltica do proletariado em sua luta de classe contra a burguesia, uma luta necess-ria, permanente e implacvel.

    O revisionismo no Anarquismo Revolucionrio assume desde o incio um carter ecltico, isto , que busca conciliar fundamentos histrico universais, programa e tticas no s contraditrios, como tambm antagnicos, seme-ando a confuso e a desorganizao nas fileiras ideolgicas proletrias sendo esta caracterstica uma causa e conseqncia de sua incapacidade histrica para direcionar o proletariado em sua luta contra a explorao capitalista. Surge de um esforo para mesclar as idias de Bakunin e Marx justamente no plano em que elas so opostas, na concepo das tarefas histricas, no pro-grama, na ttica e na estratgia.

    Estes posicionamentos so os embries das formas do que se conhece como anarco-sindicalismo e anarco-comunismo que se desenvolveram nos primrdios do sculo XX. Estas posies revisionistas constituram, de maneira mal feita na maioria das vezes, novas teorias, hbridas por definio, que so a sustentao ideolgica de uma srie de prticas amorfas e carentes de perspectiva revolucionria.

    Por um lado, o anarco-comunismo, tendncia ecltica de carter pe-queno-burguesa, ir negar exatamente as contribuies do pensamento mar-xista: O Materialismo Histrico e a crtica da economia burguesa. O principal exemplo se encontra no pensamento de Enrique Malatesta, quem no s deprecia a luta de classes no terreno da ideologia, como tambm, como um bom pensador pequeno-burgus, acredita que os pensamentos se encontram acima da luta de classes e que se podem juntar quaisquer pensamentos to antagnicos graas a obra da vontade. Foi por isso que ele rompe com o bakuninismo em nome de uma conciliao do anarquismo com o comu-nismo.

    A ruptura fundamental estabelecida entre o revisionismo anarco-comunista e o Anarquismo Revolucionrio no campo da teoria tem sua m-

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    xima expresso no critrio que o primeiro tem para analisar a histria e a sociedade que no o trabalho como base do socialismo, que a forma ma-terialista de abordar a questo, e sim no critrio que no s abandona esta base programtica como tambm a sepulta magistralmente com sua frmula pequeno-burguesa a cada um de acordo com as suas necessidades.

    Este desvio programtico implica em uma renuncia tcita, semi-consciente, da contradio entre as classes. A supremacia da necessidade a afirmao da supremacia do individuo contra a supremacia das foras coleti-vas do trabalho, que implica uma falsa contradio de natureza anti-dialtica que supe a oposio individuo/sociedade dando origem a uma falsa hostili-dade, em vez de resolver a contradio pela via socialista em que a existncia de um supe a relao e influncia do outro e vice-versa.

    Na prtica este desdm se expressa na negao de uma organizao pol-tica de revolucionrios anarquistas, e organismos sociais baseados na des-centralizao poltica e o federalismo, baseados em uma centralizao eco-nmica socialista, organizada civilmente em relao as direitos gerados pelo trabalho, criando um vazio programtico e organizacional que se manifestar nas grandes derrotas histricas onde os revisionistas pseudo-anarquistas tomaram parte ativa.

    Outra manifestao do revisionismo pequeno-burgus pseudo-anarquista se expressa no fenmeno conhecido como individualismo, que supe a falsa contradio hostil entre qualquer organizao e o indivduo, pondo a liberdade abstrata deste em contradio com os interesses daquele, supri-mindo a luta de classes e a dialtica sob o amparo do individualismo idealista burgus, que teve grandes partidrios contraditrios nas expresses pseudo-anarquistas conhecidas como sntese, gerou fenmenos como a propaganda pelo fato dos finais do sculo XIX, e que pretendia conciliar ecleticamente as contradies derivadas do idealismo abstrato em prticas concretas que de-rivaram na negao de toda responsabilidade poltica sria. Hoje em dia pa-rece haver um ressurgimento destas prticas na chamada informalidade violenta e emancipadora.

    Uma corrente que se coloca acima das anteriores, o revisionismo anar-co-sindicalista, cuja mxima expresso foi a Confederao Nacional do Tra-balho (CNT) espanhola, fundada em 1910. Esta corrente superior as acima mencionadas em relao com a essncia de sua natureza, que seu incio e

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    fim, e os aspectos positivos que dela derivam. Para a luta prtica, o revisio-nismo anarco-sindicalista deu grandes lies de lutas de massas, nas quais a atividade de massas se colocava no centro das lutas, ao menos, nas tarefas do perodo anterior a Revoluo, isto , nas lutas reivindicativas dirigida por esta corrente contra o Capital e o Estado burgueses. As lies derivadas des-tas experincias constituem sem dvida grandes lies para as prximas lutas do proletariado, pois ensinaram de boa maneira formas concretas de abordar a lutas econmicas sob a atividade orientada pelas tendncias revolucion-rias desta corrente. No entanto, este economicismo revisionista levou a liquidao total ou menosprezo da organizao poltica revolucionria levan-do esta negao a tal ponto, que chegada a hora suprema de direcionar a revoluo, entregou com todas as honras o poder a pequena-burguesia le-vando as massas, no caso espanhol, a uma grande derrota do proletariado digna de maior ateno.

    A caracterstica principal desta corrente liquidacionista est em no se li-vrar da influncia burguesa e fazer abstrao da dialtica entre a luta econ-mica e a luta poltica do proletariado, pondo a primeira por cima da segunda, caindo em uma reduo economicista da luta de classes. As conseqncias tticas desta concepo se expressam na consigna da Greve Geral revolu-cionria que se supe que derrocar por si s o Capital, e sua poltica ps-revolucionria da supremacia dos sindicatos para a edificao do socialismo.

    por isso que no possvel abdicar da luta ideolgica e terica. Nem tentar promover conciliaes eclticas superficiais. A anlise das experincias revolucionrias e da luta de classes demonstrar como esses dois comporta-mentos produziram sucessivas derrotas e conduziram a capitulaes dos trabalhadores.

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    2 - As grandes derrotas da revoluo social: Rssia, Espanha e Amrica Latina

    A crtica dos diferentes projetos, revolucionrios e reformistas, no pode ser seno a crtica da experincia das lutas dos trabalhadores nos ltimos anos. As diferentes correntes tericas analisadas acima estiveram presentes nas principais experincias de luta dos trabalhadores na primeira metade do sculo XX. Todas elas levaram derrotas do processo revolucionrio. Isso em razo das suas debilidades tericas e ideolgicas e do carter ecltico dos seus objetivos programticos e da natureza de classe das suas alianas. Alm de erros tticos na conduo do processo de luta.

