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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS ESCOLA DE MÚSICA E ARTES CÊNICAS MESTRADO INTERDISCIPLINAR EM PERFORMANCES CULTURAIS DOCENTE: ROBSON CORRÊA DISCENTE: ROBERTO RODRIGUES Textos estudados: Performances Culturais: um conceito interdisciplinar e uma metodologia de análise. Robson Corrêa de Camargo. Shechner, teatro e antropologia. John Cowart Dawsey. Performers e espectadores- transportados e transformados. Richard Schechner. No texto “Performances culturais: um conceito interdisciplinar e uma metodologia de análise”, o autor inicia o diálogo situando o leitor em relação ao conceito de Performances Culturais para que possamos compreendê-lo em sua complexidade e amplitude. Este novo campo de estudos pretende estabelecer comparações entre as diferentes culturas, a partir de seus fenômenos e produtos culturais, analisando e registrando “sua profusa diversidade, ou seja, como o homem as elabora, as experimenta, as percebe e se percebe, sua gênese, sua estrutura, suas contradições e seu vir-a-ser” (CAMARGO, 2012, p.1). Para estabelecer tais cruzamentos e comparações o campo das Performances Culturais tem buscado relacionar diferentes campos do conhecimento para, desta forma, compreender as formas heterogêneas das construções a ações sociais culturais e artísticas e maneira densa e complexa, assim como são formadas. As Performances Culturais atuam, assim, na análise e compreensão da produção cultural humana

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resenha de leituras.

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁSESCOLA DE MÚSICA E ARTES CÊNICASMESTRADO INTERDISCIPLINAR EM PERFORMANCES CULTURAISDOCENTE: ROBSON CORRÊADISCENTE: ROBERTO RODRIGUES

Textos estudados:

Performances Culturais: um conceito interdisciplinar e uma metodologia de análise. Robson Corrêa de Camargo.

Shechner, teatro e antropologia. John Cowart Dawsey.

Performers e espectadores- transportados e transformados. Richard Schechner.

No texto “Performances culturais: um conceito interdisciplinar e uma

metodologia de análise”, o autor inicia o diálogo situando o leitor em relação ao

conceito de Performances Culturais para que possamos compreendê-lo em sua

complexidade e amplitude. Este novo campo de estudos pretende estabelecer

comparações entre as diferentes culturas, a partir de seus fenômenos e produtos

culturais, analisando e registrando “sua profusa diversidade, ou seja, como o homem as

elabora, as experimenta, as percebe e se percebe, sua gênese, sua estrutura, suas

contradições e seu vir-a-ser” (CAMARGO, 2012, p.1).

Para estabelecer tais cruzamentos e comparações o campo das Performances

Culturais tem buscado relacionar diferentes campos do conhecimento para, desta forma,

compreender as formas heterogêneas das construções a ações sociais culturais e

artísticas e maneira densa e complexa, assim como são formadas. As Performances

Culturais atuam, assim, na análise e compreensão da produção cultural humana a partir

da comparação e relação entre as diferentes culturas e entendem essas produções como

frutos das percepções de seus agentes através de suas construções subjetivas que se

relacionam com outros fatores e determinantes sociais como a economia, a política e a

própria cultura.

As Performances Culturais como formas simbólicas e concretas vêm ampliar as

possibilidades de compreensão e interpretação das culturas a partir de novos paradigmas

reconhecendo a dinamicidade e a polissemia das atividades criadoras e das construções

culturais dos diversos agentes.

No segundo momento do texto, o autor apresenta elementos dos estudos de

Milton Singer, o primeiro estudioso a esboçar o termo Performances Culturais e Robert

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Redfield, seu importante parceiro. Esses elementos vêm delinear de forma mais clara o

campo conceitual e metodológico para a apreensão e compreensão dos produtos

culturais, dos atos artísticos e sociais das diferentes culturas.

Para Redfield, as sociedades tendem a se apresentar pelo senso comum de

poucas entidades integralizadoras. Para ele, existe em contraposição a essas formas

genéricas

(...) a pequena comunidade cultural que pode ser observada concretamente quando vamos a uma igreja ou a um templo budista, a uma festa ou a determinada atividade cultural e a percebemos em seu diálogo particular e não imaculado com o mundo real, a concretude individualizada de cada forma totalizadora. (CAMARGO, 2012, p.4).

Assim, podemos captar as sutilezas e os elementos de pequenos grupos e

relacioná-los às grandes entidades para perceber até que ponto se aproximam ou se

distanciam. É possível, desta forma, captar diferenças através do contraste, da relação e

do paradoxo expresso entre elas para que possa superar a contradição entre o geral eo

específico, a parte e o todo.

