HOBSBAWN, Eric - Ecos Da Marselhesa

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E-quauo brilhan tes e tl..'l:3 .io s h isto -

dad. . . .Of i n , g . I t. !; E r . 'k .~ . . Hoh.b. ~wl,n. en-frenea as tenratrvas de reVlS30 his ro-

rio griflca d a R ev oll!..t¢ o P ra nce sa q u e

r iveram gra nde re pe rcu ssa o PQ r ocasiao do re-

cente bicentenario da tornada c i a Bast i lha ,Em Eros a a Matselhestl; Hobsbawm se pm-

poe niu 8 , 6 defender como explicar a t inter-

prem~aQ de lnspiracao rnarxista que hoje ealvo da crftica revisicnisca. Para tanto, ele si-

rua a Revolucao Francesa na historia dos s e -culos XIX e XX~ examinando 0. proce.sso de

sua rccep ~[Qnestes duzentos anos e 0 sign ifi-

cad 0 de sua heranca,

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I~re impressi lo

ERIC J. HOBSBAWM

E CO S D A MARSE LH ESA

Dais seculos reveem

a R evo lu cd o F ra nc es a

Traducao:

MARIA CEUA PAOLl

(

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C OM PR A ~ ~

DATA 0 --:.. \ 0 / ~ 'l,R $ . L : ? : . l . . ~ . .$ .• .. . . .- - -

Nt: 3(.,0>c9-Y

tJ F ;: ~ 3 3 ~

Copyr ight © 1990 by E. J. Hobsbawrn

Titulo original:

E c ho e s o f t h e M a r se il la is e

T wo c en tu rie s l oo k b ac k o n t he F re nc h R ev ol ut io n

SUMARIOapac

Hi/fa deAlmeida

Preparac ao:F l t' it 'i o R i be i ro d e O l iv e ir a

lndice rernisaivo:

Cintia Avila

Revisao:

Rosemary Cataldi Machado

Isabel Cur}'

Agradecimentos .• • • • • ~ • • • • • + • • • • • • ~

Prefacio , . , , .

7

9Dados lmemacionais de Catatogecao na l"1.Jblk~ao (n!)

( C fu n .a : ro B r a si l el r a d o L i "T O . SI B£-lI sil)

I. Uma revolueao de ciasse media .

2. Alem da burguesia .+ • • • • •• • • •• • •

17

47oosoawm. Eric J., 1917·

F...L."{);;; 'a M w -s .e lh e" a : do is s ecu lo s r e .. ..e -m a Rc\O~~ao

Prance-a I Eric J, H cb sba wm ; ,rad~aG M~ r iOLeel i a P a ol i - -

Sao Pau lo Companh ia das Let ra . . 1996.3. De urn centenario a outro . . 81

Titulo original: Echoes of the Marselluise: two cemurles

1 0 01 b a ck o n t he F r e n e ll R c vc lv . .u o n.

Bib liograf i~ ,

l"i.RN 85·7164-594-9

4. A revisao que subsiste . ~ • • • • • • • + • • • • • • ~ • • • 105

1 . P r a n ca - H ~ : ,; l. O di ! l R . . .: :~'ol~ao, 1 7 89 · 1 7 99 H i st o ri o gr a -

f ia 2 . F r an ca - H is to rl a R .. .. -: \· ol ~a {) . 1 78 9- ] 7 99 - [nflll~nda.<

1.Tilulo

A ~ dipen Ice , ,

Notas . 135

12 9

fndice remissivo . . . . . . . . . . . . . , . , , 151

coo·94-\.04()72

fndi~f: paru .;;.:d~logo~istemMic()

I . H i st cr io gr s fi a : R 1 . ." :...)h .l~ P runce sa 9 44.cu on

2:. Rcv ol ~! o P ra nc cs a :H l ao ri og ra te 9 44 , 04 07 2

1996

Todns 0, dir ei tos des ta edi~i io r es ervados 11

EDffiJRA SCHWAH:CZ LTDA.

Rua Bande ir a Pauli st a, 702, C J. 72

04532·002 - Sao Paulo - SP

Telefone: (01 1) 866-0801

Fax: (011) 866-0814

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AGRADECIMENTOS

E s te l iv ro e u m a v er sa o r el at iv am e nt e a m pl ia da da s .r es C o n-

fe re nci as M a so n W e lc h G ro ss q ue fui c on vid ad o a d ar n a U niv er si-

d ad e d e R utg er s, N ew B ru ns w ic k, N e w Je rs ey , e m a br il d e 1 9 89 . M e u

p rim eir o a gr ad eci me nt o e , p orta nto , a e ss a u niv ers id ad e, p or te r m e

convidado: a R utg er s U ni ve rs ity P re ss , q ue s ug eri u a p ub lic aca o; e ,

s ob re tu do , a o f al ec id o R ic ha rd S ch la tt er , u rn a m ig o e e m in en te h is to -

r iador, d e q ue m p ar ti u a i ni ci at iv a d o c on vi te . A m a io rp ar te d a redacao

d es sa s c on fe re nci as e s ua s ub se qu en te e la bo ra ca o fo ra m fe it as , e m

con dico es de q ua se u to pica perfe icao , n o C en tro para a H is t6r ia daArte e H u m a n id ad e s J. P au l G et ty , d e S an ta M o n ic a, C a li fo rn ia , o nd e

fu i p ro fe ss or v is it an te n a p ri m av er a d e 1 9 89 . E g ra n de m i n ha g ra ti da o

a e ssa in stitu ica o e ao s co lega s e am igo s q ue h i es t iveram du ra nte

a qu ele s m es es . F ere nc F eh er d en -m e a o po rtu nid ad e d e re al iza r u ma

e xp lo ra ca o p re li min ar d e a lg un s d os te ma s a qu i t ra ta do s q ua nd o m e

pediu para co ntr ib uir co m 0 m im er o e sp eci al s ob re a R ev olu ca o

F ra nc es a d e Social Research ( 56, n Q 1 , p rim av er a d e 1 98 9) , a r ev is ta

daNew S ch o ol f or S o ci al R e se a rc h, c u jo s e s tu d an te s h a vi am p ac ie n te -

m en te a ss is tid o a m in ha s a ula s s ab re " Re vo lu ca o n a H is to ri a" . U rn

d es se s e st ud an te s, F re d L o ng en ec ke r, a ju do u- me a e xp lo ra r a s jo m a is

do secu lo XI X e d o co me co d o s e cu lo x x. U ma le itu ra d os c om en ta rio s

fr an ce se s r ec en te s s ob re a R ev ol uc ao F ra nc es a f om e ce u a a dr en al in a.

Q u in t in H oa re , G eo ffrey N ow el l Sm ith e o s edi t o res

L aw ren ce e W ish a rt perm it iram a re im pre ssa o de trecho s do s

Cadernos de prisiio de Gram sc i .

E. 1. H.

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PREFAclO

Em janeiro de 1989, aproximadamente mil titulos em frances

estavam disponiveis em catalogos de livrarias prontos para 0 bicen-

tenario da Revo l ucao , Desde entao, 0 numero de titulos publica-

dos em outras linguas, sobretudo em ingles, deve ter subido em

varias centenas. Vale apenas adicionar mais urn a esses mimeros?

o presente ensaio tern a desculpa de ser baseado nas Conferencias

\ Mason Welch Gross, em Rutgers, a universidade estadual de New

Jersey, em 1989, e a Revolucao Francesa era urn assunto 6bvio no

ana de seu bicentenario. Noentanto, explicar nao e justificar, Tenhoduas justificacoes.

A prirneira e que a nova literatura sabre a Revolucao France-

sa, especialmente em sell proprio pais, e extraordinariamente dis-

torcida. A combinacao de ideologia, moda e poder publicitario da

rnidia modema perrnit iu que 0bicentenario fosse amplamente

dominado por aqueles que , em uma palavra , nao gostam da Re-

volucao Francesa nem de sua heranca. Isso nao e novo - em sell

primeiro centenario foram escritas mais coisas contra a Revolucao

do que a sell favor - embora seja de a lgum modo surpreenden te

ouvir urn primeiro-ministro (socialista) da Republica Francesa,

Michel Rocard, saudando 0 bicentenario "porque este convenceu

muitas pessoas de que uma revolucao e per igosa e que, caso sejapossfvel, e melhor passar sem ela". ' Esses sao sentirnentos ad-

miraveis que provavelmente expressam, na maior parte das vezes,

urn amplo consenso. As epocas em que aspessoas comuns querem

uma revolucao, sem mencionar as epocas em que a fazem, sao por

def inicao pouco freqiientes . Mesmo ass irn, pode-se pensar que

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existem momentos -1789 foi urn deles, e monsieur Rocard pode-

ria, sern dtivida, pensar em varios outros em 1989, caso sua mente

vagasse para 0 leste de Paris - em que os povos deram sinai s de

querer ganhar Liberdade, Igualdade e Fraternidade.

A novidade da s it u a ca o a t u al e que a re je icao da memoria daRevolucao Francesa vern daqueles que a desaprovam sob 0 argu-

menta de que a tradicao central da historiografia francesa e, desde1815, r n a rx is t a e , como tal, inaceitavel academicamente por uma

nova escola de historiadores "revisionistas". ("Enquanto iS50, as

caminhoes de lixo rolam pelas ruas recolhendo a velha-guarda [de

historiadores], e a cabeca de Marx, espetada em uma lanca, e car-regada no al to pe la mul tidao", como nota urn hi stori ador rea-

cionario que, embora ignorante do assunto, capta 0clima dos tem-

pos que corrern.)'

Na verdade, houve avances notaveis na pesquisa, sobretudo

nos anos 70, feitos principalmente por historiadores ingleses e arne-

ricanos, como podem verificar os leitores da revista Past and Pre-

sent - que tern publicado artigos da maioria dos academicos re-

novadores.' No entanto, e errado super que esses novos trabalhosrequeiram que toda a histor iograf ia do seculo seja jogada fora, e

mais errado ainda supor que o s e s fo r c os i d eo l o gi c os contra a Re -

volucao Francesa estejam baseados em pesquisas novas. Eles cor-

r e spondem a diferentes in terpre tacoes daquilo que tanto velhos

como novos h i st o ri a do r e s a c e it am como sendo os me smo s fatos.

Alem disso, as varias versoes "revisionistas" da historia revolu-

cionaria, a s vezes conflitivas, nao sao necessariamente melhores

guias do que as antigas versoes para se compreender 0 papel e as

consequencias historicas da Revolucao. Somente alguns dos revi-

sionistas pensam assim. De fato, algumas das novas versoes ja estao

mostrando sinais de idade, como outras mais 0 farao na ocasiao

oportuna.o presente ensaio e tanto uma defesa quanto uma explicacaoda velha tradicao, Airritacao com alguns dos ataques que ela sofre

e a primeira razao para escreve-lo. Asegunda razao, e amais irnpor-tante, e que este ensaio trabalha com urn tema surpreendentemente

desprezado: nao com a historia da propr ia Revolucao Francesa,

mas com a historia de sua recepcao e interpretacao, da heranca que

recebeu dos seculos XIX exx. Muitos especialistas do tema ~ entre

os quais nao me incluo - seguem muito de perto os aconteci-

rnentos de 1789-1799, ou qualquer data que escolharn para definir

o perfodo revolucionar io , de modo que p ou co s e incomodam com

o que veio depois. No entanto, a Revolucao Francesa foi urn con-

junto de acon t ec imen t o s tao ext raordinar io , tao cedo reconhecidouniversal mente como a fundacao do seculo XIX, que parte de sua

his tor i a e 0 que 0 seculo fez dela, ta l como a t ra n sf or m a ca o p o s-

tuma de Shakespeare no maior genic Iiterario britanico e parte dahistoria do proprio Shakespeare. 0 seculo XI X estudou, copiou,

comparou -se com aRevolucao Francesa; ou tentou evita-la, ignora-

la, repeti- la ou ultrapassa-la, A maior parte des te pequeno livro

trata d e s se p r o ce s s o de ass imi lacao de s ua s expe r ienc i a s e I icoes ,

o qual, certamente, esta longe da exaustao. E uma ironia suficienteda historia 0 fa to de que - no exato momenta em que os liberai s

f ranceses, ansiosos por dis tanciar-se de urn passado jacobino,

declaravam que a Revolucao nao tinha mais nada a dizer ao pre-

sente - a relevancia imediata de 1789 para 1989es tivesse sendoafrrmada pelos estudantes em Beijing e pelos membros recente-

mente eleitos do Congresso em Moscou,

E, contudo, 0 estudioso da recepcao e interpretacao que 0

seculo XI X fez da Revolucao Francesa deve impressionar-se com

o conflito entre 0 consenso daquele seculo e, ao menos, algumas

da s modern as pe squ i s a s r ev i si on i s ta s , E a1goque exige explicacao,mesmo que admitamos os preconceitos politicos e ideologicos dos

historiadores ou sua simples ignorancia e falta de i m ag in a ca o , O s .

revisionistas tendem a sugerir que a Revolucao realmente nao fez

tanta diferenca na historia da Franca e que certamente nao repre-

sentou uma mudanca para melhor. De fato, ela foi "desnecessaria",

nao no sentido de poder ter side evitada, mas no sentido de ter tido

r~sult~dos modestos - negatives mesmo - a cus tos despropor-

cronai s . Poucos observadores do seculo XIX, e menos ainda histo-

r iadores, teriam entendido essa polemica, e tampoueo a ter iam

aceitado. Como explicariamos que homens i n fo rmados e inteli-

. gentes da metade do seculo XIX - urn Cobden, ou a historiador

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Sybel - tinham como certo que a Revolucao Francesa havia

aumentado 0 crescimento economico frances e criado urn corpo

macico e satisfeito de proprietaries camponeses?' Nao se tern essa

impressao de grande parte da pesquisa corrente. E , embora as

impressoes dos contemporaneos aos fatos nao tenham autoridade

em si mesmas , podendo ser invalidadas pela pesquisa modema

seria, elas tambern nao podem ser dispensadas como mera ilusaoou erro. E muito facil mostrar que, segundo 0 modo como as

depressoes economicas sao hoje medidas, os anos entre meados da

decada de 1870 e 0 comeeo da de 1890 noo foram, em nenhum

sentido, uma era de queda secula r, e menos ainda de "grande

depressao": no entanto, devemos ainda explicar por que pessoas

nonnalmente sensatas, com grande senso da realidade economica,

insistiram que assim foi. Como, entao, podemos explicar a diver-

gencia, a s vezes muito grande, entre as visoes antigas e novas?[2 ] Urn exemplo pode ajudar a explicar como surgem essas diver-

gencias. Entre historiadores economicos, hoje, tomou-se fora de

moda pensar que a economia britanica, sem falar de outras econo-

mias, tenha passado por uma "revolucao indus tr ial" entre 1780 e1840 - nao tanto pelas razoes ideologicas que f izeram 0 grande

biometrista Karl Pearson rejeitar a descontinuidade porque "ne-

nhuma grande reconstrucao social que beneficie permanentemente

qualquer classe dacomunidade pode ser trazida por uma revolucao"

- mas porque as mudancas na taxa de cresci rnento economico e

as transformacoes na economia, ou mesmo seu abrupto aumento

quantitativo, simplesmente nao parecem ser, aos nossos olhos, am-

plos ou repentinos 0 suficiente para garantir tal descr icao, De fato,

e faci) dernonstrar que, nos termos dos debates entre historiadoresquantitativos, essas mudancas nao eram "revolucao".

Como, portanto, podemos explicar que a expressao Revolucdo

Industrial tenha entrado no vocabulario da Inglaterra e da Franca

na decada de 1820, junto com 0 vocabulario recern-inventado para

o novo conceito de industria, de tal modo que, no final de 1830, a

expressao ja era "algo como urn termo de usa corrente, nao neces-

sitando explicacao" entre os escritores de problemas socials?' Alem

disso, e claro que pessoas informadas e intel igentes , entre elas

homens com muita exper iencia pratica em tecnologia e manufa-

turas, previram (com esperance, medo ou sa t i s facao) a total trans-

formacao da sociedade atraves da industria: 0 tory Robert Southey

eo fabricante socialisra Robert Owen, antes mesmo de Waterloo;

Karl Marx e sua bete noire, 0 dr, Andrew Ure; Frederick Engels e

o cientista Charles Babbage. Parece claro que esses observadores

contemporaneos naoestavam meramente prestando tributo a s novi-dades dramaricas das rnaquinas a vapor ou ao sistema de fabrica,

ou refletindo a alta visibilidade social de lugares como Manches-

terou Merthyr, atestada por sucessivos visitantes continentais; eles

estavam sobretudo impressionados pelo potencial ilimitado de re-

volucao que tais coisas corporificavam e pela velocidade da trans-

formacao que, corretamente, predisseram. Em resumo, tanto os his-

toriadores ceticos como os contemporaneos profeticos estavam

certos, embora cada grupo se concentrasse em urn aspecto distin-

toda realidade. Uns salientaram a dis tancia entre 1830e a decada

d e 1980, enquanto outros enfatizaram aquilo que viam como novo

e dinamico em detrimento do que viam como relfquias do passa-

do, destinadas, cedo ou tarde, a s margens da historia,Ha uma diferenca similar entre os observadores conternpora-

neos e os comentaristas pos-napoleonicos da Revolucao Francesa,

bern como entre os historiadores que continuaram em suas trilhas

e os revisionistas de hoje. Aquestao permanece: quem, dentre eles,

e mais iitilao historiador doseculo XIX?Aqui nao ha duvida. Vamossupor que queremos explicar par que Marx e Engels escreveram

urn Manifesto comunista que preve a denubada da sociedade bur-

guesa por uma revolucao do proletariado, filha da Revolucao

Industrial, em 1847; par que 0 "espectro do comunismo" rondava

tantos observadores na decada de 1840; par que representantes dos

trabalhadores revolucionarios foram incluidos no govemo pro-

visorio frances depois da Revolucao de 1848 e por que os poli ti -

cos chegaram a considerar se a bandeira para a nova Republica

deveria ser vermelha ou tricolor. E de pouea uti Iidade a historiaque meramente nos conta 0 quanta a realidade da Europa ociden-

tal estava longe da irnagem cultivada nos cfrculos radicais, E umahistoria que nos conta apenas 0 obvio, ou seja, que 0 capitalismo

12 13

 

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em 1848, la nge de se s uste nta r s ob re pe rn as ca mb ale an te s, a pe na s

comecava a dar seus grandes passos - com o de fa to lo go reco -

n heceram os proprios revolucionarios sociais, 0 q ue r ea lm e nt e

necessita de explicacao e por q ue , a pe sa r d o d es en vo lv im en to

q ua ntita tiva me nte fra eo d o capitalismo industrial, a ideia de que a

p ol it ic a n a Franca, e talvez em toda parte , to rnava-se um a lu ta de

c lasSes . e_ I! t reem presa i jb , 'burgueses e t ra ba lh ad or es as -S iU ar ia do s, -_.---- .. ._--..1.----oua de qu e 0 co mu nis mo _po dia im agin ar a si mesrno - e s er tem i-

dO _ _ : : _ c o m o u ma a me a~ a a · s o ci e d ad e bu rgu e s a~ -pm te rr u n s er ideias

c on sid er ad as -s er ia me nt e p or todos, E aiiida assimo fCitam, e na~

apenas po r a lg un s po ue os jovens enraivecidos.

Um a interpretacao historica enraizada no contexte eontem-

p or an eo - tan to 0 e on te xto in te le ct ua l c om o 0 s ocia l e 0 politico;

tanto 0 contexto existencial como 0 a na litico - e indi spensavel

aos h is to ria do re s q ue de se ja m r es po nde r a q ue st5 es sobre 0 pas-

s ad o. T a lv ez 0 seja ate m esm o na in ter rogacao d o p re s en t e. Pode

au niio se r corre to demonstrar, atraves do arquivo e da equacao,

q ue n ad a m udo u multo en tre 1780 e a decada de 1830, m as ate que

en tendam os qu e as pessoas acreditavam que viveram ou que

estavam vivendo em um a era de revolucao - u rn p ro ce ss o d e tr an s-

formacao qu e ja havia convulsionado 0 continen te e continuaria a

convu ls iom i-Io -, nada en tenderem os sobre a h ist6ria do m undo

depois de 1789. Todos nos, inevitavelmente, escrevemos a historia ' " *de nos so proprio tem po q uando olham os 0 passado e , em algum a

medida, empreendernos as bata lhas de ho je no figu rino do peno-

do. M as aqueles q u e e sc re ve m somente a historia d e s eu p r6 pr io

tempo nao p od em e nt en de r 0pa ssa do e a qu ilo q ue veio d e le . P o dem

a te m e sm o f al si fi ca r a passado e 0 presente, m esm o sem intencao

de 0 fazer.

o julgr m e nt a p ol it ic o e meno s importante d o q ue a a na lis e. Afinal

de contas, como disse ° grande crftico literario dinamarques Georg

@ ] . . . .--; :::B;:;ran=d:. . ;e; , ; ;s_;a; ;_J:. . :. ,;P1ro:. . . l)P;_;(o; . :s; :; it; , ; ;o_d;;_o; ;_; ;a.&;. ; , ; ;p;ai; ;_x;,; ;o. . :;fi; ,; ; ;ad; ; ;_o; ; . . . . ; ;a; , ;; ta::. :l. , ;qu; . :e;_d;; ;_e:. . .. . . :.Hlte:.......:T;;,;aJ:..;·i:. . ;e;_a:;_ '---.

Revolu; ; :ao em seu livro Origins of contemporary France, qu al a

i mp or ti in ci a d e se fa ze r u rn sermao c on tr a u rn t er re m ot o (au a f av o r

dele)?

E. 1.Hobsbawm

Santa Monica e Londres, 1989

,

~15

Este traba lho fo i escrito na crenca de que os duzen tos anos

que se seguiram a 17 89 na~ podem ser n egligen ciados caso

queiram os en tender "a m ais te rrive l e cru cia l se rie de aconteci-

m en to s em to da a h isto ria [ ... J 0 v er da de ir o p on to in ic ia l d a h is to ri a

d o s ec ul o XIX", co mo a s d efin iu 0 historiador britanico 1. Holland

Rose. E em bo ra eu par tilhe da opin iao de que a efe ito dessa re-

vo lucao sobre a hu man idade e sua h isto ria fo i benefice , cre io que

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I

j- 1

~-- UMA REVOLUr;Ao DE CLASSE MED1A

@ ] 0 subtituLo deste Livro e "Dois seculos reveem a Revolucao

Francesa" _*Reve]'_o_~~i P_<l!_,_?ul_!Iarem_g__l!~I9!!eI_9ire",ao,e!ll- . .

pre implica um ponto de vista - no tempo, noespaee, em uma

atitude mental 00 outra perspeetiva SlIbjeti-\'2._ Enquanto escrevo,

vejo Santa Monica do alto deminhajanela e 0que vejo e bern real.Nao invento os predios, aspalmeiras, 0 estacionamento que se situa

seis andares abaixo ou as colinas adiante, apenas delineadas atraves

da neblina. Nessa medida, as teoricos que veem toda realidade

como urna construcao puramente mental, alem da qual a analise

niio pode penetrar, estao errados; e, ao afirrnar isso de saida, estou

f ixando minhas cores conceituais em algurn tipo de mastro. Se a

historia que escrevemos fosse indistingufvel da ficcao, nao have-

r ia Ingar para a profi ssao d e historiador e pe s soa s como eu teriam

pesdido.o.tempo de suas vidas . No entanto, e inegavel que 0 que

vejo atraves dajanela, ou 0 que revejo no passado, nao e arenas area lidade hi fora ou la arras, mas sim uma selecao cla ramente

especifica. E tanto aquila que posso ver fisicamente do lugar onde

e sto u e sob d et er m in ad as c ir cu ns ta nc ia s - p or e xe m pl o, n ao posso

ver alga na direcao de Los Angeles sem ir ate 0 outro lado do pre-

dio, e nao posso ver muita coisa das colinas ate que 0 tempo me-

lhore - como aquilo que estou interessado em ver, Da infinitudedo que e objet ivamente observavel la fora, estou de fato obser-

vando apenas uma selecao muito limitada. E, e claro, se en estivesseaqui olhando a mesma cena da mesma janela em algum outro

(*) Two centuries look back on the French Revolution, no original.

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';1 11

' . 1 1

IiI

memento, poderia estar focalizando diferentes aspec,tos; au s~ja,

fazendo uma selecao diferente, No entanto, e quase inconcebivel

que eu, ou qualquer outra pessoa, olhando des ta janela em qual-

quer tempo em que a vista permanecesse como esta',n~o pU.dess.e

ver, ou, mais precisamente, notar algumas cardctenstlcas ~nev~-

taveis do panorama: por exemplo, 0 esguio pinaculo da Igr~Ja

exatamente ao lado da grande laje plana de urn ediffcio de dezoito

andares e a torre ciibica no topo de seu telhado.

Nao desejo trabalhar essa analogia entre olhar para uma pai-

sagem e olhar para uma parte do passado. Em qualquer caso: q~ero

retomar a questao que tentei levantar ao longo des tas pagw_as ,

Como veremos, variou enormemente, em grande parte por razoes

politic as e ideol6gicas, 0modo como se leu a Revolu~a,o F~ance-

sa a medida que as pessoas a reviam, ao longo dos dots seculosdesde 1789. Contudo, duas coisas sobre ela foram geralmente

aceitas, A primeira e a forma geral da paisagem que viam. Q~ais-

quer que se jam as teorias sobre as origens da Revc lucao, todos

concordam que havia uma crise na velha mona r qu i a que, em 1788,

levou os Estados-Gerais - a assernbleia que representava os tres

estados do reino, 0 clero, a nobreza e 0 resto, 0 "Terceiro Estado"

_ a serem convocados peJa primeira vez desde 1614. Desde que

foram estabelecidos pela primeira vez, os marcos politicos princi-

pais continuaram inalterados: a transformacao dos Est~dos-~rais,

ou preferencialmente doTerceiro Estado, n~Asse~blela Nacional;

os atos que visivelmente terminaram 0An,t1goReglfn~ - = - a.Toma-da da Basti lha, a prisao real, no dia 14dejulho; a des is tencia, pela

nobreza, de seus direi tos feudais em 4 de agosto de 1789; a Decla-

rQ / ;i io d o s Direitos; a rransformacao da Assernbleia Nacional ~m

uma Assembleia Constituinte que, entre 1789 e 1791, revolucio-

nou a estrutura administrative e a organiza~iio do pais (alias, intro-

duzindo 0 s is tema metr ico no mundo) e que esbocou a primeiradas quase vinte constituicoes da Franca modema, uma monarquia

liberal constitucional. Tarnbem nao M desacordo sobre os fatos da

dupla radicalizacao da Revolucao depois de 1791, que.l~vou, em

1792, a i rrupcao da guerra entre a Franca revoluclOnan~ e ~~a

coalizao variada de potencias estrangeiras contra-revoluclOnanas

18

e insurrei~oes internas contra-revolucionarias, Essa situacao durou

at e 1815, quase sem interrupcoes. Tambem levou a segunda revo-lu~ao de agosto de 1792, que aboliu a monarquia e instiruiu a

Republica - uma era nova, absolutamente revolucionaria , na

his t6ria da humanidade - s imbolizada, com urn pequeno atraso,

por urn novo calendario. Cornecando no ano I, 0 calendario aboliu

a antiga divisao semanal, dando aos meses novos nomes para propi-

dar aos estudantes de hist6ria dores de cabeca, mas tarnbem titeis

recnicas rnnemonicas , (A nova era e seu calendario duraram ape-

nas doze meses.)

o per iodo da revolucao radical , de 1792 a 1794, e especial-

; mente 0 da Republica Jacobina, tambem conhecido comu 0 "Ter-

; ror", de 1793 a 1794, constituem urn marco ainda rnais reconheci-

Ido universalmente; tambem 0 e 0 fim do Terror, 0 famoso Nove

Terrnidor, que assistiu il . pri sa? e execucao de ~obespie rre - e~-

bora sobre nenhum outro penodo da Revolucao Francesa as OP1-

nioes tenham divergido tao drasticamente. 0 regime de moderado

liberalismo e corrupcao que dominou nos cinco anos seguintes nao

t tinha uma bas~ adequada de.r~spaldopolitico ou a habilidade para

) restaurar condicoes de estabi lidade e - novamente todos concor-

, . dam - foi substituido, no farnoso Dezoito Brumario de 1799, por

uma d itadura rnil ita r mal disfa rcada, a primei ra de mui tas na

his toria moderna, resultado do goJpe de urn jovem general bern-

sucedido e ex-radical, Napoleao Bonaparte. Amaioria dos historia-

dores modernos da por terminada a Revolucao Francesa nesse

ponto, embora, como veremos, 0 regime de Napoleao - pelo

menos ate sedeclarar imperador em 1804- foi normalmente con-

s iderado como a ins ti tucionalizacao da nova sociedade revolu-

cionaria durante a primeira rnetade do seculo XIX. Pode-se lembrar

que Beethoven so reti rou sua dedicat6ria da Sinfonia eroica a

Napoleao depois que ele deixou de ser 0 chefe de uma republica,

Nao esta em disputa a sucessao bas ic a de acontecimentos , nem a

natureza e per iodizacao da Revolucao Francesa. Quaisquer que

sejam nossas discordancies sobre a Revolucao e seus marcos, amedida que vemos tais marcos na paisagem hisror ica, estamos

falando sobre a mesma coisa. (Nem sempre esse 6 0 caso em his-

19

 

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roria.) Mencione-se 0 Nove Termidor e qualquer pessoa que tenha

o mais leve interesse na Revolucao Francesa sabera 0 que significa:

a queda e execucao de Robespierre, 0fim de sua Casemais radical.

A segunda nocao sobre a Revolucao Francesa que era uni-

versalmente aceita, pelo menos ate bern pouco tempo arras , e , de

varies modes, mais importante: que a Revolucso foi urn episodic

designificado profundo e sem paralelo nahistoria detodo 0 mundomoderno, qualquer que seja 0modo como essa significacao e posta.Para retomar a citat;ao de Holland Rose, "foi a serie de aconteci-mentos mais terrivel e momentosa em toda a his toria [ .. .1 0 ponto

de par tida real para a his toria do seculo XIX; pois esse grande le-

vante afetou profundamente a vida polft ica e, mais ainda, a vida

social do continente europeu". ' Urn historiador liberal alemao de

1 8 48 - Karl von Rotteck - pensava que nao havia "nenhum even-

to maior do que a Revolucao Francesa na his t6ria mundial, e dif i-

cilmente algum evento de grandeza semelhante". ' Outros his to-

riadores foram menos radicais: apenas pensavam que a Revolucao

Francesa havia sido 0 mais irnportante acontecimento historico

desde a queda do Imperio Romano no seculo v d. C. Os mais cris-

taos dentre esses historiadores e, entre os alemaes, os mais patrio-

tas, inclinavam-se a pensar nas Cruzadas e na Reforrna (alema)

como acontecimentos comparaveis It Revolucao Francesa, mas

Rotteck, que chegou a considerar como candidatos alternativos

eventos tais como a fundacao do Isla, as reforrnas do papado me-

dieval e as Cruzadas, acabou por deles desistir. Para ele, os unicos

processos que haviam mudado 0 mundo com igual intensidade

foram 0 cristianismo e a invencao da escrita e da imprensa - e

eles mudaram 0 mundo apenas gradualmente. Mas a Revolucao

Francesa, "abruptamente e com forca irresistivel, convulsionou 0

continente onde nasceu. Tarnbem lancou seus raios em outros con-

tinentes. Desde que surgiu, tern sido virtua1mente 0 unico objeto

a ser considerado na cena da historia mundial". '

Portanto, podemos assumir que as pessoas no seculo XIX -

pelo menos as pessoas le tradas - conside ravam a Revo lucao

Francesa sumarnente importante, urn acontecimento, ou uma serie

deles, de tamanho, escala e impacto sem precedentes , Essa con-

sideracao nao se devia apenas as consequencias historicas enormes

que pareciam obvias aos observadores, mas tambem It natureza

espetacular e peculiannente dramatics daquilo que aconteceu na

Franca e,atraves da Franca, na Europa e ainda alem, nos anos que

se sucederam a 1 7 8 9 . Thomas Car lyle - que havia esc rito urna

historia precoce, apaixonada e colorida da Revolucao Francesa na

decada de 1830, pensava que essa era nao apenas uma revolucaoeurope ia - conside rava-a uma predecessora do cartismo - mas

tamoem 0 grande poema do seculo XIX; uma historia real equiva-

lente aos mitos e epopeias da Grecia antiga, escri ta , contudo, nao

por urn S6foc1es ou urn Homero, mas pela pr6pr ia vida! Era uma

hist6ria de terror - e, de fa to, 0perfodo da republica jacobina de

1793 - 1 794 ainda e gera1mente conhecido como Terror, mesmo quesegundo nossos criterios de massacre 0 numero de mortes se ja

modesto, t alvez umas poucas centenas. Na Gra-Bretanha, por

exemplo, essa era a imagem que chegou mais per to da conscien-

cia publica, grar, :asa Carlyle e ao livro de Dickens , inspirado em

Carlyle, Canto de duas cidades, seguidos por epigonos literarios

populares como 0Pimpinela Escarlate cia Baronesa Orczy:0

golpedas laminas da guilhotina, as mulheres sans-culotte tricotando

impassivelmente enquanto assistiam ao rolar das cabecas dos con-

tra-revolucionarios , 0 l ivro de Simon Scharna, Cidadiios, best-

sel ler de 1989 e escri to para 0mercado de lingua inglesa por um

historiador expatriado, sugere que esta imagem popular e aindamulto viva. Foi uma his t6ria de herofsmo e de grandes fei tos, de

soldados esfarrapados liderados por generais de vinte anos que con-

quistavam toda a Europa e que arrastaram 0 continente e os mares

a uma guerra vir tualmente continua por quase um quarto de secu-

10 . Produziu herois e viloes duradouros: Robespierre, Saint-Just,

Danton, Napo l e ao , Para os intelectuais, produziu uma prosa de

lucidez e forca maravilhosamente l aconicas , Em resumo, seja I: i 0

que fosse alem disso, a Revolucao Francesa era urn superespe-

taculo.

Contudo, 0 impacto maior da Revolucao Francesa naqueles '

que a rernemoravam no seculo XIX, e mesmo no seculo XX, nao era

Iiterario e sim politico ou, mais genericamente, ideol6gico. Neste

20 21

 

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'II,

II

II

livro serao considerados tres aspectos desta analise retrospectiv_a.

Primeiro abordarei a Revolucao Francesa como uma revolucao

n u rg ue sa e , de fa to, em certo sent ido, como 0 p~ot6tipo das re -

volucoes burguesas , Em seguida, ela sera examtna~a como urn

modelo para todas as revolucoes subseqttentes. espec;almente para

asrevolucoes sociais e para aqueles que que~am faze-,l~. E, fina~-

mente, considerarei astransformacoes nas atitudes polfticas ~efl~tl-das nas comemoracoes da Revolm;ao Francesa entre 0 seu pnmetro

e segundo centenaries , e seu impacto naqueles que escreveram e

continuam a escrever sua hist6ria.

Hoje, nao s6 esta fora de moda ver .a Re;olu?ao Francesa

como uma "revolucao burguesa", como muitos hist~nado~e5 exce-

lentes considerariam tal interpreta~ao como COITOIda e msusten-

t a ve l . A s s im , embora eu nao tenha dificuldades em mostrar que os

primeiros estudiosos series da historia da Revolucao Fran~~sa ~

a prop6sito, homens que vive rarn entre 178,9e 1815 - viam-na

exatamente desse modo, serei obr igado a dizer uma palavra pre-

l iminar sobre a atual fase de revis ionismo his torico sobre. a R~-

volucao, fase iniciada pelo falecido Alfred C~bba~, da Universi-dade de Londres, em meados de 1950. Esse r ev i s i omsmo t?rn~u-se

urn ataque macico em 1970, quando Francois Fure.te ~ms Richet

criticaram a visao estabelecida da hist6ria revoluclOnana tal co~o

ensinada em uma catedra da Sorbonne (estabelecida corn tal o~Je:

tivo quase urn seculo antes).' No capitulo final. retomar:l a

sucessao canonica de professores que defenderam a Revolucao .e

a Republica. Aqui e relevante obs e r va r apenas que ° a~que revi -

sionista foi dirigido prindpalmente contra 0 que era visto como

uma interpretacao marxista da Revolucao Francesa - ou melhor,

como a interpretacao rnarxista - tal como forrnulada nos cerca.de

vinte anos que antecedent e sucedem a Segunda Guer:a Mun_dIal.

E uma quesrao relativamente t rivial saber se essa fo i, ou nao, a

propr ia interpretacao de Marx, especialmente porque 0survey

academico completo das concepcoes de .M~ e E~ge ls sobre 0

assunto mostra que suas opinioes, jarnais s is tematicamente ex-

pastas, eram as vezes inconsistentes ou incoerentes. Mas_pooe ser

relevante, contudo, mencionar de passagem que 0 concerto de re-

22

vol\J~ao burguesa (revolucao biirgerlichei, de acordo com os rnes-

mo s a c a dem i c os , aparece n ao m a is do que doze vezes nos 3 8 vo-

lumes macicos dos dois autores dos Werke."

@ ] A con ce p c ao que foi questionada e a que ve 0 seculo XVI I l

f rances como uma luta de classes entre uma burgues ia capitalista

ascendente e uma classe dominante estabelecida de aristocratas

feudai s, que a burguesia em ascensao, consc ien te de si mesmacomo classe , procurava combater para substitui-Ia na condicao de

for¢a dominante na sociedade. E s sa c o nc ep ca o via a Revo l ucao

Francesa como 0 triunfo dessa classe e, conseqiientemente, como

o mecanismo historico que acabou com a sociedade feudal-aris-

tocratica e inaugurou a sociedade burguesa capitalista do seculo

XIX , a qual - deduzia-se - nao teria podido surgir senao que-

brando aquilo que Marx, quando falava da revol u~aoproletaria que

considerava destinada a derrubar 0 capitalismo, chamava de "0

involucre da velha sociedade". Em resumo, 0 revisionismo critica-

va (e critica) 0 conceito de que a Revolucao Francesa foi essencial-

mente uma revolucao social necessaria, urn passo essencial e ine-

vitavel no desenvolvimento his torico da sociedade modema e, eclaro, a transferencia de poder de uma classe para outra.

Nao ha duvida de que algo dessa concepcao foi amplamente

conservado, e nao apenas entre as marxistas , Contudo, deve-se

tambem dizer que os grandes especialistas historicos que operavam

nessa tradicao estao longe de ser redutiveis a urn modele tao sim- -

pies. Alem disso, e uma vez mills, esse modelo nao era especif i-

camente marxista, embora - por razoes que discutirei no ult imo

capitulo - entre 1900e aSegunda Guerra Mundial atradicao orto-

doxa da historiografia revolucionaria tenha encontrado a si rnesma

convergindo com a tradicao marxista. Tambem e claro par que talmodelo seria adequado para os marxistas. Tal como era posto, ele

fomecia urn precedente burgues para 0 triunfo proximo do prole-tariado. Os trabalhadores eram outra classe que nascera e crescia

com forca irres is tfvel dentro de uma velha sociedade cujo poder

estavam destinados a tomar. Seu triunfo tambem viria inevitavel-

mente por meio da revolucao; e, tal como a sociedade burguesa se

situara diante do feudalismo que a precedera e que ela derrubara,

23

 

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a nova sociedade socialista seria a pr6xima fase, mais adiantada,

do desenvolvirnento da sociedade humana. Na era comunista esse

modelo servia mills ainda aos marxistas, uma vez que sugeria que

nenhum outro mecanisme poderia transformar a sociedade tao ra-

pida e fundamentalmente quanto uma revolucao.

Nao necessi to enumerar os argumentos que tomaram essa

concepcao insustentavel como descricao do que aconteceu na

Franca do final do seculo XVIII . Aceitemos simplesmente que nao

havia uma classe burguesa autoconsciente, em 1789, que pudesse

representar as novas realidades dopoder e co n or n ic o e que estivesse

pronta para tomar os des tinos do Estado e da sociedade em suas

proprias maos; e que, na medida em que tal classe pode ser dis-

cernida na decada de 1780, seu alvo nao era fazer uma revolucao

social mas, antes, reformar as instituicoes do reino; e que, em qual-

quer caso, ela nao visava it construcao sistematica de urna econo-

mia industrial capitalista, E, no entanto, 0problema da revolucao

b u rg u es a n ii o desaparece quando reconhecernos que na o havia

classes de burgueses e nobres distintas e antagonicas, lutando pela

supremac ia , Pois - se eu puder cit ar Col in Lucas, cujo t rabalho"Nobres, burgueses e as origens da Revolucao Francesa" tern sido

amplamente usado pelos revis ionis tas franceses - se na o havia

classes distintas e antagonicas em 1789

ternos, nesse caso, que decidir por que, em 1788-1789, grupos que

podem ser identificados como nao-nobres combatiam grupos que

podem ser identlficados como nobres, com i880 construindo as fun-

day5es do sis tema polit ico da burguesia do seculo XIX; e por que

eles atacaram e destrufram osprivilegios em 1789, com Is80 destru-

indo a organizacao formal da sociedade francesa do seculo XViIl e

preparando a estrutura dentro da qual 0 desenvolvimento economi-

co do seculo XIX poderia florescer.'

Emoutras palavras, temos de descobrir por que a Revoiucao Fran-

cesa foi uma revolucao burguesa mesmo que ninguem tenha pre-

tendido que fosse.

Esse e urn problema que nao preoeupou os hornens que

primeiro viram a Revolucao Francesa como uma revolucao social,

uma lura declasses e uma vitoria burguesa sobre 0 feudalismo nos

jl24

\

,~ anos que se seguiram imediatamente it derrota [mal de Napoleao.

I!I_e_sQr6prios eram Iiberais moderados e, mais ou menos como os

:~; burgeois sem consciencia de classe, pareciarn-se ao estranho li-

I e ra l moderado Tocqueville, que pertencia a velha aristocrada. De'~~; fato, como0proprio Marx reconheceu de born grado, esses foram

:r os homens dos quais ele derivou sua ideia de luta de classes na

t: historia, s Eles foram, essencialmente, historiadores de seu proprio

,

f . : ! . i . . tempo. Francois Guizot tinha 28 anos quando Napoleao foi man-

-s dado a Santa Helena; Augustin merry tinha vinte, Adolphe Thiers

" e F . A. Mignet, dezenove e Victor Cousin, 23. De fato, P. L. Roe-

~.. derer- que viu a Revolucao Francesacomo algo que se fez antes

i do seu a c on t ec im e n t o , " d an s les m o eu rs d e l a c la ss e m o ye nn e [nos

.r modos de vida da classe media]" e cujas ideias sobre a ascensao

secular predestinada das classes medias e sobre a substituicao da

terra pelo capi tal foram escritas em 1815 - naseera ern J754 e

tomara parte ativa na pr6pria Revolu~iio."Era urn poueo mais velho

d o q ue A nt oi ne Barnave, urn moderado que foi guilhotinado, mas

cuja "Introducao a Revolucao Francesa", escrita enquanto espera-

va a morte, segue interpretacao semelhante. Seu texto foi utiliza-do po r Jean Jaures, no livro Historia Socialista da Revolucdo

Francese, como a fundacao da interpretaeao socialista de c las se ,

Ao escrever sabre a Revolucao Francesa, esses homens estavam

f or m a nd o u r n julgamento sobre 0 que eles pr6prios haviam vivido

e, certamente, sobre a expe ri e n c ia original de seus pais, professores

e amigos. E 0 que estavam abertamente fazendo quando eome-

~~am a escrever historia, no comeco da decada de 1820, era, para

cuar um texto frances recente, "a celebracao da epopeia das clas-

ses medias francesas"."

@ l _ . Essa epopeia, tanto para Guizot e Thierry quanta para Marx,

tcome~ournuito antes da Revolucao Francesa - de fato, comecou

com a c onqu i st a da autonomia pelos habitantes dos burgos medie-

v~s com rel~ao a seus senh~res feudais, constituindo-se assim no

n~cleo daquilo que se tom~a a rnodema ==.me~.ia.I A burguesia, uma nova na~1io,cujas maneiras e moral liiioconsti-

I tuidas pela igualdade civil e pelo trabalho independente, surgiu agora

entre nobres e servos e, portanto, destruiu para sempre a dualidade

25

 

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social original do feudalismo anterior, Seu instinto para a inovacao,

sua atividade, 0 capital que acumulou [grifos meus] formam uma

f or ca q u e r ea g e de m i l m o d os contra 0poder daqueles q u e p o s su f am

a t e r r a. "

"A continuada elevacao do tiers eta: e 0 fato predominante e

a lei de nossa historia", pensava Thierry, 0 surgimento historico

dessa classe e seu acesso ao poder foi demonstrado e rat if icadopela Revolucao Francesa e, mais ainda, pela revolucao de 1830,

que foi vista por Thierry como "0 termino providential de todos

os seculos , desde 0 seculo XII","

Francois Guizot, um historiador surpreendentemente interes-

sante que se tornou primeiro-ministro da Franca no auto-reco-

nbecido regime burgues de 1830-1848. foi ainda mais inequivo-

co, 0 agregado de emancipacoes de habitantes dos burgos locais,

na Idade Media, "cr iou uma classe nova e ge r a l" . P o i s , embora nao

houvesse laces entre esses habitantes e eles nao tivessem existen-

cia comum e publica como uma classe, "homens engajados em

uma mesmasituacao atraves do pais, possuindo os mesmos inte-

resses.o mesmo modo de vida [moeurs], s6 poderiam engendrar,

gradualmente, cer tos lacos mutuos , cer ta unidade, da qual iria

nascer a burguesia. A fo rmacao de uma grande classe social, a bur-

guesia, foi a consequencia necessaria da liberacao local dos habi-

tantes do burgo"." E nao apenas isso. A emancipacao da s comu-

n a s m ed i ev a is p r od u z iu a luta de classes. "aquela luta que preenche

a his tor i a modema: a Europa modema nasce na luta das di ferentes

classes da sociedade"." No entanto, a nova burguesia, gradual-

mente crescente, estava limitada peio que Gramsci teria chamado

de sua subalternidade, 0 que Guizot chamou de "a prodigiosa

timidez de espfrito dos burgueses, sua humildade, a excessiva mo-

destia das re ivindicacoes que f az em a o govemo de se u pais, a faci-

lidade com que se pode satisfaze-los '' ." Em resumo, a burguesia

era vagarosa em marcar sua pretensao como classe dirigente; emmos t r a r 0que Guizot charnou de " a q ue l e v e rd a d ei ro e s pf r it o p o lf ti -

co que aspira influenciar, reformar, govemar. 16 E, par implicacao,

essa era a pretensao que ela deveria demarcar, Em 1829, sob 0 go-

verno reacionario de Carlos x, que logo ser ia de r rubado por uma

26

verdadeira revolucao burguesa, era impossfvel falar rnais claro de

u;Ptilpit~-ll-ni~ersitano.

' -Mas qual, precisamente, ser i a 0 cara ter da sociedade dirigida

pela burguesia, assim que ela finalmente decidisse "influenciar,

refonnar, governar"? Seria essa, como a visao convencional da Re-

volucao ainda sustenta e a despeito das negacoes dos "revisio-

nistas", "a era do capitalismo liberal baseado na propriedade priva-da, naigualdade perante a lei e em ies carrieres ouvertes(em teoria,

pelo menos) aux talents [as carreiras abertas para os talentos]"?"

Nao pode haver diivida sobre a intencao do porta-voz do tiers etat,

sem falar dos l iberais da Restauracao, de estabelecer os ult imos

tres itens. A Dedarat,,:aodos Direitos do Homem dizia 0 rnesrno.