    Para reconstruir o sindicalismo e o movimento revolucionrio bakuninista internacional preciso ento uma crtica severa dessas correntes. E isso o balano do seu papel na histria. Nesse sentido, devemos analisar os acon-tecimentos chave do sculo XX. A revoluo russa e a guerra civil espanhola, na Europa, e o processo de emergncia dos governos Ditatoriais-Militares na Amrica Latina nos anos 1930-80 explicitam as contradies e crise do movi-mento socialista internacional.

    2.1 - A revoluo russa e a degenerao do marxismo

    A revoluo russa mostra a degenerao do marxismo. Mas tambm de-nuncia pelo carter marginal ocupado pelo anarco-comunismo, suas contra-dies. Somente na Ucrnia, num dos pases subordinados pelo Imprio Rus-so, um movimento de massas significativo se desenvolveu, e graas ruptura com os postulados do anarco-comunismo e do anarco-sindicalismo.

    A composio do movimento de massas na Rssia se dava da seguinte maneira. Existiam duas grandes organizaes partidrias, o Partido Operrio Social-Democrata (filiado a II Internacional) e o Partido Socialista Revolucio-nrio. Os grupos anarco-comunistas eram representados por inmeros pe-quenos grupos locais. Todos os grupos eram subdivididos em correntes de

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    direita e esquerda (melhor exemplificada pela histrica diviso entre bolche-viques e mencheviques), mas os SR e anarquistas tambm.

    Podemos dizer que o processo revolucionrio russo se desenrolou em torno de duas questes fundamentais: a posio frente derrubada da mo-narquia e a posio ante a Primeira Guerra mundial imperialista. Na dinmica da revoluo russa podemos encontrar a experincia de aplicao da teoria da revoluo permanente ou etapista do marxismo. E como ela foi sucessi-vamente mostrando suas contradies e permitindo a integrao sistmica do marxismo. Isso fica explicito pelo desenrolar da prpria luta revoluciona-ria. O setor marxista que conseguiu se tornar dirigente da revoluo foi exa-tamente o setor que rompeu com a Internacional Social-Democrata em razo da sua posio diante da Guerra.

    Lnin nos textos O Oportunismo e a Falncia da Segunda Internacional (1916) e Teses de Abril (1917) deixa claro como o marxismo do perodo anterior havia degenerado. Ao mesmo tempo explicita como o marxismo desenvolvido pelos bolcheviques na situao pr-revolucionria possibilitou que depois da revoluo de 1917 ele fosse levado a cumprir um papel contra-revolucionrio.

    Em primeiro lugar, importante notar que o texto est marcando a ciso dos Bolcheviques com II Internacional, com o Partido de Marx (o KPD). O motivo foi a capitulao da II Internacional diante da poltica nacionalista e seu apoio a guerra imperialista. Os oportunistas, dizia, negavam a oposio a Guerra diante da guerra. Quer dizer, a II Internacional possua uma carac-terizao terica correta, mas na hora da deciso esqueceu sua teoria por falta de ideologia revolucionria, vontade poltica. O carter relativamente pacifico do perodo de 1871 a 1914 alimentou o oportunismo primeiro co-mo estado de esprito, depois como tendncia e finalmente como grupo ou camada da burocracia operria e dos companheiros de jornada pequeno-burgueses.

    O oportunismo tenderia no plano poltico a se reduzir ao legalismo e par-lamentarismo e no plano de massas ao economicismo mais estreito e nacio-nalista.

    Se no cenrio Internacional, os Partidos Social-democratas j manifesta-vam sua capitulao, no contexto russo tal fato se daria em 1917. As teses de Abril de Lnin so escritas em 1917 depois da revoluo de fevereiro. Nesse

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    contexto, as duas alas da Social-Democracia russa, Mencheviques e Bol-cheviques, comeavam a confluir para o apoio a uma forma de revolu-o democrtico-burguesa. Lnin ao contrrio, retorna a Rssia defenden-do uma outra linha programtica. Seria necessrio passar das tarefas democrticas (derrubada da monarquia) as tarefas socialistas. Ele afirma que o intervalo de tempo entre uma etapa e outra curto e no indefinido. Passa a defender a Supresso do Exrcito, da Policia e da Burocracia, a Equi-valncia dos salrios em um Estado Tipo-Comuna. As propostas de Lnin so acusadas pelos prprios bolcheviques de bakuninismo. Lnin percebe que seria preciso romper com os pressupostos do prprio marxismo interna-cional e do prprio bolchevismo: apresentar um novo programa e uma nova interpretao das etapas da revoluo permanente.

    Mas seria no Estado e a Revoluo que ele afirmaria que passada a rpi-da etapa da revoluo democrtico-burguesa a revoluo socialista, se inau-guraria uma etapa histrica de longa durao e transio do socialismo ao comunismo. Assim, Lnin rompe com II Internacional ao aceitar As tticas de luta clandestina e negar a reduo parlamentarista e nacionalista, mas no rompe com a teoria da revoluo permanente e transposio das tarefas histrico-universais da burguesia ao proletariado.

    E nessa defesa do papel legitimo do Estado na revoluo e da longa dura-o da transio entre as etapas (assim como havia acontecido com a II In-ternacional) d margem para a formao de um novo tipo de oportunismo, que vai gerar uma nova classe dominante dentro do Estado revolucionrio. Mas a especificidade da perspectiva de Lnin que isso essa degenerao s poderia se manifestar na situao ps-revolucionria, porque ele modificou substancialmente a teoria marxista da revoluo permanente.

    Mas processo de degenerao da revoluo e do bolchevismo abordado por Trotski ao longo dos anos 1920 e 1930. E ele j consegue identificar que o bolchevismo estava se transformando na teoria do socialismo num s pas, em que mais uma vez o Estado, o nacionalismo e a acomodao ao capitalis-mo estavam predominando dentro do marxismo.

