Guia Do Filhote de Gnu

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Foto: Vismar Ravagnani O GUIA DO FILHOTE DE GNU As melhores (e piores) respostas do CACD 2013 Material de estudo para a terceira fase do Concurso de Admissão à Carreira de Diplomata

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  • Foto: Vismar Ravagnani

    O GUIA

    DO FILHOTE DE GNU

    As melhores (e piores) respostas do CACD 2013

    Material de estudo para a terceira fase do Concurso de Admisso Carreira de Diplomata

  • Like a newborn wildebeest, it's time to hit the ground running. It is pretty amazing to think of a newborn creature running with the pack

    within minutes after birth. Like the wildebeest, or gnu if you prefer, it is time to get things moving (...)

    David Bates

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    O guia do filhote de gnu - As melhores (e piores) respostas do CACD 2013

    NDICE

    APRESENTAO ............................................................................................................................. 5

    PORTUGUS .................................................................................................................................. 6

    Redao ..................................................................................................................................... 6

    Exerccio 1 ............................................................................................................................... 15

    Exerccio 2 ............................................................................................................................... 20

    HISTRIA DO BRASIL ................................................................................................................... 25

    Questo 1 ................................................................................................................................ 25

    Questo 2 ................................................................................................................................ 35

    Questo 3 ................................................................................................................................ 44

    Questo 4 ................................................................................................................................ 52

    INGLS ......................................................................................................................................... 61

    Translation - part A .................................................................................................................. 61

    Translation - part B .................................................................................................................. 66

    Summary ................................................................................................................................. 71

    Composition ............................................................................................................................ 77

    GEOGRAFIA ................................................................................................................................. 82

    Questo 1 ................................................................................................................................ 82

    Questo 2 ................................................................................................................................ 91

    Questo 3 .............................................................................................................................. 100

    Questo 4 .............................................................................................................................. 108

    POLTICA INTERNACIONAL ........................................................................................................ 115

    Questo 1 .............................................................................................................................. 115

    Questo 2 .............................................................................................................................. 125

    Questo 3 .............................................................................................................................. 134

    Questo 4 .............................................................................................................................. 141

    DIREITO...................................................................................................................................... 149

    Questo 1 .............................................................................................................................. 149

    Questo 2 .............................................................................................................................. 157

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    Questo 3 .............................................................................................................................. 166

    Questo 4 .............................................................................................................................. 171

    ECONOMIA ................................................................................................................................ 176

    Questo 1 .............................................................................................................................. 176

    Questo 2 .............................................................................................................................. 184

    Questo 3 .............................................................................................................................. 193

    Questo 4 .............................................................................................................................. 200

    ESPANHOL ................................................................................................................................. 205

    FRANCS .................................................................................................................................... 213

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    APRESENTAO

    com grande satisfao que a turma de 2013 do Instituto Rio Branco apresenta o Guia do filhote de gnu - As melhores (e piores) respostas do CACD 2013, voltado preparao para a terceira fase do Concurso de Admisso Carreira Diplomtica (CACD). Em um concurso to complexo, o servio prestado pelos guias de estudo pu-blicados desde 1996 pelo Instituto Rio Branco em parceria com o Centro de Seleo e de Promoo de Eventos (CESPE) mostra-se fundamental para auxiliar os candidatos durante a preparao. O presente guia tem o objetivo de complementar esse trabalho, de maneira a oferecer uma viso mais ampla sobre o que esperado do candidato ao CACD.

    No comeo da preparao, comum que os candidatos se assustem com a qua-lidade das respostas dos guias de estudo. Aqui, pretendemos mostrar que no h, ne-cessariamente, uma resposta universal e perfeita. Geralmente, a banca do CACD aceita diferentes argumentos e posicionamentos, desde que fundamentados e bem estrutu-rados. Por esse motivo, apresentamos as trs melhores respostas de cada questo (com exceo da resposta j presente no guia oficial), para que o candidato perceba as abordagens distintas dos aprovados.

    Publicamos, tambm, a resposta com nota mais baixa obtida pelos aprovados em cada uma das questes. Essa ideia motivada por dois objetivos. Em primeiro lu-gar, o candidato poder observar claramente a distino entre as respostas com notas altas e baixas, o que fornecer uma noo sobre como no responder a uma questo. Em segundo lugar, h um aspecto motivacional. Em todos os concursos, h alguma questo especialmente complexa ou que trata de um assunto sobre o qual o candidato no possui total domnio. Pretendemos mostrar que possvel, sim, ser aprovado no CACD mesmo quando o candidato se depara com dificuldades durante as provas.

    Por fim, anexamos os dois melhores espelhos das provas de espanhol e francs de 2013. Embora saibamos que, em 2014, essas provas sero objetivas, pensamos ser interessante a divulgao desses documentos devido dificuldade de obteno de espelhos de francs e espanhol, uma vez que o guia de estudos oficial no aborda es-sas disciplinas. Ademais, pretendemos que esse guia se torne uma ferramenta til no apenas para o CACD 2014, mas tambm para concursos dos prximos anos. Caso as provas de francs e espanhol voltem a ser discursivas, os espelhos podem auxiliar futu-ros candidatos.

    Esperamos que o guia seja til a todos os aspirantes carreira diplomtica e que se torne uma tradio seguida pelas turmas posteriores. Todos sabemos o quo complexo o caminho at a aprovao, e, por esse motivo, nosso dever ajudar como possvel nossos futuros colegas de profisso.

    Turma 2013

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    a *As expresses destacadas em vermelho foram descontadas pela banca como erros microes-truturais.

    REDAO Texto I um lamentvel fato da vida que o comrcio internacional tenha, apesar de suas imensas po-tencialidades, contribudo to pouco para o desenvolvimento econmico dos pases de baixa renda per capita, sobretudo nos ltimos tempos da histria humana. Em certos casos, atravs de mecanismos de deteriorao das relaes de troca, o comrcio internacional tem atuado at mesmo como fator de empobrecimento relativo dos pases subdesenvolvidos e como ve-culo de agravamento dos desnveis de rendas entre os pases desenvolvidos e os subdesenvol-vidos.

    Fragmento de discurso proferido pelo Ministro de Estado das Relaes Exteriores na abertura da XVIII Sesso da Assembleia Geral das Naes Unidas, em 17/9/1963.

    Texto II Ao selecionar o embaixador Roberto Azevdo, a Organizao Mundial do Comrcio renova o compromisso com uma viso de multilateralismo que privilegia o dilogo, o respeito diversi-dade e a busca de consenso, conforme as nossas melhores tradies diplomticas; uma viso que incorpora as perspectivas de todos os membros, com particular ateno s dos pases em desenvolvimento e de menor desenvolvimento relativo; uma viso segundo a qual o comrcio no um fim em si mesmo, mas uma ferramenta para o desenvolvimento e para a melhor distribuio da prosperidade entre as naes, e dentro delas, em benefcio de todos.

    Fragmento de circular telegrfica do Ministro de Estado das Relaes Exteriores transmitida em 22/5/2013.

    Discuta e emita opinio sobre os fragmentos de texto acima apresentados, com ateno s semelhanas e s diferenas de percepo relativas ao comrcio internacional.

    Extenso do texto: 600 a 650 palavras [valor: 60 pontos]

    PORTUGUS

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    FILIPE BRUM CUNHA (52,50/60)

    Ao final da Guerra Fria, o economista Samuel Huntington previu a ocorrncia de um choque de civilizaes na sociedade internacional, devido s diferenas culturais existentes entre os pases. Mais de vinte anos depois, percebe-se que a teoria de Huntington no se con-firmou, uma vez que a cooperao entre os Estados caracterstica importante do atual con-texto mundial. O comrcio internacional um meio pelo qual os pases mantm relaes amis-tosas, porquanto representa uma possibilidade real de promover o interesse coletivo. Embora subsistam empecilhos para que o comrcio seja considerado plenamente justo, as relaes comerciais tm possibilitado o desenvolvimento de Estados anteriormente marginalizados, o que demonstra que o comrcio internacional possibilita mais que apenas o crescimento eco-nmico de poucas naes.

    As relaes comerciais nem sempre resultaram em ganhos multilaterais. Na dcada de 1960, o comrcio beneficiava somente os pases ricos, na medida em que as decises no con-sideravam os interesses das naes subdesenvolvidas. O Brasil criticava a marginalizao eco-nmica imposta pelas grandes potncias, pois o comrcio no ajudava a promover o desenvol-vimento, principal objetivo da nao. Conquanto j existissem mecanismos internacionais de cooperao econmica, no se buscava eliminar as injustias do comrcio internacional, como a deteriorao dos termos de troca. A atuao da diplomacia brasileira, dessa forma, era limi-tada por um contexto de possibilidades desiguais.

    Com o passar das dcadas, ocorreram muitas mudanas no cenrio econmico inter-nacional. O desenvolvimento industrial e a progressiva urbanizao permitiram que pases como Brasil, China e ndia ascendessem condio de foras econmicas. Se, antigamente, as decises eram tomadas por um seleto grupo de potncias, atualmente, no mais possvel estabelecer medidas no comrcio internacional sem a participao de outros pases. Novas instncias de debate multilateral, como a Organizao Mundial do Comrcio (OMC), possibili-tam uma atuao mais equitativa dos diversos membros da sociedade internacional, de forma a garantir a busca do interesse de naes cuja capacidade de manifestao costumava ser limi-tada.

    O Brasil um ator fundamental para a realizao de mudanas no comrcio interna-cional. A eleio de Roberto Azevdo para a direo da OMC, conquistada com votos de pases de diferentes condies econmicas, demonstra o reconhecimento internacional da relevncia brasileira para a promoo de um comrcio mais justo. A diplomacia brasileira considera que o comrcio internacional no deve ser uma forma de assegurar ganhos relativos, mas, sim, abso-lutos, porquanto as trocas comerciais podem ser positivas para todos os envolvidos. A melhor maneira de garantir benefcios coletivos o debate multilateral, pois somente o consenso capaz de evitar a prevalncia de interesses de atores especficos.

    Apesar dos significativos avanos promovidos, ainda existem alguns obstculos a se-rem superados. A representao desigual dos Estados em determinadas instncias decisrias e a resistncia dos pases desenvolvidos em eliminar os subsdios de seus produtos agrcolas demonstram que a estrutura desigual do comrcio internacional ainda no foi completamente superada. A diplomacia brasileira busca reduzir essas dificuldades, por meio de alianas com pases de interesses semelhantes, como o G-20 comercial. O Brasil, dessa forma, defende a continuidade da evoluo do sistema de comrcio internacional, e a eleio de Roberto Aze-vdo representa importante possibilidade de atuao para a consecuo desse objetivo.

