O lugar do camponês e questão agrária na Revolução Russa ... · presença na cena política de...

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2314 Rev. Direito e Práx., Rio de Janeiro, Vol. 08, N.3, 2017, p. 2314-2349. Ana Claudia Diogo Tavares e Mariana Trotta Dalallana Quintans DOI: 10.1590/2179-8966/2017/30243| ISSN: 2179-8966 O lugar do camponês e questão agrária na Revolução Russa de 1917 The place of the peasant and agrarian question in the Russian Revolution of 1917. Ana Claudia Diogo Tavares Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil. E-mail: [email protected]. Mariana Trotta Dalallana Quintans Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil. E-mail: [email protected] . Artigo recebido 1°/09/2017 e aceito em 10/09/2017.

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Rev.DireitoePráx.,RiodeJaneiro,Vol.08,N.3,2017,p.2314-2349.AnaClaudiaDiogoTavareseMarianaTrottaDalallanaQuintansDOI:10.1590/2179-8966/2017/30243|ISSN:2179-8966

OlugardocamponêsequestãoagrárianaRevoluçãoRussade1917TheplaceofthepeasantandagrarianquestionintheRussianRevolutionof1917.

AnaClaudiaDiogoTavares

UniversidadeFederaldoRiodeJaneiro,RiodeJaneiro,Brasil.E-mail:[email protected].

MarianaTrottaDalallanaQuintans

Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil. E-mail:[email protected].

Artigorecebido1°/09/2017eaceitoem10/09/2017.

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Resumo

NoanodocentenáriodaRevoluçãoRussade1917,oartigoprocurarevisitarosescritos

deVladimirIlitchUliánov(1870-1923),Lenin,sobreoscamponeseseaquestãoagrária

na Rússia ao longo dos acontecimentos que abalaram omundo no ano de 1917. Em

síntese, refletimos sobre as persistências e inflexões do pensamento lenineano que

influenciaramapráxisdopartidobolcheviqueemrelaçãoaocampesinato.

Palavras-chave:Revoluçãorussa;Camponeses;Questãoagrária.

Abstract

IntheyearofthecentenaryoftheRussianRevolutionof1917,thearticleseekstorevisit

thewritingsofVladimirIlitchUlyanov(1870-1923),Lenin,onpeasantsandtheagrarian

question in Russia throughout the events that shook the world in the year 1917. In

summary, we reflect on the persistences and inflections of Lenin's thought that

influencedthepraxisoftheBolshevikparty'sinrelationtothepeasantry.

Keywords:Russianrevolution;Peasants;Agrarianissue

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1.Introdução

Esseanocompletam100anosdaRevoluçãoRussa!Nesseanodecomemoraçãodesse

centenário,umasériededebates,seminários,filmeselivrostemsededicadoaresgatar

aconjunturaeaslutasdosrevolucionáriosqueabalaramomundoem1917naRússia1.

Nesse espírito o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) junto as

Universidade do estado do Rio de Janeiro (UFRJ, UERJ, UFF, UFRJ dentre outras),

realizarama jornadaUniversitáriaemDefesadaReformaAgrária (JURA)2 como tema

“Paz, pão e terra: contra a criminalização e a retirada de direitos.”3 Essa jornada

procurourelembrarascontribuiçõesteóricaseosepisódiosquemarcaramosdebatese

aconstruçãodosprojetospolíticossobreocampesinatoeaquestãoagrárianaRússia

de1917.Nessajornada,procurou-seresgataraprendizadoshistóricoscomosprocessos

revolucionáriosdoiníciodoséculoXXparapensarasresistênciasdotempopresentede

acelerados retrocessos em direitos, com mudanças legislativas que aprofundaram a

contra reforma agrária e a retirada de direitos sociais (como com as contrarreformas

trabalhistaseprevidenciária)noBrasil.

Como afirmado por Walter Benjamin em suas “teses sobre o conceito da

história”emmomentosdeperigo torna-seaindamais importantepesquisarahistória

dos vencidos, promovendo uma história a contrapelo, tirando do silêncio as lutas do

passadoqueficaramesquecidas,poisquantomaiselassãoescondidasmaissereforçaa

históriadosvencedores (BENJAMIN,2008).Dessa forma,emmomentosdeperigoaos

direitoscomoavançodoconservadorismopolíticoedoneoliberalismotorna-seainda

maisimportanterelembraropassado.

A questão agrária e os camponeses foram temas polêmicos no marxismo.

Hegedüs(1984)destacaque

A questão agrária nomarxismo se apresenta, em parte, como análise dasrelações de propriedade e de produção vigentes no modo de produçãoagrícola, mais ou menos diferentes das da indústria, com base nopressupostodequetambémodesenvolvimentodaagricultura, talcomoodetodaasociedade,ocorresoboinfluxodeleisrigorosas-queagemcoma

1ReferênciaaolivrodeJonhReed“Dezdiasqueabalaramomundo”(REED,1967).2EssajornadaocorreháquatroanosemdiferentesuniversidadesdoBrasilnoperíododeabrilprocurandopautarotemadaReformaAgrárianomeioacadêmicodandovisibilidadeatemática.3 “Paz, terra e pão” foi uma das palavras de ordem levantadas pelos revolucionários russos em 1917,denunciandoaguerra,oproblemaagrárioeafome.

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força das leis naturais – que a ciência deve iluminar. E em parte, porém,apresenta-se como questão camponesa, como complementação dainvestigação sobre a estrutura social. Segundo esta abordagem, oscamponeses constituemuma classede transição: por um lado, no sentidohistórico da transitoriedade – ou seja, os camponeses são uma formaçãoeconômico-social já desaparecida no Ocidente, o elemento criador dofeudalismo,mascontinuamaexistirtambémnocapitalismo-;poroutro,nosentido estrutural da transitoriedade, isto é, os camponeses constituemuma classe de transição entre as classes fundamentais do capitalismo, aclasse operária e a dos capitalistas. O marxismo, além disso, analisa aarticulação estrutural interna da classe camponesa e define nesta base arelação da classe operária, ou do partido da classe operária, com osdiferentesestratosdaclassecamponesa,formulandotambémosprogramasagrários dos partidos operários socialistas (ou social-democratas).(HEGEDÜS,1984,p.149).

Karl Marx analisou a questão agrária e camponesa ao longo de sua vida e

identificou possíveis tendências diferentes nos países da EuropaOcidental e Oriental.

(WALICKI, 1986). Omodelo de desenvolvimento do capitalismo na Inglaterra descrito

porMarxnoCapitalnãoseriamnecessariamenteosmesmosdaformaçãoeconômicae

social da Rússia, por exemplo. (PADILHA, 2009). Assim como, as análises sobre o

camponêsdeMarxno“O18Brumário”,naqualoautordescreveopapeldasdiferentes

classessociaisnogolpedeEstadodeLuizBonaparte,apresentandoocamponêscomo

“sacodebatatas”,umamassaamorfa,muitasvezesconservadora,cujaconsciênciateria

de ser despertada e a prática guiada pelo proletariado (MARX, 1987). Entretanto, as

cartasdeMarxemrespostaaVeraZasulich4,manifestavam-seemoutrosentidosobrea

dinâmicanaRússia.Nestascartas,Marxafirmavaqueacomunacamponesarussanão

estavaameaçadaaumafatalidadehistóricaequedelapoderiainiciarmudançasparao

comunismo. Destacava os hábitos camponeses não como conservadores, mas, a

propriedade comunal, com características diferentes da propriedade capitalista.

Sinalizava também as peculiaridades dos camponeses dos diferentes países, em

especial, as diferenças dos países da Europa Ocidental e Oriental. Marx apontou a

comuna camponesa russa como “ponto de apoio natural da regeneração social da

Russa”(MARX,2005,p.123)

Esse debate presente na teoriamarxista irá perpassar as análises de Vladimir

IlitchUliánov(1870-1923),Lenin,querefletiusobreaquestãoagráriaecamponesaao

longo do desenrolar dos acontecimentos que marcaram a Revolução Russa de 1917.

4NoperíododessacorrespondênciaVeraZasulicheraumapopulistarussa.

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Esseéumtemaquesempreretornaaosdebatescontemporâneos,especialmentecoma

presençanacenapolíticademovimentoscamponesesedetrabalhadoresrurais.

Nesse artigo, apesar de não sermos historiadoras, nem pretendermos realizar

uma revisão da historiografia sobre o tema, buscamos revisitar os escritos de Lenin

sobre o campesinato e a questão agrária na Rússia, dando especial atenção às

formulações feitas ao longo do ano de 1917. O artigo encontra-se dividido em duas

partes, além dessa introdução e das considerações finais. No próximo ponto é

apresentado, por meio de revisão bibliográfica em fontes secundárias, o contexto

agráriorussoanteriora1917.NoterceirotópicosãoanalisadososescritosdeLeninem

meioaosacontecimentosde1917.

Nas considerações finais buscamos avaliar as persistências e inflexões do

pensamentolenineano,queinfluenciaramapráxisdopartidobolcheviqueao longoda

RevoluçãoRussa.

2. Lenin e as reflexões sobre o desenvolvimento do capitalismo na Rússia e o

campesinato

As peculiaridades do campesinato na Rússia, conforme Silva (2012), estão na base de

concepções divergentes sobre a permanência ou a decomposição do campesinato no

processo de desenvolvimento capitalista russo. Conforme Silva (2012), medidas

governamentaisedispositivoslegaisaolongodoséculoXIXfomentaramapermanência

decamponesesemsuascomunidades(mir),preservandoacomunaruralrussaeabaixa

produtividade,embora,gradualmente, tivesse início“umprocessodediferenciaçãoda

massacamponesa”(p.113).

Conformeaautora,aantigapolêmicasobreacomunaruralrussaressurgiraem

meadosdoséculoXIX:“Àesquerda,ospopulistasacreditavamqueelapoderiaterum

lugarnaconstruçãodosocialismo.Àdireita,acreditava-sequeelaeracompatívelcomo

desenvolvimento capitalista” (Silva 2012). Para os populistas, “a Rússia não precisaria

passarporumafasedecapitalismoparaatingirosocialismo”,poisacomunacamponesa

eradotadadequalidades, comoademocraciadiretaeaproteçãodos indivíduospelo

coletivo, que tornavam indesejável sua substituição pela economia e democracia

ocidentais(Silva,2012).