As possíveis ligações entre as pequenas culturas manifestas e os elementos canônicos da grande tradição de determinada sociedade nos evidenciam de outra forma as formas contraditórias da cultura, sua instabilidade e sua estabilidade, seu ponto de equilíbrio e o possível movimento sendo estabelecido em direção distinta. (CAMARGO, 2012, p.5).

O autor aponta que até a primeira metade do século XX as ciências sociais

buscavam apresentar dados objetivos e mensuráveis que não davam conta da

complexidade e dos aspectos subjetivos das artes, dos rituais. Assim, Singer introduz o

estudo das Performances Culturais alargando o campo conceitual e metodológico para

se pensar os contrastes entre as culturas, as especificidades e particularidades de

pequenos grupos e suas formas de pensamento em relação à grandes tradições e as

transformações diante delas.

Busca-se compreender os fatores de construção, organização e estruturação de

determinada ação social ritual ou artística para compreender as formas generalizadas em

determinada cultura, mas também para identificar suas diversidades e particularidades

em manifestações locais.

Para Singer as análises das Performances Culturais podem complementar os

estudos sobre as culturas de forma que os dados e as análises extrapolem o campo do

social e abarque as dimensões culturais, artísticas e, certamente, subjetivas das

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diferentes culturas. “Assim, dever ser as análises das Performances Culturais, exercidas

por contraste com outros parâmetros, sociais, políticos, culturais, distanciando-se do

vício de análise totalizante e individualizador” (CAMARGO, 2012, p.7).

Ainda neste texto o autor apresenta um pouco da trajetória acadêmica de Singer

para melhor elucidar os elementos e propostas conceituais por ele apontadas. Um

estudioso com formação múltipla, Singer inicia sua carreira na cidade de Detroit, o

grande polo norte-americano responsável por grandes alterações na vida econômica do

século XX. Segue, posteriormente, para Chicago ingressando na importante e renomada

Universidade de Chicago. Esta, por sua vez, se tornou uma referência em diferentes

áreas. Foi lá, por exemplo, que se desenvolveu o pragmatismo de Jonh Dewey e George

Mead.

Numa clara intervenção acadêmica no complexo meio que a circundava, a Universidade de Chicago torna-se berço da antropologia cultural e dos serviços sociais, atuando ativamente no apoio a imigrantes e trabalhadores pobres. Este trabalho é reconhecido principalmente pelas atividades (...) na Hull House, um grande complexo cultural e social privado que provia cursos de educação de adultos, preparação técnica e cultural, diversão, arte, entretenimento e comida, com declaradas tintas de reforma social. (CAMARGO, 2012, p.11).

O autor destaca, também, o acelerado processo de crescimento do contingente

populacional da cidade de Chicago em um curto espaço de tempo. O crescimento,

principalmente, do total de imigrantes chama atenção para o fato da cidade ser um local

de grandes fábricas dos trabalhadores e imigrantes e das grandes lutas sociais. Chicago

era uma cidade onde diferentes culturas, claramente distintas, coabitavam os mesmos

espaços, constituindo guetos e pequenos grupos dentro da grande metrópole, “num

processo que ia da tentativa de sua manutenção, mas também de adaptação e mudanças

em seu modo de vida” (CAMARGO, 2012,p.14).

Com sua formação múltipla e tendo tido contato com civilizações marcadas pela

extrema diversidade cultural, Singer chega à Índia para aplicar o que chamou de “estudo

metodológico de campo” para entender elementos das pequenas culturas para distingui-

las dos padrões daquela civilização. Para Singer era “uma forma de estabelecer a

importância de um método de analisar as tradições culturais num estudo de urbanização

e (das) mudanças culturais configurando-se como um campo de estudo metodológico”

(SINGER apud CAMARGO, 2012, p.16).

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A partir do estudo e análise de ritos e cerimônias daquela civilização, Singer

compreendia não somente as características da Grande Tradição, mas também suas

modificações e incorporações dos padrões da modernidade e da globalização. Ele irá

lidar principalmente com “as Performances Culturais como método de análise e na

constatação de como as formas contemporâneas da civilização se introduzem nesse

processo” (CAMARGO, 2012, p.17).