  • 8 Portugus - Redao

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    Os diferentes discursos brasileiros nas dcadas de 1960 e 2010 mostram a evoluo pela qual passou o comrcio internacional. O Brasil, defensor do debate multilateral, foi um dos principais responsveis para que esse sistema se tornasse mais justo. O resultado da ao da diplomacia nacional a promoo do desenvolvimento mundial, uma vez que o comrcio, quando em bases equitativas, ajuda todos os pases a superarem suas dificuldades econmi-cas. As trocas comerciais, por representarem interesse coletivo, possibilitam maior cooperao interestatal, um dos motivos que explicam por que a previso de Samuel Huntington no se tornou realidade. Os benefcios de um comrcio internacional mais justo, portanto, no se limitam ao mbito econmico.

    Aspectos macroestruturais: 22,50/30 Aspectos microestruturais: 30/30

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    MARIANA FERREIRA CARDOSO DA SILVA (52/60) Processos de integrao econmica em acelerada marcha atestam que no mais sub-sistem as utopias de isolacionismo outrora vigentes. A participao no comrcio internacional tornou-se indispensvel aos projetos nacionais de desenvolvimento; os resultados dessa parti-cipao, contudo, diferem em grande medida. Por um lado, instrumentos inquos distorcem o comrcio mundial em prejuzo das naes que dele mais necessitam. Por outro, os processos de liberalizao em curso indicam possibilidades alvissareiras de desenvolvimento. O Brasil, como pas entusiasta da integrao que propicia o progresso, defende, acertada e veemente-mente, concepo de comrcio internacional como ferramenta para o desenvolvimento equi-tativo entre as naes. O xito da Rodada Doha, tambm intitulada Rodada do Desenvolvi-mento, privilegia essa acepo, uma vez que eliminar tendncias perversas e impulsionar os benefcios oriundos da integrao.

    A despeito do elevado grau de integrao internacional das naes do Norte, subsdios produo e exportao, barreiras tcnicas e quantitativas ainda so praticados em seus mercados. Esses mecanismos elevam os preos dos gneros alimentcios, perpetuando a fome e a pobreza. Prejudicam, ainda, produtores de pases de menor desenvolvimento relativo, desprovidos de orientao e de meios materiais para o atendimento das rigorosas restries tcnicas impostas.

    Desde a dcada de 1960, a comunidade internacional tem reagido a essas prticas, como atesta a criao da UNCTAD em 1964. Entrementes, houve uma mudana de percepo acerca do comrcio. A tese da deteriorao dos termos de troca defendia, poca, restries ao comrcio Norte-Sul, porquanto perpetrador do subdesenvolvimento. Hodiernamente, con-solida-se a ideia de que o comrcio pode garantir o desenvolvimento, desde que realizado em condies de igualdade material.

    A criao do Sistema Geral de Preferncias (SGP), que conferiu privilgios a pases afri-canos, asiticos e latinoamericanos, atenuou as tendncias espoliadoras do comrcio interna-cional. A insuficincia desse mecanismo para o pleno desenvolvimento das naes do Sul mo-tivou o lanamento da Rodada Doha. O mandato da Rodada evidencia nova percepo inter-nacional sobre as possibilidades do comrcio, ao indicar a possibilidade de eliminao de dis-tores equivocadas e de transformao do comrcio em meio de distribuio da riqueza en-tre as naes, como notou o ex-Chanceler Antnio Patriota por ocasio da eleio do embai-xador Roberto Azevdo direo geral da Organizao Mundial de Comrcio (OMC).

    O Brasil, atualmente a sexta maior economia mundial, mas ainda com grande passivo social a superar, tem dado o exemplo de utilizao eficaz da integrao comercial para o proje-to de desenvolvimento do pas. O crescimento econmico aliado melhoria dos indicadores sociais no so obtidos revelia dos processos de integrao. A participao brasileira nos fluxos internacionais de mercadorias e de servios crescente, assim como tambm crescen-te a incluso das parcelas mais desfavorecidas da populao. Ademais, a utilizao intensa do mecanismo de soluo de controvrsias da OMC pelo Brasil favorece a eliminao de prticas comerciais esprias, em benefcio de todas as naes em desenvolvimento. A chefia da organi-zao por um brasileiro, feito indito na histria do pas, indica o reconhecimento internacio-nal do xito das polticas pblicas brasileiras. Denota, ainda, o reconhecimento da capacidade mpar do pas de articulao de consensos, talvez um legado da tradio de equilbrio de anta-gonismos como sugeriu o embaixador portugus Jos Fernandes Fafe. Uma liderana brasileira

  • 10 Portugus - Redao

    O guia do filhote de gnu - As melhores (e piores) respostas do CACD 2013

    na mais exitosa experincia do institucionalismo internacional na rea do comrcio propiciar solues abrangentes e equilibradas, em consonncia com o atual paradigma do comrcio no como fim em si, mas como meio para o progresso das naes.

    As ltimas dcadas do sculo XX assistiram a mudanas significativas na percepo dos resultados possveis do comrcio internacional. Outrora compreendida como meio de perpe-tuao das desigualdades entre as naes, a integrao comercial considerada, na contem-poraneidade, tendncia necessria e irreversvel, que, matizadas certas distores, pode fa-vorecer o desenvolvimento. A concluso da rodada Doha tende a reforar essa percepo. Efetivadas as promessas contidas em seu mandato, a clivagem norte-sul deixar de ser carac-terstica predominante da geografia mundial.

    Marcaes da banca Ortografia (hifenizao) Ortografia (hifenizao) Propriedade da linguagem

    Aspectos macroestruturais: 25/30 Aspectos microestruturais: 27/30

  • 11 Portugus - Redao

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    PEDRO PIACESI DE SOUZA (51/60) O comrcio internacional um dos temas mais importantes para as relaes interesta-tais. No obstante as distintas percepes sobre o tema, os Estados reconhecem a importncia do comrcio para o desenvolvimento econmico. Enquanto no texto I, verifica-se um certo pessimismo acerca do comrcio internacional, haja vista a crtica em relao aos mecanismos de deteriorao dos termos de troca, no texto II, constata-se um posicionamento mais otimis-ta, uma vez que ressaltada a contribuio do comrcio internacional para o desenvolvimento das naes. O comrcio internacional no um fim em si mesmo, mas, sim, um caminho para a construo de uma ordem mundial mais justa e menos assimtrica.

    A crtica do texto I acerca dos aspectos negativos do comrcio internacional evidencia a natureza contraditria do capitalismo. Se, por um lado, o capitalismo contribuu para o de-senvolvimento de pases mais avanados tecnologicamente; por outro, agravou os problemas socioeconmicos nos pases subdesenvolvidos. O empobrecimento relativo dos pases subde-senvolvidos decorreu, entre outros motivos, do mecanismo de deteriorao dos termos de troca. Conforme argumentou Raul Prbisch, a deteriorao dos termos de troca ocorre devido especializao tcnica entre os pases. O centro, composto por pases desenvolvidos, mais beneficiado pelo comrcio internacional, porquanto exporta bens de maior valor agregado. A periferia, por sua vez, prejudicada pela sua especializao tcnica em bens primrios, visto que a exportao destes bens arrecada uma quantidade de divisas menor, o que explica o des-nvel de renda entre esses dois polos produtivos.

    O elogio do texto II ao multilateralismo coaduna-se no s com a tradio diplomti-ca ptria, mas tambm com a reivindicao brasileira por uma ordem internacional mais inclu-siva e representativa. O comrcio internacional, ao ser realizado com base no pluralismo das ideias e no multilateralismo das aes, contribui sobremaneira para o desenvolvimento dos pases. Embora as potencialidades do comrcio tenham sido reconhecidas j na dcada de 1960, conforme pode ser observado no texto I, apenas em dcadas mais recentes4 o comrcio tem desempenhado um papel mais positivo no desenvolvimento dos pases em desenvolvi-mento. Trata-se de uma mudana paradigmtica, porquanto demonstra que as potencialida-des do comrcio internacional no se restringem aos pases desenvolvidos, contribuindo tam-bm para a prosperidade de outras naes, contanto que o comrcio internacional, como de-fendido no texto II, seja feito levando-se em considerao as demandas de todos os pases envolvidos.

    Conquanto tenham sido elaborados em contextos diferentes, ambos os textos defen-dem a importncia do comrcio internacional para o desenvolvimento dos pases. Em um mundo globalizado, a interdependncia entre os pases pode ser considerada fato consumado, o que torna invivel desconsiderar o impacto do comrcio internacional nas relaes interna-cionais. Os Estados, portanto, devem privilegiar o dilogo, a fim de que o regime mundial de comrcio seja estabelecido sob bases consensuais e mutuamente benficas. Nesse sentido, a nfase atribuda pela diplomacia brasileira ao multilateralismo, ao contrrio das crticas que tem recebido por parte da imprensa, deve ser elogiada, uma vez que somente o multilatera-lismo capaz de promover uma ordem internacional que beneficie tanto pases desenvolvidos quanto pases em desenvolvimento.

    Schopenhauer, em Sobre o Fundamento da Moral, argumentou que existem apenas trs motivaes humanas: o egosmo, a maldade e a compaixo. De forma anloga, pode-se afirmar que o comrcio internacional, como descrito no texto I, foi prejudicial aos pases sub-

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    desenvolvidos, porquanto era motivado por interesses egostas de pases desenvolvidos, os quais se beneficiaram das assimetrias tecnolgicas para desenvolverem sua economia. A com-paixo, entendida como a busca de um desenvolvimento compartilhado e benfico para todos, pode ser observada tanto no discurso do texto II quanto nas aes empreendidas pelo Brasil, com vistas a uma maior participao dos pases em desenvolvimento no comrcio internacio-nal. O comrcio internacional, portanto, se for estruturado sob o multilateralismo, como de-fende o Brasil, um dos caminhos possveis para a superao dos desafios contemporneos e para a constituio de uma ordem internacional mais justa e menos assimtrica.

