OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA … · norteador do aprendizado da Segunda Guerra...
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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6Cadernos PDE
OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE
Artigos
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Representações da Segunda Guerra Mundial no campo cinematográfico: metodologias para o ensino de História
Contemporânea na EJA - Prudentópolis-PR.
Moacir Bortolozzo1
Claércio Ivan Schneider2
RESUMO O presente artigo propõe discutir e apresentar metodologias educacionais para trabalhar com fontes cinematográficas, na disciplina de História, tendo o período da Segunda Guerra Mundial como meio norteador da implementação do proposto. A construção, a reflexão e a execução destas metodologias ocorreu com os educandos da modalidade de EJA – Educação de Jovens e Adultos, no CEEBJA de Prudentópolis-PR. A implementação do projeto trouxe uma ressignificação do trabalho pedagógico através de uma prática que valorizou a fonte cinematográfica no aprendizado de História, com o objetivo de sensibilizar os estudantes para a reflexão crítica das representações que se construíram da Guerra a partir do cinema. Palavras-chave: Educação de Jovens e Adultos; Segunda Guerra Mundial; fontes cinematográficas.
1. Introdução
Este artigo faz parte do conjunto de atividades desenvolvidas no Programa de
Desenvolvimento Educacional (PDE), em parceria com a Universidade Estadual do
Centro-Oeste (UNICENTRO – PR), tendo como mantenedora a Secretaria de Estado
da Educação – SEED, do Governo do Estado do Paraná. O PDE proporciona aos
professores da rede pública a retomada de estudos acadêmicos, a partir da
composição de projeto de intervenção na escola de atuação. As experiências na
implementação do Projeto de Intervenção, no CEEBJA – Centro Estadual de
Educação para Jovens e Adultos, no município de Prudentópolis, serão relatadas e
problematizadas neste artigo.
Partindo da ideia de que, hoje, ainda muitos discentes e docentes
historiadores consideram somente o registro histórico escrito como fonte confiável
para a interpretação, para o aprendizado e o conhecimento histórico, e que a sala de
aula, na relação ensino aprendizagem, é o reflexo cristalino deste pensamento, nos
1 Professor de História da Rede Estadual de Ensino do Paraná, participante do PDE (Programa de
Desenvolvimento Educacional) da SEED, em 2013/2014. 2 Orientador. Professor Adjunto do Departamento de História. Unicentro – Campus de Irati-Pr.
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valemos dos conhecimentos e reflexões de Marc Ferro, Eduardo Victorio Morettin,
Valesca Giordano Litz, entre outros autores, para repercutir a importância de novas
fontes históricas, tanto para a ressignificação do conhecimento histórico, quanto
para o trabalho em sala de aula.
A proposta é embasada nas Diretrizes Curriculares de História para a
Educação Básica do Estado do Paraná, pautada no Projeto Político Pedagógico do
CEEBJA, sob a ótica da Nova Esquerda Inglesa e a Nova História Cultural, como
corrente historiográfica e de Demerval Saviani com sua proposta de educação
formadora na pedagogia histórico-crítica. As contribuições para que o presente
trabalho tomasse forma ainda contaram com a participação dos pares da rede
pública do Paraná, através do GTR- Grupo de Trabalho em Rede, a implementação
na relação direta com o educando, sendo os questionamentos, as experiências e as
reflexões um ganho inestimável para o relato que se segue. As considerações, os
caminhos metodológicos e as perspectivas com considerações acerca das
aplicações e da composição dos trabalhos também se embasaram nos cursos
presenciais junto a UNICENTRO e as orientações do professor Dr. Claércio Ivan
Schneider.
Ensinar e aprender História de forma coletiva, na singularidade e
especificidade, é um dos muitos desafios contemporâneos da educação. A busca
por novas ou melhores práticas pedagógicas, que encontrem o educando em sua
realidade, é o “toque de Midas” da relação educador/educando. Em nosso caso
particular, focado na intervenção junto a EJA – Educação de Jovens e Adultos –, a
pluralidade dos alunos faz-se campo fértil para inovações pedagógicas. A tradicional
maneira de conduzir as aulas, só com giz e quadro, não mantém o educando
sintonizado com o conhecimento desejado, ou seja, que o coloque em contato com
seu cotidiano e com as referências culturais de seu tempo. Sem o procedimento de
inovação das estratégias de ensino, nesta modalidade educativa, o aluno pode
simplesmente abandonar a escola, sendo impossível persuadí-lo a voltar.
A realidade da EJA em Prudentópolis-PR faz coro a estas colocações. O
investimento em novas fontes e metodologias, como a cinematográfica, mais
especificamente os filmes, cujo foco aqui recai sobre a Segunda Guerra Mundial,
sintetiza a tentativa de ressignificar o ensino de História Contemporânea, amaina a
problemática, já que os alunos do Ensino Médio da EJA – Educação de Jovens e
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Adultos, são trabalhadores do campo e da cidade, excluídos da educação formal. A
heterogeneidade é marcante, presente na origem díspar e na idade dos alunos. No
PPP – Projeto Político Pedagógico (2011 p.17) – comprova-se que: “[...] os alunos
do CEEBJA de Prudentópolis são jovens de 18 anos até adultos de 50 anos de
idade que têm necessidade da educação formal.”
A prática pedagógica bem fundamentada e com diferentes metodologias
mostram ao aluno o sujeito histórico que ele é. Usando o cinema como meio
norteador do aprendizado da Segunda Guerra Mundial, construiu-se um saber plural
sobre o contexto que o educando encontra inserido, seja indiretamente, com o
mundo tecnológico, bélico e geográfico atual, ou diretamente, na medida em que
houve participação de pracinhas prudentopolitanos no combate.
O trabalho educacional com Jovens e Adultos, seu aprendizado e
permanência, possibilitam a construção de um aluno cidadão, reinserido na
sociedade e com novos objetivos. A interação entre o conhecimento e permanência
escolar estão intimamente ligados. A EJA, a partir da disciplina de História, permite
ao professor construir novos saberes históricos, mostrando ao aluno novos
caminhos para a sua formação enquanto agente ativo da história e contribuindo,
dessa forma, para a formação do ser e também para sua permanência escolar. O
ensino deve problematizar a perspectiva de que a Escola é um indispensável meio
de aprendizado e dimensiona-se como meio possibilitador do conhecimento
acumulado pela humanidade, deixando ao educando princípios, conceitos e
reflexões sobre seu papel no mundo contemporâneo.
