Documento de-aparecida e do caribe

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V CONFERÊNCIA GERAL DO EPISCOPADO LATINO-AMERICANO E DO CARIBE APARECIDA, 13-31 DE MAIO DE 2007 DOCUMENTO FINAL

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  1. 1. V CONFERNCIA GERAL DO EPISCOPADO LATINO-AMERICANO e DO CARIBE aparecida, 13-31 de maio de 2007 DOCUMENTO FINAL
  2. 2. SIGLAS AA Apostolicam Actuositatem AG Ad Gentes CIC Catecismo da Igreja Catlica CDSI Compndio da Doutrina Social da Igreja CDC Cdigo de Direito Cannico ChD Decreto Christus Dominus ChL Christifideles Laici DCE Deus Caritas est Dl Discurso Inaugural de S.S. Bento XVI na V Conferncia Geral do Episcopado Latino-americano. DP Documento de Puebla DV Dei Verbum EAm Exortao Apostlica Ecclesia in Amrica. ECE Ex Corde Ecclesiae EMCC Instruo Erga Migrantes Caritas Christi EN Evangelii Nuntiandi EV Evangelium Vitae FC Familiaris Consortio FR Fides et Ratio GE Gravissimum Educationis GS Gaudium et Spes HV Humanae vitae IM Decreto Inter Mirifica L Laborem Exercens LG Lumen Gentium NAe Declaracin Nostra Aetate NMI Novo millenio ineunte OT Optatam Totius PC Perfectae Caritatis PDV Pastores Dabo Vobis PG Pastores gregis
  3. 3. CELAM PP Populorum Progressio PO Presbyterorum Ordinis RM Redemptoris Missio RVM Rosarium Virginis Mariae SC Sacrosanctum Concilium SCa Sacramentum caritatis SD Documento de Santo Domingo SRS Sollicitudo Rei Socialis TMA Tertio millenio adveniente UR Unitatis Redintegratio UUS Ut unum sint VC Vita consecrata
  4. 4. Carta de S.S. Bento XVI aos irmos no Episcopado da Amrica Latina e Caribe Em 13 de maio passado, aos ps da Santssima Virgem Nos- sa Senhora Aparecida, no Brasil, inaugurei com grande alegria a V Conferncia Geral do Episcopado Latino-americano e do Ca- ribe. Conservo viva a grata recordao desse encontro, no qual estive unido a vocs no mesmo afeto por seus queridos povos e na mesma solicitude por ajud-los a serem discpulos e missio- nrios de Jesus Cristo, para que nEle tenham vida. Ao mesmo tempo que expresso meu reconhecimento pelo amor a Cristo e Igreja, e pelo esprito de comunho que ca- racterizou a Conferncia Geral, autorizo a publicao do Docu- mento Conclusivo, pedindo ao Senhor que, em comunho com a Santa S e com o devido respeito pela responsabilidade de cada Bispo em sua prpria Igreja local, ele seja luz e alento para um rico trabalho pastoral e evangelizador nos anos vindouros. Neste documento h numerosas e oportunas indicaes pastorais, motivadas por ricas reflexes luz da f e do atual contexto social. Entre outras, li com particular apreo as palavras que exortam a dar prioridade Eucaristia e santificao do Dia do Senhor nos programas pastorais (cf. n. 251-252), assim como as que expressam o desejo de reforar a formao crist dos fiis, em geral, e dos agentes de pastoral, em particular. Neste sentido, para mim foi motivo de alegria conhecer o desejo de realizar uma Misso Continental que as Conferncias Episcopais e cada dio-
  5. 5. CELAM cese so chamadas a estudar e a realizar, convocando para isso todas as foras vivas, de modo que, caminhando a partir de Cris- to, busque-se sua face (cf. Novo millenio ineunte, 29). Ao mesmo tempo em que invoco a proteo da Santssima Virgem em sua invocao de Aparecida, Patrona do Brasil, e tam- bm em sua advocao de Nossa Senhora de Guadalupe, Patrona da Amrica e Estrela da Evangelizao, com afeto invoco sobre vocs a Bno Apostlica. Vaticano, 29 de junho de 2007, solenidade dos santos Aps- tolos Pedro e Paulo.
  6. 6. Introduo 1. Com a luz do Senhor ressuscitado e com a fora do Esp- rito Santo, ns os bispos da Amrica nos reunimos em Apare- cida, Brasil, para celebrar a V Conferncia Geral do Episcopado Latino-Americano e do Caribe. Fizemos isso como pastores que querem seguir estimulando a ao evangelizadora da Igreja, chamada a fazer de todos os seus membros discpulos e mis- sionrios de Cristo, Caminho, Verdade e Vida, para que nossos povos tenham vida nEle. Fazemos isso em comunho com to- das as Igrejas locais presentes na Amrica. Maria, Me de Je- sus Cristo e de seus discpulos, tem estado muito perto de ns, tem-nos acolhido, tem cuidado de ns e de nossos trabalhos, amparando-nos, como a Joo Diego e a nossos povos, na dobra de seu manto, sob sua maternal proteo. Temos pedido a ela, como me, perfeita discpula e pedagoga da evangelizao, que nos ensine a ser filhos em seu Filho e a fazer o que Ele nos disser (cf. Jo 2,5). 2. Com alegria estivemos reunidos com o Sucessor de Pe- dro, Cabea do Colgio Episcopal. Sua Santidade Bento XVI con- firmou-nos no primado da f em Deus, de sua verdade e amor, para o bem das pessoas e dos povos. Agradecemos a todos os seus ensinamentos, que foram iluminao e guia seguro para nossos trabalhos, especialmente seu Discurso inaugural. A lem- brana agradecida dos ltimos Papas, e em especial do seu rico Magistrio que tem estado tambm presente em nossos traba- lhos, merece especial memria e gratido.
  7. 7. 10 CELAM 3. Sentimo-nos acompanhados pela orao de nosso povo catlico, representado visivelmente pela companhia do Pastor e dos fiis da Igreja de Deus em Aparecida, e pela multido de peregrinos de todo o Brasil e de outros pases da Amrica ao San turio, que nos edificaram e evangelizaram. Na comunho dos santos, tivemos presentes todos aqueles que nos antecederam como discpulos e missionrios na vinha do Senhor e especial- mente a nossos santos latino-americanos, entre eles Santo Tor- bio de Mogrovejo, patrono do Episcopado latino-americano. 4. O Evangelho chegou a nossas terras em meio a um dra- mtico e desigual encontro de povos e culturas. As sementes do Verbo presentes nas culturas autctones, facilitaram a nossos irmos indgenas encontrarem no Evangelho respostas vitais s suas aspiraes mais profundas: Cristo era o Salvador que esperavam silenciosamente. A visitao de Nossa Senhora de Guadalupe foi acontecimento decisivo para o anncio e reconhe- cimento de seu Filho, pedagogia e sinal de inculturao da f, manifestao e renovado mpeto missionrio de propagao do Evangelho. 5. Desde a primeira evangelizao at os tempos recentes, a Igreja tem experimentado luzes e sombras. Ela escreveu pgi- nas de nossa histria com grande sabedoria e santidade. Sofreu tambm tempos difceis, tanto por torturas e perseguies como pelas debilidades, compromissos mundanos e incoerncias, em outras palavras, pelo pecado de seus filhos, que desfiguraram a novidade do Evangelho, a luminosidade da verdade e a prticaCf. Puebla, 401.Bento XVI, Discurso Inaugural da V Conferncia, Aparecida, n. 1. Ser citado como DI.Cf. SD 15.Bento XVI, Audincia Geral, quarta-feira 23 de maio de 2007. Certamente que a re- cordao de um passado glorioso no pode ignorar as sombras que acompanharam a obra de evangelizao do continente latino-americano: no possvel esquecer os sofrimentos e as injustias que infligiram os colonizadores s populaes indgenas, pisoteadas em seus direitos humanos fundamentais. Mas, a obrigatria meno desses crimes injustificveis j condenados por missionrios como Bartolomeu de las Casas e por telogos como Francisco de Vitria, da Universidade de Salamanca no deve impedir de reconhecer com gratido a admirvel obra realizada pela graa divina entre essas populaes ao longo destes sculos.
