Edited by Foxit PDF Editor Copyright (c) by Foxit Software...

91
______. Nuestra Diversidad Creativa Informe de la Comisión Mundial de Cultura y Desarrollo. Versión Resumida. Paris, 1996. VANIER, Jean. Comunidade: lugar do perdão e da festa. Tradução Teresa Paula Perdigão. São Paulo: Paulinas, 1982. WEBER, Max. Weber Sociologia. São Paulo: Ática, 2002. (Coleção Grandes Cientistas Sociais nº 13). 90 For Evaluation Only. Copyright (c) by Foxit Software Company, 2004 Edited by Foxit PDF Editor

Transcript of Edited by Foxit PDF Editor Copyright (c) by Foxit Software...

  • ______. Nuestra Diversidad Creativa Informe de la Comisin Mundial de Cultura y

    Desarrollo. Versin Resumida. Paris, 1996.

    VANIER, Jean. Comunidade: lugar do perdo e da festa. Traduo Teresa Paula Perdigo.

    So Paulo: Paulinas, 1982.

    WEBER, Max. Weber Sociologia. So Paulo: tica, 2002. (Coleo Grandes Cientistas

    Sociais n 13).

    90For Evaluation Only.Copyright (c) by Foxit Software Company, 2004Edited by Foxit PDF Editor

  • PUTNAM, Robert D. Comunidade e democracia: a experincia da Itlia moderna. 2. ed.

    Rio de Janeiro: Editora FGV, 2000.

    QUEIROZ, Maria Izaura Pereira. O campesinato brasileiro. So Paulo: Vozes, 1973.

    RADCLIFFE-BROWN, Alfred R. Radcliffe-Brown Antropologia. So Paulo: Editora

    tica, 2002. (Coleo Grandes Cientistas Sociais n 3).

    ROCHA, Eunice Ajala. A Festa de So Joo em Corumb. So Paulo: EditorAo,

    1997.

    ROSENDAHL, Zeny. Hierpolis: o sagrado e o urbano. Rio de Janeiro: EdUERJ, 1999a.

    ______. Espao e religio: uma abordagem geografia. 2. ed. Rio de Janeiro: EdUERJ,

    1999b.

    SANTOS, Milton. Territrio, globalizao e fragmentao. So Paulo: Editora

    Hucitec/ANPUR, 1994.

    ______. A natureza do espao. So Paulo: Editora Hucitec, 1996.

    ______. Metamorfoses do espao habitado. So Paulo: Editora Hucitec, 1988. p.25-29.

    SEMPRINI, Andra. Multiculturalismo. Bauru: EDUSC, 1999.

    SILVA, Cristina Schmidt. Viva So Benedito! Festa popular e turismo religioso em

    tempo de globalizao. Aparecida, SP: Santurio, 2000.

    SOUZA, Marcelo Jos Lopes de. O territrio: sobre espao e poder, autonomia e

    desenvolvimento. In: Geografia: conceitos e temas o territrio. [S.l.: s.n.].

    SOUSA, Lcio Gomes de. Histria de Corumb. Corumb, MS, 1985. 153 p.

    UNESCO - Desarrollo a Escala Humana Una Opcin Para el Futuro. La Dimensin

    Cultural In Cultura y Desarrollo. Paris: Decenio Mundial Para el Desarrollo

    Cultural/UNESCO, 1994.

    89For Evaluation Only.Copyright (c) by Foxit Software Company, 2004Edited by Foxit PDF Editor

  • MADURO, Otto. Mapas para a festa Reflexes latino-americanas sobre a crise e o

    conhecimento. So Paulo: Vozes, 1994.

    MALINOWSKI, Bronislaw. Malinowski Antropologia. So Paulo: Editora tica S.A.,

    1986.

    MARIN, Jrri Roberto (Org.). Religies, religiosidades e diferenas. Campo Grande:

    Editora UCDB, 2005.

    MARTN, Jos Carpio (idealizador). Desenvolvimento Local em Mato Grosso do Sul:

    reflexes e perspectivas. Campo Grande: Editora UCDB, 2001.

    MAUSS, Marcel. Sociologia e antropologia com uma introduo obra de Marcel

    Mauss, de Claude Lvi-Strauss. Traduo: Lamberto Puccinelli. So Paulo: EPU, v.2, 1974.

    MEGALE, Nilza Botelho. Folclore Brasileiro. Rio de Janeiro: Vozes, 1999.

    MONTES, Maria Lcia. Entre o arcaico e o ps-moderno heranas barrocas e a cultura

    da festa na construo da identidade brasileira. [S.I.:s.n.].

    MOURA, Carlos Eugnio Marcondes de (Coord.). Olrs escritos sobre a religio dos

    orixs. So Paulo: Agora, 1981. p. 76-79.

    ORTIZ, Renato. Cultura brasileira e identidade nacional. 5. ed. So Paulo: Editora

    Brasiliense, 1994.

    PEREZ, ngela Maria. So Joo Mato Grosso do Sul. Porto Alegre: Edies Caravela

    Ncleo Cultural Portugus do Mato Grosso do Sul, 1988.

    PNUD. Desarrollo humano em Chile. PNUD: Santiago de Chile, 1996a.

    ______. Informe sobre desarrollo humano. Mundi-Presa Libros S.A.: Madrid, Espaa,

    1996b.

    88

    For Evaluation Only.Copyright (c) by Foxit Software Company, 2004Edited by Foxit PDF Editor

  • ELIADE, Mircea. O sagrado e o profano a essncia das religies. So Paulo: Livraria

    Martins Fontes, 1992.

    ELIZALDE, Antnio. Lnea de dignidad necesidades humanas y ciudadania: perspectivas y

    desafios. In: Lnea de dignidad. Chile: CONOSUR/SUSTENTABLE, 2002.

    FERNANDES, Florestan. Significado do protesto negro. So Paulo: Cortez Editora, 1989.

    FUKUYAMA, Francis. Confiana valores sociais e criao de prosperidade. Lisboa:

    Gradiva, 1995.

    FURTADO, Celso. O mito do desenvolvimento econmico. Rio de Janeiro: Editora Paz e

    Terra, 1983.

    GEERTZ, Clifford. A interpretao das culturas. Rio de Janeiro: LTC Livros tcnicos e

    cientficos Editora S. A., 1989.

    ______. Nova luz sobre a antropologia. Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2001.

    HAGUETE, Teresa Maria Frota. Metodologias qualitativas na sociologia. Petrpolis:

    Editora Vozes, 1987.

    IRVING, Marta de Azevedo. Turismo: o desafio da sustentabilidade. So Paulo: Futura,

    2002.

    KASHIMOTO, Emlia; MARINHO, Marcelo; RUSSEF, Ivan. Cultura, identidade e

    desenvolvimento local: conceitos e perspectivas para as regies em desenvolvimento. In:

    Interaes Revista internacional de Desenvolvimento Local. p. 35-42.

    LAKATOS, Eva Maria; MARCONI, Marina de Andrade. Sociologia geral. 7. ed. So

    Paulo: Editora Atlas S.A., 1999.

    LVI-STRAUSS, Claude. A noo de estrutura em etnologia; Raa e histria;

    Totemismo hoje. 2. ed. So Paulo: Abril Cultural, 1980. (Coleo Os Pensadores).

    87

    For Evaluation Only.Copyright (c) by Foxit Software Company, 2004Edited by Foxit PDF Editor

  • CHAU, Marilena. Conformismo e resistncia Aspectos da cultura popular. So Paulo:

    Brasiliense, 1986.

    CLAXTON, Mervyn. Cultura y desarrollo - estudio. Paris: UNESCO, s.d. Disponvel

    em: .

    CUNHA, L. A. G. Confiana, capital social e desenvolvimento territorial.. Curitiba:

    Editora da UFPR, 2000 (Revista RAEGA, n. 4).

    DAMATTA, Roberto. A casa e a rua espao, cidadania, mulher e morte no Brasil. 6. ed.

    Rio de Janeiro: Editora Rocco, 2000.

    ______. Conta de mentiroso sete ensaios de antropologia brasileira. Rio de Janeiro:

    Editora Rocco, 1993.

    ______. O que faz o brasil, Brasil? Rio de Janeiro: Editora Rocco, 2001.

    ______. Relativizando: uma introduo antropologia social. Editora Vozes, 1981.

    DELLA MONICA, Laura. Manual do Folclore. 2 edico, Edart, 1982, SP.

    DIAS, Cludio Santiago. Capital social e violncia: uma anlise comparada em duas vilas

    de Belo Horizonte. Dissertao (Mestrado em Sociologia)-Faculdade de Filosofia e

    Cincias Humanas, UFMG, Minas Gerais, 2001.

    DICIONRIO ENCICLOPDICO. Koogan Larousse Selees. Rio de Janeiro:

    Editora Larousse do Brasil Ltda., 1982.

    DIEGUES, Antnio Carlos (Org.). A imagem das guas. So Paulo: Editora Hucitec, 2000.

    DURKHEIM, mile. As formas elementares da vida religiosa (sistema totmico na

    Austrlia). So Paulo: Edies Paulistanas, 1989.

    ______. Durkheim Sociologia. 2. ed. So Paulo: Editora tica, 1981. (Coleo Grandes

    Cientistas Sociais n 1).

    86

    For Evaluation Only.Copyright (c) by Foxit Software Company, 2004Edited by Foxit PDF Editor

  • 85

    ______. In: Interaes Revista Internacional de Desenvolvimento Local. Campo Grande:

    Editora UCDB, v.1, n.1, set. 2000. p. 63-76.

    BERGER, Peter L. O dossel sagrado: elementos para uma teoria sociolgica da religio.

    So Paulo: Edies Paulistanas, 1985.

    BERGER, Peter L.; LUCKMANN, Thomas. A construo social da realidade: tratado de

    sociologia do conhecimento. 17. ed. Petrpolis: Editora Vozes, 1999.

    BOCK, Ana Maria. O conhecimento cotidiano - Representaes sociais na perspectiva da

    psicologia social. So Paulo: Brasiliense, 1993.

    BOSI, Ecla. Memria e sociedade. [So Paulo]: Companhia das Letras, 2002.

    BOURLEGAT, Cleonice Le. Ordem local como fora interna de desenvolvimento. In:

    Interaes Revista Internacional de Desenvolvimento Local. Campo Grande: Editora

    UCDB, v.1, n.1, set. 2000. p. 13-20.

    BRANDO, Carlos Rodrigues. A festa do santo de preto. Rio de Janeiro: FUNARTE -

    Instituto Nacional de Folclore - Universidade Federal de Gois, 1985 a.

    ______. Festim dos bruxos estudos sobre religio no Brasil. So Paulo: cone Editora,

    1987.

    ______. Memria do Sagrado estudos de religio e ritual. So Paulo: Edies

    Paulistanas, 1985 b.

    ______. O divino, o santo e a senhora. So Paulo: FUNARTE, 1978.

    CANCLINI, Nestor Garcia. As culturas populares no capitalismo. So Paulo:

    Brasiliense, 1983.

    CARDOSO, Ruth. A aventura antropolgica teoria e pesquisa. So Paulo: Editora Paz e

    Terra, 1997.

  • REFERNCIAS

    ABEL, Theodore. Os fundamentos da teoria sociolgica. Rio de Janeiro: Zahar Editores,

    1972.

    ABRAMOVAY, Ricardo. O capital social dos territrios: repensando o desenvolvimento

    rural. Economia Aplicada, p. 49-60, v. 4, n. 2, mar. 2000.