Usar o cinema como fonte histórica, instigando a compreensão e análise do
que envolve as produções escolhidas para representar a Segunda Guerra Mundial,
seja nas imagens mostradas ou no processo de formação da película, é um caminho
de reflexão e uma forma de educar mais próxima da realidade contemporânea do
educando. As películas proporcionaram roteiros com histórias reais ou histórias
factíveis com a realidade, para análise e discussão das mesmas.
O cinema voltado para a Segunda Guerra Mundial é talvez o mais amplo do
gênero, mas optou-se por algumas produções que contribuem de maneira mais
enfática para o aprendizado e trocas necessárias para a construção do
conhecimento que envolve o tema proposto. Filmes como: O Resgate do Soldado
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Ryan (1998); Leningrado (2009); Círculo de Fogo (2001); A Queda! As Últimas
Horas de Hitler (2004); Cartas de Iwo Jima (2006); A Conquista da Honra (2006),
são adequadas ao perfil pretendido.
As décadas de trinta e quarenta do século XX sintetizaram conflitos que
chamamos de Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Os acontecimentos deste
período são inenarráveis na perspectiva do choque pela violência, mas passíveis de
exemplificação e estudo. Segundo Bilharinho: “O cinema, desde o início dos
combates e antes de qualquer outra manifestação artística, dedicou-lhe atenção,
tempo e meios, focalizando-o em muitos de seus múltiplos aspectos” (2005, p. 11).
A busca da motivação para a compreensão da História e suas dificuldades de
entendimento, interação e meio transformador, deve nos levar como educadores e
historiadores, a buscar possíveis variantes para esta tarefa hercúlea. O uso de
novas fontes, como a cinematográfica, por exemplo, é um indício desta busca. Como
afirma Litz: “[...] trabalhar os processos iconográficos da história em sala de aula é
um caminho fascinante que pode se multiplicar em infinitas formas e possibilidades,
sendo uma importante fonte de pesquisa para compreensão da história” (2009, p. 6-
7).
O recurso da imagem não é novidade no campo educacional. As imagens
foram revolucionadas com os irmãos Lumier e seu cinematógrafo. Posterior a isso, a
imagem foi acoplada ao som, sendo o apelo a esta nova técnica praticamente
irresistível ao ser humano. Assim, o seu uso como método pedagógico não tardou a
acontecer. Segundo Ferro:
Durante os anos de 1960, o grupo da Nouvelle Vague conseguiu impor tanto por seus escritos quanto por seus filmes, essa ideia de uma arte que estaria em pé de igualdade com todas as outras e que, por conseguinte, também era produtora de um discurso sobre a História. De fato, já se fazia cinema há muito tempo, mas esse reconhecimento, essa legitimação data apenas daquela época (2010, p.10).
No caso da educação do Brasil, as décadas de oitenta e de noventa
representaram a abertura, com o fim da ditadura militar, a uma ideia de
redemocratização do ensino. A grande discussão é o que era possível fazer ou não
com a educação e, especificamente, com o ensino de História, já que o mesmo não
era mais pertencente aos Estudos Sociais. As discussões levaram a reconhecer
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novas linhas de pensamento como importantes no aprendizado e também novas
fontes como aprendizado. Ampliaram-se as noções de fonte e de ensino de História.
A noção de texto e documento vem se ampliando na História e hoje todos os vestígios do passado são considerados matéria para o historiador [...]. Essa ampliação da noção de documento faz parte do historiador, implica, por sua vez, repensar seu uso escolar, tanto na perspectiva didática quanto metodológica (RANZI, pág. 26).
Para Ranzi, ocorre na atualidade uma reinterpretação ampliada do historiador,
no conceito texto e o documento. A ampliação da condição do entendimento
histórico e seus vestígios possibilita uma nova abordagem na metodologia e didática
escolar, buscando o conhecimento de História.
Simultaneamente a implicação de usar o filme como fonte no aprendizado de
História encontra-se a dificuldade de entender as contradições implícitas e não
explícitas que a película esconde. Ainda com Ferro: “Sem dúvida, esses cineastas,
conscientemente ou não, estão cada um a serviço de uma causa, de uma ideologia,
explicitamente ou sem colocar abertamente as questões” (2010, p. 16).
É por razões acima descritas que o propósito deste artigo consiste em refletir
embasamentos teóricos e metodologias cinematográficas na formação e
aprimoramento teórico, crítico e intelectual do educando do CEEBJA de
Prudentópolis, na disciplina de História, na turma de coletivo do ano de 2014. Este
artigo está estruturado e composto por uma fundamentação teórica relativa à análise
dos filmes propostos e por uma exposição crítica das atividades desenvolvidas em
sala de aula, como ferramentas tanto para o educando e também para educadores.
2. Mapa de percursos: implementação da proposta
Marc Ferro, pensando sobre a função do historiador, afirma: “Já foi suficiente
escrito que, à força de se interrogar sobre seu ofício, de se perguntar como ele
escreve História, o historiador acabou por se esquecer de analisar sua própria
função” (2010, p. 26). Esta fala provoca uma reflexão sobre o trabalho pedagógico
do professor de História na Educação Básica. Analisar a própria função do
conhecimento histórico e do trabalho docente é fundamental para enfrentar os novos
desafios que foram erigidos na contemporaneidade, dentre eles, a do perfil dos
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estudantes de hoje. Segundo as Diretrizes Curriculares da Educação Básica do
Paraná – História:
A escola pública brasileira, nas últimas décadas, passou a atender um número cada vez maior de estudantes oriundos das classes populares [...] intensificou-se a necessidade de discussões contínuas sobre o papel do ensino básico no projeto de sociedade que se quer para o país (2008, p.14).
A década de noventa do século XX ficou marcada com o governo neoliberal
de Fernando Henrique Cardoso, que ao financiar a educação pelo Banco Mundial e
o FMI - Fundo Monetário Internacional - alargou a oferta de vagas na escola pública.
A liberação de verbas estava atrelada à obrigatoriedade de apresentação de metas
desejadas por estes órgãos. A educação estendeu-se a uma grande velocidade,
mas sem discussões e condições apropriadas para receber este projeto societário.