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Lenin,em1896,escreveuolivro“OdesenvolvimentodocapitalismonaRússia”,

procurandodesconstruirastesesdospopulistas,apartirdaanalise,pormeiodedados

estatísticos,da formaçãodomercado internoparaocapitalismorusso,observandoas

mudanças ocorridas na agricultura após a reforma promovida em 1861 pelo Czar

AlexandreII.5CabedestacarqueoImpérioRussofoioúltimoEstadoeuropeuaabolira

servidãoequeatémeadosdo séculoXIXa comunacamponesa russa (mir)6 foipouco

alterada. Apenas com a Reforma de 1861 que o regime de servidão começou a ser

abolido.Silva(2012,p.)explicaqueessa

reformapreviaqueossenhoresvenderiamaoscamponesesasparcelasdeterras que eles já ocupavam. Por sua vez, o Estado pagaria aos senhoresumaquantiaapretextodeindenizaçãopelasterras“perdidas”comavendaaos camponeses. Quanto ao estatuto destes, estabeleceu-se um estágiotransitório:nãoadquiririamodireitodepropriedadeprivadasobrea terracomprada,permanecendocomomembrosdeumacomunaedeumgrupodoméstico.Acomunacontinuavaresponsávelpeladistribuiçãodaterraaosgrupos domésticos e seus integrantes. Os membros da comuna pagariamum imposto coletivo (“responsabilidade coletiva”) e ninguém poderiarenunciaràsobrigaçõesdesuacomuna,mesmoestandoincluídonaminoriaque conseguia permissão para residir em outro lugar. Entre as outrasobrigaçõesmantidaspelacomuna,estavaasseguraropagamentododébitocontraído comoEstadopelas terras adquiridasdos senhores. Esteestágiotransitório, que deveria ser breve, perdurou pormuitomais tempo que oprevisto. Durante o processo de emancipação, o campesinato foiexpropriado de uma parte de suas terras, as quais, chamadas de otrezki,passaram aos senhores, deixando os camponeses com terra insuficiente(cerca de três quartos deles dispunham de menos de 25 acres) e sem apossibilidade de usar a maior parte das florestas e das terras comuns. Oobjetivo da medida era justamente obrigá-los a trabalhar nas terras dossenhores para garantir sua subsistência. Em muitos casos precisaramrecorreraoalugueldaterradossenhoresoudoskulaks.Emcertasregiões

5Leninexplicanoprefácioàprimeiraediçãodo“OdesenvolvimentodocapitalismonaRússia”,quesóteveacessoao livrodeKautsky, “Desenvolvimentodaagriculturanasociedadecapitalista”,apósa redaçãodeseulivro.SegundoLeninessaobraeraaliteraturamaisnotáveldaeconomiamodernadepoisdoCapitaldoMarx. Leninapontavaqueera as característicasdoprocesso vivenciadonaEuropaOcidental erammuitosemelhantesaoprocessodedesenvolvimentonaRússia,apesardoautordestacarque“apesardetodasasparticularidade, econômicas e não-econômicas” que se observamna Rússia. (LENIN, 1988, p.6.) SegundoLenin,aindanoprefácioàprimeiraediçãododesenvolvimentodocapitalismonaRússia,nessaobraKautskycompreende como impensável uma passagem da “comunidade rural a uma organização comunitária dagrande agricultura moderna”. (LENIN, 1988, p.7). Lenin nesse momento de sua obra aponta na mesmadireçãoaopolemizarcomospopulistasrussos,queatribuíamcaracterísticassocialistasàcomunarural,paraLeninocampesinatoestavaemdecomposiçãoe,portanto,essascomunastambém.6Omireraumacomunidadedealdeiaquetinhapodersobreasterrasdoscamponeseseasdistribuíaentreseusmembrossegundodiversoscritériosquesupostamentemantinhamcerta igualdadeentreas famíliascamponesas.Paraefeitodedistribuição,aunidadeeraafamília.Calcula-segeralmentequenocomeçodoséculoasglebasassimdistribuídasrepresentavamcercadametadedasterrascultivadas;asterrasrestanteseram: terras dos proprietários rurais, dos camponeses desligados do mir, as terras de colonização(principalmente situadas nas regiões conquistadas havia um século pela Rússia czarista), e as terras doEstado,dacoroaedasinstituiçõesreligiosas(Bettelheim,1979,p.190e193-194apudSilva,2012).

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faziam-noemtrocadeprestaçãodetrabalho,revivendoemparteaantigacorveia. Em outros casos empregavam-se temporariamente comoassalariados nas indústrias ou no campo para complementar a rendafamiliar (Kemp, 1987, p.153). Tanto nas terras do Estado como naspropriedades dos senhores, os antigos servos continuaram obrigados aempenharboaparceladosseusrendimentosnopagamentode impostoseno ressarcimento das terras recebidas. De um modo geral, a terra foiavaliadaacimadopreçodemercado.Ainsatisfaçãogeradapelareformafoigrande, uma vez que os camponeses consideravamque estavampagandoporterrasquejáeramdeles(Gerschenkron,1976,p.119).

Analisando essas mudanças Lenin (1988) identificou um processo de

decomposição dos pequenos agricultores em patrões e operários agrícolas que

constituiriamabasedaformaçãodomercadointernonaproduçãocapitalista.Leninno

livro“DesenvolvimentodocapitalismonaRússia”explicaque

Osistemaderelaçõeseconômicasesociaisentreocampesinato(agrícolaecomunitário) mostra a existência de todas as contradições próprias daseconomias de mercado e de qualquer capitalismo: a concorrência, a lutapela independência econômica, a monopolização da terra (comprada ouarrendada), a tendência à concentração da produção nas mãos de umaminoria, a proletarização da maioria e sua exploração pela minoria quedispunha do capital comercial e que emprega operários agrícolas (LENIN,1988,p.113).

Dessa forma, segundo Lenin (1988) a reforma de 1861 foi uma reforma

anticamponesa,quepromoveua“desintegraçãodocampesinato”eacriaçãodenovos

tiposdepopulaçãorural,oautorexplicaqueo“campesinatoantigonãose'diferencia'

apenas: ele deixa de existir, se destrói, é inteiramente substituído por novos tipos de

população rural, que constitui-se a base de uma sociedade dominada pela economia

mercantilepelaproduçãocapitalista.Essesnovostipossãoaburguesiarural(sobretudo

pequenaburguesia)eoproletariadorural–aclassedosprodutoresdemercadoriasna

agriculturaeaclassedosoperáriosagrícolasassalariados”(LENIN,1988,p.114).

Em1903,LeninduranteaelaboraçãodoProgramadoPartidoOperárioSocial-

Democrata Russo (POSDR)7 assinalou as especificidades da questão agrária na Rússia

comrelaçãoaospaísesdaEuropaocidental.Silva(2012)pontuaqueLenin

insistia nas particularidades da Rússia, onde o campesinato ainda nãohavia se libertado da opressão feudal. Em consequência, sem deixar de

7No II Congresso do POSDR (1903), o partido se dividiu emduas frações,mencheviques e bolcheviques.(PADILHA,2009).

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pôr o acento sobre a luta de classe entre os capitalistas agrários e oproletariado rural, assinalava a necessidade de a luta no campo sedesenvolver em dois planos: o plano da luta camponesa contra osresquíciosdofeudalismoeoplanodalutadeclassesentreoscapitalistasagrárioseosassalariadosagrícolas.NaRússia,ocamponêsaindasofriaemconsequênciadaexistênciaderelaçõesdeproduçãopré-capitalistasedassobrevivências do regime de servidão, enquanto no Ocidente ocampesinato já deixara de lutar contra o absolutismo e os vestígios daservidãoporqueestava imersonuma sociedade capitalista (Lenin, 1959).EssaparticularidadedasituaçãonaRússiafoireconhecidanoProgramade1903,ondeoapoioàlutacamponesacontraosrestosdoregimefeudalépropugnado, inclusive como “última tentativa”, “porque o própriocapitalismorussoemseudesenvolvimentorealizaespontaneamenteessemesmo trabalho”, sóqueo fazpelo caminhoda violênciaedaopressão(Lenin,1966c,p.149).(SILVA,2012,p.10-11)

NaanálisedeSilva(2012,p.p.15)

oprocessodediferenciaçãosocialentreoscamponesesapenascomeçarae ainda não assumira a forma de uma contradição de classe entrecapitalistas agrários e proletariado agrícola. A verdadeira luta de classeocorriaentreamassacamponesadeumaparteeosgrandesproprietáriosdeterrasdeoutra.

Wolf (1984) destaca que no período pré-Revolução de 1905 episódios de

insurreição camponesas, como em Vitebsk, na Rússia Branca, onde “os camponeses

exigiram a publicação da ‘verdadeira’ Proclamação da Emancipação de 1861”. As

sublevações camponesasespalharam-sepela regiãoagrícola centrale,embora fossem

localizadas,possuíam“asmesmasexigênciasbásicas:aboliçãodocontroleoficialsobre

avidacamponesa;términodospagamentosderedenção,abrandamentodosimpostos

e repartição de terras”. Iniciavam-se as organizações de “sindicatos camponeses,

estimulado no verão, pelos liberais dos zemstvose pelos revolucionários profissionais

que viviam nas zonas rurais”, que instigavam “os camponeses a ocupar terras

pertencentesaosproprietáriosdeterraserecusar-seapagarosimpostos”.

Em finsde julho, foiorganizado,numa reuniãode100camponesese25membros da inteligentsia de Moscou, um Sindicato Camponês para aRússia toda. Emnovembro, esse Sindicato Camponês já possuía 200.000membros, em 26 províncias. Dentro dos sindicatos camponeses nota-seumprocessoqueserepetiriaem1917,comgravesconseqüênciasparaadistribuiçãodopoderpolítico:osdelegadoscamponeseslocaisrevelaramser muitíssimo mais radicais que a liderança central. Em princípios denovembro, na segunda reunião do Sindicato Camponês, esses delegadosexigiram o uso da violência e a tomada e partilha das terras, sem

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compensação. Essas exigências radicais encontraram eco no soviet queforaorganizadonaárea industrialdeS.Petersburgo. (Wolf,1984,versãodigital).

Nesses anos, Lenin analisando as especificidades da Rússia defendia a

importância das alianças do proletariado com o campesinato para rupturas

revolucionárias com o Estado autocrático, Lenin compreendia que os “camponeses

russoseramrevolucionáriosdopontodevistademocrático-burguês”(PADILHA,2009,p.

53).8Padilha(2009)destacaque

Lenin (1981d, p.355) entende que a social-democracia deveria voltar osolhos para o movimento camponês, indicando-lhe tarefa dupla: deveriaapoiaressemovimentoenquantosetratardeummovimentodemocráticorevolucionário, mas deveria ser inflexível do ponto de vista de classe,mostrando que os interesses da burguesia camponesa são antagônicoscomrelaçãoaoproletariadorural.(PADILHA,2009,p.50-51).