    ALENCAR, Agla DAvila Fontes de. So Joo dormiu, So Pedro acordou. In: So Joo

    dormiu, So Pedro acordou. Aracaju: FUNDESC, 1994.

    ALVES, Isidoro. O carnaval devoto um estudo sobre a festa de Nazar, em Belm.

    Petrpolis: Vozes, 1980.

    ANDRADE, Julieta. Cocho mato-grossense: Um alade brasileiro. So Paulo: Escola de

    Folclore, 1981.

    ANDRADE, Manuel Correia de. A questo do territrio no Brasil. So Paulo: Editora

    Hucitec; Recife: IPESPE, 1995.

    ARON, Raymond. As etapas do pensamento sociolgico. 6. ed. So Paulo: Livraria

    Martins Fontes Editora Ltda., 2003.

    VILA, Vicente Fideles (Coord.). Formao educacional em desenvolvimento local:

    relato de estudo em grupo e anlise de conceitos. 2. ed. Campo Grande: Editora UCDB,

    2001.

    ______. No municpio sempre a educao bsica do Brasil. Campo Grande: Editora UCDB,

    1999.

    For Evaluation Only.Copyright (c) by Foxit Software Company, 2004Edited by Foxit PDF Editor

  • 83

    carter que frisa o urbano, o moderno, o global, construindo uma cultura que se situa

    entre a arte e a vida, o sagrado e o profano (SILVA, 2000, p.89).

    A importncia do fenmeno para a populao a valorizao da tradio, isso se

    mostrou claro nas centenas de respostas dadas antes, durante e depois da festa. Na tradio

    da festa religiosa em questo, so adicionados rituais que a torna mais popular. A religio

    catlica a que reuni maior nmero de fiis no Brasil, e com a adio de caractersticas

    carnavalescas festa, ela se transforma e trs no s os devotos, como tambm parte da

    populao que quer apenas participar do movimento popular. A carnavalizao torna o

    fenmeno mais popular do que j o , misturando festa procisso, sendo o festeiro o

    prprio devoto, contudo um devoto que, devido carnavalizao, age em certo momento

    formalmente (rezando) em outro momento informalmente (danando e pulando). uma

    forma pela qual os diferentes grupos tendem a expressar sua adeso aos valores sociais

    comuns a toda sociedade (ALVES, 1980, p.104). Mas tambm uma expresso que traz

    seus conflitos.

    A questo final que, sendo uma realizao que acontece dentro de uma sociedade

    e dela faz parte, e em meio a inevitvel globalizao do sistema capitalista, ela pode e deve

    ser vista como um fator que pode agregar e disseminar o Desenvolvimento Local, muito

    alm da noo somente econmica, passando para o estgio, to necessrio hoje em dia, do

    desenvolvimento social e humano. Nesse contexto, a cultura se torna a forma pela qual os

    indivduos se comunicam, interagem e criam meios de transformar o cotidiano e serem

    transformados pelo mesmo, numa relao dialtica do aprender a desaprender para um

    novo aprender (MARTN et alii, 2001).

    No caso da Festa de So Joo Batista de Corumb, os atores sociais devem aprender

    a desaprender a noo de desenvolvimento que extingui a cultura do seu significado, e

    aprender o desenvolvimento que valoriza o ser humano e seu meio, de forma horizontal

    para um crescimento substancial da comunidade onde vive. Enfim, fazer do arraial seu

    territrio de encontro com outras pessoas e consigo, aonde exista a metabolizao de

    insumos para a continuidade e, cada vez maior, troca de sinergias que possam manter e

    transmitir essa cultura durante geraes.

  • CONCLUSO

    Com este estudo mostrou-se que as denominadas festas de santo tm sua

    importncia principal pelo envolvimento de um grupo especfico, de um municpio e/ou de

    uma regio do estado ou pas. No geral concluiu-se que o aspecto que tornou especial a

    festa do Banho de So Joo em Corumb est relacionado, primeiramente, a sua dimenso

    enquanto festa, segundo, seu poder aglutinador cultural, terceiro, sua importncia para o

    corpo social e quarto, suas caractersticas podem, se trabalhadas da maneira correta, servir

    um meio para o desenvolvimento local.

    No caso de Corumb, o envolvimento se d no espao de um municpio, mas que

    tem o reconhecimento de ser uma festa de importncia no calendrio festivo do Estado e

    Nacional. Corumb no perodo da festa se transforma, seguindo um ritual que vai desde a

    organizao do Arraial do Banho de So Joo, at a preparao dos arraiais de menor porte,

    mas no de menor importncia. Os espaos se misturam. As brincadeiras, o parque, as

    comidas, os shows, o concurso de quadrilha, o cortejo, o banho, entre outros, se tornam

    momentos nicos e atemporais durante o perodo da festa e, principalmente, durante o

    processo ritual do banho. Os objetos e aes, que no dia a dia so apenas usados com suas

    devidas funes, na festa se tornam parte de um ciclo ritualstico, adquirindo significados

    extraordinrios. O trnsito de pedidos e promessas circula entre as necessidades e a

    expectativa de transformar o cotidiano, tudo dentro de um curto espao de tempo, porm,

    vivido com extrema intensidade por muitos que participam daquele momento,

    transparecidos atravs de gestos e rezas que cresce em cada um dos indivduos de forma a

    percorrer o cu e a terra a uma velocidade inexecutvel, por meio de um louvor a um

    santo que tem sua importncia para a religio (no apenas a catlica) e que agora serve de

    intermedirio de Deus. As funes se transformam de uma festa rural para uma festa de

    For Evaluation Only.Copyright (c) by Foxit Software Company, 2004Edited by Foxit PDF Editor

  • 81

    espao. Esse territrio de conflitos/conexes de poderes deve ser trabalhado para que o ator

    social se sinta um ser pertencente em tal comunidade, para, assim, empoderar-se, e fazer da

    festa sua festana.

    No caso especfico do banho de So Joo Batista, o desenvolvimento local se

    encontra no turismo cultural-religioso, pois nem sempre as pessoas so adeptas do santo,

    mas aderem festa, ou seja, tanto num caso como noutro a cultura ponto chave para o

    desenvolvimento.

  • 80

    conhecimento desses patrimnios naturais, histricos e culturais, [...] tem dificultado as

    aes de valorizao e de conservao desses bens e valores (materiais e imateriais). Essa

    citao cai como uma luva no caso do municpio de Corumb, apesar do autor ter se

    referido ao Estado de modo geral. A questo fundamental fazer da cultura corumbaense o

    ponto de encontro, primeiramente, das prprias pessoas do lugar e, posteriormente, das

    pessoas que vm visit-las. Os moradores da cidade at tem noo da importncia da

    cultura, mas isso apenas demonstrado na forma de um orgulho passageiro, como em frase

    do tipo: Corumb j teve o terceiro maior carnaval do Brasil, A cidade j foi palco da

    Guerra do Paraguai, entre outras. O problema que as pessoas no percebem que so

    nessas memrias que o desenvolvimento pode se fazer.

    Irving et alli (2002, p.137-139), destaca trs tendncias em relao ao turismo que

    podem servir, seno como incentivo, mas tambm como algo a se pensar no caso

    corumbaense:

    Primeiro, a inverso dos fluxos migratrios, no sentido centro-periferia, j de forma perceptvel, caracterizando o fenmeno conhecido como reverso da polarizao. Uma espcie de redescoberta do caminho da roa, provocando movimento de interiorizao, co modificaes conseqentes na vida urbana e rural. Segundo, a ampliao progressiva da noo de patrimnio coincidentemente com o empenho de dar visibilidade a comunidades tradicionais. Ganha destaque, assim, todo potencial de contribuies representativas do patrimnio humano. Terceiro, o reconhecimento, nos meios acadmicos, da histria oral como mtodo de pesquisa. O fato dever ter repercusso importante na recuperao da memria, sobretudo dos povos grafos e de comunidades tradicionais que guardam e transmitem, atravs da oralidade, seus estilos de vida.

    As tendncias se voltam ao turismo tico e de valorizao do ser humano e do

    ambiente. Tudo se une na questo do Estado de Mato Grosso do Sul, porm o que se deve

    ter em mente que isso no acontece de uma hora para outra, ou para citar um exemplo do

    caso brasileiro, de uma eleio para outra. A continuidade de bons projetos encontra

    barreira no egocentrismo partidrio, onde o que vale quem est fazendo, e no o que foi

    bom e est sendo aproveitado, sem desmerecer o ponta p dado pela gesto anterior. O trip

    que seria montado na sociedade em questo seria feito pelo homem, com a cultura e seu

  • 79

    Banho de So Joo (organizado pela prefeitura com apoio do governo do Estado) uma

    festa para o povo. O povo neste ponto espectador do evento, o que no participa da parte

    religiosa do festejo, ou que participa, mas fica para aproveitar os atrativos a mais que o

    arraial da prefeitura tem. A mesma Dona Natalcia exps que a festa do porto uma

    forma de chamar a populao para a festa. Corroborando com essa idia a Prof Eunice

    fala que a festa da prefeitura serve como chamarisco pra chamar turista e arrecadar

    dinheiro. Tm-se dois pontos a serem analisados: no primeiro, o arraial organizado pela

    Prefeitura serve de chamariz para que o ritual do banho do santo se torne mais popular; e no

    segundo, a ateno voltada para o fato de os organizadores do arraial do porto terem

    interesse somente no lucro que a festa pode lhe dar. Em contra-posio, essa forma limitada

    de agir, se no feita, ser sentida pela populao, pois se tornou obrigao do governo local

    e estadual faz-la. Contudo os rgos governamentais podem fazer muito mais como ser

    observado neste captulo ainda.

    Os motivos pelos quais Corumb no vai para frente, em termos de estrutura,

    muitas pessoas tentam explicar, como no caso do senhor Agripino que tenta resolver a

    questo dizendo que a culpa de Corumb no ir para frente por falta de representao

    poltica. Essa tentativa de explicar a decadncia do municpio pode ser vista em muitas

    entrevistas, quando o fato vem tona. Corumb era uma coisa que crescia que dava gosto

    de se ver, essa uma das memrias que so contadas pelas pessoas mais idosas que

    viveram o bom tempo da Corumb que quase virou capital. Foi colocado, em captulo

    referente histria do municpio, que Corumb o ponto de encontro de diversas culturas,

    e teve durante toda sua histria grandes momentos, pode-se dizer, econmicos. O que vale

    ressaltar, e este o ponto chave para este captulo, que o desenvolvimento passou por

    Corumb, mas no fez deste municpio morada. Contudo, o que fica, e isto encontrado de

    forma muito forte em Corumb, a cultura. Mesmo o turismo de pesca, tem em Corumb

    seu ponto de encontro, mas acaba partindo para os ranchos pesqueiros localizados a

    quilmetros da cidade. A cultura corumbaense um forte elemento que pode servir de

    propulsor do desenvolvimento local. Segundo Martn et alii (2001, p. 34), o

    desconhecimento dos bens e valores patrimoniais da natureza e da cultura o pouco

  • 78

    similares s economias que formam o atual centro do sistema capitalista. [...] essa idia tem sido de grande utilidade para mobilizar os povos da periferia e lev-los a aceitar enormes sacrifcios, para legitimar a destruio de formas de culturas arcaicas, para explicar e fazer compreender a necessidade de destruir o meio fsico, para justificar formas de dependncia [...] Cabe, portanto, afirmar que a idia de desenvolvimento econmico um simples mito (FURTADO, 1983, p.75).