Nem pode haver muita diivida quanto ao pnrnei ro Item, ainda que,

em 1789, nem 0 tenno liberal nem 0 termo capitalismo existissem

ou t ivessem suas c o n o ta c o es mod e r na s , e a inda que 0 termo ca-

pitalismo nao aparecesse em frances com alguma alusao ao seu

significado corrente antes da decada de 1840, quando laissez-faire

tambem entrou, como substantive, no vocabulario." (Contudo,

capitalista, no sentido de uma pessoa vivendo da renda de inves-

timento, ja tinha sido rf\:>:istradoem 1798,)

Pois 0que esses hojuens certamente incentivavam era ~Jibe...!-

dade dos empreendimentos a ~ -'nterferenc 'a nos assuntos da

econo' p pno fate de que 0 slogan internacional de tai polfti~'

'Ca("laissez-jaire, laissez-passer') e de origem frances a e velho de

muitas decadas em 1789 0 sugere." Como tambern 0 atesta a po-

pularidade e inf luencia de Adam Smith, cuja obra A r iqueza das

napJes, no reconhecimento pesaroso dos pr6prios franceses, "ar-

ruinou os economistas franceses que eram os primeiros domundo

[ ,. ,] Ele reinou sozinho na maior par te do seculo"." Houve pelo

menos t re s e d ic o e s f r an c e sa s de seu trabalho antes d a R e vo lu c a o,

e mai s quatro foram pubJicadas durante a p e ri o do r e vo l u ci o n ar io

(1790-1791,1795,1800-1801,1802) - sem conta r a primeira

edicao do livra de seu discfpulo 1.B, Say, Traite d'economie poli-

tique (1803), pois 0 autor somente foi plenamente reconhecido no

perfodo da Restauracao - e apenas cinco edicoes francesas pos-

teriores d e A riqueza das nacoes, desde a queda de Napoleao ate

r

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II :I i i . i

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I 1 I 1 1 1

o fim do seculo XIX."' Dificilmente se poder ia negar que isso de-

monstra 0 interesse consideravel, durante 0periodo revolucionario,

no profeta daquilo que hoje e chamado, indiscutivelmente, de a

economia do capitalismo liberal.

Nao se pode nem mesmo negar que os l iberals burgueses da

res tauracao visassem a urn capital ismo industrial, embora a

mesma coisa nao possa ser di ta dos teoricos de 1789. (Mas ate

mesmo na grande obra deAdam Smith podernos olhar em van por

uma a n te ci pa ca o s er ia da Revolucao Industrial, que estava prestes

a eclodir em seu proprio pafs.) ADfinal do periodo napole6nico,

a conexao entre desenvolvimento econ6mico e industrializacao ja

era evidente. 0 economista 1. B.Say, ele pr6prio urn antigo asso-

ciado dos girondinos, havia experimentado seu talento nos nego-

cios de f iacao de algodao e confinnado suas conviccoes sobre 0

livre comercio atraves dos obstaculos que encontrara na politic a

napoleonica de i n t e rvencao estatal. POT volta de 1814, Saint -

Simon ja via a industria (no modemo significado da palavra) e os

industrialistas (palavra que criou) como a fundacao do fu turo, e a

expressao Revoluciio Industrial estava entrando nos vocabularies

frances e a l emao, por analogi a com R evo lu ca o F ra nc esa ." A le m

disso, os liames entre progresso, polftica economic a e industria ja

estavam elaros na mente dos jovens filosofos liberai s. Victor

Cousin declarava em 1828: "As ciencias ffsicas e matematicas sao

uma conqui s t a da intel igencia humana sabre as segredos da

natureza; a industr ia e uma conquista da liberdade da vontade

sobre as forcas dessa mesma natureza [ .. ,] 0mundo, tal qual as

ciencias ffsicas e rnatematicas e, em seu rastro, a industria, 0 fi-

zeram, e um mundo para 0homem, reconstrufdo por ele em sua

propria imagern"." Cousin anunciava: "Aeconomia polftica" -

isso e , Adam Smith - "exp lica 0 segredo, ou melhor, 0 detalhe,

de tudo isso; segue as conqui s t a s da industria, que e s t ao, em si

mesmas, conectadas com aquelas das matematicas e das cienciasffsicas",;' Mais ainda:

a industr ia nao sera estatica e im6vel. mas progressiva, Nao se con-

tentara em receber da natureza 0que a natu reza esta pronta para

garantir [ .. .] Exercera pressao sobre a terra para dela extorquir 0

28

maximo de produ tos: e , par sua vez:,operant sabre esses produtos/; ' para dar-lhes a fo rma que melhor se adequar a s ideias da epoca, 0

~

' comercio sedesenvolvera em uma grande_escala, e t~d.asas na~6,es

que tiverern um papel nessa era serao nacoes comerciais [ .. .] Sera a

era dos grandes empreendimentos maritimos. "

Nao e necessario grande esforco para reconhecer, por tras das ge-oeralidades do discurso fi losofico do jovem professor, 0 modelo

c ia sociedade do seculo XI X em sua mente: ele era visivel da Franca ,

atraves do Canal. Voltaremos a o r ie n ta c ao b r it an i ca do l iberal ismo

frances dentro em pouco.

o ponto importante a ser notado aqui nao e 0 fato de a ideia

d e uma economia industrial, como tal, ter surgido clararnente s6

depois da era napole8nica, como tes temunham Cousin e Saint-

Simon; nessa altura, 0 conceito geral parece ter side familiar para

a esquerda intelectual, 0 importante e notar que essa ideia surgiucomo 0prolongamento natural do pensamento i l umini s t a do s ecu-

_10XVIII. Era 0 produto da cornbinacao do "progresso do Iluminis-

rno" em geral - l ibe rdade, igua ldade e economia pol iti ca - com

o avanco material da producao. A novidade si tuava-se em fazer

com que 0riunfo desse drsenvolvimento dependesse da a scensao

e triunfo de uma classe eJj.lecifica, a burguesia.

Mas onde a Revolucao Francesa entra nesse esquema? AHis-

t oire d e l a Revolution Francaise de F. A. Mignet, de 1824, fornece

um a resposta. 0 trabalho d e Mignet, 0 primeiro do gene ro a mere-

ee r 0 nome de "his tor i a",foi precedido apenas por uma obra simi-

la r e maior escrita poe urn homem destinado, como Guizot, aos car-

gos polit icos mais altos : Adolphe Thiers. Segundo Mignet, no

Antigo Regime, o s h om en s estavam divididos em classes rivais:

os nobres_e "0povo", ou Terceiro Estado, "cujo poder, riqueza, es-

tabilidade e inteligencia cresciam diariamente"." 0 Terceiro Esta-

do fonnulara a Constituicao de 1791, que ins ti tufra uma monar-

quia constitucional liberal. "Essa constituicao", diz Mignet, "foi

obra da classe media; naquele momento, a mais forte; pois, como

todos s abem, 0 poder dominante sempre toma 0 controle da s

ins ti tu i~Oes." Em uma palavra, a classe media era entao 0 poder

dominante ou classe dirigente. Infelizmente, apanhada entre 0 re ie

29

 

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a aristocracia contra-revolucionaria, por um Jado, e "a multidao",

por outro , a classe media foi "atacada por uns e. invadida po~ou-

tros"." Se as realizacoes da revolucao liberal deviam ser mantidas,

a guerra civil e a intervencao estrangeira requeriam a mobilizacao

do povo comum. Noentanto, porque a multidao era necessaria para

defender 0pais, "ela reivindicava 0 governo do pais; assim, fez

sua propr ia revolucao, da mesma forma que a classe media haviafeito a sua". 0 poder popular nao durou. Contudo, 0 objetivo da

r evolucao liberal foi real izado, apesar da "anarquia e despotismo;

a velha sociedade foi des truida ao longo da Revolucao, e a nova

sociedade estabelecida sob 0 Imperio"." Logicamente, Mignet ter-

minou sua hi storia da Revolucao Francesa com a queda de Na-

~eiio em 1814.

I . . : ] A Revo luca o Francesa, p or ta n to , f oi vista como urn processo

complexo e de mane i r a nenhuma unilinear, 0 qual, na o obstante,

troux.e como climax a longa asc_en~.i()_~'!-_sl~~.!ledille substituiu

a antiga sociedade por uma nova. A descontinuidade soci a l funda-

mental que representou foi poucas vezes tao elegante e eloqtlen-

temente expressa quanto por Alexis de Tocquevil le , cuja obra econstantemente citada por historiadores revisionistas, com outros

propositos. Em suas Lembrancas, TocqueviUe escreveu: "Nessa

historia , vista a distancia e como urn todo, sus tenta, de faro, ur n

quadro de lutas rnortais entre 0 Antigo Regime, Silas tradicoes,

memorias, esperancas e homens, tal como representados pela aris-

tocracia, e a Nova Franca, l iderada pela classe media"." Tal qual

Thierry, Tocqueville via a Revolucao de 1830 como a segunda edi-

~iio, ma i s bern-sucedida, de 1789, tornada necessaria por causa da

tentativa dos Bourbon de fazer retroceder 0 relogio para 1788. A

Revolucao de 1830, segundo ele, foi urn triunfo da classe media,

"tao definitivo e tao completo que qualquer poder politico, cada

prerrogativa e todo 0 g ov em o f ic ar ar n confinados e , d e fa ro , com-

primidos nos estreitos limites desta unica classe [.. .1Nao apenas,

por tanto, eia dir ige a sociedade, mas tambem se pode dizer que

formou a sociedade"." Ern outro texto, Tocquevil le afinnou: "A

Revolucao destruiu inteiramente, ou esta destruindo, tudo 0que na

antiga sociedade provinha da aristocracia e das instituicoes feu-

30

dais, tudo 0 que estava, de algum modo, conectado com etas, tudo

o que tinha algum trace delas"."

A luz de tais avaliacoes, feitas par homens que, afinal,

, d es cr ev ia m a sociedade em que v iv i am, fica dificil compreender

visoes correntes de que a Revolucao Francesa foi "ineficiente em

s eus resul tados" - para na o mencionar os historiadores revisio-

nistas que sustentam que "ao final, a Revolucao Francesa benefi-

ciou a mesma eli te proprietar ia de terras que a havia iniciado", ouque juJgam que a nova burguesia ascendente continuava a "s'In-

serer dans une volonte d'identification a l'aristocratie lse inserir

em uma vontade de identif icacao cam a aristocracia]"," 0 mini-

mo que se pode dizer e que esse nao foi ° modo como a F r anca: . ~ p os -r e vo l uc iona r ia espantou aque l e s que viviam nel~ ou a visi ta-

!f:. v am . Certamente, no o lh ar d os observadores estrangeiros, como no

¥ ~ de Balzac, a Franca pos-revclucionaria era uma sociedade na qual,

: i f mais do que em q u al qu e r o u tr a, a riqueza era pader e os homens

fI: estavam dedicados a sua acumulacao.

i ; . - , Lorenz von Stein, t racando a emergencia da luta de classes

'} entre burgueses e proletarios na Franca apos a Revolucao, ate

, mesmo im a gin ou u rn a explicaJ io hist6rica p ar a e ss a excepcionalinclin~iio ao capitalismo, Sob Napoleao, argumentava, a quesrao

crucial da Revolucao Francesa, ou seja, "0 direito de cada indivi-

duo de ascender, par meio de sua propria capacidade, a rna i s alta

posicao na sociedade c ivil e no Estado", havia sido reduzida aseguinte altemativa: acumular propriedade au ser bem-sucedido

no exercito. JJ 0 despotismo exclufra outras formas de competicao

pela dist incao publica. Ass im, a Franca se t orna r a rica "porque,

exatamente atraves de sua queda sob 0 despotismo do Imperio,

entrou em urn perfodo em que a riqueza constitui 0poder para cada

indivlduo"." E uma outra questao saber como explicamos essa

notavel divergencia entre alguns historiadores do final do seculo

XXe os observadores do comeco do seculo XIX . QuaJquer que se ja :

a resposta, nao se pode elidir 0 fato de que os liberais moderados

do periodo inicial viram as consequencias da Revolucao Francesa

em termos completamente dife rentes dos de seus sucessores li - ,

berais moderados da de c ada de 1980.

31

«

 

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Uma coisa e clara . Em aJgum momento entre 1814 - quan-

do Migne t terminou sua h istori a - e a in fcio da decada de 1820.

a R e vo lu ca o F r an ce sa p a ss ou a ser lida porjovens liberais declasse

media, que cresceram en tre a decada de 1790 e a de 1800, como

o cume da ascensao secular da burguesia a posicao de classe diri-

gente. Note-se, no entanto, que eles nao identificaram a classe me-

diaexclusi vamente ou essencialmente com ernpresarios, ainda que

tivessem poucas dilvidas de que, em uma terminologia posterior,

a sociedade burguesa tomaria realmente a forma de uma sociedade

capital is ta e crescentemente indus tr ial. Guizot, mais uma vez,

expressou isso com sua lucidez habitual. No seculo XTI , a nova

c1asse consistia principalmente em mercadores e pequenos comer-

ciantes ("negociants faisant un petit commerce") e pequenos pro-

prietarios de casas ou terras, residentes nas cidades. Tres seculos

depois, essa classe incluia advogados, medicos, pessoas letradas

detodos as tipos e todos osmagistrados locais: "Aburguesia tomou

forma ao lango do tempo e foi formada por elementos var iados.

Tanto essa sequencia cronologica como a diversidade foram geral-

mente negligenciadas em sua historia [.. .1 Talvez a segredo de seu

destine historico repouse precisamente na diversidade de sua com-posicao em diferentes perfodos da historia"."

Sociologicamente, e 6bvio que Guizot estava correto. QuaI-quer que fosse a natureza da c1asse media au burgues ia do seculo

XIX, ela era formada pela combinacao de var ios grupos s ituados

entr e a nobreza e 0 campesinato, e que antes naa julgavam que

tivessem, necessariamente, muito em comum entre si, como uma

cJasse unica, consciente de sie tratada pelos outros como tal; esse

era 0 caso sobretudo daqueles cuja posicao estava baseada na edu-

'8 l cacao (Besitzburgertum e Bildungsburgertum, na reveladora ter-

I . : : J minologia alema)." A his toria do seculo XI X e incompreensivel

para qualquer urn que suponha que apenas ernpresarios eram real-

mente" burgueses.A interpretacao burguesa da Revolucao Francesa tornou-se a

interpretacao dominante, nao apenas entre Iiberais franceses mas

tambem entre os liberais de todos os paises nos quais 0 "comercio

eo Iiberalismo", ou seja, a sociedade burguesa, njiohaviam ainda

32

triunfado do modo como os liberais acreditavam que estavam des-

tinados a triunfar em toda parte. Os tinicos pafses onde, ate entao,

a sociedade burguesa ja havia triunfado, pensava Thierry em 1817.

eram a Franca, a Inglaterra e a Holanda. A afinidade entre esses

parses nos quais a sociedade burguesa tornara-se dominante pare-

cia ta o estreita que, em 1814, Saint-Simon, 0 profeta do indus-

trialismo e inventor do t e rm o , i m a gi n av a realmente urn Parlamen-

to unico anglo-frances, 0 qual seria 0 nucleo de urn conjunto unico

de instituicces pan-europeias, em uma monarquia constitucionaJ

pan-europeia, quando 0 novo sistema fosse universalmente triun-

". iante.37

».:

Os histor iadores l iberais nao apenas viam afinidade entre a

. :Qa-Bretanha e a Franca revolucionaria, mas tambern viam a pri-

.> meira, em alguns aspectos, como uma predecessora e urn modelo

para a Franca, Dado a habitual galocentrismo da cultura francesa,

nada e mais surpreendente do que a concentracao desses homens

DR hist6ria da lnglaterra - especialrnente Thierry e Guizot, ambos

.\ profundamente influenciados por Walter Scott. Pode-se dizer, de

. fato, que eles leram nao apenas a Revolucao Francesa como uma

'revolu'rao burguesa, mas tamh1 n a Revolucao lnglesa do seculo'XVII. (Esse e outro aspecto da heranca da res tauracao liberal que

. .ressoaria nos marxistas posteriores.) Havia forte razao para tanto:

..J() precedente ingles confirmava os liberais f ranceses de classe

media, cujo idea l ce rtamente nao era uma revolucao mas - para

' cUar Thie rry novamente - u rn "progresso lento mas sem inte r-

~', na conviccao que a revolucao, nao obstante, pode ser

Jnecessaria, ao passo que 0 exemplo Ingles dernonstrava que tal re-

.>1folu\=aopoderiaanto sobreviver ao equivalente a 1793-1794 (1649

-e Cromwell) quanto evita-lo (1688) para criar urn sistema capaz

.. transformacao progressiva nao-revolucionaria."

Os argumentos de Guizot sao particularmente claros, Embo-

.b. ele insistisse na centralidade d a luta de classes na h ist6ri a;<eu ropeia, nao via essa luta como urn jogo de soma zero que te r-

" lninasse com a vit6ria tota l de urn lado e a eliminacao do outro ,

, . . ; , . · ·. t a a s sim - mesmo na decada de 1820 - como urn processo que

.T ; \erasse. ao f inal , dentro de cada naciio, " ce r ro e sp f ri t o geral, certa

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comunidade de interesses. de ideias e de sentimentos que su~rasse

a diversidade e a guerra" .39A unidade nacional sob hegemoru~ bur-

guesa parece ter s ido seu ideal . Nao surpreende que ele esnvesse

fascinado pelo desenvolvimento hist6rico da lnglaterra onde, mars

do que em qualquer outro lugarda Europa, : ' 0 5 diferentes elementosda coofigura,\:ao social [itar social] comblllaram~se, combateram-

se e modif icaram-se, sendo continuamente obr igados a se ~~m-prometerem em uma existencia com~m". Onde "a or~e~ CIV1! e

religiosa. a aristocracia, a democracla, a realeza: .as mstltuH;oes

locais e centrals, 0 desenvolvimento moral e politico avancam .e

crescem juntos. em balburdia, n e m s er np re com a mesma veloci -

dade. mas nunca muito afastados uns dos outros" , E a lnglaterra,

assim, foi capaz, "mais rapidamente que qualquer outro Estad~ do

continente, de alcancar 0 objetivo de toda a sOCledade.ou se~a,0

estabelecimento de urn governo ao mesmo tempo regular e livre,

e de desenvolver born sense politico e solido juizo sobre os ass~n-

tos publicos [ le bon sens national et l 'intel ligence des affQlres

publiques]"."" . -Havia razoes hist6ricas para essa diferenca entre as evoluyoes

britfmica e francesa (este e 0 assunto da aula final ~o curse ~e

Guizot) ainda que a rendencia fundamental da evolucao, nos dois

paises, fOsse similar. Enquanto a feudalismo b~taniCo (0 "Norman

Yoke" [Jugo Normando]) tinha sido a conquista ~e. uma nobrez.a

normanda sobre a comunidade politica anglo-saxolllca estabeleci-

da e estruturada - 0 que, portanto, permitira a resistencia popu-

la r estruturada e de certo modo inst ituc ional izada, urn a~lo .as

1iberdades previas anglo-saxonicas - 0 equivalente frances fOl_ a

conquista, pelos nobres frances, sobre uma desinte~rada po~~~a~~o

de gauieses locais ("nos ancetres les Gaulois"). lffeconc~liavels,

mas impotentes. Sua revolta contra os nobres, na Revoluyao Fran-

cesa, foi, portanto, mais incon~rolada e ~ncol1tr~l~vel.~, conse-

qiientemente, essa revolucao foi mats temvel e r~dlcal . ~ssa era

uma tentativa para explicar aquilo que tanto mtngava muuos dos

historiadores liberais do seculo XIX. ou seja, por que na Franca (nas

palavras de Lord Acton) "a passagem das formas ~e soci~da~e feu-

dal e aristocnitica para as industriais e democratlcas foi fei ta por

34

convulsOes", diferentemente de outras nacoes (ou seja, daGra-Bre-

tanha):2 Contudo, os britilnicos poderiam servir de modelo para a

Franya, depois de 1789: se a Gra-Bre tanha havia superado seu

Robespie rre eI au Napoleao - Cromwell - para tomar possfvel

uma segunda revolucao, silenciosa e decisiva, destinada a imple-

menta r urn sistema permanente - a Revo l ucao Gloriosa de 1688

_, a Franca poderia fazer 0mesmo. Poderia, eo fez. com a ins ta-

la~ao da Monarquia de Julho em 1830.

Dentro da Franca, por tanto, as paladinos da Restauracao

Dlomirquica da revolucao burguesa eram ja moderados potenciais.

vendo-se como vencedores, ja, do embate decisive de sua classe.

fora da F r anca , era 0 chamado de 1789 que s oava alto e claro nos

.'.~ouvidos da c1assemedia. As ins t i tu icoes da Idade Media j a h a vi am

' tido seus dias, pensava urn historiador liberal alernao adequada-

.mente idealista, Novas ideias haviam surgido, e elas afetaram

"sobretudo as relay6es nos estratos da sociedade" [Standel. dentre

,o s quais 0 " e s tr a to b u r g u es " (Biirgerstand) tornava-se a cada dia

: : k ' mais importante. Eass im "as homens comeiaram a falar e a escre-

'~~:.ver sabre o s D i re i to s do Homem, e investiglr o s direitos daqueles

~.,:_.quebaseavam suas demandas nos chamados privilegios"." Essas

t~.cram palavras de luta naAlemanha de 1830,ass.im como na~ mais

.j,t.;oecessitavam se- lo na F r anca , Nessa altura, 0 termo bourgeois. na

: 1 j - : . r r a n ~ a .era definido em contraste compovo (peuple) ouproletarios

",.. " ); na A1emanha - como na enciclopedia Brokhaus de

-, opunha-se a aristocracia; de urn lado, e a campesinato,

outro, e 0 proprio termo Burger era crescentemente igualado

termos classe media e ao frances bourgeois;" Uma revolucao

;.>,",,"JI;:;U<""1 era a que os liberais alemaes de classe media desejavam

consideravam necessar io , e de uma forma muito mais clara do

seus predecessores franceses de 1788, parque tinham 0 fato e

experiencias de 1789 para relembrar.

Alern disso, 0 paralelo britanico dessa revolucao, analisado aI..ur"~,·~~.pelos historiadores franceses, parecia aos alernaes esta-

urn mecanisme de transformacao histories de grande poder

(particularmente quando suplementado pel as pre-

revoltas da Holanda): "Deve urn grande povo necessariamente

35093938

ji1

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;

,I,

passar pela cri se da revolucao , se dese ja i rromper em direcao a

uma vida polftica independente, a liberdade e ao poder? 0 duplo

exemplo da Inglaterra e da Franca aproxirna-se, forcando-nos a

aceitar esta proposicao". Assirn escreveu 0 liberal alemao Georg

Gervinus a s vesperas de 1848 - ele p roprio, como tantos de seu

r ipo , urn intelectual e urn ativista politico."

Como tantas ide ias rnais tarde assumidas com en t u s i a smo

pelos marxistas, essa concepcao da necessidade da revolucao, esta-

belecida, de cer to modo, por extrapolacao his torica (aquilo que

Charles de Rernusat chamou, mais ta rde, de "uma conviccao

geometric a de que havia uma lei d a s r e vo l u co e s no,mundo m~er-

no"), veio dos liberais da Restauracao francesa." E clare que ISSO

era, tambern, plausfvel , e os acontecimentos subseqiientes nao

diminuiram essa plausibilidade.

[] Em alguns momentos en tre 0 seculo XVII e a metade do secu-

1 0 xx, as histor ias de quase todos os Estados "deseuvolvidos" -

com algumas raras excecoes, como a Suecia - e de todos os

grandes poderes do mundo modemo registrararn uma ou mais des-

continuidades repentinas, cataclismas ou rupturas hist~ricas, clas-

sificadas como revolucao ou moldadas na revolucao. E urn abuso

atribuir tal fato, simplesmente, a uma combinacao de coinciden-

c ia s, e m b o ra s e ja urn 'tanto quanto ilegftimo e evidentemente erra-

do inferir, do registro historico, que e inevitavel que a mudancavenha por rupturas descontfnuas em todos os casos.

De qualquer modo, a r evolucao necessa ria dos liberai s da

Res tauracao nao deve ser confundida com as suas versoes pos te-

riores. Eles nao estavam preocupados em defender quedas violen-

tas deregimes ou atacar 0gradualismo. Se m diivida, teriam preferi-

do 0 gradua li srno . 0 que prec isavam era de: a) uma teoria q~e lt "

justificasse a revolucao liberal contra a acusaciio que produziria,

inevitavelmente, jacobinismo e anarquia e b) uma justificacao do

triunfo da burguesia. A teoria da revolucao necessaria e inevitavel

servia para ambos os propositos, pois evitava criticas,Quem pode-

ria di scuti r urn fenomeno que estava alem da vontade e do con-

trole do homem, semelhante a uma alteracao nas placas t ec tonicas

daTerra? Por mil razoes, pensava Victor Cousin, a Revo l ucao tinha

36

absolutamente necessaria, incluindo seus excesses, que eram

de sua "missao destrutiva", E para Guizot, "as choques que

·~;.:dl8JliUlI'nosde revolucao sao menos os sintomas daquilo que esta

¥J!i, .)me9Im<lLO mais a declaracao do que ja esta acontecendo", ou

'-.'_'_' a ascensao secular da classe media," Essa visao, de fato, nao

~JiilieIeC(:unsustentavel para observadores racionais da primeira me-

do seculo XIX.

Por sua vez, mesmo a dasse media alema, que estava longe

tI D ex tremismo - e enfrentava a necessidade de reali za r tal re-

. .volur ;ao burguesa, consciente de que a possibi lidade de faze- lo

".via chegado a Alemanha, vinda da Franca -, encarava mais

::Jt·.JIItilmentea violencia da Revolucao Francesa do que os ingleses

. : tbnt.empori ineos, os quais a) nao tinham necessidade de tamar a

:";E~an9a como modelo do liberal ismo ingles e b) enfrentavam sua

S}ft6pr ia erupcao de forcas sociais vindas de baixo. A imagern da

,!.:YRevol~9aoFrancesa que mais penetrou np consciencia britanica

' ;i ;Mo foi a d e 1789 au 1791, mas a de 1793~ 794, 0Terror, Quando

.,~?~€arlyleescreveu sua Historia da Revolucao em 1837, estava nao

i ; !1 6 pagando um tributo a gran?eza do e spe t a cu l o h i s to r i co mas tam-

" E 'i ' [ .' . ante:~n~o 0 que pode~a ser uma rev?lta dos trabalhadores, '~ . b re s b r it an ic o s, Como deixou claro, mar s ta rde, seu pon to de

. 1 ~.· Anciaera a cartismo."

";;)" Os liberais franceses, evidentemente, eram perseguidos pelos

. dojacobinismo, Os liberais alemaes contemplavam-no com

surpreendente, embora os radicais alernaes, por exemplo 0

juvenil revolucionario Georg Buchner, 0 enfrentassem sem

.dpc:oiiWleJi!lf."riedrich List, 0 carnpeao do nacionalisrno economi-

alemao, defendeu a Revolucao do libelo de que ela ser ia uma

.,: 'tmJ)les explosao de forca bruta. Ela era causada pelo "despertar

. .. espir ito humane" ." "S6 0que e debil e impotente nasce sem

.' formularia outro alemao liberal estudante da Revolucao

antes de casar-se com uma soubrette e assumir a cate-

. de ciencia econ6mica da Universidade de Praga."

. No entanto, se e inegavel que a geracao imediatamente pos-

:,jdll"'l[lIUCI'[Ona.' de franceses l ibe rais via a Revolucao Francesa

burguesa, e tambem igualmente claro que a analise d e classe

37

 

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e de Iuta de classes que eles exemplificam teria surpreendido todos

os observadores e participantes em 1789; mesmo aqueles rnem-

bros do Terceiro Estado mais ressentidos dos privi legios aris-

tocraticos, tal como Barnave ou, digamos, 0 Figaro da peca de

Beaumarcha is e da opera de Mozart! Da Ponte. Foi a propria Re-

volucao que criou a consciencia dos estratos situados entre a aris-

tocracia e 0 povo de que constitutam urna classe media au classemoyenne, u rn t er m o que, de fato, seria m ais co mu me rne u sado do

que bourgeoisie (exceto no contexte de seu desenvolvimento

historico), especial mente durante a Monarquia de Julho."

Era uma classe media em dois sentidos, Em primeiro lugar,

oTerceiro Estado, que dedarara ser "a nacao" em 1789, nao 0 era,

falando operacionalmente, mas sim aquilo que 0Abbe Sieyes, seu

mais eloqiiente porta-voz ~ e, alias, urn paladino de Adam Smith

-, chamou de "as classes disponiveis" daquele estado: nas

palavras de Colin Lucas, "0grupo solido, unificado, dos homens

profissionais", 0 estrato medic da sociedade, homens eleitos como

representantes dela. 0 fato de que eles tambern sevissem, sincera-

mente, como representantes dos interesses de toda a nacao, e mes-

mo da humanidade em geral - na medida em que defendiam urn

sistema nao fundado no interesse e no privilegio ou em "precon-

ceitos e costumes, mas sirn naquilo que e de todos os tempos e detodos oslugares, naquilo que deve ser a base de cada Constituicao,

a liberdade e a felicidade do povo" - nao pode nos impedir de

observar que eles eram tirados de uma zona social especffica do

povo frances e eram conscientes desse fato. j Pois se, nas palavras

de Mignet, 0 eleitorado de 1791 - a revolucao propria dos l ib~

rais - estava "restrito aos esclarecidos" que, dessa forma, "con-

trolavam toda a forca e poder do Estado" , sendo "no momento os

unicos qualificados para controla-los porque apenas eles tinham a

inteligencia necessaria para 0 controle do governo", isso aconte-

cia porque eles constinnam uma elite selecionada po r sua capaci-dade, demonstrada par meio daindependencia economica e daedu-

Ca\ iaO .55 Tal elite aberta, fundada nao em nascimento (com a

excecao das mulheres, cuja constituicao ffsica e psicologica, acre-

di tava-se, pr ivava-as de tais capacidades) e s im no talento, era

I I

I II

III

38

inevitivel e majori tariamente composta dos estratos medios da

. M ) C ie d a d e (pois a nobreza nao era numerosa, e seu status de modo

•.aIgum se correlacionava positivamente com inteligencia, e a mul-

......~ nao possuia nem educacao nem meios economicos) . Contu-

.:do. um a vez que as carreiras abertas ao talento eram a base essen-

cial dessa elite, nada poderia obstar a aceitacao de alguem como

. ;. p ar te desta eli te desde que preenchesse esses cri terios de per-

0; .tencimento, qualquer que fosse sua origem. Citando Mignet nova-

L mente: "Deixemos todos partilhar dos direitos quando forem

i ' j , capazes de ganhd-los" [grifos meus].

Em segundo Ingar, as "classes disponiveis" do Terceiro Esta-

do. que assim se tomaram naturalmente modeladores da nova

. F r a n\ ia , estavam no meio em outro sentido, Elas se encontravam

'. politica e s oc ia lm e nr e o po st as tanto a aristocracia acima quanto ao

;. povo abaixo. 0 drama da Revolu\ iao Francesa para aqueles que

:., .podemos chamar, em retrospecto, de liberais 1 1 1 1 derados - a

. ,palavra ern si mesma, como sua analise da Revo \w; ao , somente

~u na Franca depois da queda de Napo leao _16foi que 0

apoio do povo era essencial contra a aristocracia, 0 antigo regimee. a contra-revolll\ilio, enquanto esse povo e os estratos medios

,linham interesses seriamente conflitantes. Ta l como foi posto, urn

.1i6cu10 depois, por A. V Dicey, e1eproprio 0 menos radical dos li-

. l ierais: "A confianca no apoio da multidao parisiense significava

eonivencia com 0 ultraje e com crimes que tomavam imposstve]

.f8tabelecer institui~5es livres na Franca, A repressao a rnultidaoJllrisiense significava r ea ca o e , muito provavelmente, a restaura~ao

d o despotismo".? Em outras palavras, sem a rnultidao nao haveria

• nova ordem; com ela, viria 0 risco da revolucao social, 0 que pare-

ileu tornar-se realidade por urn breve perfodo em 1793-1794. Os

«mstrutores do novo regime precisavam de prot~ao contra os ve-

".Jhos e os novos perigos. Nao surpreende que aprendessem a sereco-

.JIhecer,no curso dosacontecimentos e tarnbem retrospecti vamente,

como urna classe med ia , e a reconhecer a RevolU9liocomo uma luta

'* classes tanto contra a aristocracia quanto contra os pobres,· ; i · E, contudo, que ourra coisa poderiam ter feito? A moderna

Wisaorevisionista de que a Revolu~ao Francesa foi, em certo sen-

39

 

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t ido, "desnecessar ia", ou seja, que a Franca do seculo XIX seria

quase a mesma sea Revolu~ao nao tivesse acontecido, eo tipo de

proposicao contra factual que nao 6 plauslve l nem passivel de

prova. Mesmo em seu sentido mais restri to - 0 qual argumenta

que "a mudanca atribufda a Revolucao Francesa [,..1e insuficientepara dar conta daquilo que pode seTatr ibufdo a uma mobilidade

social colet iva em tal escala que modificou a estrutura social" , eque nao era necessario desbloquear 0 capitalismo em urn antigo

regime que nao oferec ia a e le obstaculos se ri es, e que, se a Re-

volucao Francesa fez algo, foi desacelerar seus avances p6s-re-

volucionarios - nso se pode de modo nenhum presumir que os

moderados de 1789 poderiam ter partilhado desta visao, no mini-

rno porque ela pertence ao di scurso do fina l do secuIo xx e nao

aquele do final do seculo XVIIl,"Desde 0 momento em que os Estados-Gerais estiverarn reu-

nidos, era bastante claro que 0 esclarecido programa de reformas

e progresso com 0qual, em principio, todos oshomens deboa von-

tade e educacao concordavam, nobres e outros, nao seria feito como

uma reforrna vinda de cima, pela monarquia - como eles todos

aspi ravam - mas sim por urn novo regime. Foi feito por uma re -

volucao _ ou seja, uma revolu~ao vinda debaixo, pois uma revo-

lu~ao vinda de cima, por mais desejavel que seja na teoria, deci-

didamente nao era mais uma op~ao em 1789, se e que algum dia

o fora. De fate, essa revolucao jarnais ter ia side fei ta se nao fosse

a intervencao do povo comum. Nem mesmo Tocquevi lle , que

refletiu sobre 0 quanto teria sido agradavel se um autocrata esclare-

cido pudesse ter feito tal revolucao, supos, por urn memento, que

i sso te ria sido possivel ." E, embora a cada fase do processo re-

volucionano houvesse homens que decidiram que os aconteci-

mentos ja haviarn ido longe 0 suficiente e que teriam preferido

faze-los parar, os historiadores liberais da Restaura~ao, diferente-

mente dos liberais modernos e de alguns academicos revisionistas,

sabiam que tais acontecimentos nao podem ser Iigados e desliga-

dos como programas de televisao, A imagem que subjaz 1 1. meta-

fora da "derrapada'' tderapage), de Fran~ois Furet, e nao histori-ca, pois pressupoe que 0controle do veiculo e possivel; mas perder

40

'9 controle e uma parte integrante das grandes revolucoes, como" da~ g ~:mdes g uerras do seculo xx e de outros fen6menos

veis, Os homens esquecem seus interesses reai s, seus

~,inten~ssl~soncretes", escreveu Thierry sobre a Revolucao France-

, em 1,81.7,"mas ter ia s ido, fut il tentar nos mostrar a presuncao

, obJetJ.vo~ que .persegUIaffiOS; f . . . ] a nis toria estava hi . e

podedamos te-Ia deixado falar por nos e confundido a razao"IIJ

Mign~t sab~a-o ~elhor do que a lguns de seus descendentes da

•familia do liberalismo moderado:

T~lvezseja impertinente afirmar que as coisas nao poderiam ter tcr-

mmado de modo diferente : mas 0 certo e que, considerando-se as

causa~ que , lev~m a e la e a paixao que uti li zou e desper tou, a Re-

vo_lw;aofoi ?bnga~a a tomar esse curso echegar aesse resul tado [, ,JNao era mars possivel nern preveni-la nem dirigi-la [grifomeu]."

capftul_?2. retornarei a descoberta da revolucao como uma espe-de fenomeno natural que escapa ao controle humano, uma das

mars caracterfsticas e importantes que os observadores

da experiencia da Revolucao Francesa.

No entanto, nao devenamos esperar que os liberais modera-da Restaurar;~o, tais quais seus sucessores do presente, tives-

la~entado 0lnc_ontrohlvelcataclisma que atravessou a Franca,

essa mesma razao? Se os revisionistas estao certos em olhar 0

de seculo revolucionario como "une per ipet ie cruelle" na

frances a, depois da qual as coisas voltaram ao seu r itmo

.de mu~anr;a, nao ser ia de esperar que homens moderados

'" ssem, as vezes, nos custos desproporcionais dessas relati-

' ," vamente peque?as mudancas?" Nao seria de seesperar, talvez, que

, 'mostrassem ate mesmo alguma nostalgia do Ancien Regime, a

, sma que aquele,sque vis itam regioes da Europa antes governa-

pe~a monarquia Habsburgo ainda detect am entre inteLectuais

parses que se l ivraram de seujugo nos tempos de seus avos au

• . ; ,o lsa ', "os? (A propos ito, nao deverfamos esperar uma reversao

macica ao monarquismo entre as massas cuja vida foi tao destruf-

por ta ~ pou,co?)""Mas nao ha sinal de tais reacoes. '

Os liberais da Restauracao, embora amedrontados por multo

que aconteceu em seu pais, nao rejeitaram a Revolucao France-

41

 

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II

I,

!!

sa nem foram seus apologistas. De fato, sua historiografia foi vis-

ta por urn conservador britanico contemporaneo como uma "cons-

piracao geral , entao operante, contra os mais velhos Bourbon-

uma paradoxal apologia da velha revolucao e uma velada provoca-

v ao a uma nova" ,04 0 autorque e1etinha em mente, Adolphe Thiers,

muito dif icilmente pode ser acusado de radical ismo excessive,

mesmo na decada de 1820.65

Quaisquer que fossem os excessosda Revolucac Francesa, a altemativa de nao haver revolucao nao

teria side pior? Como colocou Francois-Xavier Joseph Droz, que

viveu 0 perfodo do Terror quando jovem: "Nao devemos imitar

aqueles antigos que, terrificados pela incandescencia da carrua-

gem de Faetonte, pediram aos deuses para ficar em escuridao per-

manente", oc

Nada e mais surpreendente sobre os Iiberais da Restauracao doque sua r ecusa em abandonar me smo aquela parte da Revolucao que

era indefensavel em termos I iberais, que os l iberais nao queriam

defender. e que de fato os liberais tinham derrubado: 0jacobinismo

de 1793-1794. A Revolucao Fraucesa que eles desejavam preserver

era aque l a d e 17 8 9 . ada Declaradio dos Direitos d o Homem, cujo

Iiberal ismo essencial T o cq u ev il le n u nc a deixou de assinalar ; ou, mais

concretamente, dos princtpios da Constituicao de 1791.61Contudo,

nao foi 0 proprio Guizot que defendeu a Revolucao Francesa como

urn todo, como "0 desenvolvirnento necessaria de uma sociedade

que a va n ca [ .. .] a batalha terrivel, mas legltima, do direi to contra 0

p ri vi le gi o" ? N l io f oi Guizot que na o queria

repudiar nada da Revolu~ao. Nao ~o que se retire nada dela. Eu

a entendo como urn todo, suas verdades e seus errns, suas vir tudes

e seus excesses, seus triunfos e suas derrotas [... Voce s me dirac

que elaviolou ajustica, oprimiu a liberdade. Concordarei comvoces.

At e mesmo me engajarei no exame das causas dessas Iamentaveis

digressoes. Irei ate mesmo aiem. Garanto-lhes que 0 germe desses

crimes estava presente no pr6prio berco da revoluyao,"

Ao contrario de tantos que prepararam, ou hesitaram em preparar, as

celebracoes do bicentenario da Revolucao Francesa, os liberais da

Restauracao, com roda sua rnoderacho, assumiram a posicao de que

"no fmal da s contas, os crimes inclufdos, a RevoJuvoovaleu r pena"."

42

Uma das razoes para essa inclinacao em aceitar ° que Thier-falando da Revolucao Inglesa, chamou de "os atos necessaries

violencia" foi, sem diivida, 0 fato de 0 Terror jacobino ter sido

episodic de curta duracao; alem disso, um episodic finalizado

propria Revolucao. Os moderados tinham apenas ternporaria-

perdido seu controle. Mas outra razao, e rnais poderosa, foi

a revolucao ainda parecia indispensavel. Pois, assim como 0

Regime na o teria sido derrubado se m uma revo lu cao em

'1789, a tentativa de restaura-lo, que eles acreditavam estar aeon-

~receIld(),tambem teria que ser anulada por uma revolucao. Por tras

desenvolvimento do modelo burgues da Revolucao Francesa,

eu localizei no perfodo da Restauracao, havia precisamente a

polftica dos Iiberais moderados burgueses contra a tentativa

de fazer voltar 0 tempo. Para eles, isso se tornou obvio

1820, quando os ativistas politicos liberais - incluindo todos

homens que venho discutindo - t iveram de ret irar-se da acao

refugiar-se no pensamento e na escrita. "Escrevam Iivros", teria

a estes jovens intelectuais 0 lfder liberal Royer-Collard, depois

queda do minister io Decazes, "nao ha nada mais para ser fei to

memento"." Foi desse modo que a escola his torica da Restau-a de Guizot, Thie rs, Mignet e outros ve io it luz, embora.

a a~ao t omou- se novamente factfvel , alguns tenham prefe-

pennanecer em seus estudos. Aqu i 10 em que esses jovens his-

eriadores estavam engajados era a elaboracao de uma teoria para

uma revo lucao burguesa . Em 1830, eles a puseram em

"",.r-.__ -

Nesse ponto um esciarecimento toma-se importante. Deve-se

' · · '1f 'f ,Omlllfeender com clareza que, para os liberais moderados e it dife-

dos herdeiros dos jacobinos, a Restauracao de 1814 na o era

concessao Iamentave l it reacao, feita sob a pressjio da derro-

mas sim exatamente 0 que queriam. Embora nao estivessem se-

inicialmente, os l iberais logo viram - ou acharam conve-ver - Luis XVIll como urn monarca constitucional, ainda

a face monarquica e internacional tenha sido salva pelo ato de

•• arnar a Constituicao de uma car ta de direi tos I ivremente garan-

a par tir de cima." Napoleao havia garantido a burguesia con-

43

 

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tra os dois perigos que a ameacavam. mas com um preco: sua

exclusao da politica e a ausencia de direitos eivis. A burguesia nao

par ti lhava do poder , "Havia de fato r icos e pobres" , disse Lorenz

von Stein "mas n ao h av ia c la ss e dominante e nenhuma classe esta-

va sendo 'govemada. Havia apenas suditos."" Mas a Restaurw;;ao

de 1814 res taurou nao apenas a monarquia, mas tambem 0ele-

mento do govemo consr itucional representat ivo que parecia tao

essencial, e 0 fez sem 0 perigo do excesso de democracia. Parecia

institucionalizar as conquistas da fase moderada da Revolucao -

pre-1791 - sem a necessidade de revolucao ulterior. Como

escreveu Guizot, "revolucao e 1egitimidade hoje tern em comum

o fato de que ambas procurarn preservar-se e preservar 0 status

quo"," Ao faze-lo, elas estabeleceram a "cooperacao franca" por

rneio da qual " reis e na~Oes"- Guizot estava, como sempre, pen-

sando na lnglaterra - "extinguiram aquelas guerras internas que

sao denominadas revolucoes". 0 que Guizot condenava nos rea-

cionar ios era menos a in tencao de restaurar urn velho regime que

estava for'a do alcance de urn renascimento efetivo, e mais 0 fato

de arriscar 0 retorno das massas em u rn a a ca o i mp re vi sfv el , t al ve z

necessaria mas sempre perigosa. Aburguesia gostava de Luis XVIIl

porque "para a casa de Bourbon e suas bases de sustentacao, 0

poder absolute e [agora] impossivel: sob eLes, a Franca deve serlivre"." Em r e s ume , era uma garantia melhor e ma i s d e se j av e l do

que Napo l e ao , tanto contra 0 Ant igo Regime quanta contra a

democrac ia. Eo regime de 1830 - aque la revolucao que de fato

foi fei ta como uma revolucao burguesa e que ins ti tu iu um regime

bu rgue s consciente de si e de sua classe.icom.um rei,qu.e usava

uma car tola ao inves de uma coroa - era uma solu¢6-ainEla-mais

desejavel, Parecia ate.ter resolvido 0 problema crucial do libera-

lismo burgues moderado, 0 de como csmtrolar.a.mebi.limgil:o re-

v ol uc io na ri a d as mass as . Como a situacao reYerteu.,.~sotveu.

De fato, a Revolucao France sa foi, necessariamente, tanto

1789 quanta 1793-1794. tanto moderada quanto jacobina, QuaL-

quer tentativa de separar esses perfodos, de aceitar Mirabeau mas

rejeitar Robespierre, e irrealista. E claro que isso nao l:gnifica iden-tificar ambos, como as conservadores do seculo XI X estavam pron-

44

: tos a fazer : " jacobinismo, agora chamado pelo novo nome de li-

beralismo", segundo escreveu em 1823 0 ideologo protestante

bOlandes Isaac da Costa (1798-1860). 7j Os ideologos do liberali s-

. 1 iiOhu rgue s e s fo rc a r am- se muito para manter a democraeia limi-

: tada'- . . . : . :_u seja, Longeda intervencao dos pobres e da maioria dos

. ~_il_dores. Os l ib e r ai s da res tauracao e a Cons t it u i cao de 1830

.."fize!am demodo mais implacavel do que a Constituicao de 1791,

.·pois.J~mbravam-se da experiencia do jacobinismo, Eles .acredi-

tavarn, como vimos nas ideias de Mignet, no eleitoradovrestrito

losesclarecidos", que "eontrolavarn toda a fort;aeo poder do Esta-

.•.do" porque somente eles estavam qualificados para controla-los.

. . . .N a o - a c r e d T I a v a m ern direitos iguais paratodos-os cidadaos; para

· .de~_!!J~.arantia de uma "igualdade verdadeira" era, para citar

.'.Mignet novamente, a "admissibilidade", da mesma forma que a. _ - a da des igualdade era a "exclusao"." A democracia l iberal

parecia-lhes uma c on tr ad ic ao : o u h a vi a 0 I ib e r al ism o , b a s ea d o em

nma elite meritocratica com entrada franca, ou havia democracia,

. A experiencia da Revolucao Francesa fe- los ate m e sm o s us pe it ar

uma republica que, na Franca, estava ligada aojacobinisrno. 0

realmente ter ia s ide adequado a eles era algo como a monar-

constitucional da Inglaterra whig, talvez algo um poueo mais

e sistematico e menos aleatoric, introduzido preferencial-

por uma revolucao controlada como a de 1688. Em 1830

pensavam te-la encontrado.

Mas i ss o n a o poderia te r funeionado. N ao havia modo de parae

meio da estrada, desde que os por toes de 1789 foram abertos,

esta 0 enorme merito de Tocqueville, urn liberal d e origem;

que nao par tiLhava exatamente das i lusoes de urn

. " ' . , ,> ._,~u. ou de urn Thiers. Os esc ritos de Tocquevil le sobre a Re-

ao Francesa foram mal lidos, como se fossem declaracoes de

ela nao era necessaria e afirmacoes a favor da continuidade

·~'···nll!!tc'n'caa evolucao francesa. Mas, como virnos, ninguem esta-••vamais conveneido que ele d e que a revolucao marcara urna grande

. . . . 1 = irreversfvel ruptura com 0 passado. Da mesma forma, seus

~'4'llCriltOS sobre a democracia na America foram Lidos,especialmente

. aa pr6pria America, como apreciacoes do merito desse sistema.

45

 

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Mas nao e assim, Tocqueville reconhecia que, na mesma medida

em que a democracia era temida por ele e outros homens ins truf-

dos, nao havia modo de evita-la a longo prazo. Ela estava implici-

ta no liberalismo. Poderia, no entanto, esse sistema funcionar sem

produzir jacobinismo e revolu~ao social? Foi tal questao que 0

levou a invest igar as Estados Unidos. Ele concluiu que uma ver-

sao nao jacobina da dernocracia era possivel. Contudo, com toda

sua prontidao para estimar a democracia americana, nao se mostrou

um entusiasta do sistema. Quando escreveu seu notavel trabalho,

Tocqueville pensou, e certamente esperou, que 1830 provesse urn

quadro referencial permanente para a evolucao posterior c t : ' socie-dade e instituicoes francesas. Corretamente, ele apenas quis desta-

carque, mesmo assim, essa referencia teria de seampliar para poder

operar atraves da democracia poluica que, gostasse ou nao, havia

gerado. A longo prazo, a sociedade burguesa fez ass irn, embora

nao 0 tivesse seriamente tentado ate 1870, rnesmo no pals da pro-

pria Revolu~ao. E, como veremos no ultimo capitulo, a avaliacao

da Revolucdo Francesa em seu primeiro centenario foi, em grande

parte, dominada par esse problema.

o fato fundamental permaneceu e ainda permanece: 1789 e1793 estao juntos. Tanto 0 liberalismo burgues quanto as revo-

lucoes sociais do seculo XIX e do seculo xx reivindicam a heranca

da Revolucao Francesa. Neste capitulo, tentei mostrar como 0 pro-

grama do liberaJ ismo burgues foi cristal izado na exper iencia da

Revolucao Francesa e em sua reflexao. No proximo capitulo con-

sideraremos a Revolucao Francesa como um modelo para as re-

volucoes sociais subseqtientes que comecaram air alem do J ibe-

ralismo e como urn ponto de referencia para aqueles que observaram

e avaliaram tais revolucoes.