    Trotski dirige sua critica direo do PCUS, que ele denomina de ve-lhos bolcheviques (Stlin, Bukharin, Zinoniev e Kamenev). O debate se d em torno de duas teorias: a teoria da revoluo permanente e depois teoria do socialismo num s pas. Em primeiro lugar, Trotski desmascara o mito

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    revolucionrio do bolchevismo ao mostrar a contradio entre a urea de revolucionrios dos chamados velhos bolcheviques e sua atuao no mo-mento decisivo, o ano de 1917. Neste perodo os velhos bolcheviques tive-ram um posicionamento democrtico-burgus idntico aos mencheviques (ou seja, postulavam apenas uma revoluo democrtica, que substitusse a monarquia pela democracia, e no a revoluo socialista). Somente com o retorno de Lnin que o Partido Bolchevique d uma guinada esquerda. Trotski indica que nenhum dos velhos Bolcheviques foi capaz de no momen-to histrico mais grave e mais cheio de responsabilidades, nenhum deles foi capaz de utilizar, por si, toda a experincia terica e prtica do Partido.

    Ou seja, o oportunismo que Lnin havia denunciado como estado de esp-rito, tendncia e camada dirigente da burocracia operria, que teria tomado a Direo Poltica da II Internacional se desenvolveu tambm no interior do partido bolchevique, fazendo este pender para a uma via de revoluo de-mocrtico-burguesa. A vitria da linha de Lnin e Trotski em Outubro foi o resultado da aliana da linha revolucionria minoritria na Direo do Partido com as bases populares neste momento mais avanadas (j que, por exem-plo, a insurreio s foi aprovada numa reunio ampliada do CC dos Bolche-viques com participao das bases operrias, e ainda, tendo de ser submetida a duas votaes, pois os dirigentes do partido votaram contra a mesma). Trotski indica que nas concepes teorias e no estado de esprito do marxismo vulgar, predominante na II Internacional (inclusive na Rssia), existia um lapso histrico enorme, de dcadas, entre o estgio Democrtico (ou seja,m entre a revoluo democrtico burguesa) e o estgio Socia-lista. Esta concepo predominava no somente entre os mencheviques, mas tambm na maioria dos dirigentes bolcheviques. Os problemas da revoluo socialista ainda eram o preldio obscuro de um futuro ainda lon-gnquo.

    Assim, a histria do marxismo no sculo XX foi a da ruptura com a buro-cratizao da Internacional Social-democrata e seu ressurgimento dentro da III Internacional e de todas as variantes do marxismo que partiam da sua base terica (o maosmo, o grasmcianismo) e mesmo o trotskismo, que no rompe com o etapismo da teoria da revoluo permanente. Assim, esse dilema do marxismo se manifestaria numa eterna oscilao entre as polticas de direita (parlamentarismo, legalismo com diferentes expresses histricas, como o bernsteinanismo, o stalinismo), de esquerda (o maosmo, o trotskismo) e

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    ultra-esquerda (conselhismo, e foquismo). Essas variantes ao mesmo tempo permitiram uma freqente integrao do marxismo ao sistema capitalista e a renovao do seu flego nas lutas de libertao nacional e de massas. Quan-do o marxismo conseguia cumprir um papel importante e revolucionrio na situao pr-revolucionria, na situao ps-revolucionria ele estava fadado a burocratizao e contra-revoluo.

    No possvel falar da Revoluo Russa sem falar da revoluo na Ucr-nia. Se o marxismo revolucionrio em 1917 se desenvolve pela ruptura com as bases da Social-democracia Internacional que predominavam na Rssia, o anarquismo revolucionrio se desenvolve pela negao das bases tericas do anarco-comunismo internacional representado na Rssia pelo individualismo literrio e conservador de Tolstoi e pelo educacionismo de Kropotkin. Tal debate expresso por Makhno em seu dirio que sustentava que Devemos, sem tardana, comear a organizar uma Unio dos Camponeses de nosso grupo. Este fato apresenta duplo interesse: impediremos, por a, que o ele-mento hostil a nosso ideal poltico se estabelea (...) O camarada Kalinit-chenko condenou severamente meu ponto de vista, pretendendo que nosso papel de anarquistas, no decorrer da revoluo atual, deveria limitar-se a divulgar nossas idias...

    A histria da revoluo na Ucrnia e condicionada pela confrontao en-tre trs foras. Trs foras polticas importantes, muito diferentes, estavam em ao na Ucrnia: 1) Petliurovstchina movimento nacionalista, de nome oficial Rada, composto pela burguesia nacional e que conseguiu uma adeso de segmentos das fraes trabalhadoras; 2) Bolchevismo o Partido/Estado; 3) Makhnovtchina movimento de massas, de base camponesa e orientao anarquista. Deu-se ento um longo processo de guerra civil cheio de avanos e recuos, sendo que a fora revolucionria anarquista conseguiu avanar na libertao de territrios. A derrota da revoluo na Ucrnia se dar pela combinao de diversos fatores. Mas como o prprio Makhno em seus Di-rios e Archinov em seu livro A Insurreio dos Camponeses da Ucrnia, o fator militar e da represso foi apenas um. Outro fator importantssimo foi a debilidade organizativa, terica e programtica do prprio movimento. Con-seguindo cumprir um papel importante ente 1918-1920, a insurreio cam-ponesa da Ucrnia serviria como base histrica das formulaes da Platafor-ma de Organizao em 1926. E a derrota da revoluo russa tambm

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    explicada pela incapacidade do anarco-comunismo e anarco-sindicalismo se apresentarem como alternativas revolucionrias.

    2.2 - A guerra civil espanhola e a degenerao do anarco-sindicalismo e anarco-comunismo

    O anarco-sindicalismo um fenmeno do sculo XX e ele parte do de-senvolvimento das grandes centrais sindicais. A criao da CNT em 1910 to-mando por base a CGT francesa inaugura assim um processo de luta na Espa-nha que menos de trs dcadas depois resultaria na guerra civil. O anarco-comunismo vai se desenvolver em parte dentro e em parte a margem e/ou contra o anarco-sindicalismo. O processo de luta de classes na Espanha, as-sim como na Rssia, se desenvolveu tendo por base tambm a luta contra a monarquia, basicamente at 1923 e deste ano at 1930 contra a Ditadura, comandada pelo General Primo Rivera. Ele ento derrubado e proclama-da a Repblica com a convocao de eleies. At 1933 o Governo ser composto pelos partidos republicanos de esquerda e socialistas, quando a direita comea a avanar. Em fevereiro de 1936 so convocadas eleies num contexto de guerra civil velada, com terrorismo de direita e movimento ope-rrio em armas.