    Essa viso pode ser pessimista de desenvolvimento econmico, mas no passa da

    realidade divulgada h anos no Brasil a qual, municpios como o de Corumb, espera

    alcanar. H a esperana de algum dia instalar uma grande empresa que absorva a mo-de-

    obra excedente, trazendo emprego e renda, gerando um dinamismo no comrcio local.

    A viso desenvolvimentista tem que dar lugar ao desenvolvimento em escala

    humana (MARTN et alii, 2001, p.21-22), pois esta se constri a partir do protagonismo

    do real, verdadeiro de cada pessoa. Em conseqncia, se deve privilegiar toda a diversidade

    cultural, tnica, total, igual autonomia dos espaos em que cada pessoa esteja se sinta

    protagonista. Do mesmo livro, o autor mostra as variveis em que o estado de Mato

    Grosso do Sul pode trabalhar em cima. Entre eles est o patrimnio natural e cultural, e

    nesta segunda variante que se deve dar foco.

    Em muitos relatos da festa, os conflitos, entre populao e rgos governamentais,

    so observados. A maioria deixa claro que os rgos governamentais, no do incentivo

    algum para a festa, somente faz o arraial no Porto Geral. Ou seja, a prefeitura, ou pode-se

    dizer as prefeituras durante os tempos, procuram apenas cumprir com o seu papel,

    disponibilizando algo a mais como atrativo festa, pois, como observado nas entrevistas,

    nem todo mundo vai para o ritual do banho de So Joo. Com isso, as instituies do

    governo e prefeitura, aproveitam a festa para no somente fazer propaganda, que render

    frutos nas prximas eleies, mas para tambm arrecadar fundos. No entanto, o que se

    compreende que a festa ficou centralizada no arraial do porto, deixando de, pouco a

    pouco, retornar ao arraial de origem, e isso confirmado pelo senhor Sebastio, quando ele

    mesmo diz que a festa ficou mais centralizada na beira do rio, por causa do arraial da

    prefeitura. Aqui se encaixa a fala da Dona Natalcia, onde ela coloca que o Arraial do

  • 77

    Observa-se que a noo de desenvolvimento, disponibilizada por Elizalde, oposta

    a dita anteriormente (no segundo pargrafo deste captulo). O desenvolver, parte das

    prprias pessoas e no de uma instituio governamental, ou no-governamental. Vem ao

    encontro da proposta do Desenvolvimento Local onde o primeiro passo o desabrochar das

    capacidades, competncias e habilidades de uma comunidade definida. O mximo que os

    agentes externos do desenvolvimento (instituies pblicas e privadas) podem fazer

    propor idias, sensibilizando o local. Contudo, as opinies propostas devem ser

    contextualizadas com a cultura e o modo de vida das pessoas daquele lugar, e a

    sensibilizao no deve ser apenas um jogo de seduo, mas sim, um dilogo entre as

    partes envolvidas. A sensibilizao talvez seja a parte mais importante, pois nela que o

    valor humano deve ser ressaltado, mostrando, assim, as capacidades e como a comunidade

    pode agir e modificar o meio aonde vive. No basta dar ferramentas tcnicas, petrechos e

    maquinrios, se no h alta estima, tanto do ator social com o meio, como tambm, dele

    com ele mesmo. Neste contexto encontram-se as relaes primrias, a confiana, entre

    outros fatores mostrados anteriormente que atuam como pilares do Desenvolvimento Local.

    O grande problema da interpretao do que vem a ser desenvolvimento, que o

    termo confundido com a ideologia de progresso, uma crena muito forte e, arrisca-se

    dizer, enraizado na cultura de muitos grupos. Isso faz com que a idia de desenvolvimento

    seja algo frente, ou seja, se uma famlia possui bens domsticos o suficiente para

    sobreviver, ela considerada menos desenvolvida do que uma famlia aonde existe vrios

    aparelhos de televiso, muitos celulares e diversos outros petrechos eletroeletrnicos. O que

    ocorre nesta analogia, que o ter medido em escalas, dentro do termmetro chamado

    status social. Celso Furtado questiona esse modo de viver capitalista que acirra mais ainda

    essa disputa, onde quem sai perdendo so todos, pois acaba por acelerar o consumo dos

    bens no-durveis como o petrleo, o gs e os minerais, ainda necessrios. Citando-o a

    respeito do assunto temos que:

    [...] o desenvolvimento econmico a idia de que os povos pobres podem algum dia desfrutar das formas de vida dos atuais povos ricos simplesmente irrealizvel. Sabemos agora de forma irrefutvel que as economias da periferia nunca sero desenvolvidas, no sentido de

  • 5 ANLISE E INTERPRETAO DOS DADOS COLETADOS

    Neste captulo ver-se- que a festa de So Joo Batista em Corumb pode servir de

    exemplo para a riqueza que a primeira vista no aparece, mas fica mais exposta quando

    feita a anlise dos dados e contextualizado com uma teoria mais humana, onde o homem

    no o centro e sim um elemento do meio em que vive sendo o nico capaz de mud-lo

    consideravelmente. A anlise em si se volta mais aos aspectos do desenvolvimento local

    para melhor compreender a ponte entre cultura e desenvolvimento.

    Sempre quando se aborda de desenvolvimento a esperana cresce aos olhos dos

    habitantes onde estes pretendem agir. Assim, acaba sendo um ente a ser personificado, ou

    mesmo montado como um brinquedo de encaixar, porm ele no final se torna um mito.

    Como no mito do retorno (Eliade, 1999), a histria da construo primordial relembrada,

    s que nas conversas dirias da esperanosa populao. So citados exemplos de sucessos

    passados, e at mesmo os sucessos alcanados por populaes mais avanadas. O

    desenvolvimento surge como um Santo Graal o qual se deve encontrar preservar e desfrutar

    do seu sucesso, contudo, como em muitas produes humanas vividas no mundo capitalista,

    esse sucesso no tem limite, a sede no saciada e, ento, os homens correm atrs de outro

    mito. Nesse momento o mito acaba por se confundir com o conceito de utopia.

    No aporte de Elizalde (2002, p. 125) pode-se chegar a uma definio de

    desenvolvimento que fuja do senso comum, a saber:

    La nocion de desarollo se refiere al despliegue del potencial interno (endgeno) contenido en cada ser humano y en toda forma de vida, incluso an en las ms simples. La sustentabilidad tiene que ver con la adaptacin del contexto, es decir, del potencial externo, que a su vez es la condicin de posibilidad y el producto o resultado del desarrollo.

    For Evaluation Only.Copyright (c) by Foxit Software Company, 2004Edited by Foxit PDF Editor

  • 75

    Quadro 5: Diagrama da procisso feita pela igreja Santurio Maria Auxiliadora.

    Com isso as pessoas, em um ritmo mais lento e pelo mesmo caminho adotado na

    maioria dos cortejos do dia anterior, chegam s margens do Rio Paraguai e aps darem o

    banho nos santos retornam s suas respectivas casas. Talvez, o fato de a igreja realizar a

    descida todo o ano no mesmo dia e horrio, depois de terminado o ciclo de descidas, se

    deva pelo motivo de simbolicamente, fazer o fechamento oficial deste ciclo, ou pela

    opo de evitar a aglomerao de fiis em um nico cortejo podendo at, talvez, abafar

    os outros cortejos que descem no dia anterior. A resposta sobre este assunto se tornou

    muito confusa, pois eram bastante dispares as respostas (entre as pessoas entrevistadas) em

    torno deste acontecimento. Contudo, o que se viu, foram vrios fechamentos.

    E assim, com a demonstrao desta missa, que se pode concluir o estudo sobre o

    fenmeno e passar para a anlise e, posteriormente, para as consideraes finais, a respeito

    da Festa do Banho do So Joo Batista.

  • 74

    compreenso do local, demonstrada, a seguir, um esquema de como est estruturada a

    missa da igreja:

    Quadro 4: Igreja Santurio Maria Auxiliadora.

    Aps a missa, as pessoas saem do recinto e se posicionam frente de um carro de

    som que os acompanhar at a beira do rio para que o santo, ou os santos por se tratarem de,

    no total, trs andores, um retrato e uma imagem de barro, seja(m) banhado(s). A nica

    funo do carro de som, mais especificadamente do locutor, exaltar a importncia do

    acontecimento, no geral, e dar incentivo aos gritos viva em louvor a So Joo. O

    fogueteiro fica na parte mais frente do cortejo, as pessoas se posicionam ao lado e atrs do

    andor, e a banda permanece atrs do carro de som. A organizao dessa descida fica mais

    bem visualizada no grfico a seguir:

  • 73

    A respeito dos alimentos, dentro de um estudo baseado na teoria de Lvi-Strauss

    sobre o cru e o cozido, aonde o cozido corresponde ao chamado endo-cozinha e o assado

    correspondendo ao exo-cozinha, o endo-cozinha , segunda a teoria, feito no mbito

    familiar mais formal. O exo-cozinha feito no mbito festivo aonde se faz a comida para,

    por exemplo, a comunidade (rua). O que se v na festa de So Joo a mistura, mas pouco

    significativa, do endo com o exo cozinha, pois se encontram para comer na rua

    (arraiais) coisas como milho (cozido), espetinho (assado), porm os alimentos assados

    so mais feitos e vendidos. Todavia, ao voltar do banho do santo, retornam para o arraial,

    aonde so encontradas mais pessoas ligadas famlia, se v o exo-cozinha (assado) mantido

    como alimento principal, dando ao So Joo em Corumb um carter sempre informal.

    Assim, a comida ao invs de assumir um duplo papel simblico, tendo de um lado, como

    expresso de um cdigo culinrio voltado para o grupo familiar e, de outro, como expresso

    de uma unidade social ampla, aparecendo como cdigo ideal, unificador, numa situao em

    que se ope sociedade real (ALVES, 1980, p.67), mantm seu carter informal de festa.

    O ltimo banho de santo, pois, no se trata de um arraial em si, a ser estudado,

    organizado pela Igreja Santurio Maria Auxiliadora. A descida para o banho do So Joo

    da Igreja Santurio Maria Auxiliadora realizada um dia depois em relao aos demais,

    ocorrendo aps uma missa (a missa tem incio s 19 h do dia 24 de junho).

    A missa comea com a entrada de um andor, carregado por quatro beatas, ao som do

    consagrado hino tocado por uma banda, porm o hino tocado de forma lenta, compassada

    e com o volume baixo. Percebe-se a presena de alguns msicos que tocaram no dia

    anterior no Arraial da Secretaria de Turismo e Cultura de Corumb, como tambm para

    tantos outros cortejos.

    Este andor que entra na igreja posto na parte esquerda, em cima de uma mesa, do

    local onde o padre rezar a missa. Junto com ele se encontram mais dois andores, uma

    imagem de barro (sem andor) e um quadro com a imagem do santo impressa. Para maior

  • 72

    4.3.3 O Cortejo acabou, a Festa no!

    Aps o banho do So Joo, as pessoas responsveis pelo seu respectivo andor junto

    com uma parcela de populares que o acompanharam, retornam aos seus arraiais. No local

    do arraial encontram-se pessoas ligadas famlia do organizador da festa, pessoas do bairro

    ou somente os familiares quando se trata de um arraial na casa (interno). O exemplo a

    seguir de um arraial visitado e que por motivo de promessa se fez, mas como muitos, se

    tornou tradicional, e este vai servir para se demonstrar um pouco sobre o que acontece aps

    o banho.

    O responsvel pelo arraial se chama Roberto da Silva, e foi contado que o primeiro

    arraial ocorreu aps o cumprimento de um pedido feito a So Joo, pela bisav, que se

    realizou, e, ento, comeou a ser feito o arraial. O que se observou foi a diminuio do

    nmero de pessoas depois, em relao ao nmero encontrado antes do banho do santo.