"

46

2

ALEM DA BURGUESIA

A Revolucao Francesa dominou a hi st6ri a, a propria l in-

guagem e 0 sirnbolismo da polftica ocidental desde sua irrupcao

ate 0 perfodo que se seguiu a Primeira Guerra Mundia1- incluin-

do a poli ti ca daque las el it es no que hoje e chamado de Terceiro

Mundo. que viram que as esperan~as de seus povos estavam em

algum tipo de modernizacao, ou seja, em seguir 0 exernplo dos

mais avancados Estados europeus. Assim, por quase urn seculo e

meio, a bandeira tricolor francesa fomeceu abertamente 0modelo

pa r a as bandeiras da maioria dos Estados recem-independentes ou_",unificados no mundo: a Alemanha unificada escolheu preto, ver-

. . melho e ouro (edepois preto , branco e vermelho) nolugar do azul,

branco e vermelho; a I talia unificada, verde, branco e vermelho:

' . p a r volta dos anos 1920, 22 Estados haviam se adomado com ban-

deiras nacionais que consistiam em tres listas de cores diferentes,

. .>terticaisou horizontais, e outros dois com blocos de tres cores em

vermelho, branco e azul, 0que tambem sugere a influencia france-

f l a . - Em comparacao, eram muito poucas asbandeiras nacionais que·b1ostravam a influencia direta das estrelas e listas, mesmo se con-

·siderarmos a presenca de uma iinica estrela no topo do canto es-

qaerdo como urn s inal de der ivacao da bandeira dos Estados Uni-

dos: urn maximo de c inco bandei ras, das quai s t :re s - Liberia,

. . . P a na m a e Cuba - foram vir tualrnente criadas pelos Estados Uni-

. . dos. Mesmo na America Latina, as bandeiras que rnostram a in-

·f1uencia tricolor superam 0 numero das que mostram influencia do

Norte. De faro, a influencia comparati varnente modesta da Revolu-

~ Americana - exceto, e claro, na propria Revolucao Francesa

~: 47

 

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_ deve espantar 0 observador. Como modele de rnudanca social

e de sistema politico, a Revolucao Americana foi absorvida e subs-

tituida, por ass im dizer, pela Revolucao Francesa, parte porque os

refonnadores au revoluciomirios das sociedades europeias podiam

reconhecer-se mais prontamente no Ancien Regime da Franca do

que nos colonos livres e senhores de escravos daAmericad~ Norte.

E tambem porque , mui to mais do que a Revolucao Amencana, aRevo l ucao Francesa via-se a si mesma como u rn fen8meno glo-

bal, apioneira e 0modele do destino do mundo. Entre as numerosas

revolucoes do final do seculo XVIII, ela se destaca na o apenas por

sua escala ou - em t e rmos do sistema de Estado - por sua cen -

tralidade, para nao falar de seu drama, mas tambem porque desde

o comeco possuiu conscientemente essa dimensao ecumenica.

Por razoes obvias, aqueles que s e p ro p us er am a fazer re -

volucoes, e especialmente revolucoes cujo objetivo era a transfer-

macae fundamental da ordem social ("revoIUl;:oessociais"), foram

particularrnente inspirados e influenciados pelo modelo da Franca,

Desde a decada de 1830 ou, no mais tarda r, de 1840 , essas pro-

postas incluiram os novos movimentos sociais das classes trab~-

Ihadoras nos pafses com industrializavao. ou pelo menos o s m o v i-

men t e s e organizacoes que pretendiam fa lar em nome dessas novas

classes. Na propria Franc;a, a ideologia e a linguagem da revolucao

espalhou-se, depois de 1830, por regioes e estratos ainda intoca-

dos pela era revolucionaria original, incluindo grandes areas do

campo. 0 processo foi maravilhosamente descrito e analisado pOT

partes da Provenca no livro de Maurice Agulhon, La Republique

au village. IFora cia F r anca , os camponeses, em geral, pe rmanece -

ram hostis a s ideologias trazidas pelos home~s das cid~d~S.mesm.oquando podiam entende-Ias, e justificaram seus propnos movi -

mentos de protesto social e revolta em uma terminologia diferente.

Era comum aos governos, a s classes dominantes e aos ide61ogosda esquerda, ainda em plena segunda metade do seculo XIX , con-

cordarern - com sat isfacao ou resignacao - que os camponeses

eram conservadores. 0 fato de a esquerda subestimar 0 potencial

radical dos agricultores e bastante notorio nas revolucoes de 1848

e ref letiu-se em sua histor iograf ia ate muito depois da Segunda

48

Mundial, ainda que tenha havido sugestoes, no p6s-1848,

que Frederick Engels nao considerara total mente utopica uma

"}~UJJlU<L edicao das guerras camponesas, a qual ele reclamava

1Al1l f l1""" '" estava escrevendo uma hist6ria popular delas). E claroele havia visto pessoalmente a ac;aodos revolucionarios anna-

na Alemanha do sudoeste , uma parte do pais em que , con-

os historiadores agora percebem, 1848 foi essencialmente

mo v im e n to a g ra ri o, e talvez 0 mai o r de tais movimentos na

!'ftIlCJI:lill.UH desde a guerra camponesa do seculo XVI.' Contudo,

para os camponeses revolucionarios, a Revolucao France-

estava longe. 0 jovem Georg BUchner, autor do espantoso A .

de Danton, nao se comunicou com 0 campesinato de sua

natal na linguagem jacobina , mas si m na l inguagem da

luterana.'

Bern diferente foi 0 caso dos trabalhadores urbanos au indus-

que nao encontraram dificuldades em assumir a linguagem

o sirnbolismo da revolucao jacobina, os quais a ultra-esquerda

havia adaptado especificamente a sua situacao, identifi-

opovo como proletariado-especialmente depois de 1830.

trabalhadores franceses de 1830 adaptaram a ret6r ica da Re-

a seus pr6prios objetivos, ainda que tivessem se tornado

_Ll""l<OlJllC~ de s icomo urn movimento de classe contra as autori-

' ~ " d e sl ibera i s que t ambem apelavam a essa re tor ica , e na o apenas

Franca. ' Os movimentos socialistas austriaco e alemao. talvez

meio da ident i f icacao de s e u s l fd e r es com a revolucao de 1848

os trabalhadores austriacos celebravam 0aniversario das viti-

de marco de 1848 (Miirzgefallene) antes de passarem a cele-

o Primei ro de Maio -, punham enfase na continuidade com

.' Grande Revolucao. A Marseillaise (em varias adaptacoes tex-

..•. . era 0 hino da Social Democracia Alema, e a Social Demo-

jf.~ia Austr iaca, ainda em 1890,punha 0 barrete frigio - 0 chapeu

, ',Ig_liiracteriSticoda Revolucao Francesa - e as divisas Igualdade,

; '. \! :~ade e Fraternidade em seus emblemas doPrimeiro deMaio.'

< '. nao surpreende. Afinal de contas, a ideologia e a l inguagem

.. revolucao social chegaram da Franca a Europa central por inter-. medio dos trabalhadores assalariados radicais alernaes em seus

49

 

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grandes deslocamentos, dos turistas ou ernigrados politicos ale-

maes na Paris de 1848 e por intermedio de publicacoes influentes

e a s vezes extremamente bern informadas que alguns deles traziam

cons igo, especialmente as de Lorenz (von) Stein. ' Na epoca em

que, na Europa continental, se desenvolviam importantes movi-

mentos operarios socialistas, a tradicao da Revolucao Francesa

como uma transformacao politica, ativa e insurrecional havia sido,em grande par te, reduzida de fate a seu componente operario. A

Comuna de Paris de 18711igou a tradicao jacobina com a social-

revolucionaria proletaria, e para isso nao foi de menor importiin-

cia 0 eloquente obi t u a ri o ana l it i co escrito por Karl Marx a respei to , 7

Que a Revolucao Franeesa vivesse tanto atraves de 1793-1794

quanta de 1789 era evidente demais para incomodar as comen-

taristas, Pois 1848- embora aparentemente fosse urn breve epis6-

dio derrotado com rapidez na maioria dos numerosos parses con-

vulsionados pela revolucao - certamente demonst rou que 0

processo revolucionario continuava. Na Franca, a esperanca de que

ele houvesse encontrado urna clara conclusao em 1830 a b r iu l u ga r

para 0 pessimismo e a inseguranca entre os liberals. "Nao sei quan-

do esta viagem vai terminar", exclamou Tocqueville na decada de

1850. "Estou cansado de pensar, mais uma vez, que alcancamos a

costa, e descobrir que ela era apenas urn enganoso aterro de nevoa .

Freqtientemente me pergunto se a base firme que ha tanto tempo

procuramos realmente existe, ou s e n o s so destino e navegar ern urnmar tempestuoso para sernpre , "I Fora da F ranca , nos anos 1870, e

usando uma comparacao similar, Jacob Burckhardt inaugurou sell

eurso sobre a Revo lu c ao F r a n ce s a com as p a la v ra s : " S ab emo s que

a mesma tempestade que fer iu a humanidade em 1789 esta ainda

nos levando para 0 futuro"." ,.

Nessa situacao, a Revolucao Francesa acabou servindo a uma

serie de objetivos, Para aqueles que queriam transformar a socie-

dade, ela fornecia uma inspiracao, uma ret6riea e urn vocabulario,

urn modelo e urn padrao de comparacao. Para aqueles que nao

desejavam ou nao necessitavam fazer revolucao, os primeiros tees

desses usos eram menos importantes (exceto na Franca), embora

a maior parte do vocabulario polftico de todos osEstados do seen-

50

10 XI X tenha derivado da Revolucao Francesa e tenha sido, com

fi:eqiiencia, diretamente emprestado ou adaptado do frances: por

exernplo, a maioria daquilo que e associado com "a nacao" . Por

o u tr o l ad o , como padrao de c om p a ra ca o , a R e vo lu ca o Francesa

foi. no mfnimo, mais importante - poi s 0 medo d e revolucao emais eomum do que as perspectivas r ea is d el a. E ernbora, como

veremos , para a maioria da nova esquerda ocidental - operaria esocialista - a relevancia operacional de 1789-1799 tornava-se

cada vez mais fraca, ao contrario de sua relevancia ideologica, os

governos e as classes dominantes estavam constantemente avalian-

d o as possibilidades de subversao e de rebel i ao de homens e mu-

. )' l he re s que, como sabiam be r n , tinham muitas razoes para estar

, . d e sc o n te n te s com sua parte. As r e vo l u co e s do passado eram, ob-

, viamente, pontos de referencia.Assim, ern 1914,0 rninistro britani-

co John Morley p er gu n ta v a- se s e 0 clima do pais, as vesperas do

que ser ia a Primeira Guerra Mundial ~ no meio de uma agitacao

;' > s6cio-politiea consideravel-, nao seria semelhante ao de 1848,IQ

Quando uma r e vo l u ca o r e alm e n te e c lo d iu , tanto as que a apoiavam

quanto os que aela seopunham a eomparariam imediatamente com

suas predecessoras, Quanto maior e mats central era uma revo-

luvao, rnais inevitavel era sua cornparacao com 1789.

Assim, em ju lho de 1917, 0 Current Historical Magazine do

N ew Yo rk Tim es publieou urn artigo anon imo cujo titulo, "A s Re-

volucoes Francesa e Russa de 1789 e 1917: paralelos e contrastes"

inquestionavelmente refletia as preocupacoes de cada europeu ou

americano instrufdo do tempo." Provavelmente, urn mimero razoa-

ve l deles teria t am b em c o n co r da d o com as o b se rv ac o es n a o m u it o

perspicazes do artigo, Em ambos os pafses , pensava seu autor, "se

o soberano tivesse, s ab ia e lealmente. cedido no momenta eritico,

estabelecendo genu fna s i n s ti t u icoe s representativas [...J nenhuma

revolucao teria ocorrido, Em ambos os pafses , d a mesma forma, a

:; oposi~ao final e fatal veio da rainha estrangeira (Maria Antonieta,

·:em urn caso, e a czarina alerna por nascimento, em outro) e atraves

de seu perigoso poder sobre 0 soberano". Em ambos osparses, argu-

Dlentava, fil6sofos e escritores prepararam longamente a revolucao

, - Voltaire e Rousseau em urn caso, Tolstoi , Herzen e Bakunin no

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outro. (0 autor do ensaio nao julgava alta a inf luencia deMarx.) Ele

construiu urn paralelo entre 0 Conselho de Notaveis frances, subs-

tiiufdos pelos Estados-Gerais e pela Assembleia Constituinte, em urn

caso, e 0Conselho Imperial russo, substinudo pela Duma Imperial,

no outro. Examinando 0 desenvolvimento interne da Revoiucao

Russa, que, e claro, nao tinha progredido muito par volta do verao

de 1917, 0 autor ju 1gava que no par tido liberal Kadet , Rodsianko eMiliukov correspondessem aos girondinos, e 0 Soviete dos repre-

sentantes dos trabalhadores e dos soldados, aos jacobi nos. (Na medi-

da em que isso poder ia suger ir que as i iberais seriam depos tos pelos

Sovietes, nao era uma rna predicao; contudo, em outros assuntos, 0

autor nao conscgue dar uma impressao particularmente forte.)

o que essas comparacoes ressal tavam nao era a revolucao li-

beral . mas a revolucao jacobina e 0que estava nelaimplicado. Pois,

cada vez mais, 1789 deixava de ser urn assunto explosive, com

excecao da Russia czari st a e da Turquia, Ao final do seculo XIX, a

Europa consi st ia majorit ariamcnte - com excecao das duas mo-

narquias absolutas acima mencionadas , das republic as da Franca

e da Su tca e de algumas mini rrel iquias da ldade Media como San

Marino e Andorra , que nao necessi tam ser contadas - de monar-

quias que se haviam ajustado a revolucao ou, em outros termos,

de c lasses medias que se haviam ajustado aos ant igos regimes.

Depois de 1830. nao houve mais revolm;:5es burguesas bem-suce-

didas . Contudo, as velhos regimes haviam aprendido que a sobre-

vivencia significava adaptar-se a era do Jiberalisrno de 1789-1791,

ou melhor, de 1815 -1830. Em contra partida, eles aprenderam que

a maioria dos burgueses l ibe rais se sat isfaria com menos que seu

programa complete em t roca de uma garanti a con tra 0 jacobinis-

mo a democracia au as furores que poderiam produzi-Ios. De faro,

a res tauracao da monarquia naFranca em I814mostrou ser a ante-

cipacao de ur n padrao geral: ur n -velho regime que coopta 0 sufi-

ciente da Revolu<;ao Francesa para satisfazer a ambos os parceiros.

Como 0 arquiconservador Bismarck declarou em 1866, com sua

habi tua l e incomparave l lucidez e gosto pela provocacao: "Se epara haver uma revolucao, Cmelhor no s a fazennos do que sermos

suas vitimas" . '

'.

52

o l ibe rali smo burgues (exceto na Russia e na Turquia ) nao

preci sava mais de uma revolucao nem a dese java. De fato, estava

ansioso para a fastar- se da anal ise que havia c riado, poi s ta l ana-

lise, antes direcionada contra 0 feudalismo, agora voltava sua mira

cont ra a sociedade burguesa. Como disse 0socialista moderado

Louis Blanc em sua Historia da Revolucao Francesa, de 1847, a

burguesia havia ganhado uma l ibe rdade genufna atraves da re -

volucao, mas a liberdade do povo era apenas nominal ." Por tanto,

o povo precisava fazer a sua Revolucao Francesa. Observadores

mais hicidos e radicais iam adiante e viam uma luta de classes entre

a classe dominante dos novos burgueses e 0proletariado que ela

explorava como 0 princ ipa l conteudo da hi storia capit al ista -

ass im como aquela da burgues ia contra 0 feudalismo nos tempos

antigos. Essa era a visao dos cornunistas franceses, f ilhos da ultra-

esquerda jacobina do periodo apos 0Termidor, Essa elaboracao da

ana lise de classe burguesa-libera l Ioi t ao bern receb ida pelos re-

volucionarios sociais, como Marx, quanto mal recebida por seus

fundadores, Thierry, sacudido pela Revolucao de 1848, concluiu

que a anali se de classe e ra re levante para 0 Antigo Regime, masnao para 0 novo. pois a nacao, que havia se rea li zado a traves da

Revolucao Francesa , e ra agora urn todo uni ficado, una e sempre a

mesma; e mais err6nea ainda era a suposicao de que 0 Tiers Etat

havia correspondido a burgucsia, que esse Tiers Etat burgues seria

superior a s outras classes inferiores e que teria interesses diferentesdos delas." Guizot, que havia, mais do que os outros, deixado uma

saida de emergenc ia para sua ana li se de classe, abandonou rapi -

damente a posicao de apoiar qualquer revolucao. As revolucoes

erarn, ou rer iarn de ser, uma his t6ria passada,

Par outro iado, para os novos revolucionarios socials orienta-

dos para 0 proletariado, a questao da revolucao burguesa perma-

neceu, paradoxalmente, urgente e vital. Era obvio que a revolucao

burguesa precedia uma revolucao pro letaria, porque acontecera pelo

menos uma revolucao burguesa bem-sucedida e, a te entao, ncnhu-rna prole ta ria a inda. Poder-se-i a a rgumentar - e assim se argu-

mentou - que apenas 0 descnvol vimento do capitalisrno cm uma

sociedade burguesa vitoriosa criaria as condicoes para a emergen-

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c ia de seu opositor proleta rio, econornica e pol it ica rnente, pois,

como Marx colocou, aocomentar a Thierry p6s-1848: "A oposicao

decis iva entre a burgues ia e 0 povo nao se estabe lece a te que a bur-

guesia, como Tiers Etat, de ixe de se opor ao cletge e a noblesse","

Poder-se -ia iambern argumentar - e rna is t arde se argumen tou -

que apenas a extensao da revolucao burguesa a sua conclusao l~-

gica de uma republica democratica poderia criar as condicoes insti-rucionais e organizacionais para a conduta eficaz da luta de classe

proletaria contra a burgues ia; quaisquer que fossem os detalhes do

argumento, ate 1917 era univcrsalmente aceito, ao menos entre os

marxistas, que 0 caminho para 0 triunfo das classes trabalhadoras

e para 0 socialismo passava pela revolucao burguesa - a primeira

fase necessaria da revolucao socialista,

Nesse ponto emergem tres questoes, Primeiro, parec ia evi-

dente que as duas revolucoes dever iam ser entrelacadas. 0 espec-

t ro do comunismo comecou a acossar a Europa em uma epoca em

que a revolucao burguesa ou ainda n a o n a vi a sido fei ta (como na

Alemanha) au ainda estava incornpleta, ao menos em importantes

setores da burguesia - sem mencionar a pequena burguesia -• como na Monarquia de Julho ou mesmo na Gra-Bretanha do

primeiro Reform Act. 0 que havia acontec ido? Essa, s~ se qUl,ser ,

era aquestao para a esquerda nadecada de 1840 e tambem na deca-

da de 1850, na medida ern que ela ainda esperava urn novo 1848.

Segundo, 0 que acontecer ia se a burgues ia atingisse seus princi-

pais objetivos sern levar a revolucao burguesa para alem de urn

compromisso satisfatorio com 0 antigo regime, como estava aeon-

tecendo em muitos paf ses? Ou - a te rce ira contingencia - 0 que

ocorreria se, uma vez mais, a burguesia, para manter os traba-

lhadores controlados , sacr if icasse a urn tipo qualquer de ditadura

suas demandas pol fticas por uma Const ituicao e por um govemo

representa tivo'! A Revo lucao Frances a fornecia materi al pa rt.

responder 1 1primeira e a terceira questoes, mas nao a segunda,o jacobinismo pare cia ser a chave para ~ ~ro~lema de 184~.

Parecia ser tanto essencial ao sucesso e sobrevLvencla da revolucao

burguesa quanta urn modo de radicaliza-la e ernpurra-la para a

esquerda , pa ra alem de seus l irni te s burgueses. Em uma pa lavra,

,r .

54

fomecia tanto urn modo de sealcancarem osf ins da revolucao bur-

guesa, quando a burgues ia desamparada nao estava em posicao de

faze- lo , quanta urn meio de ultrapassa- la . Aanalise inicial de Marx

no comeco de 1840 - e ele foi urn dos muitos esquerdistas que

anal isaram deta lhadamente cada fase da hi storia da Revolucao

Francesa com lentes de aumento, de modo a poder discernir as

licoes para 0 futuro - concentrou-se no jacobinisrno como urn

fen6meno politico que permitira 1 1 r e v o l u c a o sal tar, c nao andar, e

tambern alcancar em cinco anos a que, de outro modo. tomaria

muitas decadas , "em vista das concepcoes temerosas e excess iva-

mente conciliadoras da burguesia" ." Contudo, durante e depois de

1848, a possibi lidade de empurrar a revol ucao para a esquerda, por

meio deuma v angua r da p o li ti ce , de transformar sell carater , tornou-

se a preocupacao central de seu pensamento: e essa fase do pen-samento estrategico de Marx que formaria 0 ponto de partida de

Lenin au, rnais precisarnente, 0 dos revolucionarios marxistas rus-

sos que se encontrar iam, em sua propr ia opiniao, em uma situacao

analoga, em que a burguesia e 0 proletariado eram ambos evi-

dentemente fracos demais para cumprir as tarefas his toricas a elesatr ibufdas pela teoria. Lenin, conforrne seus oponentes gos tavam

de dizer, era umjacobino.

E claro que a ascendencia do c om u n is m o, v in do do jacobi-

nismo, foi a essencia do argumento da Conspiracdo dos iguais, de

Buonarroti (l 828). Era urn ponto seguro para a ultra-esquerda

francesa antes de os b!anqui s tas, ap6s 1848, comprometerem-se

com a visao de que os hebertistas - e nao 0insuficientcmcnte

ateista Robespierre - foram os verdadeiros revolucionarios, 0que

foi c la ramente ace ito pelo jovem Engels." Tan to e le como Marx,

inicialmente, aceitaram a visao de que a base da Republica Jacobi-

na era 0 "proletariado insurgente", mas urn proletariado cuja vit6ria

em 1793-1794 podia ser apenas temporaria, "urn elcmento da

propria revolucao burguesa", na medida em que as condicoes mate-

riai s para a superacao da burguesia nao estavarn ainda maduras.

(A prop6sito, esse e urn dos raros exemplos do uso que Marx fez

do termo corrente revoluciio burguesa.i" A analise mais completa

da cornpos icao social da mult idao par is iense de 1789-1794 ser ia

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fei ta apenas no futuro, como tambem a dist incao entre jacobinos

e sans-culottes que seria tao importante na tnsionografia francesa

da esquerda, de Mathiez a Soboul.Em resumo, era natural para Marx dizer simplesmente aos

poloneses , em 1848: "0 jacobino de \793 tornou-se 0cornunista

de noje" ." E, por tanto, nao surpreende que Lenin nao escondesse

sua for te admiracao pe lo jacobin ismo, sem se deixa r convencerpelos mencheviques que 0 cri ticavam como jacobino no intcio de

1900, bern como peJos narodniks , que tambern 0 faziam com ou-

tros argumentos. ",Tal ve z se deva dizer que, ao contrar io de tantos

outros russos revolucionarios, Lenin nao mergulhou em urn conhe-

cimento detalhado das rninucias da historia revoluciomiria france-

sa, embora tenha fe ito uma bibliografi a sobre 0 assunto em seu

exilic na Suica durante a guerra. Pode-se derivar praticameote tudo

o que esc reveu sobre 0 tema de sua educacao gera l e dos t raba lhos

de Marx e Engels.Contudo, sem contarmos com a fil iacao nistor ica, a ref lexao

marxis ta sabre a estrategia do proletariado em uma revolucao futu-

ra, p6s-1848 (como oa "Comunicar;ao a Liga Comuoista", de 1850)• _ a tamoso chamado para a "revolucao permanentc" -, fornece

um eJo com 0 tipo de problema politico com 0 qual os bolcheviques

se vi ram confrontados meio seculo depois. Alem disso, a crit ica

Iei ta pur Trotsky a Lenin, mais tarde corporificada nas ortodoxias

rivals das seitas trotskistas, referern-se novamente ao mesmo ponto

do pensamento deMarx, ou seja, seu uso(ocas ional) dafrase "revo-

lucao permaneote" , precisamente pela poss ibil idade que abr ia de

transformar a revolucao burguesa em algo mais radical. 0usa origi-

nal des ta frase por Marx, nem seria precise dizer , refere-se oireta-

mente a historia da Revo\U(;:ao Francesa.*

E , portanto, evidente que a questao da revolw;iio burguesa foi

de substancial interesse pratico para os revoluciomirios sociais, eque setomou urgente nas raras ocasioes em que se viram realmente

na direcao de urna revolucao. Tornou-se crucial para eles at~ hoje,

como 0 tes temunham os debates da esquerda revolucionaria lat i-

no-americana desde os ii ltimos anos da decada de 1950, que al i-

mentaram 0debate academico entre as estudiosos da America Lati-

na, teoricos do "sistema mundial" e teoricos da "dependencia" ,

Podem?s nos lembrar que a maior questao teorica entre as par tidos

comumstas ortodoxos da linha sovietica e as var ias novas esquer-

d~s - esquerdas marxistas dissidentes ( trotskistas , maofs tas, cas-

tfIst .as) - era se a qUCSl:10imediata era unir-se com a burgues ianacional contra os regimes dorninados pclos propr ietaries da terra

(q~e poder iam ser vistas como similares aos senhores Ieudais ) -

e, e claro, com~a 0 imperia lismo - ou imediatamente depor tam-

bern a burguesia para cstabelece r di retamente um regime soc ia-

lista, * Embora estes debates terceiro-mundis tas, como os debates

analogos que dividiram 0 movimento comunista indiano nao se

referissem direiamente a Revolucao Francesa, e claro que eles pro-

longavam os debates entre os marxi st as que dela deriva ram e que

nela podem ser localizados.

o contraste com 0 Velho Mundo e impressionante. Ainda em

1946, a versao rrotskista do debate ("revolu~iio permanente") esta-

va presente nos termos especif icos da Revolucao Francesa no livro

de Daniel Guerin, Bourgeois et bras-nus, um trabalho descr ito

como. a historia das lutas de classe sob a Primeira Republica e

debatido como urn exemplo da tese da revoiucao permanen t e . "

.Contudo, suponhamos que a burgues ia renunciasse a sua pre-

t endida revolucao; ou suponhamos que a fizeram, mas sent i r am-

se incapazes de proteger-se contra os perigos da esquerda em urn

r:gime de instituicoes liberais. E dai? A Revolucao Francesa forne-

er a pouca ajuda no primeiro caso, embora, depois de 1848, ele

tenha se t?rna~o bastante fami liar, particularmcntc na Europa cen-

tral. Os his toriadores ainda interrogam se a burgues ia alerna real-

mente abdicou diante da rnonarquia e nobreza prussianas, entran-

(" ) A d is cus sao pos te ri or mai s in te re ssante sob re o ja cobi n ismo , do porno

de vi st a de uma revo luci io ma is r ad ic al, s eri a fe it a p~l as rc f\ exOes de Ant oni o

Gramsci na pri si io . Elas estao reproduzidas aqui, no npendice.

(*) Em termos acaderuicos . i sso levou a inf indas discussoes sobre a natureza

do modo regional de producao, ou modes de producao, e a debate, sobre se a

America Lat ina poder ia ou nao ser vis ta como essencialmente "capi ia li sra' desde

a conquis ta , dado que dcsdc cnt iio jri ser ia pane de urn rnundo interpretado como

u r n s i st em a c s se n c ia l rn e n te capitalista exis tente no seculo )(\'1.

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do ass irn (diferenternente das classes medias inglesa e francesa)

em urn Sonderweg, ou numa peculiar estrada his torica que a levou

a Hit ler; ou se, de fato, e la forcou Bismarck e os junkers a garan-

tir urn regime suficientemente burgues. Qualquer que seja a respos-

t a a tai s questoes, a s liberai s alemaes, depoi s de 1848, se sat isfi-

zeram com hem menos do que aqui la que a maior parte deles havia

considerado como indispensavel quando eles aderiram a revolucao

de 1848. Frederick Engels, no fina l de sua vida. a s vezes brinca-va com a ideia de que, em analogia com a Franca, cedo ou tarde

parte desses l ibera is realmente faria nova proposta em relacao a

urn poder sern concessoes, mas de fato 0 novo movimento operario

e socia lista nao contava rna is com 1S50. Por mais que esse novo

movimento operario estivesse compromet ido com a tradicao da

Revolucao Francesa - e nao podemos esquecer que, antes de a

Internacional tornar-se seu hino, os trabalhadores alernaes can-

tavam versoes proprias da Marseillaise - politicamcnte a hist6ria

de 1789-1794 havia deixado de se r relevante para os novos par-

t idos trabalhis tas social-democnit icos." Picou menos relevante

ainda nos pa ises indust riai s quando os lideres traba lhist as reco-nheceram, alguns mais re lutantes do que outros, que 0 caminho

para a frente nao passava mais pur tomadas de bast~lhas. por procla-

macoes de comunas inssurectas ou coisas assim. E claro que eram

revolucionarios, pelo menos se fossem marxis tas, como a rnaioria

dos seus partidos de faro era. Mas, como disse Karl Kautsky - 0

guru te6rico do grande SPD a le rn ao - com ur n toque de cons-

t ranz imento: "Nos somas urn partido revoluc iomi rio, mas na o'"

fazemos revolucao"."

Por outro lado. a Revolucao Francesa fomecia um exemplo

espetacular de uma revolucao excessivamente radical izada que se

refugia no autorit ari smo, ou seja , a ascensao do poder pol iti co de

Napoleao. Mais ainda, a hist6ria da Franca fomeceu ~ma ri~eti\a.odo fen6meno em 1848-1851, quando, uma vez mats, as l ibera is

moderados, tendo derrotado urn desafio insurrecional da esquerda,

foram incapazes de estabelecer as condicoes de uma estabil idade

polit ica, criando as condicoes para que outro Bonapar te tomasse 0

poder . Nao e, por tanto, surpreendente que 0 termo bonapartismo

58

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tcnha se tornado parte do vocabulario politico dos revolucionirios

sociais, especialmente aqueles inspirudos em Marx, que. em urn de

seus mais bri lhantes panfletos , descreveu a ascensao ao poder do

segundo Napoleao chamando-a pelo nome do golpe de Estado do

primeiro Napoleao. 0 fen6meno nao cscapou a observadores l i-

berais, Heinrich von Sybel estava provavelmente pensando nele

quando. no inicio da Historia da Revoluciio Francesa que comecara

a escrever em 1853, pensou que a queda do sistema feudal medieval

tFeudalwesensv em toda par te favorecia 0surgimento do Estado

rnili tarizado moderno." Em 1914.0 his toriador l iberal bri tanico e

futuro ministro do govemo H.A. L. Fisher, de modo pouco esclare-

cedor, generalizou 0 fen6meno em seis conferencias cujo t itulo era

"Bonapartismo". Mais cornumente, no entanto, a palavra foi usada

nodiscurso politico con vencional seja para descrever acausa daque-

les Jig ados a dinastia Bonaparte, como na Franca, seja, rnais geral-

mente, como urn s inonirno para alga que tambem podia scr chama-

do de cesarismo, com referencia a Julio Cesar.

Contudo, na esquerda marxista, 0 bonapar tismo ser ia dis -

cutido intensamente, sobretudo em relacao a questao da luta declasses e da direcao de classe em situacoes de equil ibrio relat ivo

e n tr e f or ca s de classe antagonicas . Em tais s i tuacoes , a que ponto

poder ia um aparato de Estado, au urn governante pessoal , tornar-

se aut6nomo, ascendendo ac ima das classes au jogando-as umas

contras as outras? Embora esses debates derivassern da expc-

riencia da primeira Revolucao Francesa, eles rea lmente ocorri-

am em urn Dutro plano porque estavam baseados muito mais na

historia do segundo Bonaparte do que na do pr imei ro . E eram

debates, e claro, preocupados com problemas polit icos e his tori :

cos cada vcz mais afastados do Dezoito Brumario origina l, pro-

blemas de crescente generalidade historica, Algumas discussoes

modemas derivam pouco mais do que 0 nome da siruacao doBonapar te original, como quando 0 termo e usado para explicar

os regimes autor itar ios e fascistas do seculo xx." Contudo, a par-

tir de 1917 0 termo retomou a debates polit icos relacionados

muito rnais diretamente a grande Revolucao Francesa, como logo

verernos.

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6061

Na medida em que 0 seculo XIX corr ia, a exper ienc ia da re-

volucao original tornou-se crescenternente dis tante das circuns-

tancias nas quais os revolucionarios se encontravam. IS50 aeon-

teceu inclusive na Franca, 0 ana de 1830 poder ia ainda ser vi sto

_ e de fato toi - como uma repeticao de 1789-1791 pela bur-

guesia l ibe ral . dessa vez pronta para 0 potencial perigo jacobino

e. portanto, capaz de mandar as massas mobilizadas para casadepois de alguns dias, antes que elas eornprcendessem que tinham

sido logradas, 0 ana de 1848 foi, uma vez mais, faci lmente vi sto

como outra var iante da revolucao original: dessa vez, com urn de-

saf io jacobino-sans-culotte muito rnais for te . vindo de uma ultra-

esguerda que pretendia representar 0 novo proletariado mas que

ja rnai s teve a chance de adquiri r poder, nem por urn momento ; foi

de rrotada e le ito ralmente, enganada , provocada para ent rar em

uma insurreicao em junho de 1848 e brutal mente esmagada. Mas,

ta l como apos 0 Termidor em 1794, os moderados vitor iosos nao

tinham apoio politico para urn regime estavel. mesmo quando

al iados com os conservadores; isso abriu caminho para 0 segun-

do Bonaparte. Mesmo a Comuna de Paris de 187 J ainda sc encai-• xava no padrao da revolucao radical de 1792. pelo monos no que

dizia respeito aos aspectos municipais: a comuna revoludonaria,

as secoes populares e assim par diante. Se a burguesia nao pen-

sava mais em terrnos de 1789-1794. os radica ls social-revolu -

cionarios e democr;iticos certamente ainda 0 faziam. Eles estavam,

como Blanqu i e seus seguidores, mergu lhados na experienc ia de

1790. sern fa lar de jacob inos como Delesc luze, que se conside-

ravarn herdciros diretos de Robespierre. Saint-Just e da Comissao

de Sa r vacao PUbl ica. Havia de fa to hornens, em 1860, cuja ideia

do que fazer quando Napoleao 11 1 caissc era repetir, tao exatamente

quanto POSSIVei , 0 que havia acontecido na grande R(f '. 'o lur; :ao.""

Facam sentido ou nao esses para le los com a revolucao original ,

el es nao parecern i rrelevantes por urna razao princ ipa l: era evi-

dente que a Pranca nao havia conseguido chegar a urn novo regime

perrnanente desde a queda do Antigo Regime, em 1789. Havia

passado pelos dez anos da Revolucao, dezoito anos da Monarquia

de Julho, quatro anos da Segunda Republica e dezenove anos de

outro imperio. A Revolucao , ao que tudo indicava . ainda estava

em processo.

Contudo, tomava-se cada vez mais clare, depois de 1870. que

a formula para um regime burgues permanente havia sido encon-

trada em uma republica parlamentar burguesa , ernbora essa re-

publ ica cont inuasse a ser desafi ada de tempos em tempos. Esses

eram, essencialmen te, desafios vindos da d irei ta ou, no caso do

boulangerisrno, de algo que parecia semelhante ao bonapartisrno,

o que fac il itava, portanto, a uniao dos herde iros dos l ibera is e dos

jacobinos em defesa da republica, reforcando a polft ica que, como

o falecido Sanford Elwit t mostrou, foi sisternaticamente iniciada

pela oposicao moderada na decada de 1860." Mas olhernos para 0

outro lado da moeda, 0 fato de que os burgueses l iberais podiam,

doravante, opera r no quadro de uma republica dernocra tica - 0

que des tinham ate entao tentado evitar-demonstravaque 0 peri-

go do jacobinismo nao era mais 0que se devia temer. Os ul tra s

podiam ser integrados no sistema - e aqueles que se recusavam

poder iam ser isolados em um gueto rninori tario, Aquilo que Dan-

ton ou Robespierre haviarn fe ito nao tinha mais interesse dir eta -

mente operational para aqueles inspirados em 1792-! 794, embo-

ra, e claro, como vimos, a propr ia cooptacao da revolucao radical

e popular pelos l iberais modcrados tenha dado a suas divisas , sf rn-

bolos e retor ica uma ressonancia nacional enorme. Afinal de con-

tas, a da ta do epi sod ic mais dramat ico de intervencao popula r da

Revolucao Francesa, a Tomada da Basti lha, foi escolhida em 1880

como o Dia Nacional da Republica Francesa.

Se tudo era assim na propria pa tri a-rnae da Revolucao, mais

6bvio ainda era em outros lugarcs . Ou as revolucoes nao cstavam

realmentc na agenda politica ou haviam se tornado tipos difercntes

de revolucao , Po is, mesrno onde as po lit icas da insurreicao, da

rebeliao e do poder que emerge do cano de uma arma fossern prati-cadas ou praticaveis, como na peninsula Iberica, clas nao eram

imediatamente rraduziveis em tenTIOScomparaveis a 1789-1799.

Para vcr isso, basta segui r a ca rreir a de Giuseppe Garibaldi, que

provavelmente tomou parte em urn maior mimero de revoltas, revo-

lucoes, levantes arrnados e guerras de liber tacao do que qualquer

 

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out re homem do seculo XIX e que, alia s, comecou sua carreira

poHtica sob a inf luencia da Revolucao Francesa vista do pr isma da

ideologia saint-simoniana, que 0 marcou profundamente." Certa-

mente todos, com excecao de cegos reacionarios, acreditavam nos

Direi tos do Homern e no pa is que lnes havia dado sua mais influ-

ente expressao. 0 caudiiho mili tar Melgarejo, em sua distante

Bolfvia, mail' fort e em simpat ia polftica do que em informacao e

gcografia, ofereceu levar sua caval aria para ajudar a Franca , 0pais

da liberdade, quando ouviu falar da Guerra Franco-Prussiana de

1870-1871. No entanto, admiracao ou inspiracao sao uma coisa,

modelos politicos sao outra.

Contudo, a Revolucao Francesa fez urn dramatico retorno

como modelo, ou como ponto de referencia , na Russia, por razoes

ja sugeridas, De um lado, as cornparacoes pareciam obvias: uma

monarquia absoluta do tipo Ancien Regime em crise; a necessidade

de instituicoes libe rai s burguesas que, sob as ci rcunstanc ias do

czarismo, poderiam aparecer apenas atraves de revolucao; c forcas

revolucionarias rnais radicais ainda esperando por coisas alern do

que esperavam aqueles que apenas desejavam urn constituciona-

li smo liberal . De outro lado, grupos e corpos revolucionarios -

hi que se lembrar de que, sob as condicoes czaristas, ate mesmo

os reformadores moderados t inham de ser revolucionarios , pois

inexistia urn modo legal de se mudar 0 regime, a nao ser pelo trono

- grupos revolucionarios que estavarn mergulhados na histor ia da

Revolucao Francesa e com 0 mais forte incentive para ana1isar

detalhadamente seu registro historico. Aqui havia uma revolucao

universal mente considerada como mevitavel e irninente. 0 proprio

Marx comecou a apostar em uma explosao russa por volta de 1870

em diante.

Os intelectuais russos , a maioria dos quais era necessaria-

mente tambem revolucionaria sob 0 czar, estavam mergulhados nahistoria da Revolucao Francesa, "Eles conhecern a Revolucao

F r ance s a melhor do que nos". e xc la m ou M a rc el Cachin, mai s tarde

um dos velhos che tes do cornunismo frances. aos deiegados do

Congresso do Part ido Socialista de Tours, em seu retorno de Mos-

cou em 1920. '<)Nao admira: as contr ibuicoes russas or iginals a

62

hisl6r~a d~ Revolucao Francesa foram substanciais. De fato, I.V.

Lutchitskii (1845-1918), urn liberal russo, e N. l.Kareiev (1850-

1931) , urn liberal que tinha s ido narodnik, foram os pioneiros no

e~tudo do campesinato e da questao da terra na Franca do final do

s e cu lo x vm , e foram reconhecidos pelos franceses como tais. Tam-

bern 0 anarquista Peter Kropotkin escreveu uma his toria da Re-

volu~~o ~r~ncesa em dois volumes que, por longo tempo, foi a me-Ihor historia esquerdista seria disponivel intemacionalmente. Foi

primeiro publicada em ingles e frances, em 1909, e f inalmente emrusso, em 1914.

Nao surpreende, portanto, que os revolucionarios russos auto-

maticamente procurassem analogias russas com o s acontecimen-

I~S franceses de 1789-1799, como 0 fez Plekhanov, 0 "paj do mar-

xrsrno russo", no fina l de sua vida ."'

A comparacao com a Revolucao Francesa, embora 6bvia na

mente dos part icipantes ins truidos da Revolw;ao Russa de 1905

nao parece, no entanto, ter sido muito importante, talvez princi-

palmente porque 0 czarismo, ainda que tenha balancado por urn

tempo, de fato nunca perdeu 0 controle, mesmo antes que a re-volucao fosse reprimida." Em 1905, Lenin cri ticou as menchevi-

ques como "girondinos" par nao terem ao menos considerado a

poss ibil idade de uma ditadura jacobina na Russ ia; mas 0 assunto

era acadernico .:2 Em todo 0 caso, Lenin estava respondendo com

uma alusao direta a exper iencia da convenvao de 1793. Depois da

de.ITot~,a ~elalf~o entre a classe operaria e a revolucao burguesa

foi rnuito discutida, com as referencing habituais aojacobinismo e

a sua natureza. Contudo, a comparavao COm 1789-1799 nao foi

muito alem de generalidades.

Por outro lado, 1917 e os anos que se segui ram foram cheios

de referencias a Franca revoluciomiria. Essas referencias che garam

ao POnto de se procurarem as contrapartes rus sas para as figurasfamosas .da Re.volu~ao Francesa. Em 1919, W. H. Chamberlin, que

escrevena mars tarde uma das me1hores his t6rias da Revolucao

Rus s a , .pensavaque Lenin era s em e lh an re a Robespierre, com " u r na

mentahdade mais esclarecida e com mais las tro internacional",

embora Charles Wil lis Thompson, da is anos depois, crit icasse

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como pouco adequada a comparacao Lenin-Robespierre. Pa ra

Chamberlin, Trostky era como Saint-Just, mas para ThOl~pso,n.eJe

lembrava Carno!, 0 organizador dos exercitos revolUClOnanOS.

Mais tarde, Thompson rejei tou aqueles que viram em Trotsky urn

Marat." . "Seria facil t racar os caminhos pelos quais as revolUclOnano

s

russos dotados de senso historico compararam os acontecimentos

de sua prop ria revolucao com a sua predecessora . Su~~o,v, 0

Iamoso observador de 1917, e um excelente exemplo de individuo

"cr iado nas his tories das rcvolucoes inglesa c francesa", que espe-

culava, como ele propr io disse, que 0 "poder dua l" dos Sovie tes e

do govemo provis6rio produziria algum tipo de Napoleao ou

Cromwell - mas quem, entre os politicos revo1ucionarios, se

prestari a ao paper! - ou talvez u rn Robe spie rre , Mas novamente

nao havia candida to 6bvio em vista." A propria Histor ia da Re-

voluoio Russa de Trotsky e cheia de ta is co rnparacoes. que scm

duvida estavam entre suas preocupacoes nesse tempo. Os demo-

cratas constitucionals (0 principal partido liberal), que esiavam ten-

tando manter u r na monarquia constitucional, sugeriam a eJe0

quaodiferente 1917 era de 1789: naquela ocasiao, 0 poder real era ainda

universalmente aceito, ao passo que agora 0 czarismo ja perdera

sua legit imidade popular . 0 poder dual suger ia eomparacoes com

as revolucoes inglesa e francesa . Em julho de 1917, os. bolche-

viques foram levados por uma manobra a se co l oca r na hd~ran\a

de dernonstracoes populares as quais eles proprios achavam intern-

pest ivas, e a rep ressao proYocou uma derrota te rnpora ria do par-

tido e a fuga de Lenin de Petrogrado. lmediatamente, ocorreu a

Trotsky a comparacao com as demonstracoes no Champs de Mars

em ju lho de 1791, nas quai s Lafayet te havia manobrado os repu-

bl icanos: do mesmo modo, tentou a cornparacao entre a segunda

e mais radical revolucao de J 0 de agosto de 1792 com a Revolucaode Outubro, ambas vir tualmente sem resist enc ia, ambas de fato

proclamadas antecipadamente." _

E talvez mais inte ressante ver como as comparacoes com os

revo luciomi rios franceses foram usadas por varias pessoas para

avaliar, e progressivamente criticar, os acontecimentos que se suce-

diamna Russia. Uma vez mais, lembremo-nos do prototipo histori-

co der ivado da Revolucao Francesa. Ele consist ia de seis fases : 0

rebentar da Revolucao, ou seja, a perda de controlc pela monarquia,

do c u rs o d o s a c on r ec ir n en to s na p rim a vc ra e no verao de 1789: 0

per iodo da Assernbleia Constituinte, que terrninou com a Consti-

tuicao liberal de 1791; it quebra da nova formula em 1791-1792,

devida a tensoes internas e cxternas, que levaram it segunda revo-

l uc ao e rn lOde agos to de 1792 e it is t i tu icao da Republica; em ter-ceiro lugar , a radical izacao da Republica em 1792-1793, quando a

direita e a esquerda re vo lu cio na rias - a Gironda e a Montanha-

lutavam por ela na nova Convencao Nacional, C 0 regime lutava

contra a revolta intema e a intervencao estrange ira. Isso culminou

no golpe que confer iu poder a esqucrda, em j unho de 1793,0 qual

in t roduziu a nova fase : a Republ ica Jacob ina, a fase mais radical

da Revolucao Francesa, alias associada ao terror (como 0 indica scu

nome popular), uma sucessao de expurgos internes e uma extraor-

dinariamente bern-suced ida mobili zacao para a guerra total da

populacao. Quando isso salvou a Franca, 0 regime radical termi-

nou no Nove Tennidor. Para n o s s os o b j et iv o s , 0 periodo que v ai d e

julho de 1794 ate 0 golpe de Napoleao pode ser visto como uma

fase unica , a quin ta, que t entou retroceder para urn regime mai s

viavel e moderado. Essa tentativa malogrou, e no Dezoito Brumario

de 1799 0 regime autorit ario e a rmado de Bonaparte assumiu ()

poder. Sem duvida, e possfvel distinguir ainda entre 0 regime de

Napoleao antes de 1804, quando de ainda governava como chcfe

de urna republica, e seu imperio posterior, mas nao precisamos nos

preocupar com isso n e st a d is cu s sa o , Em qualquer ca so , para os l ibe-

ra i s da Restauracao, todo 0 periodo napoleonico pertencia a Revo -

lucao Franccsa. Mignet t e r rnihou sua his t6ria em 1814.

Que os bolcheviques cram, em 1917, os cquivalentes aos

jacobinos, parecia evidente derna is. 0 problema para os adver-sar ios a e sque rda de Lenin era que , uma ve z que a revolucao havia

eclodido, era muito d i f fc i I c r it i ca r os ja co bin os . E le s h av ia m s id o

os revolucionarios rnais consistentes e eficazes, os salvadorcs da

F r anca , e, alern disso, n ao p od iu m ser ident i f icados com 0 puro

extremismo, pois Robespierre e a Comissao de Salvacao Publica

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tinham sc oposto tanto a seus inimigos da dircita quanto aos da

c:-;querda. Portanto. 0 velho Plekhanov, que nao aprovava a trans-

f erenc ia de poder feit a em outubro, recusou-se a ve-la como urna

vitoria dos jacobinos. Argumentavaque 0equivalente aos hebertis-

las (os ultras que foram liquiuados por Robespierre na primavera

de 1794) havia tornado 0 podcr e nada de born poder ia vir disso."

Por seu lado, alguns anos depois, 0 velno teonco social-democra-

ta alemiio Karl Kautsky iambem recusou a conexao pos it iva entre

os jacobi nos c as bolcheviques. ~aturalmente. argumentava, os

amigos dos bolcheviques ressal tavam as semelhant ,;as entre a

monarquia constitucionaL o s girondinos republicanos moderados

da Revolu~ao F r ancc s a e os derrotados social-revolucionarios e

menchcviqucs da Russia, identificando portanto os bolcheviques

com os jacobinos. lsso servia para dar-Ihes credito como ver-

dadeiros revolucionarios. Contudo. desde 0 corneco, os bolcnevi-

ques apenas poder iam parecer equivalentes aos jacohinos; eles

haviam se comportado de forma bas tante dis tinta: revelaram-se

bonapar tistas , ou seja, como uma espccie de contra-revoluclo-

nar ios . "o selo da all tent icidade jacobina. por outro lado, foi dado aos

bolcheviques pela fonte mai s aLitorizada: a Societe des Etudes

Robespierr i s tes- que mandou 05 mais calorosos votes para ajovem

revolucao, com a esperan~a de que "cncontra ria, para l ide ra-la .