  8. 8. 11VCONFERNCIAGERAL DO EPISCOPADO LATINO-AMERICANO E DO CARIBE- aparecida -DOCUMENTO FINAL da justia e da caridade. No entanto, o mais decisivo na Igreja sempre a ao santa de seu Senhor. 6. Por isso, diante de tudo damos graas a Deus e o louvamos por tudo o que nos tem sido dado. Acolhemos toda a realidade do Continente como dom: a beleza e fecundidade de suas terras, a riqueza de humanidade que se expressa nas pessoas, famlias, povos e culturas do Continente. Sobretudo nos tem sido dado Jesus Cristo, a plenitude da revelao de Deus, um tesouro in- calculvel, a prola preciosa (cf. Mt 13,45-46), o Verbo de Deus feito carne, Caminho, Verdade e Vida dos homens e das mulhe- res, aos quais abre um destino de plena justia e felicidade. Ele o nico Libertador e Salvador que, com sua morte e ressurreio, rompeu as cadeias opressivas do pecado e da morte, revelando o amor misericordioso do Pai e a vocao, dignidade e destino da pessoa humana. 7. As maiores riquezas de nossos povos so a f no Deus amor e a tradio catlica na vida e na cultura. Manifesta-se na f madura de muitos batizados e na piedade popular que expres- sa o amor a Cristo sofredor, o Deus da compaixo, do perdo e da reconciliao (...), o amor ao Senhor presente na Eucaristia (...), o Deus prximo dos pobres e dos que sofrem, a profun- da devoo Santssima Virgem de Guadalupe, de Aparecida ou dos diversos ttulos nacionais e locais. Expressa-se tambm na caridade que em qualquer lugar anima gestos, obras e caminhos de solidariedade para com os mais necessitados e desamparados. Est presente tambm na conscincia da dignidade da pessoa, na sabedoria diante da vida, na paixo pela justia, na esperan- a contra toda esperana e na alegria de viver que move o cora- o de nossos povos, ainda que em condies muito difceis. As razes catlicas permanecem na sua arte, linguagem, tradies e estilo de vida, ao mesmo tempo dramtico e festivo, e no en- frentamento da realidade. Por isso, o Santo Padre nos responsa-DI 1.
  9. 9. 12 CELAM bilizou ainda mais, como Igreja, na grande tarefa de proteger e alimentar a f do povo de Deus. 8. O dom da tradio catlica um cimento fundamental de identidade, originalidade e unidade da Amrica Latina e do Cari- be: uma realidade histrico-cultural, marcada pelo Evangelho de Cristo, realidade na qual grande o pecado abandono de Deus, comportamentos viciosos, opresso, violncia, ingratides e mi- srias porm, onde bem maior a graa da vitria pascal. Nos- sa Igreja goza, no obstante as debilidades e misrias humanas, de alto ndice de confiana e de credibilidade por parte do povo. A Igreja morada de povos irmos e casa dos pobres. 9. A V Conferncia do Episcopado Latino-americano e Cari- benho novo passo no caminho da Igreja, especialmente a par- tir do Conclio Ecumnico Vaticano II. Ela d continuidade e, ao mesmo tempo, recapitula o caminho de fidelidade, renovao e evangelizao da Igreja latino-americana ao servio de seus po- vos, que se expressou oportunamente nas Conferncias Gerais anteriores do Episcopado (Rio, 1955; Medelln, 1968; Puebla, 1979; Santo Domingo, 1992). Em todas elas reconhecemos a ao do Esprito. Tambm nos lembramos da Assemblia Espe- cial do Snodo dos Bispos para a Amrica (1997). 10. Esta V Conferncia se prope a grande tarefa de prote- ger e alimentar a f do povo de Deus e recordar tambm aos fiis deste Continente que, em virtude de seu batismo, so chamados a ser discpulos e missionrios de Jesus Cristo. Com desafios e exigncias, abre-se a passagem para um novo perodo da his- tria, caracterizado pela desordem generalizada que se propaga por novas turbulncias sociais e polticas, pela difuso de uma cultura distante e hostil tradio crist e pela emergncia de variadas ofertas religiosas que tratam de responder, sua ma- neira, sede de Deus que nossos povos manifestam.Ibid. 3.Ibid. 3.
  10. 10. 13VCONFERNCIAGERAL DO EPISCOPADO LATINO-AMERICANO E DO CARIBE- aparecida -DOCUMENTO FINAL 11. A Igreja chamada a repensar profundamente e a re- lanar com fidelidade e audcia sua misso nas novas circuns- tncias latino-americanas e mundiais. Ela no pode fechar-se frente queles que s vem confuso, perigos e ameaas ou queles que pretendem cobrir a variedade e complexidade das situaes com uma capa de ideologias gastas ou de agresses irresponsveis. Trata-se de confirmar, renovar e revitalizar a novidade do Evangelho arraigada em nossa histria, a partir de um encontro pessoal e comunitrio com Jesus Cristo, que desperte discpulos e missionrios. Isso no depende tanto de grandes programas e estruturas, mas dehomens e mulheres novos que encarnem essa tradio e novidade, como discpulos de Jesus Cristo e missionrios de seu Reino, protagonistas de uma vida nova para uma Amrica Latina que deseja reconhecer- se com a luz e a fora do Esprito. 12. No resistiria aos embates do tempo uma f catlica re- duzida a uma bagagem, a um elenco de algumas normas e de proibies, a prticas de devoo fragmentadas, a adeses sele- tivas e parciais das verdades da f, a uma participao ocasional em alguns sacramentos, repetio de princpios doutrinais, a moralismos brandos ou crispados que no convertem a vida dos batizados. Nossa maior ameaa o medocre pragmatismo da vida cotidiana da Igreja, no qual, aparentemente, tudo procede com normalidade, mas na verdade a f vai se desgastando e de- generando em mesquinhez. A todos nos toca recomear a par- tir de Cristo, reconhecendo que no se comea a ser cristo por uma deciso tica ou uma grande idia, mas pelo encontro com um acontecimento, com uma Pessoa, que d um novo horizonte vida e, com isso, uma orientao decisiva.10RATZINGER, J. Situao atual da f e da teologia. Conferncia pronunciada no Encontro de Presidentes de Comisses Episcopais da Amrica Latina para a doutrina da f, celebrado em Guadalajara, Mxico, 1996. Publicado em LOsservatore Romano, em 1 de novembro de 1996.Cf. NMI 28-29. 10 DCE 1.