    Talvez isso ocorra pela diminuio do entusiasmo. O arraial, no comeo, cercado de

    ansiedade, de levar e banhar o santo, de encontros com pessoas conhecidas, com

    comentrios se o arraial do porto est melhor ou pior do que o do outro ano, etc. No arraial,

    depois da descida, as pessoas esto cansadas e mais calmas, como se tivessem cumprido

    com sua funo no ritual. Segundo Roberto, h o comparecimento maior das pessoas

    denominadas mais chegadas da famlia para uma conversa mais ntima. Ao ser indagado

    sobre o no levantamento do mastro, ele explicou que no se ergue mais o mastro porque

    ele fica exposto (na rua) e que muitas vezes encontrou o mastro depredado.

    Ento a Festa de So Joo em Corumb pode ser, como observado, dividida em trs

    momentos: o arraial antes (da descida do andor para o banho do So Joo), o cortejo

    correspondendo ao durante (a descida) e o arraial depois (a subida no sentido de

    retorno ao arraial), sendo que a nica diferena percebida entre o arraial antes e o arraial

    depois so a intensidade, dos sentidos (sensoriais) e do entusiasmo das pessoas. Por

    exemplo, o antes h uma banda ou qualquer tipo de msica em bom volume (alto), e o

    depois no h banda e a msica em tom mais suave (baixa).

  • 71

    Fotografia 10: O banho do Santo. Fonte: Felipe Coelho Senna / junho de 2003.

    Com a aproximao da meia noite, anunciada no palco, atravs dos altos falantes,

    que est chegada a hora da queima dos fogos de artifcio (oficiais), marcando o fim do

    Arraial do Banho do So Joo, mas isso no impede que a comercializao de comidas e

    bebidas continue. Neste ano (2003), os fogos finais foram soltos em outro lugar, diferente

    de outros anos em que foram soltos ou em embarcaes fluviais ou na margem oposta do

    rio.

    Com isso, tanto os ltimos andores, como os primeiros, foram retornando aos seus

    respectivos locais de origem e as pessoas foram se dispersando e optando entre continuar

    no arraial do porto, ir embora para suas casas ou voltar para o arraial do andor que

    acompanhou.

  • 70

    Nesse ir e vir, na ladeira, a ao da passagem por baixo do andor, de acompanhar o

    cortejo, mesmo que apenas observando, que ocorre o encontro de classes sociais

    diferentes (antagnicas), como ocorre na manifestao do Crio de Nazar (ALVES, 1980,

    p.49):

    Numa situao como a descrita, os opostos se cruzam e/ou se neutralizam permitindo a emergncia de novas categorias, de ao. Assim, o contgio entre as categorias sociais diferentes que na vida cotidiana estariam separadas por uma gramtica de smbolos perfeitamente legveis (um modo de vida, status, papis desempenhados, modos de vestir, profisses, etc.), neutralizado por um grau de purificao expresso no sacrifcio da promessa.

    O banho de So Joo acaba por ser um evento neutralizador das diferenas sociais,

    pelo menos naquele momento mgico do ritual do antes, durante e depois da festa que, na

    verdade, formam apenas um. A purificao e sacrifcio esto, neste fenmeno em estudo,

    mais relacionados s pessoas que organizam um arraial, adornam e banham o santo, do que

    com as pessoas que fazem a ao de passar por baixo do andor, pois ao passarem por

    debaixo do andor elas esto em xtase (alegres) e nem devem se lembrar do cansao

    causado pela ao de subir e descer a ladeira, ou nem devem se cansar, porque os andores

    vo ao encontro da populao necessitando, assim, de um curtssimo trecho para se passar

    por baixo do mesmo. Pde-se observar que h a ao de uma troca simblica do santo

    com os participantes do cortejo, e pode-se dizer, ainda, que sobre essas trocas simblicas

    que se constitui, na prtica, uma festa de santo (BRANDO, 1978, p.49).

  • 69

    Quando h o encontro de um cortejo com o outro, ocorre uma espcie de

    cumprimento entre eles, aonde os dois abaixam os andores simultaneamente. Existe

    momento em que ocorre a queda do santo, que fica no alto do andor, que fica quebrado, s

    vezes, mas esse empecilho no diminui a alegria dos participantes dos cortejos, pois o santo

    colocado de volta ao seu local de origem (topo do andor) e levado para o banho ou para

    o arraial do jeito que ficou. Com o passar do tempo e com a aproximao da passagem de

    um dia para o outro (meia noite), aumenta o fluxo de cortejos que descem e sobem a ladeira,

    criando um tumulto na beira do rio. s margens do Rio Paraguai, as pessoas benzem o

    santo e se benzem, posteriormente, em uma ao recproca semelhante feita por Joo e

    Jesus e que descrita no consagrado hino, Joo batiza Cristo, Cristo batiza Joo. E

    nesse momento, em que as pessoas banham o santo, que se joga gua para todos os lados

    molhando quem estiver perto. Mas teve um momento inusitado em que uma pessoa, que

    pela sua fisionomia e comportamento, se encontrava bbada, ao se ver molhada, caiu no rio,

    e a cada banho do santo, a cada grito de louvao a So Joo (Viva So Joo), jogava

    gua em todos que acompanhavam o cortejo, porm ningum se alterou a ponto de querer

    brigar com esta pessoa, afinal, So Joo carnaval, um momento extraordinrio que

    articula de maneira diferente os momentos ordinrios da rotina cotidiana e, alm de torn-la

    inteligvel, institui uma outra rotina para que os indivduos participantes compreendam as

    diferenas entre o natural e o cultural (ALVES, 1980, p. 25).

    Fotografia 9: Cumprimento dos andores. Fonte: Felipe Coelho Senna / junho de 2003.

  • 68

    Fotografia 7: Participantes passando por baixo do andor. Fonte: Felipe Coelho Senna / junho de 2003.

    So poucas as pessoas que acompanham o cortejo com algum tipo de fantasia, como

    no carnaval, ou que levam lanternas, que composta por uma vareta de bambu ligada por

    um arame (no formato de um v) que se prende a uma armao na forma de um cilindro,

    feito de papel crepom, com o fundo fechado com um papelo, aonde levada uma vela

    acesa.

    Fotografia 8: Pessoas acompanhando o cortejo. Fonte: Felipe Coelho Senna / junho de 2003.

  • 67

    Apesar do consagrado hino ser longo, talvez, as partes que mais se repetem so a

    primeira e a segunda parte. Quando cantado o primeiro verso do hino, as pessoas,

    acompanhadas da banda ou no, executam um estilo mais compassado, lento do verso,

    porm quando se d o incio do segundo verso as pessoas comeam a pular e a passar por

    baixo do andor. No caso de andores acompanhados por uma banda, o trompetista faz um

    chamado e posteriormente tocada uma marchinha de carnaval bem acelerada acontecendo

    o que sucede no caso anterior (passagem por baixo do andor). exatamente por esse

    motivo que as pessoas do cortejo que no possui banda, quando cantam o segundo verso do

    hino, comeam a pular e executar o caminho descrito acima. H cortejos que descem a

    ladeira silenciosamente, os acompanhantes banham o santo e retornam (para a casa ou

    arraial de origem). Esse ltimo fato ocorre, geralmente, em cortejos que so acompanhados

    por um grupo extremamente reduzido de pessoas. A ao de passar por baixo do andor

    advm da crena em que o indivduo que fizer isso, repetindo a ao por sete vezes ter

    casamento certo at o prximo So Joo. Alguns dizem que preciso mentalizar a pessoa

    com quem se deseja casar, pois aumenta a possibilidade de se tornar fato a crena. O

    interessante de se ver a funo que dada a So Joo, a de casar as pessoas que

    cumprirem com a ao explanada anteriormente. A funo de casamenteiro, segundo a

    Prof. Eunice, era de So Gonalo, mas o santo que se popularizou no restante do Brasil

    como casamenteiro, foi Santo Antnio e em Corumb essa funo foi dada a So Joo.

    O(s) motivo(s) pelo(s) qual (ais) ele foi colocado popularmente como santo casamenteiro,

    no municpio, no foi explicado.

  • 66

    andores vm de diversos pontos da cidade, se convergindo na parte frontal da Praa da Repblica

    em frente ao arco da ladeira L 1 do croqui 1, afunilando-se na ladeira Cunha e Cruz e geralmente

    possuem a seguinte formao:

    Quadro 2: Um dos diversos tipos de formao dos andores (procisso).

    O grfico demonstra a formao completa de um cortejo na descida da ladeira Cunha e

    Cruz para realizar o banho do santo, mas deve-se lembrar que no se trata de uma regra para todos

    os andores, uma vez que alguns deles no possuem banda e/ou fogueteiro (pessoa responsvel pela

    queima dos fogos de artifcio). A maioria destes andores acompanhada pelo canto do consagrado

    hino:

    I. Deus te salve, Joo Batista sagrado O teu nascimento Nos tem alegrado O teu nascimento Nos tem alegrado

    II. Se So Joo soubesse Que hoje era o teu dia Descia do cu a terra Com prazer e alegria Descia do cu a terra Com prazer e alegria

    III. Joo Batista Santo Como Deus usou A quem batizaste A vs batizou A quem batizaste A vs batizou

    IV. Joo batiza Cristo Cristo batiza Joo Onde foram batizados No Rio Jordo Onde foram batizados No Rio Jordo

    Quadro 3: Ladainha de So Joo. Fonte: PREZ, ngela (org.). So Joo - Mato Grosso do Sul (Testemunhos Literrios). Edies

    Caravela: Porto Alegre RS, 1988.

  • 65

    A ordem colocada por Megale no fixa, pois o orix Xang, segundo algumas informaes,

    corresponde tambm a So Joo. Existe outra verso para o incio das prticas do sincretismo. O

    relato do Sr. Sebastio, da Tenda Esprita de Umbanda Caboclo Estrela do Norte (Corumb-MS),

    disse que os negros escravos eram impedidos de cultuar os seus deuses (orixs), ento, eles

    comearam a celebrar seus deuses utilizando as imagens de santos do catolicismo, sendo assim

    ficavam livres para celebr-los. Em um estudo, Moura (1981, p.77) encontrou num terreiro em

    Porto Alegre a ligao entre Xang-Aganju e as fogueiras de So Joo, mais especificamente com

    So Joo Batista.

    Existe uma diferena na utilizao das palavras e religies, Candombl e Umbanda, sendo

    que mesmo no havendo unidade, nem sequer de denominao, so muito semelhantes entre si,

    mas aparecem com as seguintes denominaes: Candombl na Bahia e tambm no Rio de

    Janeiro; Umbanda no Rio de Janeiro e adjacncias (MELATTI, s.d., p.75). Todavia, o mesmo

    autor (s.d. p.77) relata que a Umbanda aglutina [...] catolicismo, espiritismo e ocultismo. Pode

    existir uma explicao melhor que separe o termo Candombl do termo Umbanda, porm, o que se

    v, que na prtica, eles se misturam em sentido e ao.

    Continuando, percorrendo a cidade durante o dia 23 de junho, ao anoitecer, pode-se observar

    que foram colocadas frente de algumas casas, umas fogueiras e/ou um mastro (cada um com seu

    tipo de adorno). Estas casas no possuam arraial (particular), talvez seja uma reminiscncia da

    poca descrita pelo Sr. Sebastio, na qual o So Joo era comemorado em casa. Essa linguagem

    para ser eficaz tem que ser percebida e entendida pelos que emitem e recebem da o carter

    redundante do ritual (ALVES, 1980, p.24). Isso faz com que os gestos ritualsticos sejam vlidos,

    na medida em que se acredite neles. Lvi-Strauss apud Brando (1978, p.72) afirma tal explicao

    colocando que no porque so eficazes que se repetem, porque se repetem que se tornam

    eficazes.