Robespierres e Saint-Jus ts capazes de garanti-la contra 0duplo

per igo da fraqueLa e do exagero" .'8 (E, podemos aereseentar, para

continuar a guerra contra a Alemanha, que eles logo encerraram.)

De fa ro, a maie r autoridade no assunto, Albert Mathicz , que viu

Lenin como "0 Robespierre bem-"ucedido", escreveu Limpanfle-

to, Bolchevismn e jacobinismo, no qual argumentava que, ernbora

a hist6ria nunca se repetisse, "os revolLicionarios russos delibera-

da e conseientemente copiavam seus model osfranceses. Estao ani-mados peJ0 rnesmo espfri to". "J Par urn breve momcnto (J 920- I922)

Matniez [evou ao novo Partido Comunisla sell cnlusiasmo pelos

Robespierres hem-sucedidos - gracas a Ulnadoutrina mais efeti-

va que a original -, 0 que lhe deve ter eustado a sucessao oficial

de uma c:itedra [}a Sorbon ne quando Aulard seaposentou, em 1924.

No,e~tanto. C di ffcil ve-lo como u rn rn arxista o u comunista ca rac-

t er ts n co , c m b o ra se,u apoio a experiencia do csforco de guerra feito

e~ tr~ .1914-1918 e a Revolucao Russa tenha dadu a sua sfntese da

h~stona,~c 1789.-1794 (1921) uma conscicncia social e uma dirnen-

sao politica maiores do que tivcram OS"rabalhos do .. mesmo tipo

que 0 antecederam.

, . D~ mo~o bas tante cur ioS{~, inicialrnente houve poucos pala-

dinos da ultra-esquerda revolucionaria francesa, Talvez estivessem

desarrnados pelo entusiasn 'h' db'. • . 10 0 VIO o s o lc he viq ue s por M ' .cUJo bati Jurat,

nome. auzou urn dos navies de guerra do novo regime e uma

rua em Lenmgrado Em qualq , , ~ . ." .. '. u cr ca so , a revo l u~ao vIonos a encon-

r ra va m a r s f ac il rn e n te identificacao com R b .' d• . > U esplerre 0 que com

:(!~s.oponentes gU1lhotm~dos da esquerda, mesmo sc Lenin, logo

pos outuhr?, tenha sedefendido contra a acusacao de praticar urn

~error~JaeOblOo:"A nossa revolucao nao C0 terror revolucionario

. ranees ~ue guil~~tinou pessoas dcsarmadas, e espero que nunca

1 re~os .tao long~":""A e~peran~a provou ser em vao, Somente com

o.tnu.nto do staiinismo e que a ultra-esquerda encontrou seus paJa-

~n~s. cont.ra ? novo Robespierre de Moscou: entre eles. Danieluenn, cujo l :vro La lutte ~es c!asses. sous fa Premiere Republique

(1946), uma CUrIUSacombinacao de ideias libertarias e trotskistas

- com u m to q ue de Rosa de Lb' .u xem urgo -, reviv ia ( ) argumenta

s.e~un.do0 qual os sans-culot tes cram proletarios lutando contra os

jacobinos burgueses,

Na verdade, i?dependentemente do fato de Stalin ver-se como

urn. novo Rcbcspierre , os comunista s estrangeiros do periodo

ant i fasci s ta e n co n tr a v am a lg u m conforto, quando avalia vam os j ul -

~~menlos e expurgos sovieticos, na ide ia de que estes eram tao jus-

tificados pela necessid d . .. .. a e quanto havia sido 0Terror de 179"" '-1794. 1 I . J. . sso ocorna tambe~ na Franca, onde a idealizacao de

Ro~esplerre chegava a dominar a tradicao his t6rica jacobina porrazoes quc n.adate~ que ver com Marx ou Lenin. Era bas tante Iacil

~ara com~.l1lstas~franceses como Mathiez ver Robespierre como

uma prefiguracao de Stalin"." Talvez em outros paises onde a

pal~Yra Terror nao suger isse tao prontamente episodios de doria

nacional e tr fo revoluci " e-run 0 revo ucionano, essa comparacao com Stalin

 

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t enha sido evit ada . Contudo, e diffe il nao concordar com Isaac

Deutscher que Stalin "pertencia a familia dos grandes despotas re-

volucionarios. como Cromwell, Robespierre e Napoleao"."

No entanto, 0 debate sabre 0 j acob ini smo em si mesmo nao

foi muito signifi cat ive . Hav ia rea lrnente pouca duvida de que, se

ulguern em 1917 representava 0 equivalente aos jacobinos , eram

as bolcheviques. 0 problema real era0

seguinte: onde estavam osBonapar tes au os Crornwells que, como seus precedentes his tori-

cos sugcriarn, poderiam esta r andando pelos bastidores? Alem

disso, haveria algum Termidor e, em caso positive, aonde ele pode-

r ia levar a Russia?

o primeiro desses problemas foi vis to como uma poss ibil i-

dade mui to real j a em 1917. Kerensky tinha sido tao comple ta -

mente expulso da his toria que me lcmbro de meu propr io espanto

quando me contaram que aquele pequeno cavalheiro idoso que

podia ser vis to andando pela area dabiblioteca de Hoover, em Stan-

ford, era ele. De algum modo sentia-se que ele dcver ia estar morto

ha muito tempo, ernbora, na realidade, ele ainda nao tivesse oiten-

ta anos par aquela epoca, Sell momento na his toria durou de marcoa novembro de 1917, mas durante esse periodo e le foi uma figura

centra l - como mostram os persistcntes debates fe itos na epoca

e depois - por seu desejo ou capacidade para ser um Bonaparte.

Isso se tomou parte da heranca sovie tica poi s, anos depoi s, tanto

Trotsky quanto M. N.Roy argumentaram - no contex te daquestao

geral do bonapartisrno e da Revolucao Russa - que a temativa de

Kerensky de atuar como Napoleao foi de faro um aborto porque

nao havia base nenhuma para tanto no desenvolvimento previa da

Revolucao." Esses a rgument os se baseavarn na temativa do go-

verne provisorio - bem-sucedida por urn breve tempo - de

supri mir osbolcheviques, noverao de 1917. 0 que estava namente

de Kerensky, naquele momento, nao era cer tamente tornar-se urn

Napoleao, mas sirn ressuscitar outro aspecto da Revolucao France-

sa, ou seja, desencadear urn apelo de tipo jacobino, urna guerra de

res is tencia patriot ica contra a Alcmanha que iria manter a Russia

na Grande Guerra. 0 problema foi que todos os revolucionario s

reais, e nao apenas as bolcheviques, se opunham it guerra porque

sabiam que a demanda por pao, paz C terra era 0 yue realmente

rnobil izava a maioria das rnassas, Kerensky Iancou seu apelo e

m ais u rn a v ez jogou 0 exercito russo em urna ofensiva no vcrao de

1917. Errou totalmente a pontaria e cor tou a garganta do governo

provisorio. Os soldados camponeses recusaram-se a Iutar , foram

para casa e cornecaram a dividir a terra. As pessoas que realrnente

consegui ram levar os rnssos a lutar novamente foram os bolche-viques: - mas depots da Revolucao de Outubro e depois de safrem

da Guerra Mundial. Aqui a cornparacao entre os jacobinos c os

bolcheviques era obvia , W. H. Chamberlin corretamente notou, no

meio da guerra civil russa, as sernelhancas entre 0 sucesso jacobi-

no em construir exercitos revolucionarios formidaveis a par tir de

conscritos, nas ruinas do antigo exercito real, e "0 igualrnente

esparuoso contrasre entre a rnultidao desamparada e desordcnada

que depos as armas e recusou-se a lutar em Brest-Litowsk e 0

Exercito Vermelho, resolute e eficaz, que expulsou os tchecos lo-

vacos do Volga e os franceses da Ucrania"."

Contudo, 0 debate real sobre 0 bonapartisrno e 0 Termidor

estabeleceu-se depois da Revolucao de Outubro e ent re as var iastendencias do rnarxi smo sovie tico e nao-soviet ico, Pa radox a l-

mente. pode-se dizer que ta is deba tes prolongara rn a memoria

his t6rica e a inf luencia da Revolucao Francesa, que de outre modo

teria sido transferida para 0 museu da his toria passada na maior ia

dos pulses do mundo, com exceeao, e claro, da Franca. Pois, afi-

nal, 1917 tornou-se 0 prototipo da grande revolucao do seculo xx,

aque la com a qua l a pol fti ca do seculo fo i obrigada a se entender.

A escala ascendente e asrepercussoes intemaci onais da Revolucao

Russa tornaram pequenas aquelas de 1789, e nao havia precedente

para a sua inovacao maior, um regime revo lucionar io soc ial que

deliberadamente fo i alern da Iase dernocratica burguesa, manten-

do-se permanentemente e provando-se capa: de gerar outros. 0

jacobinismo do ano II, qualquer que tenha sido seu carater social ,

foi um episodic temporario. A Cornuna de Pari s em 1871. embo-

ra fosse cla rarnente um fen6meno opera rio, nao chegou a se r urn

regime e m al durou algumas s cmana s , Seu potencial para a trans-

formacao socialists ou pos-burguesa repousa inteirarnente no elo-

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qucnte obituario que Marx the dedicou, 0 qual se tornou um texto

tao importantc tanto para Lenin quanta para Mao. Ate 1917, nern

mesrno Lenin, como tambern a maioria dos marxistas, esperara ou

antecipara urna transicao direta e imediata para a "podcr proletario"

como uma conscquencia da queda do czarismo. Contudo, desdc

1917, e para grande parte do seculo xx, sao prcci samente os re-

gimes pos-capitalistas os esperados como conseqiiencias normais

de revolucocs, De fato. noTerceiro Mundo 1917 obscureceu 1789:

aquilo que manteve vivo 17R9 como urn ponto poli tico de refe-

rencia, dando-lhe uma sobrevida de segunda mao, foi seu papel

nos debates internes da propria Russia sovietica,

Termidor foi 0 terrno obvio usado para descrever qualquer

desenvolvimento que marcasse urn recuo dos revolucionarios de

posicoes radicais para moderadas, 0 qual os revolucionarios cornu-

mente (mas erradamente) identificavam como traicao da revolucao.

Os mencneviques, que se naviam recusado, desde 0 inicio. a apoiar

o projeto de Leni n, para transformar uma revol ur;ao burguesa em

u m a p ro le ra ria - com 0 argumento mui t o pouco razoavcl de que

a Russia nao cstava pronta para 0 socialismo - , estavarn prontos

para detectar 0 termidor desde 0 comcco: no caso de Martov, ja

em 1918, Naturalme nte, todos 0 recon hecerarn quando 0 regime

soviet ico iniciou a NEP (Nova Poli tica Economica) em 1921. e

saudaram esse termidor com variados graus de auto-satisfacao,

caso fossem entices doregime, e variados graus de aprecnsao, caso

Iossem bolcheviques (os quais associavam 0terrnidor com a con-

tra-revolucao )."('0 termo fo i prontamcnte usado contra aqueles que

propuseram a NCP como urn possivel caminho adiante e nao como

urn recuo temporario, tal como Bukharin 0fez. De 1925 em diante

passou a ser usado por Trostky e seus a li ados cont ra a maioria do

partido, significando uma acusacao geral de que a Revolucao esta-

va sendo traida, com isso amargando as ja tensas rclacoes entre os

grupos. Embora a flecha da "reacao termidoriana" fosse original-

mente dir igida contra a perspectiva de Bukharin sobre 0 descn-

volvirncnto socialista -e, portanto, errou 0 alvo uma vee que Sta-

lin entrou pcla via oposta da industriali zacao ultra-rapida e da

colctivizacao em J 928 - Trotsky voi tou ao griio de "termidor"

nos anos 30. quando reconhecidarnente seu julgamcmo polit ico

havia caido aos pedacos. De um modo au de outre, apalavra tcr-

midor p erm an cc eu c om o a a rrn a com a qual T r o ts ky a t ac a v a sell.';

oponentes - de forma suicida, poi s, em certos mO!l1entos Cl'U-

ciais, fe-Io olhar Bukharin, 0 sern-sorte na polnica, como urn peri-

go maior qu e Stalin. De f ar o, e rn b or a T ro ts ky n u nc a t en h a real-

mente desist ido da palavra, rnais tarde chegou per to de adrniti rque ele e seus aliados haviam ficado obcecados pcla analogia com

1794.-"

A analogia termidoriana gerou, para citar Isaac Deutscher,

"calor e paixao indescriuvcis em todas as Iaccoes" na luta que

houve entre a rnorte de Lenin e 0 triunfo de Stalin." Deutscher,

que descrevcu essa atmosfera cxtraordinariamente bern em sua

biografia de Trotsky, tambem sugere uma explicacao plausivel para

as "paixoes nefas tas e violentas susci tadas por essa l ivresca lcrn-

branca hi storica"." Pois, tal qual a Revolucao Francesa entre 0

Termidor e0Brumario, a Russ ia sovietica, entre 1921 e 1928, esta-

va visivclmente vivcndo urn intervale. Ainda que a polftica de

t r ansformacao feita sobre as ba s e s da NE?, justificada em nome do

falecido Lenin. seja vista hoje como a legitimacao historic a das

pol ft icas reformistas de Gorbachcv , nos anos 20 era meramente

uma das opcoes polf ticas para osbolcheviques e, conforme sedeu,

uma opcao fal ida, Ninguem sabia 0que aconteceria, ou 0 que de-

veria acontecer, se os que fizeram a rcvolucao estive,sem em

posicao de controla-l a. Nas palavras de Deutscher: "Isso levou a

suas mentes 0 elernento incontrolavel de uma revolucao, do qual

eles estavam progressivamente - ainda que vagarnente -

c ie nt es "; y O U r efe ri r- rn e brevernente a iSSO . , I[ J

Embora, em ret rospectiva, a decada de 1920 pareca se r, aos

observadores soviet icos dos anos 80, uma breve era de esperance

e vida cultural diante da era de ferro de Stal in , aos velhos bolche-

viques do tempo era urn pesadelo a rnais, no qual as coi sas fami -

hares se tornaram est ranhas e arneacadoras: a esperanca de uma

economia sociali sta resul tara exatamente na velha Russia dos

mujiques, dos pequenos comerciantes e dos ourocratas, s o que sema aristocracia e a antiga burguesia; 0 Partido, aquele hando de ami-

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gos devotados a fazer a revolucao rnundial, aparecia como 0 sis-

tema de partido iinico do poder, obscure e irnpenet ravel mesmo

para aqueles que dele faziam parte , "0 bolchevique de 1917 difi -

cilmente se reconhecia no bolchevique de 1928", escreveu Chris -

tian Rakovsky.'

As lutas pelo futuro da Undo Soviet ica, e talvez tambern pelo

social ismo mundiaL foram feitas par pequenos grupos e taccoesde polit icos entre a indiferenca macica de urn campesinato igno-

rante c a terrfvel apat ia da classe operari a, em cujo nome os bol-

cneviques diziarn agir, Aqu i , para os conhecedores da Revolucao

Francesa, residia a comparacao mais obvia com 0 Terrnidor, De

acordo Com Rakovsky, 0 Terceiro Estado havia se dcsintegrado

assim que derrotara 0Antigo Regime." Abase social da Revolucao

encolheu, mesmo sob os jacobi nos, eo poder foi cxercido cada vez

p or m e no s p es so as . A fome e a miser ia do povo, no tempo da crise,

nao permitiam aos jacobinos confiar 0 destine da Revolucao ao

voto popular. 0govemo arbitrario e terrorista de Robespierre levou

o povo a inditercnca politic a, e foi iS50que perrnitiu aos termido-

rianos derrubar seu regime. Qualquer que fosse 0 resultado daslutas ernpreendidas por minuscules punhados de bolcheviques

sobre 0 corpo inerte das massas sovieticas - como Rakovsky

escreveu depois da vitori a de Stal in - ele nao teria sido influen-

ciado de baixo. De fato, Rakovsky amargamente c itou 0 Babeuf

do perfodo termidoriano: "Reeducar 0 povo no amor a liberdade e

mais diffcil do que conquistar a liberdade"."

Em ta l si tuacao, logicamente 0 estudioso da Revolucao

Francesa dever ia esperar um Bonapar te. De Iato. Trotsky ehegou

a ver, em certo memento, Sta lin eo stalinisrno desse modo. em-

bora inicia lrneme, uma vez mais, sua proximidade com 0 prece-

dentc frances tenha obscurecido seu julgamento e 0 tenha levado

a pensar que urn Dezoito Brurnar io literal fosse provavel, ou seja,

urn golpe armado contra Stal in." Contudo, de modo paradoxal, a

acusa9iio de bonapartismu Ioi principalmente usada pe los opo-

nentes de Trotsky como urn contragolpe natural contra as acusacoes

de termidor . Trotsky tinha s ido, afinal de contas, 0 arquiteto prin-

cipal e chele efetivo do Exercito Verrnelho e estava suficientemente

conscicntc, como sempre, do precedente frances para renunciar

como cornissa rio de guerra em 1925 para que pudesse se opor a sacusacoes de que nutria a rnbicoes bonapart istas.' A propria ini-

ciativa de Stalin nessas acus acoe s foi, provavelmente, negJigen-

ciavel, embora nao haja diivida de que ele as tenha acolhido e

usado. Nao ha evidencias nos regi s t ros e t rabalhos de Stal in que

mo s t re r n q u a lq u c r interesse especial na Revo l ucao Francesa. Suasreferencias historic as sao essencialmente as da hist6ria russa,

Assim, a luta da decada de 1920 na Uniao Sovietica fui (on-

duzida com acusacoes mutuas tiradas cia Revo l ucao Francesa.

Alias, i550 e uma advertencia contra a tendencia excessiva em bus-

ca r na historia uma repe ticao, Na medida em que eram mera troca

de insuitos, as acusacoes nuituas de termidor ou bonapart isrno

foram polit icamente irrelevantes. Na medida em que aqueles que

as fizeram l evaram a ser io as analogias com 1789-1799, elas t r e-

quenternente fizeram com que eles se enganassem. Comudo, essas

analogias indicam a extraordinaria profundidade da imersao dos

revolucionar ios russ os na his tor i a de s eu s p re de ce ss or es , N a o e

muito s igni fica t ive que um Trotsky, d e fe n de n do - se p e ra n te a Co-missao de Contra le em 1927, cit e uma tala de um obscure jacobi-

no (Brival) na Convencao Nacional no di a seguinte ao Termidor

- uma ocasiao que conteve a mais profe tica lernbranca da Revo-

lucao Francesa, ou seja. urn aviso da guilhotina que vit ia na deca-

da de 1930 . ." 0 que e r n a is e s p an t o so e que 0primeiro homern a

fazer publicamcme acomparacao entre a Russia p6s-Lenin e 0Ter-

midor nao fo i um intelectual, mas 0 secre tar io da organizacao do

par tido em Leningrado em 1925, um trabalhador autodidata, Peter

Zalu tsky. 07

No entanto, havia uma dist incao importante entre termidor e

bonapartismo como slogans. Todo mundo era contra ditadores mili-

tares . Se havia um princfpio fundamental entre os rnarxistas revo-lucionarios - e, sem duvida, a memoria de Napoleao contribufa

para isso - era a necessidade da suprernacia absoluta do partido

civil sobre 0militar , por mais que este fosse revolucionario. Essa

era a razao, afinal de contas, para a instituicao dos comissa rios

politicos. No melhor dos cases, pode-se argumentar que Bonaparte

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de fato nao train a Revolucao mas tornou-a irreversivel, ao te-la

institucionalizado em seu regime. Havia cornunistas heterodoxos

- M. N. Roy era urn deles - que perguntavam: "E daf se a re-

volucao proletaria de nossos dias vai tcr seu napoleonismo? Pode

s er u rn e st ag io necessaria"." N o entanto, estes s en ti m en to s e ra rn

apolo geticos.

Por outro lado, termidor pode ser visto nao como mera traicaoa revolucao ou ur n modo d e t er m in a- la , m a s como um a guinada

de uma crise a cur to prazo para uma transforrnacao a longo prazo:

tanto recuo de uma posicao insustentavel quanta avanco para uma

estratcgia mais viavel. Annal de contas, aspessoas que derrubaram

Robespierre no Nove Termidor original nao eram contra-revolu-

cionarios , mas seus proprios colegas da Convencao Nacional e da

Comissao de Salvacao Publica. Na histor ia da Revolucao Russa,

existe um momento obviamente s eme l han t e , quando os bolchevi-

ques foram forcados a fazer algo muito parecido, embora sem sa-

c ri fi car nenhum .de seus !fderes. 0 implacavel "comunismo de

guerra" pelo qual 0 governo sovietico conseguiu os recursos para

sobreviver a guerra civil de 1918-1920 correspondeu a s analogaspoliticas de emergencia do esforco de guerra jacobino, at e mesmo

no faro de que havia, em ambos as casas, entusiastas revolucio-

narios que viam a austeridade torcada do perfodo como uma pri-

meira instalacao de sua utopia, fosse ela def inida como a regra de

uma Virtude igual i t a r i a e espar tana , fosse de a lgum out ro modo

rnais marxista Em ambos os casos, a vit6ria fez dos regimes de

crise algo politicamente intoleravel e, de fato, desnecessario, Sob

a pressao da revolta dos trabalhadores e carnponeses, a Nova Politi-

ca Econornica teve de ser inst ituida em 1921. Era ccr tamente urn

recuo da R e vo lu c ao , p o re m um r ec uo i ne vit av el . C o nt ud o, e ss as

medidas n ao poderiam ser vistas como uma mudanca planejada-

ou transformadas em mudanca planejada- que apontassc para urnmodo de desenvolvimento necessariamente menos drastico, mas,

a longo prazo, mais firmemente ancorado? As proprius opinioes

de Lenin niio foram firmes ou cons is tentes , embora ele tenha pro-

gress ivamente jogado seu peso - sempre 0 realista politico supre-

mo - a favor de uma pohtica pos-revolucionaria de reforrna e

gradualismo. 0 que cle realmente pensava e aSSunto de 'nui lo

debate, e~pecialmente em seus ultirnos dois anos de vida, J.lando

sua condicao cada VC7. ruais 0 impedia de escrever e, ao f inal , a ternesmo de falar.:" No entanto, 0 hornem que escreveu: "0 que enovo no presente memento, para nossa revolucao, e a necessidadcde nos refugiarmos em urn metodo de aqao ' reformisia' . gradua-

lista, cautelosamente desviante, nas questoes fundamentals da cons-trucao eco~omi:a" nao e algucm que est ivesse pensando em urn

drama SUhltO.6" E igualmente ccrto que Lenin nao tinha a in tencao

de abandonar a cons trucao de uma sociedade socialista, mesmo se

em seu ultimo artigo publicado tenha escrito: "Falta-nos civiliza-

~ao suf iciente para permitir que passemos direto ao social ismo,

embora de ta ro te nh am o s o s requisitos politicos para tanto"."] Ate

o fim de seus dias, elc cstava confiante em que 0 socialismo no

mundo em algum momento triunfaria,

Nao surpreende, portanto, que na atmosfera da Uniao Sovieti-

ea de Gorbachev, Lenin obtivesse 0 credito de ter t ido uma visao

m a is p os iti va d o Termidor do que a usual; at e mesmo enunc i ou - s e

a ideia de que um dos maiores problemas da Revolucao foi comoassegurar sua propria "autotermidorizacao".« Na ausencia de qual-

quer documentacao, pode-se expressar ceticismo. A conotacao da

palavra termidor no bolchevisrno de entao e no comunismo inter-

nacional era tao forte e unilormemente negativa que seria supreen-

dente encontrar Lenin usando 0 termo, embora i sso talvez nao

tivesse sido mais surpreendente que cncontra- lo pedindo aos bol-

cheviques que fossem reformistas. Contudo, ainda que de nao 0

tenha fei to , a refcrencia a "autoterrnidorizacao" na Moscou de

1988-1%9 e urna evidencia da forca e persistencia da Revolucao

F r ance s a como u rn ponto de referenda para sua g r an d e s u c es s o ra ,

Alern do T e rr ni do r e de Bonaparte, dos jacobinos e do Terror,

a Revolucao Francesa suger ia mais cornparacoes gener icas com aR e vo lu c ao R u ss a , Uma das primeiras coisas observadas sobre ela

foi que parecia nao tanto urn conjunto de decisocs planejadas e

acocs controladas par seres humanos, mas urn fenomeno natural

que nao se submetia aocontrole humano, escapando de seu ambito.

Em nosso seculo, acosturnamo-nos a outros fenomenos que tern

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essa caracterfst ica: as duas guerras mundiais , por exemplo, 0 que

rcalmente acontece em tais casos, como eles se desenvolvem, qual

e seu resultado, tudo isso nao tem, praticamente, nada que ver com

as intencoes daqueles que tomaram as dec isoes inic iai s. Esses

acontecimentos te rn sua propria dinarnica, sua propria logica

irnprevisfvel. Na decada de 1790. os conrra-revolucionarios foram

provavelmente os primeiros a charnar a atencao para essa incon-

trolabiLidade do processo revolucionario, uma vez que isto lhes

fomecia os argumentos contra aqueles que apoiavam a Revolucao,

No entanto, os proprios revolucionarios tambem fizeram a mesrna

observacao, cornparando a Revolucao a um cataclisrna natural. "A

lava da revolucao corre majestat icarnente, nada poupando", es-

creveu 0 jacobino alernao Georg Forster em Paris , em outubro de

1793. A rcvolucao, dizia , "quebrou todos os diques, venceu todas

as barreiras erigidas por muitos dos melhores intelectuais, aqui e

em outros lugares [ .. .1 cujos sistemas prcscreviam seus lirnites", A

revolucao era s irnplesrnente "a Revolucao, urn tenomeno natural

raro demais para conhecermos suas leis peculiares"." E claro que

a metafora de um fen6meno natural percorr ia ambos os caminhos .Se suger ia uma catastrofe aos conservadores, era uma catas trofe

inevitavel e que nao se podia deter . Conforme os conservadores

intel igentes logo entenderam, era algo que nao podia ser s imples-

mente suprimido, mas sim canalizado e dornesticado.

Repetidamente encontramos a metafora da natureza aplicada

as revolucoes, Nao creio que Lenin sequer soubesse das imirneras

passagens sernelhantes sabre a Revolucao Francesa quando

escreveu, logo ap6s outubro, sobre a situacao antes da queda do

czarismo: "Estavamos conscientes de que ()velho poder sentava-

se no topo de urn vulcao, Muitos s inais nos diziarn que grandes

processes estavam sc dando nas profundezas da mente das pes-

soas. Sentfamos que 0 ar estava carregado de eletr icidade, Esta-vamos seguros de que inevitavelmente explodiria em urn tempo-

ral puri ficador", 6+ Qual outra metafora que nao a erupcao vulcanica

ou a furacao viria tao espontaneamente a mente')

No entanto, para os revolucionarios, e especialrnente para urn

revolucionario tao implacavelmcnte rcal ista como Lenin, as con-

sequencias da incontrolabilidade como que natural dos (~nomenos

cram priit icas. De fato, Lenin era 0 oposto de urn blanqu.sta uu do

hornern que tcntasse faze r a revolucao como ato de von lade. pOT

meio de um golpe ou de urn putsch, ernbora tenha sido por isso

que seus opositores 0criti cavam. Estava no polo oposto de urn

Fidel Castro ou Che Guevara. Repctidamente, e sobrcrudo durante

e depois de 1917, clc insistiu que as "revolucoes nao podem ser

fei tas, nao podem ser ganhas por panes. A revolucao nao pode ser

feita por encomenda: ela se desenvolve"." Ou entao: "A revolucao

nao pode ser previ st a nem profe tizada: vern por si mesma . Sera

que alguern sabia, mesmo uma semana antes da revolucao de

fevere iro, que ela estava a ponto de irrornper?"." Ou a inda: "Ne-

nhuma sequencia pode ser estabelecida para as revolucoes"."

Quando alguns bolcheviques se prepararam para apostar no apare-

cimento da revolucao na Europa ocidental , na qual tarnbem Lenin

punha suas esperancas, ele rcpetiu, mais de urna vez, que "nao

sabemos, e ndo poderemos saber, nada dessas coisas. Ninguem csta

em posicao de saber" se haver ia algum atraso, quando a revolucao

varreria0

Ocidente, se ela au os bolcheviques ser iam derrotadospela reacao, ou 0que aconteceria." 0partido tinha de cstar prepara-

do para todas as contingencias e ajustar suas estrategias e tat icas

para as circunstfincias que apareciam.

Contudo, nan naveria aJgum risco de os revolucionarios , ao

navegarem os mares revol to s e as eorrentes da historia , se vercm

carregados nao apenas para direcoes nao desejadas e incer tas, mas

tambem parafora de seu objetivo original? E apenas nesse sentidoque podcmos falar naquilo que Furet ehama de derapage, que nao

pode ser vista como um desvio do curse do veiculo, mas sim como

a descober ta de que 0 chao da terra historica e tal que, dada a si tua-~ao, 0 lugar e as condicoes sob as quais ocorre uma revolucao, nem

mesmo 0 melhor condutor pode leva- la na direcao desejada, Poisessa, afinal, foi uma das Iicoes da Revolucao Francesa. Ninguern,

em 1789, pretendeu a ditadura jacobina, 0 Terror, 0 Tennidor ou

Napoleao. Ninguem, dos mais modcrados reformistas aos mais radi-

cais agitadores, ter ia recebido bern, em 1789. qualquer urn desses

acontecimentos, exceto, talvez, 0 sombrio Marat, que - nao obs-

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tante a maravilhosa pintura de David - nao foi universalmente

pranteado entre seus colegas revolucionarios, Lenin - em seu

proprio cornpromisso de tomar qualquer decisao que garantisse a

sobrevivencia da Revolucao, mcsmo que desagradavel ; em sua

recusa em deixar que a ideologia per tu rbasse 0modo de fazer aqui-

10que deveria ser fe ito - nao teria corrido 0 risco de ter transfer-

mado a Revolucao em alguma outra coisa?

Como vimos, esse receio deve ter rondado obscuramente ns

b olch ev iq ue s d ep ois da mor r e de Lenin. E urn d os s in ai s de sua

grandeza 0 faro de que 0 proprio Lenin e st av a f ra n ca m en te incli-

nado a enfren tar essa possibil idade quando the fo i suger ida por

Sukhanov em suas mcmor ias, que sao urn va liosfssimo re la ta de

testemunhos diretos da Revolucao, E significative que, ao enfren-

ta-la , Len in mais urn vez tenha cafdo no perfodo da Revolucao

Francesa. Ele citou a fumosa maxima de Napoleao: "Primeiro entre

na batalha, depois veja 0 que deve ser fei to" ["On s'engage et puis

on voir" ]. Entramos na batalha, di tou0moribundo Lenin em 1923.

Bern, descobrimos que lfnhamos de fazer coisas que odiamos fazcr

e que gosta ria rnos de nao te r f eir o - a paz em Brest-Litowsk, 0

recuo a Nova Pohtica Economica c "assirn por diante"." Naopodemos real mente culpa -lo por se recusar a cntra r em detalhes

desse "assim por diante" , ou por ins is ti r que tais desvios e recuos

eram "detalhes do desenvolvimento (do ponto de vis ta da his t6ria

mundial eles eram cer tamente detalhes)"." Nao se poder ia esperar

que Lenin deixasse de expressar sua fe na Revolucao e em suas

perspectivas a longo prazo - rnesm o que sa ib am os q ua o grandes

ele considerava as dif icu ldades , quao remotes as perspectivas de

avanco, quao estreitas as "limitacoes camponesas" que confinavam

o regime.

M as a f e de Lenin no futuro da R evo lu cao R ussa tambem

r ep ou sa va na hisror ia : a his to r i ada R e vo l u ca o Franccsa. Poi s. como

vimos, a principa l li cao que os obse rvadores do scculo XI X delaretirararn e que nao havia s ido um acontccimento, mas lim proces-

so. Cornpreender 0 que Lenin e muitos marxistas olharam como 0

resultado logico, "class ico" , de uma revolucao burguesa, ou scja,

uma republica dernocratica e parlamentar, levou quase urn seculo.

l7!\9 Iao Ioi a Revolucao Francesa, nem 1791ou 1793-1794, nem

o Diretorio. nem Napoleao. nern a Restauracao, nem 1S30, 1848.

nem 0Segundo Imperio. Todas essas foram Iases do processo com-

plexo e contraditor io de criar a base permanera de uma sociedade

burguesa na F ra nc a, P or que Lenin na o pensa ria, em 1923 , que a

Revolucao Russa poderia ser tambern urn processo historico longo.

com seus diffccis recuos e ziguezagues?

E impossivel dizer como os obscrvadorcs soviet icos olham

para esse processo hoje , depoi s de se tema anos. A babel de vozes

discordantes que agora tern urna chance de surgir de dentro do pais,

pela primcira vel desde a Revolucao Russa, na o pode a in da ser

analisada his toricamente em seus componentes. Uma coisa, no

en tanto, e dam. A ana logia com a Revo lucao Francesa ainda csta

viva. Dada a his t6ria da Uniao Sovietica, dif icilmente se poder ia

csperar outra coisa. A his toria da propr ia Revolucao Francesa esta

sendo recons iderada , f. bastante cer to que Robespierrc sera ur n

heroi bern mcnos positivo, na his toriografia sovietica, do que ele

foi no passado. Mas no biccntcnario da Revolucao Francesa, houve

outra comparacao que i mp re ss io no u o s i nt cl ec tu ai s da Russia de

Gorbachev, quando 0 primeiro Congresso dos Deputados do Povo

genuinamente eleito foi aberto. Foi 0 chamado dos Estados-Gerais

e sua transformacao em uma Assernbleia Nacional que cornecou a

reformar os domfnios da F ranca . Essa analogia nao e ma i s realista

do que outras tentativas de vcr 0 padrao de urn acontecimento his-

to rico em outro. Tambern permitc dife rentes le ituras e enfases,

dependendo da posicao polit ica corrente daqueles que as fazem,

Nao precisamos concordar com a versao de urn reformador de-

mocratico que, na metade de 1989, depois de ver que seu lado

politico tinha sido bern votado no Congresso deMoscou, escreveu:

"Hoje, quando os acontecimentos franceses de dois seculos atras

estao em nossas men tes - e Gorbachcv afi rmou que a perestroi -ka e uma revolucao - gosta ria de relembra r que 0 Terceiro Esta-

do tambem constituiu urn terce des deputados , mas foi aquele terce

que se tomou a aurentica Assernbleia Nacional" ." No entanto, nao

poder ia haver tributo maior para 0 sentido politico da Revolucao

de 1789 que 0 fato de que cla ainda possa prover um modelo e

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ponte de referencia para aqueles que desejam transfonnar 0 sis-

tema sovietico, Em 1989. pennanece 1789 - ou novamente se

torna mais re levante do que 1917, a te mesmo no pai s da Grande

Revolucao de Outubro.

3

DE UM CENTENARIO A OUTRO

\

o primeiru capitulo deste livro analisou 0 que a burguesia li-

beral do seculo XI X fez da Revolucao Francesa. 0 segundo seguiu

aquelcs que terneram ou fizeram, au esperararn fazer uma re-

volucao que os levou para alem dos jacobinos e, por tanto, ass imi-

lou a experiencia de 1789 e dos anos seguintes. Poi s - nao se pode

deixar de repe tir sempre - tanto 0 liberalisrno quanta a revolucao

sQ9ill, tanto a burguesia quanto, poiencialmcnte, 0 proletariado,

tanto a democracia (em qualquer de suas versoes) quanto a ditadu-

r .a encontram seusancestrai sna extraordi naria decada que comecoucom a convocacao dos Estados-Gera is, a Tomada da Basti lha e a

Declaracao dos Direitos do Homem e do Cidudtio.

Com excecao dos conservadores, todos podiam lembrar-se de

algumas de suas par tes au interpretar sua his toria de uma maneira

adequada a sua causa. A polft ica francesa, sabemos, continuava a

scr fei ta como urn drama de costumes ves tido de barretes fngios.

Os liberais rnoderados podiam ser reconhecidos porque seu hcroi

foi Mirabeau ou os gi rondinos, sobre quem urn poli tico e poe ta

romantico farnoso, mas insipido, Alphonse Lamartine ( 1790-1869),

pubJicou uma historia em varies volumes nas vesperas da Re-

volucao de 1848 para desencorajar os excessos do jacobinismo.

Quando a Revolucao estourou, Lamart ine fez o melhor que pode

para evi ta r as radica is de esquerda e , depoi s. para anula -los, Os

republicanos do centro, seguindo Michelet e Auguste Comte, csco-

lheram Danton como seu heroi, Os republicanos de esquerda e

insurrectos pincaram Marat au, progressivamente, Robespierre

como scu tipo, exceto para os rnais apaixonados ateis ras, que nao

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podium engolir sua defesa do Ser Supremo. Foi sugerido que: a

idcntif icacao das grandes f iguras da Revolucao com as pos icoes

polnicas posteriores, amargarncnte conflitivas, tornou impossfvel

para a Franca desenvolver urn culto aos pais fundadores, como foi

o caso dos Estados Unidos. Ate onde conheco, nenhum deles sequer

apareceu cm selos postais.'

Em contrapar tida, essas diferencas nao f o rum s ig n if ic a ti v aspara os bolcheviques russos, desde que as figuras fossem sufi-

cicnternente revolucionarias, Eles nem teriam de ser antecessores do

socialismo, Quando os bolcheviques tomaram 0 poder na Russia,

Lenin achou importante educar urna populacao amplamente analfa-

beta em pol it ica e por tanto propos. ern 1918 , que monumentos a

varias pessoas dignas da Revolucao deveri am ser erguidos em

lugares visiveis das cidades, cspccialmente naqueles onde soldados

pudessem ve-los, acompanhados de uma placa biografica. Natural-

men t e , des inclutram os socia l i s t as e c o rn u ni st as - Marx, Engels,

Lassal le - , radicais russos e osprecursores - Radishtchev, Herzen,

Perovskaya -, libertadores para todos as fins, como Gar ibaldi, e

poetas prngressistas , Entre as f iguras da Revolucao Francesa queeram extremamente proeminentes, encontramos Robcspierre e Dan-

ton, ambosnao socialistas, mas- ate onde pude descobr ir - Babeuf

n a o I ig u ra v a . Para os objetivos de Lenin, revolucionarios vi tor iosos ,

por mais efemcros que tivessem sido, eram claramente mais impor-

tantes do que suas pos icoes ideologicas . Parece que essa comemo-

racao dos revolucionarios franceses como ancestrais da Revolucao

de Outubro durou pouco. Muitos desses monumentos desaparece-

ram dcsde entao, pois, por causa do tempo curto , os art is tas foram

autorizados a produzir suas estatuas em terracota e gesso ate que tra-

balhos mais permanentes, de b ronze ou marrnore, pudessem ser

criados , No entanto, urn relevo de Robespierre fei to em 1920 ainda

cxiste, sugerindo 0 que Ioi perdido, fei to pe lo criador dos monu-

mentos de Robespierre, Danton e Herzen em Leningrado. ' A prop6-

sito, a Revolucao Francesa nao pareee ter uma presenca irnportante

na iconografia posterior ou na toponfmia da Russia sovietica.

Em resumo, rodos tiveram a sua Revolucao Francesu, e 0 que

foi nela celebrado, condenado ou rejei tado dcpendeu nao da polft i-

ca ou da ideologia de 1789. mas do tempo e lugar dos pr6prios

cornenta rista s. Essa re tracao da Revolucao atraves de pr isrnus

politicos contemporancos e 0 assunto deste capitulo. Isso e muitoevidente, como verernos. nos debates e conflitos que acontecerarn

no b icentenario revoluc ionario de 1989, ou mesmo no primei ro

centenario, celebrado em 1889.

Nao ha a menor di ivida de que °primeiro centenario foi uma

ocasiao polftica superior, nacional e internacionalmcnte. Os embai-

~ad~res da Rli~sia. Iralia, Au"ria-Hungr~a, ~lcm~nha e Gra-Bre-

ta nh a - ou seJd, de todos <IS gtmde~; potencras alem da F ranca -

recusararn-se incisivamente a comparecer a s celebracoes do aniver-sario do encontro dos Estados-Gerais (a data escolhida para marcar

o c om e co d a R ev olu ca o Francesa), embora, como mostrou acida-

mente Le Temps. seus predecessores houvessem comparecida ao

primeiro aniversar io da Tornada da Basti lha, em 1790. 0 Times, de

Londres, nao teve duvidas de que eles estavam corretos. " Infeliz-

mente", pensava, "a Revolucao que comecou sob tao brilhantes aus -

pfcios, ao invcs de fazer reformas, terrninou no reino do terror, da

confiscacao e da proscricao e decapitou 0 rei e a rainha." Portanto,

embora outras nacoes "que, gradualmente, adotaram as reformas

introduzidas pela Revolucao" nao estivessern realmente se rccusan-

do a celebrar 0 centenario, pais diplomatas rnenores nao foram lem-

b ra d os , d if ic il m en tc s c p o de ri a esperar que a presen~a do s embaixa-

dores , na condicao de representantes pcssoais de seus monarcas,

expressasse sua aprovacao aos jacobinos.' Alern disso, a Republica

Francesa pretendera celebrar o centenario de seu acontecimcnto fun-

dador nao apenas com l ima au duas cerimonias, mas tambem com

aentao habitual exposicao intcmacional - mas uma exposicao espe-

cial, pois seu monumento principal, a reccm-construfda torre Eiffel,

e ainda a (mica construcao da Franca mat s conhecida intemacional-

mente. Mesmo assirn, houve pressoes pesadas sobre os tranceses e,como 0Times mai s uma vez no t i ci ou , com aprovacao, "sob a i n f luen -

ci a do bom senso publico, nacional e e s t range i ro [ou seja , a amcaca

de boicote 1 gradualmeme a Exposicao abandonou sua conexao inti-

ma com a Revolucao Francesa", de modo que sua inauguracao

deixou de ser pane oficial da celebracao ccntenaria. '

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podiam engolir sua de fe sa do Ser Supremo. Fui sugerido que a

identif icacao das grandes f iguras da Revolucao com as pos icoes

pohticas posteriores, amargamente conflitivas, tomou irnpossivel

para a Franca desenvolver urn culto aos pais fundadorcs, como foi

()easo dos Estados Unidos, Ate ondc conheco, nenhum deles sequer

apareceu em selos postais.

Em contrapar tida, essas diferencas nao foram significativaspara os bolcheviques russos, desde que as figuras fossem sufi-

cicntemente r e vo l u ci o ru i ri a s. E l es n cm teriam de s e r an t e ce s so r e s do

socialismo. Quando os bolcheviques tomaram 0 poder na Russia,

Lenin achou importante cducar uma populacao amplamente analfa-

beta em polit ica e por tanto propos. em 1918, que monumentos a

varias pessuas dignas da Revolucao deveriam ser erguidos em

lugares visfveis das cidades, especialmente naqueles onde soldados

pudessem ve-los, acompanhados de uma placa biografica Natural-

mente, eles inclufram as socialistas e comunistas - Marx, Engels,

Lassalle -. radicai s.russos e os precursores - Radishtchev, Herzen.

Perovskaya -, libert adores para todos us fins, como Gariba ldi , e

poetas progress istas , Entre as f iguras da Revolucao Franccsa queeram extremamente proerninentes, encontramos Robespierre c Dan-

ton, ambos nao social is tas, mas - ate onde pude deseobrir - Babeuf

nao figurava, Para os objetivos de Lenin, revolucionarios vitoriosos,

por mais efemeros que tivessem sido, eram claramente mais impor-

tantes do que suas pos icoes ideoiogicas . Pareee que essa comemo-

racao dos revolucionarios franceses como ancestrais da Revolucao

de Outubro durou pouco. Muitos desses monumentos desaparece-

ram desde entao, pois, por causa do tempo curto , os art is tas foram

autorizados a produzir suas estatuas em terracota e gesso ate que tra-

balhos mais permancntes, de bronze ou marmore , pudessem ser

criados. No entanto, urn relevo de Robespierre fei to em 1920 ainda

existe, sugerindo 0 que foi pe rdido, fe ito pe lo criador dos rnonu-

mentos de Robespierre, Danton e Herzen em Leningrado. ' A prop6-

sito, a Revolucao Francesa nao parece ter uma presenca importante

na iconografia posterior ou na toponfmia da Russia sovietica,

Em resume, todos t iveram a sua Revolucao Francesa, e 0 que

foi nela celebrado, condenado ou rejei tado dcpendeu nao da polit i-

ca ou da ideologia de 1789, mas do tempo c lugar dos proprios

comenta rista s. Essa re fracao da Revolucao a traves de pri smas

politicos conternporfineos e 0 assunto deste capitulo. Is50 C muito

evidente, como verernos, nos debates e conflitos que aconteceram

no bicen tenario revolucionario de 1989, ou mesmo no pr imeiro

centenario, celebrado em 1889.

Nao hi a menor duvida de que 0 primeiro ccntenario foi uma

o c a si a o p o li ti ca superior, nacional e i nt er na ci on a lm e n te . O s e rn b ai -xadores da Russia. I talia, Ausli \a-Hungria, Alemanha e Gra-Bre-

tanh a - ou sep, de todos as grandes potencias alem da Franca -

recusaram-se incisivamente a cornparecer a s celebracoes do aniver-sario do eneontro dos Estados-Gerais (a data esco1hida para marcar

o comeco da Revolucao Francesa) , ernbora, como mostrou acida-

mente Le Temps, seus predecessores houvessem comparecida ao

primeiro aniversario da Tomada da Bastilha, em 1790.0 Times, de

Londres, nao rcvc duvidas de que eles estavarn corretos, " Infeliz-

mente", p e ns a va , " a R e vo lu c ao que comecou sob ta o hrilhantes aus-

pfcios, au inves de fazer reformas, terrninou no reino do terror, da

confiscacao e da proscricao e decapitou 0 rei e a rainha." Por tanto,

embora outras nacoes "que, gradualmente. adutaram as reformas

introduzidas peia Revolucao" nao estivessem realmente !ierecusan-

do a celebrar 0centenario, pois diplomatas menores nao foram Iem-

brados, dificilrnente se poderia esperar que a presenca dos ernbaixa-

dores , na condicao de representantes pcssoais de seus monarcas,

expressasse sua aprovacao aos jacobinos.' Alem disso, a Republica

Francesa pretendera celebrar 0 centenario de seu acontccimento fun-

dador nao apenas com uma ouduas cerim6n ias, mas tambcm com

a entao habitual exposicao intemacional- mas urna exposicao espe-

ciaL pois seu rnonumento principal, a reccm-construtda torre Eiffel,

e ainda a unica construcao da Franca mais conhecida internacional-

mente. Mesmo assim, houve pressoes pesadas sobre os franceses e,

como 0 Times mais uma vel noticiou, com aprovacao, "sob ainfluen-

cia do born sensu publico, nacional e estrangeiro [ou seja, a ameaca

de boicote] gradualmente a Exposicao abandonou sua conexao inti-

ma com a Revolucao Francesa", de modo que sua inauguracao

deixou de ser parte oficial da celebracao centenaria. '

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Naturalrnente houve pafscs oos quais 0 centenario foi urn

acontecimento menos controverso, como par cxernplo os Estados

Unidos, que decorararn as estatuas de Nova York para a celebracao

centenaria da Queda da Basti lha. ' Uma republica nascida pela re-

volucao, e ligada COIll a Revolucao Francesa arraves de Lafayette

e Tom Paine , nao achava a simples ocorrenc ia de urna revolucao

tao diflcil de engolir. Nao obstante, 0 jovem Woodrow Wilson, ja

com ares de homem de Estado - mais tarde, presidente -, entao

ens inando his toria em Bryn Mawr, via 0jacobinismo como urn dos

piores exernplos para ser colocado aos olhos de qualquer urn, espe-

cialmente latino-americano. Contudo, fora do hemisferio ociden-

tal , as monarquias eram ainda a forma de governo quase universal

e, ao menos par essa razao, aqueles que governavarn Estados eram

extremamente suscetiveis com relacao a celebrar urn regicidio.