    nesse momento que as contradies do anarco-comunismo e anarco-sindicalismo espanhol, expressos ambos dentro da CNT-FAI iro se demons-trar de forma gritante. Se no caso do marxismo revolucionrio as contradi-es s apareceram de forma mais clara na situao ps-revolucionria, no caso do anarco-comunismo e anarco-sindicalismo (assim como da social-democracia) elas apareceriam pela sua capitulao na situao pr-revolucionria. O trecho abaixo, de uma resoluo de plenria da CNT/FAI ilustra bem essas contradies tericas e seus efeitos prticos, do Informe del Comit Peninsular de la Federacin Anarquista Ibrica al Movimiento Libertario Internacional (septiembre 1937), firmado por Santilln, Ger-minal De Souza, Pedro Herrera y Federica Montseny: ramos efeti-vamente os donos da situao. Mas imediatamente, nos formulamos as se-guintes perguntas: o fascismo no est abatido ainda em toda a Espa-nha. Fora da Catalua no somos a fora predominante. Devemos compartilhar as responsabilidades e os direitos com as foras anti-

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    fascistas () no h que proclamar o comunismo libertrio. Procurar man-ter a hegemonia nos comits de milcias antifascistas e afastar toda realiza-o totalitria de nossas idias.

    A estratgia stalinista da III Internacional representava a aplicao da teoria da revoluo permanente j sob a tica da nova classe dominante rus-sa, a nomenklatura. Dessa tica, as revolues deveriam se subordinar as etapas democrtico-burguesas como parte da poltica internacional da URSS, ou seja, no deveriam extrapolar a construo de repblicas burguesas. Essa linha foi aplicada na Espanha ao colocar a tarefa da luta anti-fascista (que era uma apenas adequao da prioridade da luta anti-monrquica ao novo con-texto). O centro dessa etapa seria a aliana com a burguesia democrtica. Na Frente Popular deveriam estar o movimento operrio e a burguesia nacional, que fariam uma aliana contra Franco. Assim, apesar do dog-matismo anti-marxista, o anarco-sindicalismo e anarco-comunismo espa-nhol se integraram na poltica derivada da teoria marxista da revoluo permanente e objetivamente nas estruturas do Estado burgus.

    Esse processo derivava fundamentalmente das deficincias tericas e i-deolgicas do movimento, que foram percebidas e combatidas mesmo que tardiamente pela agrupao oposicionista da CNT-FAI Los Amigos de Durruti. Tal oposio denuncia a capitulao da direo da CNT-FAI e a degene-rao dessas organizaes, materializadas no fenmeno do ministerialis-mo. Los Amigos de Durruti atravs do jornal Amigo do Povo fizeram a opo-sio a esse processo o que verdadeiramente contribuiu, quer dizer, decidiu sensivelmente a perda de uma revoluo que somente podia escapar das mos de uns incapazes, a falta de uma diretriz que houvesse marcado de uma maneira inconfundvel o caminho a seguir. (...) As revolues sem uma teoria no seguem adiante. A total ausncia de uma teorizao sria nos anos que antecederam a guerra civil espanhola, especialmente nos anos 1920, no era um problema exclusivo do anarco-sindicalismo espanhol. Ele era um trao estrutural do anarco-comunismo e anarco-sindicalismo in-ternacional, que ficou claramente manifesto na reao contrria ao pla-taformismo liderado por Makhno e Archinov.

    As contradies derivadas do ecletismo terico no se manifestaram ape-nas durante a Guerra Civil Espanhola, mas ao longo de toda a dcada de 1920 e incio de 1930. A adeso a apoltica de frente popular for-mulada pela URSS, j tinha sido ensaiada antes, com a adeso acrtica

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    das centrais anarco-sindicalista a Internacional Sindical Vermelha dirigida pelo Partido Comunista da URSS na dcada de 1920. Na prtica isso levou a toda uma poltica de colaborao de classe, que fez que figuras como Frederica Montseny, Diego Abad Santillan, Garcia Oliver e outros, fos-sem integrados na estrutura de Governo Espanhol, primeiro por meio do Comit de Milcias Anti-Fascistas, e depois como ministros de diversos conse-lhos de estado. O ministerialismo foi a forma histrica concreta mais avan-ada e grave de degenerao do anarco (comunismo e sindicalismo).

    Essa capitulao ante o capitalismo seria assumida abertamente por San-tilln no final de sua vida. Em e estratgia e tctica. Ontem, hoje, ama-nh, Santilln apresenta as linhas finais da evoluo de seu pen-samento e de sua poltica: "Primeiro: [...] o capitalismo no mais uma mas-sa uniforme e petrificada, um conjunto de atitude e de categorias que no se mostra sempre solidria nem sequer frente aos adversrios comuns; Existe um capitalismo que poderamos qualificar de compreensivo e progressista, que observa a evoluo obrigada da economia atual; [...] Segundo: A grande revoluo de hoje a reforma; a barricada j cumpriu sua misso, se que teve uma misso, e nas condies atuais muito mais um caminho para a contra-revoluo do que para a realizao de um progresso efetivo e de uma autentica libertao; A propagam e recorrem a ela precisamente os que no aspiram a liberdade nem a democracia, seno a instaurao de novos despo-tismos. Terceiro: Resumindo, achamos que hoje importa muita mais a luta contra o totalitarismo estatal que contra o sistema capitalista que j mostra fissuras suficientes para que o esprito de iniciativa e desejo criador podem praticar formas de vida econmica no-capitalista". Essas posies mostram claramente a evoluo e degenerao final da concepo revisionista, eclti-ca e sintetista: Santilln elabora de forma clara e aberta aquilo que a experi-ncia histrica dos anos 1920/30 tinha praticado sob forma envergonhada: a possibilidade de coexistir e aceitar o capitalismo, e praticar o socialismo li-bertrio como experincias marginais dentro do sistema.