    A descida dos andores para o banho do So Joo d-se incio s 22h, com um

    espaamento maior de tempo entre um andor e outro, mas diminuindo com o passar do tempo. Os

  • 64

    A caracterstica geral desses cultos a possesso da divindade pelo crente, ou melhor, sobre o crente iniciado para tal fim. Geralmente so as Filhas de Santo consideradas cavalos em que montam quando a da possesso. Estas divindades so denominadas Orixs, existindo ainda as figuras de Exu e If, o primeiro, mensageiro entre os homens e os orixs e este uma espcie de orculo, que transmite aos homens os pensamentos dos orixs; o adivinho por excelncia.

    Fotografia 6: Parte externa do terreiro Maria Aparecida de Souza. Fonte: Felipe Coelho Senna / junho de 2003.

    Contudo, v-se a presena de um orix do candombl numa festa catlica, porm este orix

    representado pela imagem de So Joo no terreiro e no andor. A isso foi dado o nome de

    sincretismo:

    Existe um sincretismo muito grande entre os orixs e os santos catlico, porque os negros, chegados ao Brasil, notaram que haviam santos invocados para os mesmos fins dos seus orixs, da confundirem as mesmas entidades. Por exemplo: Omolu, orix que protege contra as pestes, o chamado deus da bexiga, se confundiu com os santos que defendem, contra as epidemias: S. Lzaro, S. Roque e S. Sebastio. O deus supremo Olorum ou Zaniapombo se confunde com Jesus. Oxal, pai dos orixs o Senhor do Bonfim. Os Ibej, orixs meninos, gmeos, so confundidos com S. Cosme e S. Damio. Outros orixs so: Xang, representao dos raios e tempestades, identificado com S. Jernimo; Oxoce, deus da caa, S. Jorge; o deus do ferro Ogum se identifica com Santo Antnio, que na Bahia tinha posto de capito do exrcito;Oxun-mar, o arco-ris est identificado com S. Bartolomeu, crido de Xang e tem a forma de uma serpente (MEGALE, 1999:76).

  • 63

    transformao. Os ritos so momentos no-rotinizados, apresentam-se como situaes

    extraordinrias, da a importncia dada ao sagrado ou a sacralizao que seria inerente a

    performance ritual.

    Em primeiro lugar, demonstrar os ritos do terreiro de candombl. S se pode acompanhar a

    parte catlica, como se ver a seguir, das rezas, pois o tempo foi escasso para uma investigao

    de suma importncia.

    Dona Natalcia, a responsvel pela Tenda Nossa Senhora Conceio que pertence ao

    Terreiro Maria Aparecida de Souza, relatou que existem trs momentos na festa: a reza, o banho

    (do So Joo) e a festa. Ela mesma nos convidou a comparecer no trabalho de candombl, que iria

    acontecer no dia 22 de junho s 19h. Todavia, isso s foi possvel somente no dia 23 de junho s

    21h, sendo esse dia o responsvel pela parte catlica.

    O local da parte catlica estava armado com uma aparelhagem de som, monitorado por

    um DJ (Disck Jockei) cadeiras, mesas e com o andor sobre uma mesa maior. A cerimnia ocorreu

    fora da rea de trabalho, como um dos participantes chamou a parte do terreiro responsvel pela

    parte de candombl, em um tipo de galpo, ao lado do mesmo. frente do terreiro havia algumas

    pessoas vendendo licores, cerveja e comida, suas estruturas pareciam at mesmo igual a dos

    autnomos sem barraca do Arraial do Banho do So Joo. Algumas pessoas comearam a chegar

    e esperar pela rezadeira, que a princpio pensava-se ser a Dona Natalcia, que na verdade j tinha

    chegado. Tratava-se de uma senhora idosa, mais ou menos 80 anos, que cansada de esperar pela

    Dona Natalcia, resolveu dar incio reza. Todos se posicionaram, em p, em frete ao andor, ento a

    rezadeira deu incio s oraes. Foi rezado o tero inteiro com alguns intervalos de louvao a So

    Joo e outros santos catlicos. Aqui cabe uma explanao a respeito dos cultos de Candombl e

    Umbanda.

    Geralmente os cultos e rezas de um terreiro de candombl acontecem de um modo diferente

    do que se viu, supe-se que isso acontecera no dia anterior, como observou Megale (1999, p.73):

  • 62

    Pode-se observar este esprito em diversas comemoraes, tem-se (DORCS, s.d. apud

    MONTES s.d., p.143):

    Sempre que encontramos reunidas em um s gesto vrias intenes contraditrias, o resultado estilstico pertence categoria do Barroco. O esprito barroco, para diz-lo vulgarmente e de uma vez por todas, no sabe o que quer. Quer ao mesmo tempo, o pr e o contra. Quer eis aqui estas colunas cuja estrutura um paradoxo pattico gravitar e voar. Quer recordo-me de certo anjito numa certa grade de uma certa capela de certa igreja de Salamanca levantar o brao e baixar a mo. Afasta-se e cerca-se em espiral. Ri-se das exigncias do princpio de no contradio.

    O barroco cabe tambm nesta festa, como em tantas pelo Brasil afora, citadas anteriormente.

    Montes (s.d., p.144) ressalta o barroco quando comenta que:

    Para um antroplogo ou historiador das mentalidades, a revelao desta extraordinria continuidade viria com a descoberta de que uma verdadeira cultura da festa, barroca em suas Santurio Maria Auxiliadoraes, impregna em profundidade o fazer e o sentir brasileiro, visvel ainda, longe dos cnones eruditos da arte contempornea dos museus, nas formas das chamada cultura popular. Lugar de confluncia da vida social [...] torna-se assim ndice privilegiado de mentalidade e estilo de vida, permitindo-nos explorar o significado da marca barroca que, como herana ela carrega e a que ela permiti ainda manifestar-se, forma vida de cultura e no simples sobrevivncia, no mundo contemporneo

    Assim pode-se afirmar que a festa do povo, e que ele exprime uma capacidade de

    conformismo ao resistir, capaz de resistir ao se conformar.

    4.3.2 Cultura em Movimento

    Neste tpico sero apresentados os acontecimentos relativos ao fenmeno em movimento,

    isto , o banho e os movimentos de devoo, subida e descida da ladeira do Arraial do Banho de

    So Joo. Para isso falar-se- do rito, que tem como significado, comunicao. Comunicao com o

    que? Com o mundo espiritual e suas foras sobrenaturais, atravs de gestos, sinais, rezas que

    possuem significao. Todas as religies possuem algum tipo de comunicao com o mundo

    espiritual como forma de respeito, cura ou agradecimento. No conceito de Alves (1980, p.21),

    articular elementos simblicos, os eventos rituais so propcios interpretao, comunicao e

  • 61

    Outro arraial visitado foi o da Dona Titina, como gosta de ser chamada. O arraial se localiza

    na Rua Major Gama, entre as ruas Cabral e Cuiab, e segue a mesma estrutura encontrada em

    outros arraiais, mas que, como o Arraial do Banho de So Joo vende, o vatap. Dona Titina pde

    nos informar, em poucos minutos de entrevista, que por causa de uma beno concebida a um

    familiar que se fez o primeiro arraial, com o banho no So Joo, e que isto comeou a ser repetido,

    ano aps ano, at o arraial se tornar tradio. Alis, h um consenso entre todos os entrevistados, a

    de que a Festa de So Joo nos moldes em que feito em Corumb, se tornou uma tradio do

    municpio que envolve o poder pblico, a igreja e diversas classes sociais. Como ocorre na Festa

    do Esprito Santo em Pirinpolis-GO, os agentes da Festa trabalham no sentido de preservar o que

    consideram suas tradies, para eles o motivo quase nico pelo qual tem sentido repeti-la todos os

    anos (Brando, 1978, p.45). No arraial de Dona Titina o interessante foi observar que, quando a

    descida do andor para o banho do santo era anunciada, as pessoas comearam a esvaziar o mesmo,

    pois segundo algumas pessoas, como o Porto fica muito longe prefervel ir de carro at as

    proximidades da ladeira Cunha e Cruz, e de l esperar e acompanhar o santo deste arraial.

    Para finalizar, falar-se- do papel da Igreja, que no passado entrou em conflito com a festa.

    Em entrevista com o Sr. Fbio Alexson, obteve-se a informao de que, existiu um padre,

    responsvel pela Igreja Santurio Maria Auxiliadora, que tentou acabar com a festa por causa do

    esprito carnavalesco que envolvia o culto ao santo. O padre a que se referiu Alexson no mais

    toma conta da parquia em questo.

    Fotografia 5: Igreja Santurio Maria Auxiliadora. Fonte: Disponvel no site < www.corumba.com.br> acesso 14/06/2006.

    http://www.corumba.com.br>

  • 60

    Fotografia 4: Ladeira Cunha e Cruz e o rio Paraguai, ao fundo. Fonte: Felipe Coelho Senna / junho 2003.

    A regio marcada com o nmero 4 corresponde s lojas que, fora do perodo da festa,

    trabalham com a venda de produtos para pesca, passeios tursticos e bares, que durante o perodo da

    festa vem a oportunidade de comercializam comidas, como lucro extra, montando mesas e

    vendendo, alm de bebidas e comida, artesanato com temas relacionados com o Pantanal, chapus

    de palha, entre outros produtos. O R 1 o trecho aonde ocorre o arraial e corresponde avenida

    porturia. E por ltimo, a regio demarcada com o nmero 5, se trata de uma rea de passeio na

    qual as pessoas tentam escapar do tumulto, e aonde se encontra o brinquedo pula-pula.

    Por toda as cidade so montados Arraiais. Observou-se que a Secretaria de Cultura e

    Turismo organiza seu prprio arraial, na sede da mesma, e que nele esto envolvidos os Cururueiros,

    as pessoas que danam o Siriri, a banda marcial e os comes e bebes gratuito, e o arraial do

    Rottary Clube.

  • 59

    O L 1 e o L 2 correspondem respectivamente s ladeiras que do acesso ao arraial, sendo

    que pela primeira, a Ladeira Cunha e Cruz, que descem as pessoas para banhar o santo exatamente

    no ponto 1. Todos, sem exceo, descem essa ladeira para banhar o santo.

    Segundo alguns relatos, houve um ano em que a Prefeitura tentou organizar a descida pela

    ladeira L 2 e a subida pela L 1, mas fez com que o encontro dos andores no ocorresse, este um

    dos pontos de importncia para o movimento do banho do So Joo. O que se v nas ladeiras, que

    os autnomos (sem barraca) se posicionam nelas, pois as mesmas so as portas de entrada da festa e

    por serem o nico meio de se chegar ao arraial oficial, porm os mais privilegiados so os que se

    localizam na ladeira L 1, porque por ali que passaro os andores para a lavagem do santo. O porto

    tem outros dois acessos, mas que ficam nos extremos, portanto, muito distantes do arraial. Os

    retngulos demarcados com o nmero 2 so as barracas que foram leiloadas pela prefeitura, sob

    as condies estipuladas, como foi visto anteriormente. Na regio demarcada com o nmero 3,

    encontra-se um vazio cercado de folhas de bacuri (tipo de palmeira) a meia altura (mais ou menos

    com um metro de altura) com a funo de separar a parte externa por onde passam as pessoas, pois

    ali reservado s pessoas que, se quiserem, podem danar. Mas tambm o espao no qual

    acontece a apresentao dos grupos concorrentes no Concurso de Quadrilha que, segundo

    informaes, recebem premiaes de acordo com a posio que foi conquistada.