Nao obstante, 0 tema mais controver tido levantado pelo cen-

tcna rio nao foi a monarquia, mas a democrac ia . A discussao era

sobre isso, e nao sobre terror, ou proscricao (ou seja, a perseguicao

de diss identes) , oem mesmo sobre 0 maior pesadclo da sociedade

burguesa do seculo XIX: 0 confisco da propriedade privada.Af-ranca

havia f inal mente escolhido ser uma republica e uma democracia na

decada de 1870. Seus governantes haviarn escolhido deliberada-

mente autodef inir -se como herdeiros da Revolucao, fazendo do 14

de julho 0 seu dianacional c cscolhcndo a Marsei l lai se como 0 hino

nacional; e , apesar de cer ta relutancia em rclcmbrar Robcspierre,

cujo nome, a te hoje, e dado a poucas ruas do pai s, a Republ ica nao

exc1uiu a heranca j acobina. Chegou ate a eleger para a presidencia,

ern 1887, urn homem que levava um dos grandes nomes jacobinos

- 0 neto de Lazare Carnal, que havia sido 0Trotsky dos exercitos

revolucionarios - ernbora, e claro, 0feito jacobino de ter ganhado

suprernacia mil itar para a Franca era 0 aspecto menos controverso

daquele regime. Sobre isso, a esquerda e a direi ta podiam conver-gir, 0que expJica que entre as f iguras proerninentes do ann II colo-

cadas formalmente no Pantheon em 1SS9, no aniversario da

abolicao do feudalismo, estivessern tres homens da guerra, Carnot,

Roche e Marceau.' Ainda que 0 centenario oficial tenha evitado

cuidadosarnenre relembrar as datas mais controversas depois da

Proclarnacao da Republica em 21 de setembro de 1792. prefcrindo

se concent rar nos tres primei ros meses da Revolucao de 1789 -

como fez tarnbem 0 segundo cenrenario -, nao negou nenhuma de

suas datas. 0 t inico ato his toriografico da Republica em 1889 foi 0

de votar fundos para uma edicao nacional dajacobina Historic da

Revoluciio Francese de Michelet, A municipalidade de Paris, entao

mais radical , foi alem: erigiu urna estatua para Danton, que ainda

fica perto da estacao de metro Odeon, no terreno da casa onde 0

propr io Danton foi preso em 1794.

o jacobinismo foi a par te mais toeante da Revolucao France-

sa c, em 1889, ° jacobinismo significava democracia. Pois, em-

bora os socialistas e outros revolucionarios cer tamente lutassem

pelo socialisrno, e embora a Segunda Internacional tenha sido real-

mente fundada em Paris em 1889 - -plenamente consciente do sig-

nificado da data e do Iu ga r - 0 socia lismo nao era a inda uma

grande forca pol ftica na primei ra metade de 1889, exce to na Ale-

manha. Logo se tornaria essa forca polit ic a, mas so depois do cen-

tenar io . A democracia e que preocupava os analistas.

Pois hi uma grande diferenca entre 0 primeiro e 0 segundo

centenaries. Exceto pela dernocracia, ninguern, dos l iberais ate a

esquerda, via a Revolucao de outro modo a nao se r como urn nota-

vel acontecimento his torico, cujas maiores realizacoes eram jul-

gadas positivamente, no todo. "Os principios da Revolucao France-

sa", escreveu urn autor na Contemporary Review, "tomaram-se

uma propriedade comum no mundo civilizado." Que ele tenha

esc rito, ao lembra r a Revolucao Gloriosa de 1688, "envol tos em

forma historica, eles e ram ingleses mui to antes de se tornarem

franceses", prova sirnplesmente que ele osaprovav a.' A Revo lucao,

pensava 0 his toriador l iberal carolico Lord Acton, que a ens inava

em Cambridge na decada de 1890, tinha dado "urn irnenso passo

adiante na march a da humanidade, algo que the devemos a te hojepor alguns dos beneffcios politicos que gozamos". ' Anatole Leroy-

Beaulieu, urn preocupado e intel igente l iberal , invcntou urn ban-

quete centenario no qual varies est range iros cxpressavam suas

op ini6es cri ticas gera is sobre a Revolucao Francesa, mas 0 sur-

prccndente a respeito deles foi 0 quanto da Revolucao eles acci-

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,~,

 

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tavam.: 0 convidudo americana natural mente argumeutava que, se

alguern havia inventado a libe rdade , tinha sido seu povo c nao a

Franca. 0 convidado inglcs, que era - supunha-se - urn baronete

liberal unionisia de uma familia whig, argumentava a mesrna coisa.

o alcmao congratulava-se por seu pals nao ter t ido uma revolueao

e ter vencido a guerra camponesa do seculo XV! que poderia ter-se

tornado uma revolucao, mas ad rnit ia que a Revolucao Francesa

havia acelcrado 0 desenvolvimento nacional germanicn. E sc elat inha sido tao universalmcnte saudada pelas grandes cabecas da

Alemanha , e ra porque essas cabecas ja estavam i rnbutdas dos

princfpios que, eles pensavam, vi ram a Franca por em acao, 0 it a-

liano aclamava a Revolucao Francesa por su a contr ibuicao ao

Risorgimento e a reconstituicao das nacionalidades modernas, mas

e c lare que achava tanto seus bons quanto os maus elementos japre sen te s na tradicao ita liana. 0 grego o bviam en te refe riu -se 11

tradicao classics passada, mas tambem reudeu tribute 11Revolucao

por ter cont ribu tdo para a revivescencia de seu pa ls. E assirn por

diante. Em resume. as cnticas dos convidados dc Leroy-Beaulieu

_ e e la s n atu ra lm cn te n ao sao apen as ponadoras o a propria opi n i a odo autor - revel am a aceiracao e a aceitabil idade geral , pelo menos

no Ocidentc, dos principios da Revolucao Francesa.

Aqueles que achavam que a Rcvolucao Francesa tinha sido

urn desastre - "a tremenda catastrofe de 1789 seguida por cern

anos de revolucao", como a Edinburgh Review a chamou - assim

pensavam por causa do elemento popular que nela foi identif ica-

do corn 0 jacobinisrno. 'u Mas erubora houvesse referencias obr i-

gatorias ao Terror, 0 inimigo real efa "0 princfpio de que a von-

tade popula r esta sobre todas as pessoas c todas as inst i tuicoes

superiores", como disse Henry Reeve, uma velho amigo Ingles de

Guizot, de Thiers e de Tocqueville, quando comentou 0 livro

apaixonadamente anti-rcvolucionario de Hippolyte Taine, Origins

of contemporary France, que tinha aparecido havia pOUCO.11Pois,

pensava Henry Reeve, se tal princfpio fos se accito "haveria um fim

nao apenas daquilo que e chamado de limires constitucionais, mas

ta rnbern das p roprius bases da sociedade civil e das leis funda-

mentais da moralidade"." De fato, como dissc 0I11ro resenhista do

livro de Taine, a sua licao politica central era 0 descredito nos

principios de mo cra tico s de governo." Embor a a s vezcs se su po -

nha que a palavra anarquia que aparece prontamente na boca dos

e sc rit or es a ntija co bi no s s c rcfira a b an ho s de s angue e ausenci a de

leis, de faro eles t inham em mente algo menos dramtit ico, A Edin-

burgh Review falava de urn descenso graduaL nos ul timos cern

anos, "para um a condicao de anarquia que ameaca a propria

existencia da nacao" na Franca . " E clare que isso nao queria dizcrque Paris - s cm m c n ci on a r a Borgonha - t iv es se s e aproxima-

do, em 1889, da situacao do South Br onx em 19S9, mesmo se 0

auror pensava, sem dar evidencias, que 0 anticlericalismo do gover-

no s ig ni fi ca va " ur n grande relaxarnento da moral e u rn au men to

unico do crime"," 0 que de quis dizer . como outros que s impa t i -

zavam com essa- ;"'0s i\oes, ere que um secuio de revolucao havia

dado 11 Franca "sufragio universal sern intel igencia" , para citar

Goldwin Smith. que, portanto, via a Revolucao como "a maior

catastrofe que ca iu sobre a raca hurnana"." 0 sufragio unive r s a l ,

para citar novamente a Edinburgh Review, "tinha gradualmente

solapado a autoridade das classes esclarccidas", De modode sn ec essa rio , po is - como Smith e screveu - "0 que a r n ai o ri a

de nos queremos nao e votar [.. .1 mas sim um govcrno for te, esta-

vel, esc lar ecido e responsave l"." A Revo lucao Francesa - aqui a

referencia e Burke - havia rompido drast icamente com a tradicao

e, por tanto. ret irado todas as garantias contra a anarquia."

~ nota de hister ia nesses ataques pode no s parecer exagerada,

especialmente na medida em que ate antijacobinos duros nao ne -

g~vam que a Revolucao tinha fei to algum bem para a Franca - e

nlSSO eles se diferenciavam des antijacobinos de 1989. Havia

"~umentado tremendamentc a r iqueza mater ial da Franca" . ,"Ha-

via dado a Franca um corpo solido de carnponeses proprietaries,

semprc considerados, no seculo XIX, como urn elernento de esta-bilidade polftica." Quando analisamos COl detalhe estes textos anti-

revolucionarios, descobrirnos que 0 pior que podem dizer e que aFranca, desde a Revo lucao, tornou-se pol it icamente instavel -

nenhurn regime havia durado mais do que vinte i.!1l0S, treze cons-

t ituicoes hav iam se sucedido em um seculo, e assim por diante.'

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Para sc r franco, no centenar io a Republica es tava no meio de um a

crise ser i a : 0 movimento polftico do general Boulanger , que n ao

podia deixar de evocar outros militares que puseram urn fim a

republicas instaveis. Contudo, seja Ja 0 que se pensasse sobre a

polftica francesa nas decadas de 1880 e 1890, seria urn absurdo

falar desse pais em termos apocalipricos em 1889. Era, reco-

nhecidamente, 0 mesmo pais que, vinte anos depois - quando

Boulanger , Panama e Dreyfus ainda estavarn frescos na memoria

-,0 Spectator, resenhando outre livro sobre a Revolucao France-

sa, podia descrever como "0mais saudavel , estavel e tambem mais

civilizado dos paises conrinentais"."

o que fazia surgir tais terrores e paixoes na o era 0 estado no

qual se achava a Franca depois de urn seculo de revolucao, mas

saber que a pol ftica dernocra t ica e tudo 0 que implicava es tava

agora se espa lhando em todos os pai ses burgueses, e que "0 voto

universal sem i nt el ig e nc ia ", c e do au tarde, cstaria chegando. Foi

iS50que Goldwin Smith quis dizer quando declarou: ' ·0 jacobi-

nismo e agora u m a d oe nca tao estabelecida quan t o a v ar fo la , A

infeccao corneca a a travessar a Cana l"." Foi nesse perfodo que a

dernocracia eleitoral em bases amplas tornou-se, pela prirneira vez,

parte integral da polft ica ate mesmo daqueJes pafscs que costu-

mamos considerar como os mais tradicionalmente democraticos;

au seja, quando a especie de constitucionalismo liberal que os bur-

gu e s es l ib e r ai s, como Guizot, tinham institufdo precisarnente como

uma barreira a dernocracia - excluindo do dire i to de voto, em

principio, os pobres e os ignorantes (se rn falar das mulheres) -

deixou de ser sustentavel. 0 que nao e tao amplamente conhecido

e a enorme preocupacao das classes dorn inan tes com as irnpl i-

cacoes da democracia eleitoral . Elas olharam os Estados Unidos,

como Tocqueville havia feito, mas, diferentcmente de Tocqueville,

viram antes de rna i s nada 0 melhor Congresso e as rnelhores

preteituras que 0 dinheiro podia comprar: f raudes , pilhagens , de-

magogia e maquinas poli ticas - e tambem, no perfodo da pertu r-

bada decada de 1880, descontentamento social e agitacao, Elas

olharam para a F ra nc a e v ir am , sob a longa sombra de Robespierre,

corrupcao, instabilidade, demagogos, embora sem rnaquinas polfti-

88

cas. Em resurno, elas viram a cri se dos Esrados e das po lit icas a te

entao conhecidas. Nao admira que 0 centenario da Revolucao

Francesa as enchesse de mau agouro.

No entanlo, se deixarrnos de lade os reacionar ios genuinos.

como a Igreja Catoli ca do SHabo de 1864 e do Primei ro Concflio

do Vaticano , que re je itou tudo do pobre seculo XIX, a Revolucao

F r ance s a , em g er al , n ao gerou re je icoes tao his ter icas quanto as

que mcncionei . Pelo rnenos no mundo anglo-saxao, mesmo aque-

les que s impatizavam com 0 antijacobinismo de Taine geralmente

concordavam que seu livro Origins of contemporary France pas-

sara dos l im i te s, O s resenhistas levantaram q u e s to e s s e n sf v e is , Par

que Taine nao viu que, em 1789, poderia nao ter sido obvio para

os franceses, como agora, que uma mudanca para ins ti tu icoes l ibe-

rais ser ia possivel sem uma revolucao fundamental?" Pur que ele

nao viu que a chavc para a situacao era que nem mesmo as mode-

rados podiam confiar norei? Se todos cram tao devotados a monar-

quia , por que a Franca , que nao era uma republ ica em 1788, nunca

se tornou monarquista novamente?" Taine nao reconheceu 0 dilc-

rna de cada part ido na medida em que chegaram ao poder: "Con-

fianca no apoio da mult idao de Pari s signi ficava conivenc ia com

o ultraje c os crimes que tornavam impossfvel estabelecer as insl i-

tu icoes livres n a F r an c a. R e pr es sa o a mu l ti d ao p a ri si e ns e signifi-

cava re aca o e, muito p ro va ve lm e nt e, a r es ta ur ac ao do despo-

tismo"." De fa to, com todo a respei to a Taine como inte lectual de

peso, seu trabalho fo i considerado muito mais propagandistico do

que cienufico, A amargura do conservador , pensava 0 Spectator,

esparramava-se pelo livro. A ele, "falta desinteresse cientifico.

largueza de visao e discernimento", escreveu The Nation. Intelec-

tuais franccscs eminentes foram normal mente recebidos no estran-

geiro com mais respcito do que Taine."

Vamos agora do primeiro ccntenario para a experienc ia dosegundo. A primeira coisa a notar sobre 0 intcrvalo entre os secu-

los e que sahemos incomparave lmente rnais sobre a hi stori a da

Revolucao l -rancesa do que sab iamos em 1889. Uma das consc-

q u en cia s p ri nc ip al s, n ao do primciro centenario, mas da adocao,

pela Terceira Republica, da Revolucao Francesa como scu acon-

. _ . t :

 

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tccimento Iundador fo i que a historiografia foi em frente. Ern 1880.

a Franca ganhou nao apcnas urn museu da Revolucao - 0 Mu~~u

Carnava lct . de Paris -- mas tambem, na Sorbonne, urna m,atena

dedicada a sua histo ria. em 1885, e uma catedra , em 1891. E pos-

s ivcl atestar a grande novidade que isso represcntava pelo. ~.ato~e

que seu prirneiro ocupante, que se tornou a primeira corponhc~~ao

academica da Revolucao Francesa, nao era nern mesmo urn his to-

riador por formacao. Alphonse Aulard (1849-1928), urn estudioso

de literatura c um especialista no grande poeta romflntico Leopar-

di, tornou-se um histor iador da Revolucao Francesa porque era urn

republicano convicto, . . _

Assim, te rnos que lembrar que , em 1889, a hlsLonograha

academica estava ainda em sua infancia. Acton, que conhecia a l i-

teratura hisroriografica internacional melhor que muitos, relacio-

nou apenas tres homens que descreveu como "histo riadores m~-

demos" em suas conferencias de 1895: Sybel , Taine e Sorel : e dOIS

destes esc reviam sobre tudo sobre os aspectos intemacionai s da

Revolucao Francesa." Mas logo 1SS0 mudou. Por volt a de 1914, os

sucessores de Aulard na catedra da Sorbonne ja erarn adultos c, de

fato ate 0 fim da decada de 1950 a hi st6ria da Revolucao France-

sa pertnaneceu dominada pela longeva geracao que chegou a

maturidade por vol ta de 1900: Mathiez e Lefebvre nasceram. em

1874, Sagnac, em 1861).e Caron, em 1875. (0 pr~prio Aul~rd tinha

nascido em 1849.) Com excecao de Georges Lefebvre, exilado em

escolas provinciais de segundo grau, a nova ger~~ao ja tinha. pu-

blicado bastante e estava ja estabelecida - e Lefebvre . que tinha

apenas uma monograf ia local como credito , ja t inha vir tualrnente

completado a pesqu isa que gcrou sua grande tese sobre as cam-

poneses do departamento do Nord e a Rcvolucao Francesa , que

ser ia puhlicada em J 924. .

Ao cont rario do que agora f reqli entemenle se diz , nenhumdesses his toriadores era um marxis ta . (De faro, ncm mesmo os rus-

sos que iniciararn ° estudo da questao agrar ia na Franca d~ra~:e a

periodo, estimulando Lefebvre, eram marxistas:.1. y. Lutchltskl~-

11145-1918- eN. I. Kareiev - It1S0-J 93J-toram, ambos, libe-

rais, embora 0 ult imo tenha tido, originalmente, l igacoes popu-

90

li stas.) Mathiez a legava ser um sociali sta, mas 0 consenso gerul

en tre seus contemponineos indicava que e le era basicamente um

homem de 1793." Lefebvre. urn socialisra do Norte industrial. esta-

va mais profundamente imbufdo das ideias do movimento operario

e certamente irnpressionado com a concepcao rnaterialista da

histor ia de Marx, mas seu mestre verdadeiro era Jaures, que havia

adotado algumas das ideias de Marx - rnuito poucas. e com-

preendidas de modo erroneo, poder iarn dizer os marxis tas de set!

tempo - COIll uma grande par te de Michelet. Os his ioriadores da

Revolucao Francesa eram republicanos democraticos e apaixona-

dos, na versao jacobina, e isso autornaticamente os empurrou para

uma posicao a esquerda do espectro polftico. Pois nao era 0 proprio

A . i lard, urn hornem longe do extremismo, que julgava que a Rc-

volucao Francesa conduzia logicamentc ao socialismo, embora ape-

nas uma minoria de franceses pudcsse compreende-la assim?" Nao

e nada claro 0que ele, ou a maioria dos que politicamente chama vam

a si mesmos de socialistas na Franca, por volta de 1900, entendiarn

pela palavra , mas ela er a inquestionavelmenre uma insfgnia que

assina lava a posicao de alguem do lado do prog resso , do povo c da

esquerda. E c di ffci i que tenha sido par acaso que tantos dos quef izeram a his toriografia class ica da Revolucao Francesa tenham

vindo daquele templo da Republica, scm inimigos na esquerda, a

fona leza dos dreyfusa rds. a fcole Normale Superieure da rua

d'Ulm: 0 proprio Aulard, Agnac , Mathiez , Jean Jaures - emhora

tarnbern, deve-se dizcr, Taine, de uma geracao anterior.

Lancernos um breve olhar, e necessariamente impressionista,

quanti ta tivo, na hi storiog rafia da Revolucao Franccsa desde 0

primeiro centenario." Em uma estirnativa aproximada. o Museu

Brit anico (a Biblio teca Bri tanica) agregou mais de 150 t itulos a

cada c inco anos ent re 181)I e 1900. mais de 250 ent re 1901 e 1905,

rnai s de 3.10 entre 1906 e 1910 e urn maximo de todos os tempos- ate 0 prescntc - de aproximadamente 450 t itu los entre 1911-

1915. \' 0 primeiro pes-guerra manteve lim nfvel f ixo de ISOa 170

titulos a cada cinco anos. mas a segunda metade do.decada de 1930

- a cpoca da F rcntc Popular - ass ist iu it urn notave I crescirnento

de 225 ti rulos, que nao se refl etiu nas resenhas do Times Literary

91

i.

 

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Supplement, ao contrario do estouro pre-1914. Depois de um

corneco modesto na segunda era p6s-guerra, as decadas de 1960 e

1970 registraram um agudo arranque: aproximadamente trezentos

t f tulos na segunda metade da decada de 1960. Isso refletiu-se clara-

mente no Times Literary Supplement na decada de 1970. Podemos

ter cer teza de que a decada de 1980 regis trara, provavelmente, um

estouro maior do que aquele anterior a 1914 - algo que acorn-

panha naturalmente 0segundo centenario e os meios rnodernos decomunicacao e de publicidade editorial.

Contudu, embora a quantidade possa indicar 0mvel geral de

interesse na Revolucao Francesa, em si mesma con t a -nos pouco

sobre sua natureza. Aqui pode ser util urn rapido olhar no lado

biografico dessa literatura. Antes da Primeira Guerra Mundial, ela

e dorninada pelos t raba lhos sobre a fami lia rea l francesa - Maria

Antonieta e c or np an h ia - que e n ch i am c o lu n a s de bibliografia e.

d e ve rn o s s u po r , a pe la vam sobretudo ao s leitores conscrvadores e

contra-revolucionar ios, Desde a Primeira Guerra M und i a l , esse

ramo da histor iograf ia revolucionaria murchou e hoje e ins ignifi-

cante, Por outro lado, os estudos sabre as personalidades revo-

lucionarias individuais ou sobre os lfderes e suas obras foram

escritos por autores com diversas at i tudes politic as e varies nfveis

de ser iedade, e iam desde obras para cntre tenimento de salao ate

erudicao pesada. Isso faz com que as var iacoes no interesse em fi-

guras especif icas sejam instrutivas. Assim, a mais moderada das

f iguras principais, Mirabeau, teve seu apice antes de 1914, caindo

acentuadamente depois. Exceto por urn rapido momento na deca-

da de 1960 e novamente na de 19S0, e le nao despertou interesse

desde a Segunda Guerra Mundial - ainda que fosse de s e e sp e-

rar que urn homem que era n a o a pe na s uma das f iguras principais

da Revolucao Francesa, mas tambern urn econornista destacado,

alern de pom6grafo, atraisse autores." 0 centrista Danton, menos

eminente , teve seu pico na decada de 1920, com alguma acao nas

decadas de 1900 c 1930e- como ja vimos - por volta do primeiro

centenario. Robespierre nan foi par ticulannente not6r io ate 1900

- ele estava mais ou menos nu mesrno nivel de Marat, como re-

presentante do jacobinismo radical ate 0meio da decada de 1900 ,

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mas, desde entao, atraiu rnais atencao do que qualquer outra f igu-

ra - embora pane di sso nao fosse tanto biogra fica, mas antes uma

ref lexao sobre sc u papel na Republica Jacobina. Contudo , 0 pcrio-

do em que esteve mais em evidencia foi, talvez scm surpresas, a

segunda metade da decada de 1930 - a epoca da Frente Popular

- e as decadas de 1960 e 1970. Na extrema esquerda Marat tem

sido cad a vez rnais suhstitufdo como porta-bandeira por Saint-Just.

embora pareca que urn certo interesse neste se tenha mantido desdeas dias da Revolucao de Outubro na Uniao Sovietica." Afora a

edicao de Vellay, de 1908 , dos escri tos de Saint-Just , a Bibl iotcca

Britanica nada registra dele au sabre ele antes da Primeira Guer-

ra Mundial (contra ooze tftulos sobre Murat), 0 interesse se torna

vislvel, na decada de 1930 - embora nao mais refletido ade-

q u ad ar ne n te n a Biblioteca B ri ta ni ca - mas a lc an c ou a pe n a s urn

modesto pico nas dccadas de 1970 e 1980, como seria de esperar

de um a f igura que, ao contrar io de Marat, atrai fundamentalmente

in te lcctuai s , Na extrema esquerda Babeuf, 0 primeiro comunista,

inexiste antes da Primeira Guerra Mundial , aparecendo apenas na

decada de 1930. Seu perfodo de pro jecao maxima e nas decadasde 1960 (que celebrou 0 bicentenar io de s e u n a s c imcn t o ) e de 1970.o que isso sugere e que 0maximo do interesse cspecif ico daesquer-

da na h i s t o r iog r a f ia da Revolucao Francesa e e n co n tr ad o n a dec a-

da de 1930 e novamente nas de 1960 e 1970. Em ambos os cases,

t emos a combinacao de urn forte part ido comunista com uma ra -

dicalizacao mais geral. E contra isso que devemos s ituar a reacaoque, depois de 1940, era rnais polit ica do que his toriografica (0

livro de Georges Lefebvre, Quatre-vingt-neuj; foi conf iscado pOT

Vichy como subversive), mas que hoje e tao pol it ica quanta his-

tor iograf ica."

Exarninemos rapidarnente a producao historiografica impor-

tante. Aqui podemos distinguir cinco perfodos. Durante todos eles,

com excecao do ul timo e a tua l pcrtodo, a historiografia de ponta

sobrc ° assunto foi apaixonadamente republicana e jacobina. Os

anti- revolucionar ios nao possuiam reconhecimento acadernico

importante, embora t ivessern urn born punhado de lei tores. Ape-

nas urn desses autores tem possibi lidade de ser candidate a reabi-

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litacao , Auguste Coch in (1876-1916 ), ur n defensor de Taine con-

tra 0 ataque de Aulard, 0 qua! tem sido assumido por Francois Furet

(que nao e um normalieni . A versao classica, pohtica e institucio-

nal dos radicals da Terceira Republica e dos radicais socialistas

coincide com a epoca de Aulard. Como ja se sugeriu, as fundacoes

da historiograiia moderna erudita foram feitas no periodo entre a

d ec ada de 1 880 e a Prirneira Guerra Mundial. Depois da Primeira

Guerra Mundial, 0campo historiog raf ico, n a Franca, moveu- se

para a e squerda e se tornou nitidamente socialista - Aulard entrou

em declfnio bem antes de sua morte. em 1928 - ernbora nova-

mente os historiadores socialistas e comunistas Iranceses se man-

tivessem fieis ao jacobinismo, especialmente a Robespierre, e niio

aos pr6prios ancestrais de seu movimeuto; nem mesmo foram fieis

ao Lenin de 1917, 0 qual, de todos os revolucionarios , prezava

sobretudo Danton como "0 maior rnestre das tat icas revolu-

cionarias que conhecernos"." A decada de 1920 foi dominada por

Mathiez, que, alias, enfatizou suas conviccocs socialistas reedi-

lando a His toire socialiste de la Revolution Francoise, de Jaures,

que originalmente havia sido editada como uma obra polftica e naoacademica. Embora Mathiez nao tenha conseguido a catcdra, ele

dominava a Societe des Etudes Robespierristes e, atraves dela, 0

campo de estudos, A versi io de Mathiez tornou-se uma das mais

~nt1uentes. Foi rapidamente assumida nos Estados Unidos, onde 0

mteresse pela nistoria da Revolucao Francesa, talvez por causa da

tradi~ao republican a, estava bern estabelecido nas un iversidades

- Harvard chegou a comprar a b iblioteca de Aulard - c sua sin-

tese da historia revolucionaria logo foi t r aduzida e uma versao

resumida dela Io i indufda, no corneco da decada de 1930, na Enci-

clopedia de ciencias socials de Seligman, onde ainda pode ser

prove i tosa rnente consu l tada ,

Nao vou me deter na amarga hosulidade de Mathiez a Dan-ton, que 0 distinguia de Aulard mesrno antes da Primeira Guerra

Mundial, uma vez que e princ ipahnente uma polernica de interesse

local frances; em todo caso, pode-se suspeitar que ela reflctisse os

sentimentos edipicos de Mathiez pelo fundador do campo, 0 qual

cle nao conseguiu suceder na catedr a da Sorbonne,

Aulard foi succdido nessa catedra por Philippe Sagnac, urna

figura central na historiografia positivista francesa, mas que nao

imprimiu um perfil espec ial a sua pos icao , Contudo, Mathiez de

facto sucedeu Aulard c foi succdido por Georges Lefebvre (1874-

1959) que , e rn J 932, tomou seu lugar como 0catedrat ico da Societe

des Etudes Robespierristes e diretor dos Annates Historiques de

la Revolution Francoise de Mathiez, que havia muito tin h am subs-

tituido a cn fraquecida revisia de Aulard, La Revolution Francoise,

como 0 orgao da historiografia revolucionaria, Lefebvre, que dorni-

nava na dec ada de 1930 - e, de fato, durante todo 0 periodo de

sua vida -, tinha tido um corneco muito lento, talvez porque Ihe

faltasse 0 supor te de uma ins ti tu icao de origem. Exilado nas esco-

las ~~undarias do Norte - dizern que ele foi a unica pcssoa que

apoiou Dreyfus em Boulogne-sur-mer -, Lefebvre nao conseguiu

sequer se concentrar na Revolucao Francesa, pois seu superior na

provinciana Lille induziu-o a traduzir um trabalho-padrao, 0 livro

de Stubbs Constitutional history of England, em tres volumes, ao

qual agrcgou urn complemento na decada de 1920. Essa excursao

implausivcl na hist6ria da lnglaterra medieval, tornada mais im-

plaus tvel ainda pelo fato de que 0autor original d e s se c la s si co vito-

riano foi ur n bispo, teve 0 proveito rnenor de fazer os his toriadores

inglescs aprecia-lo mais rapidamcnte do que os arnericanos. A

tinica Vel em sua vida em que deixou a Franca foi para fazer uma

visita academica a Ingla ter ra , em 1934. E bern poss ivel que Lefeb-

vre tenha pass ado algumas noites na Gra-Bretanha an tes de, aos

60 anos, passar urna noite em Paris. Depois da publicacao do seu

grande e seminal trabalho sobre 0 campes inato , e le foi habili tado

para ocupar uma catedra un iversitaria: primeiro em Clermont-Fer-

rand - na epoca, a Siberia academica da Franca - dcpois em

Estrasburgo, inusitadamerne aberta ao talento apos seu retorno a

Franca depois da guerra e a base de onde Marc Bloch e Lucien

Febvre desleriram seu ataque contra a ortodoxia historica nos

Annales e se prepararam para capturar Paris. Lefebvre tambern

chegou a Paris em 1935 , Iinalrnente mudando-se para a canonica

catedra de historia da Revolucao Francesa dcpois da apo sentado-

ria de Sagnac, em 1937.

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Por mais lento que seu corneco tenha sido, Lefebvre reeu-

perou 0 tempo perdido. A decada de 1930 foi dominada por um

mimero de volumes classicos fei tos por eIe: Th e g rear [ea r of 1789

e de 1932, que e ponto de partida para a hoje chamada "histori a

vinda de baixo" (urn termo cunhado pOTLefebvre) ; a magnifica

hi storia de Europa na era napoleonica (1935), superior a urn vo-

lume precederue sobre a Revo luci lo Franccsa , na mesma serie,

escri to apenas parcialmente por ele (mas depois revisado) ; a con-

tinuacao dos t res volumes de Mathiez sonre a era do Termidor -

Lefebvre nao pubJicou 0 volume final. sobre 0Diretorio, ate 1946:

e acima de tudo. 0mais marcante monumento que alguemjamais

ergueu no centesimo quinquagesimo aniversar io da Revolucao

Francesa, em 1939, urn pequeno livre chamado Quatre-vingt-neuf

[Oitenta e nove], em frances, mas fami lia r a todos na traducao de

R. R. Pa lmer de 1947, com 0titulo de The coming of the French

Revolution. Foi 0 t ributo prestado pela Frente Popular Francesa,

no mornento do seu declfnio, a Revolucao Prancesa, quando nao

poder ia mais cornernora- la adequadamentc. Esse l ivro e, essen-

cialmente, aquilo que a his toriografia revisionis ta modern a esta

atacando, mas nao sem respeita- lo . Pois Lefebvre, concordernos

ou nao com ele, foi urn grande histuriador. Na minha opiniao, e

mesmo na de seus adversaries, Lefebvre foi, de longe, 0 mais

importante historiador moderno da Revolucao Francesa, Politica-

mente, era urn socialists no tempo em que escreveu suas rnaiores

obras ; depois da guerra, foi um simpatizante dos comunistas .

Duas outras obscrvacoes his toriograficas podem ser fei tas

sobrc a decada de 1930. Primeiro, cssa hi storiogra fia pareee tao

completamente dominada por Lefebvre sobretudo porquc outr?

graode histor iador da Revolucao Francesa e, ou tornou-se, mars

conhecido comohistoriador economico ou social: Ernest Labrous-

se (1895-1988) , que morreu nonagenar io . Labrousse foi outro dosintelectuais comprometidos com a esquerda que se dedicaram it

his toria, ernbora fosse mais ativista em polit ica do que a maior ia

deles. Apos urn breve perfodo no Partido Comunista no comeco

dos anos 20 seguindo 0Congresso de Tours, quando a maior ia dos

social is tas se afastou, ele juntou-se novarnente ao Par tido Socia-

l is ta e tornou-se por algum tempo chefe degabinete de Leon Blum.

Seu traba lho maior sobre a Revo lucao Francesa foi urn alent ado

estudo da crise econornica do Ancien Regime, na segunda rnetade

da decada de 1780 . Expl icou a origem da Revolucao em terrnos

de uma coinc idenc ia de duas cri ses, a econornica e a poli ti ca, no

ve lho sistema, e depois cscreveu um trabalho ("Como nascem as

revolucoes"), ' no qual tentava general izar esse modelo um pouco

mecanico para 1830 e 1848. Por sua biografia e mentalidade.

Labrousse pertence a Terceira Republica e a sua tradicao, mas, ao

contrar io de outros histor iadores, considerava-se urn marxis ta ,

embora 0fosse de u rn modo antigo , detennini st a econornico ou

kautskista. Braudel a considerava 0 unico grande historiador

franc\~ alem dele mesmo e lamentava - au fingia lamentar -

que a nistoria francesa sofresse porque ele e Labrousse nao se

davam bern, A ou tra observacao a fazer sobre a decada de 1930 eque nela foi desencadeado 0 estudo rnoderno de his toria revolu-

cionaria nos Estados Unidos (onde 0 campo ja estava estabeleci-

do) c na Gra-Bretanha. Ambos sao, ou tomaram-se, os principais

centros nao-franceses para essa pesquisa,

o perfodo do pos-guerra, ate a metade dos anos 60, foi domi-

nado por Lefebvre - que morreu em 1959 - e seus discipulos,

que, a essa altura, estavarn muito mais proxirnos do Partido Cornu-

nista, embora seu sucessor (apos urn intervale preenchido por Mar-

cel Reinhard, 1889-1973), Alber t Soboul (1914-1982) , fosse exa-

tamente uma figura tao tipica da tradicao rcpublicana quanto

qualquer urn de seus predecessores: ha obituaries maravilhosos

tanto de Lefebvre quando de Sobou Ifeitos par Richard Cobb, aluno

de urn e amigo de outro, nao obstante ser tao afastado do marxis-

rno quanta possivel; contudo, Cobb era um his toriador Iascinado

pelas pessoas anonimas da base da historia e, portanto, aproximou-

scdos t inicos his toriadores que f izeram a his t6ria do povo eomumna Revolucao, Lefebvre e seus seguidores comunistas , Deve-se

notar , de passagem, que 0 brilhante grupo de jovens historiadores

que abandonou 0 Partido Comunista na metade dos anos 50, de -

pois de uma fase de rtgido stalinismo - 0rnais erninente deles,

Emmanuel le Roy Ladurie, ja descreveu seu desenvolvimento po-

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l it ico -educacionai -;" mostrou muito poueo inter esse na Rcvo-

lucao Francesa, sendo bem mais atrafdo pela escola dos .AnI~ales;

no entanto , dois ex-comunista s, Francoi s Furet e Denis Richet ,

inaugura ram a onda revisionista na Franca, Desde a morte pre-

matura de Albert Soboul, em 1982, a catedra da Sorbonne vern

sendo ocupada por Michel Vovell e (nascido em 1933): o~~o ex-

cornunista, cuja pesquisa original estava no campo da his toria c~l-

tura l ou hist6ria das "mental idades", a qua l exerceu uma a tracao

forte e benefica sobre muitos historiadores talentosos de esqucrda

nas decadas de 1960 e 1970.

Contudo , desde a guerra nao foi mais possivel pensa r a hi s-

toriografia da Revolucao Francesa como fundamentalmen.te fran-

eesa. Os propr ios discipulos de Lefebvre eram urn grupo mterna-

cional, e 0 mimero de Ph. D. no assunto subiu verti calmente na

Gra-Bretanha das decadas de 1950 e 1960. Nao houve teses ames

de 1910 e dai em diante houve seis par dec ada ate 1950 - de fato,

nove nadecada de 1930 - mas, a pa rtir de entao, dezoito na deca-

da de 1950 e vintena de 60 ..9

Agora examinemos brevemente 0 significado dessas fa.ses de

mterpretacao da Revolucao Francesa. Na Franca, elas ref letlra~ a

historia da Terceira Republica enquanto 0 regime durou - ou seja,

ate 1940. lsso s ignifica que a formacao da principal escola de his -

toriadores revolucionarios franceses reflete a institucionalizacao

da Terceira Republica como urna democracia que se refer ia a Re-volucao Francesa como sua experiencia fundante . Sugi ro que a

grande explosao da historiografi a revolucionaria na decada de 1900

reflita 0 triunfo das muitas crises de infancia por que passou -

que culminou com 0Caso Dreyfus, urn triunfo ratifica~o ~ela sep~-

r acao da Igre ja do Estado e pe la emergencia dos soc ia list as radi-

cais como par tido central da Republica. Eles nao eram, como todos

sabemos nem radicais nem social is tas, mas s im profundamente

comprometidos com a Republica e portanto com a Revolucao

Francesa, e muitos dos seus politicos de destaque, no perfodo entre

guerras, c ram series hi stori adores prat icantes do perfodo revo-

lucionario, notadamente 0 intelectual gas tronomo, e redondo,

Edouard Herriot (1872-1957) - tambern urn normalien. Herriol

publicou um volume de conferencias chamado Homenagem a Re-

voluciio no ana de seu centesimo quinquagesimo aniversar io , nao

obstante 0 fa to de 0 Terror jacobino ter fei to 0 melhor que pode

para arrasar sua cidade de origem e sua base politica, a grande

cidade de Lyon, por causa de sua atividade contra-revolucionaria,

(Herr iot escreveu tambem uma histor ia do episodio. )." 0 triunfo

da Republica sobre seus inimigos, como a Caso Dreyfus tinha

demonstrado, foi baseado em uma alianca do centro com a esquer-

da - ate mesmo com a extrema esquerda. 0 pr incfpio politico

basico da Terceira Republica era, entao: "Nan ha inimigos a esquer-da" e, por tanto, nenhuma rejeicao ao legado da Republica Jacobi-

na. Embora nem Robespierre nem Saint -Just , para nao fa la r em

Marat, despertassem entusiasmo fora da extrema esquerda, mesmo

os moderados apreciavam Danton, que tinha sido tanto umjacobi-

no como um oponen te de Robesp ierre e dos excessos do Terror.

Louis Bar thou, um polft ico moderado republicano que f icou rnais

conhecido por sua morte - foi assassinado junto com 0 rei Alexan-

dre da Iugos lavia em 1934por urn terrorista iugoslavo- , escreveu

as biografias de Mirabeau e Danton e tambern um livro sobre 0

Nove Tennidor, ou seja, sobre a queda de Robespierre. Essa e, eu

sugiro , a chave para a idea lizacao que Aulard faz de Danton.

Depois da dec ada de 1900, tern-se a impressao de que, por

urn momento, a Revo lucao Francesa tornou-se, para as repub li-

eanos de centro, um assunto da oratoria do 14 de julho mais do

que um assunto de urgencia ideologica importame. 0 centro de

gravidade da historiografia revolucionaria mudou-se para a esquer-

da : nao tanto em termos pol iti cos mas sim sociai s. Nao e insigni-ficante , em meu ponte de vi sta, que 0 grande trabalho do sucessor

de Aulard como principal representante da historia revolucionaria

fosse sobre 0 preco dos alimentos e it revolta social na era do Ter-

ror , embora Mathiez tenha publieado primeiro sobre hisuiria rel i-giosa; ou que 0 sucessor de Mathiez, Lefebvre, tcnha escri to sua

lese sobre 0 campesinato do Norte na Revolucao; ou que a obra

magna de seu sucessor Soboul lidasse com os sans-culottes de Paris

- ou seja, com as ativistas de base popular. (Alias, nenhum des-

ses his toriadores idealizou seus ternas: Mathiez e Soboul I icaram

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firmes ao lado de Robespierre contra seus opositores da esquerda,

e Lefebvre analisou seus camponeses sem ilusoes, ou meihor, da

perspectiva dos jacobinos urbanos.j" Mais gener icamente, a his-

t6r ia da Revolucao Francesa cada vez rnais mudou-se para urn re-

gistro social e economico, Ja mencionei Labrousse: mas, para ci-

tar outros exemplos da velha geracao de especialistas no campo,

Marcel Reinhard tinha sido urn dos primciros a ir a historiademografica do penodo revolucionar io , embora tambern ele - urn

pouco mais tarde - tenha publicado uma biografia-padrao do

organizador militar jacobino, Carnot." Jacques Godechot (nasci-

do em 1907), presidente da Societe des Etudes Robespierristes,

embora interessado principalmente em nistor ia ins tirucional em

geral, tarnbern foi atraido pela demografia. No irucio, esse inte-

resse certamente nao refletia 0 rnarxismo - a tradicao marxista na

Franca era desprezivel- mas a ascensao do movimento operar io

e socialista: se se quiser, a influencia de James. Entretanto, ajudou

a trazer a historiografi a revolucionaria para mais perto de urn

campo comum com os marxistas , que ate entao tinham sido a prin-

cipal escola interessada nas dimensoes econ6micas e sociais dahis toria. Na decada de 1930, essa convergencia foi reforcada por

urn acontecimento crucial: a ascensao do fascismo internacional,

que levou a maioria das outras escolas pohticas conservadoras,

direitistas, tradicionalistas e reacionarias em seu rastro.

Tal acontecimento foi crucial, porque 0 fascismo era a ex-

pressao da quintessencia daqueles que tinham rejeitado cornpleta-

mente, desde 0 corneco, a Revolucao Francesa, De fato, ate mea-

dos do seculo xx, a extrema direita poderia praticamente ser

definida por sua rejeicao da Revolucao, ou seja, nao apenas dos

jacobinos e de sua descendencia poli tica, mas tambern do libera-

l ismo, de toda a ideologia do I lurninismo do secuio XVl! ! e do pro-

gresso do seculo XIX, para nao falar da emancipacao dos judeus,que foi uma das majores e mais notaveis facanhas da Revolucao

Francesa, Nao havia duvidas sobre a pos icao da direita f rancesa:

queria reverter a Revolucao Francesa, mesmo se sua maioria nao

acreditasse realmente na restauracao da monarquia dos Bourbon,

o que pediam os militantes mais ativos da Action Francoise. A

unica vez em que a direi ta f rancesa realmente derrubou a Repubh

~a, e~l ~9~0-19~, manteve a rnonarquia longe - ernbora Sua

inf luencia ideologica nos homens de Vichy fosse muito visfvel _

estab~I~~endo meramente urn "Estado Frances" indefinido e

autontano. Nao ?avia dtividas sabre a posicao da Igreja Cat61ica

no tempo do Vatlcan.o L Nao esperava abolir 1789 por toda par te

- embora 0 ten.hafeito na Espanha de Franco, dos franco-ma96ni-cos.e tU?~ 0 mars - mas bern que ten a gostado. E, sobretudo, nao

havia dtividas sobre a posicao do fascismo, Mussolini a disse, pes-

soa~lllente, em seu artigosohre 0 fascismo em sua Enciclopedia

It~flana. Ele lutava "contra a positivismo marer iausra e fraco do

seculo ~IX [ ... J contra todas as abs traq6es individualis ras do tipo

das,~~ seculo XV I II [ ' : j e con~a todas as utopias e inova~6es jacobi-

nas. A mesma corsa era ainda mats obviamente verdadeira na

Ale~anha, onde a i.deo!ogia nacional havia muito tempo suspeita,

va nao.apenas do liberalismo ocidental mas dos franceses, vis tas

c?~~ i rnorais, nacionalistas e. pur assim dizer, inimigos here-ditarios da Alernanha,

Assim, inevitavelmente todos os antifaiicistas, na decada de1930: tenderarn a .c~rrar fileiras em torno da Revolucao Francesa,

o maior alvo dos 101Inigos. Devc-se dizer que essa campanha em

torno da memoria da Revolw;ao Francesa foi ideo[ogicamente 0

que .aFrente Popular foi polit icamente: a uniao de todos os anti-

fascis tas, Na? foi por acaso que os s indicatos franceses, depois de

1936, financlaram Jean Renoir para fazer urn fi lme sobre a Mar-

seillaise, ou, como eu mesmo lembro, uma producao teatral elabo-

rada da obra muito macante de Romain Rolland, Quatorze Juillet,

representada em Paris no verao de 1936. Mas havia ainda outra

ra~ao .pela qual a Frente Popular desenvolvia urn culto pela Mar-

seillaise, pela bandeira tricolor e pelos jacobinos de 1793-1794,

Eles haviarn sido os franceses patriotas eriginais, as salvadores daFranca ?U~~guerra .de defesa nacional - e ideokigica _ contra

?s. r~aC1onanos locals que foram ao estTangeiro aliar-se com osimrrugos do pais.

Par razoes que nao precisam nos ocupar aqui, nas ultimas duas

decadas no seculo XIX 0 vocabulario do nacionalislllO e patriotismo

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f rances passou da esquerda para a direi ta ." A esquerda p.roletar i~

e soc ia lista _ novamente po r razoes que nao posso ana li sa r aqu i

_ reagiu, durante esse periodo, it coopracao da Marseillaise, da

bandeira tricolor e do resto pela Tercei ra Repub lica oficial, abando-

nando 0 lado patri6t ico e guerreiro da rradicao jacobina. Tornou-

se assoc iada a antimi !ita rismo e mesmo a pac ifismo. Principal -

rnante sob intluencia comunista, essa esquerda agora voltava-se

novamente para os stmbolos do patriot ismo nacional, c6nscia do

fato de que a Marseillaise e as tres cores jacobinas eram tambem

sfmbolos da revolucao social radical . 0 Par tido Comunista pare-

cia gue conseguir ia assumir as tradicoes da Republica: era uma das

coisas que preocupavam De Gaulle nos anos da Resistencia.

Tal como aconteceu, a recuperacao do patriot ismo jacobino

foi ideologicamente uma boa rnudanca. pois a fraqueza da historic-

grafia francesa de direita sempre residiu no fato de que ela nao

podia rejci tar urn episodic tao glorioso e triuntante da his t6ria da

Franca como as conquis tas e vit6r ias dos revolucionarios e da cr.a

napole6nica. Os liistor iadores de direi ta que escreviam populan-

zacoes elegantes e inteligentes estavam unidos para exaltar 0Ant~-

go Regime e para denunciar Robespierre. Contudo, como poder i-

am rejeitar aqueles gloriosos feitos militares dos soldados

franceses, especial mente quando conquistados contra prussianos e

ing!eses? Tudo isso signif ica que a histor iograf ia da ~evolu~a?

Francesa tornou-se tanto mais de csquerda quanta Jacobtna. Politi-

camente, a Frente Popular se desfez. Histor iograf icamcnte, pro-

duziu seu maier triunfo em 1939, na medida em que a guerra se

aproximava: 0 !iVTOde George Lefebvre, The coming oj the French

Revolu t ion. E, se para a geracao seguinte esse livro dorninou o

campo, isso era em memoria tanto da Resistencia e da t .ibertacao

quanto da Terceira Republica.A essa altura, a fusao das tradicoes republicanas, jacobinas ,

socialistas e cornunistas estava bas tanle cornpleta, pois a Frente

popular e a Resislcncia posterior haviam transfonnado 0 Partido

Comunista no maior partido da esquerda; e na decada de 1930

podemos realmente cornecar a tracar a inf luencia do marxismo na

esquerda franccsa, Mas qual. exatamente, era essa inf luencia em

termos da Grande Revolucao? 0 proprio Marx nunca analisou a

Revolucao Francesa como historiador, como fez com a Revolucao

de 1848 na Franca , com a Segunda Republ ica e com a Cornuna de

Par is . Nem mesmo Engels, mais inclinado para a escri ta histor ica,

chegou a produzir uma versao coerente deia, nem sequer uma ver-

sao popula r, Como vimos, a ideia da Revolucao Francesa como

uma vitoria burguesa na luta de c lasses, que Marx assumiu, ve io

dos l ibcrais burgueses da Restauracao. 0 rnarxismo recebeu bema ideia da Revolucao Francesa como uma revolucao do povo e ten-

tou olha-la a partir da perspectiva popular, mas is so foi menos

especificamente marxista ainda: pertencia a Michelet. A idealiza-

~~o do Terror e de Robespierre deve- se aos babouvista s e, espe-

cialmente, a Buonarrot i, que transp6s a fase radical de 1793-1794

para 0 registro do comunismo proletario do seculo XIX. Contudo,

embora Babeuf fosse admirado como urn comunista precoce, cer-

tamen~e .eletinha tantas chances de atrair Marx teoricamente quan-

to Weitl ing ou Thomas Spence, e 0 culto a Robespierr e nao era,

em nenhum sentido, marxis ta . Na verdade, como vimos , 0 que se

tomou a tradicao marx ista cent ral foi a escolha de se alinhar com

Robespierre contra os ultra-radicals da esquerda que a ele se opu-nham, uma escolha que e apenas compreensivel na hipotese de que

os marxi st as se tenham apropriado da tradicao jacobina , e nao 0

contrario. Em si mesmo, parece tao surpreendeme para comunistas

modern os defender Robespie rre contr a Hebert e Jacques Roux

como seria pa ra as comunistas e socia li st as bri tanicos - com toda

a sua admiracao pelos regicidas e pela republica no seculo XVI-

defender Cromwel l contra os Levell ers e os Diggers. Para falar a

verdade, os historiadores rnarxistas comprometidos simultanea-

mente com as conceitos da Revolucao Francesa como uma revo-

lucao burguesa e da Republica Jacobina como a corporificacao das

suas conquistas mais avancadas tiveram problemas consideraveis

para dec idi r exa tamente quem representava a burguesia na era da

Comi ssao de Salvacao Publica, a qual tinha tanto orgulho de comer-

ciantes quanta William Jennings Bryan de banqueiros orientais. A

proposito , nem Engels ncm Marx aceitaram uma visao da Republi-

ca Jacobina tao ingenua como esta.