  11. 11. 14 CELAM 13. Na Amrica Latina e no Caribe, quando muitos de nos- sos povos se preparam para celebrar o bi-centenrio de sua inde- pendncia, encontramo-nos diante do desafio de revitalizar nos- so modo de ser catlico e nossas opes pessoais pelo Senhor, para que a f crist se enraze mais profundamente no corao das pessoas e dos povos latino-americanos como acontecimen- to fundante e encontro vivificante com Cristo. Ele se manifesta como novidade de vida e misso em todas as dimenses da exis- tncia pessoal e social. Isso requer, a partir de nossa identidade catlica, uma evangelizao muito mais missionria, em dilogo com todos os cristos e a servio de todos os homens. Do contr- rio, o rico tesouro do Continente Americano... seu patrimnio mais valioso: a f no Deus de amor...11 corre o risco de seguir desgastando-se e diluindo-se de maneira crescente em diversos setores da populao. Hoje se prope escolher entre caminhos que conduzem vida ou caminhos que conduzem morte (cf. Dt 30,15). Caminhos de morte so os que levam a dilapidar os bens que recebemos de Deus atravs daqueles que nos precederam na f. So caminhos que traam uma cultura sem Deus e sem seus mandamentos ou inclusive contra Deus, animada pelos dolos do poder, da riqueza e do prazer efmero, a qual termina sendo uma cultura contra o ser humano e contra o bem dos povos lati- no-americanos. Caminhos de vida verdadeira e plena para todos, caminhos de vida eterna, so aqueles abertos pela f que condu- zem plenitude de vida que Cristo nos trouxe: com esta vida divina tambm se desenvolve em plenitude a existncia huma- na, em sua dimenso pessoal, familiar, social e cultural.12 Essa a vida que Deus nos partilha por seu amor gratuito, porque o amor que d a vida.13 Esses caminhos frutificam nos dons de verdade e amor que nos foram dados em Cristo, na comunho dos discpulos e missionrios do Senhor, para que a Amrica La- 11 Bento XVI, Homilia na Eucaristia de inaugurao da V Conferncia Geral do Episcopa- do Latino-americano, 13 de maio de 2007, Aparecida, Brasil. 12 DI 4. 13 Bento XVI, Homilia na Eucaristia de inaugurao da V Conferncia Geral do Episcopa- do Latino-americano, 13 de maio de 2007, Aparecida, Brasil.
  12. 12. 15VCONFERNCIAGERAL DO EPISCOPADO LATINO-AMERICANO E DO CARIBE- aparecida -DOCUMENTO FINAL tina e o Caribe sejam efetivamente um continente no qual a f, a esperana e o amor renovem a vida das pessoas e transformem as culturas dos povos. 14. O Senhor nos diz: No tenham medo (Mt 28,5). Como s mulheres na manh da Ressurreio ele nos repete: Por que buscam entre os mortos aquele que est vivo? (Lc 24,5). Os si- nais da vitria de Cristo ressuscitado nos estimulam enquanto suplicamos a graa da converso e mantemos viva a esperana que no engana. O que nos define no so as circunstncias dra- mticas da vida, nem os desafios da sociedade ou as tarefas que devemos empreender, mas acima de tudo o amor recebido do Pai graas a Jesus Cristo pela uno do Esprito Santo. Essa priorida- de fundamental a que tem presidido todos os nossos trabalhos, que oferecemos a Deus, nossa Igreja, ao nosso povo, a cada um dos latino-americanos, enquanto elevamos ao Esprito Santo nossa confiante splica para redescobrir a beleza e alegria de ser cristos. Aqui est o desafio fundamental que afrontamos: mos- trar a capacidade da Igreja para promover e formar discpulos e missionrios que respondam vocao recebida e comuniquem por toda parte, transbordando de gratido e alegria, o dom do encontro com Jesus Cristo. No temos outro tesouro a no ser este. No temos outra felicidade nem outra prioridade seno a de sermos instrumentos do Esprito de Deus na Igreja, para que Jesus Cristo seja encontrado, seguido, amado, adorado, anun- ciado e comunicado a todos, no obstante todas as dificuldades e resistncias. Este o melhor servio o seu servio! que a Igreja deve oferecer s pessoas e naes.14 15. Nesta hora em que renovamos a esperana, queremos fazer nossas as palavras de SS. Bento XVI no incio de seu Pon- tificado, fazendo eco a seu predecessor, o Servo de Deus, Joo Paulo II, e proclam-las para toda a Amrica Latina: No te- mam! Abram,abram de par em par as portas a Cristo!... Quem 14 Cf. EN 1.
  13. 13. 16 CELAM deixa Cristo entrar no perde nada, nada absolutamente nada do que faz a vida livre, bela e grande. No! S com esta amiza- de abrem-se as portas da vida. S com esta amizade abrem-se realmente as grandes potencialidades da condio humana. S com esta amizade experimentamos o que belo e o que nos liberta... No tenham medo de Cristo! Ele no tira nada e d tudo. Quem se d a Ele, recebe cem por um. Sim, abram, abram de par em par as portas a Cristo e encontraro a verdadeira vida.15 16. Esta V Conferncia Geral se celebra em continuidade com as outras quatro que a precederam no Rio de Janeiro, Me- delln, Puebla e Santo Domingo. Com o mesmo esprito que as animou, os pastores querem dar agora novo impulso evangeli- zao, a fim de que estes povos sigam crescendo e amadurecendo em sua f, para serem luz do mundo e testemunhas de Jesus Cristo com a prpria vida.16 Como pastores da Igreja, estamos conscientes de que, depois da IV Conferncia Geral, em Santo Domingo, muitas coisas mudaram na sociedade. A Igreja, que participa dos gozos e esperanas, das tristezas e alegrias de seus filhos, quer caminhar ao seu lado neste perodo de tantos desa- fios, para infundir-lhes sempre esperana e consolo.17 17. Nossa alegria, portanto, baseia-se no amor do Pai, na participao no mistrio pascal de Jesus Cristo que, pelo Esp- rito Santo, nos faz passar da morte para a vida, da tristeza para a alegria, do absurdo para o sentido profundo da existncia, do desalento para a esperana que no engana. Esta alegria no sentimento artificialmente provocado nem estado de nimo passageiro. O amor do Pai nos foi revelado em Cristo que nos convidou a entrar em seu reino. Ele nos ensinou a orar dizendo Abba, Pai (Rm 8,15; cf. Mt 6,9). 15 Cf. Bento XVI, Homilia no solene incio do Ministrio Petrino do Bispo de Roma, 24 de abril de 2005. 16 DI 2. 17 Ibid.
  14. 14. 17VCONFERNCIAGERAL DO EPISCOPADO LATINO-AMERICANO E DO CARIBE- aparecida -DOCUMENTO FINAL 18. Conhecer a Jesus Cristo pela f nossa alegria; segui-lo uma graa, e transmitir este tesouro aos demais uma tarefa que o Senhor nos confiou ao nos chamar e nos escolher. Com os olhos iluminados pela luz de Jesus Cristo ressuscitado, podemos e queremos contemplar o mundo, a histria, os nossos povos da Amrica Latina e do Caribe, e cada um de seus habitantes.