Hoje, segundo as Diretrizes, faz-se necessário as discussões permanentes, para
que a educação básica abarque os educandos das classes populares.
Há outros desafios que sempre foram pouco reconhecidos em outros
períodos da educação brasileira, principalmente a ideia do aluno como mero
receptor de conteúdos estanques e não como sujeitos históricos. Conforme as
Diretrizes: “Um sujeito é fruto de seu tempo histórico, das relações sociais em que
está inserido, mas é, também, um ser singular, que atua no mundo a partir do modo
como compreende e como dele lhe é possível participar” (2008, p.14). Os
educandos devem ser considerados como sujeitos históricos singulares
pertencentes a determinado tempo histórico. A consciência desta condição por parte
dos professores pode possibilitar o acesso às discussões das contradições que
permeiam a sociedade contemporânea e não apenas a ditadura de conteúdos
descontextualizados.
Sendo assim, foi proposto como ponto de partida para o enfrentamento
destes desafios, a problematização de filmes e a contextualização da produção
cinematográfica em torno da Segunda Guerra Mundial, demonstrando que é
possível usar o cinema como fonte histórica e ressignificar as relações ensino-
aprendizagem, educador e educando.
As reflexões iniciaram com uma rápida coleta oral de informações prévias
sobre o conhecimento histórico envolvendo cinema e Segunda Guerra Mundial, já
que o trabalho com a EJA nos traz esta possibilidade. A sondagem mostrou que
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todos os educandos têm contato com diversos gêneros de filme, mas que há uma
dificuldade enorme em contextualizar a produção, entender que o cinema mostra
algo a mais do que as imagens propostas. Houve uma unanimidade quanto a função
do cinema: distração e o passatempo. Pode-se perceber que a grande maioria dos
alunos já teve contato formal ou informal com o tema da Segunda Guerra Mundial e
tendo alguns de seus personagens, como Adolf Hitler, uma figuração maior no
imaginário coletivo destes educandos.
Comprovada a dificuldade existente para a reflexão destas temáticas, uma
proposta de atividade foi trabalhada a partir de um texto reflexivo de própria autoria,
sendo representado de forma teatral, que mostrou um cotidiano fictício entre dois
irmãos, mas que serviu para contextualizar o educando ao seu próprio cotidiano,
mostrado na sondagem inicial.
“ASSISTINDO” Ao chegar em casa o irmão mais velho observa sua irmã mais nova esparramada no sofá. Pergunta Pedro: _ O que está fazendo? A resposta foi um pensamento preguiçoso “Estou assistindo um filme, será que ele não tá vendo?” _ Que produção? Quem é o diretor? Insiste o irmão. Ana só o ignora, faz de conta que não é com ela. Não desistindo de tirar a irmã do marasmo, Pedro continua: _ Já pensou em qual interesse se esconde por trás desta produção? Com muita falta de vontade ela responde: _ Sei lá, só quero relaxar! Filmes não são feitos pra nós descansarmos? Pedro deixa a conversa para outro dia e se retira um pouco decepcionado com Ana. Ele sabe, porém, que em outro momento poderá retomar a conversa com a irmã e conseguir colher melhores frutos. (Bortolozzo – texto particular).
Após a apresentação do texto teatral, voltou-se a discussão inicial e foi de
senso comum entre os educandos que a realidade era exatamente como fora
apresentada. Algumas questões levantadas ficaram: Como entender o cinema como
fonte?
Iniciado o trabalho sobre o filme como fonte, fiz-se a análise e
questionamentos a partir de coletas de matérias no laboratório de informática com
sites direcionados ou não. Atividade que possibilitou mostrar ao educando quanto é
farto as fontes e informações sobre a Segunda Guerra Mundial. Pode-se refletir que
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as fontes necessitam ser analisadas com critério e metodologia, sem as quais ficam
inviáveis usá-las.
Em sala de aula, discutiu-se sobre os nuances que levaram a Europa e,
posteriormente, o mundo a um conflito de proporções épicas, deu-se ênfase às lutas
de classes, aos interesses políticos, econômicos e pessoas que envolveram aos
momentos do pré-guerra, guerra e pós-guerra. Sendo portador deste material, foi
proposto uma problematização sobre o período pré-guerra e a contextualização
deste momento histórico. Estes questionamentos levaram os educandos a refletir e a
se perguntar: Por que a Segunda Guerra Mundial ocorreu? Quem atuou? Que
motivações, que ações e quais os agentes deste conflito impar?
Sendo os educandos emissores destes questionamentos, já no contato inicial
de implementação do projeto, foi proposto a anotação das impressões sentidas, as
particularidades as implicações as limitações da abordagem usada. Com essa
atividade foi verificado que, ao compartilhar as impressões das atividades,
notadamente o uso do texto teatral ficou marcado no imaginário do educando devido
a proximidade do que foi apresentado com o que ocorre realmente no seu dia a dia,
sendo recorrentes comentários: “é bem assim que acontece”, “é igual lá em casa”,
“nunca pensei por esse lado”. Outro fator que chamou a atenção foi a falta de
conhecimento prévio do educando, apesar de ser da EJA, quando questionados
sobre o conhecimento de Segunda Guerra Mundial, sobre fonte histórica ou o uso do
cinema na construção do conhecimento histórico. A amostragem possibilitou
visualizar um terreno fértil para a implementação do projeto proposto e o despertar
para uma nova forma de aprendizado.
Propondo esta descontinuidade desenvolveu-se o trabalho, conscientes que
os meandros da educação são feitos de muita pluralidade, mas nem sempre
explorados pelos professores que, na maioria, ficam presos ao que é mais cômodo e
fácil, mas que talvez não seja o melhor. Ou seja, muitos, profissionais da educação
apenas buscam dar continuidade aos conteúdos e às práticas tradicionais de ensino,
sem dar um passo adiante e tentar mudar um pouco a estrutura pedagógica, ou dar
passos para trás voltando a estudar propostas diferenciadas para modificar e
modificar-se, como uma busca constante de ensinar e aprender.