    Essa contradio j havia sido analisada por Nestor Makhno, anos an-tes da Guerra Civil, que advertira da presena de elementos ideolgicos burgueses e contra-revolucionrios no anarquismo espanhol. Na sua car-ta aos anarquistas espanhis durante a crise de 1931, ele advertia: "Queri-dos companheiros Carb e Pestaa: Transmita a nossos amigos e companhei-ros espanhis e, atravs deles, a todos os trabalhadores, (...) O proletariado

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    espanhol (operrios, camponeses e trabalhadores intelectuais) deve unir-se e impor a maior energia revolucionria para dar lugar a uma situao em que a burguesia no tenha oportunidade para opor-se a conquista da terra, das fbricas e das liberdades completas; situao que cada vez seria mais ampla e irreversvel (...) Ao meu ver, a federao anarquista e a Confederao Na-cional do Trabalho devem considerar essa questo seriamente. (...) Do mesmo modo, no devem temer em assumir em suas mos a direo estratgica, organizativa e terica do movimento popular. Obviamente devem evitar unir-se com o partidos polticos em geral e com os bolcheviques em particular, j que imagino que os bolcheviques espanhis sero bons imitadores dos seus colegas russos. Seguiro os passos do jesuta Lnin ou inclusive os de Stalin, (...) o silenciamento de todas as tendncias revolucionrias e o fim da inde-pendncia das organizaes dos trabalhadores".

    Na realidade podemos resumir essa concepo do reformismo li-bertrio (ou seja, um reformismo de base anarco-comunista anarco-sindicalista) em alguns traos fundamentais: A) A concepo terica e de revoluo: a idia de revoluo nunca associada guerra revolucion-ria, ao contrrio, essa negada. A revoluo vista como uma transforma-o moral; B) Estratgia poltica economicista e cooperativista: retoman-do elementos da antiga social-democracia e anunciando os elementos da concepo ps-moderna de revoluo pacfica dentro do capitalismo, vislumbra-se a idia de formao de cooperativas de trabalhadores que teriam o papel de educao e gesto compartilhada das instituies capitalistas, criando comunidades supostamente auto-isoladas dentro do capitalismo e que seriam a expresso de organismos libertrios; C) Identi-ficao com o liberalismo: A critica do Estado reduzida critica do excesso de governo e de fiscalizao das atividades e iniciativas individuais.

    Em seu texto, A Histria da Revoluo espanhola, o papel jogado pe-los socialistas de direita, esquerda e pelos anarquistas Maknho aprofunda ainda mais suas criticas: O que impediu que os anarquistas convertesem suas convices em prtica, transformassem uma revoluo democrtico-burguesa em revoluo social? Primeiro, a ausncia de um programa especfico e detalhado impediu a unidade na ao, a unidade que determina a propagao do movimento (...) Em segundo lugar, os nossos camaradas espanhis, como muitos outros camaradas de vrias localidades viam o anarquismo como uma igreja itinerante da liberdade. (...) Isso nesta ocasio,

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    ao invs de realizar a tarefa histrica de desenvolver o anarquismo em tempos de revoluo. Com todo o prestgio de que gozam aos olhos dos trabalhadores no pas, os comunistas-libertrios espanhis e anarco-sindicalistas falham ao no inclinar a cabea das massas para a revoluo, e titubeiam entre a Revoluo e concepo pequeno-burguesa da mesma."

    Makhno previu os grandes desvios e limitaes, tericas e organiza-cionais, do anarquismo espanhol. Makhno, que havia sido chamado de bol-chevique, advertia sobre o perigo incutido nas alianas com o partido comu-nista e com o partido socialista. Esta seria realizada na poltica da frente po-pular na qual a CNT/FAI foi incorporada anos depois. A derrota do sindicalis-mo revolucionrio do perodo entre guerras (1914-1945) permitiu o fortale-cimento da poltica de direita do marxismo, consubstanciada no modelo da Frente Popular, que foi adotado e exportado para diversos lugares e contex-tos, especialmente para a periferia do capitalismo, em continentes como a Amrica Latina, e permitiu que a fraqueza e a deteriorao do anarco-sindicalismo e das correntes revolucionrias do marxismo. A derrota do pro-letariado espanhol como Makhno advertiu, se constituiu em uma derrota do setor revolucionrio em escala mundial, que seria difcil de superar. Assim, sua crtica importante. Ao mesmo tempo, a luta de classes na periferia capi-talista, particularmente na Amrica Latina, demonstraria as limitaes de tais correntes. Agora discutiremos estes acontecimentos:

    2.3 - A crise do sindicalismo revolucionrio na Amrica Latina e as sucessivas capitulaes de anarco-comunistas, comunistas e na-cionalistas

    A histria do movimento operrio e socialista na Amrica Latina tam-bm complexa. E ela representativa da historia das correntes socialistas nas periferias do capitalismo. Alguns fatores foram fundamentais nessa histria: a) o primeiro entre 1870 e 1890 aquele contexto da represso contra a AIT do perodo ps-Comuna de Paris, em que os socialistas internaciona-listas tinham um espectro ecltico, derivados do processo de reviso e negao do bakuninismo e influenciado pela emergncia do terrorismo indi-vidual e individualismo pequeno-burgus, que chegar Amrica Latina e influenciar o proletariado e suas primeiras formas de organizao; b) o

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    segundo se desenvolve entre 1890/1930, em que temos como marco a revoluo Russa. Nesse perodo comeam a ser formados os Partidos Co-munistas alinhados a III Internacional; um terceiro contexto formado pela emergncia do nacionalismo estatista burgus depois da crise 1929 e que evoluir de diferentes formas at 1980; c) o terceiro comea na dcada de 1980 e se estende at os dias de hoje pela confluncia de vrios elementos oriundos desses processos anteriores.

    Podemos dizer que no primeiro contexto a busca pelos pases da Amrica Latina pelos internacionalistas remanescentes da AIT, era influ-enciada em grande parte pela concepo de Bakunin de que a revolu-o se daria nos pases da periferia, partindo da para o centro. Nesse primeiro movimento, chegam militantes, inclusive o prprio Malatesta, que atuaro em pases como Argentina e Uruguai, criando organizaes sindicais similares aos parmetros da tidos Socialistas inspiradas pelo mar-xismo seria incipiente, exatamente porque a orientao da II Internacional Social-democrata priorizava os pases industrializados do centro do capita-lismo. Nessa primeira etapa da formao do movimento operrio na Amrica Latina, os elementos do sindicalismo revolucionrio chegariam de forma difusa e em diferentes graus em toda Amrica Latina, espe-cialmente em pases como Brasil, Argentina e Mxico que so em-blemticos da evoluo posterior.