  15. 15. PRIMEIRA PARTE A VIDA DE NOSSOS POVOS HOJE 19. Em continuidade com as Conferncias Gerais anterio- res do Episcopado Latino-americano, este documento faz uso do mtodo ver, julgar e agir. Este mtodo implica em contemplar a Deus com os olhos da f atravs de sua Palavra revelada e o contato vivificador dos Sacramentos, a fim de que, na vida coti- diana, vejamos a realidade que nos circunda luz de sua provi- dncia e a julguemos segundo Jesus Cristo, Caminho, Verdade e Vida, e atuemos a partir da Igreja, Corpo Mstico de Cristo e Sacramento universal de salvao, na propagao do Reino de Deus, que se semeia nesta terra e que frutifica plenamente no Cu. Muitas vozes, vindas de todo o Continente, ofereceram contribuies e sugestes nesse sentido, afirmando que este mtodo tem colaborado para que vivamos mais intensamente nossa vocao e misso na Igreja: tem enriquecido nosso traba- lho teolgico e pastoral e, em geral, tem-nos motivado a assu- mir nossas responsabilidades diante das situaes concretas de nosso continente. Este mtodo nos permite articular, de modo sistemtico, a perspectiva crist de ver a realidade; a assuno de
  16. 16. 20 CELAM critrios que provm da f e da razo para seu discernimento e valorizao com sentido crtico; e, em conseqncia, a projeo do agir como discpulos missionrios de Jesus Cristo. A adeso crente, alegre e confiante em Deus Pai, Filho e Esprito Santo e a insero eclesial, so pressupostos indispensveis que garantem a eficcia deste mtodo.18 18 Cf. CELAM, Sntese das contribuies recebidas para a V Conferncia Geral do Episco- pado Latino-americano, 34-35.
  17. 17. 20. Nossa reflexo a respeito do caminho das Igrejas da Amrica Latina e do Caribe tem lugar em meio a luzes e som- bras de nosso tempo. Afligem-nos, mas no nos confundem, as grandes mudanas que experimentamos. Temos recebido dons incalculveis, que nos ajudam a olhar a realidade como discpu- los missionrios de Jesus Cristo. 21. A presena cotidiana e cheia de esperana de incontveis peregrinos nos lembra os primeiros seguidores de Jesus Cristo que foram ao Jordo, onde Joo batizava, com a esperana de encontrar o Messias (cf. Mc 1,5). Eles se sentiram atrados pela sabedoria das palavras de Jesus, pela bondade de seu trato e pelo poder de seus milagres. E pelo assombro inusitado que a pes- soa de Jesus despertava, acolheram o dom da f e vieram a ser discpulos de Jesus. Ao sair das trevas e das sombras de morte (cf. Lc 1,79), a vida deles adquiriu plenitude extraordinria: a de haver sido enriquecida com o dom do Pai. Viveram a histria de seu povo e de seu tempo e passaram pelos caminhos do Imprio Romano, sem esquecer o encontro mais importante e decisivo de sua vida que os havia preenchido de luz, fora e esperana: o encontro com Jesus, sua rocha, sua paz, sua vida. 22. Assim ocorre tambm a ns olhar a realidade de nos- sos povos e de nossa Igreja, com seus valores, suas limitaes, Captulo I OS DISCPULOS MISSIONRIOS
  18. 18. 22 CELAM suas angstias e esperanas. Enquanto sofremos e nos alegra- mos, permanecemos no amor de Cristo, vendo nosso mundo e procurando discernir seus caminhos com a alegre esperana e a indizvel gratido de crer em Jesus Cristo. Ele o Filho de Deus verdadeiro, o nico Salvador da humanidade. A importncia nica e insubstituvel de Cristo para ns, para a humanidade, consiste em que Cristo o Caminho, a Verdade e a Vida. Se no conhecemos a Deus em Cristo e com Cristo, toda a realidade se torna um enigma indecifrvel; no h caminho e, no havendo caminho, no h vida nem verdade.19 No clima cultural relati- vista que nos circunda se faz sempre mais importante e urgente enraizar e fazer amadurecer em todo o corpo eclesial a certeza de que Cristo, o Deus de rosto humano, nosso verdadeiro e nico salvador. 1.1. Ao de graas a Deus 23. Bendito seja Deus, Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que nos abenoou com toda sorte de bnos na pessoa de Cristo (cf. Ef 1,3). O Deus da Aliana, rico em misericrdia, nos amou primeiro; imerecidamente amou a cada um de ns; por isso o bendizemos, animados pelo Esprito Santo, Esprito vivificador, alma e vida da Igreja. Ele, que foi derramado em nossos cora- es, geme e intercede por ns e com seus dons nos fortalece em nosso caminho de discpulos e missionrios. 24. Bendizemos a Deus com nimo agradecido, porque nos chamou para sermos instrumentos de seu reino de amor e vida, de justia e paz, pelo qual tantos se sacrificaram. Ele mes- mo nos encomendou a obra de suas mos para que cuidemos dela e a coloquemos a servio de todos. Agradecemos a Deus porque nos faz colaboradores seus para que sejamos solidrios com sua criao pela qual somos responsveis. Bendizemos a Deus que nos deu a natureza criada que seu primeiro livro, 19 Cf. DI 3.
  19. 19. 23VCONFERNCIAGERAL DO EPISCOPADO LATINO-AMERICANO E DO CARIBE- aparecida -DOCUMENTO FINAL para que possamos conhecer a Ele e viver nela como em nossa casa. 25. Damos graas a Deus que nos deu o dom da palavra, com a qual podemos comunicar-nos com Ele por meio de seu Filho, que sua Palavra (cf. Jo 1,1), e entre ns. Damos graas a Ele que por seu grande amor fala a ns como a amigos (cf. Jo 15,14-15). Bendizemos a Deus que se nos d na celebrao da f, especial- mente na Eucaristia, po de vida eterna. A ao de graas a Deus pelos numerosos e admirveis dons que nos outorgou culmina com a celebrao central da Igreja, que a Eucaristia, alimento substancial dos discpulos e missionrios. Tambm pelo Sacra- mento do Perdo que Cristo nos alcanou na cruz. Louvamos ao Senhor Jesus pelo presente de sua Me Santssima, Me de Deus e Me da Igreja na Amrica Latina e no Caribe, estrela da evangelizao renovada, primeira discpula e grande missionria de nossos povos. 26. Iluminados pelo Cristo, o sofrimento, a injustia e a cruz nos desafiam a viver como Igreja samaritana (cf. Lc 10,25-37), recordando que a evangelizao vai unida sempre promoo humana e autntica libertao crist.20 Damos graas a Deus e nos alegramos pela f, solidariedade e alegria caractersticas de nossos povos, transmitidas ao longo do tempo pelas avs e avs, as mes e pais, os catequistas, os rezadores e tantas pes soas annimas, cuja caridade mantm viva a esperana em meio s injustias e adversidades. 27. A Bblia mostra reiteradamente que, quando Deus criou o mundo com sua Palavra, expressou satisfao, dizendo que era bom (Gn 1,21), e quando criou o ser humano, homem e mu- lher, disse que era muito bom (Gn 1,31). O mundo criado por Deus belo. Procedemos de um desgnio divino de sabedoria e amor. Mas, atravs do pecado essa beleza originria foi deson- rada e essa bondade ferida. Deus, por nosso Senhor Jesus Cris- 20 DI 3.