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No que se refere a metodologias proveitosas para o ensino de História, o uso
da tecnologia como fonte mostrou-se interessante, oportuno e, em certa medida,
ressignificador, e é por isso, que se transforma em um viés compatível com a tarefa
apresentada na aplicação do projeto. Foi importante também definir ao aluno o
parâmetro utilizado, mostrando que a proposta é entender a fonte, estudá-la como
fonte no seu processo produtivo e depois utilizá-la para refletir a Segunda Guerra
Mundial como fato histórico relevante para a humanidade, usando para isso o
cinema e suas produções.
Perseguindo o objetivo de estimular o educando e mostrar a fonte filmítica
como alargadora do conhecimento pedagógico, foi proposta uma reflexão inicial
sobre a Segunda Guerra Mundial, com uma divisão do combate em três regiões
distintas: o conflito no Pacífico, a Guerra no Ocidente e no Oriente da Europa, mas
ressaltando ao educando que o conjunto da guerra era único, pertencente ao
mesmo tempo histórico, emaranhado a um contexto geral que só pode ser dividido
para facilitar o entendimento pedagógico.
Para enriquecer a implementação do projeto e situar os educandos no
contexto geopolítico, orientou-se a atividade de localização de alguns países e
pintura de dois mapas, um mundi e um europeu político, possibilitando o
entendimento da existência de blocos beligerantes contrários no conflito (EIXO –
Alemanha, Itália, Japão X Aliados – Estados Unidos, União Soviética, Inglaterra,
Brasil) e pontos geográficos estratégicos de ambas as partes. Os educandos
puderam ter uma noção de espaço geográfico e também recorrer aos mapas sempre
que as dúvidas surgiram. A partir destes, souberam qual foi o ganho territorial dos
países do EIXO e entenderam como ocorreu a retomada de território pelos Aliados,
na Segunda Guerra Mundial.
De posse dos recursos e sabendo que a guerra europeia passou a ser
ofensiva por parte dos Aliados, foi proposta uma reflexão sobre a importância do
“Dia D” para a retomada da Europa Ocidental, visualizando o embate ideológico
entre a URSS socialista e os EUA/Inglaterra capitalista, aliados no conflito e o
nazismo alemão contrário a este bloco heterogêneo.
O desembarque aliado na Normandia e a abertura de um novo flanco na
Europa, foi explorado como tema e desenhado no imaginário do aluno quando os
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trinta minutos iniciais do filme O Resgate do Soldado Ryan (SPIELBERG, 1998) foi
projetado. Houve uma preparação para com a seleção das cenas do filme e a
contextualização do desembarque, os fatos geradores, as implicações, os nuances e
a conjunto geográfico envolvido. O uso de mapas, textos com reflexões de forma
individual, em dupla ou em grupos foi importante. Levantou-se dados sobre o filme:
ano de lançamento, diretor, financiador, figurino, cenário e fotografia, com uma
pesquisa no laboratório de informática.
Foi proposto que os alunos observassem, com atenção, durante a projeção
do conteúdo do filme o uso da câmera e o nervosismo que ela passa ao espectador
e que escolhessem uma cena relevante para si e anotassem, para ser compartilhada
com os colegas. Assim, posteriormente a projeção, os educandos compartilharam as
cenas escolhidas e explicaram os motivos das escolhas. Em posse das cenas, estas
foram revistas em retomadas na projeção, sendo a análise de grande valia para o
entendimento da Segunda Guerra, bem como o entendimento de técnicas e táticas
empregadas nas batalhas durante o conflito, sempre partindo do interesse dos
educandos, ou seja, o público alvo.
Foi importante relacionar e retomar as relações da fonte cinematográfica, com
a produção. A observância dos educandos da quantidade de mortos, a carnificina
que foi o conflito, a questão psicológica dos soldados e sua frieza, o uso dos
soldados da juventude hitlerista, a análise dos soldados como combatentes e não
assassinos, os soldados como engrenagem da guerra, a abertura de um flanco
ocidental na Europa e seu significado, o próprio filme e sua parcialidade na visão
norte-americana do conflito, a qualidade do cenário e do texto por trás da produção,
o nervosismo da câmera e o impacto que ela causa no espectador foram levantadas
e problematizadas, possibilitando reflexões e entendimentos plurais sobre a fonte
filmítica e sobre os diferentes episódios que caracterizaram este conflito.
O trabalho final desta etapa foi compatível com a proposta inicial,
demonstrando a possibilidade real de melhorar a qualidade pedagógica da aula de
história e do entendimento do educando no seu papel de espectador ativo dos
julgamentos da obra filmítica. Partindo destas reflexões, ocorreu a produção de um
texto sobre o tema apresentado, as impressões sentidas e o aprendizado
conseguido corroborou para confirmar que houve crescimento significativo na
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compreensão da Segunda Guerra Mundial e de suas obras cinematográficas como
meio facilitador do aprendizado. Foi muito importante também perceber que a
análise da produção fez os alunos perceberem a construção do filme como fonte
histórica.
Como já dito, na atualidade as mídias se tornaram hegemônicas na sociedade
e por isso não podemos deixar de usá-las como fonte de estudo da História, tanto
por sua produção quanto pelos conteúdos de sua película. Como destaca Litz:
“Assistir a um filme é sempre elucidativo e muitas vezes vence o imobilismo e a
visão dirigida de certos assuntos, fazendo com que se abram novos caminhos,
novos espaços, novas visões” (2009, p. 26).
Porta vozes latentes da nossa sociedade, as mídias que trazem imagens e
sons, transformaram-se em “professores”, muitas vezes fascinando os
telespectadores ao mundo do consumo e do entretenimento. Amealham os jovens e
os adultos em uma teia cujos conteúdos são de fácil absorção e aceitação, haja vista
que a interação se dá, no caso dos programas televisivos, de forma passiva e
despreocupada. De forma geral, as mídias acabam por fazer uma competição
desleal com as escolas, que não conseguem acompanhar a estrutura tecnológica
gigantesca instituída no contexto capitalista das grandes corporações, derramando
bilhões de dólares para a disseminação de conhecimentos ideológicos de fácil
digestão. Porém, todo este sistema, quando problematizado, pode contribuir como
meio facilitador da educação, na medida que permite a problematização e a
formação da consciência histórica.
Certamente que mostrar o conhecimento como algo tangível e de relevância
cotidiana parece difícil para os professores, que também muitas vezes se alienam
pelo sistema midiático. Mas em um período no qual a pregação pela felicidade
absoluta virou moda, as mídias colocam o aprazível logo ali em uma tela, construída
por sensibilidades que envolvem a música, as imagens, as falas que facilmente
seduzem os humanos.