    Marcaes da banca Construo do perodo / colocao de termos Ortografia (acentuao) Construo do perodo / colocao de termos 4 Pontuao (falta de vrgula aps "recentes")

    Aspectos macroestruturais: 25/30 Aspectos microestruturais: 26/30

  • 13 Portugus - Redao

    O guia do filhote de gnu - As melhores (e piores) respostas do CACD 2013

    MENOR NOTA (32,65/60) Na transio do sculo XVIII para o XIX, com o advento de algumas das principais teori-as do livre comrcio internacional, rompeu-se a hegemonia do pensamento mercantilista vi-gente no perodo. Desde ento, a promoo da liberdade no intercmbio mundial, tornou-se um dos principais objetivos da sociedade dos Estados. Ao longo do sculo XX, a dinmica do comrcio internacional aprofundou-se e sofisticou-se, mas nem sempre beneficiou todos os pases da mesma forma. No alvorecer do sculo XXI, em um contexto de globalizao econ-mica, no h como negar a importncia das trocas internacionais para o desenvolvimento das naes; esse desenvolvimento, entretanto, , ainda, bastante desigual. Nesse sentido, o gran-de desafio do comrcio internacional contemporneo o de assegurar uma distribuio mais equitativa da prosperidade entre as naes e dentro delas.

    Em 1776, Adam Smith publicou A Riqueza das Naes. Entre os diversos temas trata-dos no livro, chama a ateno o relativo defesa da liberdade comercial internacional, que, segundo o autor, seria capaz de gerar riqueza e desenvolvimento para todos os pases que a praticassem. A teoria de Smith foi aperfeioada por David Ricardo, e, logo, tornou-se parte integrante do discurso oficial da Gr-Bretanha, potncia mundial dominante no sculo XIX, que a impunha s demais naes por meio de tratados desiguais. Ocorreram guerras, revolues e crises, e a Gr-Bretanha foi substituda em sua condio de potncia hegemnica pelos Esta-dos Unidos da Amrica; o discurso em defesa da liberdade do comrcio internacional, no en-tanto, no desapareceu.

    Aps a Segunda Guerra Mundial, surgiram novos instrumentos de promoo da liber-dade nas trocas entre as naes, como os Acordos Gerais sobre Tarifas e Comrcio (GATT). O mundo, todavia, transformava-se. Emergiam novas naes que no se sentiam beneficiadas pela estrutura do comrcio internacional. Nesse contexto, surgiu a Comisso Econmica das Naes Unidas para a Amrica Latina e o Caribe (CEPAL), um grupo de economistas coordena-do por Ral Prebisch que passou a pensar o comrcio internacional da perspectiva do mundo em desenvolvimento. As concluses da CEPAL foram revolucionrias. Segundo Prebisch e sua equipe, a dinmica do comrcio internacional vigente em meados do sculo XX, que opunha um centro exportador de produtos de alto valor agregado a uma periferia agroexportadora, gerava uma situao de deteriorao dos termos de troca em prejuzo do mundo em desen-volvimento, cujos produtos perderiam valor, ao longo do tempo, em face daqueles dos pases desenvolvidos. Nesse sentido, concluiu a CEPAL, o comrcio internacional, no lugar de promo-ver o desenvolvimento dos pases perifricos, era indutor de crises recorrentes em seus balan-os de pagamentos.

    As teorias cepalinas romperam a hegemonia do pensamento clssico em comrcio internacional e incentivaram uma maior articulao entre os pases menos desenvolvidos, o que levou criao de importantes foros polticos com o objetivo de promover um comrcio internacional que seja, de fato, indutor do desenvolvimento dos diversos Estados, como, por exemplo, a Conferncia das Naes Unidas sobre Comrcio e Desenvolvimento (UNCTAD) e o Grupo dos 77. importante notar que essa maior articulao entre as naes perifricas resul-tou em importantes conquista, como as relativas criao de regras comerciais mais favor-veis aos pases pobres.

    Em 1994, foi criada a Organizao Mundial do Comrcio (OMC), a qual passou a confe-rir maior institucionalizao ao intercmbio multilateral global. Aps anos sob o comando dos pases centrais, em 2013, finalmente, a organizao passou direo de um nacional do mun-

  • 14 Portugus - Redao

    O guia do filhote de gnu - As melhores (e piores) respostas do CACD 2013

    do em desenvolvimento, o brasileiro Roberto Azevdo. Embora Azevdo no assuma o cargo em nome do seu pas, evidente que sua trajetria pessoal e profissional influenciar no mo-do como ele exercer a diretoria geral da OMC. Por ter sido, durante anos, representante brasileiro nessa organizao, Azevdo mais sensvel aos anseios dos pases em desenvolvi-mento. Pode-se considerar, portanto, que sua eleio uma vitria de todos que almejam um comrcio internacional mais justo.

    Nas ltimas dcadas, o comrcio internacional passou por transformaes notveis no sentido de tornar-se, cada vez mais, um vetor de desenvolvimento global, e isso deve-se, em grande medida, atuao coerente e articulada do mundo perifrico. Nesse sentido, a elei-o de um nacional dessa parte do planeta para a diretoria geral do principal rgo de regula-o do intercmbio mundial suscita perspectivas animadoras quanto ao futuro da vertente desenvolvimentista do comrcio internacional.

    Marcaes da banca Ortografia (hifenizao) Construo do perodo / colocao de termos

    Aspectos macroestruturais: 16,25/30 Aspectos microestruturais: 28/30 Palavras em excesso: 58 (-11,6 pontos)

  • 15 Portugus - Exerccio 1

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    EXERCCIO 1 As fbulas indgenas tm uma participao intensa na literatura oral brasileira, mas sempre atravs da interpretao mestia, mudados os termos, substitudo o heri, trocadas s vezes as finalidades do conto por efeito da influncia catequista. O mestio transmite a fbula indgena aproveitando quanto no contrarie sua maneira pessoal de viver, agir e compreender. As gi-des indgenas no satisfazem a mentalidade do mameluco e do caboclo. Transfere, para a es-tria, os valores que o impulsionam e justificam, aos seus olhos, a conduta.

    Luis da Camara Cascudo. Literatura oral no Brasil. 2. ed., Rio de Janeiro: Jos Olympio/INL, 1978, p. 97 (com adaptaes).

    Com base no fragmento acima apresentado, discuta como a ideia de interpretao mestia repercutiu nos movimentos sociais e culturais do Brasil no sculo XX.

    Extenso do texto: 120 a 150 palavras [valor: 20 pontos]

  • 16 Portugus - Exerccio 1

    O guia do filhote de gnu - As melhores (e piores) respostas do CACD 2013

    LEONARDO ROCHA BENTO (18,07/20) A temtica da mestiagem aspecto indissocivel da elaborao da identidade brasileira. Por ser mestio, o povo brasileiro no compartilha a mesma interpretao da realidade dos povos que o originaram e adapta peculiaridades culturais dessas naes ao modo de viver local, o que se expressou em manifestaes socioculturais, no sculo XX.

    A interpretao mestia da realidade foi caracterstica dos escritores modernistas, como evidenciam a obra Macunama, de Mrio de Andrade, que reuniu influncias culturais diversas, a fim de definir o indivduo autenticamente brasileiro, e as anlises de Gilberto Freyre sobre as relaes entre africanos e portugueses. Essa interpretao fortaleceu-se depois, repercutindo na difuso de movimentos socioculturais de valorizao da mestiagem e das etnias formadoras da nao. Nas artes cnicas, ela foi adotada pelo Teatro Experimental do Negro, que promoveu discusses sobre as desigualdades sociais brasileiras; na msica, ela foi utilizada pelo movimento tropicalista, que enfatizou a miscigenao nas composies.

    Aspectos macroestruturais: 8,07/10 Aspectos microestruturais: 10/10

  • 17 Portugus - Exerccio 1

    O guia do filhote de gnu - As melhores (e piores) respostas do CACD 2013

    PEDRO MEIRELLES REIS SOTERO DE MENEZES (18,07/20)

    amplamente aceita, hoje, a constatao de que a cultura e sociedade brasilei-ras so formadas por aportes de diferentes. Neste processo de assimilao, no entan-to, cada fragmento absorvido sofrer uma adaptao, uma interpretao segundo as caractersticas e interesses dos grupos envolvidos. A adaptao, por mestios, das tra-dies indgenas excelente exemplo deste fenmeno. No sculo XX, o movimento que primeiro explicita este processo o Modernismo, fazendo dele uma de suas pe-dras angulares. Esta antropofagia consciente de elementos estrangeiros e nacionais ser algo repetido no cinema novo, na tropiclia e em outros movimentos. O Estado brasileiro tambm praticou esta interpretao mestia: o Estado Novo buscou na cultura popular elementos para combater os regionalismos e tentar criar uma cultura nacional com ele identificada. Esta apropriao de elementos alheios para fins prprios continuou, no sculo XX, a ser uma constante na vida social e cultural do Brasil.

    Aspectos macroestruturais: 8,07/10 Aspectos microestruturais: 10/10

  • 18 Portugus - Exerccio 1

    O guia do filhote de gnu - As melhores (e piores) respostas do CACD 2013

    LUIZ HENRIQUE ELLER QUADROS (17,63/20) Em sua obra Literatura oral no Brasil, Luis da Camara Cascudo afirma que o processo de formao da tradio oral ptria se caracterizou pela interpretao mestia das lendas amerndias. De acordo com esse conceito, a populao multitnica do Brasil teria selecionado elementos da cultura autctone com base em viso de mundo prpria, influenciada por valo-res de outros povos formadores, como o catolicismo europeu.

    Essa interpretao foi um dos elementos mais importantes no pensamento modernista do sculo XX. No campo social, autores, como Gilberto Freyre, buscaram valorizar a formao multitnica da populao brasileira. No campo artstico-cultural, a fuso de elementos estran-geiros e autctones, para formar esttica brasileira original, foi defendida, por exemplo, por Oswald de Andrade em seu Manifesto antropofgico. Para esses autores, a interao entre culturas seria caracterstica indissocivel da nacionalidade brasileira, reflexo da mestiagem que singularizou a formao do pas.

    Aspectos macroestruturais: 7,63/10 Aspectos microestruturais: 10/10

  • 19 Portugus - Exerccio 1

    O guia do filhote de gnu - As melhores (e piores) respostas do CACD 2013

    MENOR NOTA (13,45/20) As fbulas indgenas so parte integrante da cultura oral e do folclore brasileiros, em especial nas regies interioranas do pas. Personagens fantsticos, como a Cuca, o Curupira e a Iara, fazem parte do imaginrio coletivo nacional; a maneira como a maioria das pessoas os conhece, no entanto, no a original, mas decorrente daquilo que Lus da Cmara Cascudo chamou interpretao mestia.

    De acordo com Cmara Cascudo, ao ter contato com uma fbula indgena, aquele que no ndio a adapta a sua realidade antes de retransmit-la. Essa seria a interpretao mestia mameluca, cabocla que, embora no tenha preservado a integralidade das referidas fbu-las, teve enorme repercusso nos movimentos sociais e culturais brasileiros do sculo XX, uma vez que a interpretao mestia que torna as lendas autctones do nosso pas conhecidas de toda a populao.