Aautoraexplicaquenodecorrerarevoluçãode1905,asformulaçõesdoPOSDR

passarama apoiar “a ação revolucionária dos camponeses até chegar ao confiscodas

terras dos latifundiários, reconhecendo a revolução burguesa como revolução agrária

camponesa.” (PADILHA,2009,p.70).Tambémressaltaqueessaformulaçãosuscitouo

debate na social democracia russa se ela “deveria apoiar: a partilha de terras dos

latifundiários, entregando aos camponeses em forma de propriedade ou; a

municipalização das terras dos latifundiários ou; a estatização de todas as terras.”

(PADILHA,2009,p.70).

Nesse debate Lenin defende a estatização de todas as terras, com a

nacionalizaçãodasterraseapropriedadeconcedidaaoEstado,como“efetivarealização

da revolução agrária camponesa na Rússia, sendo o único meio de acabar com o

feudalismo na agricultura e melhor regime agrário concebível sob o capitalismo.

(PADILHA,2009,p.71).

Entretanto, as reformas agrárias realizadas Stolípin não alteraram

substancialmente as estruturas tradicionais no campo, mantendo os camponeses na

pobreza(PADILHA,2009).

O objetivo desse tópico do artigo foi de forma sintética apresentar o cenário

agrário russo e os debates no contexto anterior a 1917. ConformeWolf (1984), três 8 Concomitantemente a essas insurgências camponesas, várias greves operárias eclodiam pela Rússia(PADILHA,2009).

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fatorespredominantesesincronizadosdeterminaramoêxitodaRevoluçãode1917que

derrubouoEstadoczaristaeassuasclasses:“odesenvolvimentodagrevedasmassas

operárias na indústria, a intensificação das desordens camponesas; e a deserção em

massadoexército,composto,principalmente,deoperáriosecamponeseschamadosàs

armas”,assimcomoem1905.NopróximotópicodaremosatençãoàsanalisesdeLenin

aolongodosacontecimentosquemarcaram1917.

3.AsanálisesdeLêninsobreocampesinatoeaquestãoagráriaapartirdaRevolução

defevereirode1917

Em1917,emplenoperíodorevolucionárionaRússia,Leninescreveradiversostextose

obrasqueficaramconhecidascomoasTesesdeAbrileolivroOEstadoeaRevolução,

comoobjetivo, conformedestacaFernandes (1978,p.10),de libertaromarxismode

umatradiçãooportunista,representadaporautorescomoLassalle,Bernstein,Kautskye

Plekhanov, bem como travar um combate teórico com os anarquistas. Portanto, as

várias obras escritas nesse período possuem um cunho didático “de esclarecer a

consciênciasdasmassaspopularesedasclasses trabalhadores” (FERNANDES,1978,p.

10).

JoséPauloNetto(2010,pp.158-159)percebeque:

aunidadeinternadopensamentolenieano,mantidaeasseguradaporumpeculiar manejo metodológico do marxismo (tomado como “análiseconcreta da situação concreta”), alimenta-se de giros e inflexões; é umaunidade que não se constrói de identidades, mas de diferençasdeterminadas pelo movimento do objeto de sua reflexão, sempre apolítica.

Um desses giros foi provocado pela primeira Guerra Mundial, deflagrada em

1914,oquelevouLêninaavaliarqueestavampostasascondiçõesparaumarevolução

socialistaemâmbitomundial(Netto,2010).

A partir de semelhantes pressupostos teórico-metodológicos, Linhart (1983)

procura,adespeitodasformulaçõesdeLêninsobreocampesinatoeaquestãoagrária

na Rússia no período anterior à Revolução Russa, explicar as tomadas de posição e

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mudanças nas formas de compreensão do próprio campesinato no desenrolar dos

acontecimentoshistóricosapartirdefevereiro-marçode1917.

O enfrentamento de linhas políticas sobre a questão agrária ocorre desde

fevereiro-março de 1917, após a derrubada do czarismo, e inclui o debate sobre

nacionalizaçãoourepartiçãodasterrasentreosdiversosgrupospolíticosnossovietes,

sem a participação do campesinato, que naquele momento se limitava a realizar

pontualmentealgunsatosdepilhagem justificados,masqueparaamassacamponesa

“nãoestabelecemumnovodireito”,poisparaela

overdadeirodireitoencontraseusfundamentosnotrabalhodeplantioena semeadura, na longa caminhada arquejante através da qual ocamponês, em cada sulco, em luta conta a terra pesada e pedregosa,arrancaapossibilidadedassubsistênciasdopróximoano(LINHART,1983,P.25).

Opensamentocoletivodocampesinatotomaformalentamenteesecondensa

entreagostoeoutubrode1917,quando

uma ideia simples toma conta da imensa massa camponesa e vai,novamente, derrubar a Rússia: é preciso agir agora, no momento dostrabalhosdoplantio.Éagoraquecabeanós,camponeses,tomarasterrassenhoriais,marcando-ascomnossotrabalhoeestabelecendoassimnossodireito(Linhart,1983,p.25).

E énesseperíodoqueasmassas camponesaspassarama tomaras terrasdos

senhores9,

proíbem pela força os trabalhos dirigidos pelos proprietários de terras,realizamdeacordocomseusinteressesevontade,ostrabalhosdeplantioe semeadura, fazem por sua conta o corte de lenha nas florestas dossenhores.Omovimentodemassacamponêsdecideresolveràsuamaneiraa“questãoagrária”.Éa“divisãonamarra”(Linhart,1983,p.25).

Aaçãocamponesa,conformeLinhart(1983),levouaRevoluçãoapassarporum

momento decisivo, de teste das forças e indivíduos que participaram da ação

revolucionária.Nessemomento,“emquesecolocavapraticamenteaquestãodeapoiar

oureprimiromovimentorevolucionáriodemassadoscamponeses,somenteLenineo

9Conformeasestatísticasoficiais,emmaioforamcercade150casosdetomadasdeterrapelaforça,emagostoquase500eemsetembropertode1.000(Carr,s/d,t.2,p.40,apudLinhart,1983,p.30).

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partidobolcheviquesecolocaram,de fato,ao ladodoscamponeses” (Linhart,1983,p.

26).Defenderam,naocasião, “a insurreiçãoarmadacontraogovernoprovisório,para

salvareprotegeromovimentodemassa”(Linhart,1983,p.27).

Ao lermososescritosdeLeninnoperíodo,entretanto,vemosqueadefesada

insurreiçãoarmadacomeçaaseesboçarapartirdo finalde julhode1917,quandoas

análises de Lenin apontam para uma viragem na revolução que tornara

temporariamente obsoleta a palavra de ordem “Todo poder aos sovietes!”, então

dominadoseesvaziadospelosmencheviquesesocialistas-revolucionários.

Linhart (1983), diante da tomada de posição prática de Lenin em defesa do

campesinato,consideraserumalendaatribuiradefesadosinteressescamponesesaos

socialistas-revolucionários (SRs) e o desconhecimento dos problemas rurais aos

bolcheviques, que teriam realizado uma aliança efêmera com o campesinato no

momento do golpe de Estado de outubro. Para Linhart (1983), houve um

entrecruzamentoentrearevoluçãodefevereiroeadeoutubrode1917,nosseguintes

termos:

No começo, na ausência do movimento de massa camponês, os SRsdefendiamdecididamenteumalinhaderepartiçãodasterrasquepareciater a simpatia do mundo rural. Quanto aos bolcheviques, hesitavam eLenin não escondia suas dúvidas sobre o papel do campesinato naRevolução.Emseguida,namedidaemqueas“desordens”explodiramnocampo, os SRs – que participaram no governo provisório – tornavam-semais prudentes, depois francamente hostis. Repartição sim, diziam elesagora, mas na legalidade. Nada de entregar a tarefa à inciativa dospróprios camponeses: é preciso esperar a Assembleia Constituinte.Quanto aos bolcheviques, faziam o trajeto inverso: os camponeses têmrazãodeserevoltaretomarasterrassemesperar.Enamedidaemqueavontade das massas começa a se formar na prática, nós, bolcheviques,apoiamoso“projetodedecreto”sobreaterraqueosSRsapresentarameque foiadotadopelosdeputadoscamponeses.Mas,paradoxo,osSRs, jápreocupadoscomosmovimentosespontâneosnocampo,defendemseupróprio projeto apenas da boca para fora, no momento em que osbolcheviquessetornamseusardorosospropagandistas.(Linhart,1983,p.28).

LinhartsublinhaumahesitaçãodeLeninemrelaçãoàquestãoagrárianasTeses

de abril e um programa agrário doutrinário, defendendo nacionalização, grandes

fazendas-modelo nas antigas terras senhoriais, apoio aos camponeses pobres e não a

repartição,(1983,p.29),masconsideraqueessaspropostasnãosãoessenciais,poiso

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maior interesse de Lenin não está nos projetos de lei agrária,mas nomovimento de

massadoscamponeses10.

Defato,emdiversosescritosdeLenindoperíodopercebe-seessapreocupação

com a adesão dos setores pobres ou semiproletários dos camponeses. Nas Teses de

Abril, contidas no artigo Sobre as Tarefas do Proletariado na Presente Revolução, ao

tratar da atitude perante a guerra imperialista e das condições que justificariam o

defensismo revolucionário menciona a “passagem do poder para as mãos do

proletariadoedossetorespobresdocampesinatoqueaeleaderem”(LENIN,1977a,t.2,

s.p.,grifosnossos).

Enquanto o partido permanecesse em minoria na maior parte dos Sovietes,

consideravaquea tarefadosbolcheviquesseriaexplicaràsmassasqueosSovietesde

deputadosoperários(SDO)seriam“aúnicaformapossíveldegovernorevolucionário”,

ou seja, “um trabalho de crítica e esclarecimento dos erros, defendendo ao mesmo

tempo a necessidade de que todo o poder de Estado passe para os Sovietes de

deputadosoperários,afimdeque,sobreabasedaexperiência,asmassasselibertem

dos seus erros” (LENIN, 1977a, t. 2, s.p.). Defendia, dessa forma, "uma república dos

Sovietesdedeputadosoperários,assalariadosagrícolasecamponesesemtodoopaís,

desdebaixoatéacima”(LENIN,1977a,t.2,s.p.).

A sexta tese trata do programa agrário e propõe: “transferir o centro de

gravidade para os Sovietes de deputados assalariados agrícolas”, a “confiscação de

todasasterrasdoslatifundiários”,alémda

Nacionalização de todas as terras do país, dispondo da terra os Sovieteslocais de deputados assalariados agrícolas e camponeses. Criação deSovietes de deputados dos camponeses pobres. Fazer de cada grandeherdade [...] uma exploração-modelo sob o controle dos deputadosassalariadosagrícolaseporcontadacoletividade(LENIN,1977,t.2,s.p.).