Essas dúvidas e observações geram questões legítimas. Uma delas é buscar
soluções para o desinteresse dos alunos para o ensino tradicional, nas culturas
midiáticas. Um meio é fazer um trabalho de problematização das produções
cinematográficas do tempo atual, na possibilidade de ressignificar o ensino, fazendo
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uso de fontes mais próximas do universo de referência dos alunos. Novamente Litz
nos ensina que: “o filme pode despertar no aluno outro tipo de relação com o
processo de aprendizagem, e pode ser visto como mais uma forma de ampliar o
conhecimento, de instigar a pesquisa e levar a questionamentos sobre a história”
(2009, p. 26). Sendo assim, os filmes foram usados para criar novos paradigmas,
despertar para o aprendizado com olhos voltados ao conhecimento através de uma
nova relação em que se instiga a reflexão, a pesquisa e os questionamentos
históricos.
A desconstrução de seu aparato ideológico foi questionado e problematizado
como fonte histórica. Foi refletido com o educando do CEEBJA de Prudentópolis a
possibilidade de trabalhar História com várias fontes, dentre elas, a midiática.
Aproximar as mesmas do “nosso mundo” através do que é palpável e palatável fez
parte deste bojo de tentativas que se mostrou útil, na busca de motivação para o
educador e também para os educandos, em aprender os meandros históricos da
Segunda Guerra Mundial.
Imbuídos deste pensamento voltou-se os questionamentos para a
participação decisiva da União Soviética na Segunda Guerra e a obstinação deste
povo em defender seu território, hora por amor à pátria, hora frieza com que o
soldado e a população da União Soviética foram tratados, em especial as cidades de
Leningrado e Stalingrado, pela cúpula de seu governo e de seu exército vermelho.
Para entender e refletir sobre a participação soviética na Segunda Guerra
Mundial, os filmes Leningrado (BURAVSKY, 2009) e Círculo de Fogo (ANNAUD,
2001) foram escolhas pertinentes, já que fugiram um pouco das produções
americanas e levaram a um contexto menos explorados destas fontes filmíticas. A
preparação para o uso das cenas do filme e a contextualização da Segunda Guerra
no flanco oriental da Europa seguiu os mesmos parâmetros estabelecidos para a
fonte anterior, já que a contextualização dos fatos geradores, as implicações, os
nuances e o conjunto geográfico envolvido são necessários para o entendimento da
base histórica em que foi fundamentada a fonte e a problematização. Além da
pesquisa e reflexão dos dados coletados sobre os filmes, tais como o ano de
lançamento, diretor, financiador, figurino, estúdio, cenário e fotografia, foi proposto
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aos alunos a atenção especial no cotidiano de Leningrado cercada e de Stalingrado
invadida.
Os educandos assistiram ao filme Círculo de Fogo (ANNAUD, 2001) nos 47
minutos iniciais e as cenas de Leningrado (BURAVSKY, 2009), nas cenas de 6:44
minutos até 20:50 minutos; 4:22 até 68:35 minutos. A partir das cenas buscou-
selevantar as questões relacionadas a participação decisiva da União Soviética
nesta batalha mortal. A atividade de destacar uma cena e retomá-la depois com os
educandos possibilitou perceber e desconstruir a ideia da guerra como algo
glamoroso, mostrando-a “sem sentido” e mortal, principalmente para a população
indefesa. O ponto que ficou latente nas colocações dos estudantes quando foi
mostrado a película de Círculo de Fogo (ANNAUD, 2001), foi a falta de
entendimento, já que várias questões tiveram que ser refletidas, retomadas e
explicadas. Dos alunos surgiram “Por que alguém é mandado para a guerra sem
arma, só com as balas? Qual a importância de Stalingrado para ser defendida
daquela forma? Qual a necessidade de criar um mito frente uma guerra em que um
homem tem tão pouca importância? Por que Hitler não deixou seus soldados
recuarem e nem se renderem?”
As perguntas geradas levaram a um entendimento sobre as tiranias que
podem se passar pela cabeça de ditadores, como Hitler e Stálin. A reflexão foi
produtiva e relacionada com figuras atuais que continuam no poder de forma
ditatorial ou que, recentemente, perderam o poder pela pressão popular em grandes
manifestações, tendo, como exemplo, a Líbia e seu ditador Kadafi. A reflexão sobre
Kadafi foi feita depois de uma coleta de matérias lançadas na mídia e as
comparações possibilitaram uma maior proximidade do educando com a
personalidade dos ditadores que comandavam a Alemanha e a União Soviética,
durante a Segunda Guerra Mundial.
Neste momento do trabalho, ocorreram provocações sobre a participação do
Brasil na Segunda Guerra Mundial, mesmo que o foco do trabalho não fosse esse,
foi de grande valia as reflexões sobre a participação da FAB – Força Aérea
Brasileira, a FEB – Força Expedicionária Brasileira e a Marinha nos combates. Foi
possível através de fontes escritas coletadas de jornais, revistas e livros, entender a
conjuntura que levou o Brasil a declarar guerra ao EIXO. Valeu ressaltar o papel dos
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soldados prudentopolitanos, paranaenses, enfim, brasileiros como participantes do
conflito.
A participação brasileira não se restringiu ao conflito direto na Europa, tornou-
se importante fornecedor de matéria-prima aos aliados. Contribuiu com o
patrulhamento do Atlântico Sul, levado a cabo pela marinha. Sob pressão do
governo do presidente Roosevelt, dos EUA – Estados Unidos da América, o Brasil
então presidido por Getúlio Vargas, cedeu bases no nordeste brasileiro para os
Aliados (EUA, Inglaterra e União Soviética), que atacaram o norte da África,
controlado pelo EIXO (Alemanha, Itália e Japão). Os acordos políticos e econômicos
fizeram o Brasil declarar guerra ao EIXO e participar do conflito ao lado dos Aliados.