    Marcaes da banca Acentuao

    Aspectos macroestruturais: 4,45/10 Aspectos microestruturais: 9/10

  • 20 Portugus - Exerccio 2

    O guia do filhote de gnu - As melhores (e piores) respostas do CACD 2013

    EXERCCIO 2

    (...) Porque os homens no me escutam! Por que os governadores No me escutam? Por que no me escutam Os plutocratas e todos os que so chefes e so fezes? Todos os donos da vida? Eu lhes daria o impossvel e lhes daria o segredo, Eu lhes dava tudo aquilo que fica pra c do grito Metlico dos nmeros, e tudo O que est alm da insinuao cruenta da posse. E se acaso eles protestassem, que no! que no desejam A borboleta translcida da humana vida, porque preferem O retrato a leo das inauguraes espontneas, Com bstias de operrio e do oficial, imediatamente inferior, E palminhas, e mais os sorrisos das mscaras e a profunda comoo, Pois no! Melhor que isso eu lhes dava uma felicidade deslumbrante De que eu consegui me despojar porque tudo sacrifiquei. (...)

    Mrio de Andrade. A meditao sobre o Tiet. In: Poesias completas. So Paulo: Martins, 1974, 4. ed., p.311-2, (com adaptaes).

    Com base no texto acima apresentado, discorra sobre as recentes manifestaes pblicas nos planos nacional e internacional, relacionando-as, em especial, ao fragmento: Por que os governadores / No me escutam? Por que no me escutam / Os plutocratas e todos os que so chefes e so fezes?.

    Extenso do texto: 120 a 150 palavras [valor: 20 pontos]

  • 21 Portugus - Exerccio 2

    O guia do filhote de gnu - As melhores (e piores) respostas do CACD 2013

    LUIZ HENRIQUE ELLER QUADROS (17,07/20) Recentes manifestaes populares no Brasil e em outros pases denunciaram o distan-ciamento entre as populaes de Estados democrticos e seus lderes eleitos. Em seu poema A meditao sobre o Tiet, Mrio de Andrade exprime viso anloga, ao demonstrar indig-nao com a indiferena dos poderosos em face de seu anseio por renovao.

    As contradies existentes em uma sociedade, para que sejam superadas, requerem meios que permitam o dilogo constante entre representantes e representados. Quando a comunicao entre esses dois grupos obstruda, perde-se o dinamismo da democracia e, muitas vezes, a legitimidade dos governantes questionada. Tanto nas manifestaes popula-res quanto na diatribe de Mrio de Andrade, essa vontade de participao no processo pol-tico que se revela. Em um como em outro caso, h desejo de mudana, que legtimo e que deve ser considerado como contribuio positiva para o processo democrtico.

    Aspectos macroestruturais: 7,07/10 Aspectos microestruturais: 10/10

  • 22 Portugus - Exerccio 2

    O guia do filhote de gnu - As melhores (e piores) respostas do CACD 2013

    MARIANA FERREIRA CARDOSO DA SILVA (16,95/20) Mrio de Andrade, liderana do Modernismo brasileiro, sacrificou a naturalidade de estilo, adquirindo pedantismo s avessas, na expresso de Antonio Candido, para o xito de seu projeto de tradicionalizar o passado cultural do pas. Diferiu, desse modo, da atitude, co-mum poca, de negar tradies locais e de buscar inspirao em obras estrangeiras - com-portamento que intitulou molstia de Nabuco.

    A analogia entre a atitude de Mrio e as manifestaes pblicas contemporneas deveras elucidativa. A negao do sistema poltico vigente incua, se no houver disposio para aperfeio-lo. O arcabouo poltico-constitucional o ponto de partida para qualquer mudana e as vias democrticas so o nico caminho legtimo para o aprofundamento da ci-dadania. Os protestos recentes parecem indicar a conscientizao da juventude sobre a impor-tncia da participao democrtica; para que as lideranas a escutem, preciso, contudo, que se disponham a contribuir nos processos de mudana.

    Aspectos macroestruturais: 6,95/10 Aspectos microestruturais: 10/10

  • 23 Portugus - Exerccio 2

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    FLVIA CRISTINA DE LIMA FERREIRA MAGRINI (16,63/20) A ideia atual de democracia baseia-se na necessidade de que os bens pblicos sejam administrados de acordo com a vontade popular. Desse modo, democrtico aquele regime que se estabelece por meio da liberdade de expresso, do direito de voto e da transparncia. Frequentemente, a cobia e a vaidade distanciam governadores em relao a governados, e o poder transforma-se em meio de dominao.

    As manifestaes pblicas, nacionais e internacionais, que ocorreram nos ltimos a-nos, podem ser analisadas como reaes contra situaes em que a manuteno do poder no promove o bem-estar social. As manifestaes so protestos contra a desateno dos repre-sentantes em relao s necessidades dos representados, so formas de o povo interromper as palminhas e os sorrisos de mscaras, palavras com as quais Mrio de Andrade identifi-cou o cinismo dos plutocratas e dos governantes autoritrios.

    Aspectos macroestruturais: 6,63/10 Aspectos microestruturais: 10/10

  • 24 Portugus - Exerccio 2

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    MENOR NOTA (10,44/20)

    Em A meditao sobre o Tite, Mrio de Andrade expressa insatisfao com os go-vernantes que no o escutam apesar de ele saber o que fica pra c do grito, isto qual os desejos que levam o povo a protestar. O sentimento de desencontro entre governos e deman-das populares motivou protestos no mundo rabe e no Brasil. Em ambos os casos reivindica-es so difusas e h dificuldade em saber exatamente aquilo que, no poema, Andrade afir-mou saber. Os protestos brasileiros e a Primavera rabe no so idnticos. O Brasil no vive uma situao de instabilidade poltica decorrente desses protestos e o governo tem buscado esta-belecer dilogo com a populao. Contrariamente, alguns pases rabes vivem guerras civis e os envolvidos no conseguem estabelecer comunicao entre si. Mrio de Andrade era brasi-leiro, mas no que diz respeito comunicao entre governo e cidados, na atualidade, seu poema representa melhor outros pases4.

    Marcaes da banca Concordncia Pontuao A banca marcou erro de pontuao nessa linha. 4 Colocao de termos

    Aspectos macroestruturais: 4,44/10 Aspectos microestruturais: 6/10

  • 25 Histria - Questo 1

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    a

    QUESTO 1 Disserte acerca das relaes entre a Inglaterra e o Brasil no perodo compreendido entre 1808 e 1831.

    Extenso do texto: mximo de 90 linhas [valor: 30 pontos]

    HISTRIA DO BRASIL

  • 26 Histria - Questo 1

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    GUILHERME RAFAEL RAICOSKI (30/30) As relaes entre Brasil e Inglaterra durante o perodo joanino e o Primeiro Reinado tiveram em comum uma dinmica enquadrada em uma lgica de dependncia assimtrica. O determinante fundamental para a estruturao de uma lgica claramente de centro e periferi-a, para alm do evidente desequilbrio de poder entre as partes, foi o interesse das elites diri-gentes nacionais em manter a continuidade dinstica em contextos de instabilidade. Em am-bos os contextos, a dinmica foi marcada por concesses da Amrica Portuguesa e do Brasil Inglaterra em favor da manuteno dinstica dos Bragana frente do Estado em processo de emancipao, com escassos ensaios de autonomia, fatores que implicaram a periferizao do Brasil e sua incluso na rbita de influncia direta do Imprio Britnico.

    O processo de reproduo da relao de dependncia Inglaterra-Portugal para os vn-culos Inglaterra-Brasil, que seria a marca de todo o Brasil Imperial, teve incio por condicionan-tes das disputas de poder europeias, em particular as Guerras Napolenicas. O dilema posto ao regente Dom Joo VI apresentou-se com a escolha difcil entre respeitar o Bloqueio Conti-nental imposto pela Frana e encarar provvel runa econmica devido sua satelitizao eco-nmica em relao Inglaterra, ou manter o comrcio com o Imprio Britnico e enfrentar possvel invaso e derrubada da dinastia de Bragana. A soluo encontrada foi a transmigra-o da Corte, que se instalaria no Rio de Janeiro, sob os amparos e protees da esquadra inglesa. A contrapartida pretendida por George Canning, frente dos negcios estrangeiros britnicos, seria o acesso direto ao mercado da Amrica Portuguesa via um porto de comrcio exclusivo, preferencialmente na regio de Santa Catarina. Dom Joo, cioso de criar tal vnculo preferencial, decide uma soluo de carter mais autnomo, de cunho liberal, ao decidir, em escala em Salvador, pela abertura dos portos do Brasil a todas as naes amigas, orientado pelos conselhos smithianos de Jos da Silva Lisboa.

    No obstante esse ensaio autnomo, sua efemeridade seria determinada pela posio de fragilidade portuguesa. Os plenipotencirios de Canning, buscando a contrapartida pela continuidade da dinastia Bragana, arrancaram aos negociadores portugueses os tratados de 1810. Estes inauguraram a relao de tratados desiguais que seria a marca do processo de independncia do Brasil entre 1808 e 1831. Os produtos ingleses teriam acesso ao mercado brasileiro mediante pagamento de tarifa ad valorem de apenas 15%, inferior taxa de 16% sobrada de produtos fretados por navios portugueses. Ainda, criaram-se direitos de extraterri-torialidade, em que a soberania de Bragana sobre a Amrica Portuguesa seria flexibilizada, pois sditos ingleses contariam com jurisdio de tribunais ingleses, escapando competncia jurisdicional lusa. Por fim, marca-se o incio da cruzada inglesa contra o trfico de escravos africanos, ao se iniciar processo, complementado no contexto do Congresso de Viena, em que Portugal deveria se abster de promover trfico no Atlntico norte e em territrios da costa da frica que no estivessem sob soberania do Imprio Portugus.

    No contexto americano, as expedies militares de Dom Joo em represlia ao eixo Paris-Madri contaram com posicionamentos diversos do ingleses. Estes apoiaram a ocupao de Caiena, que furtou o acesso francs Bacia Amaznica, mas foram menos entusiastas das duas intervenes contra Artigas na Banda Oriental e se opuseram incorporao da Bacia Cisplatina em 1821. Tal incorporao revela algum espao para condues dos negcios exter-nos de Bragana, por expressar o interesse histrico em garantir acesso navegao do Prata. No Congresso de Viena, em que Castlereagh consegue levar os portugueses mesa secundria das potncias em concertao, por influncia britnica para garantir o princpio da legitimida-

  • 27 Histria - Questo 1

    O guia do filhote de gnu - As melhores (e piores) respostas do CACD 2013

    de, Portugal restitui Caiena dinastia Bourbon reinstaurada e logra, com apoio ingls, elevar a colnia ao patamar de Reino Unido a Portugal e Algarve.