    Mas ser no segundo perodo, entre 1890 e 1930 que se daro os acontecimentos mais importantes. A debilidade da presena do marxismo ser superada, j que pela linha da III Internacional seria necessrio atuar nos pases atrasados do capitalismo. E as burguesias e os Esta-dos iro desenvolver instrumentos de represso, controle e cooptao dos trabalhadores. At a crise de 1929, o sindicalismo revolucionrio era uma fora importante e algumas variantes como anarco-sindicalismo na Argentina, chegaram a ter uma presena destacada na direo do movimento operrio e campons. A experincia da revoluo mexicana (1910-1917) demonstrou ao mesmo tempo toda a potencialidade do movi-mento operrio, popular e campons que levaram a medidas igualitrias importantes, sendo o principal legado delas a Reforma Agrria. Por outro lado, deixaram evidentes fortes debilidades, que levou a sua derrota ainda durante a revoluo. Alm disso, o processo revolucionrio mexicano tam-bm demonstrou as linhas tnues em que se organizou poltica e ideologica-

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    mente o campo revolucionrio popular do pas, sendo que este perdeu a disputa para o setor constitucionalista, vinculado burguesia radical. Aqui nos interessa assinalar o papel revolucionrio desempenhado pelo campesi-nato, que se colocou como sujeito da luta revolucionria, dissolvendo assim o fetiche marxista e anarco-sindicalista da figura do operariado industrial como sujeitos revolucionrio "a priori". Isso tambm ajudar a compreender o pa-pel contra-revolucionrio e conciliador exercido pela Casa del Obrero, repre-sentante mexicano do anarco-sindicalismo e tambm do ecletismo mexicano. Dentro do movimento popular e operrio Mexicano havia a influncia do anarquismo ecletista (anarcocomunismo, anarcosindicalismo), ainda que no sculo XIX houvesse uma seo da AIT influenciada por bakuninistas e prou-dhonistas. O fato que o anarquismo ecletista mexicano (basicamente o anarcocomunismo) estava presente fundamentalmente na atuao de Ricar-do Flores Magon no Partido Liberal Mexicano e, anteriormente, na Casa Del Obrero, fundamentalmente entre os anos de 1906 e 1910, desenvolvendo um anarcosindicalismo. Alm disso, atuar na articulao de greves e de le-vantamentos indgenas e camponeses. Por outro lado, as foras populares da revoluo mexicana estavam ligadas a Emiliano Zapata e Pancho Villa. Os dois organizaram exrcitos que partiram ao sul e ao norte do pas, o primeiro lide-rava o Exercito Libertador do Sul. Tornaram-se assim, fundamentais para a realizao da Revoluo Mexicana, sendo necessrio o combate das foras burguesas, que culminou no assassinato de ambos os lderes populares. Por sua vez, a Casa Del Obrero, anarcosindicalista, apoiou os constitucionalistas e esteve ao lado da foras mais conservadores da revoluo, combateram os Exrcitos Populares de Villa e Zapata, e quando estes foram assassinados, passaram a ser perseguidos pelo Novo Governo. Isso demonstra mais uma vez, que o anarquismo ecletista, sem um programa e uma ideologia definida serve como brao da direita e de setores reformistas do movimento operrio. Assim foi na Guerra Civil Mexicana e na capitulao do anarcosindicalismo Italiano diante do governo fascista de Mussolini. A morte dos dois principais lderes revolucionrios mexicanos marcou a consolidao do poder nas mos das foras burguesas e capitalistas. O principal legado da Revoluo foi a Reforma Agrria, que permaneceu quase que intacta at a chegada ao poder dos grupos neoliberais, na dcada de 90.

    Podemos dizer que ns temos nesse perodo trs experincias distin-tas que mostram as contradies internas do movimento operrio e tambm das correntes, como o anarco- sindicalismo, atuantes dentro

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    do sindicalismo revolucionrio. Ns temos a experincia da revoluo mexicana (1910-1917) em que os movimentos operrio e campons assumiram tendncias revolucionrias e levaram a formao de um governo revolucionrio, de uma revoluo que assumiu efetivamente uma forma burguesa em razo da ausncia de projeto poltico; a ex-perincia Argentina com a criao de uma centrais que reuniam oper-rios e camponeses e que se configurou na disputa FORA X CGT (ou a-narco-sindicalismo X sindicalismo puro influenciado pelo sindicalismo francs); e tivemos no caso do Brasil a formao de um sindicalismo revolucionrio de base regional, sem maior presena no campo e sem a for-mao de uma central sindical importante e de movimento de massas revolucionrio de abrangncia nacional.

    Nessas trs primeiras dcadas tivemos a formao de organizaes importantes do proletariado latino-americano nos trs pases: no Mxico, a Casa Del Obrero, sob influencia do PL (Partido Liberal) de orientao anar-co-comunista no Mxico, que manteve uma relao tensa e contradit-ria com o movimento campons e antecipou vrias das contradies do sindicalismo revolucionrio; na Argentina a FORA, e logo depois, de uma srie de centrais sindicais que iriam conformar uma disputa pela direo do movimento operrio e campons Argentino, at a formao da CGT nos ano 1920, que se tornou a principal central sindical argentina; e no Brasil, a tentativa de formao da COB (Confederao Operria Brasileira, que no chegou a se constituir efetivamente como uma central nacional), sendo a articulao feita a partir das federaes operrias regionais. Depois da superao da crise de 1929, ficou claro que o sindicalismo revolucionrio tinha perecido em grande parte devido a suas prprias contradies. Por outro lado, os modelos de sindicalismo alternativos e hegemnicos confluam em diversos aspectos: o sindicalismo nacional-corporativista e o sindicalismo social-democrata, atualizado pelos partidos comunistas, se desenvolveram de forma limitada e contraditria, subordinada ao primei-ro.

    No caso dos Partidos Comunistas, eles apresentaram, apesar de particula-res nacionais de representatividade e fora poltica, uma evoluo similar. Eles tenderam a se integrar na poltica burguesa nacionalista, sempre mane-jada por meio do conceito de Frente Popular ou Frente Ampla com a burgue-sia nacional. A ciso e crtica dessa poltica se daria especialmente nos pero-

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    do ps- revoluo Cubana. A partir da ocorrero diversas tentativas de de-nuncia e ruptura com a poltica direitista dos PCs, mas sem que isso repre-sentasse uma ruptura com a teoria e programa marxista da revoluo per-manente. A principal reao a essa degenerao dos Partidos Comunistas foi o foquismo, movimento amplo e heterogneo que tinha como alguns elementos comuns, como a defesa da lutar armada, sem avanar na crtica terica. Entre 1960-1980, o foquismo deu tambm exemplos de herica resistncia e tristes deformaes, no sendo capaz de apresentar uma alternativa de massas.