  • 58

    comidas [...] Est claro que as noites do arraial so de encontro, de circulao de pessoas, de namoro e de um conjunto de fatos que por sua prpria natureza no esto sob o controle da Diretoria da Festa e muitas vezes exigem a interveno de outros mecanismos de fora como a polcia e agentes da prpria diretoria.

    Estes acontecimentos que ocorrem com o Arraial do Crio, ainda acontecem em pequena

    escala no Arraial do Banho do So Joo, mas so artifcios que buscam chamar a ateno do

    espectador enquanto os andores no descem (a ladeira), ou durante, porque no todo mundo que

    acompanha a descida dos andores. A festa comea na noite do dia 21 de junho (sbado neste ano),

    e vai at a passagem da noite do dia 23 de junho para a madrugada do dia 24 de junho (segunda-

    feira para tera-feira neste ano).

    As bebidas e comidas so vendidas, tambm, por autnomos que possuem petrechos

    precrios e sem a estrutura metlica das barracas oficiais; assim improvisam com pequenas

    churrasqueiras (para a venda dos espetinhos) e/ou isopores com gua, cerveja e refrigerantes. Eles

    ocupam duas posies estratgicas, como pode ser percebido por meio de um croqui (1) do Arraial

    do Banho do So Joo a seguir:

    Quadro 1: Porto de Corumb.

  • 57

    No ano em que foi feita a visita a campo (2003), a Prefeitura buscou o apoio do Governo

    para a realizao do Arraial, para amenizar os custos, que em anos anteriores vinham somente da

    Prefeitura e da Secretaria Municipal de Turismo e Cultura, trazendo a possibilidade da realizao de

    um espetculo com mais atraes e grandiosidade. Foram contratados artistas regionais (usa-se

    este termo para designar os artistas que pertencem, no sentido de moradia, no Estado e nem sempre

    tocam msicas regionais, como a polca, o chamam e o sertanejo, enfim, ritmos musicais que foram

    incorporados festa de So Joo e que foram reincorporados na festa local). Dentro desta festa da

    prefeitura, o arraial oficial13, foi feito um tipo de leilo para que as pessoas pudessem montar sua

    venda dentro do arraial oficial com a estrutura (a barraca) fornecida pela mesma. Segundo o Sr.

    Fbio Alexson, que trabalha no ILA (Instituto Lus de Albuquerque), as barracas so autorizadas a

    serem montadas a partir do pagamento de um valor que fica entre 150 (cento e cinqenta) e 300

    (trezentos) reais, sendo que neste leilo d-se a prioridade s barracas, que nos dias de festa,

    vendam comidas e bebidas tpicas da festa do ms junino, como p-de-moleque, paoca de carne

    seca (um tipo de farofa), arroz carreteiro, milho assado, espetinho (churrasco com pequenos

    pedaos de carne estacados em espetos, de proporo bem menor que o convencional, que podem

    ser acompanhados de mandioca cozida e uma poro de vinagrete [pedaos de cebola e tomate

    picados misturados com gua e leo formando um tipo de molho]). As bebidas tpicas seriam os

    licores, de diversos sabores, e quento; as brincadeiras que so tradicionais nas festas juninas so a

    pesca, a priso, etc. Contudo o que se viu foram barracas no s com comidas, bebidas e

    brincadeiras tpicas, mas tambm com a venda de vatap, comida tpica dos Estados do Nordeste

    brasileiro, coquetis das mais variadas bebidas, tendo at a opo da prpria pessoa fazer seu

    coquetel (um self service alcolico), e uma brincadeira igual encontrada em parques de diverso

    (o pula-pula uma espcie de colcho de ar, muito procurado pelas crianas).

    O que fica claro o mesmo fenmeno que se encontra no arraial do Crio de Nazar,

    conforme (ALVES, 1980, p.75):

    Nota-se que o arraial em que se desenrola a festa, no ponto de encontro [...] a caracterstica principal do arraial so os brinquedos, termo que indica o parque de diverso, barracas pequenas ou grandes destinadas venda de bebidas e

    13 A denominao arraial oficial para diferenciar dos demais arraiais que no so organizados pela prefeitura.

  • 56

    esquinas e deve medir de seis a sete metros de altura. Neste arco encontram-se impressos o ttulo do

    Arraial (Arraial do Banho do So Joo), e tambm as logomarcas com os respectivos nomes das

    instituies que patrocinam (Governo do Estado de Mato Grosso do Sul e a Prefeitura Municipal de

    Corumb) e organiza o evento (somente a Prefeitura Municipal de Corumb).Este arco encontra-se

    na outra ladeira que d acesso festa.

    Fotografia 3: Arco da entrada localizado na ladeira Cunha e Cruz. Fonte: Felipe Coelho Senna / junho de 2003.

    Eles possuem a mesma funo com o descrito por Alves (1980, p.83) sobre os arcos

    encontrados no Crio de Nazar:

    o arraial um espao demarcado por entradas e sadas, onde so armados os arcos iluminados [...] Observa-se que os arcos restringem o espao ritual sob a gide da imagem da Santa. Contudo esse espao, consagrado como o da festa, compreendem situaes ditas sagradas e profanas, na medida em que ele permite uma intensa comunicao entre as pessoas [...]

    Os arcos restringem o espao ritual mostrando que no s o lugar do arraial, mas tambm

    onde h a descida dos andores (Ladeira Cunha e Cruz) e ali se manifestam todos os movimentos, a

    festa e o banho do So Joo.

  • 55

    esperana de livrar todo seu corpo, mente e alma, dos males que as afligem, causados por mau-

    olhado, inveja, entre outros fatores que s vezes mesclam atitudes sociais com efeitos corporais.

    Talvez o banho seja feito no rio Paraguai, pelo fato da populao acreditar que o rio possui

    propriedades curativas como o rio Jordo, devido importncia que ele tem para a regio, mas isso

    seria difcil de se afirmar com clareza. O que se pode afirmar que esse rito acontece por ser uma

    re-atualizao do mito cosmognico em que Joo batizou Cristo e esse batizou Joo.

    Enfim, os elementos permeiam os rituais de diversas religies, fazendo parte do rito e da

    magia, dando corpo ao ritual em seu aspecto geral, tornando-o no apenas uma festa religiosa, mas

    um local aonde se forma, segundo Lvi-Strauss (s.d. apud ALVES 1980, p.24), um vaste systme

    de communication entre individus et l groups, ou mesmo quando, segundo Leach apud Alves

    (1980:24), apontar sobre a mesma idia a reformula afirmando que, a ritual sequence when

    perfomed in full, tends to be very repetitive whatever the message may be that is supposed to be

    conveyed, the redundancy factor is very high. Este sistema passa de signos para significados, que

    dentro de uma comunicao entre as pessoas e essas com o santo formam uma rede que se repete

    com a esperana da efetivao do milagre, ou da magia.

    4.3 O PROCESSO DOS ARRAIAIS

    4.3.1 Antes do Arraial

    a partir daqui que se traar o objetivo principal da Festa de So Joo em Corumb,

    intitulado pelas instituies locais com o nome Arraial do Banho do So Joo, que o de

    contextualizar as relaes sociais e fenmenos simblicos na festa.

    Primeiramente, como o ttulo sugere, falar-se- da preparao do espetculo, as atraes a

    serem apresentadas e sobre a prpria estrutura da festa: oficial (organizada pela Prefeitura do

    Municpio) e no oficial (arraiais espalhados pela cidade). A partir do ponto mais alto da Ladeira

    Cunha e Cruz so colocados adornos, como as tradicionais bandeirolas, e na parte aonde a ladeira

    faz esquina com a Rua de Lamare, foi colocado uma espcie de arco que toca as pontas das

  • 54

    flores, dinheiro e frutas. Esses adornos de cunho alimentcios so reflexos das culturas pr-crists,

    nas quais em certas religies, havia o culto a diversos deuses.

    A gua o elemento ltimo a ser analisado. A gua abenoa, porque simboliza a soma

    universal das virtualidades: so fons et origo, o reservatrio de todas as possibilidades de existncia;

    precedem toda forma e sustentam toda criao (ELIADE, 1999, p.110). E mais:

    No ciclo vida e morte, essa dualidade dos sentidos da gua se manifesta assumindo, em muitos casos, simultaneamente, o smbolo da morte e da regenerao. nas guas que o sentido mstico das crianas malficas, presente no universo das culturas antigas tradicionais, parece se realizar: a gua permite o expurgo dos males, evitando-se que as crianas toquem a terra (DIEGUES, 2000, p.21)

    Somado a esse trecho pode-se dizer que o fato da gua possuir sal, como as guas do mar,

    tornam-na mais purificadora ainda, sendo o sal um fator somtico. Eliade (1999, p. 111-112),

    baseado em Tertuliano (De Batismo III-V) e Joo Crisstomo (Homil.in Joh., XXV, 2) relata:

    Foi a gua que produziu o que tem vida, a fim de que o nosso espanto cessasse quando ela gerasse um dia a vida no batismo [...] Toda gua natural adquire [...] a virtude da santificao no sacramento [...] O homem velho morre por imerso na gua e d nascimento a um novo ser regenerado.

    E a gua faz parte da Festa de So Joo de Corumb, porque um dos raros lugares em que

    ainda continua o fenmeno de dar banho na imagem do santo, seja a imagem feita de barro levada

    em um andor (espcie de mesa sem pernas, mas com quatro hastes na horizontal por onde quatro

    pessoas levam o santo), ou levada em uma foto com moldura, ou impressa em uma medalha na

    corrente para colocar no pescoo. com a gua que as pessoas se benzem ao entrar na igreja,

    quando so batizadas, quando so purificadas em festividades em louvor a um santo do candombl

    (gua de cheiro), quando querem se purificar, por exemplo, quando lhe pedido que tome um

    banho de descarrego, solicitado por um pai ou me-de-santo, ou at mesmo por uma pessoa

    responsvel por um centro esprita (ou uma varincia de um templo esprita). No caso do banho de

    descarrego as pessoas somam gua, sal grosso, ramos de arruda, guin, essncias, com a

  • 53

    V-se a inter-relao de conceitos, entre Radcliffe-Brown e Chau em certos pontos, sendo

    que Chau destaca a lngua para exprimir sua idia, apesar do ltimo autor (a) no ter

    tradicionalmente estudos voltados para a religio, vlida a citao.

    Outro smbolo presente na festa o mastro. Este est ligado, entre muitos significados, ao

    fato de Isabel ter prometido a Maria, o levantamento do mesmo, para o nascimento de Joo. O

    levantamento do mastro, na festa de So Joo, sempre acompanhado de rezas e cantorias. A

    busca pela madeira e seu corte devem ser feitos em uma sexta-feira, por trs pessoas, com a lua, de

    preferncia, em quarto minguante. A respeito disso o Sr. Agripino relatou exatamente o que foi

    descrito acima, porm no se tem o motivo pelo qual o corte realizado nestas condies. O

    erguimento do mastro se assemelha ao rito descrito por Eliade (1999, p.36-41):

    O poste sagrado dos achilpa sustenta o mundo deles e assegura a comunicao com o Cu. Temos aqui o prottipo de uma imagem cosmolgica que teve uma grande difuso: os pilares csmicos que sustentam o Cu e ao mesmo tempo abrem a via para o mundo dos deuses [...] Essa coluna csmica s pode situar-se no prprio centro do Universo, pois a totalidade do mundo habitvel espalha-se volta dela. O mesmo simbolismo do Centro explica outras sries de imagens cosmolgicas e crenas religiosas, entre as quais vamos reter as mais importantes: (a) as cidades santas e os santurios [...] (b) os templos so rplicas da Montanha csmica e, consequantemente, constituem a ligao por exelncia entre a Terra e o Cu; [...]