  20. 20. 24 CELAM to em seu mistrio pascal, recriou o homem fazendo-o filho e dando-lhe a garantia de novos cus e de uma nova terra (cf. Ap 21,1). Levamos a imagem do primeiro Ado, mas somos chama- dos tambm, desde o princpio, a produzir a imagem de Jesus Cristo, novo Ado (cf. 1 Cor 15,45). A criao leva a marca do Criador e deseja ser libertada e participar da gloriosa liberdade dos filhos de Deus (Rm 8,21). 1.2. A alegria de ser discpulos e missionrios de Jesus Cristo 28. Neste encontro, queremos expressar a alegria de ser- mos discpulos do Senhor e de termos sido enviados com o te- souro do Evangelho. Ser cristo no uma carga, mas um dom: Deus Pai nos abenoou em Jesus Cristo seu Filho, Salvador do mundo. 29. Desejamos que a alegria que recebemos no encontro com Jesus Cristo, a quem reconhecemos como o Filho de Deus encarnado e redentor, chegue a todos os homens e mulheres fe- ridos pelas adversidades; desejamos que a alegria da boa nova do Reino de Deus, de Jesus Cristo vencedor do pecado e da morte, chegue a todos quantos jazem beira do caminho, pedindo es- mola e compaixo (cf. Lc 10,29-37; 18,25-43).A alegria do dis- cpulo antdoto frente a um mundo atemorizado pelo futuro e oprimido pela violncia e pelo dio. A alegria do discpulo no um sentimento de bem-estar egosta, mas uma certeza que brota da f, que serena o corao e capacita para anunciar a boa nova do amor de Deus. Conhecer a Jesus o melhor presente que qualquer pessoa pode receber; t-loencontrado foi o melhor que ocorreu em nossas vidas, e faz-lo conhecido com nossa pa- lavra e obras nossa alegria. 1.3. A misso da Igreja evangelizar 30. A histria da humanidade, histria que Deus nunca abandona, transcorre sob seu olhar compassivo. Deus amou
  21. 21. 25VCONFERNCIAGERAL DO EPISCOPADO LATINO-AMERICANO E DO CARIBE- aparecida -DOCUMENTO FINAL tanto nosso mundo que nos deu o seu Filho. Ele anuncia a boa nova do Reino aos pobres e aos pecadores. Por isso, ns, como discpulos e missionrios de Jesus, queremos e devemos procla- mar o Evangelho, que o prprio Cristo. Anunciamos a nossos povos que Deus nos ama, que sua existncia no ameaa para o homem, que Ele est perto com o poder salvador e libertador de seu Reino, que Ele nos acompanha na tribulao, que alenta incessantemente nossa esperana em meio a todas as provas. Os cristos somos portadores de boas novas para a humanidade, no profetas de desventuras. 31. A Igreja deve cumprir sua misso seguindo os passos de Jesus e adotando suas atitudes (cf. Mt 9,35-36). Ele, sendo o Se- nhor, se fez servidor e obediente at morte de cruz (cf. Fl 2,8); sendo rico, escolheu ser pobre por ns (cf. 2 Cor 8,9), ensinando- nos o caminho de nossa vocao de discpulos e missionrios. No Evangelho aprendemos a sublime lio de ser pobres seguindo a Jesus pobre (cf. Lc 6,20; 9,58), e a de anunciar o Evangelho da paz sem bolsa ou alforje, sem colocar nossa confiana no dinhei- ro nem no poder deste mundo (cf. Lc 10,4 ss). Na generosidade dos missionrios se manifesta a generosidade de Deus, na gra- tuidade dos apstolos aparece a gratuidade do Evangelho. 32. No rosto de Jesus Cristo, morto e ressuscitado, maltra- tadopornossospecadoseglorificadopeloPai,nesserostodoente e glorioso,21 com o olhar da f podemos ver o rosto humilhado de tantos homens e mulheres de nossos povos e, ao mesmo tempo, sua vocao liberdade dos filhos de Deus, plena realizao de sua dignidade pessoal e fraternidade entre todos. A Igreja est a servio de todos os seres humanos, filhos e filhas de Deus. 21 Cf. NMI 25 e 28.
  22. 22. 2.1 A realidade que nos desafia como discpulos e missionrios 33. Os povos da Amrica Latina e do Caribe vivem hoje uma realidade marcada por grandesmudanas que afetam profunda- mente suas vidas. Como discpulos de Jesus Cristo, sentimo-nos desafiados a discernir os sinais dos tempos, luz do Esprito Santo, para nos colocar a servio do Reino, anunciado por Jesus, que veio para que todos tenham vida e para que a tenham em plenitude (Jo 10,10). 34. A novidade dessas mudanas, diferentemente do ocor- rido em outras pocas, que elas tm alcance global que, com di- ferenas e matizes, afetam o mundo inteiro. Habitualmente so caracterizadas como o fenmeno da globalizao. Um fator de- terminante dessas mudanas a cincia e a tecnologia, com sua capacidade de manipular geneticamente a prpria vida dos seres vivos, e com sua capacidade de criar uma rede de comunicaes de alcance mundial, tanto pblica como privada, para interagir em tempo real, ou seja, com simultaneidade, no obstante as distncias geogrficas. Como se costuma dizer, a histria se ace- lerou e as prprias mudanas se tornam vertiginosas, visto que se comunica com grande velocidade a todos os cantos do planeta. Captulo II OLHAR DOS DISCPULOS MISSIONRIOS SOBRE A REALIDADE
  23. 23. 28 CELAM 35. Essa nova escala mundial do fenmeno humano traz conseqncias em todos os campos de atividade da vida social, impactando a cultura, a economia, a poltica, as cincias, a edu- cao, o esporte, as artes e tambm, naturalmente, a religio. Interessa-nos, como pastores da Igreja, saber como esse fen- meno afeta a vida de nossos povos e o sentido religioso e tico de nossos irmos que buscam infatigavelmente o rosto de Deus, e que, no entanto, devem faz-lo agora desafiados por novas lin- guagens do domnio tcnico, que nem sempre revelam, mas que tambm ocultam o sentido divino da vida humana redimida em Cristo. Sem uma clara percepo do mistrio de Deus, torna-se opaco tambm o desgnio amoroso e paternal de uma vida digna para todos os seres humanos. 36. Nesse novo contexto social, a realidade para o ser hu- mano se tornou cada vez mais sem brilho e complexa. Isso quer dizer que qualquer pessoa individual necessita sempre mais in- formao, se deseja exercer sobre a realidade o senhorio a que, por vocao, est chamada. Isso nos tem ensinado a olhar a realidade com mais humildade, sabendo que ela maior e mais complexa que as simplificaes com que costumvamos v-la em passado ainda no muito distante e que, em muitos casos, introduziram conflitos na sociedade, deixando muitas feridas que ainda no chegaram a cicatrizar. Tambm se tornou difcil perceber a unidade de todos os fragmentos dispersos que resul- tam da informao que reunimos. freqente que alguns quei- ram olhar a realidade unilateralmente a partir da informao econmica, outros a partir da informao poltica ou cientfica, outros a partir do entretenimento ou do espetculo. No entan- to, nenhum desses critrios parciais consegue propor-nos um significado coerente para tudo o que existe. Quando as pessoas percebem essa fragmentao e limitao, costumam sentir-se frustradas, ansiosas, angustiadas. A realidade social parece muito grande para uma conscincia que, levando em conside- rao sua falta de saber e informao, facilmente se cr insig- nificante, sem ingerncia alguma nos acontecimentos, mesmo