    Entre 1980 e 2000, temos o ressurgimento do movimento de massas na Amrica Latina, j no perodo ps-ditaduras. Esse movimento ser carac-terizado por dois processos: a negao parcial do stalinismo e a crtica ferrenha da luta armada. Esse movimento representado no caso brasileiro pela formao do PT e da CUT ter expresses variadas na Amrica Latina, mas apresenta a tendncia geral de que a idia genrica de democracia vai esvaziar o programa socialista, que ser combinado com medidas defensi-vas anti-neoliberais. Nesse quadro contemporneo, um socialismo hbri-do no estilo do PT brasileiro, do MAS boliviano coexiste com remanes-centes do nacionalismo conservador e stalinismo, tendo como ponto comum a convergncia em torno da defesa do desenvolvimento capita-lista nacional e da democracia burguesa (tarefas tpicas da primeira eta-pa da teoria da revoluo permanente).

    Nesse sentido podemos explicar a evoluo contraditria do proletariado latino-americano e internacional e a situao de integrao sistmica na qual se encontra por alguns fatores: a) Em primeiro lugar, seja por meio das centrais, seja por meio de sindicatos profissionais pulverizados, a evolu-o das organizaes sindicais foi nacional o que facilitou sua integra-o sistmica e degenerao burocrtica, uma vez que o corporativismo surgia tanto dentro de um modelo de sindicalismo revolucionrio como do reformista.

    Os sindicatos e as organizaes de trabalhadores se adequaram no so-mente a ideologia do estatismo, mas a prpria estrutura poltica nacional que limitava suas bandeiras e formas de luta, canalizando-as diante dos momentos de crise para as polticas de salvao nacional; b) Mesmo quando vinculadas a organizaes internacionais, estas ou eram orga-nizaes apoiadas e criadas por Estados e atendiam aos objetivos da poltica

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    externa desses Estados. O nacionalismo assim impregnou toda a estrutura e organizao do sindicalismo. Essa caracterstica reforou e foi reforada pelo corporativismo, que surge espontaneamente da diviso do trabalho capitalista e foi incentivado pelo capitalismo monopolista de Estado. Houve assim movimentos voluntrios de adesismo aos governos e a vincula-o ao poder central (presidencialismo e centralidade personalista do poder executivo).

    c) Em terceiro lugar podemos dizer que dois fatores, um de ordem objetiva e outra de ordem subjetiva, criaram uma auto-limitao ao desen-volvimento do proletariado. De um lado, o carter contraditrio da atividade sindical que combina a resistncia ao capitalismo com a reproduo das rela-es de produo capitalistas, de outro o pragmatismo economista que per-mite freqentemente a acomodao dos trabalhadores. Essa situao objetiva da resistncia coloca questes fundamentais. Por outro lado, o pro-letariado experimentou ao longo de um sculo (1900-2000) as variantes dos grandes modelos de sindicalismo (o social-democrata e o revolucion-rio) e tambm um sindicalismo nacionalista-corporativista de Estado. Mas esses modelos sofreram adaptaes locais e sempre degeneraram em formas que facilitaram a sua prpria crise; d) o sindicalismo puro e o anarco-sindicalismo no tinham os instrumentos organizacionais, tericos e ideol-gicos para confrontar o capitalismo e superar as crises do prprio prole-tariado. Foi devastado pela combinao de represso, reestruturao econmica, auto-isolamento e hegemonia do sindicalismo de Estado.

    As correntes socialistas e comunistas foram tambm cooptadas pelas pol-ticas de unio nacional e frente popular, e fracassaram sob as ditaduras quando ficou claro que o projeto de via pacfica ao socialismo no seria vivel. O desenvolvimento subjetivo do proletariado assim nunca foi assenta-do sobre teorias, estratgias e formas de organizao que garantissem seu desenvolvimento autnomo no sentido do socialismo. A recusa da pol-tica ou neutralismo e economicismo das correntes variantes do sindicalismo revolucionrio, bem como o fetichismo de Estado levaram ao mesmo lu-gar: ao adesismo aos governos nacionalistas (cardenista, peronista e var-guista) e a integrao sistmica dos sindicatos e organizaes de trabalhado-res no aparelho estado.

    A crise de 1929 levou a uma reestruturao da economia na Amri-ca Latina, o que amplamente reconhecido, mas tambm a formao

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    de um novo padro da relao do Estado com as classes trabalhadoras de seus respectivos pases, e ao desenvolvimento do estatismo como fora den-tro da classe trabalhadora (o que at ento no havia acontecido na Amrica Latina). Os prprios Estados criaram um novo modelo de sindicalismo, nacional-corporativista, centrado na idia de dilogo e colaborao com os Governos e no fetiche do Estado-protetor, que materializava na figu-ra de partidos ou lideranas populistas. Esse modelo permitiu a constru-o de compromissos, de durao efmera em termos da integrao dos trabalhadores na estrutura de decises governamentais, mas duradouro em termos do controle do Estado sobre os sindicatos e trabalhadores. Esse compromisso foi fundamental para o desenvolvimento econmico e a formao de uma semi-periferia na Amrica Latina, pois assegurou a reproduo das condies necessrias super-explorao da fora de traba-lho na regio, uma vez que o problema foi transformado em questo nacio-nal, que deveria ser resolvida pela regulao do Estado.

    2.4 - Sobre o fracasso histrico do comunismo/social-democracia e do anarco-comunismo/anarco-sindicalismo e sua condio atual

    Um balano histrico dessas correntes constata que elas fracassaram. No porque no tenham tido poder ou expresso de massas. Mas por-que no cumpriram o objetivo que ela prprias anunciavam: abolir a sociedade de classes e o Estado. E fracassaram exatamente pelas razes expostas acima. Podemos dizer tambm que esse fracasso no significa que elas simplesmente deixaram de existir ou ter expresso. Elas continuam existindo e se apresentam como obstculo ao desenvolvimento autnomo do proletariado internacional. O marxismo se apresenta preso ao dilema da teoria da revoluo permanente e o anarco- comunismo e anarco-sindicalismo dilema da ausncia de uma teoria prpria da revoluo (que se converteu no uso acrtico da teoria marxista e na sua fase degenerada na negao da revoluo em si). Em seu conjunto, essas correntes se encon-tram presas a ciclos histricos de integrao Sistmica e desintegrao.