Ao desenvolver as teses sobre os Programas Agrário e Nacional, no artigoAs

tarefas do proletariado em nossa revolução (Projeto de Plataforma do Partido

Proletário),escritoem10(23)deAbrilde1917,Lenindemonstracautelaaoafirmar:

10 Nessesentido,sevaledetrechosdasCartassobreatáticaescritasporLeninemabrilde1917,emqueele tratadasdiversaspossibilidadesdeaçãodoscamponeses, considerandoquenaquelemomentohaviacolaboraçãode classeentreo campesinatoe aburguesia, aomesmo tempoemqueadverte: “quandoocampesinato se separar da burguesia, tomar a terra e o poder apesar da burguesia, teremos então umanova etapa da revolução democrática burguesa, que será preciso tratar em separado” (Lenin, ObrasCompletas,tomoXXIV,1977,p.462,traduçãonossa).

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Nomomentoatualnãopodemossabercomprecisãose sedesenvolveránumfuturopróximoumapoderosarevoluçãoagrárianocamporusso.Nãopodemos saber precisamente quão profunda é a divisão de classe docampesinato, acentuada, indubitavelmente, nos últimos tempos, emoperáriosassalariadospermanentese temporáriose camponesespobres(semiproletários),porumlado,ecamponesesricosemédios(capitalistasepequenoscapitalistas),poroutrolado.Sóaexperiênciadáepodedararespostaaestapergunta(Lenin,1978,t.2,p.21-48).

Apesardeapelarparaaexperiênciafuturaarespostasobreapossibilidadedese

desenvolver uma revolução agrária no campo russo e a profundidade da divisão de

classe do campesinato, afirma que “como partido do proletariado temos a obrigação

absoluta não só de apresentar semdemora umprograma agrário (sobre a terra)mas

tambémdedefendermedidaspráticasderealizaçãoimediatanointeressedarevolução

agráriacamponesanaRússia”(Lenin,1978,t2,pp21-48).Eassim,reiteraaspropostas

de nacionalização de todas as terras, que passariam à propriedade do Estado, com

algumasressalvas:

Mastodaadisposiçãodaterra,todaadeterminaçãodascondiçõeslocaisdasuaposseeusufrutonãodeveencontrar-sedemodoalgumnasmãosdaburocracia,dosfuncionários,masplenaeexclusivamentenasmãosdosSovietesdedeputadoscamponesesregionaiselocais.Paramelhoraratécnicadaproduçãodecereaiseaumentaraproduçãoetambém para desenvolver as grandes explorações agrícolas racionais eefetuar o controlo social sobre elas, devemos procurar, dentro doscomités de camponeses, transformar cada herdade latifundiáriaconfiscadanumagrandeexploraçãomodelo, sobocontrolodosSovietesdedeputadosassalariadosagrícolas(Lenin,1978,t2,pp21-48).

Em contraposição ao defendido pelos socialistas-revolucionários sobre a

“socializaçãodaterra”,Leninafirmavaque“opartidodoproletariadodeveexplicarque

o sistema da pequena exploração, no regime de produção mercantil, não está em

condiçõesdelibertarahumanidadedamisériadasmassasedasuaopressão”,alémde

“explicar a necessidade de Sovietes especiais de deputados assalariados agrícolas e

Sovietesespeciaisdedeputadoscamponesespobres(semiproletários),ou,pelomenos,

conferências especiais permanentes dos deputados destes sectores de classe, como

fracções ou partidos especiais dentro dos Sovietes gerais de deputados camponeses”,

comoobjetivodeevitar“oenganodasmassassemterrapeloscamponesesricos,que

representamapenasumavariedadedecapitalistas”(Lenin,1978,t2,pp21-48).

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NaResolução Sobre aQuestão Agrária, de 13 deMaio (30 de Abril) de 1917,

adotadanoâmbitodaVIIConferência(deAbril)deTodaaRússiadopartidobolchevique

(POSDR)11, realizadaemPetrogradode24 a 29deAbril (7 a 12deMaio) de1917, as

tesesde Lenin sãoassumidaspelopartidobolchevique,quecaracterizaapropriedade

latifundiária da terra na Rússia como “o baluartematerial do poder dos latifundiários

feudais e uma garantia da possível restauração da monarquia” e a propriedade

camponesada terra comoenredadaem“velhos vínculos e relaçõesde semi-servidão,

peladivisãodoscamponesesemcategoriasherdadasdotempodoregimedeservidão,

fragmentação dos lotes, etc”, sendo necessário “reestruturar todas as relações da

propriedadeda terraedaagriculturadeacordocomasnovascondiçõesdaeconomia

nacionalemundial”,oqueconstituiria“abasematerialdaaspiraçãodocampesinatoà

nacionalizaçãodetodasasterrasnoEstado”.

Quantomais decidida e consequente for a destruição e a eliminação dapropriedade latifundiária da terra, quanto mais resoluta e consequentefor, em geral, a transformação agrária democrático-burguesa na Rússia,tanto mais forte e rápido será o desenvolvimento da luta de classe doproletariadoagrícolacontraocampesinatorico(aburguesiacamponesa).NamedidaemquearevoluçãoproletáriaquecomeçaasurgirnaEuropanãoexercerumainfluênciadiretaepoderosasobreonossopaís,asorteeo desenlace da revolução russa dependerão de se o proletariado urbanoconseguirálevaratrásdesioproletariadorurale ligaraesteamassadesemiproletáriosdocampo,oudeseessamassaseguiráatrásdaburguesiacamponesa, propensaaaliar-se [...] comos capitalistase latifundiáriosecomacontra-revoluçãoemgeral.(grifosnossos)

Portanto, é reiteradamente presente nos textos lenineanos a leitura de que a

revolução russa dependeria de uma adesão do proletariado rural e da massa de

semiproletáriosdocampo(porvezestratadoscomosetorespobresdocampesinato)ao

proletariadourbano(avanguardarevolucionária).

11Conformenotadefimdetomo:“FoiaprimeiraconferênciadoPartidorealizadaemcondiçõeslegais.NaConferência participaram 133 delegados com voto deliberativo e 18 com voto consultivo, de 78organizações partidárias. Pela sua representatividade e pelas suas tarefas políticas e organizativas, aConferênciadesempenhoudefactoopapeldeumcongresso,tendoelaboradoumalistapolíticaparatodoo Partido e formado os seus órgãos dirigentes. [...] A Conferência elegeu o Comité Central do Partido,encabeçado por Lênin. A importância histórica da Conferência de Abril consiste em que ela adoptou oprograma leninista de passagem à segunda etapa da revolução na Rússia, traçou o plano da luta pelatransformação da revolução democrática burguesa em revolução socialista, avançou a reivindicação dapassagemdetodoopoderparaosSovietes.Foisobestapalavradeordemqueosbolcheviquesprepararamasmassasparaarevoluçãoproletária”.

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Entre as “tarefas do proletariado”, ao contrário do discurso dos socialistas-

revolucionários e de Sovietes de deputados operários e soldados, estaria “exortar os

camponesesaefetuarsemdemoraeporiniciativaprópriaastransformaçõesagráriase

a confiscação imediata das terras dos latifundiários por decisão dos deputados

camponeses das localidades” (Lenin, 1977a, t. 2, p. 86 a 88). Também está presente

desdeabrilapreocupaçãocoma insistência“nanecessidadedeaumentaraprodução

de alimentos para os soldados na frente e para as cidades, em que é absolutamente

inadmissível destruir ou causar danos ao gado, alfaias, máquinas, edifícios, etc, etc”

(Lenin,1977a,t.2,p.86a88).

Entreasresoluçõesdopartidobolchevique,queabarcaramaspreocupaçõesde

Lenin,emsíntese,pode-seler,comoprimeiroponto:

“Opartidodoproletariadolutacomtodasasforçaspelaconfiscaçãoimediatae

completa de todas as terras dos latifundiários da Rússia (assim como as terras de

apanágio,daIgreja,dacoroa,etc,etc)”12(Lenin,1977a,t.2,p.86a88).

Emseguida,lê-se:

2.Opartidopronuncia-se resolutamentea favordapassagem imediatadetodas as terras para asmãos do campesinato, organizado em Sovietes dedeputados camponeses ou em outros órgãos de auto-administração localeleitos de modo plena e realmente democrático e plenamenteindependentesdoslatifundiáriosefuncionários.3. O partido do proletariado exige a nacionalização de todas as terrasexistentesnoEstado;significandocolocarodireitodepropriedadedetodasasterrasnasmãosdoEstado,anacionalizaçãocolocaodireitodedispordasterrasnasmãosdasinstituiçõesdemocráticaslocais(Lenin,1977a,t.2,p.86a88).

NoRelatóriosobreaquestãoagrária,constaadefesadeLeninsobreainversão

de ordem dos pontos 2 e 3, alegando que “para nós é importante a iniciativa

revolucionária,ealeideveserresultadodela.Seesperardesquealeisejaescritaenão

desenvolverdes vós próprios energia revolucionária, não tereis nem lei nem terra.”

(Lenin,1977a,t.2,p.82a85).

12 Esse ponto foi alterado em relação ao projeto de resolução, em que se propunha que “O partido doproletariado apoia com todas as forças a confiscação imediata e completa de todas as terras doslatifundiários”,apartirdaaprovaçãodeumaemendapropostaporLeninquenaocasiãosustentaraque“sedigaqueopartido‘lutapor...’aoinvésde‘apoia’,pois‘apropriedadeagráriadoslatifundiárioséabasedojugoqueoprimeocampesinatoeotornaatrasado.Nãosetratadequeoscamponesestenhampoucaterraounão.Abaixooregimedeservidão!’”

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Argumenta,nessesentido,aocontráriodospartidosfavoráveisaque,quantoà

questãoagrária,seesperasseatéàAssembleiaConstituinte,queaterradeveriapassar

imediatamente “para as mãos dos camponeses com o máximo de organização”,

manifestando-se “contra as ocupações anárquicas” e contra a proposta de que os

camponeses “entrem em acordo comos latifundiários”, afirma que “se deve tomar a

terra, imediatamenteesemeá-la,para lutarcontraafaltadepão,para livraropaísda

falênciaqueseavizinhadelecomumarapidezcolossal”(Lenin,1977a,t.2,p.82a85).

Esses pontos também são incorporados na Resolução, que ao destacar que o

partidodevesselutarcontraoGovernoProvisório,quealémdeimporaoscamponeses

um“‘acordovoluntáriocomoslatifundiários”ameaçava“castigaroscamponesespelos

seus ‘atos arbitrários’, isto é, passar à violência da minoria da população (os

latifundiáriosecapitalistas)contraamaioria”(Lenin,1977a,t.2,p.86a88).