  24. 24. 29VCONFERNCIAGERAL DO EPISCOPADO LATINO-AMERICANO E DO CARIBE- aparecida -DOCUMENTO FINAL quando soma sua voz a outras vozes que procuram ajudar-se reciprocamente. 37. Essa a razo pela qual muitos estudiosos de nossa po- ca sustentam que a realidade traz inseparavelmente uma crise do sentido. Eles no se referem aos mltiplos sentidos parciais que cada um pode encontrar nas aes cotidianas que realiza, mas ao sentido que d unidade a tudo o que existe e nos sucede na experincia, e que os cristos chamam de sentido religioso. Habitualmente, este sentido se coloca nossa disposio atra- vs de nossas tradies culturais que representam a hiptese de realidade com que cada ser humano pode olhar o mundo em que vive. Em nossa cultura latino-americana e caribenha conhece- mos o papel to nobre e orientador que a religiosidade popular desempenha, especialmente a devoo mariana, que contribuiu para nos tornar mais conscientes de nossa comum condio de filhos de Deus e de nossa comum dignidade perante seus olhos, no obstante as diferenas sociais, tnicas ou de qualquer outro tipo. 38. No entanto, devemos admitir que essa preciosa tradio comea a diluir-se. A maioria dos meios de comunicao de mas- sa nos apresentam agora novas imagens, atrativas e cheias de fantasia. Ainda que todos saibam que elas no podem mostrar o sentido unitrio de todos os fatores da realidade, oferecem ao menos o consolo de ser transmitidas em tempo real, ao vivo e diretamente, com atualidade. Longe de preencher o vazio produ- zido em nossa conscincia pela falta de um sentido unitrio da vida, em muitas ocasies a informao transmitida pelos meios s nos distrai. A falta de informao s se resolve com mais in- formao, retro-alimentando a ansiedade de quem percebe que est em um mundo opaco e que no compreende. 39. Esse fenmeno talvez explique um dos fatos mais des- concertantes e originais que vivemos no presente. Nossas tradi- es culturais j no se transmitem de uma gerao outra com a mesma fluidez que no passado. Isso afeta, inclusive, esse n-
  25. 25. 30 CELAM cleo mais profundo de cada cultura, constitudo pela experincia religiosa, que se torna agora igualmente difcil de ser transmiti- do atravs da educao e da beleza das expresses culturais, al- canando inclusive a prpria famlia que, como lugar do dilogo e da solidariedade inter-geracional, havia sido um dos veculos mais importantes da transmisso da f. Os meios de comunica- o invadiram todos os espaos e todas as conversas, introdu- zindo-se tambm na intimidade do lar. Ao lado da sabedoria das tradies, localizam-se agora, em competio, a informao de ltimo minuto, a distrao, o entretenimento, as imagens dos vencedores que souberam usar a seu favor as ferramentas tec- nolgicas e as expectativas de prestgio e estima social. Isso faz com que as pessoas busquem denodadamente uma experincia de sentido que preencha as exigncias de sua vocao, ali onde nunca podero encontr-la. 40. Entre os pressupostos que enfraquecem e menospre- zam a vida familiar, encontramos a ideologia de gnero, segundo a qual cada um pode escolher sua orientao sexual, sem levar em considerao as diferenas dadas pela natureza humana. Isso tem provocado modificaes legais que ferem gravemente a dig- nidade do matrimnio, o respeito ao direito vida e a identidade da famlia.22 41. Por essa razo, os cristos precisam recomear a par- tir de Cristo, a partir da contemplao de quem nos revelou em seu mistrio a plenitude do cumprimento da vocao humana e de seu sentido. Necessitamos fazer-nos discpulos dceis, para aprendermos dEle, em seu seguimento, a dignidade e a pleni- tude da vida. E necessitamos, ao mesmo tempo, que o zelo mis- sionrio nos consuma para levar ao corao da cultura de nosso tempo aquele sentido unitrio e completo da vida humana que 22 Cf. Congregao para a Doutrina da F, Carta aos Bispos da Igreja Catlica sobre a cola- borao do homem e da mulher na Igreja e no mundo, n, 2, 31 de maio de 2004, que cita o Pon- tifcio Conselho para a Famlia, Famlia, matrimnio e unies de fato, n. 8, 21 de novembro de 2000.
  26. 26. 31VCONFERNCIAGERAL DO EPISCOPADO LATINO-AMERICANO E DO CARIBE- aparecida -DOCUMENTO FINAL nem a cincia, nem a poltica, nem a economia nem os meios de comunicao podero proporcionar-lhe. Em Cristo Palavra, Sabedoria de Deus (cf. 1 Cor 1,30), a cultura pode voltar a encon- trar seu centro e sua profundidade, a partir de onde possvel olhar a realidade no conjunto de todos seus fatores, discernindo- os luz do Evangelho e dando a cada um seu lugar e sua dimen- so adequada. 42. Como nos disse o Papa em seu discurso inaugural: s quem reconhece a Deus, conhece a realidade e pode responder a ela de modo adequado e realmente humano.23 A sociedade que coordena suas atividades s mediante mltiplas informaes, acredita que pode agir de fato como se Deus no existisse. Mas a eficcia dos procedimentos conseguida mediante a informao, ainda que com as tecnologias mais desenvolvidas, no consegue satisfazer o desejo de dignidade inscrito no mais profundo da vocao humana. Por isso, no basta supor que a mera diversida- de de pontos de vista, de opes e, finalmente, de informaes, que costuma receber o nome de pluri ou multiculturalidade, re- solver a ausncia de um significado unitrio para tudo o que existe. A pessoa humana , em sua prpria essncia, o lugar da natureza para onde converge a variedade dos significados em uma nica vocao de sentido. As pessoas no se assustam com a diversidade. O que de fato as assusta no conseguirem reunir o conjunto de todos esses significados da realidade em uma com- preenso unitria que lhes permita exercer sua liberdade com discernimento e responsabilidade. A pessoa sempre procura a verdade de seu ser, visto que esta verdade que ilumina a reali- dade de tal modo que possa nela se desenvolver com liberdade e alegria, com prazer e esperana. 2.1.1 Situao scio-cultural 43. Portanto, a realidade social que em sua dinmica atual descrevemos com a palavra globalizao, antes que qualquer ou- 23 DI 3.
  27. 27. 32 CELAM tra dimenso, impacta a nossa cultura e o modo como nos inse- rimos e nos apropriamos dela. A variedade e riqueza das cultu- ras latino-americanas, desde as mais originrias at aquelas que com a passagem da histria e a mestiagem de seus povos foram se sedimentando nas naes, nas famlias, nos grupos sociais, nas instituies educativas e na convivncia cvica, constitui um dado bastante evidente para ns e que valorizamos como rique- za singular. O que hoje em dia est em jogo no a diversidade que os meios de comunicao so capazes de individualizar e re- gistrar.O que ningum esquece , pelo contrrio, a possibilida- de de que essa diversidade possa convergir em uma sntese que, envolvendo a variedade de sentidos, seja capaz de projet-la em um destino histrico comum. Nisso reside o valor incompar- vel do nimo mariano de nossa religiosidade popular que, sob distintos nomes, tem sido capaz de fundir as diversas histrias latino-americanas em uma histria compartilhada: aquela que conduz a Cristo, Senhor da vida, em quem se realiza a mais alta dignidade de nossa vocao humana. 44. Vivemos uma mudana de poca, e seu nvel mais pro- fundo o cultural. Dissolve-sea concepo integral do ser hu- mano, sua relao com o mundo e com Deus; aqui est preci- samente o grande erro das tendncias dominantes do ltimo sculo... Quem exclui Deus de seu horizonte, falsifica o conceito da realidade e s pode terminar em caminhos equivocados e com receitas destrutivas.24 Surge hoje, com grande fora, uma sobre- valorizao da subjetividade individual. Independentemente de sua forma, a liberdade e a dignidade da pessoa so reconhecidas. O individualismo enfraquece os vnculos comunitrios e prope uma radical transformao do tempo e do espao, dando papel primordial imaginao. Os fenmenos sociais, econmicos e tecnolgicos esto na base da profunda vivncia do tempo, o qual se concebe fixado no prprio presente, trazendo concep- es de inconsistncia e instabilidade. Deixa-se de lado a preo 24 Ibid.