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Certarnente, a interpretacao jacobina da Revolucao Francesa

foi, em certa rnedida, "marxianizada" por Jaures e seus seguidores,

pr incipalmente no sentido de que eles prestaram mais atencao do

que seus predecessores aos fatores sociais e economicos em sua

or igem e desenvolvimento e, par ticularmente, na rnobil izacao de

seu componente popular. No senti do rnais amplo, a interpretacao

pos-Jaures da Revolucao Francesa como uma revolucao burguesa

nao avancou significativamente para alem da tese liberal de ter sido

um levante que rati fi cou a longa ascensao da burguesia que. por

volta de 1789, estaria pronta para substituir 0 feudalismo. Os mar-

xistas permaneceram dentro dos limites da interpretacao jacobina

tambern a esse respeito. Os art igos bern conhecidos de George V.

Taylor sabre a "riqueza nao capitali st a" que, mais ainda do que

Cobban, formam 0 ponto de par tida real para 0 revisionismo, nao

eram tanto cnticas aos pesquisadores marxis tas au jacobinos do

assunto, que mal exist iam, quanto demonstracoes de que nao bas-

tava assumir que a burguesia t inha surgido, mas 0 termo deveria

ser def inido e ° surgirnento, demonstrado."Em resumo, os marxistas tiraram bern mais da historiografia

republicana da Revolucao Francesa, tal como ela se desenvolveuno seculo xx, do que contribufram para ela. No entanto, nao ha

duvidas de que fizeram dessa historiografi a a sua pr6pria e. por-

tanto, assegurararn que urn ataque ao marxismo dever ia ser lam-

bern urn ataque aquela historiografia,

4

A REV/SAO QUE SUBSISTE

o que vimos nos ult imos vinte anos aproximadamente e uma

reacao historiografica macica contra essa visao canonica, Vinte anos

atras, Lefebvre foi louvado, em termos extravagantes, por John

McManners na New Cambridge Modern History, e sua sfntese foi

considerada completa. Crane Brinton, que dificilmente cornparti-

!haria algo com 0 leninisrno, basicamentc rejeitou 0 livro de Alfred

Cobban, Social interpretation of the French Revolution - a pedra

angular do revisionismo moderno - , como 0 trabalho de urn histo-

riador fora de moda, antiteorico, 0 qual. uma vez que nem alguem

como ele pode deixar de "interpretar", mostrou algo muito mais sim-

plorio do que aqui lo que reje ita.' No en tan to, em 1989. urn livro

excelente e equil ibrado baseado na velha visao - The French Re-

volution, de Georges Rude - foi repudiado como 0 trabalho de

alguem que "esta preocupado com a distribuicao da carga quando 0

navio ja foi torpedeado [ .. .]e ja esta nofundo do mar" , e como "urna

recapi tulacao de velhas ideias, nao millsconfiavei s a luzde pesquisasrecentes. Nao se ajus ta aos fatos tal como sao percebidos hoje". ' E

urn historiador frances descreve 0 trabalho de Francois Furet como

"diffuser les theses deCobban etde ses successeurs [difundir as teses

de Cobban e de seus seguidores]". ' Duvido que, em algum penodo

anterior, a historiografia revolucionaria francesa tenha passado portao dramatic a revisao dejulgamento como esta.

o forte extremismo de algumas afirmacoes correntes deve nos

alertar que estamos lidando com algo mais do que puras emocoes

acadernicas, Da mesma forma, as afirmacoes do tipo "os fates, tal

como sao percebidos hoje" [grifo meu], que significa nao as fatos,

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mas nossa intcrpretacao deles . Isso se confirma pela tentativa de

mostrar que a Revolucao Francesa foi, de certo angulo, IUID impor-

tante, 0 que nao apenas e implausfvel mas tambern contra a opiniao

universal do seculo XIX. Em resumo, que a Revolucao Franccsa foi

o opos to rnesmo da mudanca social inevitavel na qual pensava 0

jovem Benjamim Constant. 0 primeiro e mais moderado dos

grandes uberais burgueses rnoderados, quando escreveu em 1796:"Ao final, devernos curvar-nos a neccssidade que nos impele para

a frente, devemos parar de ignorar a marcha da sociedade". ' Mas,

segundo uma opiniao recente, a Revolucao Francesa foi "puro

acaso em sua origem e ineficaz em seu resultado".' De fato ha

ide6logos, alguns deles historiadores, que escrevem como se a Re-

volucao pudesse ser escri ta fora do enredo da hist6r ia moderna,

sern que se afete a sua narrat iva basic a - embora 0 autor da ulti-

ma citacao nao esteja entre eles, 0 absurdo da hip6tese de que a

Revolucao Francesa seria sirnplesmente um deslize na longa e gra-

dual marcha da Franca eterna e patente.Ajustificacao oficial para essa reviravolta e , dizern, a acurnu-

lacao de pesquisa que tornou a antiga abordagem insustentavel. DeIato, houve urn impressionante c rescimeruo da pesquisa nesse

campo, ernbora nao tanto na Franca e cenamente nao entre os revi-

sionistas desse pais. Paradoxalmente, a mais bern cotada ortodo-

xia histor iografica do pes-guerra, a escola dos Annates (na medi-

da em que era urna escoia), preston pouca atencao naquilo que era

considerado fenornenos superficiais da hist6ria de acoruecirnentos

tais como a polft ica, incluindo af as revolucoes. Essa e talvez a

razao por que a hi storia da Rcvolucao Francesa foi deixada fun-

damentalmente aos marxi stas, os quais acreditavam que as re-

volucoes sao acontecimentos historicos importantes. 0 que a maio-

r ia dos revisionistas franceses esta fazendo e, para citar a t itulo do

livre de Francois Furet, Pensando a Revolucdo Francese (Penserfa Revolution Francaisei ou seja, ajustando de forma diferente os

fatos conhecidos, as tais novos fatos. tal como estao circulando.

sao em grande parte devidos apesquisadores ingleses e americanos.

Em seis paginas de referencia de urn trabalho revisionista recente,

escolhidas ao acaso, encontrei 89 referencias a trabalhos estran-

geiros e 51 a franceses. ' Dado 0 orgulho nacional dos academicos

franceses e a central idade da Revolucao Francesa em sua hist6r ia

Il~cional, poder-se-ia suspeitar que a inclinacao ideologies tenha

ajudado a fazer com que alguns deles setornassem tao prontamente

recepti.v~s ~ opinioes estrangeiras. De qualquer modo. 0 corneco

do revisiorusmo remete a uma epoca anterior a disponibilidade

dessa nova pesquisa, ou seja, ao ataque de Alfred Cobban (1901-1968) ao conceito da Revolucao Francesa como uma revolucao

burguesa, em 1955. ' Em resume, 0 argumento nao tern sido feito

com base em fatos, mas em interpretacoes.

Pode-se ir ate mais longe. 0 argumento revi sionista nao cexatamente sobre a RevolU(;ao Fraucesa, mas sobre as grandes ge-

neralizacoes historiograficas e poifticas que podem ser lidas nela.

Urn leitor histortograncamente na o comprometido - par exern-

plo. um sociologo bem inform ado - sernpre pode enfatizar que,

sobrc as fates da si tuacao, ha muito pouca discordia entre os revi-

sioni stas e 0 melhor da velha erudicao," embora os esbocos histori-

cos do falecido Albert Soboul (mas nao seu extraordinario traba-

lho sobre os sans-culottes parisienses) deixem margem para aszornbar ias de Furet sobre "uma especie de vulgata leninista-po-

pulista"." Se Georges Lefebvre t ivesse publicado seus trabalhos

nao nas decadas de !920 e 1930 mas, como urn pesquisador desco-

nhecido, nas decadas de 1960 e 1970, eles dificilmente teriam sido

lidos como pilares de uma ortodoxia que deve ser hoje ques tion a-

da. Ter iam sido lidos como uma contribuicao a sua revisao. H'

Um exemplo e ilustrativo. Um dos maiores argumentos revi-

sionistas contra considerar a Revolucao Francesa uma revolucao

b~r~uesa e .que ta~ revolucao, na hip6tesc marxis ta , deveria, pur

direito, ter impulsionado 0 capitalisrno na Franca, quando e evi-dente que a economia francesa nao esteve particulannente bern nem

durante nem apos a epoca revolucionaria ("Le m y the marxisteassimilant la revolution a une etape decisive dans lc developpcmentde I'economic capitaliste est facilernent dernentie par la stagnation

de I 'economic pendant laper iode revolutionnaire et au dela") .' No

minimo, 0 desenvolvimento econ6mico da Franca no seculo XIX

estava arras do de muitos outros paises. 0 primeiro fato ja era bern

10 6 107

 

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conhecido par Freder ick Engels, que 0 eomentou aparentemente

sern imaginar que poder ia invalidar suas analises." 0 segundo foi

geralmente aceito por mui tos historiadores econ6micos da pr imei ra

metade des te seculo. incluindo marxistas . 0 grande corpo de lite-

ratura sobre "0 atraso economico'' frances 0 a testa, ernbora a

pesquisa mais moderna abra espaco para 0 revisionismo tambem

nesse campo. Contudo, George Lefebvre nao apenas considerou

cer tos os efeitos negatives da Revolucao Francesa sobre 0 desen-

volvimento subsequente do capital ismo frances , mas especif ica-

mente tentou explica-lo por meio da analise do contexte agrario da

Revolucao. Explicacoes semelhantes foram usadas ate mesmo pelo

porta-bandeira da ortodoxia da revolucao burguesa, Albert Soboul,

para dar conta do atraso relat ivo do capital ismo frances quando

eomparado ao britanico." Ambos podem ser legitimamente critica-

dos , mas nao por te rem falhado em notar e analisar 0 que parece

tao evidente para seus entices. as argumentos sabre interpretacoes

e argumentos sobre fatos sao de tipos diferentes.

I ss o n a o implii::a, e claro, negar que a pesquisa sabre a RevolucaoFrancesa tenha avancado de modo bas tante impress ionante desde a

Segunda Guerra Mundial- provavelmente mais do que em qualquer

perfodo desde 0quarto de seculo que precedeu 1914 - e que, por-

tanto, sua historiografia requeira ampliar-se, atualizar-se, rever-se e

modificar - se para incLuir novas ques toes , novas respos tas e novos

dados. Esse e , acima de tudo, 0 casu para 0 penodo que susci tou a

Revolucao . Por exemplo, a af irmacao de Lefebvre de que "a reacao

aristocratica, crescendo e tomando forma r ap id am e n te d es de 0final

do reinado de Luis XlV, e a caractenstica mais importante da hist6ria

francesa do seculo XVIII" n ao s e sustentou e, no presente, e d i ffc il ve r

a lguern tentando r e ss u sc it a- la ." M a i s generic amente, a h i st o ri a r e -

volucionar ia deve, daqui em diante, buscar eonhecer melhor as regioes

e gruposda sociedade francesa desprezados pela historiografia tradi-cional e orientada polit icamente: sobretudo as mulheres, as par tes

"apoliticas' do povo frances e oscontra-revolucionarios. E bern menosclaro que deva pr eocupa r -s e com as modas con t er npo ranea s de analise,

como fazem alguns his toriadores - a his t6ria como "retorica", a re-

volucao como simbolismo, deconstrucao e coisas parecidas,

E tambem inegavel que a historiografia francesa republicans

tradicional , antes e depois de sua convergencia e interpenetracan

com a versao marxista, tendeu a sc tornar tanto urna ortodoxia

I~dag6gica como ideol6giea, ~Itamente resistente a mudanca. Para

i lustrar com urn exernplo relat ivamente menor: nadecada de 19S0

a sugestao de R. R. Pa lmer e Jacques Godechot de que a Revolu -

r ;i lo Francesa fazia par te de urn movimento atlantico mais amplo

contra os antigos regimes ocidentais" enfrentou uma indignadaoposicao nos cfrculos his toricos marxist as, embora a ideia fosse

suges tiva e interessante e ambos os autores per tencessern a prin-cipal corrente da his tori ograf ia republieana. 16 As objecoes eram

essencia lmenre pohticas. De urn la do , o s comunistas da decada de

1950 eram t remendameme deseonfiados do termo atlantica, na

medida em que parecia reforcar a alegacao ocidental de que os

Estados Unidos e a Europa ocidental compunharn urn todo, em

oposicao a Europa do leste (como na Organizacao do Tratado do

Atlantica Norte). Essa objecao ao atlanticisrno, tanto na his toria

quan ta na polit iea, introduziu-se de modo infe liz no campo aca-

demico e era, al ias, part ilhada por pesqui sadores de urn conse r-

vadorismo scm macula. '7 Pur outro lado, a sugestao de que a Re-

volucao Francesa nao tinha sido urn fen6meno singular e,

historicamente falando, singularmente decisive, parecia enfraque-

cer a singularidade e a irnportancia mundial decisiva das "gran des"

revolucoes contemporfineas e futuras , para nao falar do orgulho

national dos franceses, especialmente dos revolucionarios france-

ses . Se as ortodoxias eram tao sensfveis a rnodificacoes relat iva-

mente menores, entao sua res istencia a desaf ios maiores dever ia

ser bern mais forte.

Contudo, os desafios para interpretacoes ideol6gicas ou polfti-

cas na o devem ser confundidos com revi soes historicas, mesmo se

as duas nem sernpre possam ser separadas, especialmente em urn

campo polit ico tao explosi vo quanta e a his toria da Revolucao

Francesa. No cntanto, quando consideramos 0 atual desafio - na

medida em que e polft ico e ideol6gico - hi uma curiosa despro-

porcao entre aspaixoes envolvidas e os objet ivos a que seobrigam.

Pois, ta l como a extensao da dernocracia polit ica em sociedades

l O SJ0 9

 

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par iamentares oeidentai s foi a sornbra que se.projetou, s ob r e os

debates no primeiro centenario de 1789, assim tambem a Re-

volucao Russa e as que a s u c ed e ram projetaram sua sombra.sobre

os debates ideologicos fe itos na ocasiao de seu hicentenario , As

(micas pe s soa s que ainda atacam 1789 como ta l sao velhos. con-

servadores franceses fora de moda e os herdeiros daquela direi ta

que sempre se def iniu pela rejeicao de tudo 0 que foi trazid~ pelo

lluminismo. E cla ro que ex iste rn ainda muitas pessoas assim. Arevisao liberal da historia revolucionaria francesa e inteiramentedir iaida, via 1789, para 1917. E uma ironia da his toria que, aofaze-10, e la ataque preci samente - como virnos no primeiro capi tulo

_ a interpretacao da Revolucao Francesa que primeiro foi for-

mulada e popular izada pela propr ia escola de libcral ismo mode-

rado da qual p r et e n de - se h e r de i ra .

Dai vern 0 descontrolado uso de termos como gulag (uma

palavra ruidosa nos drculos inte lec tua is fr a~ceses des~e ~olje-

nitsin), e da OrwelHngua de 1984, as referencias ao totalitarismo,

a enfasc nos agit adores e idcologos como os criadores de 1789 e

a ins is tencia nos jacobinos como os ances trais do par tido de van-

guarda (Fure t, a tua lizando Coehin). Daf a insi st enc ia n.o Toe-queville que viu continuidades na historia contra 0Tocqueville que

viu a Revolucao Francesa como criadora de uma "nova so-

ciedade"." Dai, tambern, a preferir-se 0 velho Guizot, 0 qual pre-

tendia que pessoas como ele "rejeitassem ambas as afirmativas:

recusar tanto 0 retorno a s max imas do Antigo Regime quanto qual-quer adesao especu lat iva aos princ ipios revolucionario s"," ao

[overn Guizot que escrevera em 1820:

Direi ainda que a Revolucao, trazida pelo desenvolvimento ne-

ccssario de uma sociedade que prngride , fundada em princfpios

morais, encarrcgada do projeto do bern geral, foi a bata lha terrivel

mas legitima contra ()privilegio, da liberdadc legal contra 0 dcspo~

tisrno, e que arenas a Revolucjio pcnence a tarefa de regular-se a 51

mesma, de purificar-se, deencontrar a monarquia constitucional para

consumer 0 bern que comecou e para reparar 0 mal que fez."

Dar, em resume, a linha geral do argumento que favo rece a re for-

ma e a mudanca gradual da Revolucao e a linha especif ica do argll-

mento de que a Revolucao Francesa pouco in f lu iu em relacao ii

evolucao da Franca, e que aquilo em que inf iuiu foi realizado a lim

CUSlomais alto do que val ia . "

De faro, a hipotese de que a Revolucao Francesa nao con-

seg\iu nada pro~oreional a seu~ eu.stos e e;s:encial a s histor~as daRevolucao escntas como deruincias polft icas contemporaneas,

como e 0 caso do best -sell er eloqiientc e est il isti co de Simon

Schama, Cidad/ios, pais deixa 0 autor livre para concentrar-se na-quilo que e apresentado como horror e sofrimento g ra tu ito , N a o

ha di ividas de que, no devido tempo, alguem que nao rums sa iba

por que a Segunda Guerra M und i a l foi feita, pelo menos na Europa,

podera escrever uma hist6ria maravilhosamente talentosa e arnar-

ga dessa guerra, na qual concluira que cia foi uma catas trofe iruit il

e provavelmente evitavel, que causou mais morte e destruicao do

que a Primeira Guerr a Mundia l e que conseguiu pouca coi sa que

nao pudesse se r obtida de outro modo. Certamente e mais faci I

analisar esses acontecimentos de lima dis tancia descomprometida,

se eles sao suf icientemente remotos para que 0 envolvimento seja

opcional. Schama nao esta envolvido no assunto como urn espe-

cialista, pois, embora seja extremamente bern informado, seu l ivro

nao se destaea por sua contribuicao ao conhecimento ja adquirido.

A escolha feita pelo autor , de uma narrativa centrada em incidentes

e pessoas especfficas, evita nitidarnente os problemas de perspec-

t iva e genera li zacao. E, escr evendo 150 anos apos Carly le, cuja

brilhante tecnica da histori a de cfeito e le retomou, Scharna nao

mais se sente parte do drama como Carlyle era, mas apenas urn

cronista desencantado dos crimes e loucuras da humanidade.

No entanto, embora seja muito natural para os in te lectuai s li-

berai s usar a experiencia da Revolucao Francesa como urn argu-

mento contra as revolucoes eomunistas modernas e, inversamente,

avaliar criticamente Robespierre a luz de Stalin ou Mao - como

de fato os proprios historiadores sovieticos estao fazendo agora -,

a olho nu, as petigos de uma revolucao social do tipo da russa au

chinesa, ou. sese preferir, da cambodjana ou daperuana do Sendero

Luminoso parece rn mui to remotos nos pa ises dcsenvolvidos da

decada de 1980, incluindo a Franca - muito mais remotos. de fato,

110 III

 

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do que pareciam os possfvcis per igos da democracia em 1889. Foi

natural para historiadores que viveram a cxperiencia de atrocidades

muito maiores do que as de 1793-1794 situar sua origem na deca-

da de 1790, tal como foi natural para his toriadores bri tanicos que

viveram durante a Segunda Guerra Mundial reconsiderar 0 Terror

do ano II como possivelmente 0 pr imeiro exemplo da guerra de

mobilizacao total planejada que haviam recentemente experimen-

tado. Contudo, por que alguern, exceto aqueles que semprerecusaram 1789, haver ia de ins is ti r na Revolucao Francesa como

urn exemplo do que pode acontecer quando revolucoes nao sao evi-

tadas, ou apresentar estimativas rnaximizadas das perdas e destrui-

coes que e la t rouxe para a Franca - algo que nenhum histori ador

tentou esconder - quando, dentre todos osper igos reais para 0 teci-

do social da Franca ou de todas as sociedades modernas urbani -

zadas, os oferccidos pelos sucessores de Robespierre e Saint-Just

sao, prov avelmente, osmais desprezivei s? Existe uma desproporcao

total entre 0 mero faro do bicentenario em um mundo ocidental rc-

Jat ivamente estavel e as paixoes que fez surgir na Franca, embora

sedeva dizer que em outros lugares a ocasiao foi comemorada den-

tro de urn espfrito menos litigioso.

o que era explosive na Franca de 1989 nao era 0 estado do

pais, mas as paixoes de seus intelectuais, especialmente daqueles

com visibil idade na cada vez rnais importante midia de opin iao,

que lhes deu urn destaque pouco cornum." 0 ataque revisionista

contra a Revolucao refl etiu nao urn perigo detectado de revo lta

social , mas urn ajuste decontas na Rive Gauche dePar is . Um ajuste

de contas principalmente com 0 passado dos proprios escritores,

ou seja, com 0 marxi smo, que, como notou Raymond Aron, foi a

base geral das voluveis modas ideologicas que dominaram a cena

intelec tual de Pari s par trinta anos, apes a Libertacao." Os deta -

lhes desse capitulo da his toria intelectual da Franca nao precisam

nos oeupar aqui, Sua origem remonta ao periodo do fasci smo, ou

melhor, do antit asci smo, quando a ideo logia traditional do Ilu-

minismo e dos valores republicanos - da crenr ;a na razao, na cien-

cia, 00 progresso enos Direitos do Homem - convergiu com 0

comunismo, no exato momenta em que este se tornava firme e

implacavelmente sta lini st a, c nao menos no domesti co Partido

Comunista Frances , de modo que, entre 1935 e 1945, ele setornou

conuguo com a tradicao jacobina na tiva , e tambem a maior orga-

nizacao politic a do pais.

\ Certamente nem todos os intelectua is da esquerda eram ou se

tornaram mernbros do Part ido Comunista, embora 0 numero de

estudantes que entraram para esse par tido na Franca do pas-guer-

ra, e specialmente em aJgumas insti tuicoes de eli te, t enha sidoimpress ionante: durante a primeira Guerra Fria, algo em torno de

urn quarto de todos as estudantes da E c o le N o rm a le S u pe r ie u re da

rna d ' Ulm, conhecida como urn estabelecirnento que mantinha as

tradicoes da esquerda repub l icana, possuia a ca rtei ra do PCF.,.

(Antes da guerra, 0 Quartier Latin tinha sido dominado principal-

mente pelos estudantes da ultradireita.) No entanto, indcpendente

do fato de os inte lec tua is pertencerem ou nao ao part ido, e certoque "da Libertacao ate 198I , 0 PCF exercia uma fascinacao hipno-

tizadora sobre a intelligentsia radical da Franca" porque represen-

tava a base de massa da esquerda - de fato, com 0 declinio do

velho Partido Socialista antes de sua reconsti tuicao em novas bases

por Mitterand, 0 PCF era praticarnente 0 unico representante politi-

co da esquerda." Alern disso, uma vez que prati camente todos os

governos, do fina l da unidade ant ifasci sta (1947) ate a decada de

1980 foram, com excecoes rnomentancas, baseados no centro e na

direita (gaullista), os intelectuais raramcnte se sentiram tentados a

abandonar a postura oposicionista de esquerda. 0 repensar seria-

mente as perspec tivas poli ticas de esquerda - que poder iam ter

s ido suger idas peJas exper iencias europeias das decadas de 1950

e 1960 - pode ser adiado ate depois do gaullismo e, a nao ser por

urn breve momento de reto rica rebeLde e ilusao ao final dos anos

60, nao pareeeu sequer necessario. 0 afastarnento do general De

Gaulle e 0 fim das ilusoes de 1968 tarnbem marcaram 0 tim da era

da hegemonia intelectual marxisant. 0 recuo na Franca foi tremen-

damente dramatico, porque a distancia entre a alta teoria abs trata

e a rcalidade social com a qua l c ia deveria, de a lgum modo, esta r

relacionada , tornou-se insuperavel - exceto pelas t ramas da su-

t ileza f ilosof ica, que nao poder iam ter peso algum. Em todo caso,

I l 2 113

 

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as modas intelectuais ditam as cores ideologicas a serem usadas

durante 0 ciclo corrente, da mesma forma que a haute couture dita

as cores da es tacao. Logo tomou-se mais dificil encontrar marxis-

t as do que posit ivistas no velho estilo, e os que sobrararn foram

abandonados como urn chapeu velho, Mesmo antes de sua morte.

Jean-Paul Sar tre h av ia se romado alguern que na o interessava:

Quando, apos a sua morte , um editor americana quis compra r os

direi tos da edicao de sua biografia , que ele natural mente imagina-va que estivesse sendo preparada, descobriu que nenhum editor

frances havia julgado valer a pena investir em tal trabalho. * Sartresurni ra de vista no Quinto Arrondissement. em bora 0 sucesso da

biagra fia de Annie Cohen-Sola l na Franca e em diversos outros

paises tenha dernons t rado que 0 nome ainda s igni ficava muito para

urn publico mais amplo.

A crise do rnarx i smo afetou a Revolucao Francesa por razoes

gerais e especff icas. Em termos gerais, a Revolucao, e especial-

mente o jacobini smo, t inha sido a imagem em re lacao a qual a

esquerda francesa havia se formado, como vimos. Em termos

especificos. como Tony Judt argumentou, a h i s to r i a r evo l uci ona r ia

francesa, em urn sentido real, substitui uma grande parte da

pesquisa e da teoria polft ica da esquerda francesa." A rejeicao das

antigas crencas radicais implicou, autornaticamente, um ataque

revisionism na historia da Revolucao, No entanto, e isso nao pas-

sou despercebido por Judt, esse ataque nao era contra a interpre-

tacao marxista, mas contra aquilo que os intelectuais radicais

f ra n ce se s v e rn fazendo desde a d ec ada de 1840 - e, como v imos ,

aquilo que os intelectuais l iberals f ranceses vern fazendo desde a

decada de 1 810. E urn ataque contra 0 corpo principal da tradicao

intelectual f rancesa: Guizot e Cornre sao vft imas tao inevitaveis

quanta Marx.

No entanto, existem outras razoes que nao as intelectuais para

expl ica r por que, desde a decada de 1970, esse rebaixamento da

Revolucao Francesa se tornou menos inconcebivel do que teria

e) De iato, foi en cont ra do urn auror, 0livro foi cncornendado (em frances)

par Nova York e 0, direitos de edi<;ao Coram vendidos aos franceses.

f14

j

sido antes. A primeira dessas razoes e especificamente francesa. A

profunda transformacao do pais desdc a Segunda Guerra Mundial

tornou-o, em alguns aspectos, quase irreconhecivel para aquelcs

que 0 conhecerarn antes da Segunda Guerra. Muito do ceticismo

a resI\ 'ito de a Revolucao Francesa ter sido uma revol w; a o bur-

guesa emerge da comparacao entre a Franca de hojc - urbaniza-

da , high-tech, indust rial izada , modernizada - e a Franca clara -

mente rural e pequeno-burguesa do seculo XIX ; ent re a Franca dadecada de 1940, com s eu con t ingen t e populacional agrar io de 40%

e a Franca da dec ada de 1980, na qual 90% da populacao nao se

ocupa de atividades rura is. A transforrnacao economica do pai s

desde a Segunda Guerra Mundial nao tern reaLmente nada que ver

com 1789. Assi rn, 0 analista pode bern s c p e rg u n ta r : 0 que a revo-

lucao burguesa fez para 0 dcsenvolvirnento capitalista? A questao

nao e impertinente, embora seja facil ignorar 0 fato de que, pelos

padroes do seculo XIX , a Franca estava entre as econornias mais

desenvolvidas e indus tr ializadas, e que 0 contras te com outras

econom i a s capitalistas europeias antes de 1914 e desde 1870 e,

talvez, igualmente impress ionante ,

Novamcn t e , a visao de que a R ev olu ca o F ra nc es a n ao e m a isrelevante para a Franca, que esta acabada, que seu trabaiho foi

f inalmente concluido - visao proposta par Furet e outros durante

o per iodo do bicentenario - e ao menos compreensivel se avaliar-

mos a dcscontinuidade extraordinaria entre a politica do pais antes

e depois da Quarta Republica - ou seja, a continuidade extra-

ordinar ia entre 1789 ate, digamos, 1958. Durante todo esse per lo-

do, a I inha entre direi ta e esquerda polit icas separava de faro aque-

les que aceitavam 1789 e aqueles que a recusavam e, ap6s 0

desaparecirnento da opcao "bonapart ist a" (que era, em termos

franccses, uma subvariedade da tradicao revolucionaria), separa-

va aqueles que acrcditavam na Republica e aqueles que a re-

jei tavam. Aqui, a Segunda Guerra marca a transformacao, Ao con-t ra rio de Petain, cujo regime teve os classicos traces da reacao

anti- l789, De Gaulle, cmbora com rafzes tradicionais catol ico-

monarquistas, foi 0 primeiro l idcr genuinamente republicano de

direi ta . A polft ica da Quinta Republica realmente foi muito dife-

:~ 115

 

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rente da de suas predecessoras, embora ate mesmo a Quarta

Republica, com sua elirninacao temporar ia da velha ultradireita e

a proerninencia (tarnbern temporaria) de urn partido ca t6li co-

democratico, tenha se afastado urn poueo da tradicao, E verdade

que a esquerda tradicional republicana tambern surgiu, aparente-

mente mais poderosa do que nunca , da Resistencia formada nos

tempos da guerra, que setornou a Iegitimacao ideologica da Franca

do pos-guerra, pelo menos para uma geracao. E a esquerda repu-blicana, em suas versoes radical , socialista e cornunista, fundiu a

tradicao de 1789 com a da Rcsistencia . Contudo, essa esquerda,

em sua forma organizada , foi logo vista ou como isolada ou como

decadente. 0 socialismo radical , central para a Terceira Republi-

ca, empalidecia cada vez mais e nem mesmo os talenros de Pie rre

Mendes-France puderam deter seu declfnio, 0 Par tido Socialista

mal sobreviveu a Quarta Republica e parecia que estava para desa-

parecer da vista, ate que Francois Mitterand recriou-o no comeco

da decada de 1970 em urn formato que tinha poueo que ver com

a velha "Serrao Francesa da Internacional SociaJista" . 0 Par tido

Comunista manteve-se por uma geracao dentro de urna especie de

gueto ou for taleza, cujas defesas mantinham lange as intrusoes do

f inal do seculo xx, mas seu propr io declfnio na decada de 1980 foi

tanto mais espetacular, Nao adrnira que os meninos-maravilhas,

jovens ou mesmo de meia -idade, da Eco l e Nationale d'Adminis-

tration (fundada no pes-guerra) e outros tecnocratas e comen-

tar istas polit icos vissern a Revolucao Francesa como algo muito

lange da polftica francesa atual.

Contudo, ate a dec ada de 1940, as coisas nao tinham sido

assim. Mesmo em termos pessoais, a Revolucao Francesa estava,

por assim dizer, ao alcance dejovens homens e mulheres que (como

este autor) cantavam versoes da revolucionaria Carmagnole, diri-

gidas apropriadamente contra os reacionarios nas dernonstracoes

da Frente Popular na dec ada de 1930. Nao mais do que tres pas-

sos l igavam os jovens revolucionarios daqueles anos a Gracchus

Habeuf, cuja Conspiracao dos Iguais tinha sido mantida na

memoria par seu companheiro Filippo Buonarroli (1761-1835) em

urn l ivro influente sabre sua historia ." Buonarrot i, que foi con-

vincentemente retratado como "0 primeiro revolucionario profis-

sional", iniciou urna daquelas vanguardas revolucionarias secretas

das quais seu seguidor Auguste Blanqui (1805-1881) tornou-se

lideq ~inspiracao, transformando 0 pov~ jacobino no "proletaria-

do" do seculo XIX." A Comuna de Pans de 1871 representou 0

breve momento de triunfo para esses cornunista s franceses pre-

marxistas. Seu ultimo membro sobrevivente, Zephyrin Carnelinat

(nascido em 1840) , morreu como membro do Par tido Comunista

Frances no ana reeente de 1932.

Mais ainda, a historiografia academica da Revolucao France-

sa era a carne e os ossos daquela Terceira Republica cuja per-

manencia polftica foi assegurada por uma associacao entre as

descenden tes do l ibera lismo de 1789 e do jacobinismo de 1793

contra os inimigos da Revolucao e da Republica. Eo era ate mesrno

bibliograficamente. Seus grandes historiadores foram hornens do

povo, que vinham de famflias de carnponeses , artesaos ou traba-

lhadores e, muito freqi.ientemente, filhos ou pupilos daqueles pro-

fessores pri marins que foram 0 clero seeul arda Republica (Soboul,

Vovelle) ; homens que atingiram os mais altos pos tos na academia

atraves das passagens estreitas, mas acessiveis, que 0 sistema edu-

cacional republicano abria para 0 talento, os quais esperavam tra-

balhar para sua honra academica enquanto permaneciam profes-

sores de segundo grau ao longo de grande par te de suas carreiras .

Eram franceses de urna epoca em que 0 orgao teorico de facto da

Republica, 0 satfrico Le Canard Enchaine, concebia seus leitores

como essencialmente homens (mulheres cer tamente nao, ainda)

empregados nos Servicos Pos tais e Telegraficos em cidades como

Limoges, que odiavam os padres e 0 "dinheiro grande" , que ti-

nham urn gosto especial para Vouvray e Julienas em cafes de

esquina, uma relutancia em pagar impostos que eram, por. de-

finicao, excessivos, e urna vi sao cfnica dos senadores radica l-

social is tas. Quao remota essa Franca pareee hoje, quando mesmo

homens apaixonadamente devotados a tradicao revolucionaria sen-

timentalizam-na ironieamente, como Regis Debray ao rnencionar

"0 ja rdim da Franca como era em 1930, aque le acolhedor hexa-

gono de colinas e bosques, de conse lhei ros loca is e tre/ .entas va-

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r iedades de queijo, ao qual 0 radicalismo agregou 0 barrete frigio

e Jean Giraudoux, suas metaforas"."

Esses historiadores pertenciam a uma Franca nao reconstrui-

da , antiga e pre -tecnologica, mesmo no sent ido de que 0 grande

Mathiez mantinha-se em contato com 0mundo sem urn te lefone e

nem ele nem Georges Lefebvre possuiam maquina de escrever ou

sabiam datilografar." Nao eram ricos nem estavam na moda; eles

estavarn enraizados em cidades provincianas e. se chegaram aMarx, foi pela estrada nao-teorica do "homem do povo" frances

procurando a posicao mais radical no espectro polit ico.

Sua Franca nao era a de hoje, na qual os jovens executives

(jeunes cadres) e os intelectuais da midia sao, de longe, figuras

bern mais centrais do gue 0professor de escola, e na qual ate mesmo

as ins ti tu icoes que fomcciam a principal forma de educacao supe-

rior parajovens t a l entosos de fami l i as simples, as Ecoles Normales

Superieures lnao parisienses) ou os colegios de treinamento de pro-

tessores , sao cada vez mais apropriadas por criancas da alta classe

media estabelecida."Sob estas ci rcunstancias, nao surpreende que a Revolucao

Francesa hoje pareca consideravel mente mais remota das realidades

da Franca do que parec ia a te mesrno na decada de 1930, pa ra nao

falar do comeco da decada de 1900, 0 periodo ap6s 0 Cam Drey-

fus, quando a Franca a inda parecia estar convulsionada pe la luta

entre aquelcs que saudavam os destruidores da Bastilha e os que os

execravam. A propr ia Par is , a cidade da Revo l ucao par excellence,

e hoje ur n habitat enobrecido da classe media; aqueles que urn dia

foram ehamados de "0 povo" se desloeam ate la para 0 trabalho

diana, a partir de suburbios perifericos ou cidades-satelites, deixan-

do, ao anoitecer , suas ruas vazias e os bis tros de esquina fechados.

Seu prefcito, em 1989. e ra ur n ex-primeiro-ministro eonservador c

lfder da direita francesa, e seu partido controlava nao apenas a

prefeitura da area central mas, scm excecao, cada um dos vinte

arrondissements da capi tal . Se a F r anca mudou tao dras t icamenre ,

por que nao mudaria a his toria de sua Revolucao?

o revisionisrno historico fora da F r anca foi bern menos poli-

tizado, pelo menos desde os dias de Cobban, cuja revol ra contra

u«' 1 > '..

. ,

Georges Lefebvre somente pode ser entendida no contexte dos

reeeios liberais em relacao ao comunismo sovietico e it expansao

sovietica nos anos da prirneira Guerra Fria. 0 proprio Cobban era

urncq_nbatente nessa guerra, 0 suficiente para colocar na lista negra

seu phiprio disclpulo, 0 professor secundario comunista George

Rude, cuja carreira academica, consequenternente, teve de ser feita

nao na Gra-Bretanha, mas na Australia do Sui e,depois, no Canada.

A maioria dos pesqui sadores revisioni st as, desde entao, nao foimais mobilizada par tais paixoes explicitas. Como podemos, entao,

explicar 0 recuo geral acadernico da interpretacao trudicional

durante 0 ult imo quarto de seculo?

Uma das razoes e, cer tamente, que os his toriadores sao cada

ve: mais rnovidos par incentive's que se tornam mais prernentes na

medida em que a profissao acsiemica, como tal, se expande : por

aquilo que Crane Briton, em sua resenha de Cobban, chamou de "a

coercao - nenhum out ro termo rnai s suave se rviria - sobre 0 his-

toriador e. em particular, sobre 0 jovern pesquisador que necess i t a

s e c st ab e le c er , s e r original [...] 0 historiador criati vo, como 0 artista

criativo, e obrigado, em nosso tempo, a produzir algo novo na formade uma 'intepretacao'. Em rcsumo, e obrigado a se r urn revisio-

nista"," A R ev ol uc ao F r an ce sa e, indubitavelmente, 0 unico campo

na his toria em que 0 incentivo para se produzir uma versao revisio-

nista, ou seja, para rejeitar-se a visao estabelecida, e irresistivel. Issoe particularmente visivel nesse campo porque a propria Revolucao

Francesa e uma caracterist ica muito central de nossa paisagem

hist6rica e porque - por exatamente essa razao - seu estudo nas

universidades britanicas e ame r i c ana s tern s ido mais cultivado do

que a maior ia dos outros assuntos per tencentes 11his t6ria de Esta-

dos estrangeiros. Contudo, embora isso de conta de alguns dos revi-

s ionisrnos no campo, nao da conta de todo 0 revisionismo,

o l ib e r a li sm o a n t ic o r n un i s ta , e c la ro, t am b er n p er m an ec e

como urn fator de importancia, e ass im tern sido desde que 0 fale-

cido J. L. Talmon co r necou a explorar essa l inha de pens a r nen t o

- reconhecidamente usando urn niodo de discurso algo difcrente

- em seu l ivro Origins oftotalitarian democracy, do final da deca-

da de 1940." Seria um erro se rio subest imar a opiniao de alguns

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hisioriadores libcrais de que 0 jacobinis rno deve ser rejei tado por

causa da descendencia ideol6gica que produziu, ernbora seja facil

entender esses sentimentos nadecada de 1980 quando vern de inte-

lectuais dos paises comunistas. 0 filrne Danton, de Wajda, fei to

em 1982, e claramente rnenos sobre Paris do ana II do que sobre

Vars6via de 1980 . No entanto, esse ISum fator secundar io .

Par out ro lado, os fatores ja notados no caso f rances ajudam

a explicar a ascensao do revis ionismo em outros lugares, ainda que

tenha gerado bern menos rna vontade poiftica, ideol6gica e pessoal

fora de Paris. Em alguns aspectos, 0 contexte do revisionismo nao

frances e mais esclareccdor, porque nos permite ver que esta

envolvido nele algo rnais do que a recuo internacional do marxis-

mo. E c la ro que i sso ta rnbern esta presente. 0 marxismo, como

vimos, havia integrado em seu proprio modelo histori co de mu-

danca social revolucionaria tanto a tradicao liberal frances a origi-

nal quanta a his toriografia republicana de esquerda do seculo xx.

Ao final da Segunda Guerra Mundial, uma versao monolitica e

monocentrica do marxismo, corporificada na ideologia dos par-

t ides comunistas alinhados com Moscou, estava em seu apogeu: e

os propr ios par tidos, depois do mais bern-sucedido perfodo de sua

historia , esiavam no apice de seu tamanho, poder e influenc ia -

e nao menos sobre os intelectuais europeus de esquerda. Para f ins

praticos, 0"marxi smo" significava esse conjunto de doutri nas, uma

vez que out ras organizacoes que diz iam represen tar essa teoria

eram polit icamente desimportantes - com raras excecoes - e os

teoricos nao ortodoxos de dentro e de fora dos partidos comunistas

estavam geralmente isolados e eram marginais ate mesmo dentro

da extrema esquerda." A unidade antifascista nacional e interna-

donal que havia tornado isso possfvel cornecou a quebrar , vis ivel-

mente, entre 1946 e 1948, mas, paradoxalmente, a primei ra Guer-

ra Fria ajudou a manter unido 0campo cornunista (ou seja, defacto

o marxi st a) a te que rachaduras aparccessem dentro da propria

Moscou em 1956.

As crises na Europa oriental em 1956 levaram os intelectuais

a urn exodo em rnassa dos par tidos comunistas ocidentais, embo-

ra nao necessariamente da esquerda c nem mesmo da esquerda

120

,. ,

1

marxista. Durante a seguinte decada e meia, 0marxismo tornou-

se politicamente pluralista, dividiu-se entre partidos comunistas de

diferentes orientacoes e f idel idades internacionais, entre grupos

dissiq ~ntes rnarxistas de var ias tendencias que agora adquiriam

alguma significacao polftica (por exemplo, as seitas rivais do

trotskismo), entre novos agrupamentos revolucionarios atraidos

pe lo que era agora a ideologia da revol ta e da revolucao social pa r

excelenc ia, e entre out ros movimentos ou correntes de ext remaesquerda sern perris clams em terrnos de organizacao e de outros

traces, em que a influencia de Marx competia com a daqueles a

quem ele proprio teria rcconhecido como os herdeiros de Bakunin.

Os velhos partidos comunistas ortodoxos, mais ou menos alinhados

com Moscou, provavelmente permaneceram, de longe , como 0

maior componente da esquerda marxista no mundo nao-socialista,

mas mesmo dentro do marxismo cessaram de aspirar a uma unidade

monol iti ca, e era agora acei ta uma variedade de inte rpretacoes

marxistas, freqiientcmente associadas com escritores marxistas do

passado, famosos mas ate entao margina lizados, ou entao com

escri tores desejosos de aproximar Marx das var ias doutr inas aca-

demicas importantes ou da moda.

A ext raordina ria expansao da educacao superior criou urn

corpo de estudantes e intelectuais muito maior, em termos rela-

t ivos e absolutos, do que qualquer outro estrato comparavel fora

ate entao, e isso deu a radical izacao polft ica da decada de ]960,

daqual eles se tomaram a tropa dechoque, urn gos to pouco comum

pela lei tura e discussao teoricas, ou, em qualquer caso, pelo uso

de urn jargao baseado em frases t iradas de teoricos academicos.

ParadoxaLmente, 0 ponto alto desse novo florescimento da escri-

ta e da iei tura marxistas, urn tanto confusas, coincidiu com 0pico

de uma onda de prosperi dade global - as anos de expansao

imediatarnente anteriores a crise do petr6leo em L973_ Nas de-

cadas de 1970 e 1980 , a esquerda marx ista estava recuando tanto

polft ica quanta ideologicamente. Nessa epoca, a crise afetava nao

apcnas 0 marxismo nao-governamental , mas tarnbem as doutr i-

nas ate entao ngidas e oficialmente obrigato rias dos paises que

viviam sob regimes comunistas (os quais, no entanto, nao mais

121

 

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par ti lhavam nenhuma das versoes dogmaticas da sua rei igiao de

Estado). A Revolucao Francesa, como parte da Iinhagem rnarxista,

foi urna evidente vitirna desse processo.

Contudo, em urn sentido mais genuino, a profunda transfer-

macae social, econ6mica e cultural do mundo desde 1950 - e

especialmente dos pafses capitalisras avancados - s o poderia levara esquerda marxista (ou melhor, as cada vez mais subdivididas e

pouco perrnanentes esquerdas marxistas ) a sc repensar. Assim, asmudancas na pos icao do proletariado industrial - 0 qual, ainda

que most rasse sina is de quere r ser 0 coveiro do capitalismo, na o

mais parecia grande 0 suficiente para se- lo de modo p la u st ve l _

e as rnudancas nas estruturas e aspectos do capitalismo tendiam a

roer pelas bordas as teor ias tradicionais das revolucoes tanto pro-

letarias como burguesas, das quais a interpretacao ean6niea da Rc-

volucao Prancesa havia se tornado parte integral. De fato, a questao

sabre 0 Que exatamente const ituia uma revolucao burguesa, e se

tais revolucoes realmente trariarn uma burguesia ao poder mesmo

quando ocorressem, comecou a preoeupar alguns d o s r na r xi st as n a

decada de 1960 (na Gra-Bretanha. por exernplo), e um recuo diante

da posicao classica podia ser notado."No entanto, nao apenas os marxis tas se preocupavam com 0

assunto, A revolucao burguesa tornou-se central para imimeros

debates entre his toriadores que nao eram nem urn pouco rnarxis-

t as em sua orientacao (a nao se r que uma boa parte da anali se e da

problematica rnarxistas tenha sido imperceptivelmente absorvida

pelos mais serios histori adores nos iiltimos cinquenta anos) e tam-

bern para os debates das decadas de 1960 e 1970 sabre as raizes

do Naeional Socialismo alemao. Se houve urn Sonderweg alernao

que Ievou a Hi tle r, isso se deveu a falencia da revolucao burgue-

sa alema de 1848, ao contrar io do I iberal is rno frances e do bri tani-

co, que tiverarn confianca em uma revolucao vitoriosa a rras de si

- fosse ou nao burguesa. Por seu lado, os crit icos da tese do Son-

derweg argumentavam que a burguesia alema tinha conseguido a

sociedade Que queria ou precisava, ainda que nao tivesse feiro uma

revolucao bern-sucedida." No entanto, com ou sern revolucao, a

burguesia conseguiu seus fins em algurn Ingar? 0 antigo regime nao

12 2

: . - :

;j,

sobreviveu por quase toda par te na Europa, no f inal do seculo XIX,

como argumentou urn historiador (dc esquerda)?" Por cer to , sus-

' ,ntou-se de ~odo c?~vin_cente que, mesmo na primei~<Ieco~omia

ii\.lustrial, os industnais nao eram oem a classe govemante nem, de

modo algum, os mais ricos e influentes membros da classe media."

o que, d e J a to , era a burgues ia do seculo XIX? A hist6ria social, que

h a vi a s e coneentrado em i n v es ti g ar a s classes trabalhadoras por toda

uma geracao, descobriu agora que sabia realmente mUItopouco sobrc<ISclasses medias e comecou a remediar a sua ignorancia."

Na verdade, a questao estava longe de ser puramente

academica. Ass irn, na Gril .-Bretanha de Margareth Thatcher, os

paladinos do neol ibera l i s rno radical desse regime explicavam qu.e

o dec lfnio da economia bri tanica se devera ao fracasso do capi-

tal ismo britanico, outrora, em romper decis ivarnente com 0 pas-

sado nao-capital is ta e aristocratico c, por tanto, em abandonar os

valores que bloqueavarn 0 caminho para urn crescimento basea-

do no mercado - de fato, explicavam que Thatcher havia eom-

pLetado a revolucao burguesa que Cromwell tinha deixado inco~-

pleta." (Paradoxalmente, essa linha de argumenta<;ao convergia

com outra que uma tendencia dos marxis tas hri tanicos usava para

sew; pr6prios fins.)