O partido aconselhava “os camponeses a tomar a terra demodo organizado,

sempermitiremcasoalgumamenordeterioraçãodosbense comapreocupaçãode

aumentaraprodução”edecidia“apoiarainiciativadoscomitéscamponesesquenuma

série de lugares da Rússia entregam o gado e as alfaias dos latifundiários ao

campesinatoorganizadonessescomitésparaumautilizaçãosocialmenteregulamentada

paraocultivodetodaaterra”(Lenin,1977a,t.2,p.86a88).

Além disso, resolvia-se que o partido deveria “aconselhar os proletários e

semiproletáriosdocampoaprocuraremconseguiratransformaçãodecadapropriedade

latifundiária numa propriedade modelo bastante grande, administrada por conta da

sociedade pelos Sovietes de deputados de operários agrícolas sob a direção de

agrónomoseempregandoosmelhoresmeiostécnicos”(Lenin,1977a,t.2,p.86a88).

Porum lado, vemosapersistênciadomodeloagrário ideal lenineanoadotado

pelopartidobolchevique,baseadonaimagemdagrandepropriedadeagráriacapitalista,

queseriasubmetida,apartirdarevoluçãosocialista,aocontroledosoperáriosagrícolas

dirigidosporespecialistase comempregode técnicasavançadas.Poroutro,opartido

constata e apoia a iniciativa de comitês camponeses de vários lugares da Rússia que

tomam e entregam gado e alfaias dos latifundiários, bem como defende o

aconselhamento à tomada pelo campesinato, de forma organizada, das terras, com

objetivosdeaumentaraprodução.

OcontextodeaprovaçãodareferidaResoluçãoédescritonoRelatórioSobrea

QuestãoAgrária,de28deAbril (11deMaio)de1917,queaprecedeenoqualLenin

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defende suas ideias: “o crescimento domovimento agrário” em toda a Rússia (Lenin,

1977a,t.2,p.82a85).

Portanto,aomenosdesdeabrilde1917,Leninadotacomoposiçãodeprincípio

a necessidade de liberar a iniciativa revolucionária dos camponeses, tratando como

essencial que “os próprios camponeses resolvam, passando à ação, a questão das

terras”(Linhart,1983,p.30).

Nomesmoperíodo,“opartidosocialista-revolucionário tomaposição inversa”:

com um de seus quadros (Tchernov) assumindo o Ministério da Agricultura, apoia a

políticaagráriadogovernoprovisóriodeKerenski.Entreosprincipaispontosdapolítica,

a defesa de que a reforma agrária fosse realizada “na legalidade” e que não fosse

tolerada “nenhuma ação espontânea dos camponeses antes da Assembleia

Constituinte”,ouseja,“opartidosocialista-revolucionáriopretende,comoconjuntoda

burguesia,concederaterraaoscamponeses,mediantecompensaçõesaosproprietários

deterrasexpropriadas”(Linhart,1983,p.30).

Osmesesde junhoe julhode2017 sãomarcadospormanifestaçõese greves

emqueamassadostrabalhadoresnascidadesexpressaseudescontentamentocomo

governo provisório, quemantinha a Rússia na guerra. Ao analisar, em 7 de julho, as

mobilizaçõesocorridas,noartigoTrêsCrises,Leninavaliaqueamaioriadapopulaçãodo

país seria pequeno-burguesa e, embora existisse “um proletariado urbano

suficientemente desenvolvido para seguir o seu próprio caminho”, ele ainda não era

“capazdeatrair imediatamenteparaoseu ladoamaioriadossemiproletários”,oque

explicava a inevitabilidade das crises, que poderia no futuro variar em suas formas

(Lenin,1977a,tomo2,s.p.).Entretanto,destacaque“aessênciadascoisas”semanteria

mesmo na eventual futura reunião de uma Assembleia Constituinte socialista-

revolucionáriaemOutubro,pois:

Ossocialistas-revolucionáriosprometeramaoscamponeses(1)aaboliçãodapropriedadeprivadadaterra;(2)aentregadaterraaostrabalhadores;(3) a confiscação das terras dos latifundiários e a sua entrega aoscamponeses sem indemnização. A realização destas grandestransformações é absolutamente impossível sem as medidasrevolucionárias mais decididas contra a burguesia, medidas queunicamente poderão ser realizadas mediante a aliança do campesinatopobre com o proletariado, unicamente mediante a nacionalização dosbancosedosconsórcios.Oscréduloscamponeses,quedurantealgumtempoacreditaramqueerapossível conseguir estas belas coisas com espírito de conciliação com a

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burguesia,sentir-se-ãoinevitavelmentedesapontadose...“descontentes”(parafalarsuavemente)comaagudalutadeclassedoproletariadocontraa burguesia pela realização de fato das promessas dos socialistas-revolucionários.(Lenin,1977a,tomo2,s.p.).

Apósosacontecimentosde4dejulho,caracterizadoscomocontra-revolução13,

os textos de Lenin passam a identificar uma viragem que apontava para a

impossibilidade de revolução por vias pacíficas o que teria como consequência a

necessidade de mudança da própria palavra de ordem que defendia todo poder aos

Sovietes,comofimdadualidadedepoderes14(cf.oartigoAPropósitodasPalavrasde

Ordem,escritoem17deJulhode1917).Antesdisso,osSovietespoderiamterassumido

opoderpormeiospacíficos,mas,paraLênin

ApassagemdopoderparaosSovietesnãomudarianempoderiamudaracorrelaçãodasclasses;nãomudariaemnadaocarácterpequeno-burguêsdo campesinato.Mas teria dado oportunamente um grande passo parasepararoscamponesesdaburguesia,paraosaproximaredepoisparaosuniraosoperários(Lenin,1977a,tomo2,s.p.).

Entretanto,analisandoasituaçãoconcreta, segueafirmandoqueaúnicasaída

seria a tomada de poder pelo proletariado, apoiado pelo campesinato pobre ou os

semiproletários,e,nessesentidoosSovietesatuaisteriamfracassado“peranteacontra-

revolução,quetriunfouetriunfa”(Lenin,1977a,tomo2,s.p.).

13 “À medida que desaparecia o prestigio e a autoridade do Governo Provisório, a influência dosbolcheviques nas fábricas e no exército crescia rapidamente, e em julho as autoridades governamentaisresolveram agir contra eles, sob a acusação de que realizavam propaganda subversiva e atuavam comoagentes alemães. Vários lideres foram detidos. Lenin fugiu para a Finlândia, de onde manteve umacorrespondência regular com o comitê central do partido, agora operando na clandestinidade, emPetrogrado”(CAR,1981,p.14).14ConformeCarr(1981,p.12-13):“ARevoluçãodeFevereirode1917trouxedevoltaaPetrogrado,vindosda Sibéria e do exílio no exterior, grande número de revolucionários antes banidos. Pertenciam, em suamaioria, a uma das duas alas — bolchevique e menchevique — do Partido dos TrabalhadoresSocialdemocratas,ouaoPartidoSocialRevolucionário (SRs), eencontraramumaplataforma jáprontanoSoviete de Petrogrado. Este era, de certamaneira, rival doGovernoProvisório instauradopelos partidosconstitucionais da velha Duma; a expressão "dualidade de poder" foi então criada para descrever umasituaçãoambígua.MasaatitudeinicialdoSovietefoimenosclara.OesquemahistóricodeMarxpostulavaduas revoluções distintas e sucessivas—umaburguesa, a outra socialista.Osmembros do Soviete, compoucasexceções,satisfaziam-seemidentificarosacontecimentosdefevereirocomoarevoluçãoburguesarussa que estabeleceria um regime democrático-burguês nos moldes ocidentais, relegando a revoluçãosocialista a uma data ainda indeterminada, no futuro. A cooperação com o Governo Provisório foi ocorolário dessa opinião, partilhada pelos dois primeiros líderes bolcheviques a retornarem a Petrogrado,KameneveStalin.AdramáticachegadadeLeninaPetrogrado,noiníciodeabril,abalouesseentendimentoprecário.”

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A defesa da insurreição armada como a tática a ser adotada ante a nova

conjunturacomeçaraaserentãoesboçadaedesenvolve-senotextoASituaçãoPolítica

(QuatroTeses),em23deJulhode1917.Leninentãoafirma:

somente a clara consciência da situação, a firmeza e a resistência davanguarda operária, a preparação das forças para uma insurreiçãoarmada, cujas condições de vitória são agora terrivelmente difíceis maspossíveis,nocasodeseverificarumacoincidêncianosfactosetendênciasassinaladas no texto da tese. Nada de ilusões constitucionais erepublicanas, não mais ilusões sobre uma via pacífica, nada de açõesdispersas,nãodevemosdeixar-noslevaragorapelaprovocaçãodoscem-negrosnemdoscossacos,mas reunir forças, reorganizá-laseprepará-lasfirmemente para uma insurreição armada, se o curso da crise permitirfazê-lo numa verdadeira escala demassas, de todoo povo.Apassagemdas terras para os camponeses é agora impossível sem uma insurreiçãoarmada, pois a contra-revolução, tendo tomado o poder, uniu-secompletamente aos latifundiários como classe. (Lenin, 1977a, t. 2, s.p.,grifosnossos).

Naquelemomento, estava em curso a repressão ao partido bolchevique, com

prisãodeváriosbolcheviques,sobacusaçãode“espionagem”.

Emfinsdejulho,LeninescreveoartigoAsLiçõesdaRevolução,noqualanalisao

significado da revolução como “uma viragem brusca na vida de massas imensas do

povo”,queexigeamadurecimentoe“dáatodoopovo,empoucotempo,asliçõesmais

profundas e preciosas” (Lenin, 1977a, t. 2, s.p.). Em síntese, argumenta que, com a

revolução realizada em abril, as massas de operários e camponeses esperavam

liberdade, paz, pão, terra. Nenhum dos anseios das massas foram atendidos pelo

governoqueseformou,mas,aocontrário,restaurava-seaanteriorarbitrariedade:

Implanta-se a pena demorte para os soldados na frente, são levados aostribunaisoscamponesesporseapoderaremporiniciativaprópriadasterrasdos latifundiários. São saqueadas as tipografias dos jornais operários. Sãofechadossemjulgamentoosjornaisoperários.Osbolcheviquessãopresos,muitas vezes semque contraeles se formule sequer acusaçãoalguma,ouformulandoacusaçõesclaramentecaluniosas(Lenin,1977a,t.2,s.p.).