    Os desafios ensejados pela rebelio liberal do Porto, no contexto da primeira leva da Era das Revolues descrita por Eric Hobsbawn, obrigam o retorno de D. Joo VI a Portugal e precipitam uma ruptura poltica at ento inesperada e indesejada pelas elites brasileiras as-sociadas aos corteses da metrpole interiorizada. Aps breve guerra de independncia, em que houve larga participao de mercenrios britnicos, a questo fundamental que se impu-nha era o reconhecimento da independncia sob a soberania de Dom Pedro. A historiografia, em vertente endossada por Amado Cervo e Clodoaldo Bueno, costuma indicar que a indepen-dncia j se encontrava consolidada no apenas pelos esforos nacionais e pelo consenso con-juntural intraelites em favor de Dom Pedro, mas pelo interesse ingls na independncia brasi-leira, vez que implicaria acesso direto poro mais rica do Imprio Portugus sem mais ne-nhum constrangimento implcito relao com os lusos. Dom Pedro alijou as elites nacionais do processo de negociao da independncia ao afastar Jos Bonifcio e manter o Parlamento fechado at 1826, fazendo concesses extremas aos plenipotencirios de Canning, novamente frente dos negcios estrangeiros. Estes serviram como representantes de Portugal e negocia-ram o tratado de 1825 entre Brasil e Portugal, que previu: indenizao de 2 milhes de libras; o conceito de que a independncia fora concesso, e no conquista; o compromisso em no buscar anexar territrios lusos na frica; e a manuteno do ttulo de imperador para Dom Joo. A contrapartida exigida pela Inglaterra consubstanciou-se nos tratados de 1827, em que as preferncias tarifrias que inundaram o Brasil com txteis ingleses nos 17 anos anterior foram reafirmados por mais 15 anos e em que o Brasil assumiu o compromisso de eliminar o trfico de escravos at 1830. As medidas foram insidiosas para o interesse nacional conforme interpretado pelas elites, pois gerava a perspectiva de estrangulamento da principal oferta de mo de obra e a realidade de que a receita do Estado, poca advindas principalmente de tarifas alfandegrias, seria reduzida. Gera-se, assim, um dos paradoxos fundamentais da estra-tgia externa de Dom Pedro: ao subordinar os interesses da elite nacional sua leitura de ine-xorabilidade do reconhecimento ingls a qualquer custo em favor da manuteno do trono para os Bragana, Dom Pedro corroeu sua base de apoio entre as elites, fato que precipitou sua renncia em 7 de abril de 1831.

    Outro fato que contou com protagonismo ingls foi a mediao na Guerra da Cisplati-na. O conflito entre Brasil e Provncias Unidas, iniciado a partir do apoio buenairense aos 33 orientales que declararam o desejo de vincular a Cisplatina s Provncias Unidas no Congresso da Flrida, contou com participao massiva dos mercenrios ingleses em ambos os lados, alm de desorganizar o comrcio ingls com ambos os pases. O impasse na guerra levou a Inglaterra a mediar, exitosamente, a Conveno Preliminar de Paz de 1828, em que se garantiu a livre navegao do Prata e a independncia uruguaia, que seria, em palavras atribudas ao plenipotencirio ingls, um algodo entre dois cristais.

    As relaes entre 1808 e 1831 de Brasil e Inglaterra foram marcadas pela continuidade nas relaes de dependncia, ensejadas, sobretudo, pela continuidade na estratgia externa dos Bragana em submeter o pas tutela inglesa com vistas continuidade da Coroa. No obstante, os efeitos negativos para as elites nacionais decorrentes desses arranjos foram, jus-tamente, a raiz do colapso de legitimidade que levou entrpica Regncia.

  • 28 Histria - Questo 1

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    PEDRO MEIRELLES REIS SOTERO DE MENEZES (28/30)

    Tanto Portugal quanto mais tarde o Brasil independente mantiveram relao prxima, porm marcada por tenses e pela dependncia, com a Inglaterra nos 23 anos que seguiram chegada da famlia real Amrica. A dependncia, no plano ex-terno, teve origem principalmente na configurao econmica de Portugal e do Brasil, sobremaneira dependentes das rotas do Atlntico para sua insero internacional e para a viabilizao de sua produo. Houve, no entanto, episdios constantes de ten-so entre esta dependncia estrutural e esforos para resisti-la e minor-la.

    O Estado portugus, no incio do sculo XIX, financeiramente dependente das rendas tributrias e do comrcio oriundos de sua colnia americana. Em um contexto de polarizao do sistema europeu entre Inglaterra e Frana, a elite portuguesa se v dividida entre anglfilos e francfilos, e pressionada fortemente pelas potncias rivais. Com o Decreto de Berlim de 1806 e o Bombardeio de Copenhagen pelo Almiran-te Nelson, Frana e Inglaterra deixam claro que no aceitaro neutralidade ou ambi-guidade em seus sistemas de alianas. Com a revelao do tratado de Fontainebleu, que previa o desmembramento de Portugal entre Frana, Espanha e Manuel de Godoy e a permisso de passagem de tropas francesas pela Espanha, a faco anglfila, lide-rada pelo Conde da Barca, vence o debate interno e decidida a transferncia da corte para o componente dinmico do Imprio: o Brasil. Tal escolha implica em um aprofun-damento da dependncia para com a Inglaterra, pois a nica fiadora de um traslado seguro e de um possvel retorno Europa.

    Meros dias aps a chegada em Salvador, no entanto, Dom Joo VI ensaia mo-vimento de independncia, ainda que no de resistncia explcita, em relao ao do-mnio ingls: a abertura dos portos. Assessorado ainda no trnsito pelo Conde de Belas e, na chegada, pelo futuro Visconde de Cair, o prncipe regente decide empreender abertura de comrcio no Brasil a todas as naes amigas em regime de tarifas igualit-rias e relativamente baixas. Alguma forma de abertura era, certamente, inevitvel, pois uma manuteno do exclusivo comercial sem o eixo metropolitano implicaria um fechamento total do Imprio Portugus ao comrcio. A forma como se deu esta inicia-tiva, no entanto, estava longe de ser pr-determinada, e no agradou aos interesses ingleses. No tardou para que os efeitos da insatisfao inglesa se fizesse sentir. Desde a sua chegada no Rio de Janeiro o ministro ingls Strangford aplica enorme presso corte portuguesa que, ciente de suas limitaes, cede em 1810. Assinam-se neste ano um tratado de aliana, um comercial e um, menos importante, sobre o envio de pa-quetes entre os dois pases. As disposies favorveis Inglaterra so extensas: teria ela tarifa de 15% na importao de seus produtos (frente a 24% de outras naes e 16% de Portugal); humilhante extraterritorialidade, na figura do Juiz Conservador da Nao Inglesa; o direito de atracar e cortar madeira na costa brasileira e outras ainda. As disposies em favor de Portugal se resumiram, em verdade, ao reconhecimento da casa de Bragana como nica representante do imprio portugus, em uma clara pre-ponderncia de interesses dinsticos sobre polticas de Estado, algo repetido em certa medida no processo de independncia, como veremos adiante.

  • 29 Histria - Questo 1

    O guia do filhote de gnu - As melhores (e piores) respostas do CACD 2013

    Apesar deste reforo da supremacia inglesa, Dom Joo percebe no Brasil uma base para ao autnoma, promovendo a reforma e a criao de instituies estatais no Brasil, interiorizando a metrpole na Amrica. A elevao do Brasil a Reino Unido em 1815 e o expansionismo na bacia do Prata atestam este vis dinmico e indepen-dente. Este mpeto, no entanto, ser tolhido pela Revoluo Liberal do Porto, em 1820. Dentre os fatores responsveis pelo movimento, certamente a relao com a Inglater-ra um dos mais fortes: a burguesia comercial que agora se revoltava havia sido o se-tor mais prejudicado pelo predomnio comercial ingls no Brasil, e enquanto Dom Joo VI promovia o adensamento institucional do Brasil, Portugal era, de fato, governado pelo representante ingls Lord Beresford. Sob presso no Rio de tropas leais s cor-tes e sem controle sobre Portugal, Dom Joo parte para Lisboa, deixando seu primo-gnito no Brasil, como proteo dinastia frente a qualquer aventureiro iniciativa apoiada pela Inglaterra.

    As tenses da corte resultam na proclamao da independncia e, com ela, novo reforo da supremacia inglesa. Para existir politicamente, o novo pas precisaria do reconhecimento da grandes potncias da poca. Mas, para alm disso, sua sobrevi-vncia econmica dependia da exportao e, portanto, da Inglaterra,, que detinha a maior armada mercante e de guerra. O caso das negociaes para a independncia brasileira nico, pois tratou-se de relao tripartite. AA Inglaterra era a maior inte-ressada em um reconhecimento clere, pois desde o bloqueio continental o Brasil era um mercado importantssimo. Pelo tratado de 1810, no entanto, dependia do reco-nhecimento portugus para que pudesse tambm faz-lo. Em um primeiro momento Jos Bonifcio, Ministro da Guerra e dos Estrangeiros, empreende negociao com base em poltica de Estado, sendo intransigente com as demandas excessivas de Por-tugal Inglaterra. Segundo Rubens Ricupero, o estadista estava ciente de que motivos de ordem econmica e o vencimento, em 1817, das disposies de 1810, impeliriam a Inglaterra a reconhecer, eventualmente, o Brasil. Sua queda, no entanto, resulta em controle mais direto, por parte de Pedro I, das negociaes, e e com a isso a colocao de interesses dinsticos em pauta. O impasse entre Brasil e Portugal quebrado por intermdio de Charles Stuart, diplomata ingls a servio de Portugal. Com esta mudan-a de postura o Brasil aceita termos extremamente favorveis tanto a Portugal quanto Inglaterra, que consegue uma transferncia sem sobressaltos do domnio que tinha sobre a metrpole para o novo pas. O Brasil assumiria a dvida vultuosa de Portugal com bancos ingleses, reconheceria e renovaria os compromissos comerciais de 1810 e se comprometeria a abolir o trfico de escravos em no mximo trs anos. O preo co-brado pelos ingleses por uma separao sem grandes rupturas com Portugal foi consi-derado extremamente alto, e a queda de Pedro I reflete, em parte, uma reao da elite brasileira a estas exigncias. O interesse ingls no cone sul ser, ainda, a causa para a soluo do Imprio com as Provncias Unidas do Prata ter tomado sua forma final.Em 1828, com os dois rivais exauridos militar e economicamente em sua luta pelo controle da banda oriental, foram os esforos de mediao ingleses que resultaram na criao de um Estado-tampo, o algodo que amorteceria tenses e atritos, na expresso de Ponsonby. A criao do Uruguai foi a soluo inglesa para o bloqueio do Prata pelo Brasil e para um quadro de instabilidade e insegurana para seus comerciantes.