Em resume, 0 revisionismo na hist6ria da Revolucao France-

sa e . s implesmentc. um aspecto de urn revisionismo muito maior

sobre 0 processo do desenvolvimento oc identa l - c mais tarde

gLobal - na era do capitalismo e em seu interior, Nao afeta ape-

nas a inte rpre tacao marxista, mas tambern a rnaiori a das out ras

interpretacoes hist6ricas desse processo, pais, a luz das mudancas

um tanto ex.traordinarias que transformaram 0mundo desde 0 final

da Segunda Guerra Mundial, todas elas defrontam-se com a neces-

sidade de se repensarem. Nao h < i precedentes his t6ricos para

mudanca s tao rapidas , profundas e . e m term os socioeconornicos,

tao rcvolucionarias, em um periodo laO cur to , Muito daquilo que

na o Io i notado tomou-se visivel a IU dcssa experiencia eontem-

poranca. Muito doque foi tornado como cerro abre-se agora a inter-rogacao, Alem disso, nao silo apcnas as origens historicas e 0

desenvolvimento da sociedade moderna que pedem alguma recon-

} , . 1 3

 

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sideracao, mas os pr6pr ios ob jet ivos de tai s sociedades como os

aceitaram desde 0 seculo XVIII todos os regimes modernos e rno-

dernizantes , capital is tas e (desde 1917) socialistas - principal-

mente 0 objetivo de crescimento economico e progresso tee-

nol6gico i1imitados. Os debates sobre aquilo que tradicionalmente

(e lcgitimamente) e considerado urn episodic central no desen-

volvimento do mundo modemo e um dos seus marcos mais desta-

cados devern ser colocados no contexte mais amplo do final doseculo xx, reconsiderando seu passado e seu possfvel futuro a luz

da transformacao mundial, Contudo, por que dever ia a Revolucao

Francesa tornar-se 0 bode exp iatorio de nossa inabi lidade para

entender 0presente?

No entanto, com ou sem revis ionismo, nao nos esquecamos

daquilo que era 6bvio para todas as pessoas ins tnudas no seculo XIX

e que ainda e obvio: a central idade e a relevancia da Revolucao

Franeesa. 0 proprio fate de que, apos duzentos anos, ainda foi 0 toco

de debates polit icos e ideol6gicos apaixonados , tanto academicos

quanto publicos, e prova disso. Ninguern perde a cabeca por causade assuntos ultrapassados, Em seu segundo centenario, a Revolucao

Francesa nao degenerou em uma celebracao nacional do tipo"Parabens a voce", como 0bicentenario da dos Estados Unidos, nem

em mero pretexto para aumentaro turisrno, Alern disso, 0bicentenario

fo i mais do que uma ocasiao puramente francesa. Em grande par te

do mundo, as meios de comunicacao de massa, da imprensa a tele-visao, deram-lhe urn grau de destaque raramente concedido a acon-

tec imentos que perteneem a urn unico pai s estrangeiro, e em uma

parte ainda maior do mundo as universidades coneederam-Ihe trata-

mento cinco-estrelas. Ambos comemoraram a Revolucao Francesa

na crenca de que foi relevante para as preocupacoes contemporaneas.

Pois a Revolucao Francesa foi , de fato, urn conjunto de aeon-

tecimentos suficientemente poderoso e suficientemente universal

em seu impacto para ter transformado 0mundo permanentemente

em importantes aspectos e para introduzir, ou pelo menos nomear ,

as forcas que continuam a transforma-lo,

Mesrno se deixarmos de lado a Franca, cujas estruturas legais,

administrativas e educacionais sao ainda substancialmente asestru-

12 4

turas dadas ao pa is pela Revolucao, que estabeleceu e nomeou os

depar tamentos nos quais os franceses ainda vivern, as mudancas

permani ntes que podem remontar a Revolucao Francesa sao subs-

tanciais, Metade dos si stemas legai s do mundo esta baseada na

codificacao legal que a Revolucao implantou. Pafses tao afastados

de 1789 como 0 Ira islamico e fundamentalista sao Estados nacio-

nais rerritoriais estruturados nomodele rrazido ao mundo pela Revo-

lucao Francesa, junto com mui to do nosso vocabu lario poli tico

moderno." Cada urn dos cienti stas do mundo e, fora dos Estados

Unidos, cada urn dos le itores deste l ivre , mesmo hoje pagam tri -

buto diario a Revolucao Francesa ao usar 0 s is tema metr ico que

ela inventou e propagau. Mais concretamente, a Revolucao France-

sa tornou-se parte das histori es nacionais de grandes areas da

Europa, da America e mesmo do Oriente Medic , par meio de seu

impacto di reto nos te rritorie s e regimes - sem falar dos modelos

polit icos e ideologicos dela der ivados e da inspiracao ou medo de

seu exemplo, Quem poder ia entender, digamos , a his t6ria alema

desde 1789 sem a Revolucao Francesa? Quem, de fato, poderia

compreender qualquer coisa da his toria do seculo XI X sem ela?

Alem disso, se alguns dos model os estabelecidos pela Revo-

IU 9ao Francesa , ou nela inspirados, nao sao mais de grande inte-

resse prat ico , como por exernplo a revolucao burguesa - embora

fosse pouco sabio dizer 0mesmo de outros modelos, como 0Esta-

do terri tori al fundado na cidadania ou "Estado-na9ao"-, outras

de suas inovacoes mantem seu potencial poli tico. A Revolucao

Francesa deu aos povos a nocao de que a histori a pode ser muda-

da por sua ao;ao.Deu-Ihes tambern, a proposito, 0 que ate hoje per-

maneee como a mais poderosa divisa jarnais formulada para a

polit ica da democracia e das pessoas comuns que eIa inaugurou:

"Liberdade, Igualdade, Fratcmidade'' . Esse efeito his torico nao

chega a ser negado quando se demonstra que, provavelrnente (comexcecoes passageiras) , a maioria dos franceses, mesmo a grande

maior ia das mulheres francesas , nunca se engajou na Revolucao,

ou foi pouco ativa, ou ate. em certos mementos, hostil a ela: ou

que, de qualquer modo, nunca foi muito entus iasta dos jacobinos ;

ou que a Revolucao Francesa vi sava sobretudo a urn govemo "em

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nome do povo" ,mas raramentc do povo, e muito menos pelo povo,

como e tambem 0caso da rnaioria dos regimes desde J 789; ou que

os lideres da Revolucao tendiam a identificar "0povo" com aspes-

s e a s " b em - pe n s an t es " , 0 q u e t a rn b em eo caso em alguns regimes.

A Revolucao Francesa demonstrou o poder das pessoas c~mu~s de

uma manei ra que nenhum dos governos subseqi lentes jamais se

permitiu esquecer - quando menos, na forma de e~e~ci tos des-treinados, improvisados, recrutados, derrotando a coalizao das me-

lhores e ma i s e x pe r im e n t ad a s tropas dos ant igos regimes.. . .

De fato, 0 paradoxo do revisionismo e que procura diminuira s ignificacao histor ica e a capacidade de transformacao de uma

revolucao cujo impacto extraordinario e dur~dour~ e absoluta-

mente 6bvio, a tal ponte que so pode ser negligenciado por uma

cornbinacao de provincianismo intelectual e visao estr~ita;42 ou

entao pela miopia rnonograf ica que c a doenca ocupacional dos

pesquisadores especializados nos arquivos hist6~cos, _

o poder do povo, que nao e a mesma coisa que a vers~o

domesticada que se expressa em eleicoes periodicas pelo sufragio

universal,

evisto raramente e mais raramente ainda exercido. Con-

tudo, quando e visto, como em muitos continentes e ocasioes no

proprio ano do bicenrenarlo da R~volU!;;ao :rancesa ---: qu~ndo

transformou os paises da Europa onental-, e urn espetaculo trre~

sistivel e impressionante, Nenhuma revolucao anterior a 1789 foi

tao decisiva, evidentc e imediatarnente eficaz. Foi 0 que transfer-

mou a Revolucao Francesa em uma revolucao, Nao pode haver

revisionismo em fatos como: "No comeco do verao de 1789,0 con-

flito entre 'aristocratas' e 'patriotas', naAssernbleia Nacional, pare-

cia 0 t ipo de luta sobre uma Consti tuicao que ja havia arruin~do a

maior ia dos pafses europeus ocidentais desde a metade do seculo

[".] Quando 0 povo interveio, em julho e ag?sto .deJ78?,' t rans-

formou 0 conf li to entre as eli tes em algo mu i to diferente ,quan-

do rnenos por terem trazido, em questao de sernanas, a colapso d?

poder e da administracao do Estado c d~ poder da ~Iasse do~-

nante rural no campo." Foi isso que dcu a Declaraciio dos Direi-

tos do Homem uma rcssonancia muito maior do que ados rnodelos

americanos que a haviam inspirado: que fez com que as inovacoes

126

III f

da Franca - incluindo seu novo vocabulario polnico _ fossern

mais rapidamente aceitas fora dela; que criou suas ambiguidades

e conflitos: e, 0 \ ue nao e menos importante. que transforrnou a

Revolucao Francesa no acontecimento epico, terrfvel, espetacular

e apocalfptico que Ihe deu certa singularidad« tao horripilante comoinspiradora.

Foi isso que fez COmque hornens e mulhcres pensassem na

Revoluyao Francesa como "a rnais ternvel e crucial sucessao de

acontecimentos em toda a hi s t o ri a " , '" ' F o i isso que fez Thomas Car-

lyle escrever: "A mim parece-me que, se houvesse a Historia cor-

reta (essa coisa impasslvel que charno de Histor ia) da Revolucao

Francesa, ela seria 0 grande poema de nos so tempo, cornu se os

homens que pudessem escrever a sua verdade valessem tanto quan-

to todos os outros cscritores e poetas''." E e isso que faz com que

seja sem senti dopara 0hisroriado- pincar e escolher aspartes desse

grande levante que merecem louvor e as que devem ser rejei tadas.

A revoluyao que se tomou "0 verdadeiro ponto de part ida da

historia do seculo XIX" nao e este ou aquele episodic ocorrido entre1789 e 1815, mas a seu todo."

Felizmente, a Revoluc;ao Francesa a inda esta viva. Pais Liber-

dade, Igualdade e Fraternidade e os valores da razao e do Ilumi-

n ism o - o s valores que consrnuram a civilizayao modern a desde

os tempos da Revoluyao Americana - sao rnais necessaries do

Quenunca, na medida em que 0 irracionalismo, a rel igiao funda-

mentalista, ° obscurantismo e a barbaric estao, rnais uma vez,

avancando sobre nos. E , portanto, uma boa coi sa que, no ano deseu bicentenano. tenharnos a ocasiao de pensar novamente sobre

os acontecimentos histuricos extraordinarios que ha dois seculos

transformaram 0 mundo. Para melhor.

I

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APENDICE

As pdg inas que se seguem, ret iradas dos cadernos de Allto-

nio Gramsci, antigo lider do Partido Comunista Italiano, escritas

em lima prisi io jascista em vtirios momentos entre 1929 e 1934,

indicam como urn revoluciondrio marxi sta ext remamente in-

teligente 1150U, tanto para fins de compreens iio his torica quanta

para a anal ise pol it ica contempordnea, aquila que julgava ser a

exper iencia e signif icado dojacobinismo de 1793-1794. 0 ponto

de partido sdo diversas ref lexi ies sabre 0 Risorgimento italiano,

cujo grupo mais radical . 0Partido da Ariio de Mazr ini, e com-

parado des fuvoravelmente com asjacobinos . Afora algumas oh-

servacoes interessantes sabre ()Jato de a "burguesia" niio ser ne-

cessariamen te a classe pol iti camen te dominante em "regimes

burgueses ", as notas de Gramsci retomam essencialmente a com-

paraoio (ruio mencionadai entre duas "vanguardas '' h is toricas:

os jacobinos. dentro da re/erencia a revo lucdo burguesa, e os

holchev iques - pe lo menos, na concepcdo de Gramsci sobre sua

versao italiana - na era da revoluciio socialista. Ficard evidente

que Gramsci v ia a tare fa dos revo luciondrios ndo apenas em ter-

mas de c lasse, mas (talvez princ ipalmentev em termos da naci io

dirigida por uma classe.

Para asfontes de interpretaciio dojacobinismo - essencial-

mente os escri tos do pes-guerra de Mathiez , que ele leu na prisi io

- e para um comentdrio critico mais completo, veja-se Renate

Zangheri , "Gramsci e i l giacobinismo", Passato e Presente 19:

Rivista di storia contemporanea (jan. abr: 1989): 155-164. () texto

aqui presente e retirado de Quintin Hoare e Geoffrey Nowell Smith,

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orgs., Antonio Grarnsci, selections from prison notebooks (Lon-

dres. Lawrence e Wishart, 1971). pp. 77-83.

Terceiro Estado ter ia caido nessas "arrnadilhas" succss ivas sem a

ent\.~ica acao dos jacobi nos, que se opuseram a carla parada "in ter-

rnediaria" no processo revolucionario e mandaram a guilhotina nao

apenas elementos da velha soeiedade que ainda resistiam, mas tam-

bern os revoluc ionarios de ontern - hoje transfo rrnados em rea-

cionarios. Os jacobinos, consequentemente, erarn 0unico partido

da Revolucao que avan~ava, na medida em que eies nao apenas

representavam as necess idades e aspiracoes imediatas dos indivi-duus f is icos reais que constitufam a burgues ia francesa, mas tam-

bern representavam 0 movimento revolucionario como urn todo,

como um desenvolvimento historico integral. Pois des representa-

Yam tambern as necessidades futuras e, uma vez mais , nao apenas

as necessidades daqueles individuos ffsicos particulares, mas tam-

bern de todos os grupos nacionais que tinharn de ser ass imilados

ao grupo fundamental existente. E necessario insistir, contra uma

escola de pensamento tendenciosa e fundamentalmente anti-his-

tor ica, que os jacobi nos eram realistas nos moldes de Maquiavel ,

e nao sonhadores abstratos. Estavam convencidos da verdade abso-

lu ta de suas divi sas sobre a igualdade , fra temidade e liberdade e ,

o que e mais importante, asgrandes massas populares que osjacobi-nos agitavam e levavam para a luta estavam tambem convencidas

de sua verdade. A linguagem dos jacobi nos, sua ideologia . seus

metodos de ar;ao. ref letiam perfeitamente as exigencias da epoca,

mesmo se "hoje", em uma situacao di ferente e depoi s de rnais de

urn seculo de evolucao cultural, possam aparecer como "abstratos"

e "freneticos". Naturalmente eles ref letiam aquclas exigencies de

aeordo com a tradicao cultural francesa. Uma prova disso c a

analise da linguagem jacobina que pode ser encontrada em A

Sagrada Familia. Outra e a concordancia de Hegel , quando con-

siderou paralelos e reciprocamente traduziveis a linguagem polfti-

co-juridica dos jacobi nos e osconccitos classicos da filosofia alerna

- que, hoje se reconhece, tinha 0 maximo de concretude c foi a

fonte do histori ci smo moderno. A primcira necessidade foi a de

aniquilar as forcas inimigas, oupelomenos reduzi-las a impotencia,de modo a tornar uma contra-revolucao impossfvel. A segunda foi

a de ampl iar os quadros da burguesia como ta l. e colocar tai s qua-

Sobre 0 t ema do jacobin ismo e do Partido da Acao, urn e lemento

a ser esclarecido e 0seguinte : que os jacobinos ganharam sua

funcao de par tido "dirigente" por uma luta de rnorte: eles l iteral-

mente "impuseram-se" a burguesia f rancesa, levando-a a uma

posicao bern mais avancada do que aquela que 0 nucleo burgues

originalmente forte teria espontaneamente desejado assurnir, e ate

mesmo bern mais avancada do que aquela que as bases his toricas

teriam pennitido - dai as varias formas de recuo e a funcao de

Napoleso I. Essa caracterfst ica, propr ia do jacobinisrno (e antes

dele, tambem de Cromwell e dos Roundheads) e, portanto, de toda

a Revolucao Francesa, que consist ia em (aparentemente) forcar a

situacao criando faits accomplis irreversfvei s, e em urn grupo de

homens ext remamente energicos c de terminados levando a bur-

guesia adiante com chutes no traseiro, pode ser esquernatizada do

seguinte modo. 0 Terce iro Estado era a menos hornogeneo; pos-

sufa uma elite intelectual mui to desigual e urn grupo muito avan~a-do economicamente, mas polit icamente moderado. Os aconteci-

mentes desenvol veram-se em direcoes extremarnente jnteressantes.

Os representantes do Terceiro Estado inieialmente colocaram ape-

nas aquelas questocs que interessavarn aos rnembros f ts icos reais

do grupo social, seus interesses imediatamente "corporativos" (cor-

porarivos no sentido tradicional , de interesses imediatos e egois -

ticamente estreitos de uma categoria particular). Os precursores da

Revolucao eram, de fato, reformadores moderados , que gri tavam

muito alto mas de fato demandavam muito pouco. Gradualmente,

uma nova eli te foi selecionada, a qual nao se preocupava sornente

com as reforrnas "corporat ivas", mas tendia a conceber a burgue-

sia como 0 grupo hegemonico de todas as forcas populates . Essaselecao ocorreu pela acao de dois fatores: a res istencia das antigas

forcas sociais e a ameaca internacional . As antigas forcas nao que-

r iam conceder nada e, quando concediam alguma coisa, 0 faziam

com a intencao de ganhar tempo e prepara r a contra-ofensiva . 0

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dros na chefia das forcas nacionais : isso s ignificava identif icar os

interesses e demandas comuns a todas as forcas nacionais, de modo

a colocar todas essas forcas em movimento e leva-las a luta, obten-

do dois resultados: a) 0 de opor urn alvo mais amplo aos a taques

do inimigo, ou seja, de criar urna rclacao polft ico-rnil itar favora-

vel revolucao; b) 0 de expropriar 0 inimigo de cada zona de pas-

sividade na qual Ihe sena possfvel recru tar exercitos do tipo da

Vende ia, Sem a pol it ica ag raria dos jacobinos, Pari s teri a tido aVendeia a suas portas. A resistencia da Vendeia, propriamen te

falando, esta ligada a ques r ao nacional ~ que se tornou amarga

entre os povos da Bretanha e, em geral , entre aqueles estranhos a spalavras "uma Republica unica e indivistvel" - e a polftica de

central izacao militar -burocratica - urn lema e urna polft ica a que

os jacobi nos nao podiam renunc ia r scm cometer suicidio. Os gi -

rondinos tentaram explorar 0 federalismo com 0 objetivo de esrna-

gar a Paris jacobina, mas as tropas provinciais trazidas a Par is ali-

nharam-se com os revolucionarios. Com excecao de algumas areas

marginais, onde a diferenciacao nacional (e lingufstica) era muito

grande, a questao agraria provou ser mais forte do que as aspi-

racoes a uma autonomia local . A Franca rural ace itou a hegemo-

nia de Par is ; em outras palavras, compreendeu que, para des truir

def init ivamente a Antigo Regime. t inha de formar urn bloco com

os elementos mais avancados do Terceiro Estado, e nao com os

moderados girondinos. Se e verdade que as jacobinos "forcaram a

mao", tambern e verdade que i sso se rnpre ocorreu na di recao de

um desenvolvimento his torico real. Pois nao apenas eles organi-

zaram urn governo burgues , isto e , f izeram da burgues ia a classe

dorninante - eles f izeram mais. Criaram 0Estado burgues, fizer-

am da burgues ia a classe dir igente e hegemonica da nacao; em ou-

tras palavras, deram ao novo Estado uma base permanente e cria-

ram a modema e compacta nacao francesa.

Que os jacobinos, apesa r de ludo, sempre permaneceram no

terreno burgues e demonstrado pelos acontecimentos que mar-

caram 0 seu f im como cas ta par tidaria em urn molde muito especf-

fico e inflexive l, e pela morte de Robespierre . Ao man ter a le i Le

Chape li er, most raram que nao desejavam conceder aos traba-

132

lI1ado~es0 direito de se organizarern; como consequencia, tiveram

de aprovar a lei do maximum. Em seguida, quebrararn 0 bloco

urbano de Paris: suas forcas de assal to , reunidas na Cornuna, dis -

persaram-se desapontadas, e 0 Termidor saiu vi torioso. A Re-

volucao tinha encontrado seus maiores l irni tes de classe. A polit i-

ca de a li ancas e de revolucao permanente havia terminado pe la

proposicao de novas questoes que , no momento, nao podiam ser

resolvidas: havia Iibe rado fo rcas elemcntares que apenas umaditadura mili tar ser ia capaz de canter.

Se na Ita lia urn partido jacobino nao foi formado, as razoes

devem ser procuradas no campo economico, ou seja, na relat iva

fraqueza da burguesia ita liana e no cl ima historico diferente da

Europa depois de 1815.0 limite alcancado pelos jacohinos em sua

polit ica de reativacao forcada das energias populares francesas a

se aliarem a burguesia, com a lei LeChapelier e a do maximum,

apareceu em 1848 como urn "espectro" que ja era ameac;ador-

e que foi habilmente explorado pela Austria, pelos velhos gover-

nos e ate mesmo par Cavour (deixando de lado 0 papa) . A bur-

guesia nao podia (talvez) esrender mais ainda sua hegemonia sobre

as cstratos populates - que ela havia conseguido incluir na Franca

- (nao podia mais por razoes subjetivas do que obje tivas): mas a

ar;ao dirigida ao campesinato era certamente sempre possfvcl. Hi

diferencas entre a Franca , a Alemanha e a Itali a no processo pelo

qual a burguesia loma 0 poder (relativamente a Inglaterra), Na

Franca 0 processo foi mais rico em seus desenvolvirnentos e em

elementos polit icos ativos e positives. Na Alemanha, ele evoluiu

em termos que se assernelha rn, em certos aspectos, ao que acon-

teceu na Italia e, em ou tros, ao que aconteceu na Ingl a terra. N a

Alemanha, 0movimento de 1848 falhou como resultado da escas-

sa concentracao burguesa (0 lema de tipo jacobino Io i fomecido

pela extrema esquerda democratic a: " revolucao permanentc") e

porque a questao da renovacao do Estado estava entrelacada com

a questao nacional. As guerras de 1864, 1866 e 1870 resol veram

tanto a questao nacional como, de uma fonna inrermediaria, a

questao de classe: a burgues ia obteve 0 poder economico-indus-

trial , mas as velhas classes feudais permaneceram como 0 estrato

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governamental do Estado politico, com amplos privilegios corpo-

rat ivos no exercito, na adminis tracao e na terra. Contudo, se essas

velhas classes conservaram tanta importancia na Alemanha e

gozaram de tantos privi legios , pelo menos elas exercitaram uma

funcao nacional e tornararn-se os "intelectuais" da burguesia, com

uma indole particular conferida por sua origem de casta e pela

tradicao, Na Inglaterra, onde a revolucao burguesa aconteceu antes

que na Franca, ternos um fenomeno semelhante ao alemao, de fusao

entre 0 velho e 0 novo - e isso apesar da extrema energia dos

"jacobinos" ingleses, os Roundheads de Cromwell . A velha ari s-

tocracia conservou-sc como 0 estrato governante, com cer tos pri-

vilcgios, e tambem tornou-se 0 estrato intelectual da burguesia

inglesa (deve-se ac rescenta r que a ari stocracia inglesa tern uma

estrutura aberta e continuamcnte se renova com elementos vindos

dos intelectuais e da burguesia) , Na Aiemanha, apesar do grande

desenvolvimento capi ta lista , a s re lacoes de c lasse c riadas pelo

desenvolvimento indus tr ial - alcancados os l irni tes da hegemo-

nia burguesa e revertida a posicao das classes progressistas -

induziram a burgucsia a nao lutar com toda a sua forca contra 0

velho regime, mas perrnit ir que uma par te de sua fachada subs is-

t isse, arras da qual ela pode dis farcar sua propr ia dominacao real.

134

I '

I

II

\

NOTAS

PREF.4cIO (pp. 9-15)

(1) Publicado em Le Monde, IIj an. 1988.(2) Jonathan Clark. Suplemento Literar io do Sunday Times. 21 ma i, 1989.

p.69.

(3) UlTIa vez que 0 p re se nt e a ut or , c et ic o a r es pc it o do revisionismo politi-

co. tern s ido estreirarnentc associado com esta revis ta , nilo pos>o ser acusado de

nan te r i nt er es se nos novos pont os de par ti da da pesqui sa h is to ri ca sob re a Re -

volucao Francese.

(4 ) Ve ja- se E . J. Hobsbawm, 'The making of a bourgeoi s revo lut ion" in

Social Research. 56. n" I. 1989. P D - 10· J •

(51 "Schon mit e iner gewissen Selbs tverstandl ichkei : gebraucht". Ernst

No l t e . Marxismus und lndustrielle Revolution. Stu t tgart . 1983. p . 2 4.

I. U MA REVOLU(:AO DE CLASSE MEDIA (pp. 17-46)

( I) JHolland Rose . A centurv of continental history: 1780-1 880. Londres,

1895. p. I.(2) Allgemeine Geschichte von Anfang der his tori schen Kenntni s: his auf

unsere Zeiten. Brauschweig, 1848. v. 9 . pp . 1 ·2 .

(3) Ib id.

{4) Veja-se Barton R_Friedman, Fabricating historv: English writers all/he

rrencn Revolution, Princeton. 1988. p. 117.

(5) Francois Furet & Denis Richer. Ia Revolution Francoise, Paris . 1970.

( 6) E be rh ar d S ch m it t c M a th ia s M e yn , "Ursprung u n d C h a ra kt er d e r F r an ze -

si schen Revolution bei M a rx u nd Engels" . inErns t Hinrichs. Eberhard Schmi u &

Rudolf Vierhaus, orgs. l im Ancien Regime zur Franrsosi schen Revolut ion, Giit-

tingen. Varulenhoeck e Rupprecht. t 978. pp. 588-649_

0) Past & Present. 60. 1973: 469-496; e em Douglas Johnson, org. French

.1O('iel\· and 1111 'Revolution. Camb r i dge . 1976. p. 90.

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(H JMarx pa ra Weydemeye r, 5 de ma rco de 1852; Marx para Engel s, 27 de

ju l h o de 1854, In K arl M a rx & Frederick Engels, Collected works. Londres , 1983,

v. 39, pp, 62-3: 473-6,

(9) Veja-sc seu art igo "L'cspr it de Ia Revolut ion" . pos tumamente publica-

do, InOeuvres du Comte P_ L Roederer publiees par son fils A. M. Roederer, Par i s ,

1854, v, 3, pp. 7,10-1.

(10) Marcel Gaucher. "Les iettres su r l'histoire de France de Augustin Thier-

ry" , in Pierre No r a , erg. Les lieux de memoire, v . 2 de La Nation. Par i s . 1986, p.

271

(II) Augus t i n Thierry, Essai sur l 'his toire de laformation etdes progres du

ners Etat. Paris, 185.1. D-21.

(12) Lionel Go s sman . Augusti n Thie rr y and li be ral h is to riography and

theory, Beiheft 15. Middletown, 1976: 37-9 (para referencias),

(13) Francois Guizot, in Pierre Rosanvallon, mg. Histoire de la civilisation

en Europe. Pans, P lur ie l, 1985 . p . 181.

(14) Ibid. , p . Ul2.

(15) Ibid . . pp, 181-4.

(16) Ibid, p_ 183,

(17) w . G. Runciman, "Unnecessary revolution: th e ca se of France" , in

Archives Europeennes de Sociologic, 24, 1983 : 298

(Ill) Pau l I r nb s . o r g , Tresor de la languefrancaise; dictionnaire de la langue

d u XiX e t d u XX siecle. Par is , 197I ; v. 5, 1977. p. 143-4; v, 10, 1983, p. 927.

( 19) E mais cornumente a tr ib uid o a J. C. M . V ince n t d e Goum ay (17 12 -

J759)_

(20) La grande encyclopedic. Paris, s/d, 30, verbete "Smith, Adam",

(21) Catalogue genhal des l ivres imprimes de la Bibliotheque Nat ionale .

Paris, 1948_Pode-se acre seentar qu e duas edicoes ing lesas tarnbem foram adquiri-

das durante esse pcr todo (1799, 1814) . em adicao a" Ires prirneiras edi~{Je!ique ja

e st avarn h i an te s de 1789, e a edic ao (i ng les a) conc isa do t rabal ho (1804 ). Uma

traducao f rancesa de Philosophical essays, d e A _ S mith , ta m b ern foi p ub li ca da e m

1797.

(22) A p nm ci ra discussao est! em A. Bezanson, "The early use of the term

I nd us tr ia l R ev ol ut io n" , i n Quarlel.,. journal of Economics, 36. 1922: 343-9: e t am-

bern ern EmSI Nolle, Marxismus und lndustrelle Revolution. Stuttgart . 1983, pp.

23-5.

(23) Victor Cousi n, Introduction to the history ofphilosophv; trad. Henn ing

Gottfried Li nbe rg . Bost on, 1831, p . 8 .

(2 4) C ours de phi losophic par V COUSiIL' introduction iI Iii histo ire de la

philosophie. Paris, IH28, pp _ 10-2,

(25) Ibid. . p , 14-5, Minha r raducao.

C!61A. F Migner, Histoire de laRrvolution Francoise depuis 1789 jusqu 'ell

1814, Par i , UN8. v, I, p _ 15_

em Ibid. . pp. 206, 209_

136

(28) Uso a t raducao fei ta presumivelrnente pelo organlzador , In Wal ter Si-

moo. mg. French liberalism /789- J sss. Nova York. 1972, pp _ 139-43.

( 2 9 ) Alexis de Tocqueville, Recoliections. 1. P. Mayer, org. Nova York.

1 949 , p. 2.

(30) Ibid.

(31) Tocqueville, A.1IClenRegime, t rad. M. W.Paterson. Oxford, 1947. p_2:},

(32) Runciman, "Unnecessary revolut ion" , p. 318: Jacques Sole. La revo-

lution en questions. P ar is , 1 9H ~ , pp. 2 7 3 , 275.

l33)Lorenz Stein, Der Socialismus und Communismus des heutingen Frank-

reich: Ein Beitrag zur Zeitgeschichtc, 2' cd. Leipzig, 184lL pp, 128-9,131,

(J4) Ibid.

( 35 ) G u iz ot , Histoire de la civilisation, p. 1 81 - 2 .

(36) Ha u m a d is cu ss ao cornple ta em l ii rgen Kocka & Ute Frevert , ergs.

Burgertum 1m 19 Iahrhundert, 3 v,M u ni qu c, 1 98 8, e sp cc ia lm e nt e v. 1 , p ane I,

( 37 ) G o ss am n , Thiem', p. 40 .

(38) Thierry. Tiers Etat . Dp. 76-7.

(39) Guizot, H i st o ir e d e 1 1 .1i vi li s at io n . pp . IH2-3,

(4-0 ) Ibid., pp. 287-8.

( 41 ) C f_ G ui zo t in S im o n. o rg : French liberalism, p. 108_A i nf lu en ci u ta nto

sobre a equacilo de Thie rr y de ra~a e lu ta de c las se quant o sob re 0 Iivro Ivanhoe,

de Walter Scan. e evidente aqui,

(42) Lord Acton, Lectures on the French Revolution. Londres, 1910, p, 2,

As conferencias, publicadas postumarncnte , Ioram proferidas em 1895.

(43) Wilhelm Friedrich Volger, Ha n d bu c h d e r a l lg em e in e m W e t tg es c hi ch t e .

v. 2, pa rt e 2 : Neueste Geschiciue. Hanover , lS}9, p, 240.

(44) 0, Brunner, W. Conze & R. Koselleck, ergs. Geschichtliche Grunt/be-

wiffe. Stuttgart , 1972, verbete "BUrger" , pp. 7 I 5-6 _

_ . (45) Ibid, v. ), p. 747, verbcte "Revolution". Mesmo pO T vol ta do fi na l do

seculo, 0 mesmo tema ainda aparece no Brockhaus Converscuionslexikon, 13 ' ed.

L ei pz ig , 1 88 6, v, 13 . p. 6 5 2, a ru go " R ev o lu ti on ", As revo lucoes inglesae f rance-

sa sao agrupadas COIOIO "duas catas trofes que marcaram urna verdadeira vi rada na

vida cultural da Europa, as quais asoutras rnudancas violcntas da epoca estao mais

o u m e no s Iigadas".

( 41 '1 )E m s e u l i v ro Politique liberate ()Uladefense de laRevolution Francoise,

1860, citado em Alice Gerard. La Revolution Francoise: mvthes er interpretations

17119·1970. Paris, 1970.

(47) [b id. , p . 34_

(48) Em "Char ti srn" , in Cnuca! and miscellaneous essays. Londres, 1 8 9 9 . v,

4.p. 149.Carlyle argumenta que a Revolucao Francesa nao esta ainda completa: "Foi

uma revolta das classes baixas oprimldas contra as classes superiores opressoras ou

indiferentes: nao foi urna revolta somente franccsa: nao, foi uma revolta europeia".

(49) Especialmente em seu extraordinario documentario dramatizado Dan-

IOI1S Tod.

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(50) Friedrich Lis!' Schriften, Redell, Briefe , Berlim, 1932, v. I. p. 286 , A

pas sagem esn i s ern da ta , mas fo i e sc ri ta entr e 1815 e 1825 ,

(51) Carl Richter. Staats=: lind Gesellschaftsrecht der Framrosischen ReI-

olution ~Ol! 17fl9his 1804. Bcrlim, ISM, v, 1, p. viii.

(52) Vejase Constant V. Wurzbach, Biographisches Lexicon der Kaiser-

t h ums O s te r r ei c h . Vicna, 11l74. v, 26, p. 63.

(53) Cf. "La classe moyeune est arr ivee aupouvoi r" , de Maurice de Guerin.

"Correspondance 1824-1839", Oeuvres completes. ed. B . d 'Harcour t. Par is , 1947,

p. 165 r a c ita ca o e de 1834). Ed o u a r d Alletz , De fa democratic nouvel le ou de;

moeurs et de lapuissance des classes movennes en France. Paris, 11137,2 v, Jules

Michele t, "La classe moyenne bourgeoise, dont la par ti e Ia plus inquiete s 'agi ta it

aux Jacob ins " i n Histoire de la Revolut ion Francaise , ci tado no Dictionnaire

Raben. Pur is , 1978 ,v . 4 , p . 533 .

(54) Thierry, Reorganisation de la .weihi europeene, III14,citado em Goss-

man, Thierry, p. 37.

(55) Citado em Simon, French liberalism, p. 142.

(56) Para urna visao gerai da evolucao da palavra como urn termo pol it ico,

vcr o art igo "Libera li smus". de Ulr ich Dierse, inJoachim Riner & Karlfricd Gri.in-

der, ergs. Historisches wanerbuct: der Philosophie. Basel-Stuttgart , 1980, v, 5,

eels. 257-71, que diz que seu usn - pO T futures l iberai s como Sieyes e Constant

- niiocra ainda suficienternente especff ico antes de 1814.0 primeiro grupo pol [ti-

co com 0 nome "l ibera l" f oi encont rado na Espanha , em 1810, onde depu tados

f or am agrupados em "li bcr al es " e "s er vile s"; a t erminologia e spanhola fo i s em

diivida influente panl assegurar a sor te do termo,

{571Alber t Venn Dicey, "Taine' s origins of contemporary France" , in The

Nation, 12abr . 1894, pp. 274-6.

(5)!) Runciman, "Unnecessary revolution", p, 315: cf. Francois Furet, Inter-

pret ing th e French Revolut ion. Cambridge, 1981, p. 1 1 9 .

(59) Tocqueville, Ancien Regime. p . 176 .

(60) Citado em Gussman, Thierry. p. 39.

(61) Citado em Simon, French liberalism, pp. 149-51.

(62) Rene Sedillot, l.e COllI de la Revolution Francoise. Paris, 1987, pp. 282-7.

(63) Mas, e claro, embora c e ri c os v e jam um "bi lan globale tnent negat if " na

agr icult ur a, como em toda pa rte , mesmo Sed il lo t nao nega, r ea lmcn tc , que "os

carnponeses ganhararn rnais do que perdcrarn" ( ibid., pp. 173.266), ou seja, ( )que

todo rnundo tornava pm cer to no seculo XIX.

(64) ESSil_VJ on the early per iod of the French RI'~'oIUl ;otl by the late John

Wi/son Croker. Londre s, 18S7, p , 2 .

(65) Ibid.

(66) Nouvelle biograph;" ginerale. Paris, 1855, v, 13, p. 810 . Leit or es do

seculo XIX niin precisavam ser in fo r rnados de que Factonte foi um ast ronauta pre-

maturo da mitologia grega que fOI incinerado quando sua car ruagern chegou muiro

per to do Sol .

(67) "l a s egunda pane ( lncompl era ) de seu li vr o Anc ier Reglme, Veja-sc

Alan Kahan, "Tocquevillcs two revolutions", Journal ofthe Hi.l"IOJ~\· oIldeas . 46.

1985: 595-6.

(68) Citado em Stanley Mellon. The pol it ical uses of his tory: a s tudv ofhis-

torians in the French Revolution. Stanford, 1958, p. 29.

(69) Ibid.

(70) Gossman, Thierrv, p. 7.

(71) Para esse t ipo de argurnento, veja-sc Mel lon, The Poli tical uses of his -

torv , pr. 47-52.

(72) Stein. Dcr Socialismus, jl. 133.

(73) Citado em Simon, French liberalism, p. 110.

(74) Ibid. . p. 112 e 113.

(75) Citado de "Bezwaaren regen den geest der eeuw" (1823) na entrada

"Liberalisme" do woordenboek der Nedertandsche Taal, v . 8. parte 1. The Hague,

1916, p. 1874.

(76) Mignet, Histoire, p. 207.

2. AL£M DA BURGUESJA rpp . 47·80)

(I) Maurice Agulhon, La Republique au village: Inpopulat ions du Var de

[II Revolution il la Seconde Republique. Paris, 1970.

(2) Cf. Hans Ulrich Wehler. Deutsche Gesellschaftsgeschichte Zweiter Band

/ R 1 5 -] R 4 9. M u n i qu e , 1 9 11 7 ,p p . 706-15; cf ta rn be rn a grande bib l iografia em ibid.,

pp. 880-2.

(3) Veja-se seu panflcto, dirigido a populacao rural, Der hessische Landbo-

te. 1834, in Georg Buchner , Wake urul Bnefe. Munique, Deutscher Taschen-

buchver lag, 1965, pp. 133·43.

(4) William Sewell, Work and revolut ion in France. Cambridge, 19110,pp.

198-200.

(." I ) Para bons exernplos de uma "Marselhesa-Prole taria" e daheranca icono-

g raf ic a c s irnbo li ca de 1789 , vej am-s e pp, 65 e 68 do vol ume da Bi bl io te ca Fel-

trinelli Ogni anne un maggio nuovo: i lcentenario del Primo Maggio, intr. deAnro-

n io P iz zinar o. Mi lan, I () ~8 . Esse volume do cen tenar io do Pri rneir o de Mai o f oi

p ub li ca do s ob u p atr oc in io d os s in di ca to s de r rabalhadores da Umbria. Veja-se

tarnbem Andrea Panaccione, org., The memory of May Day : all iconographic his-

tory of the origins and implanting of (]workers 'holidav. Veneza, Marsilio Editore.

1989. cspecialrnente pp . 290 (Dinamarca) , 295 (Suecia) e 3360uil ia).

(6) Lorenz Stein, Der Socialismus. 0 \'on vein depois, quando ()autor era pro-

fessor em Vicna.

(7) CL "The Commune asa symbol and example", inGeorges Haupt , Aspects

of international socialism. Cambridge e Par i" 1986 , pp. 23-47.

(8) "Souvenirs" . in Oeuvres completes. Paris. 1964, v, 12, p. 87.

138 139

 

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(9) Citado no art igo de fel ix Gilbert , "Revolution". inDictionarvoj the ius-

Ion' of Ideas, 5 v., Nova York, Scr ibner' s Sam, 1980, p. 159,

( 10 ) Ci tado em Norman Stone. Europe transformed 1878- J 91Y. Londrcs.

1983, p. 331.

(II) 6:118-123,ju1.J9J7. n. L p. II.(12) Geschichtliche Grundbegriffe, v 5, p 744, verbete "Revolution",

(13) Louis Blanc, Histoir« de la Revolution Francoise, Par is , 1874, v , 1 , p ,

121.

(14) Thierry, Tiers E t a l . [1. 2.

( 15) Marx & Engel s , Collected works, 39, p. 474.

(16) Veja-se Eric J. Hobsbawrn , "Marx, Enge ls and pol it ic s" i nE J. Hobs-

bawm, mg. The his tor; of Ma r x ism . \ -- iJ / um e1: Marx i sm in Ma r x '.I day. Bloomong-

ton, I0~2, Bernard Chavance, erg. Marx en perspective, Par is , 1985, pp. 557 -70:

Karl Marx & frederick Enge Is, "Moralising criticism and critical morality" (11147),

in Marx & Engels, Collected works. Londres, 1976, v, 6, p. 3 I 9.

(17) Samuel Bernstein. AuglH te Blanqui and the art of insurrect ion. Lon-

drcs , 1971, p. 270-5, Engels, "The Festival of Nat ions 10 London" in Collected

works, v. 6, pp. 4-5.

(18) Ihid. : e "The civil war in Swi tzer land", Collected ...orb", V. 6. p. 372;

Marx, "Moralizing criticism", Collected works. Londres, 1976, V. 6, p. 319.

(19) Karl Marx & Frederick Engels. Collected works, Londre s 1976, v . 6 ,

p.545.

(20) Veja-se Victor Cal ine, "Lenine et Ie jacobinisme". Annales Historiques

de la Revolution Francoise, 43. 1971, pp, 89-112.

(21) Daniel Guerin, "Cont roverse sur la Revolut ion Francai se '' , Cahiers

Bernard Lazare, l J9-20, Par is , 1987, pp. 58-81.

(22) Sabre a prevalencia da "Marselhesa" em circulos internacionais socia-

I is tas nudecada de 1l!90, d. Maurice Domrnanget, E u ge n e P o rr ie r : membre de la

Commune et chantre de t'lntemationale. Par is , 1971. pp. 144-6.

( 2 3) C i ta d o em Georges Haupt , Programm und Wirklichkeit: Die interna-

tionale sozialdemokratie vor 1914. Neuwied, 1970, p. 41.

(24) Geschichie del ' Revoltionszeit von 1789 bis 1795 (ln9 bis 18(0) [sic],

Dritte vermehrte un d verbesserre Auflage. 5 v, Dusseldorf . 1865- 1874. v . 1.

( 25 ) Como no ver be te "Bonaparti smus " i n Konversationslexikon, 9" ed,

Mannheirn, 1960, v. 4, p. 483.

(26) Veja-se Charles Rihs. La Commune de Paris 1871: sa st rUClUre et ses

doc/rilles. Paris, 1973, passim, especialmente ~ para a irnitacao do passado ~

pp. 58,59, 182 -3 . Para Delescluze, PD. 18 5-9 L

(27) Sanford Elwitt, The making (I f the Third Repub! ie; c lass and pol iucs in

France, /868-/884. Baton Rouge, 1975, cap. l.

(28) Para 0proprio relate de Gar ibaldi , veja-se D. Mack Smi th, org. Garibal-

di: a portrait in documents. Florence, 191\2,pp. 13-4.

(29) Gerard, La Revolution Francoise, p. 81,

140

no ) Samuel H, Baron. Piekhanov: thefather ojRussian Marxism. Londres,

1%3, p. 3 5R .

(3I ) Cf. 0 discurso perante 0 Sov ie te de Sao Pet er sburgo em 5 de novern-

bro, relatado por Leon TrOIA)" 1905. Hannondswor th, 1973, Dp· 1~5 e ss

O:! j [Jaline, "Lenine et lcjacobini,me". p. 6.

(33) W.H, Chamber lin. "Bolshevik Russia and Jacobin France" in 711"Dial,

67, 12jul. 1919, pp. 14-6; Charles W.Thompson. "The French and Russian Revo-

lutions" in Current Historv MUK(Eine , New York Times. lJ jan, In . pp . 149-57.

1.34)Adam Ulam, Russia's Jailed revolut ions: f rom decembris ts to dissi -

dents, Londres, 19R1, pp . :~16-7,

OS) Leon Trotsky, Historv ojthe Russian Revolution. Londres , 1036, p. 194,

589,1204.

(36) Baron, Plekhanov, p. 3511.

(37) Karl Kautsky, Bolshevism at (I deadlock. Londres, 1931. secao. III d,

"Jacobins or Bonapar ti st s" , espccia lmente pp. 127. 135. A data da ed i cao alerna

original e 1930.OS) Cirado em Gerard, La Revolution Francoise; p. 81.

(39) l.e bolchevisme et lejacobinisme. Paris, 1020, p. 24,

(40) Daline, "Leninisrnc et jacobinisrue". p, 107.

(41) "Agora ap rovo, se rn re se rvas ~ a te mesmo com cnrus ia srno - 0 vigor

[\'igore 1 e a aspcreza que Stalin usou contra aqucles considerados [indicari] inimi-

gos do soda Ii srno e agerues do imper ia li smo. Confror itudo com a capitulacao das

democracies ocidentai s, Sta lin seguiu 11r isca a velha hcso do terror jacobino, de

violencia i rnplacavel na defesa da pat ria do socia li srno." Giorgio Amcdola , Let-

tere u Milano: r icordi e documenti, 1939-1945. Roma, 1973, pp. 17-8. Amendola.

como rnostra to regi SITO, e sta va l onge de s er ur n li una-dura sectario ou urn daque-

lcs que tern f idel idade ccga, Citado em Giuseppe Boffa , llfenomeno Stalin neila

storiu del XX secolo, Bari, 191\2,p. 137.

(42) Silvain Mol inier, in LlI Pensee. rnar-abr. de 1947, p. 116.

(43) Isaac Deutscher, Stalin: u poli tical biographv, ed. rev. Hardsmonds-

wor th, Penguin Books , 1966. [1. 5S0.

(44) Mahendra Nath Roy, The Russian Revolution. Ca lcu ta , 1945, pp. 14-

S. Trotsky. Russian Revolution. p. 663-4.

(45) Chamber lin, "Bolshevik Russia" , p. 14-25.

(46) Para refcrencias. veja-sc Boffa, II [enomeno S tu l in , p. 138; Stephen

Cohen, Bukharin an d the Botschevik H('l 'OluIIOI1.Londres , 1974, pp. 131-2.

(47) "No entanto, devernos admit ir no]c que a analogia doTermidor scrviu

ma is para obs cu recer a que stao do que para clarifica-la". The workers' s tare and

the q u es ti on n f T h er m id o r and Bonaparusm (1935). Londres , 1973, p. 31.

(4~) isaac Deutscher, The prophet unarmed : Trotskv, 1921-1929. Oxford.

1970.

(491 lhid. , pp. 312, J 13.

(50) lbid., p, 312.

141

 

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(51) I b id . . p_437.

(51) lbi lL pp. 435-7.

(53) Ib id. , p. 437_

(54) Ibid. , pp. 458-9.

(55) Essa e a ve rs ao de Cohen , em Bukharin, p. 13I , Deutscher , em Prophet

unarmed, pp. 160-3, e m a is n u an c ad o .

(56) Deutscher, Prophet unarmed, pp. 342-5,

(57) Ibid. . P , 437 ,

(58) Roy, Russian Revolution, pp. 14-) ,

( 59 ) Incli ne -me a acei ta r a op in iao de Moshe Lewin em Lenin's las/ strug-

gle, Nova York , 1968. E le ere que Lenin . em xeus ii lt imos anos , su st ent ava a

e vo lu c ao g r a du a l , : - 1 0 e n ta n to , a q u es ta o e e sp ec ul au va , e rn b or a h oj e t en ha s e t or -

nado pol it icamente impor tantc r ia lJRSS. Len in dci xou sua a tiv idade e fe ti va e rn

marco de 1923. Podemos apenas adivinhar 0que ele poder ia ter pensado ()lJ feito

caso vivesse para j ul ga r a s it ua ca o em 1927 ou 1 93 7 .

(60) Cirado em Cohen, Bukharin, p. 133.

((i1) " M e lh or p ou co s, m a s m e lh or es " in Pravda, 2 mar . 1923, publ icado em

Collected works, 4" ed. Moscou, 1960 , v. 38, pp, 487-502,

(62) A f r as e f o i-m e dita por um especia li sta em his toria do bolchevismo que

aouviu ern Moscou. A consulta a especialistas no periodo inicial ci a hist6ria sovieti-

e a d a G ra -B re ta nh a, E sta do s U nid os e U nia o S ov ie tic a n ao co ns eg uiu Ie va n tar

nenhumu fonte p oss f vel para essa f rase , nem nos escri tos nao t raduzidos de Lenin

nem na l it eratura nar ra ti va sobre seus ulr imos anos,

(63) Georg Fmler.lm Anhlick des grossen Rodes, Schriften zur Revolution.

mg. R. R . Wuthenow. Darmstadt-Neuwied, 1981, pp_ 133-4.