Emrelaçãoaoscamponeses,afirma

Numa longa série de congressos, a imensa maioria dos camponesesdeclarou alta e claramente que considera a propriedade latifundiária daterra como uma injustiça e um roubo. E o governo, um governo que sechama a si próprio revolucionário e democrático, continua há meses a

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enganar os camponeses e a enchê-los de promessas e adiamentos.Durante meses os capitalistas não permitiram que o ministro Tchernovpublicasseleissobreaproibiçãodacompraevendadaterra.Equandoporfim foi promulgada essa lei, os capitalistas levantaram uma campanhainfame e caluniosa contra Tchernov, e prosseguem esta campanha atéhoje. O governo chegou a um tal descaramento na defesa doslatifundiários que começa a levar a tribunal os camponeses por seapoderaremdasterras“poriniciativaprópria”.Engana-se os camponeses, persuadindo-os a aguardar a AssembleiaConstituinte. Mas os capitalistas continuam a adiar a convocação destaassembleia.(Lenin,1977a,t.2,s.p.).

Em diversos escritos, Lenin começa a preparar o Partido Bolchevique para a

insurreiçãoarmadadeOutubro.NaobraOEstadoeaRevolução,aotratardaanálisede

Marx sobre a experiência da Comuna de Paris de 1871 para refutar a interpretação

dominante no marxismo, representada pela obra de Kautsky, observa que Marx

afirmarano18brumárioanecessidadededestruiramáquinaburocráticaemilitardo

Estadocomocondiçãopréviaparaarevoluçãopopulardocontinente.Sobreesseponto,

ressalta que como na Europa continental do período o proletariado não constituía a

maioriadopovo,arevolução

sópoderiaser“popular”comacondiçãodeenglobaroproletariadoeoscamponeses.Essasduasclassesconstituíam,então,“opovo”.Essasduasclasses são solidárias, visto que a “máquina burocrática e militar doEstado”asoprime,asesmaga,asexplora.Quebraressamáquina,demoli-la,taléoobjetivopráticodo“povo”,dasuamaioria,dosoperáriosedoscamponeses; tal é a “condição prévia” da aliança livre dos camponesesmaispobresedoproletariado.Semessaaliança,nãohádemocraciasólidanemtransformaçãosocialpossível(Lenin,2010,p.60-61).

NacartaaoComitêCentral,aosComitêsdePetrogradoedeMoscoudoPOSDR,

intituladaOsbolcheviquesdevemtomaropoder15,escritaentre12e14desetembrode

1917, Lenin considera que devem tomar o poder de Estado na medida em que

obtiveram “a maioria nos Sovietes de deputados operários e soldados de ambas as

capitais”,oqueseria

15Conformenotadoseditores,“AscartasdeLénine‘OsBolcheviquesdevemtomaroPoder’e‘OMarxismoeaInsurreição’foramdiscutidasnareuniãodoCCde15(28)deSetembrode1917.OComitéCentraltomoua decisão de fixar paramuito breve uma reunião do CC dedicada à discussão das questões tácticas. FoicolocadaàvotaçãoaquestãodeconservarapenasumexemplardascartasdeLénine.Houve6votosafavordestaproposta,4contrae6abstenções.KámenevqueeracontraalinhadoPartidoemdireçãoàRevoluçãoSocialista,apresentouàreuniãodoCCumprojetoderesoluçãodirigidocontraaspropostasdeLéninedeorganizaçãodainsurreiçãoarmada.OComitéCentralrejeitouaresoluçãodeKámenev”(ObrasCompletas,1978,t.2,pp306-307).

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suficienteparaarrastarasmassas,paravenceraresistênciadoadversário,para o destruir, para conquistar o poder e mantê-lo. Pois, propondoimediatamenteumapazdemocrática,entregando imediatamentea terraaos camponeses, restabelecendo as instituições e as liberdadesdemocráticas espezinhadas e destruídas por Kérenski, os bolcheviquesformarãoumgovernoqueninguémderrubará (Lênin,1978, t.2,pp306-307).

Diantedosacontecimentosdesdeacomposiçãodoprimeirogovernoprovisório

decoligação,em6deMario,atéastentativasdecontra-revolução,comaconvocação

da Conferência Democrática, que, segundo Lenin, representaria “apenas as cúpulas

pequeno-burguesas conciliadoras” e enganaria “o campesinato, não lhe dando nem a

paznematerra.Sóumgovernobolcheviquesatisfaráocampesinato”(Lênin,1978,t.2,

pp306-307).Afirmaque“Opovoestácansadodasvacilaçõesdosmencheviquesedos

socialistas-revolucionários.Sóanossavitórianascapitaisarrastaráoscamponesesatrás

denós”(Lênin,1978,t.2,pp306-307).

Ante a explosão de sublevações camponesas, especialmente em setembro de

1917, o governo provisório decreta estado de sítio na região de Tambov, onde se

verificam as mais numerosas e violentas, e envia tropas, transformando a questão

agráriaemguerracivil(Linhart,1983,p.30).

Lenineosbolcheviquesconsideramnecessárioapoiareproteger,inclusivepela

açãoarmada,asublevaçãocamponesa,aocontráriodossocialistas-revolucionáriosque,

abandonandoopróprioprograma,propõemumacomposiçãocomosproprietáriosde

terra(Linhart,1983,p.31).

Nesse sentido, o escrito de LeninA crise amadureceu, de 29 de setembro de

1917,demonstraapercepçãodequese iniciaranaRússiaomomentoda“viragemda

revolução”:

Num país camponês, com um governo revolucionário, republicano, quegoza do apoio dos partidos dos socialistas-revolucionários emencheviques, que ainda ontem dominavam entre a democraciapequeno-burguesa,cresceainsurreiçãocamponesa.Istoéinacreditável,maséumfacto.[...]Uma insurreição camponesa num país camponês, contra o governo deKérenski, socialista-revolucionário, deNikítine eGvózdev,mencheviques,e de outros ministros representantes do capital e dos interesseslatifundiários! O esmagamento desta insurreição com medidas militaresdeumgovernorepublicano.

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Será ainda possível perante tais fatos ser um partidário honesto doproletariadoenegarquea crise amadureceu, quea revoluçãoatravessauma grandiosa viragem, que a vitória do governo sobre a insurreiçãocamponesa seria agora o enterro definitivo da revolução, o triunfodefinitivodakornilovada?Éclaroporsimesmoque,senumpaíscamponês,depoisdesetemesesderepública democrática, as coisas puderam chegar a uma insurreiçãocamponesa, ela demonstra irrefutavelmente a bancarrota nacional darevolução, a sua crise, que atingiu uma intensidade nunca vista, aaproximaçãodasforçascontra-revolucionáriasdoúltimolimite.Isto é claro por si mesmo. Perante um facto como a insurreiçãocamponesa, todos os outros sintomas políticos, mesmo quecontradissessem este amadurecimento da crise nacional, não teriamabsolutamentenenhumaimportância.Mas,pelocontrário, todosossintomas indicamprecisamentequeacrisenacionalamadureceu.[...]Osbolcheviquesrevelar-se-iamtraidoresàdemocraciaeàliberdade,poistolerar o esmagamento da insurreição camponesa em tal momentosignifica deixar falsificar as eleições para a Assembleia Constituinteexatamente — e ainda pior, mais grosseiramente — como foramfalsificados a “Conferência Democrática” e o “pré-parlamento” (Lenin,1978,t2,pp.318-325).

A continuação da carta, distribuída apenas aos membros do Comité Central,

ComitédePetrogrado,ComitédeMoscovoedosSovietes,defendeatomadaimediata

dopoder,atravésdeumainsurreiçãoimediata,visandovencerumacorrentepartidária

quedefendiaesperarpelocongressodosSovietes.Entreosargumentos,consideraque

seria uma traição tanto aos operários alemães quanto ao campesinato, pois “tendo

ambososSovietesdascapitais,deixaresmagara insurreiçãodoscamponesessignifica

perder,eperdermerecidamente, todaaconfiançadoscamponeses” (Lenin,1978, t.2,

pp.318-325).Entreosfatosquerelacionacomoasseguradoresdavitóriadainsurreição

aosbolcheviques,destaca:“temospalavrasdeordemquenosasseguramapoio:abaixo

ogovernoqueesmagaainsurreiçãocamponesacontraoslatifundiários!”(Lenin,1978,

t.2,pp.318-325).

Em 25 de Outubro a insurreição dos bolcheviques, de fato, tem um desfecho

vitorioso. No mesmo dia ocorre a reunião do Soviete de Deputados Operários e

SoldadosdePetrogrado, naqual Lenin, aodefender as resoluções a seremaprovadas

pelopodersoviéticorecém-instalado,argumenta:

DentrodeRusia,un inmenso sectordel campesinadohadicho:bastadejugar con los capitalistas, nosotros marcharemos com los obreros.Conquistaremos laconfianzade loscampesinoscomunsolodecretoque

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pondra fin a la propiedad terrateniente. Los campesinos comprenderanque la salvacion del campesinado esta unicamente en la alianza con losobreros. Estableceremos un verdadeiro control obrero sobre laproduccion.(Lenin,t.XXVII,1976,p.349)

Entre as resoluções então aprovadas, constata-se que o governo soviético

“Abolira inmediatamente la propiedad terrateniente y entregara la tierra a los

campesinos. Establecera el control obrero sobre la produccion y la distribucionde los

produtos”(Lenin,t.XXVII,1976,p.350).

Osprimeirosdecretosbolcheviques,aprovadosnoSegundoCongressodetoda

RússiadosSovietesdedeputadosoperáriosesoldados,realizadoem25e26deoutubro

(7 e 8 de Novembro), em que Lenin assinalava a presença da imensa maioria dos

sovietes e demuitos delegados dos sovietes campesinos, incluíramoDecreto sobre a

terra.

Em 26 de outubro, após ler o Informe sobre a terra, em que reafirma a

necessidade de entregar a terra aos camponeses, Lenin apresenta oDecreto sobre a

terra, que no artigo primeiro determina a abolição, sem indenização da propriedade

latifundiáriasobreaterra.Essaspropriedadeseasterrasdacoroaedaigreja,comseu

gado, instrumentos de trabalho e construções passam a ser postas a disposição dos

comitêsagráriosedossovietesdedeputadoscampesinosdedistrito,atéareuniãoda

AssembleiaConstituinte(2).Consideragravedelitoapraticadequalquerdanoaosbens

confiscados (3);adota,como leiprovisória,aseradotadadeformagradualatéquese

realizasseaAssembleiaConstituinte,oconteúdodoMandatocampesinosobreaterra,

publicado no periódico Izvestia do Soviete de deputados camponeses de toda Rússia,

baseadonos242mandatoscampesinoslocaisepublicadoem19deagostode1917,na

medida em que expressaria “a vontade absoluta da imensa maioria dos camponeses

com consciência de classe de toda Rússia” (4); proíbe o confisco de terras dos

camponesesecossacoscomuns(5).