  • 30 Histria - Questo 1

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    A exposio acima ilustra momentos de maior influncia e dominncia da Ingla-terra, impondo seus interesses geopolticos e econmicos, e momentos de reao e iniciativas autnomas por parte de Portugal e, mais tarde, do Brasil. A questo do co-mrcio de escravos demonstra este contraste de forma sucinta: a edio da lei de 1831 abolindo o trfico uma vitria inglesa imposta a uma elite escravocrata. A no- apli-cao da lei, no entanto, mostra que a elite consegue impor limites a esta influncia. A progressiva solidificao institucional e a prosperidade do caf possibilitaro que, ao longo do sculo XIX, os momentos de resistncia se tornem mais coesos e constantes, culminando no rompimento de relaes da questo Christie em 1863.

  • 31 Histria - Questo 1

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    LETICIA DOS SANTOS MARRANGHELLO (27/30) As relaes entre Brasil e Inglaterra entre 1808 e 1831 foram intensamente marcadas pelo contexto internacional e pela conjuntura poltica brasileira. Nesse contexto, podem-se destacar as relaes comerciais; a presso quanto ao trfico de escravos e a independncia do Brasil. Assim, as relaes bilaterais eram do interesse de ambos, mas havia uma importante assimetria devido ao fato de a Inglaterra ser a maior potncia mundial.

    Em 1808, no contexto das guerras napolenicas, houve a transmigrao da corte por-tuguesa para o Brasil, o que contou com o auxlio ingls em questes de poltica e segurana. Devido ao Bloqueio Continental imposto pela Frana Inglaterra, esta tinha problemas para realizar comrcio com o continente europeu, inclusive devido guerra que l acontecia. Nesse contexto, ganha importncia para a Inglaterra o mercado brasileiro. Ao chegar ao Brasil, Dom Joo decretou a abertura dos portos s naes amigas. Apesar de essa medida ser benfica para as importaes provenientes da Inglaterra, no foi uma exigncia inglesa. Ao contrrio, tratava-se de medida baseada na ideologia liberal de Adam Smith, sugerida ao regente pelo Visconde de Cairu. Inglaterra interessava obter vantagens especiais no comrcio com o Bra-sil. Alm disso, a Coroa portuguesa estava em dvida com a Inglaterra, devido ao auxlio na transmigrao da Corte. Assim, em 1810, foram assinados tratados de amizade e comrcio que davam diversas vantagens aos ingleses. Por exemplo, eles passavam a ter direito a serem jul-gados por um juiz conservador no Brasil, e suas importaes pagavam taxa de apenas 15%, inferior inclusive aos produtos provenientes de Portugal. Com efeito, diversos autores conside-ram que esses foram tratados desiguais, devido desproporo das clusulas em favor da Inglaterra. necessrio considerar que Portugal j tinha relaes muito prximas Inglaterra e que lhe interessava esse tipo de relacionamento no contexto do sistema internacional, visto que Portugal era uma potncia decadente e um pas pequeno na Europa e havia-se aliado aos ingleses em diversas ocasies nas guerras sistemas destes contra a Frana, o que tinha rendido algumas vantagens aos portugueses em relao Espanha (aliada da Frana, em vrias ocasi-es).

    Apesar de as relaes bilaterais tambm serem relevantes para os ingleses, j na dca-da de 1810 comearam atritos devido ao trfico de escravos para o Brasil. No incio do sculo XIX, comeavam os movimentos internacionais pela abolio da escravido, que era a base de trabalho para a grande lavoura brasileira. H divergncias sobre o motivo para os ingleses pressionarem por essa causa, um dos mais plausveis parece ser a emergncia do movimento Quacker, com campanhas de carter humanitrio pelo fim da escravido. O tema ganhava relevncia internacional e chegou a ser discutido no Congresso de Viena. Assim, o Brasil aca-bou consentindo com a Inglaterra em medidas como o direito de visita a embarcaes suspei-tas de estarem traficando escravos de certas regies da frica para o Brasil. Num primeiro momento, a supresso do trfico foi geogrfica (ao Norte do Equador), mas depois a presso tornou-se generalizada, sobre todo o trfico de escravos para o Brasil. Tanto as questes co-merciais quanto a do trfico de escravos foram retomadas quando da independncia.

    O Brasil tornou-se independente de Portugal em 1822 e passou a concentrar esforos de sua poltica externa na obteno do reconhecimento nacional. Amado Cervo argumenta que o Brasil abriu mo de vrias vantagens em negociaes com a Inglaterra naquele perodo, pois Inglaterra tambm interessava reconhecer o Brasil e normalizar relaes. De fato, a In-glaterra tinha relaes comerciais prximas com Portugal desde muito tempo, como demons-tra o Tratado de Methuen (1703), e o Brasil era o maior mercado, a regio com maior potencial

  • 32 Histria - Questo 1

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    no imprio portugus. Consequentemente, no interessava Inglaterra romper relaes co-merciais. O Brasil, porm, cedeu-lhe grandes vantagens no processo de reconhecimento. Em primeiro lugar, cabe ressaltar que a Inglaterra mediou o reconhecimento do Brasil por Portu-gal, contribuindo para que se chegasse a um tratado aceitvel para ambos. Nesse sentido, foi importante o papel do ingls Charles Stuart, que representou os interesses portugueses na ocasio. A Inglaterra j teve vantagens com o tratado entre Brasil e Portugal, uma vez que o Brasil comprometeu-se a pagar uma indenizao a Portugal, o que fez com emprstimo ingls. Apos esse tratado, passou-se negociao do reconhecimento do Brasil pela Inglaterra (esta esperou estar concludo o processo com Portugal, devido aliana antiga com este pas). Nes-sa ocasio, interessava aos ingleses replicar com o Brasil independente o sistema de vantagens que a Inglaterra tivera quando o Brasil era colnia portuguesa. Desse modo, os tratados assi-nados replicam, em grande medida, o que j se tinha firmado em 1810. Os ingleses permane-cem com a tarifa preferencial de 15% para suas importaes para o Brasil, tambm permane-cem com os direitos referentes ao juiz conservador, alem de liberdade de culto. Alm disso, determinou-se que o Brasil extinguiria o trfico de escravos 3 anos depois de ratificada a con-veno (o que se deu em 1827). Percebe-se que os termos do tratado eram pouco vantajosos ao Brasil, o que pode ser explicado pela prioridade de ver a independncia reconhecida pela maior potncia da poca, bem como pela no participao da sociedade brasileira no processo de negociao dos tratados. De fato, o Parlamento no participou da elaborao do dito trata-do e muito o criticou posteriormente, chegando inclusive a estender a todas as demais naes a tarifa preferencial dada aos ingleses, o que prejudicou a arrecadao de impostos. Quanto escravido, criou-se um problema que iria repercutir ao longo do sculo XIX, sendo apenas resolvido com a Lei Eusbio de Queirs (1850). Em 1831, foi aprovada a abolio do trfico de escravos, mas a medida no era do interesse da elite brasileira, portanto, no foi cumprida. Assim, geraram-se vrias tenses bilaterais.

    A Inglaterra tambm teve importncia nas relaes regionais do Brasil. o caso da Guerra da Cisplatina entre Brasil e Argentina, que foi causada pela separao unilateral da provncia Cisplatina do Imprio do Brasil e sua posterior incorporao Argentina. Como ne-nhuma das partes conseguiu vencer a guerra, a Inglaterra mediou o conflito, levando inde-pendncia do Uruguai, como um algodo entre dois cristais na regio do Prata.

    Apesar de as relaes terem sido desequilibradas entre Brasil e Inglaterra, devido maior fora militar, poltica e econmica desta, foram relaes teis e importantes para o Bra-sil. Por exemplo, Inglaterra de fato interessava a independncia e a estabilidade do Imprio brasileiro, tanto por motivos econmicos quanto por ver com simpatia a nica monarquia da Amrica. Assim, na conjuntura da independncia, foi importante o Memorando Polignac, com o qual a Inglaterra conseguiu compromisso francs de no intervir nas independncias. Alm disso, a Inglaterra foi o garantidor de fato da Doutrina Monroe, dos EUA, que estabelecia o princpio da Amrica para os americanos e visava a afastar a interferncia europeia dos pro-cessos de independncia no continente. Na poca, os EUA no tiveram condies blicas de impedir essas intervenes, e foi o apoio ingls Doutrina que a sustentou.

    Desse modo, as relaes entre Brasil e Inglaterra foram centrais para a poltica externa brasileira de 1808 a 1831 (da transferncia da Corte ao fim do I Reinado). A Inglaterra era o principal mercado para as exportaes brasileiras (ainda no havia ocorrido a grande expanso das exportaes de caf) e uma importante fonte de crdito. As relaes, no entanto, foram marcados tanto pela diferena do poder de que os dois dispunham no sistema internacional quanto pela conjuntura interna instvel no Brasil, que impunha algumas prioridades e restri-es. Apesar disso, pode-se dizer que as relaes eram importantes para ambos e que, apesar de presses em vrios momento, a Inglaterra tinha interesse de preservar a amizade do Brasil.

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    MENOR NOTA (11/30) As relaes entre a Inglaterra e o Brasil, no perodo entre 1808 e 1831, so, em grande medida, um reflexo da relao que existia entre Portugal e Inglaterra. Desde do final do sculo XVIII, Portugal havia se tornado crescentemente dependente da Inglaterra. Uma srie de tra-tados comerciais foram assinados entre os dois pases, consolidando a dependncia de Portu-gal e culminando com o Tratado de Methuen de 1703. Ao mesmo tempo, Portugal conservava sua posio como potncia colonial justamente devido proteo inglesa. De acordo com Si-nsio Goes, o mesmo diplomata ingls que negocia o Tratado de Methuen aquele que pro-move a participao portuguesa na guerra entre Inglaterra e Frana no incio do sculo XVIII, levando assinatura dos tratados de Utrecht, em que se define a posse portuguesa de Sacra-mento e os limites entre as posses francesas e portuguesas na Amrica do Sul. Essa relao de subordinao e proteo entre Portugal e Inglaterra estende-se por dcadas, chegando at o incio do sculo XIX.