    Isso concede ao mastro a condio de Axis Mundi, o eixo de comunicao entre a terra e o

    Cu, lugar aonde vivem os seres celestes, divinos.

    Em certos arraiais ou mesmo festas, existem pessoas designadas pelo festeiro, chamado de

    padrinho do corte. Quem prepara o mastro o capito que pode pint-lo de vrias cores. Num rito

    organizado, o alferes da bandeira tambm tem suas responsabilidades e obrigaes (DELLA

    MNICA, 1982, p.26).

    No ponto mais alto do mastro so colocados adornos que variam de quem vai ser o

    responsvel pelo mastro. Pode-se ver coroa, retrato de So Joo, fitas coloridas, bandeira, entre

    outros. Mas h locais, fora desse nicho de estudo, em que se colocam, na ponta do mastro, milho,

  • 52

    A este foram convidados pessoas ilustres, inclusive o rei, a rainha e a princesa. Entre os convidados destacava-se um, de aspecto msculo e bem apresentvel. Era So Joo Batista. A princesa deixou-se encantar pelo convidado e ofereceu-se para com ele danar. Apesar da insistncia, no conseguiu, o que muito a irritou.[...] Tomada dessa confuso de sentimentos amor prprio ferido, dio e satisfao e, ao mesmo tempo, sentindo-se lisonjeada pelas atenes de que era alvo, a princesa foi ter com sua me, Herodias, para aconselhar-se com ela. O que deveria pedir ao rei, disse-lhe a me, era a cabea de Joo Batista [...] O rei, chamando um de seus soldados, mandou que fosse cumprida a sentena. A cabea de So Joo Batista foi entregue a princesa, numa bandeja e exibida perante os convidados como um trofu [...] este havia sido atirado a uma fogueira [...] Todavia o corpo de So Joo Batista deu-lhe novo alento, as chamas se elevaram para o alto e o corpo, ao invs de queimar-se e escurecer-se, permanecia ntegro, mais alvo e brilhante.

    Essa seria apenas um das diversas verses que se encontra. A outra explicao do costume

    de se fazer fogueira vem da histria bblica onde Maria, me de Jesus, ter combinado com Jos, pai

    de Jesus, que o avisaria do nascimento de Joo acendendo uma fogueira defronte a casa de Zacarias

    e Isabel, pais de Joo, onde Maria estava hospedada espera do nascimento. Sendo assim, de um

    simples aviso, a fogueira se tornou smbolo de louvor a So Joo. Alencar (1994, p.8) afirma que o

    fogo louvor, a fogueira um smbolo. E atravs deste smbolo, e de outros, que se cria o

    significado, e atravs dos significados que se expressam as aes. Para RadCliffe-Brown (1978,

    p.13) o significado de uma palavra, um gesto, um rito, est no que ele expressa, e isso

    determinado por suas associaes com um sistema de idias, sentimentos e atividades mentais.

    A festa se torna uma rede de significados que se interligam, exercendo uma funo social e

    essa funo serve, no articular de Radcliffe-Brown (1978, p.13) para denotar os efeitos de uma

    instituio (costume ou crenas) enquanto concerne sociedade e sua solidariedade ou coeso.

    Ento, essa rede traz consigo, no mnimo, o aspecto de aproximao, no s de pessoas, mas

    destas com o divino. Assim, a lngua o meio para o dilogo ritual:

    [...] a lngua uma entidade isolada nem uma essncia, mas a dimenso da vida cultural em sua particularidade histrica, exprimindo relaes com a natureza com os demais membros da sociedade, o espao, o tempo, o visvel, o invisvel, o sagrado e o profano, o poder, o possvel e o impossvel, com o ser e o agir (CHAU, 1989, p.110).

  • 51

    de se negar a unio do til ao agradvel, quando o arraial, para o turista, representa diverso e

    para os organizadores, arrecadao, propaganda e prestgio para a empresa e organizao

    envolvidos. No se trata aqui, ainda, de um turismo religioso nas propores do Crio de Nazar

    (Belm-PA), da Festa do Divino Esprito Santo (Pirinpolis-GO) e da Festa de So Benedito

    (Aparecida-SP), mas de um turismo cultural emergente.

    Existem tambm muitas escolas, tanto municipal, estadual e particular, que fazem suas

    descidas com a imagem do santo pela ladeira at beira do rio para lav-la. Entre as muitas

    escolas foram observadas, por acaso, a Escola Municipal Lus Feitosa Rodrigues, Escola Estrela do

    Oriente e a Escola Tenir. Outras, realizam o arraial, nos moldes costumeiros de festas juninas, sem a

    descida do santo ao rio Paraguai.

    4.2 ELEMENTOS: A GUA, O FOGO E O MASTRO

    Deve-se lembrar que os elementos da natureza como o fogo, a gua, o ar e a terra, esto

    presentes nos cultos religiosos anteriores ao cristianismo e continuam at os dias de hoje. Assim,

    alguns desses elementos foram conservados e utilizados como parte das festividades crists.

    O fogo simboliza a purificao, representa o sol, e ganhou sua identidade simblica com o

    povo. Alencar (1994, p.7), a respeito do fogo, lembra que a frente dos altares dos deuses sempre

    havia uma pira de fogo ardendo [...] Da pira ardente ao artifcio, seu simbolismo ganhou identidade

    [...].

    H pessoas que praguejam outras as destinando para o fogo com expresses como voc

    arder no fogo do inferno (ALENCAR, 1994). O fogo foi, ento, lentamente incorporado s festas,

    entre elas a de louvor a So Joo Batista. O fogo representado na festa de So Joo pelas fogueiras.

    Para o fogo, Rocha (1997, p.31) busca a explicao de uma pessoa do meio folc (popular) (Sr.

    Agripino S. de Magalhes):

    Antigamente, a fogueira no tinha nenhum significado especial. Era acesa de acordo com as necessidades. Certo dia, houve uma grande festa e, nela um baile.

  • 50

    realizaram seu papel porque a Prefeitura alegou no ter verba, mas teve verba para um evento

    grande, para as atraes que se apresentaram no palco principal e para os fogos de artifcio.

    Existe tambm o arraial que organizado pelo Hotel Nacional com apoio do Rottary Clube,

    e se localiza na Rua Amrica entre as ruas Antnio Maria Coelho e Frei Mariano, um ponto bem

    conhecido pelos citadinos.

    Fotografia 2: Arraial do Hotel Nacional / Rottary Club. Fonte: Felipe Coelho Senna / junho 2003.

    Nele h barracas com bebidas e comidas tpicas, um grupo sertanejo e um andor. O que

    interessante de se ver a presena de um arraial organizado por um hotel (aspecto turstico), e que

    tem o apoio de uma instituio internacional, v-se, ento, a confluncia que a festa traz para o

    municpio. Elementos que se distanciam no dia-a-dia, mas que convergem no dia da festa. Seria este

    arraial apenas um atrativo para os turistas que se hospedam no hotel, ou um arraial como os outros?

    Pode-se ver como um arraial para exclusivos, primeiramente, porque cobrada uma taxa para

    participar do arraial, mas segundo o administrador do mesmo, o dinheiro arrecadado destinado a

    instituies carentes. Contudo, mesmo que cheguemos a concluses romnticas ou radicais, no h

  • 49

    Outra caracterstica do arraial organizado pela prefeitura so as barracas, que s podem ser

    montadas pela Prefeitura que as alugam a um preo que varia entre 150 e 300 reais, com o

    compromisso de se vender apenas comidas e bebidas tpicas, mas verifica-se que isso no acontece.

    O aparato de sonorizao, palco, contratao de msicos regionais e ornamentao do local tudo

    patrocinado pela Prefeitura, com apoio do Governo do Estado, e empresas particulares. A Prefeitura

    tambm organiza o concurso de quadrilhas, e oferece prmios12.

    Segundo o Sr. Fbio Alexson, membro do Instituto Luiz Albuquerque (ILA) a festa

    profana, porque no a Igreja Catlica que realiza e sim a populao, mas que a Prefeitura faz uma

    parceria com o Governo do Estado para engrandecer a festa. Percebe-se o significado de profano,

    para ele sendo apenas o que no organizado pela Igreja Catlica. Hoje a festa, continua Senhor

    Alexson, criou ares de show e o santo passou a ser coadjuvante e que h uma concorrncia do

    show com o banho do santo. Pode-se dizer que por parte de muitas pessoas que foram observadas e

    entrevistadas informalmente (sem questionrio especfico), no h o interesse pelo rito do banho do

    santo, mas sim pela festa no seu aspecto geral. Essa viso pode ser primria de uma entrevista; no

    obstante, o que se v so trs tipos de participantes na festa; os que participam da celebrao do

    santo (participando do arraial e seus preparativos, da descida ao rio Paraguai, ou em apenas um

    desses ritos), outra como expectadora do banho e outra que se interessa somente pelos

    entretenimentos (shows, comidas, brinquedos, etc.). A senhora Natalina d uma descrio bem

    interessante nesse caso. Indiretamente ela observa dois tipos de festa popular: uma festa pro povo

    e outra feita pelo povo. A primeira se refere organizada pela prefeitura do municpio, e a segunda

    preparada pelas pessoas nas suas casas, ruas, bairros.

    H, ainda, a queima dos fogos de artifcio, mais uma alegoria a ser inserida nos festejos. No

    de exclusividade do festejo, mas tambm cobre vrias ocasies como exposies, comcios,

    eventos em geral. Eles completam o So Joo, como muitos entrevistados disseram, mas h certas

    pessoas que reclamam a respeito da demasiada importncia que dada aos fogos, sendo at

    motivo de discrdia. O Sr. Fbio Alexson explica que, houve So Joo em que os Cururueiros no

    12 O arraial organizado pela Prefeitura, com o apoio (naquele ano) do Governo do Estado, pode ser denominado de diversas maneiras pela populao, entre elas: Arraial da Prefeitura, Arraial do Banho de So Joo e Arraial do Porto.

  • 48

    culto indgenas, afro-brasileiros e, mais recentemente, espritas kardecistas (BRANDO, 1987, p.41-42).

    Esta uma parte para esclarecer a questo de tantos andores e arraiais organizados sem

    interveno de um agente da Igreja. Isso pode ser explicado de maneira mais concisa quando, mais

    uma vez, Brando (1987, p.109-110) elucida tal fato enunciando que:

    Mais do que todos outros aspectos, entretanto, h um que define o modo de ser catlico no Brasil. Mais do que politicamente dominante em seu campo de relao de poder, o catolicismo foi e ainda , a religio de todos. Ateno isto no significa apenas que demograficamente uma religio de uma maioria uniforme de iguais praticantes; significa, antes, que o catolicismo socialmente a possibilidade de todas as categorias de sujeitos sociais possurem uma mesma religio e diferenciarem, no seu interior, modalidades prprias de sua religiosidade.

    Em paralelo aos andores populares h o andor que desce s sete horas do dia 24 de junho,

    e organizado pela Igreja Santurio Maria Auxiliadora de Corumb (descrevera-se posteriormente).