Contraascríticasdequeodecretoeomandatoforamredigidospelossocialistas

revolucionários,Leninargumenta:

No interesa quien los haya redactado; como gobierno democratico, nopodemos ignorar la decision de lasmasas popularas, aunque podamos noestardeacuerdoconella.Enel juegodi lavida,alaplicareldecretoen lapractica,alponerloenejecucionencadalocalidad, lospropioscampesinosverandondeesta laverdad.Yaunsi loscampesinoscontinuansiguiendoa

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los socialistas revolucionarios, aun si dan a este partido la mayoria en laAsambleaConstituyente,seguiremosdiciendo:.queimporta?Nohaymejormaestro que la experiencia y ella demostrara quien tiene razon. Que loscampesinos resuelvan este problema por un extremo y nosotros loresolveremos por el otro. La experiencia nos obligara a juntarnos en eltorrentecomundelaactividadcreadorarevolucionaria,enlaelaboraciondenuevas formas de Estado. Debemos guiarnos por la experiencia; debemosconcederplenalibertadalgeniocreadordelasmasaspopulares.El antiguo gobierno, derribado por la insurreccion armada, pretendiaresolver el problema de la tierra con el concurso de la vieja e invariableburocracia zarista.Peroen lugarde resolverelproblema, laburocracianohizomasquecombatiraloscampesinos.Los campesinos aprendieron algo en estos ocho meses de nuestrarevolucionyquierenresolverporsimismostodoslosproblemasdelatierra.Poresonospronunciamoscontratodaenmiendaaesteproyectodeley.[...].Confiamosemqueelpropiocampesinadosabra,mejorquenosotros,resolverelproblemaconacierto,comoesdebido.Noes loesencialque lohagandeacuerdoconnuestroprogramaoconeldeloseseristas.Loesencialesqueelcampesinadotengalafirmeseguridadedequenohaymas terratenientes en el campo; !que los campesinos resuelvan ellosmismos todos los problemas y organicen ellos mismos su propia vida!(Lenin,t.XXVII,1977b,pp.368-369).

Wolf (1984) sustenta que, nas circunstâncias de 1917, os primeiros decretos

bolcheviques“quepediamocessar-fogo imediatoeo términodapropriedadeprivada

daterra,apenascarimbaramaaprovaçãodeprocessosjáemandamentonocampo,aos

quaisnenhumpartidopolíticopoderiaterresistido,mesmoqueoquisesse”.Oreferido

autorsustentaqueaomesmotempoemqueosbolcheviquesforamforçadosadeixar

que os camponeses confiscassem a terra para si, eles também cederam “porque isso

coincidiacomseuinteressepolítico,sequisessemtomaropoder”(Wolf,1984,s.p.).

Entretanto, pela leitura do inflamado discurso de Lênin percebe-se que já na

ocasião houve disputa interna no partido bolchevique, que de fato reconhecia recuos

emrelaçãoaoprogramaagrárioemvirtudedanecessáriaaliançacomocampesinato.

Essa classe,naquelemomento,na visãode Leninedopartidobolchevique,passavaa

expressarseusinteressesatravésdopartidodossocialistas-revolucionáriosdeesquerda,

criadoapartirdedissidênciadopartidodossocialistas-revolucionários.

No Terceiro Congresso dos Sovietes de Deputados Operários, Soldados e

CamponesesdeTodaaRússia,realizadoentreosdias10-18(23-31)deJaneirode1918,

Leninreiteraaimportânciadaaliançarealizadaemdetrimentodoprogramaagráriodo

partido,ressaltandoasdificuldadesdoperíododetransiçãodaditaduradoproletariado

paraosocialismo.Naocasião,afirmaLenin:

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Todoo socialista conscientedizqueé impossível imporo socialismoaoscamponesespelaviolênciaequeéprecisocontarapenascomaforçadoexemplo e coma assimilação da prática da vida pelamassa camponesa.Como considera elamais conveniente passar ao socialismo? Eis a tarefaqueagorasecolocanapráticaperanteocampesinatorusso.Comopodeela própria apoiar o proletariado socialista e começar a passagem aosocialismo? E os camponeses iniciaram já esta passagem e temos plenaconfiançaneles.(Lenin,t.2,1978,p633-650).

Entretanto,deacordoLinhart (1983,p.35),algunsmesesapósa revoluçãode

Outubro, a euforia do movimento de massa camponês começa “a se chocar com a

inextrincávelquestãodoabastecimentodascidades,fazendocomqueosbolcheviques

sejamacuadosaumapolíticaderupturanapráticacomamassacamponesa”.

Emumprimeiromomento,asmedidascontraa fomepropostasaosovietede

Petrogrado16 envolvem a criação de destacamentos de abastecimento, formados por

operários, sob a crençadequehá estoquesde grãos escondidospor especuladores e

que tratava-se descobri-los, principalmente nas estradas de ferro, armazéns,mansões

dos ricos (Linhart, 1983, p. 35). Lenin acreditava que o campesinato seria favorável e

participariadaprocuradotrigocontraoskulakseosespeculadores,oquenãoocorreu.

Linhart(1983)sustentaqueocampoeraumdesconhecidoparaosbolcheviques

e que, após a repressão czarista, apenas a partir de fevereiro de 1917 as questões

políticas começarama ser discutidas abertamente no campo. Portanto, a partir desse

momento,nobojodalutadeclassesqueocorreraporocasiãodarepartiçãodasterras,

asdiversasforçasdasociedaderuralpoderiamsediferenciarpoliticamente,porém:“A

guerra,aurgênciadasobrevivênciadoproletariadorevolucionáriodascidades,afome

decidiramascoisasdeoutraforma.Otempodeamadurecimentodascontradiçõesnão

eraomesmonascidadesenocampo”(Linhart,1983,p.37). 16NaCartasobreafome,dirigidaaoSovietedePetrogrado,em22demaiode1918,Leninafirma:“Eisqualavanguardadarevolução—emPetrogradoeemtodoopaís—quedevelançaroapelo,quedeveerguer-se emmassa,que deve compreender que está nas suasmãos a salvação do país, que dela se exige umheroísmonãomenordoqueemJaneiroeOutubrode1905,emFevereiroeOutubrode1917,queéprecisoorganizar a grande “cruzada” contra os especuladores de cereais, os kulaques, os exploradores, osdesorganizadores, os concussionários, a grande “cruzada” contra os violadores da mais rigorosa ordemestatal na recolha, transporte e distribuição do pão para as pessoas e do pão para as máquinas.Só o levantamento em massa dos operários avançados pode salvar o país e a revolução. São precisosdezenasdemilhares deproletários avançados, temperados, suficientemente conscientes para explicar ascoisas aos milhões de pobres em todos os confins do país e para se pôr à cabeça destes milhões;suficientemente firmes para afastar e fuzilar implacavelmente todo aquele que «se deixe seduzir» —acontece—pelasseduçõesdaespeculaçãoeseconvertadecombatentedacausadopovoemsaqueador;suficientemente firmes e fiéis à revoluçãopara suportar organizadamente todoopesoda campanhaemtodos os confins do país para instaurar a ordem, para reforçar os órgãos locais do Poder Soviético, paravelarlocalmenteporcadapuddetrigo,porcadapuddecombustível.(Lenin,1978,t2,p618-623).

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Diante do agravamento da situação e da tomada de consciência de que os

estoquesdegrãosescondidoseraummitoqueocultavaoquadrotrágicoformadopela

mácolheitadoverãode1917,perdadaUcrânia(celeirodetrigodopaís)edevastações

de guerra, tornava-se necessário conseguir que o campesinato repartisse a produção

comascidadeseentregassetudoqueexcedessesuasnecessidadesvitais:tratava-seda

“lutadeclassesnocampo”(Linhart,1983,p.37).

OspontosessenciaisdapolíticaagrárianaRússiaapósaRevoluçãoemergiram,

deacordocomLinhart,desdeabril-maiode1918,epodemserassimsintetizados:1.a

guerrapelotrigo, iniciadaem1918erenovadaaté1929,e,posteriormente,sobnovas

condições;2.Avisãoda luta juntoaocampesinatocomo“uma luta ideológica longae

encarniçada contra a mentalidade pequeno-burguesa e pequeno-proprietária”; 3. o

proletariado tem a tarefa de organizar os camponeses pobres que são seus aliados

naturaisnocampo.

As formulações de Leninmostram, entretanto, que ele atribui aomovimento

doscamponesespobresumpapelsubordinado:oproletariadoapoia-senoscamponeses

pobres em sua ação nos vilarejos;mas os camponeses pobres não constituem, em si

mesmos,uma forçadirigenteda lutadeclassesnocampo. Istoémuito importante:a

partir destemomento, a política agrária soviética não temmais como fundamento o

movimentorevolucionáriodasmassasrurais.Tentasuscitaressemovimentoparaapoiar

suasprópriasofensivas,oqueémuitodiferente.Umquartopontosetornaráclaromais

tarde (em 1919): a teoria do camponês médio, simultaneamente trabalhador e

“explorador”(Linhart,1983,p.39).

Sobreaguerrapelo trigo,citandoasTesessobreasituaçãoatual,escritaspor

Leninem26demaiode1919,Linhart(1983,p.40)assinalaque:

Assim, desde a primavera de 1918, a contradição campo-cidade, que setornou antagônica pela fome e pelas necessidades de sobrevivência dapopulação urbana, assume a forma mais radical que existe: a formamilitar. Os destacamentos operários armados enviados para conseguirtrigo com a máxima urgência, sem ter tido tempo para prepararpoliticamenteocampo,serão identificadoscomoagressorespela imensamaioriadomundorural.

Nãoseconseguiuisolarosespeculadoreseasmassascamponesas,defendendo-

seembloco,responderamaosdestacamentosdeduasformas:“Acurtoprazo:esconde-

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seotrigo.Alongoprazo:asemaduraserestringiráaoqueéestritamentenecessárioà

sobrevivênciadafamília”(Linhart,1983,p.40).

Emrelaçãoà luta ideológicanocampo,Linhart ressaltaque,aomesmotempo

emqueconvocaacruzadapelotrigo,“Lenincomeçaaanalisararesistênciaideológica

docampesinatoaocomunismo,eacolocaroproblemadaapropriaçãodosgrãos,num

primeirotempo,edacoletivizaçãodasterras,maistarde,emtermosdetransformação

ideológica”(1983,p.41).

Cita trechodetextode4de junhode1918emqueLeninressaltaas raízesda

exploração burguesa que penetram no país “através dos pequenos proprietários...”.

Conforme Linhart (1983, p. 41-42), é a partir desse momento que Lenin percebe o

problema, mas a batalha contra o inimigo de classe compromete a batalha contra a

ideologiainimigadamassadoselementosintermediários.