O efetivo militar brasileiro não teve uma relevância significativa no quadro geral,
sendo a participação pequena, restringida ao final do conflito, porém marcante para
a História do Brasil. Para Vigevani:
Quanto à ação militar direta da América Latina deu-se com o envio, a partir de julho de 1944, da Força Expedicionária Brasileira, sob o comando do general João Batista Mascarenhas de Morais, chegando a conta de 25.334 homens. [...] A Batalha mais importante foi a conquista de Monte Castelo, em 21 de fevereiro de 1945, tomado aos alemães, na região de Bolonha (1991, p. 81).
O autor mostra que os efetivos mandados para a Europa lutaram nas regiões
montanhosas de Bolonha, na Itália, contra os alemães. A FEB foi a maior força latino
americana a participar de forma direta do conflito europeu. A principal batalha e
vitória do corpo do exército brasileiro foi o de Monte Castelo, já nos momentos
decisivos da guerra.
Getúlio Vargas barganha uma série de vantagens, sendo atendido em muitas
delas, principalmente na criação de uma indústria siderúrgica de base pelo capital
norte-americano, com a fundação da Companhia Siderúrgica Nacional e da
Companhia Vale do Rio Doce, ocorrendo assim o alinhamento brasileiro aos países
Aliados.
A vitória aliada aconteceu em 1945. As consequências do conflito foram
sentidas no mundo inteiro, com a força de uma Bomba Atômica, que o finalizou. No
Brasil o modelo político sofreu as modificações. Getúlio Vargas foi deposto e os
ventos de uma tentativa de democratização voltaram. O Brasil começou a sentir os
efeitos da guerra fria e da bipolarização.
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Todos esperavam que o mundo entrasse numa infinita era de paz. Mas o que ocorreu é que as disputas sobre a hegemonia do mundo adquiriram outras características na guerra fria entre a União Soviética e os Estados Unidos (PEDRO, 1987, p. 66-67).
Pedro mostra que a esperança de um mundo de paz se desfez rapidamente
quando o mundo se bipolarizou ante os interesses hegemônicos das duas potências
do pós Segunda Guerra Mundial: EUA e União Soviética.
Desde a participação brasileira na Segunda Guerra Mundial, já se passaram
algumas décadas. O povo brasileiro passou a esquecer gradativamente este fato e a
negligenciar a influência direta em nossa vida. Os soldados brasileiros fizeram parte
deste martírio. Pessoas de várias regiões do Paraná, inclusive de Prudentópolis,
participaram da refrega italiana.
A vivência diária dos educandos não possibilitou visualizar a importância da
participação brasileira. Não perceberam que a Segunda Guerra Mundial, além de
uma guerra, foi um divisor de águas da História humana. Sendo o cenário
apresentado desta forma, é pertinente que a reflexão teórica seja feita, porém, para
que isso se concretize, deve ser motivada a participação do educando na construção
deste conhecimento.
Para tanto, a produção cinematográfica que busca ambientar algum período
histórico transforma-nos em espectadores, trabalhando com a imaginação,
reportando-nos a outro tempo. Por alguns momentos somos tragados a uma janela
em que podemos observar o mundo que já não parece nosso, mas que existiu e fez
parte da história humana. A ilusão e o prazer que os filmes provocaram nos alunos
os instigaram a procurar outros e outros filmes relacionados com os conteúdos
trabalhados.
Retomando o fato gerador do trabalho, foi proposta a reflexão sobre o
desfecho final do conflito. Buscando desconstruir algumas concepções e fazer o
aluno se questionar, projetou-se partes da obra filmítica A Queda! As Últimas Horas
de Hitler (HIRSCHBIEGEL, 2004). A biografia de Hitler, gerada no imaginário das
pessoas e vistas na reflexão, mostrou que os estudantes ainda percebem esse
homem quase como um monstro ou um ser mitológico.
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A preparação para o uso da obra alavancou o trabalho, já que algumas
inquietações não respondidas sobre a personalidade do Führer puderam ser
ressignificadas. Propôs-se aos educandos interagir com a obra, na escolha de um
personagem para si e acompanhá-lo durante toda a projeção, bem como o trabalho
dos artistas e do diretor na reconstrução histórica que planejou-se para aquela obra.
Os alunos observaram os personagens históricos sendo compreendidos como seres
humanos com dúvidas, incertezas e medos. Determinadas cenas do filme mostram a
cegueira das massas frente à verdade eminente do desfecho da guerra europeia,
com a Alemanha derrotada frente ao avanço dos Aliados. Perceberam, na câmera e
seus ângulos fechados, a história de pessoas reais, com seus medos, defeitos,
tristezas e não mitos construídos para serem estudados e laureados na história da
humanidade.
Finalizando, o estudante foi instigado a compor um final diferente para o
personagem escolhido e compartilhar com a turma. Compartilhando e refletindo, os
alunos perceberam o papel passivo do espectador e que as escolhas são feitos por
outros. Sendo assim, é muito pertinente saber como o emaranhado de informações
chegam até o espectador para poder interagir de forma ativa com a sociedade.
Esta motivação pode levar ao aprendizado, que no começo foi informativo e
ilustrativo, mas que se aprofundou e foi tomando corpo. Porém, é sempre pertinente
que a discussão seja pautada pelo entendimento do educador que ajuda a mostrar a
direção a ser tomada. Segundo Eduardo Morettin: “Um ponto merece ser destacado.
Aceita-se a ideia de que uma realidade (verso e reverso de uma sociedade) é
aprendida pelo filme e percebida, por sua vez, somente pelo historiador” (2003,
p.15).
Nunca podemos colocar a Educação a mercê de apenas uma tentativa de
ensino-aprendizado, mas sim buscar ajustes compatíveis com o tempo em que a
escola se insere e por ele buscar diferentes e renovadas estratégias de ensino-
aprendizagem. Nesse sentido, “O cinema, cabe ainda ressaltar, não deve ser
considerado como ponto de cristalização de uma determinada via, repositória inerte
de várias confluências, sendo o fílmico antecipado pelo estudo erudito” (MORETTIN,
2003, p.40).
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Como já dissemos, o imaginário na contemporaneidade é instigado pelas
fontes midiáticas. Faz-se necessário a busca de outros embasamentos teóricos para
poder recolocar a História no caminho do aprendizado problematizador, a partir da
construção coletiva do aprendizado, da crítica às fontes de formação e de
informação midiáticas. O profissional de História deve estar preparado para este
ensino, cercando-se de leituras e estratégias para empreender as críticas. Nesse
sentido, não cabe a uma cena, uma imagem ou um filme, o compromisso total da
educação histórica. A busca de embasar o educando da melhor e não da maior
quantidade de informação faz do mesmo um problematizador da sociedade em que
se insere como cidadão.