(64) (7 !iOY O. S. 1917) , Collected works, v, 26, pp. 291-2_

(65) Collected works, v, 24, p. 267 (Discurso a 7 ' Conf erenc ia de Todas as

Russias do RSDLP, abr, 1917).

(66) "Carta <lOS trabalhadorcs americanos't.In Collected works, v, 28, p. 1;3.

(67) "Pol i t ica l par ti es in Russia and the tasks of the prole tariat " (abc 1917) .

Collected works. v, 26, pp. 171-2.

(68) "On the revis ion of the par ty programme" (out. 1917) . Collected works,

v. 26. pp. 171-2 .

(69) Citado em Rober t C. Tucker, The Lenin anthology, New York, 1975,

p.706,

(70\ Ibid.

(71) Evgenii Ambarzumov, "Gorbatciov, guardat i dai burocra ti " in Unite!'

29 rnai, 1989, p. I,Amba rzumov estava re alment e enganado: em 1789, 0 Ter-

ce ir o Est ado t inha dois deputados par a cada u rn dos outr os doi s Est ados, c a ssim

fo rmava me tade da a ss embl ei a to ta l. Tal vez is so se ja ur n s inal de que, embora

a memoria da Revolucao Francese esteja v iv a e m tc rm os gerais, s e te n ta a n os

diminu ir arn s eu conhec imen to deta lhado na Russi a, 0 qual foi outrora tao

admi ravel ,

3,DE eM CENTENARIO A OUTlW (pp- 81-1(4)

(1) E. J. Hobsbawrn &Terence Ranger, orgs. The iHVentioll oftradition. Cam-

~ . i dg e, 1 9R 3. p . 2 72 .

(2) Vcja-se M_L Neiman, "Lcninskii plan 'rnonumentalnoi propagandy' iper-

vye skulpturnye pamyatniki' ' in lstoriva Russkogo lisskusstva _Moscou, 1 9 5 7 . v. 6.

pp, 23 -53 . Ele d iz que Len in chegou a ideia atraves ci a utopia de Tomrnaso Cam-

panel la "Cidade dosol" , Para urn breve esboco doepisodic em inglh, veja-se Chr is -

line Lodde r , Rus s ian con s t ru t i v ism . N ew Haven, C o n n. , Y a le University Pre s s , 1933 ,

pp. 53 e ss. A. Stiigalev, "S. Kunenkov imonurnentalnaya propaganda", Sovietskava

Skulptura, 74 , MOSCOll, 1976: 210-- -223 , fornece detalhes de como a l is ta de 66 cmi-

ncntes personal idades fo i mont ad a e r no st ra UI l1 Hto to de Lenin descobrindo 0 mo-

numen t o Stenka R az in d e K o ne nk ov n a P r a ca V er m el ha . E nt re 1918 c 1920,25 mo-

n u m en to s f or a m e r gu id o s em M o s co u e quinze em Leningrado. Sov ie t skoe l s skus s t v o

20 - .' )0Godakh . Lernngrado, 1988, prancha 41 , reproduz 0 relevo de Robespicrrc feito

por Lebedeva. Par a outra s fo to s dos monument os de 19lR vej a- se Lodder, Con-

s t ru c t iv ism ; l s to r i va R u s s kog o l s sk u s st v a X I , S e r d z om S l us h a y a R e v ol u ts i ya : t s sk u ss t -

1'0 Pervikh Le i OkNahm. Leningrado, 1 9 7 7 : e Shagi Sovietov: Kinokamera pishet

istoriyu 1917-1936' Moscou, 1979, que reproduz totografias de noticiarios filmados.

(3) The Times, 4 maio 1~!i9, p. 7a.

(4) Ibid,

(5) New York Times , 14 j ul. 1 ~ 89 _ p, 9.

(6) Pascal ory. "Lc c en te n ai re d e l a R e vo lu ti on F r a nc ai sc " in Pierre Nora,

org. Les lieux de memoire, V. I, I~ Republique. Par is , 1984. pp, 523-60, para tudo

is so c rnais sob re os a spect os f rancese s do centenario .

(7) Henry Dunckley, "Two political centenaries". Contemporary Review, 55.

1988: 52"72 .

(8) "Lord Acton on the French Revolution". The Nation. 92, 30 mar . 1911 ,

p_ 3 1 H ~ 2 0 . Lord Acton, Lecture S VII 1I!t!French Revolution. Londres, 1910. foi p l t -

blicado postumamente.

(9) "Le banquet du ccntenaire de 178')" in A. Leroy Beaul ieu , La Revolu-

l ion et Ie libcraiisme. Par is , Ig90. pp. l -g4.

(10) "The centenary of 1789" . E d in b ur gh R e vi ew , V. 169, pp, 519-36.

( II ) "Tainc' s conquest of Jacobins" . Edinburgh Review. 155 : 1-26.

(12) Ibid.

( 13) B. M. Ga rd ine r, i n The Academy, 27, 4 abr, 1Rf \5 , pp, 233-4.

(14) Edinburgh Review, "The centenary", pp. 521-2.

(15) Ibid. , pp. 534-5.

(Iii) Go ldwyn Smi th, "The invitat ion to celebra te the French Revolut ion" .

National Review, ago. de 18)18,729-47: "The Centenary of 17R9" : 522_

(17) Ibid.

(i8) Ed inburgh Review, A. R. D. Eliot, "The French Revolution and mo-

dem France". Edinburgh Review, "The centenary". p . 5 24 _

142 143

 

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(iYJEdinburgh Redn,., "The Centenary". 524

(20) Smith, "Invitation", p. 743.

(21) The Times, 27 ago. 1889. p ..t"A revolucao e a te agora: urn fracasso,

I reze const ituicoes em urn secu10 [ .. .1 refletcrn abertamente as poucas l u z e s dos

homens que conduziram a cssa instabilidade cronica."

(22) Resenha de Alphonse Auiard, French Revolution, in The Spectator . 15

out. 1910, p. 608.

(2)) Smith, "Invitation", p. 745,

(24) Frank T. Marzials, "Taines Revolution", London Quuterly Review, 66.

abr, 1886, pp. 24-48,

(25) A. V . Dicey. "Taines gouverncrnent revolutionnaire", The Nat ion, 40,

26 fcv. 1885, pp . 184-5.

(26) Dicey, "Taine's origins". pp . 274-6,

(27) "M. Taine on the Jacobin Conquest" . The Spectator, 55, 18fev. 1882,

p. 232-4. The Nation, 40,5 mar . 1885, pp. 2(}6-7.

(28) Acton, Lectures on the French Revolution, pp. 345-73.

(29) Huber t Bourgin, De Jaures a Leon Blum: I 'Ecoie Normale et Lapoli -

tique. Par is , 1938, p. 271.

00) Alphonse Aulard, Histoire politique de la Revolution Francoise, Y cd.

Paris, 1905.

(31) IsSDse baseia- principal mente nDS indices de l ivros resenhados pelo

Times Lite rary Supplement desde 1902; nus Indices por assunto do Museu Bri tani -

CD (agora Biblioteca Britanica) desde 1881; e nos indices de bibliotecas de pesquisa

na area de Los Angeles ,

(32) Os indices por assunto SaO para os anos de 1881 a 1900 e, portanto,

por penodos de cinco anox. Julguci que na o val ia a pena anali sar a lem do pri rnei I'D

volume. A est imar i va esta baseada em uma conragem aproxirnada de uma coluna

de t ftulas l is tados sob a rubrica geral Franca, Historia, Revolucao, Consulado I

Imperio, 17'69-1815, sendo que secalculou que cada coluna t ivesse 25utulos antes

de 1950 . e v in te apos 1950 . Os t itu los que sc r ef erent a Napo le ao e a histcria mi -

Ii ta r - o s qua is norma lmen te fo rmam a rnai or pa rte da lis ra - fo rr un omi ti dox,

ja que se pode presurnir que requerern uma lei tura de interesse diverse .

( 33 ) No Museu Bri tani co . Mi rabcau consegu iu onze t it ul os de 18HI a 1900

{em todas as l fnguas) ou urn t itulo a cada ano: catorze ent re 1901 e 1910, ou 1.4 por

ano. Entre < 1 . ' ; guerras , conseguiu nove utulos, ou menos que Ulll a cada dois anos,

(34J Dois dos qualm utulos sobre e le . adic ionados de sde a guer ra . s ao em

russo. Seus escritos forarn traduzidos p ard D russo em 1923 e em 1956, Great So-

viet encvclopedia, edicao inglesa , art igo: Marat . 0 l ivre de l.Stepanov 1. P . Marat

and his struggl« against counter-revolution chegou a tcr sei s edicoes po r volt a de

1924. Victor Daline, "Leninc et jacobinisme", Annates His toriques de la Revolu-

tion Francoi s e , 43, 1971: 92 .

(35) Jacques Godechot, Unjury pour ia Revolution, Par is , 1974, p. 319.

(36} Collected works, V. 26, pp. 132- IH A adrn ir acao de Leni n por Danton e

144' 1 · · · · , ' .

.. . ; ; ;

part icul armente s ig ruf ic ati va, uma vez que e le usa Dan ton pa ra per suadir s eus

cama radas da neces si dade da Revo lucao de Ou tubro e do modo como d ir ig tr ta l

insurreicao,

(,17)Ernest Labrousse, l.a crise de / 'economiefrancaise u lafin de I'Ancien

Regime et au debut de la Revolut ion. Paris, 1944; "Comment naisxent lex revolu-

r ions", in Acte , du Centenai re de 1848. Paris, 1948.

(38) Emmanuel le Roy Ladur ie , Parts-Montpellier: P. C. - P . S. U.. 1945-

1963. Paris. 19R2.

(39) P. M.lacobs, History thesis 1901·1970. Londres, 1976.

(40) Hommuges a la Revolut ion. Paris, 1939. Lson IIest Plus, 4 v. Paris,

1937.

(41) Alben Mathiez, La v ie c he re e t le m ou l'e me nl .'o e/a l w as la T er re ur :

Pari.". 1927; Georges Lefebvre, Les paysans du Nord pendant la Revolut ion Fran-

raise. Par is , 1924; Alber t Sehoul, ' " " S sansculot tes paris iens en l 'an If. Mauve-

ment populaire et gouvernement revolutionnaire, Paris, 1958.

(42) Para Ulll guia conveniente aos his toriadores da Revolucao Francesa,

veja-se Samuel FScott & Barry Rothaus, orgs, Historical dictionary o f the French

Revolution, 1789-1799,2 v, Westpor t, 1985; c . mais sucinto, 0 Blackwell dictio-

Ilary ofhistorians, 1987; mas nao se consulte 0 artigo de Francois Furet, "Hisio.re

u n iv e rs it ai re d e l a R e vo lu ti o n" , in F r an c oi s l -u r et & Mona Ozouf , orgs. Dict ion-

noire cri tique de fa Revolut ion Francoise . Paris, 1988 - 0 qual dcve s cr v ist o

como uma polernica pessoal que, em muitos cases, peca pm omissao,

(43) bnciclopedia itaiiuna, V. 14, verbete "Fascis tno" , p. 847.

(44) Vcja-se Antoine Prost, vocabulaire des proc l amat ions electorales de

18111, 1885 e 1889. Paris, 1974, pr. 52-53, 65.

(45) 'Types of capitalism III eighteenth century France", English Historical

Review, 79, 1964: 479-497; "Non-Capi ta li st wealth and (he origins of the French

Revolution". Am er ic a ll H i st o ri ca l R e vi ew , 79 . 1967: 469 -496. Ar ti go "Bour-

geoisie" em Scott & Rothaus, orgs. Historical dictionnary.

4. REVISAO QUE SUBSISTE (pp. 10~-27)

( I) John Mclvlanners , in New Cambridge modem his/on'. Cambridge, 1965.

v. 8, p. 1i51. Pard it rcscnha de Crane Brinton, History and Theon', 5, 1966: 315-320.

(2) Norman Hampson. "The two French Revolut ions". New York Review of

Boob. 13abr, 1989, p. 11-2; Sole, La tevotution ell questions, p . 15.

(3) Tbid.

(4) " Il faut enf in ceder it l a ncccssi te qui nos cnt ra ine, i l faut nc plus meccn-

naitre la marc he de la societe" in De la force du gouvernement actuel (/ de la

nece ss it e de s '.I ' rattier, uma defe sa do Dir et 6r io . Cit ado em M, Gaucher . "Ben-

jarnim Constant" , in Fouret & Ozouf, Dictionnaire cri tique de /0 Revolution

Fmn('QJ~e Par is . 19~8, p. 954.

14 5

 

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(5) Runciman, "Unnecessary revolution: the case of France", European Jour-

nal ofSociologv, 23,1982: 318.

(6) Sole. La revolution en questions, pp. 366-76, 372-3. 3B6-7. Soh: reco-

nhcce e speci fi camente que "le def erl ement des enquete s c t des hypothese s qu i a

suivi, outre-Manchc et outre-Atlantique, depuis une vingtaine danees, a contribue

it r enouvele r de fond en comble notr e comprehension des evenc rnen t s survenus

en France entre 17B9 e 1799", p. 13 ,

(7) A exposi cao ma is compl et a da v isao de Cobban e sta em seu liv re Tile

social interpretation of the French Revolution. Londres , 1964 . Par a s eu at aque

original, veja-se The mvth of the French Revolut ion, Londrcs, 1955,

(8) Runciman, "Unnecessry Revolution": vcja-se especialrnentc pp. 295,

299.301.

. (9) Furet. "Le cathecisme revolutionnairc", Annates t: S. C. 24. 1971: 261.

( 1O) Georges Lefebvre, Etudes sur ia Revolut ion Francoise (1963). Paris,

1954, pp. 340-1, 0 t exto foi escri to em 1932, Por exemplo:

So entanto. do modo como Jau r es 0 aprescnta, 1789 apar ece como urn even-

(0 t ao simp le s quan to i in ico: a causa da Revol ucao f oi 0 poder da burgue-

sia que havia chegado 11maturidade, e StU resultado forneceria a consagracao

legal daquele poder , Hoje, essa visao nos espanta por ser excessivarnente

sume ria . Em pr ime ir o luga r, nao exp lic a por que 0 advento da burguesia

ocorreu naquele rnorneruo e na o em algum outro c. mais particularmente,

por que, na Franca, rornou a forma de uma mutacao siibi ta , quando poder ia

mu lt o bern te r t or nado a fo rma de lima cvo lucao gr adual. quando nao pac i-

f ica, como ocorreu em out ros lugares . Sabernos agora que para a Revolucao

ter ocorr ido, como urn evento especf fi co, em 1789, foi neccssario haver uma

verdadeira combinacao de causas imediatas extraordinarias e lrnprevistveis:

uma cri se f inanceira cxcepcional e ser ia , devida 11Guerra Americana; uma

cri sc de desemprego, devida ao t ra tado come rc i a l de 1786 e a Guerra do

Oriente : e . t inalmente, uma cri se de a l imcn to s e de cust o de vi da dev ida a scol hei ta s fr ac as de 1788 e aoEd it o de 1787que aut oriz ava a expo rta cao de

cer ea ls e , port an to , e svazi ou os cel eiro s. Mai s do que i sso, no entanto, as

pr opr ia s c aus a, a l ongo p razo da Revol ucao pa recem-nos ago ra cada vel

mai s compl ex as . Foi de rnonst rado que a raLaO pela qua l a r nonarquia nao

podia ma is li da r com sua c ri se f inancei ra fo i que sua aut oridadc e st ava em

colapso, Como Mathiez nos mostrou, D rei nao estava mais em po>i~a(}de

g o v er n a r. [QU I ro s a u t o re s ] f . . . ] ja m os tra ra rn q ue a causa imediata da Revo-

lu<,:norepousa na recusa dos propr ios privi legiados em fazer os sacri fl cios

que 0 poder real tentou i rnpor- lhes Assirn, extorquiram darnonarquia acon-

vocacao dos Estados Gerai s [ .. .J Portanto, a Revolucao nao foi inicialmente

burguesa, mas s im ari stocra tica [ .. .J

Torna-se claro, entao, que a inrerpretacao economicu da his toria nao nus

compromete com visoes s imples . A ascensao de uma classe revolucionaria

nao e necessariamente a unica causa de seu tr iunfo, e na o e inevjtavel que

146

deva se r vi to ri osa ou , em todo case , vi tonos a de f orma v io lenta . Nu ca so

er n foco, a Revolucao foi desencadeada por aqueles que ina r emover , e nao

por aqueles que ser iam sellS benef ic iarios . Nei ll se podc provar que os ari s-

tocra tas ser iam necessuiiamemc bern-sucedidos em impor sua vontade ao

soberano. Ninguern pode argurnentar que os grandes rei s do seculo XVI I i na o

poderiam ter dctido OS avancos da nobreza , Seria i rnpossrvel super que, ern

171;7.c mesmo em I789, urn grande rei , gozando de alto prest igio. t ivessc

fei to com que a nobreza visse a razao? : '\ Ii io .nao ser ia i rnpossfvel .

(I I) Sol e, La Revolution, p. 267, "0 mit o ma rx is ta que ve a Revo lucaoFrancesa como urn estagio decixi vo da economia capitalists c faciImente refuta-

vel pela estagnacao da econornia durante a era revolucionaria e depois dela. "

(12) Por exernplo, a int roducao a edicao inglesa de "Social ism, utopian and

scientific", in Wake, v, 22 , p. 304,

( 13) Lef ebvre , "La Revol ution Francai se e t le s paysans", i n E tu d es , 1 96 3 ;

Albert Soboul, Precis d'histoire de la Revolution Francoise. Paris, 1962, p. 477.

(14) Lefebvre, La Revolution, p. 240.

( 15) R. R. Palmer , The a!!eofdemocrat ic revolut ion: a pol it ical his tory 01

Europe and America !760-1S00, 2 v, Princeton, 1964: J ac q ue s G o de c ho t & R , R .

Palmer, "Le problerne de I'Atlantique du 17' ·' au 2(y~ siecle", International Con-

gress of Historical Sciences, Relarioni Florenca, 1955, v, S. pp. 173-240, Para 0

debate, ver In t e rna t i ona l Congress, Alii del ]0 Congresso tntemazionate. Roma,

1957, p. 565·79.

(16) 0 e st ud o t av or av el it C om is sa o d e Sa l var;ilo P u bl l e a de R. R. Palmer,

Twelve who ruled. Princeton 194Lea ele icao deJacques Godechot para apres idcn-

c ia da Societe des Elude!>' Robespierriste sugerern 0 bastante.

(17) SirCharles Webster -lalvez 0mais cestacado historiador de pohtica inter-

nacional no establishment oficial britanico dessa dpoca-Lescreveu. "Os relatores nao

c o n se g u jr am en f ar i za r suticienternentc a un idade do mundo , Por cssa raz1io.a cornu-

nidade atlantica PIxie ser urn fenorneno temporario. Foi criada pela polnica da \.'RSS e,

seesta mudou, aquela pode mudar tarnbem". Alii del 10 Crmgres,m, pp. 571-2.

(18) Ancien Regime, 1:72, Cf Kahan, "Tocquevi ll cs two revolut ions", pp.

587-~.

(19) Memoires, v, I, p. 157·9, c it ado na "Introducao" (escr it a por Pierre

Rosanvallon) a GUiLDt , Histoire de I" civilisation en Europe, p. 14.

(20) Citado em Mel lon, The political uses ,if history.

(21) Para uma anali se radical , veja-se Sedil lot, LI' coia de fa Revolution

Francoise, pp. 261\-79.

(22) Veja-se 0 divertido livro de Herve Hamon & Patrick Roman, l.es illtel-

locrates: expedition en haute intelligentsia. Par is , 19R1. Talvez seja algo s igni -

f ic at ivo que a li st a dos 25 intelecruais "que jogarn urn papel preponderante naci r-

curacao das ideias" contenha apenas uma pessoa que tern escri to bas tante soore a

Revolucao Francesa: Francois Furer , Nao obstante. quase urn terce do grupo csta

const itutdo de his toriadores ou de pessoas com qual i fi cacao his torica .

147

 

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(2J) "Pendant t re nr e a n ne es l es modes idcologiques par is iennes s 'accorn-

pagnereru it cnaque foi s Ifune re i nterprcta tion du marxisme." Raymond Aron.

Memoires. Paris. 1983, p. 579.

(24) Ladurie, Pa r is - M on t pe l li e r . pp. 44-5.

(25) Tony Judt, Marxism and the French lef t. Oxford, 19!!6, p. 1&3.

(26) Ibid" p. 177:

Os morncn tos s imbo li cos da cxperi enc ia r evo luc iunar ia de 17R9-J 794 c .

e rn menor g rau. de 184ll e 1871. entra rar n no vocabu lar io de todos 0, pen-

s a d or e s a c ad em ic o s como Po[}(OS de r ef er en cia i nt ele ctu ai s. N a o a pe na s ama i o r i a dos e s cr it or e s f ra n ce s es a ci r n a de t ri n ta a no s d ev e sua comprecn

sao do ambiente pol it ico ao t rabalho, mui to difundido. desses pensadores

(Mathiez, Georges Lefebvre, Alben SobouL bern como Jamb e Lucien

Herr}, mas saoMathiez et al. que os intelectuai s f ranceses cstao forcosa-

mente o br ig ad o s a c on su lt ar quando procuram urn e sq uc le to e m pi ric o n o

qual apolar seu carnudo corpo de pensamento metaf fs ico. f a Revolucao

Francesa, enlend id a como l im processo que t er n s ent ido, que expli ca , em

ult ima ins tancia , todas as contingenciax nao resol vidas da realidade pol f ti •

ca franccsa

(27) Ph. Buonarroti. Conspirauon pour l 'egali t« dite de Babeuj, 2 v. Bru-

xelas, 1828. Vcja-se Samuel Bernstein, Buonarrot i. Pans, 1949.

(28) Veja-se Elizabeth Eisenstein, The jim professional reI'()lucionis r: Fi-

tippo Michele Buonarroti. Cambridge, 1959.

(29) Regis Debray, Que vive la Republique, Par is , 19~9, p. 48 : urna esplen-

dida invcctiva, escrita com veneno e brio, contra todos aqucles que Iicaram

cmbaracados pclo fato de rerem de celebrar 0 bicenrenario da Revolucao France-

,a. Girardoux, um humo r i s t a , rornancista e drarnaturgo mu i t o fiel a etiqueta e al ta-

mente so fis tic ado , ba stant e ap rec iado ante s de 1939 mas c squeci do apes 1945

( d ev id o a s u a p o si ca o politica desaprovada) I m a l rn e n tc c o n se g u e , merecidarncnte,

entrar na colecao Pleiade dos classicos franceses.

(30) Godechot, o» JUT)' pour ta Revolution. Paris, 1974. p. 324.

(31) Pierre Bourdieu, La noblesse d'Etal: grandes ecoles et espri t decorps.

Par is , 1989, p. 296.

(32) Brinton, p. 317.

(3) J. L. Talmon, The origins ojtotalitarian democracv. Londrcs, 1~52 .

(34) 0 mais impor tante ! ,'TUpOde intelectuai s ocidentai s marxistas nao sta-

Iinistas, a cornunidade trotskista de Nova York.ja esrava sc desintegrando, e rnuitos

de seus rnernbros ou ex-rnernbros mais procrninentes ja se moviam em direcoes

que os leva vam para bell i longe da e squerda, embor a nao ai nda para 0 conser-

vadorismo militante.

(35) Para uma bi bl iogra fi a sobr e e ss e debate vc r Perr y Ande rson, "The fi-

gure, of descent". New Left Review, 161, 19117:21 n" que e um a contribuicao tar-

din a de . c sc rita na de c ada de 1980. Ver tarnbem Tom Nairn, The enchanted glass:

14 R

Britain and in monarchv, Londres , 1988. cspecia lmente p. 371 '(C ; ;S . . e a resenha

desse l ivre pm A. Arblaster em : " ' 1 ' 1 > ' hfl Review. 174, 19119:97-110.

(36) Par a uma v isao ger al des se deba te por um germanis ta b ritanico. ver

Richard Evans . "The myth of Germany's missing revolution". New Left Review.

149, jan.-fev. 1986: 67-94.

( 37 ) A m o Mayer. The persi stence of t ire Old Regime: Europe to the Grear

War. Nova York, 1YSJ. C f . David C an na din e e m s ua resenha de Tireage of empire.

de E. 1. Hobsbawm: "Muitos historiadores nao mais acreditam que ()xeculo XI X

tenha assistido all triunfo da classe m e d ia [ . .. J " lao ha razao para explicar [ .. .J pm

que a c iv il iz ac ao b u rg u es a c ol ap s ou d c fi ni ti va m e nt e [ .. .J E la n un ca r ca lm e nt e f oi

vitoriosa, em prirneiro lugar", New Society. 2J out. 1987 , p. 27.

(38) William Rubinste in , "The Victorian middle classes: wealth occupation

and geography". Economic History Review, 30, 1977: 602-2J; vejam-se out ros

estudos xcrne lhantes do rnexrno autor,

(39) Para (l projero mais arnbicioxo nesse campo, veja-se J . Kocka, m g.

Burgeriichkeit im 19 . lahrhundert. Deutschand im europdischen vergleich, 3 v,

Muniquc, 1988.

(40) Professor Norman Stone in Tire Sundav 'limes, 6 mar . 19~~, ci tado em

F 1. Hobsbawm, Pol it ics for a rat ional lef t, Londres , 1989. p. 224. Mais gene-

r icamente , ver lame, Raven, "Bri t i sh history and the enterprise culture". P a st a n d

Present, 123. mai . 1989: In-204, especia l mente 190-1.

(41) Veja-se "The Nat ion Stare in the Middle East" in Sami Zubaida . Islam.

the people and the Sture: essays 011 pol it ica! ideas and the Movements int ire Mid-

die East. Londrcs e Nova York. 1988, especialmente p. 173.

(42) Como na p rime ira fr as e da conc lu sao de Sol e, La Revolution. p. 337:

"Tocquev i lle et Tai ne on vu it JUS le t it re dans la central isat ion uapoleonienne, le

principal rcsu l tar de l a Revo l u t io n " . Reduz ir () c fci to de um acon tec imento tao

gr an de na hi st or ia mun di al il aceleracao de uma tendenc ia na administracao do

Estado frances e analogo a dizer que a pri n ci p al consequencia his torica do

Impe r i o Romano foi dor ar a lg rej a Ca tol ic a de uma l ingua pa ra a s enc icl ic as

papais .

(43) D. G. M. Sutherl and, em France J 789-1815: revolution and counter-

revolution. Londrcs, 1986. p. 49. As diferencas entre esse historiador revisionisra

c an ad e n s e e 0 hIs t o r i a d o r f r an c e .' ; S o le (L(I Re10IutiU!I), que faz pom:o m a is UII

que parafrasear 0 primeiro (cornpare-se Sutherland, p. 49, e Sole, p. 83) e instru-tiva, Urn n ao te rn p ro ble ma s p ar a v er q ue 0 i m po r ta n tc n a " R ev o lu c ao do POVD"

e seu efeito revolucionario: 0 outro. que acrescenra umponto de inter rogacao apos

o t it u lo de seu capi tu lo correspondente e presta pouqu i s s ima atencao a o f ar o c ru -

cial de que os soldados deixararn de ser leais, enfati za sobretudo quao scrnelharnes

foram os movirneruos populates de 1789 aos protestos populares dos seculos ante-

riores. Isso c precisamente perder 0 pon te cent ra l. que nao e a e st ru tu ra dcss e«

movimentos, mas - no verao de 1789, ou na Russia de fcvereiro de 1917 - seu

impac ro .

149

 

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(441Rose, A centurv otcontinentai history, p. I.

(45) Col lected lei ters of Thomas and Jane Welsh Carly le , C. R, Sanders &

K. J . Fie lding, orgs. , Durham.X. C. . 1970~1981. v. 4 , p . 446 .

(46) Rose, A ("emUTY ojcontinental history, p. I

150

iN DIC E R EM IS SIVO

Action Francoise. I()()

Acton, lorde , 34, 85, 90

Agulhon, Maurice, La Republ ique au

village, 48

Alemanha

e it r c vo l u ca o b u r gu e s a, 57, In

Rf vista da, 34-7,101

Alexandre, r e i d a J u gos l av i a. 99

Amendola, Giorgio, 141 nota 41

Amer ic a La tina e 0 problema da revo-

lucao burguesa, 57

Americana, Rcvolucao

i n fl u en c ia d a , 47

anurqu ia

sufragio uni versal descrito como, il7

Annates: Economies Societes, Civi-

ii:mtiom,96,97,106

Annale" His toriques de 1 . : / Rho/a/ion

Fra t Iaise , 95

anticornunisrno, 119, 120

a r is to c ra c i a

relacao com asclasxes medias, 39

Aron, Raymond, 112

Assembleia Nacional, 79

Atlanticismo, 109, 147

Aulard. Alphonse, 66, 90, 91, 94, l)~, 99

autoritarisrno, veja bonapartismo

aurotermidorizacao, 75, 142 nota 62

Bubbage, Charles , 13

Babeuf, Gracchus, 72 . 81 . 93, 103.116

B a k un in , ' \1 1 k ha iJ , 51, 121

Balzac, Honore de, 31

Barnave, Antoine, 25, 38

Barthou, Louis, 99

Beaurnarchais, Pierre Augustin Caron

dC,3il

Beethoven, Ludwig van, 19,20

bicentenario ciaRF, 9 , 124

Bismarck, Duo von, 52, 5g

Blanc, Louis, Historic da Revoluciio

Francesa.Y)

Blanqui.Augustc.riO, 117

Bloch. Marc, 95

Blum, Leon, 97

bolcheviqucs

atitude Irente a RF, 82, 83como jacobinos, 65~6,67,69-72

bonapartismo, 59, 66

e R ev ol uc ao R us sa , 6 8, 72~3

B fan de s, G eo rg e. I 5

Brandel, Fernand, 97

Brinton, Crane, 105, 119

Brival,73

Bryan, Will i a rn Jennings , 103

BUchner, Georg: A mot te de Danton. 49

Buonarotti, Filippo, 103

Conspiracao dos iguais, 55, 116

Burckhardt, Jacob, SO

b u r gu e s a , r e vo l uc a o

RF como, 22~3, 25~44, 104, 107-8.

114,122

151

 

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s ignif ic ado para a r evolucao pr o~

letar ia , 52,54,56-3, 78

burguesia

aUloconsciencia de, 23, 32

compromisso como Ancien Rcgi-

IDe, 52-4, 57,123,149 nota37

e a Restauracao de 1814,43-4

Burke, Edmund, ) 1 , 7

Cachin, Marcel, 62

Camelinat, Zephyrin, 117

campcs inato e r evclucao , 43- 9, 100 ,

138 nota 1i3

Canard Enrhuine, Le, 117

capitalismc

como p r og ra m a b ur gu e s, 27-117

e K~, }2, 107-8, liS

pos-guerra e revisionismo, 122-4

Carlos x , r ei d a F r an ca , 26

Carlyle, Thoma" 2L 37-lL 111-2, 127,

13 7 nota 4g

Camot , Lazare, 64, 84, 100

C a T O n , Pierre, 90

carnsmo, 37

Castro, Fidel, 77

centenario da RF. 83-6

Chamberlin, W . H " 63 , 69

classe, luta de, 14-22, 24-6

e a unidadc nacional, 33

eo I iberal ismo burgues , 39, 53

classe media, autoconscicncia da, 38-9

Cobb, Richard, 97

Cobban,Al fred,22, 104, !O7, 119

Social Interpretat ion or the trench

Revolution, 105

Cobden, Richard, 11

Co c h in , Au gu st e , 94. I 10

Cohcn-Solal, Annie, 114

Comissao de Salvacao PUblica , 60, 65,

103

comparacao

R~comopadriio de, 50-2

C o m te , A ug us te , g I , 114

Cornuna de Paris (I ~71), 50.60, 69,

117

comun ismo e j acobin ismo , 53 , 55- 6,

117

cornunista, partidos (Franca), 97-8,

102-4, 105, 116

e intelectuais franccses, 112, 113

comunis tas, par tidos (oci denta is ), 67,

120-1

Congresso dos Deputados do Povo

(Uniao Sovierica), 79

Constant, Benjamim, 106. 1311nota 56

Cousin, Victor, 25, 28, 36

Cromwel l, Oliver, 33, 35, 64, 68,103.

12 3

da Costa , I saac . 45

Danton, George-Jacques, 61, 94,144

nota 16

como heroi , 21, 81, S5, 94

estudos sobre, 92

David, Iacques-Louis, 7S

De Gaulle, Charles , 102, I I3, 115

Dcbray, Regis, 117

Declaraci io dos Direi tos do Homem,

27,42,81,126

Delescluzc, Charles, 60

democracia

ati tudes l iberal s em rcla . .a o a, 44·6,52,61,84-8

e KL 125

demografia, uso da, 100

derapage I"dcrrapada"], 40,77

Deutscher, Isaac, 68, 71

Dicey, A_v.. 39Dickens, Charles

A rule of two cities, 21

Dreyfus, caso, 95, 9g-9

Droz, Francois- Xavier Joseph, 42

dual, fenorneno do poder , 64

Ecole Normale Super ieure. 91, 113

economia polftica. 28

15 2

econcmica , cri se e a RF,97

econornico, cresci mento

como objet ivo socia l, 124

e a RF,107

Edinburgh Review. 86, g7

edu ca cao superior, e xp a ns a o d a , 121

Fiffe I. torrc, 83

Elwin. Sanford. Ii1

Engels, Frederick

m on um en to a . 82

s ob re a r ev ol uc ao a le tn a, 5 8

sobre a RF,55·6,102-3, 108

so b re 0campesinaro, 49

E s ta d os U n id o s. eo centenario da Rl',

84

fascismo, 100, iOI

Febvre, Lucien , 95

F is he r, H . A _L,59

Forster, Georg, 76

l - ra n c a, mu d a n ca social n a, e a Kj·, 115-

8

Prance, Francisco, 101

Frente Popular, 101-2

Furer .Prancois , 21.41, 77 . 91,114,148

nota 22

" e C obban, lO S

e Cochin, 93. 110

Penser la Revolu t ion Francaisc,

106·7

Garibaldi. Giuseppe, 6 1, 8 2

Gervinus, Georg, 36

Giraudoux, Jean, 118, 14g nota 29

Godechot, Jacques . 100, 109, 147 nota

16

Gorhachev, Mikhail, 71,75,79

governo const i tucional. e revotucao

bu rgues a , 43-5, 54

govemo provisorio (Russia. 1917),69

Gra- Bretanha

consciencia da RF, 36-7

esrudos da Rl', 98

Gramsci, Antonio, 21inota 57,129-34

Guerin, Daniel

Bourgeois 1'/ bras -nus, la h ili " de

classes SOl'S 10 Premiere Repu-

blique, 57, 67

Guevara , Che, 77

Guizot, Francois, 25

e dernocracia, 88

mencionado, 19, 45, ~6

sobre a natureza da burgues ia , 26- 7,

32

sobre a revoiucao, 32-4, 53, 110,

114

Harvard, Universidade de, 94

Heber t, Jacques Rene, 103

hebertistas, 55

Herriot, Edouard, Homenagens Q Re-

voiucdo. 98

Herzen, Aleksandr, 51, 82

hisroria dos de b ai xo , 9 6, 9 7

hisroria mutavel. 125·7

h i s to r ia d or e s I ib e ra is , inrerpretacao daRF,24-8,40, 46-50, 81,85, 106,110

his toriografia revolucionaria, 10, 14,

17·8

e republicanisrno, 117

el emento s de ccncor danc ia , 1S-9 ,

65,107

renovacao da, 89,98

Hitler, Allolf, ss , 122Hoche, Lazare, general, 84

Holland Rose, J. . 14,20

Igrcja Catolica

atitude para com aRF, 101

industrializacaoe classe burguesa, 28-9

Inglaterra

na visao de l iberal s do continente,

33-5

intclcctuais franceses. 112-4, 148

153

 

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jacobinismo

analogias corn o, na Revoluca«

Russa, 52,62-3.65-6,68, !10

base socia l do, 72

comuuisruo de guerra como, 74

e dernocracia, g4-8

e Frente Popular, 101-2

e h is to r io g ra fi a r ev o lu ci on a ri a, 9 3

e marxisrno, 102-3.114

e tercel ro-repuhl icanismo, 99

G ra m sc i s ob re o . 129-30, t 32-3

inf luencia do, nas revolucoes fran-

ces as pos te r io r es , 50, 55, 60

rcjcicao comunista do, 120

visao dos libcrais xobre 0,37-8,42 ,

44-5.52-3. 61

J aures, Jean, 91 , 100, 104

Histoire socialiste de fa Revolution

Francuise. 25, 94

JudI, Tony. 114

Kadets (dcrnocra tas consi tucionais

russos), 52,64K a re ie v , N . t,6 3, 9 0

K au ts k y, K a r l. f 8,66

Kerensky , Aleksandr, 68

Kropotkin , Peter, 63

Lab ro u s sc , Ernest, 96 , 100

Lafayet te . marque, de, 64, 1\4

Lamartine, Ernest. 81

Lassal le , Ferdinand, 82

Le Roy Ladurie, Emmanue l , 97

L e fe b vr e , G e or ge s , 9 0 -1 . 95-7,99, 105,

118

e rev i s io n i smo . 107-8, 119 , 146

Quaire-vingt-neuf. 9 3, 9 6The great f ea r uf J 789 ,96

Lenin, Vladimir

como analogo a Robespier re , 64, 66

eo jacobinisrno, 55, 63,65. 70

mencionado.o?

sobrc ace lebracao da revolucao, 82,

143 nota 2

sobre Danton, 94, 144 nota 36

sobre o processo de revclucao, 82.

142 nota 69

Lcopardi , Giacomo, 90

Leroy-Beaulieu, Anatole, 85

Lewin, Moshe

Ullin's last struggle, 142

l ibcralismo, 138 nota 56

e dernocracia, 45-6, !IS

e f a sc i sm o , 100-I

e revo l u c ao , 52-3

li nguagem e simbol ismo da Rr, 48-9,

51

Lis t. Friedrich, 138 nota 50

Lucas Co li n, 24, 38

L u is x v r n, rei da Franca, 43-4

L u tc h it sk ii . Ivall, 63

Luxcmburgo, Rosa de, 67

Manifesto C om un is ta , I J

Mao Tsc-tung, 70, I t 1

Marat, Jean-Paul. 64, 77

como h e r oi , 8 1 , 9 9

cstudos sobre, 92

M a rce au , F ra nco is Se ve rin D esgra -

viers, 84

Mar ia Antonie ta , rainha da Franca, 5I ,

92

Marseillaise, 49, 58, 84,101

Martov, Julius, 70

Marx, Karl

e a R ev ol uc ao R us sa , 5 2, 6 3

e 0jacobi nismo. 55-6

e os historiad ores Iiberais franceses,

118

mencionado, 59. 67

s ob re a C or nu na de Paris, 50, 70 .

1m

s ob r e a e st ru ru ra de classes nocapi -

talisrno, 53-4

trans tormado em monurnento, R2

154

marxismo

araq ue revision ista contra D, 111-4

debates sabre a Termidor sovietico,

69

c mudancas no sccu lo xx , 120 , 121,

14 9 nota 34

i nf lu cn ci a s ob re a h is to ri og ra fi a

francesa, 10 ,2 2 -3 ,90 . 94 -5 , 100,

1 0 2- 3 , l UI .)

Marhiez , Alber t, 56,67,90-1,94, ]18,

129

Bolchevismo ejacobinismo, 66

McManners. John, Cambridge Modern

History, 105

Melgarejo, Mariano, 62

m e n ch e vi qu e s, 5 6 , 6 3 -7 0

Mendes-France, Pierre, 116

Michelet, Jules, XI, I) 1, 103

Histotiu da Revoluciio Francesa, 85

M i g ne t, F r an co is A u gu s te , 2 5 ,3 2 ,3 8 .

41,43-5

Histone de Iii Revolution Francaise;

29.65

Miliukov, PauL 52Mir abeau , Honore Gabrie l Riqueti,

conde de, 44 , 81 ,92

Mittcrrand, Francois, 113, 116

m o nu m en to s r ev ol uc io na ri os , 8 2 . 143

nota 2

Morley, John, 51

movimento o p er ar io , i nf lu e nc ia d a 1 1 . 1 '

sabre , 48-50, 58

Mozar t, Wofgang Amadeus , 3H

Mu s e u B r it a ni c o ( B ib l io t ec a B r i ta n ic a )

acervo do, 91, 144

Museu Carnavale t, 90

Mus so l in i , Benito. 10 I

n3~ao, conceito de. , 1 3 , J 7 - 1 1, 51

n a ci on a l s o ci al is m o , 1 2 2- 3

Napolcao Bonaparte. 19,21, 64-~

como analogo aos revolucionarios

russo>, 68-9

e a burgues ia , 43-4

e despori smo, 31. 58. 73

mencionado, 25, 35, 78

po l ni ca e c o nom i ca de, 27

Napoleao III (Luis Bonaparte), 60

Nat ion, The, 89

neccssidadc de revolucao, crcnca em ,

35-7,106

New York Times, 51

Nova Polirica Econonuca. 70 -1 ,74

Orczy, Ernmuska, baronesa de, 0

Pimpinela bear/ate, 21

Orwel I,George, 19R4 , 11{}

Owen, Rober t, 13

Paine , Tom, 84

Palmer, Robert, 109

traduror, The coming ofthe French

Revolution (Lefebvre), 96, 102

P a r is . m u d a n ca s em, II:: ;

PaM and Present, 10

patriotismo, simbolos de, 101-2

Pearson, KarL 12P e ro v sk ay a, S of ia , 8 2

Petain, Henri Phi lippe. marechal, lIS

Plekhanov, Georgi i , 63, 66

poder dual, fcnorncno de, 64

P(1VO

ejacobinismo,72

rnudancas no, 118

poder do.na ar, 126, l :' iOnota 43

relacao com a classe media, 38-9,

41, 44

progress!), ideia de, 2 H - 9 , 34

Qui nta Republica, polftica da, 115

r a d ic a li smo s o c ia l is t a

e h istoricgrafla revolucionaria, 93

ejacobinisrno, 60, 85, 91

e r ev ol uc ao b ur gu es a, 5 4

Radithchev, Aleksandr, R2

155

 

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Rakovsk y. Christian, 72

Reeve, Henry, l!t i

rcgicidio, celebracao de. B3

Reinhard, MaJul ,97, 100

Remusat, Charles de. 36

Renoir, Jean, IOJ

rc p ublica parlamenrar como forma

burguesa, 61

republicanisrno

e c omu ni smo, 112

e histo riografia f rancesa, 82,90, 93.

98 . 1~1, 104, 116·7

C polftica do pos-guerra, 115

Resistencia Francesa, 102. 116

Restauracao de 1814,43,65

rcvisionisrno

e concerto de revolucao burguesa,

22

h is to ri og r af ia , 1 0 -5 ,9 8 . 1 0 5- 14 , 1 1 8·

9, 123-6, 150 nota 43

revolucao

ataque revisionista contra a, 110-1

como urn processo incontrolavcl ,

75-8

e ()povo, 125-7

Revolucao Russa como prototipo

dc,70

significado historico da. 106

teonas da, 122

Revolucao de 1830, 30, 35. 44. 46, t iO

Revolucao de 1848, 13·50,55,60

Revolucao Francesa

f at es com que t odos conco rdam , IR-

20,65, 107

s ignifi cado h i st ri ri co mund ial de,

20,124-5,127

Revolucao Gloriosa (1688), 33, 35, 45,

85r e vo l uc a o i n du s tr i al , c o nc e uo de, 12-~

revolucao permancnte, tese d a, 5 6

Revolucao Ruxsa, 51-2.62,79, 110

Re vol u ti o n F r a n ca i se , La, 95

Richer. Denis, 22. 98

Ro b es p ie r re , M a x im il ie n

e Len in , 64. 66

co rnarxismo, 10 3

eo povo. 72

estudos sobre, 92, 94.99

m e n ci on ad o . 3 5 . 44,55,60. 8R

papcl de, na RF, 20, 74

percepca» de. na Uni iio Sovietica ,

79,:n H2

percepcoes de, no Ocidentc, 67, H3.

100, 102-3, III

Rocard, Michel, 10

Rodsianko, M, v.. 52Ro ede r e L P. L.,25

Rol land, Romain, Quator:e Iuillet,

10 1

R ot tc ck , K a rl von, 20

Rousseau, Jean-Jacques, 51

Roux.Jacques,I03

Roy. M. N ., 68, 74

Royer-Collard, Pierre Paul, 43

Rude, George, II Y

The French Revolution, 10 5

Sagnac, Phillipe, 90-1, 95

Saint-Just, Antoine de, 21,60,64,99.

112

cstudos sobre, 93

Saint-Simon, Claude-Henri , 28·9. 33

Sartre, Jean-Paul, 114

Say, Jean-Baptiste, Traite d'iconoinie

pol it ique, 27

Schama, Simon. Cidad/ios, 21. I II

SCali. Waller, 3:1

Inmhoe.137

Seligman, Edwin R. A. Enciclopedia

de ciencias sociais , 94

Sieyes, Emmanuel. abade, 3 R, l 1R

Smi th, Adam. 28, 38

A rique:a das naciies. 27, 136

Philosophical Essavs, I 36

Smith. Goldwi n, 87,88

Soboul, Albert. 56, 97-9, 107-8,117

soc ia l democracia , i nf luenc iu da K),

4'1-50. 58

Socialista, Partido (Francaj. 116

socialistas radicals, 98. 103. 116

Societe des Etudes Rohcsp.erri stes, 66,

94- 5. 100,147 nota 16

Soljcnitsin, Aleksandr, 110

Sonderweg, lese de, 12~

Sorbonnc, catedra de historia da Rcvo-

lucao Francesa, 90.94, o sSorel, Georges, 90

Southey. Robert. 13

Sovietes dos dcputados do, traba-

Ihadorcs c xoldados, 52

Spectator; The, ~~-9

Spence. Thoma>. 10 3

Stalin, Joseph, 67 . II 1. 141 nota 41

como Bonapar te , 72

sra lini smo como 'Tennidor", 70, 72. 73

Stein Lorenz von, 31, 44, 50

Stubbs, William. Consututional Histo-

ry (If E n g I an d . 1)5

sufragio universal, condenacao censer-

vadora do. 87 -8Sukhanov , ("i_ N_ lIimmer), 64 ,n

Sybcl, Heinrich von, 12,90

H i st o rv o ft h e F r en c h R e vo lu ti o n; 5 9

Tainc, Hippolyte, I) I ,94

O rig in s o f C on te mp or ar y F ra nc e,

15.86,89-90

Talmon, J_ L, Origins oftotalitarian

democracy, 119

Tay!or, George V. , 104

T em p s, I ~> , 8- '

Terceira Republica, 117

atitude dianre da RF , 89-90, 98

Tercei ro Est ado, 29 , 38·9 , 72. 79, 142nota 71

Terceiro Mundo. revolucao no. 70

Tcrrnidor, c Rcvolucao Russa, 6R -7 5

Terror

eo regime sovie tico, 67. 141

in te rp rer acoes sobre 0 ,21, 37 . 43,

1()]

Thatcher, Margaret, InThie rr y. August in . 25. 33,53,54, 137

nOI[\41

sobre a ju stif ic acao da revolucao,

25.30,33. 41. 43

Thicrs, Adolphe, 2 5, 2 9. 4 2- 3. 45 , M i

Thompson. Charles Willis, 63

T imes L i te r a r y Su p pl eme n t . Y I

T imes , T il l' , 8 3

Tocqueville. Alex: s de, 25

Recollections, :lO

sohrc a dernocracia , 45-6. ~6, 88

xobre a revolucao. 30,40, 50

sobre as Dirci tos do Hornern, 42

Tolstoi, Lev, ) I

tricolor, b an de ir a. i nfl ue nc ia d a, 47-8.

10 2

Trotsky, Leon, ')6,M

Historia da Revolucao RmS3. 64uso da K~·como ponto de referencia,

68. 70. 72-~

Ure. Andrew, 13

vanguarda- politicas, 55, IW , 117

Vellay, Charles, 93

vio lencia , 'J 7

Voltaire, Francois Marie Arouet de, 51

Vovelle, Michel, 98, 117

Wajda. Andrzej, Danton, 120

Webster . s ir Charles , 147 nota 17

Weitling, Wi lh em. 103

Zalutsky, Peter, 73