    A transmigrao da corte portuguesa para o Brasil ocorre no contexto do bloqueio continental promovido por Napoleo. Como grande aliado da Inglaterra, Portugal no poderia respeitar a imposio francesa, restando a transmigrao como forma de conservar o trono. A escolta dos navios portugueses realizada pela marinha inglesa, e essa proteo afetar pro-fundamente a relao da Inglaterra com o territrio brasileiro. Em 1810, assina-se um tratado entre ingleses e portugueses que concede amplos benefcios tarifrios para os produtos ingle-ses, sacramentando o fim do exclusivo colonial. A Inglaterra, por sua vez, afirma que no reco-nhecer nenhuma pessoa que proclame sua soberania sobre Portugal. Na medida em que as batalhas contra Napoleo avanam, o territrio de Portugal passa a ser administrado por um general ingls, e a Inglaterra consolida sua influncia econmica no Brasil.

    Aps esse perodo inicial, D. Joo VI busca limitar de certa maneira a influncia inglesa. No Congresso de Viena, os portugueses discordam das proposies inglesas de restrio da escravido. No mbito dos laos dinsticos, D. Joo VI demonstra sua inteno de afastar-se da Inglaterra ao casar seu filho, D. Pedro I, com uma princesa austraca. No mbito da Amrica da Sul, o rei portugus contraria interesses ingleses ao promover incurses na Banda Oriental, levando incorporao da Provncia Cisplatina em 1821.

    Apesar desses esforos, a influncia inglesa era por demais forte, sendo a subordina-o portuguesa transferida para o Brasil no processo de independncia. Apesar dos esforos de Jos Bonifcio, que afirmava que o reconhecimento da independncia brasileira viria natu-ralmente com o tempo, o governo brasileiro buscou obter, por meio da concesso de benef-cios, o reconhecimento de Portugal e da Inglaterra. As negociaes com Portugal arrastaram-se por 3 anos, sendo que o acordo final entre Brasil e Portugal foi negociado por um plenipo-tencirio ingls. Um dos termos desse acordo referia-se ao pagamento de uma indenizao a Portugal, sendo que os recursos seriam emprestados ao Brasil pela Inglaterra. O domnio ingls consolidou-se na assinatura dos Tratados de 1827, em que benefcios tarifrios so concedidos para os bens ingleses e determina-se, em primeiro lugar, que cidados ingleses sero julgados por juzes especiais e, em segundo lugar, que o trfico de escravas dever ser proibido em at 3 anos. Essas determinaes levam Lei Feij, de 1831, e a uma substancial reduo dos im-postos tarifrios coletados pelo Brasil.

    Se a influncia econmica inglesa no Brasil foi institucionalizada em 1827, a influncia poltica inglesa fica evidente no caso da Guerra Cisplatina de 1825 a 1828. Essa guerra surge a partir da reivindicao de independncia da Cisplatina por parte de nacionalistas uruguaios

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    conhecidos como os 33 orientales. Esse grupo solicita e obtm ajuda das Provncias Unidas, cujo sonho de recriao do Vice-Reino da Prata ainda estava vivo. O Brasil intervm na regio, mas sofre vrias derrotas em campo de batalha, criando um impasse militar em que nenhum dos lados conseguia obter uma vitria definitiva. Buscando defender seus interesses econmi-cos no Prata, a Inglaterra media o conflito, levando conhecida soluo do algodo entre cristais: a independncia do Uruguai. Os interesses ingleses estavam protegidos, em um resul-tado que no agradava nem brasileiros nem argentinos. Alm disso, a Inglaterra exigiu o pa-gamento de uma indenizao pelo perodo de tempo em que o Brasil bloqueou o acesso bacia do Prata.

    As relaes entre Brasil e Inglaterra no perodo entre 1808 e 1831 so caracterizadas pelos laos de subordinao que marcavam a relao entre Inglaterra e Portugal. Os ingleses tornam-se os principais parceiros econmicos e polticos do Brasil, havendo, nas dcadas se-guintes, momentos em que o Brasil busca limitar a influncia inglesa, como no caso da tarifa Alves Branco, e momentos em que a Inglaterra impe sua influncia, cujo exemplo maior a Lei Bill Aberdeen de 1845.

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    QUESTO 2 O Brasil manteve, na Primeira Repblica, a poltica econmica da defesa das exportaes, bem como a de atrao de imigrantes e capitais. A respeito desse momento histrico, anali-se os seguintes aspectos:

    iniciativas voltadas para a exportao de produtos brasileiros para a Europa;

    a mudana da lei alfandegria;

    as iniciativas no campo das imigraes.

    Extenso do texto: mximo de 90 linhas [valor: 30 pontos]

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    JOO LUCAS IJINO SANTANA (25/30)

    As polticas econmico-comerciais e imigratrias desenvolvidas por sucessivos gover-nos ao longo da Primeira Repblica denotam os interesses econmicos das oligarquias nacio-nais, em sua maioria, ligadas ao complexo agroexportador. Essa identidade de interesses entre elite poltica e elite econmica, embora nem sempre totalmente coincidentes, influenciou fortemente as iniciativas comerciais e imigratrias do Brasil em suas relaes com os pases europeus. Tais iniciativas concentraram-se em trs frentes: poltica comercial, legislao alfan-degria e poltica de imigrao.

    A Primeira Repblica surge em contexto econmico marcado pela preponderncia do caf nas exportaes brasileiras. O produto respondia por grande parte do comrcio exterior brasileiro e sua defesa tornou-se uma constante ao longo de todo o perodo. A alta lucrativi-dade, resultante da elevada demanda internacional pelo produto (Estados Unidos e Europa continental em plena Belle poque) e dos ganhos de produtividade oriundos da introduo do trabalho remunerado em grande escala, em substituio ao trabalho cativo, geravam incenti-vos expanso dos cafezais. Essa dinmica, no raro, levaria a crises de superproduo que deprimiam o preo internacional do produto, levando a intervenes governamentais. Isso ocorreu em 1906 com o Convnio de Taubat e em 1927 com a Caixa de Estabilizao. No en-tanto, a Repblica no foi s caf. Tentativas de promover as exportaes de outros produtos primrios como o acar e a borracha (em plena expanso) podem ser associados assimetria do Acordo de Reciprocidade Comercial Blaine-Mendona o primeiro dessa natureza desde os anos 1820 por exemplo. No que diz respeito borracha, possvel que a anexao negociada do Acre (Tratado de Petrpolis, 1903) tenha relao com a crescente importncia comercial da extrao do ltex na Amaznia brasileira.

    Gozando de um mercado cativo para seus produtos, notadamente caf e borracha, no mercado estadunidense, a diplomacia comercial da Primeira Repblica buscou expandir mer-cados na Europa. Para tanto, as legaes brasileiras naquele continente adotaram estratgia de divulgao de nossos produtos em feiras internacionais. Em alguns casos, manifestou-se a preocupao de agentes diplomticos brasileiros com a manuteno da qualidade do produto, a exemplo de Jos Maria da Silva Paranhos Junior quando atuava junto ao governo de Ber-lim.

    Do ponto de vista alfandegrio, a Primeira Repblica introduziu grandes inovaes. Imbuda do esprito liberal e descentralizador, a Constituio de 1891 concedeu aos Estados federados a liberdade para tributar sobre suas respectivas exportaes, reservando unio apenas os impostos de importao. Essa legislao possibilitou, na prtica, que os Estados mais ligados ao complexo agroexportador desenvolvessem uma verdadeira paradiplomacia finan-ceiro-comercial, pois alm de recolherem impostos de exportao, as unidades da federao podiam contrair emprstimos diretamente no exterior, independentemente da Unio.

    Estatsticas da poca relevam que os Estados comercialmente mais dinmicos como So Paulo , Rio de Janeiro e Minas Gerais (exportadores de caf) e o Acre (exportador de bor-racha) gozavam de mais acesso liquidez internacional e, consequentemente, contraiam em-prstimos mais vultosos. Entretanto, o lado negativo desse ativismo financeiro e comercial dos Estados foi o aumento substancial da dvida externa brasileira, sobretudo junto aos credores da city londrina. Ademais, a baixa capacidade de tributar do governo federal aumentou o des-controle das contas pblicas, gerando sucessivas crises do balano de pagamento.

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    No contexto do Encilhamento e das constantes crises de superproduo de caf, o governo Campos Salles recorreu ao primeiro Funding Loan (1898) um vigoroso plano de es-tabilizao financeira de corte ortodoxo a fim de recuperar o acesso do Brasil aos mercados internacionais de capitais. Diante de sua baixa capacidade tributria, o governo federal ofere-cia como garantia do emprstimo as rendas da alfndega do Rio de Janeiro.

    A poltica de imigrao da Primeira Repblica traduz, igualmente, as preocupaes do governo central em promover as exportaes brasileiras, especialmente o caf. Embora re-monte s iniciativas de recrutamento de mo de obra europeia assalariada do Senador Ver-gueiro, uma poltica governamental sistemtica e consciente para a imigrao s ocorreria a partir dos anos 1870-1880, quando ficou claro que o fim do trabalho compulsrio do elemento servil era uma questo de tempo.

    Alm da questo econmica, a imigrao visou a um processo de branqueamento do elemento autctone, em um contexto marcado pelo cientificismo e pelas doutrinas racistas e raciais de finais do sculo XIX. Influenciados por esse pensamento, autores como Oliveira Vi-anna defenderam a imigrao como soluo para supostos problemas raciais brasileiros.

    Ao contrrio do que ocorria na Argentina desde o governo Rocca (1880), a imigrao para o Brasil gozou de pesados subsdios governamentais, que se puseram como uma necessi-dade frente s constantes queixas de imigrantes vindos para o Brasil com relao a maus tra-tos e pssimas condies de vida e de trabalho nas lavouras brasileiras. Ademais, desenvolveu-se verdadeira guerra propagandstica entre a Argentina e o Brasil para atrair mo de obra eu-ropeia. Com efeito, a imigrao em massa levou a constantes atritos entre o Brasil e chancela-rias europeias. Exemplo cabal dessas tenses foi o decreto de naturalizao emitido pelo Go-verno Provisrio, contra o qual fizeram protestos contundentes os governos da Itlia, Alema-nha, Espanha e Portugal.

    guisa de concluso, nota-se que tanto a poltica comercial, quanto a legislao alfan-degria e a poltica de imigrao da Primeira Repblica atuaram em harmonia e de forma complementar. O objetivo ltimo de todas elas foi realizar os interesses econmicos e ideol-gicos das oligarquias dominantes em um contexto de descentralizao do poder e de enfra-quecimento do poder central. Esse iderio perduraria hegemnico at a ecloso da Revoluo de 1930.