  28. 28. 33VCONFERNCIAGERAL DO EPISCOPADO LATINO-AMERICANO E DO CARIBE- aparecida -DOCUMENTO FINAL cupao pelo bem comum para dar lugar realizao imediata dos desejos dos indivduos, criao de novos e muitas vezes arbitrrios direitos individuais, aos problemas da sexualidade, da famlia, das enfermidades e da morte. 45. A cincia e a tcnica quando colocadas exclusivamen- te a servio do mercado, com os critrios nicos da eficcia, da rentabilidade e do funcional, criam uma nova viso da realidade. A utilizao dos meios de comunicao de massa est introdu- zindo na sociedade um sentido esttico, uma viso a respeito da felicidade, uma percepo da realidade e at uma linguagem, que querem impor-se como autntica cultura.Desse modo, ter- mina-se por destruir o que de verdadeiramente humano h nos processos de construo cultural, que nascem do intercmbio pessoal e coletivo. 46. Verifica-se, em nvel massivo, uma espcie de nova co- lonizao cultural pela imposio de culturas artificiais, despre- zando as culturas locais e com tendncias a impor uma cultura homogeneizada em todos os setores. Essa cultura se caracteriza pela auto-referncia do indivduo, que conduz indiferena pelo outro, de quem no necessita e por quem no se sente respon- svel. Prefere-se viver o dia-a-dia, sem programas a longo prazo nem apegos pessoais, familiares e comunitrios. As relaes hu- manas esto sendo consideradas objetos de consumo, conduzin- do a relaes afetivas sem compromisso responsvel e definitivo. 47. Tambm se verifica uma tendncia para a afirmao exasperada de direitos individuais e subjetivos. Essa busca pragmtica e imediatista, sem preocupao com critrios ticos. A afirmao dos direitos individuais e subjetivos, sem um esfor- o semelhante para garantir os direitos sociais culturais e solid- rios, resulta em prejuzo da dignidade de todos, especialmente daqueles que so mais pobres e vulnerveis. 48. Nesta hora da Amrica Latina e do Caribe, imperati- vo tomar conscincia da situao precria que afeta a dignidade
  29. 29. 34 CELAM de muitas mulheres.Algumas, desde crianas e adolescentes, so submetidas a mltiplas formas de violncia dentro e fora de casa: trfico, violao, escravizao e assdio sexual; desigualda- des na esfera do trabalho, da poltica e da economia; explorao publicitria por parte de muitos meios de comunicao social que as tratam como objeto de lucro. 49. As mudanas culturais modificaram os papis tradi- cionais de homens e mulheres, que procuram desenvolver no- vas atitudes e estilos de suas respectivas identidades, poten- cializando todas as suas dimenses humanas na convivncia cotidiana, na famlia e na sociedade, s vezes por vias equivo- cadas. 50. A avidez do mercado descontrola o desejo de crian- as, jovens e adultos. A publicidade conduz ilusoriamente a mundos distantes e maravilhosos, onde todo desejo pode ser satisfeito pelos produtos que tm carter eficaz, efmero e at messinico. Legitima-se que os desejos se tornem felicidade. Como s se necessita do imediato, a felicidade se pretende al- canar atravs do bem-estar econmico e da satisfao hedo- nista. 51. As novas geraes so as mais afetadas por essa cultura do consumo em suas aspiraes pessoais profundas. Crescem na lgica do individualismo pragmtico e narcisista, que des- perta nelas mundos imaginrios especiais de liberdade e igual- dade. Afirmam o presente porque o passado perdeu relevncia diante de tantas excluses sociais, polticas e econmicas. Para elas ofuturo incerto. Assim mesmo, participam da lgica da vida como espetculo, considerando o corpo como ponto de referncia de sua realidade presente. Tm nova atrao pelas sensaes e crescem na grande maioria sem referncia aos va- lores e instncias religiosas.Em meio realidade de mudana cultural, emergem novos sujeitos, com novos estilos de vida, maneiras de pensar, de sentir, de perceber e com novas formas de se relacionar. So produtores e atores da nova cultura.
  30. 30. 35VCONFERNCIAGERAL DO EPISCOPADO LATINO-AMERICANO E DO CARIBE- aparecida -DOCUMENTO FINAL 52. Entre os aspectos positivos dessa mudana cultural aparece o valor fundamental da pessoa, de sua conscincia e ex- perincia, a busca do sentido da vida e da transcendncia. Para dar resposta busca mais profunda do significado da vida, o fra- casso das ideologias dominantes permitiu que a simplicidade e o reconhecimento do fraco e do pequeno na existncia surgissem como valor, com grande capacidade e potencial que no podem ser desvalorizados. Essa nfase na apreciao da pessoa abre no- vos horizontes, onde a tradio crist adquire renovado valor, sobretudo quando a pessoa se reconhece no Verbo encarnado que nasce em um estbulo e assume uma condio humilde, de pobre. 53. A necessidade de construir o prprio destino e o dese- jo de encontrar razes para a existncia podem colocar em mo- vimento o desejo de se encontrar com outros e compartilhar o vivido, como maneira de dar a si uma resposta. Trata-se de uma afirmao da liberdade pessoal e, por isso, da necessidade de questionar em profundidade as prprias convices e opes. 54. Porm, junto com a nfase na responsabilidade indi- vidual em meio a sociedades que promovem o acesso aos bens atravs dos meios, paradoxalmente, se nega s grandes maiorias o acesso aos mesmos bens que constituem elementos bsicos e essenciais para viverem como pessoas. 55. A nfase na experincia pessoal e no vivencial nos leva a considerar o testemunho como componente chave na vivncia da f.Os fatos so valorizados quando so significativos para a pessoa. Na linguagem testemunhal podemos encontrar um pon- to de contato com as pessoas que compem a sociedade e delas entre si. 56. Por outro lado, a riqueza e a diversidade cultural dos povos da Amrica Latina e do Caribe se tornam evidentes. Exis- tem em nossa regio diversas culturas indgenas, afro-america- nas, mestias, camponesas, urbanas e suburbanas. As culturas
  31. 31. 36 CELAM indgenas se caracterizam sobretudo por seu apego profundo terra, pela vida comunitria e por uma certa procura de Deus. Os afro-americanos se caracterizam, entre outros elementos, pela expressividade corporal, o enraizamento familiar e o sen- tido de Deus. A cultura camponesa se relaciona ao ciclo agr- rio. A cultura mestia, que a mais extensa entre muitos povos da regio, tem buscado em meio s contradies sintetizar ao longo da histria essas mltiplas fontes culturais originrias, facilitando o dilogo das respectivas cosmovises e permitindo sua convergncia em uma histria compartilhada. A essa com- plexidade cultural se deveria acrescentar tambm a de tantos imigrantes europeus que se estabeleceram nos pases de nossa regio. 57. Essas culturas coexistem em condies desiguais com a chamada cultura globalizada. Elas exigem reconhecimento e oferecem valores que constituem uma resposta aos anti-valores da cultura que se impem atravs dos meios de comunicao de massas: comunitarismo, valorizao da famlia, abertura transcendncia e solidariedade. Essas culturas so dinmicas e esto em interao permanente entre si e com as diferentes pro- postas culturais. 58. A cultura urbana hbrida, dinmica e mutvel, pois amalgama mltiplas formas, valores e estilos de vida e afeta to- das as coletividades. A cultura suburbana fruto de grandes mi- graes de populao, em sua maioria pobre, que se estabeleceu ao redor das cidades nos cintures de misria. Nessas culturas os problemas de identidade e pertena, relao, espao vital e lar so cada vez mais complexos. 59. Existem tambm comunidades de migrantes que dei- xaram as culturas e tradies trazidas de suas terras de origem, sejam crists ou de outras religies. Por sua vez, essa diversida- de inclui comunidades que se foram formando com a chegada de diferentes denominaes crists e outros grupos religiosos. Assumir a diversidade cultural, que imperativo do momento,