Mensurar o quanto as imagens irão impactar sobre os seres humanos e neste
caso nos educandos também é uma barreira, pois estando as ideologias escondidas
pela película ou fora delas, faz-se necessário uma avaliação e um entendimento
crítico do filme. No entanto, nem sempre isso é tarefa fácil para o educador. As
mídias estão presentes no seu cotidiano e o professor traz em si suas “verdades”,
assim: “diversos tipos de historiadores coabitam e constituem meios que, entre eles,
quase não se reconhecem” (FERRO, 2010, p. 26). Seja como for, os professores
podem, através da leitura e da crítica da fonte fílmica, direcionar o aprendizado. Isso
ocorre em outras tantas fontes que necessitam de interpretação, mas o uso do filme
faz as verdades parecerem algo ainda mais verdadeiro, visto o impacto causado
pelo uso da imagem/som. Ainda com Ferro:
É preciso dizer que a utilização e a prática de modos de escrita específica são, assim, armas de combate ligado à sociedade que produz o filme, à sociedade que a recebe. Essa sociedade se trai inicialmente pela censura em todas as suas formas, compreendendo-se aí também a auto-censura (FERRO, 2010, p. 18).
O autor afirma que a produção de um filme suscita rivalidades e
enfrentamentos nas opiniões contraditórias que a obra causa no espectador, a partir
da moral impressa pelo produtor na obra. Ocorre uma ação política de censura e de
autocensura da obra, pela sociedade e da ação que a ela causou.
Contrapor duas fontes filmíticas instigou os alunos a perceberem a
parcialidade existente na construção de um fato histórico. Para análise e reflexão da
Segunda Guerra Mundial na sua parcialidade de visões, primeiro do império japonês
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e do modelo norte americano no conflito, a invasão de Iwo Jima se fez pertinente
para a compreensão da Segunda Guerra Mundial, travada no Pacífico e Ásia.
A oportunidade de contrapor o mesmo contexto histórico e entender a guerra
segundo a perspectiva norte-americana e japonesa do conflito, fez os longas: A
Conquista da Honra (EASTWOOD, 2006) e Cartas de Iwo Jima (EASTWOOD,
2006), singulares, mesmo que as produções sejam norte-americanas, já que os
alunos perceberem estes parâmetros na pesquisa da fonte em sua produção.
Pode-se perceber através destas obras como o financiamento da máquina de
guerra estadunidense, com a fabricação de mitos, foi importante, mesmo que para
isso verdades tenham que ser fabricadas e estas estiveram relacionadas a foto da
bandeira norte americana sobre o monte Suribachi, em Iwo Jima. Foi levantado
também o racismo e o abalo psicológico existente entre as tropas norte americanas.
Além disso, o confronto das duas películas possibilitou aos educandos entenderem
que uma guerra, ou seja, um fato histórico, pode ter uma ou mais visões,
dependendo de quem as conta. Partindo deste pré-suposto, Cartas de Iwo Jima
(EASTWOOD, 2006) possibilitou entender que o código de honra do soldado
japonês era mais importante que a própria vida, em nome do imperador que era
mitificado como um deus, o Japão sacrificou seus jovens.
Com a projeção do filme Cartas de Iwo Gima (EASTWWOD, 2006) e A
Conquista da Honra (EASTWOOD, 2006), os educandos observaram a sociedade
norte americana, sua face em relação ao indígena, o negro e o branco, foi possível
comparar com a sociedade japonesa do mesmo período. Para o aluno foi importante
perceber a atuação da propaganda na captação de recursos, a formação dos mitos
como personagens criados e o interesse de quem os cria. Os educandos puderam
compartilhar uma cena escolhida e explicar os motivos das escolhas. Com a escolha
as cenas foram revistas e retomadas para a reflexão. Neste momento da
implementação, os alunos estudaram uma cena e a encenaram, comentando a
dificuldade de mostrar a emoção no papel ator.
Na reflexão que se seguiu os questionamentos mostraram que o respeito
pelos artistas aumentou, já que, por unanimidade, em sala de aula os alunos
partilharam a facilidade de ser espectador e a dificuldade de conceber e produzir
uma obra filmítica. A possibilidade de mostrar o filme em sua produção como fonte
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foi retomada, mostrando que quem as fabrica tem um interesse explicito ou implícito
sobre o espectador.
O enfrentamento produzido pela escolha de uma obra pelo educador, em
relação ao educando espectador, gera um conflito de desejos, possibilitando a
reestrutura do modelo pedagógico de aprendizado. Conduzindo um trabalho
criterioso a partir da fonte fílmica, o aluno discerniu novos conhecimentos e ampliou
sua capacidade crítica e analítica enquanto cidadão inserido no contexto social
internacionalizado de sua época, com capacidade de entender o mundo em que se
encontra. Por esta atitude, a possibilidade de formar uma sociedade democrática e
participativa se mostra possível no horizonte.
Um texto de análise do trabalho foi construído pelos educandos, a partir de
uma releitura de todas as atividades desenvolvidas. A mensuração ao aprendizado
que a unidade temática alcançou, mostrou a importância da fonte histórica, neste
caso específico a fonte cinematográfica, na escolha dos caminhos para a
aprendizagem e para manter o educando da EJA frequentando o CEEBJA de
Prudentópolis, com interesse e participação.
A importância do balanço das ações e a possibilidade de construir ou
reconstruir o conhecimento, ressignificar as ações e problematizar a construção do
aprendizado em História, desvelou novos caminhos a serem seguidos no uso de
novas possibilidades educativas. A amostra final mensurou possibilidades de
conhecimentos atingidos que no início deste trabalho não existiam. Estas
mensurações e reflexões finais foram possíveis a partir de um debate que contribuiu
para a construção, em dupla, de um texto avaliativo da implementação, onde erros e
acertos foram dimensionados. O crescimento do conhecimento sobre Segunda
Guerra Mundial e cinema como fonte foi sentida e possibilitou avaliar o trabalho de
forma positiva.