    Mas, o Arraial que mais chamou a ateno foi o que a Secretaria de Cultura local organiza. Nele

    participam os Cururueiros e o grupo de Siriri, como tambm a banda marcial da prefeitura que toca

    msicas regionais (polca, chamam, etc.). So distribudas comidas e bebidas enquanto a banda

    marcial toca.

    O arraial da Secretaria de Cultura, tem por funo divulgar o turismo e a cultura, mas agrega,

    exclusivamente, os servios artsticos dos Cururueiros e o do grupo de Siriri. Pode ser que os dois

    grupos foram secretaria e solicitaram a ajuda, mas isso no foi dito pelos entrevistados, e sim que

    a Prefeitura, atravs da Secretaria de Cultura, procurou e pagou cada um dos grupos para participar

    da festa justificando que para lembrar a antiga tradio da festa (Senhor Alexson). O certo que

    eles so pagos e posteriormente descem para o Porto Geral, onde esto armadas barracas e um palco,

    e ali se realiza o levantamento do mastro oficial, acompanhado de rezas e ao som das cantorias e

    das violas-de-cocho e, posteriormente, os grupos se apresentam no palco principal da festa. A

    Prefeitura efetua, ainda, o pagamento do transporte do grupo de Cururu e Siriri at o local aonde se

    realizar o arraial, para o qual foram contratados, a fim de animarem e mostrarem a tradio (parte)

    da festa.

  • 47

    Ele relata ainda que, antigamente a comida era oferecida gratuitamente, e a Prof. Eunice

    confirma isso na entrevista feita a respeito deste assunto, como ocorria nas fazendas, mas hoje em

    dia no possvel proceder da mesma forma, pelo aumento da popularidade que atingiu a festa e

    que todas as religies participam, menos a protestante; e que a festa aumenta de ano em ano.

    Conforme a mesma, apenas para fazer uma comparao, a festa de So Joo Batista em Portugal

    feita nos lares e que foi no Brasil ela se tornou coisa das ruas. Segundo Seu Sebastio, h mais

    de 500 terreiros em Corumb11, porm os principais, ou maiores, so os que foram visitados, por

    serem os mais lembrados pelas pessoas quando perguntados sobre a existncia de terreiros na festa.

    Para explicar o fato de pessoas ligadas ao protestantismo no participarem da festa temos a seguinte

    afirmao:

    Diferentemente do protestantismo, onde o fiel precisa ser para participar, e tambm de modo diverso dos cultos afro-brasileiros, onde absolutamente comum a pessoa participar sem ser, no catolicismo, tal como o povo brasileiro o vive e significa, h uma pluralidade de modos de ser que configura uma equivalente pluralidade de maneiras de participar (BRANDO, 1987, p.112, grifo nosso).

    Percebe-se que, ao contrrio das religies protestantes, o catolicismo permite uma fluidez

    maior na participao de suas festas, principalmente pelo fato de existir uma separao entre

    catolicismo popular e eclesistico. O primeiro se caracteriza pelo fato de ser praticado fora do

    mbito eclesistico e celebrado por agentes camponeses de cultos coletivos, e o segundo pelo fato

    de ser administrado por padre regidos por uma matriz e realizados dentro do templo (igreja). O

    catolicismo popular:

    [...] preservou da doutrina cannica e do imaginrio fantstico da Igreja colonizadora ibrica quase toda a estrutura de smbolos e de articulaes de cdigos e princpios de conduta social [...] Elas atingiram sempre mais agentes de culto e fiis eruditos, de classes mdias para cima [...] Por isso at hoje, fora o caso de sujeitos e grupos populares associados ao trabalho pastoral das dioceses, parquias e comunidades definitivamente ps-conciliares, a influncia eclesistica pequena e em pouco modifica habitus populares resultantes do trabalho cultural e religioso de agentes ibricos, mesclando a influncia de sistemas de crena e

    11 No se tem registro oficial em cartrio para confirmar tal fato. Contudo, colocada a fala para ttulo de informao, e no de confirmao de que existam na mesma quantidade.

  • 46

    Os elementos mais observados no percorrer da pesquisa, na vspera, durante e depois da

    festa foram mastros, fogueiras, andores (no arraial ou casa do devoto, at mesmo na descida da

    Ladeira Cunha e Cruz para a lavagem s margens do Rio Paraguai) e arraias. Estes elementos que

    fazem parte do ritual foram observados de acordo com a rede de significados que os mesmos

    formam.

    grande o nmero de pessoas que vm prestigiar, como dizem vrios entrevistados, a

    Festa de So Joo em Corumb. Muitos vm do pas vizinho, a Bolvia, talvez por devoo ou

    mesmo pelo interesse pela tradio que representa. Antigamente existia uma organizao por parte

    dos festeiros (pessoas que descem com andor), com pessoas designadas ou at mesmo sorteadas

    com funes especficas como capito do mastro e alferes da bandeira, mas isso se perdeu, segundo

    alguns relatos. Foi dito, em entrevista feita com a Sr. Natalina, da Tenda Nossa Senhora da

    Conceio, correspondente ao Terreiro Maria Aparecida de Souza, que existia uma Irmandade para

    cada terreiro, onde (ou era) feito o sorteio e/ou votao para eleger o festeiro e os outros

    componentes organizadores do festejo. Ela deixou esse assunto muito implcito em suas falas, e deu

    a sugesto de entrevistar o Senhor Rosildo Gonalves Dias, dito como presidente da Irmandade

    daquele ano, que no estava disposto a dar a entrevista por motivos de sade. Existe uma conexo

    entre os centros (terreiros), isso ficou claro. H uma fluidez entre eles, pois, de acordo com o

    Senhor Sebastio e com a Senhora Natalina, pessoas que participam de um arraial vo para outro, e

    vice-e-versa. Talvez seja uma forma com que os centros tm para se integrarem, assim,

    prestigiando um ao outro. Muitos turistas visitam as duas tendas de umbanda solicitando

    trabalhos relativos a Xang (So Joo).

    Seu Sebastio, que participa h 30 anos, disse que existe um responsvel pela Irmandade e

    que todo o ano no terreiro so eleitas pessoas para as diversas funes, aps a descida do andor ao

    Rio Paraguai, como:

    . Capito do Mastro este adorna o mastro e o responsvel pelo mesmo;

    . Alferes da Bandeira responsvel pela bandeira de So Joo e;

    . Encarregado do Andor quem enfeita e cuida do andor.

  • 45

    primeira observao, a presena de terreiros de candombl nesta festividade, pois o mesmo So

    Joo corresponde a Xang nessa religio.

    Alguns arraiais foram visitados durante a pesquisa de campo, como o da Dona Titina,

    realizado na rua Major Gama, o da Dona Cacilda (Tenda Nossa Senhora da Conceio), o Arraial

    Sinh Ona, realizado pelo Instituto Luiz Albuquerque, o do Sr. Celso Roberto da Silva e o do Sr.

    Sebastio (Tenda de Umbanda So Jorge), entre outros que poderiam ter sido entrevistados, mas

    devido ao baixo contingente de pessoas e pouco tempo no foi possvel, pois eles ocorrem quase

    todos ao mesmo tempo.

    Existe outro arraial que realizado pela Secretaria de Cultura do municpio, no qual esto

    envolvidos os Cururueiros. O Cururu vem a ser uma msica tocada com a viola-de-cocho e ganz

    (tipo de reco-reco). A viola foi trazida pelo Sr. Agripino Magalhes de sua cidade natal, Cceres em

    Mato Grosso, onde ocorrem festas ao som da viola at os dias de hoje. Segundo o Sr. Agripino,

    existe um ritual de preparao da rvore que ser cortada. So feitas rezas e, posteriormente, o corte

    e a confeco do instrumento, que antigamente era composto de cordas preparadas com as tripas do

    macaco. O corte da madeira no um simples ato de marcenaria, segundo Eunice Ayala, ele deve

    ser feito em lua minguante, para a madeira no carunchar (eles que dizem isso 10), e as pessoas

    que cortam, carregam o mastro at o local onde ser preparado.

    Junto com o Cururu est o Siriri, que uma dana realizada ao som da viola-de-cocho, do

    reco-reco e do mocho consistindo na formao de casais que, em sincronia com a msica

    (entonao e chamados), realizam evolues no decorrer de suas apresentaes. Os Cururueiros se

    vestem com lenos no pescoo e tambm fazem algumas evolues sapateando e, desde os

    primrdios, o Cururu tocado somente por homens. No Siriri as moas colocam vestidos longos e

    coloridos e os moos vestem cala jeans, bota, camisa e leno no pescoo. Muitas das msicas

    executadas so composies antigas e tratam de diversos assuntos.

    10 A Prof Eunice Ayala se refere aos Cururueiros que cortam a madeira, pois somente eles tm a explicao, mesmo que esse fato seja oculto e embutido na tradio.

  • 44

    comportamento e os trajes serem de cunho pejorativo. No Nordeste brasileiro o Baio e o Xote

    foram estilos musicais incorporados ao festejo com o acrscimo de letras, muitas vezes, de carter

    malicioso e muitas vezes ertico.

    4.1 OS ARRAIAIS

    Os arraiais descritos abaixo no sero colocados de forma cronolgica, mas sim de forma

    espontnea de como os dados foram expostos para o observador que os estudou. Talvez a falta de

    uma diviso especfica, para melhor separ-los, seja at melhor para exp-los, pois aqui sero

    apenas apresentados os arraiais, algumas entrevistas e algumas caractersticas que os cercam,

    deixando para posterior captulo o processo ritual completo de como eles ocorrem.

    Sendo assim, comea-se com uma entrevista concedida pela Prof. Eunice8 aonde se obteve

    a informao que as festas de So Joo vm das comemoraes que ocorriam na regio, no s

    por boas colheitas como tambm por um milagre pedido e concedido pelo santo, e eram feitas,

    primeiramente, em fazendas da regio. Nessas fazendas as pessoas comiam e bebiam, com o intuito

    de se esbaldarem, porque a festa o momento para isso. Como mesmo o Senhor Satyro Manoel

    Coelho relatou, com as bebidas feitas com licores de leite ( melote ), e outros sabores, ou pinga

    mesmo. Foi s com o passar do tempo que veio a cerveja, sendo que no comeo era bebida quente

    (temperatura ambiente). As festas nas fazendas foram diminuindo, talvez pela diminuio da

    importncia do latifndio, ou mesmo pelo crescimento das cidades. Porm o que se v o

    crescimento da festa na cidade.

    Dentre os Arraiais que descem, com seus andores9, a Ladeira Cunha e Cruz, a maioria

    afirmou a participao por beno alcanada que originou a tradio, pois as primeiras descidas

    para o banho do So Joo ocorreram devido ao atendimento de necessidades, concedidos por este

    santo. Muitos afirmam que por causa disso a festa no municpio virou tradio. Destaca-se, em

    8 A professora Eunice Ajala Rocha ex-membro da Secretaria de Educao, ex-docente da UFMS do Campus de Corumb e estudiosa do assunto. 9 Andor consiste em uma espcie de mesa porttil onde em cada canto h um brao onde as pessoas podem segurar (quatro pessoas somente). Em cima dele que so feitos os adornos e colocado o santo.

  • 43

    . Moeda na fogueira - benzer a moeda na fogueira meia noite, e no dia seguinte dar ao

    primeiro pobre que aparecer;

    . Colocar em um prato com gua papis com nomes no outro dia deve-se observar o papel

    que abriu sozinho, ento, este nome ser o da pessoa com quem voc ir se casar.

    Essas so s algumas dentre muitas que pretendem a efetuao da magia, porque isso o

    que elas so,