Fechando o texto o autor retoma para o conceito das Performances Culturais na

tentativa de ampliar e não incorrer no erro de admitir que qualquer ação trata-se de ser

conceituada ou analisada dentro desse campo de estudos. Daí a necessidade de se

entender a diferença entre Performances e Performances Culturais, esta última sempre

admitida no plural. Performances Culturais são assim para Camargo (2012)

(...) um conceito metodológico que se estabelece no movimento das contradições das culturas e tem como objetivo analisar fenômenos concretos em suas distintas manifestações, identificar os elementos de mudança ou adaptação nestas tradições contemporâneas. (...) são a busca da determinação do que foi, do que é e do que se pode tornar, não apenas um levantamento do “essencial” de determinada cultura, mas como uma forma em processo de diálogo. (p.19).

Buscando efetivar um diálogo profícuo entre o texto estudado e meu objeto de

pesquisa, apontarei a seguir alguns elementos que permitam estabelecer essa ponte entre

o conceito de Performances Culturais e o contexto cultural no qual me insiro, de onde

falo e para onde olho a partir de minha pesquisa. Meu objeto de estudo está centrado nas

relações homoafetivas que se estabelecem em locais específicos de sociabilidade, as

festas. Começo situando esses locais como o que chamei de “pedaço gay” em Goiânia.

O “pedaço gay’ em Goiânia tem se configurado como um espaço dotado de

regras, posturas, formas de interação, criação e comunhão com características peculiares

que nos faz querer saber mais, penetrar seus espaços e descobrir seus percalços, suas

entranhas para que novas formas de ser e estar no mundo venham à tona e possam ser

compartilhadas. Suas fisionomias, seus cheiros, odores, as suas cores, movimentos

fazem parte de um corpo a ser explorado e investigado no tempo do aqui e agora.

O pedaço gay como espaço fecundo para se descobrir e investigar essas novas

formas de socialização. A socialidade nas festas do pedaço gay acontece pela troca, pelo

contato com o outro e pela ferveção dos corpos que se jogam e se apresentam como

possibilidade de existir e de pertencer aquele lugar. E aqui, especificamente, quer-se

compreender essa troca, o contato e as ações dos corpos que acontecem de forma

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ritualizada, constituindo performances do cotidiano que o extrapolam e ganham a

dimensão da pista de dança. Performance aqui entendida como comportamentos

restaurados, abertos ao jogo e ao movimento.

Quero, então, investigar os comportamentos, as sutilezas presentes nas

corporalidades e nas socialidades desse pedaço. Assim, faz-se necessária identificar

tanto as aproximações com o que acontece em outros pedaços gays, como perceber o

que os diferencia dos demais espaços. Então, é no contraste entre as culturas, os guetos

e seus subterrâneos que meu estudo adentrará. No confronto entre uma possível tradição

festiva e a emergência dessa cultura festiva atual, contemporânea. Por isso o campo das

Performances Culturais, como local de cruzamento entre saberes, de conflitos entre

subjetividades e seus contornos culturais. Quer-se compreender o fenômeno festivo

como um acontecimento estético que afirma e é afirmado na vida cotidiana.

Performances artísticas constituídas a partir da vida e performances do cotidiano

transformadas e transportadas para um campo artístico. Interdisciplinaridade,

multiculturalismo e pluralidade. É nesse pedaço que vamos pisar!

Sobre os estudos de Victor Turner e Richard Schechner podemos perceber que

estão entrelaçados e constituem um campo conceitural interdisciplinar. Turner parte de

sua experiência em rituais e dramas sociais. Schechner, por sua vez, traz sua experiência

em teatro de vanguarda. As influências de Turner sobre Schechner se dão no

estabelecimento das relações entre dramas estéticos e dramas sociais. “Dramas sociais

afetam dramas estéticos, e dramas estéticos afetam dramas sociais” (DAWSEY, 2011,

p.208). Para as formulações de Turner alguns conceitos apontados por Schechner foram

fundamentais como o de “comportamento restaurado”. Diz Turner:

(...) aprendi com Schechner que toda performance é “comportamento restaurado”, que o

fogo do significado irrompe da fricção entre as madeiras duras e suaves do passado (...)

e presente da experiência social e individual” (TURNER apud DAWSEY, 2011, p.

208).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CAMARGO, Robson. Milton Singer e as Performances Culturais: Um conceito interdisciplinar e uma metodologia de análise. in Karpa.at https://ufg.academia.edu/RobsonCamargo ouhttp://web.calstatela.edu/misc/karpa/KARPA6.1/Site%20 Folder/KARPA6.1.html

DAWSEY, J. C. Cadernos de Campo 20. Schechner Teatro e Antropologia in http://www.performancesculturais.emac.ufg.br/pages/38092