O papel subordinado do movimento dos camponeses pobres aparece em

diversos escritos de Lenin. Após o início da “cruzada pelo trigo” (em maio-junho de

1918),opodersoviéticocriaos“comitêsdecamponesespobres”,esperandoqueeles

apoiema“cruzada”,apartirdemedidasassistencialistas.NaspalavrasdeLinhart(1983,

p.43):

O poder operário age como uma força de justiça, mas vinda de fora,trazendoasaídaparaoscamponesespobresdocampo.Estamoslongedasituação do outono de 1917, quando os bolcheviques felicitavam-sequandoviamoscamponesesresolverporsuacontaaquestãodasterraseosencorajavamnessecaminho.Sobapressãodafome,opoderproletáriosesubstituiaomovimentodemassascamponesas:aquestãodasterrasfoiresolvidaquandoestavamadurapara asmassas camponesas.Aquestãodosgrãosnãoestámaduraparaestamesmamassa.Tantopior.Éprecisoagir ou morrer. A partir de então, subordinada à questão doabastecimento das cidades, a política agrária é importada: não dependemaisdo ritmoprópriodomovimentodemassa camponês.Desujeitodomovimentorevolucionáriode1917,ocampesinatotorna-seobjetodeumapolíticaagráriadecididanascidades.

Essescomitêsdecamponesespobres,queselimitaramadesempenharafunção

prática de “fornecer informantes” (Carr, ..., p. 161 apud Linhart, 1983, p. 44), foram

suprimidos ao serem fundidos com os “sovietes rurais” em novembro-dezembro de

1918.

Emrespostaàscríticasqueaconduçãodacruzadapelo trigo recebe, inclusive

dopartidosocialista-revolucionáriodeesquerda,noVCongressodeTodaaRússiaDos

Sovietes de Deputados Operários, Camponeses, Soldados e Combatentes do Exército

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Vermelho, Lênin, pronuncia, em 5 de Julho de 1918, um discurso em que refuta a

acusação,deque“estasejaumalutacontraocampesinato”.

Camaradas,sabemosperfeitamenteas incríveisdificuldadesqueacarretaa solução do problema dos víveres. Aqui os preconceitos são os maisprofundos. Aqui estão os interesses mais arreigados, os interesses doskulaques; aqui há a divisão, a estagnação, a dispersão do campo, aignorância,emmuitoscasos tudo issoseunecontranós,enósdizemos:apesar de todas essas dificuldades, não se pode renunciar, não se devebrincar com a fome, e as massas populares, se não forem ajudadas nasituaçãodefome,sãocapazesdepassar,porcausadafome,mesmoparaSkoropádski.Nãoéverdadequeestasejaumalutacontraoscamponeses!Quemdisseristoéomaiorcriminoso,eumhomemquesedeixaarrastarhistericamenteparataisdiscursosévítimadamaiorinfelicidade.Não,nãosó não lutamos contra os camponesesmuito pobres, como nem sequercontra os camponeses médios. Os camponeses médios têm por toda aRússia excedentes insignificantes de cereais. Os camponeses médiosviveramdurantedezenasdeanosantesdarevoluçãoemcondiçõespioresdoqueaquelasemqueviveooperário.Antesdarevoluçãosóconheciamanecessidadeeaopressão.Comestescamponesesmédiosseguimosaviadoacordo.(Lenin,t.2,1978,p633-650).

Entraemcenanessemomentoumadaspeçasdaanáliseedapolíticaagráriade

Lenin: o “camponês médio”, pequeno cultivador que emprega às vezes um ou dois

assalariadosmasnormalmentenãotemnenhum.

Aindanoâmbitodessediscurso, Lênindestaca aindao iníciodapercepçãode

que só se pode obter pão e escapar da fome por meio da aliança dos operários da

cidadecompobresdocampo“porquesóospobresdocampoéquenãoespeculamcom

oscereais”,emboraavaliequeocamponêsmédio,aolerosdecretosque“estabelecem

uma taxa para os pobres, outra para osmédios e tiram os cereais aos kulaques sem

pagar”,perceberiamaatuaçãobolcheviquecomo“justa”eseriao“aliadomaisfiel,pois

não especula com os cereais, compreenderá e concordará em que especular com os

cereaisnomomentodemaiorperigoparaarevoluçãosocialistaéomaiorcrimecontra

opovo”(Lenin,1978,tomo2,p633-650).

Ocamponêsmédio,conformedestacaLinhart(1983),passaráaservistocomoo

interlocutor principal, pois “não são propriamente os pobres que constituem a força

produtivaprincipalnocampo”,devendo-setomarmedidasquantoaociclodotrabalho

agrário,quandopercebemareduçãodasáreassemeadas.

Linhart(1983,pp.46-47)citaaformulação,emnovembrode1919,dateoriado

duplo caráter do camponêsmédio, que inaugura a prática de coerção e persuasão: o

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camponês como explorador do operário esfomeado, na medida em que dispõe de

excedente de grãos, e enquanto trabalhador, pois vive de seu próprio trabalho.

Contradição fundamental. Camponeses consideram os excedentes de grãos como sua

propriedade, suscetível de venda livre, e não compreendem que o livre comércio de

grãoséumcrimedeEstado.Assim,o fatodocamponêsmédioserumtrabalhadorao

cultivar suas terras impede o uso da força para tomar-lhe os seusmeios de trabalho,

entreosquaisa terra,nãopodendoseutilizara forçapara formar fazendascoletivas,

mas contra o camponês “explorador”, a coerção torna-se legítima para tomar os

excedentesdetrigopelaforça.

ConformeLinhart(1983,p.48),

a teoria aqui reflete apenas as contradições da prática: utilizar a violênciacontra o aspecto explorador do campesinato, a persuasão em relação aoaspectotrabalhador.Apenasumsenão:trata-sedasmesmaspessoaseelasnão captam a nuança! Para estas pessoas, o trigo que produzem é suapropriedadeexatamentepelasmesmasrazõesquetodooresto,eopodersoviético quer tomar o que é delas. De que serviria trabalhar de sol-a-solpara fazer crescer colheitas destinadas ao confisco? Mais vale produzirsomente o que se vai consumir consigo mesmo. Resultado: a resistênciacamponesa concentra-senaprodução, reduzem-seas áreasplantadase, acada ano, até 1921, o campo produz menos trigo...Pode-se confiscar umexcedentequenãoexiste?Estasemi-aliançapropostaaoscamponesesérecusadanaprática:aprovaédada pelas sublevações agrárias e pelas múltiplas formas de resistênciacamponesa no decorrer de todo o período chamado de “comunismo deguerra”.

Em 1921, o governo soviético foi acuado a implantar uma Nova Política

Econômica(NEP),querecuavaeocamponêsvoltavaaserdonodesuacolheita,oque

nãoresolviaoproblemadefundo:asrelaçõesdeprodução.

Em relação à questão agrária, o ‘leninismo’ consiste na brutal unidadedestasduasposiçõesextremas,separadasporalgunsmeses:emoutubrode1917, um apoio incondicional, único nestemomento na Rússia – dado aomovimento de massa camponês; na primavera de 1918, a reviravoltaincitada pela fome, a questão agrária subordinada ao abastecimento dascidades,acoerçãonaordemdodianaprática(pp.48-49).

Em 1929, Stálin passa a utilizar a coerção para a transformação nomodo de

produçãonocampo,forçandoacoletivizaçãodaprodução.

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4.Consideraçõesfinais

Ao revisitamosasposiçõesde Lêninedopartidobolchevique sobreo campesinato (e

seulugarna)naRevoluçãoRussade1917,pudemospercebercontinuidadeseinflexões

decorrentes do tempo histórico acelerado em especial a partir de Fevereiro de 1917,

apósaderrubadadoCzarismo.

A análise lenineana da forma como o capitalismo se desenvolvia na Rússia e

penetrava no campo, porém, parece ter o objetivo de identificar os setores que

poderiamseconstituircomoaliadosdosproletáriosnatomadadepoderdoEstado.

Os textos de Lenin, entretanto, como sublinhou Linhart, por vezes oscilam e

demonstram o desconhecimento do campesinato na Rússia, visto que o partido

bolcheviqueseafirmavaenquantorepresentantedoproletariado,quedeveriaconduzir

a revolução e buscar a adesão do campesinato, sem o apoio do qual, num país

camponês,nãopoderiachegaraopoder.

Dessaforma,parecequeavisãosubordinadadocampesinatonumaaliançapelo

poder é uma constante nos textos, mesmo quando Lênin e o partido bolchevique

apoiam o movimento camponês nas tomadas de terras e contra a repressão

governamental que se abate sobre ele e defendem seu protagonismo na revolução

agrária.

Adivisãodoscamponesesemcategoriasdistintastambémmarcaatentativade

Lenin de identificar aliados para a Revolução Socialista. Inicialmente, serão os setores

pobres e semiproletários, que poderiam aderir ao proletariado e lutar contra os

camponesesricos,vistoscomopequenos-burgueses,aliadosdaburguesia.

Após a Revolução de outubro, a figura do camponêsmédio começa a ganhar

contornos que mesclam a ideologia pequeno-burguesa sobre os excedentes de

produçãoàfacetatrabalhadoradaquelequelavraaterra .

Embora o próprio Lênin exalte no primeiro discurso após a Revolução de

outubro,contraascríticasinternas,queoqueimportavanaocasiãonãoeraoprograma

agrário(ouquemteriaelaboradooDecretosobreaTerra:ossocialistas-revolucionários

deesquerda),massimaaliançafirmadaparaatomadadopoder,eletambémjustifica

essa posição na tese de que estariam emperíodo de transição, no qual permanecem

restosdoregimecapitalistaqueestásendodeposto.

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De fato, o recuo programático é tático e não significa que Lênin ou o partido

bolchevique estavam convencidos do protagonismo das massas camponesas na

resoluçãodosproblemasagrários.Permanece,portanto,umavisãodequeatransição

para o socialismo dependeria da adoção do programa agrário elaborado pelo partido

bolcheviqueemabrilde1917,queincluianacionalizaçãodetodasaspropriedadeseno

qualjáestápresenteapreocupaçãocomoabastecimentodascidades,omelhoramento

agrícola,aadoçãodetécnicasavançadas,orientaçãodeespecialistas,etc.

Dessaforma,parecenãosertãoprofundaarupturaexaltadaporLinhart (198,

pp. 48-49) em relação à questão agrária para Lênin, que teria passado de “um apoio

incondicional” ao movimento de massa camponês (em outubro de 1917) para “a

reviravolta incitada pela fome, a questão agrária subordinada ao abastecimento das

cidades,acoerçãonaordemdodianaprática”,naprimaverade1918.

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