3. Considerações finais
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As reflexões, os questionamentos sobre a Segunda Guerra Mundial e as
possibilidades de fontes históricas alargadas, o vasto material cinematográfico, o
despertar do interesse pela História como algo vivo e presente, enfim, a metodologia
de ensino arregimentada pelo curso, mostrou-se relevante para o educando com
vontade de conhecimento e de formação enquanto ser humano. É possibilitando a
aprendizagem de um fragmento da História e de aprender o mesmo de várias
formas, buscando várias fontes, que o aluno passa a valorizar este conhecimento e
pode assim formar a sua identidade e contribuir para a construção democrática da
comunidade que está inserido.
Neste quadro de ideias defendidas e apresentadas neste artigo é que se pode
compreender os resultados do projeto proposto e realizado no CEEBJA de
Prudentópolis, com os alunos da educação de jovens e adultos, no ano de 2013.
Entretanto, implementar um projeto educacional como o Programa de
Desenvolvimento Educacional (PDE) demanda tempo e recursos, sendo que o que
possibilitou tal artigo, os estudos, as reflexões e as pesquisas, com o
embasamento teórico-metodológico, foi a possibilidade do afastamento de sala de
aula pelo período de preparação.
Expectativas de mostrar novas potencialidades com fontes históricas e a
possibilidade de ressignificar o papel do educando na relação ensino-aprendizagem,
de ligar o conhecimento a algo mais tangível, de buscar um novo viés, de maneira
nenhuma diminui o trabalho do historiador que derrama seu suor no chão da escola,
no dia a dia de educador de escola pública, que enfrenta dificuldades extremadas,
mas que com parcos recursos trabalha para a difusão do conhecimento histórico e
não dispõe de recursos, tempo e contribuição de um sistema educativo apropriado,
para inovar ao longo de uma jornada extenuante de trabalho.
Durante a implementação do projeto houve a comprovação de que é possível
educar de forma diferenciada, mas que tudo é possível quando existe qualidade,
tempo e embasamento teórico para isso. Nada ocorre sem um árduo planejamento e
estudo. Para implantar o projeto pedagógico que traz resultados e que modifica a
educação, o educador e o educando, são necessárias muita vontade e dedicação
para ousar e perceber que a educação é terreno fértil para a inovação. É preciso
muita vontade para modificar as práticas costumeiras e entender que o trabalho é
coletivo no conjunto educacional.
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Por fim, o estudo serviu para demonstrar que compreender, valorizar e
preservar as memórias dos que passaram na História serve para a construção de
uma consciência histórica, que pode, se for de nossa vontade ou possibilidade,
pautar nossas escolhas com maior lucidez, nos transformando em sujeitos históricos
conscientes e críticos dos caminhos e descaminhos da história, em especial das
histórias construídas a partir da arte cinematográfica.
4. REFERÊNCIAS
BALDWIN, Hanson W. Batalhas Ganhas e Perdidas. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército – Editora, 1978.
BILHARINHO, Guido. A Segunda Guerra no Cinema. Uberaba: Instituto Triangulino de Cultura, 2005.
CENTRO ESTADUAL DE EDUCAÇÃO BÁSICA PARA JOVENS E ADULTOS DE PRUDENTÓPOLIS. Projeto Político Pedagógico. Prudentópolis, 2011.
FERRO, Marc. Cinema e História. São Paulo: Paz e Terra, 2010.
LITZ, Valesca Giordano. O Uso da Imagem no Ensino de História. Curitiba: Universidade Federal do Paraná, 2009.
MORETTIN, Eduardo Victorio. O cinema como Fonte Histórica na Obra de Marc Ferro. In. História: Questões e Debates, n. 38, p. 11-42. Curitiba. UFPR, 2003.
PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação do Paraná. Diretrizes Curriculares da Educação Básica: História. Paraná, 2008.
PEDRO, Antonio. A Segunda Guerra Mundial. 5ª ed. Campinas: Atual, 1987.
RANZI, Serlei Maria Fischer. Cinema e Aprendizagem em História. In. Hist. Ensino, v-4, p. 25-33. Londrina, out. 1998.
SAVIANI, Demerval. Pedagogia Histórico-crítica. São Paulo: Cortez Editora/Autores Associados, 1991.
VIGEVANI, Tullo. A Segunda Guerra Mundial. 7ª ed. São Paulo: Moderna, 1991.
4.1 FONTES CINEMATOGRÁFICAS
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A QUEDA! As Últimas Horas de Hitler. Direção: Oliver Hirschbiegel. Produção: Bernd Eichinger. Alemanha: Europa Filmes, 2004. 1 DVD. (156 min) son., color.
CARTAS de Iwo Jima. Direção: Clint Eastwood. Produção: Clint Eastwood, Steven Spielberg, Robert Lorenz. EUA: Warner Bros Pictures e Dream Works Pictures, 2006. 1 DVD (140 min) son., color.
CÍRCULO de Fogo. Direção: Jean-Jacques Annaud. Produção: John D. Schofield. Alemanha/EUA/Reino Unido/Irlanda: Paramount, 2001. 1 DVD (131 min) son., color.
O RESGATE do Soldado Ryan. Direção: Steven Spielberg. Produção: Mark Gordon. EUA: Paramount Pictures, 1998. 1 DVD (169 min) son., color.
LENINGRADO. Direção: Aleksandr Buravsky. Produção: Sergei Melkumov, Alexandr Burovsky. Rússia/Inglaterra: Flashstar, 2009. 1 DVD (110 min) son., color.
4.2 SITES
CAGGIOLA, Osvaldo, Ernest. O sentido histórico da Segunda Guerra Mundial. Revista Olho na História, n.1. UFBA, Salvador, nov. 1995. Disponível em:<http://www.oolhodahistoria.ufba.br/sumario1.html>. Acesso em 10 de novembro de 2013.
MANDEL, Ernest. As causas da Segunda Guerra Mundial: os indivíduos e as classes sociais. Revista Olho na História, n.1. UFBA, Salvador, nov. 1995. Disponível em:<http://www.oolhodahistoria.ufba.br/sumario1.html>. Acesso em 10 de novembro de 2013.
NÓVOA, Jorge. Apologia da relação cinema-história. Revista Olho na História, n.1. UFBA, Salvador, nov. 1995. Disponível em:<http://www.oolhodahistoria.ufba.br/sumario1.html>. Acesso em 10 de novembro de 2013.