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    VICTOR CAMPOS CIRNE (25/30)

    A Primeira Repbica representa um momento de tentativa de redefinio da insero internacional brasileira. Para o grupo de republicanos histricos, sejam da vertente mais radi-cal do Manifesto Republicano de 1870, sejam da vertente da Conveno de Itu de 1873, o Bra-sil era uma nao caracterizada pelo atraso, pelo insulamento internacional e pela escravido. A Primeira Repblica, tanto em sua gerao original quanto na gerao aps a Primeira Guerra Mundial, buscou alterar esse panorama. Entretanto, a percepo de oportunidades foi exage-rada e a implementao das polticas foi dificultada pela estrutura do Estado republicano, comprometendo o xito dessas iniciativas.

    No plano comercial, a integrao com a economia norte-americana foi ainda mais a-profundada, em relao ao perodo imperial. A importncia do caf como produto de exporta-o evidenciada pelo atrelamento de toda a estrutura econmica nacional com a produo cafeicultora. As polticas de defesa do caf, iniciadas com o Convnio de Taubat de 1906 e posteriormente nacionalizadas, eram o instrumento de poltica econmica primordial do go-verno republicano. As articulaes cambiais da Caixa de Converso, nos anos de 1910, e da Caixa de Estabilizao, nos anos de 1920, realizavam uma correlao entre a moeda nacional, as divisas externas e as letras de crdito da venda do caf.

    Nesse contexto de definio da poltica de produo cafeicultora como fundamento da poltica econmica, a poltica comercial era definida pela promoo do caf. A dependncia em relao demanda americana era uma preocupao vlida do governo, como evidenciado aps a crise de 1929. A propaganda do caf na Europa era identificada como uma possibilidade e foi aventada no Brasil. O Itamaraty, inclusive, buscou o desenvolvimento de misses comer-ciais e de atividades de promoo comercial nos consulados. No somente o governo central, mas tambm os governos estaduais, na tica do federalismo econmico tpico da Primeira Repblica, empreenderam essas iniciativas. No caso dos estados no produtores de caf, essa necessidade de elevao do comrcio com a Europa era ainda mais clara.

    No obstante essas percepes, a exportao de produtos brasileiros para a Europa no foi relevante, com a crescente participao dos Estados Unidos no comrcio exterior brasi-leiro. O Estado europeu com mais ligaes comerciais com o Brasil, a Inglaterra, no era con-sumidor de caf, e o tamanho da demanda americana, aliada capacidade monopolstica bra-sileira de definio de preos, desincentivava esses esforos.

    Adicionalmente, a indefinio das atribuies de poltica econmica entre a Unio e os estados dificultava a implementao dessas iniciativas. Sombra Saraiva, ao descrever as articu-laes financeiras do estados, que tinham capacidade de contrair emprstimos internacionais e exerciam um tipo de paradiplomacia econmica, caracteriza os problemas advindos dessa capacidade de fazer poltica econmica dos estados como polticas conflitantes e concentradas no curto prazo.

    Apesar das dificuldades no comrcio com a Europa, relativamente impermevel ao comrcio com o Brasil e abastecida por produtos coloniais advindos dos territrios africanos e asiticos, o Brasil empreendeu uma poltica alfandegria liberal. As concepes de poltica econmica da elite republicana, influenciada pela Escola de Manchester, defendiam o livre-comrcio e o padro-ouro. A capacidade brasileira de adeso a esse padro foi intermitente, mas o liberalismo alfandegrio foi efetivo, com a adoo de tarifas mais baixas.

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    A reduo de tarifas ocasionou, poca, problemas no relacionados ao comrcio. O padro alfandegrio baixo influenciou fortemente a exportao, especialmente de caf, e a importao diversificada de bens de consumo, alimentos e maquinrio. No entanto, a arreca-dao dos governos estaduais e da Unio foi comprometida. Tendo em vista que os impostos de importao e de exportao eram os principais (inclusive com a contribuio do imposto de exportao sobre o caf para a poltica de defesa do caf), a adoo de tarifas baixas diminuiu a possibilidade de financiamento do setor pblico. Os governos estaduais, especialmente, so-freram com essa diminuio e mantiveram a poltica de cobranas de taxas interestaduais, disruptivas para a articulao do mercado interno nacional, e a busca de emprstimos no exte-rior descrita anteriormente.

    Outro ponto de inflexo da sociedade brasileira, que teve xito relativamente maior, foi a poltica de imigrao. Ao contrrio das polticas comercial e econmica, que foram cres-centemente articuladas pelos governos estaduais e no pelo governo federal, a poltica de imigrao brasileira teve um movimento inverso. O esforo imigratrio, realizado principal-mente pela provncia de So Paulo, no perodo imperial, foi sendo progressivamente encam-pado pelo governo federal.

    O cenrio internacional do incio do sculo XX era favorvel imigrao europeia, com as frentes de abertura agrcola no Novo Mundo, especialmente no Cone Sul e na Oceania, de-sincentivando grande parte da produo agrcola em pases como Espanha, Itlia e Alemanha, que no eram to competitivos na produo de trigo e carne. No Brasil, a ideologia racista, tipificada na obra do Conde de Gobineau, era extremamente influente desde o final do sculo XIX. A elite republicana almejava o branqueamento da populao brasileira e, em termos pr-ticos, considerava que a constituio de um mercado de trabalho livre seria melhor realizada com imigrantes europeus do que com antigos escravos.

    Nesse sentido, a Unio e os estados alteraram a prtica de contratos privados entre patres e imigrantes e subsidiaram a vinda de imigrantes europeus e japoneses, que comea-ram a se instalar em So Paulo desde os anos de 1900. As instituies de apoio, como a Casa do Imigrante em So Paulo, foram financiadas. Apesar de algumas controvrsias sobre o tra-tamento dos imigrantes, a ideia de fortalecimento da vocao agrria pela implantao de um mercado de trabalho livre suportou a grande expanso da produtividade agrcola do Brasil republicano e trouxe grandes contribuies para a sociedade brasileira.

    Uma transformao radical da insero internacional brasileira, com a modernizao, a integrao econmica diversificada e o branqueamento de sua populao, no foi efetivamen-te empreendida pelo Brasil. Entretanto, a afirmao da capacidade agrcola e a renovao do mercado de trabalho em seu centro dinmico foram possibilitadas devido, principalmente, a encampao dessas iniciativas por governos estaduais fortes e pela Unio.

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    GUILHERME RAFAEL RAICOSKI (24/30) A marca estrutural fundamental da poltica externa brasileira na Primeira Repblica foi a nfase nas relaes americanas, sobretudo no comrcio com os Estados Unidos e na partici-pao nas reunies pan-americanas. O pas, contudo, no se podia descuidar do restante de suas relaes exteriores devido s caractersticas econmicas do Brasil entre 1889 e 1930: escassez de mo de obra e dependncia do setor externo, sobretudo das exportaes de caf. Tais enquadramentos implicaram estratgias internas e externas para abrir o mercado euro-peu. Foram relaes, contudo, desafiadoras devido ao perfil alfandegrio brasileiro a partir de 1891 e estratgia tarifria adotada a partir do governo Artur Bernardes. Por fim, as iniciativas de atrao de imigrantes, a quase totalidade europeus, foram elementos central do ativismo diplomtico brasileiro, em ateno, por um lado, s necessidades de mo de obra, e por outro, ao perfil do sistema intelectual brasileiro no perodo.

    A estratgia de expanso da venda de produtos brasileiros na Europa envolvia o ati-vismo estatal no sentido de manter o preo internacional do caf em patamar que mantivesse a renda dos cafeicultores - e, assim, o efeito multiplicador da cafeicultura na economia nacio-nal - e de garantir a credibilidade macroeconmica interna para no gerar desconfianas a respeito da capacidade de pagamento do Brasil. Os planos de valorizao do caf, baseados, a partir do Convnio de Taubat de 1906, pela compra dos excedentes de produo de modo a conter a oferta internacional e formar estoques reguladores para venda em entressafra, au-mentavam os preos internacionais e permitiam firmar acordos aduaneiros em forma de listas de rebaixamento tarifrio. Essa estratgia permitia a criao de vantagens comparativas, pois o caf teria preo elevado que compensaria a entrada de produtos europeus. Ainda, a busca por estabelecer, ao menos parcialmente, o padro-ouro, por meio da Caixa de Converso e da Caixa de Estabilizao, buscava legitimar o Brasil como ator comercial com credibilidade.

    A estratgia externa envolveria a ao em vrias frentes, como a negociao de acor-dos e a divulgao de produtos. O Brasil buscava participar nas grandes feiras internacionais e Exposies Universais, como as de Paris, com grandes estruturas e investimentos. Em seus espaos, o Brasil buscava mostrar aos europeus seus produtos, como o caf, a borracha de ltex de seringueira e frutos secos exticos, como a castanha-do-par. Ainda, o perodo da Primeira Repblica foi marcado pela expanso da rede de misses consulares no continente europeu, presente em Moscou - at a revoluo bolchevique - e outro polos comerciais como Hannover e Liverpool. Neste, em que atuou o Baro do Rio Branco, demonstravam-se os desa-fios da penetrao do caf no mercado ingls, diante do escasso hbito de consumo desse produto. As exportaes para a Frana e Alemanha superavam aquelas para a Inglaterra, ou-trora o principal parceiro comercial brasileiro, mas que jamais foi grande importador do Brasil ao se levar em conta o porte do seu mercado.

    A mudana ensejada pelo advento da Repblica no mbito poltico implicou alteraes tambm na estrutura alfandegria. Na Constituio de 1891, a consagrao do princpio fede-ralista, com elevada autonomia para os estados, teve como corolrio a definio de que a ar-recadao de impostos de importao integraria a receita do estado exportador, enquanto os impostos de importao fariam parte da arrecadao federal. Tal fato implicou a concentrao de receitas nos estados de So Paulo e Rio de Janeiro, que escoavam o caf, e, durante o ciclo da borracha, nos estados do Norte. Para manter suas receitas em patamar equivalente aos gastos, em contexto no qual a capilaridade da arrecadao tributria por meio de impostos de consumo e de renda era irrisria e invivel logisticamente, caberia ao governo federal no

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    liberalizar em excesso as tarifas de importao. A necessidade de tarifas de importao em patamar relativamente elevado tinha repercusses sociais relevantes. Embora em meados da Primeira Repblica o Brasil j tivesse capacidade industrial instalada para suprir a maior parte da demanda interna de txteis, o pas ainda era extremamente dependente em relao im-portao de bens primrios. Aliado esse fato socializao das perdas derivada da manuten-o de um cmbio desvalorizado e de poltica inflacionrias para m