    Mas quase todas as correntes apresentam, depois de um processo de cri-se, tentativas de reorganizao Internacional. Com exceo dos revisionistas

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    do anarquismo. Uma anlise crtica s organizaes e tendncias na atualida-de por isso necessria:

    A retomada stalinista (Encontro Mundial de Partidos Comunistas e Oper-rios): Os PC's, ligados em seus respectivos pases s direes reformistas e para-governistas dos sindicatos, sustentam sua atuao em uma mistura ecltica de regionalismo e retrica stalinista, onde se destacam por sua au-sncia de anlises e caracterizaes sociolgicas, e predominam a repetio continua e pouco reflexiva de consignias, muitas delas centradas em proces-so de integrao regional, como na Amrica Latina, que possuem como eixo o respaldo a Hugo Chavez na Venezuela e a outras conjunturas similares.

    Esse processo de integrao regional tem como mesma face reformista a Alternativa Bolivariana das Amricas (ALBA) no qual os PCs avaliam como elemento mais progressivo da luta anti-imperialista, democrtica e popular no continente.

    O 11 Encontro Mundial de Partidos Comunistas e Operrios foi realizado em Nova Delhi, ndia, expressa a tentativa de reorganizao dos stalinistas. Apresenta grandes debilidades, e longe de se constituir em partido mundial: disperso, sem unidade terica e ttica, se resumindo a resolues genera-listas de partidos reformistas, social-democratas da atualidade. Apesar de postularem a centralidade na crise sistmica capitalista (diferente da antiga 2 Internacional), tais partidos em sua grande maioria acreditam na centrali-dade da atuao pelas vias institucionais. A estratgia mundial do PCs passa pelos fortalecimentos legais: Conselho Mundial da Paz, a Federao Sindi-cal Mundial, a Federao Mundial das Juventudes Democrticas, a Federao Internacional Democrtica das Mulheres, a Aliana Internacional dos Habi-tantes, os Fruns continentais e o Frum Social Mundial. Num certo sentido, expressa a poltica stalinista de governos populares dos diferentes pases.

    Trs faces do reformismo inato do Trotskismo (LIT-QI, FT QI e CRQI): Na atual conjuntura latino americana, detrs da presena majoritria dos PC's tradicionais, diversos agrupamentos que se reivindicam revolucionrias inter-vm na luta de classes das e dos trabalhadores. Destacamos nesta anlise, as trs expresses mais representativas entre o grande nmero de correntes e tendncias do trotskismo em nosso continente. A LIT-QI (fundada em 1982) remonta ao grupo trotskista argentino criado por Nahuel Moreno em 1953, chamado GOM (Grupo Operrio Marxista). Atualmente possui cerca de 24

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    partidos filiados e sua fora majoritria est na Amrica Latina em especfico no Brasil Para a LIT, este um sintoma do perodo atual de decadncia expl-cita do capitalismo. Assim, seu programa traa como meta central do mo-mento a Luta Anti-imperialista e a necessidade de uma Segunda Indepen-dncia dirigida pela classe operria. A LIT-QI/PSTU sustenta a viso etapista de que o principal instrumento de dominao colonial a dvida externa dos pases da periferia em relao aos pases do centro. Pretendendo ser diferente do stalinismo, opera com o mesmo programa de luta anti-imperialista, reduzindo o anti-imperialismo a uma luta super-estrutural. O que fica ntido que se trabalha ainda com as categorias da III Internacional Comunista e com a perspectiva de uma teoria etapista da revoluo. A idia da assemblia constituinte e da poltica de unidade de ao apenas mos-tra o carter ambguo e vacilante da poltica da LIT, que se move com rudi-mentos da teoria stalinista, tentando neg-la, mas reproduzindo o principal da sua estratgia: a idia de uma luta anti-colonial, com foco principal sobre a dvida externa as polticas de colaborao com os governos de frente popu-lar da Amrica Latina.

    Tendo como maior referencia o Partido dos Trabalhadores Socialistas da Argentina, a Frao Trotskista Quarta Internacional uma internacional trotskista com presena em 9 pases, tanto do continente Americano, como da Europa. Fundada a princpios dos anos 90 depois de sua sada da LIT QI, mantm certa presena em agrupaes sindicais, majoritariamente em Ar-gentina. Por sua vez, a Coordenao para a Refundao da Quarta Interna-cional fundada em 2004, e que tem como principal referencia o Partido Obre-ro da Argentina, mantm hoje em dia presena na Amrica, Europa e oriente mdio. Apesar de fazer crticas contra o abandono da reivindicao da revo-luo proletria por parte de grupos como a ex Liga Comunista Revolucion-ria francesa e as prticas governistas da LIT-QI, a FT-QI e a CRQI de fato man-tm um discurso revolucionrio, mas se mostram incapazes de desenvolver uma poltica genuinamente revolucionria. Para estas duas correntes inter-nacionais, cujas diferenas so menores que suas similaridades, necessrio que a oposio proletria se desenvolva em torno das direes reformistas, e no abertamente contra elas. Por outra lado, sua incapacidade programtica, intrnseca da prpria origem do trotskismo, de romper com a perspectiva de "utilizar" o sistema representativo democrtico burgus, as obriga necessari-amente, quando consolidam uma fora de massas, a abandonar a luta direta do proletariado contra a burguesia nos locais de trabalho, para lutar pela

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    repartio de migalhas que oferecem os sistemas eleitorais dos Estados capi-talistas. A perspectiva da CRQI particularmente, se sustenta em uma srie de teses que analisam a presente conjuntura sistmica mundial como a deriva-o direta e quase nica da desintegrao da URSS e outros Estados Oper-rios deformados, ignorando voluntariamente o real papel econmico da URSS depois da Segunda Guerra Mundial, e deixando de lado a prpria evoluo da produo capitalista. Uma prtica determinada pelo sistema democrtico burgus e uma incorreta caracterizao da realidade, resumem o desenvol-vimento destas trs correntes majoritrias e representativas do trotskismo na Amrica Latina.

    A bancarrota do maosmo (ILPS). A Liga Internacional de Luta dos Povos (ILPS) foi fundada em 2001 e uma organizao mundial que busca agremiar partidos e organiz