  32. 32. 37VCONFERNCIAGERAL DO EPISCOPADO LATINO-AMERICANO E DO CARIBE- aparecida -DOCUMENTO FINAL envolve superar os discursos que pretendem uniformizar a cul- tura, com enfoques baseados em modelos nicos. 2.1.2 Situao econmica 60. O Papa, em seu Discurso Inaugural, v a globalizao como um fenmeno de relaes de nvel planetrio, conside- rando-o uma conquista da famlia humana, porque favorece o acesso a novas tecnologias, mercados e finanas. As altas taxas de crescimento de nossa economia regional e, particularmente, seu desenvolvimento urbano, no seriam possveis sem a aber- tura ao comrcio internacional, sem acesso s tecnologias de l- tima gerao, sem a participao de nossos cientistas e tcnicos no desenvolvimento internacional do conhecimento e sem o alto investimento registrado nos meios eletrnicos de comunicao. Tudo isso leva tambm consigo o surgimento de uma classe m- dia tecnologicamente letrada. Ao mesmo tempo, a globalizao se manifesta como a profunda aspirao do gnero humano unidade. No obstante esses avanos, o Papa tambm assinala que a globalizao comporta o risco dos grandes monoplios e de converter o lucro em valor supremo. Por isso, Bento XVI enfatiza que como em todos os campos da atividade humana, a globalizao deve reger-se tambm pela tica, colocando tudo a servio da pessoa humana, criada imagem e semelhana de Deus.25 61. A globalizao um fenmeno complexo que possui diversas dimenses (econmicas, polticas, culturais, comu- nicacionais, etc). Para sua justa valorizao, necessria uma compreenso analtica e diferenciada que permita detectar tan- to seus aspectos positivos quanto os negativos. Lamentavel- mente, a face mais difundida e de xito da globalizao sua dimenso econmica, que se sobrepe e condiciona as outras dimenses da vida humana. Na globalizao, a dinmica do mercado absolutiza com facilidade a eficcia e a produtividade 25 DI 2.
  33. 33. 38 CELAM como valores reguladores de todas as relaes humanas. Esse carter peculiar faz da globalizao um processo promotor de iniqidades e injustias mltiplas. A globalizao, tal como est configurada atualmente, no capaz de interpretar e reagir em funo de valores objetivos que se encontram alm do mercado e que constituem o mais importante da vida humana: a verda- de, a justia, o amor, e muito especialmente a dignidade e os direitos de todos, inclusive daqueles que vivem margem do prprio mercado. 62. Conduzida por uma tendncia que privilegia o lucro e estimula a concorrncia, a globalizao segue uma dinmi- ca de concentrao de poder e de riqueza em mos de poucos. Concentrao no s dos recursos fsicos e monetrios, mas so- bretudo da informao e dos recursos humanos, o que produz a excluso de todos aqueles no suficientemente capacitados e informados, aumentando as desigualdades que marcam triste- mente nosso continente e que mantm na pobreza uma multi- do de pessoas. O que existe hoje a pobreza de conhecimento e do uso e acesso a novas tecnologias. Por isso, necessrio que os empresrios assumam sua responsabilidade de criar mais fontes de trabalho e de investir na superao dessa nova po- breza. 63. No se pode negar que o predomnio dessa tendncia no elimina a possibilidade de se formarem pequenas e mdias empresas. Elas se associam ao dinamismo exportador da eco- nomia, prestam-lhe servios colaterais ou aproveitam nichos especficos do mercado interno. No entanto, sua fragilidade eco- nmica e financeira e a pequena escala em que se desenvolvem, as tornam extremamente vulnerveis frente s taxas de juros, ao risco do cmbio, aos custos previsveis e variao nos preos de seus insumos. A debilidade dessas empresas se associa pre- cariedade do emprego que esto em condies de oferecer. Sem uma poltica de proteo especfica dos Estados frente a elas, corre-se o risco de que as economias de escala dos grandes con-
  34. 34. 39VCONFERNCIAGERAL DO EPISCOPADO LATINO-AMERICANO E DO CARIBE- aparecida -DOCUMENTO FINAL srcios termine por se impor como nica forma determinante do dinamismo econmico. 64. Por isso, frente a essa forma de globalizao, sentimos forte chamado para promover uma globalizao diferente, que esteja marcada pela solidariedade, pela justia e pelo respeito aos direitos humanos, fazendo da Amrica Latina e do Caribe no s o Continente da esperana, mas tambm o Continente do amor, como props SS. Bento XVI no Discurso Inaugural desta Conferncia. 65. Isso nos deveria levar a contemplar os rostos daqueles que sofrem. Entre eles, esto ascomunidades indgenas e afro- americanas que, em muitas ocasies, no so tratadas com dig- nidade e igualdade de condies; muitas mulheres so excludas, em razo de seu sexo, raa ou situao scio-econmica; jovens que recebem uma educao de baixa qualidade e no tm opor- tunidades de progredir em seus estudos nem de entrar no mer- cado de trabalho para se desenvolver e constituir uma famlia; muitos pobres, desempregados, migrantes, deslocados, agricul- tores sem terra, aqueles que procuram sobreviver na economia informal; meninos e meninas submetidos prostituio infantil, ligada muitas vezes ao turismo sexual; tambm as crianas vti- mas do aborto. Milhes de pessoas e famlias vivem na misria e inclusive passam fome. Preocupam-nos tambm os dependen- tes das drogas, as pessoas com limitaes fsicas, os portadores e vtimas de enfermidades graves como a malria, a tuberculose e HIVAIDS, que sofrem a solido e se vem excludos da convi- vncia familiar e social. No esquecemos tambm os seqestra- dos e os que so vtimas da violncia, do terrorismo, de conflitos armados e da insegurana na cidade. Tambm os ancios que, alm de se sentirem excludos do sistema produtivo, vem-se muitas vezes recusados por sua famlia como pessoas incmo- das e inteis. Sentimos as dores, enfim, da situao desumana em que vive a grande maioria dos presos, que tambm necessi- tam de nossa presena solidria e de nossa ajuda fraterna. Uma
  35. 35. 40 CELAM globalizao sem solidariedade afeta negativamente os setores mais pobres. J no se trata simplesmente do fenmeno da ex- plorao e opresso, mas de algo novo: a excluso social. Com ela a pertena sociedade na qual se vive fica afetada na raiz, pois j no est abaixo, na periferia ou sem poder, mas est fora. Os excludos no so somente explorados, mas suprfluos e descartveis. 66. As instituies financeiras e as empresas transnacionais se fortalecem ao ponto de subordinar as economias locais, sobre- tudo debilitando os Estados, que aparecem cada vez mais impo- tentes para levar adiante projetos de desenvolvimento a servio de suas populaes, especialmente quando se trata de investi- mentos de longo prazo e sem retorno imediato. As indstrias extrativistas internacionais e a agroindstria, muitas vezes, no respeitam os direitos econmicos, sociais, culturais e ambientais das populaes locais e no assumem suas responsabilidades. Com muita freqncia mse subordina a preservao da nature- za ao desenvolvimento econmico, com danos biodiversidade, com o esgotamento das reservas de gua e de outros recursos naturais, com a contaminao do ar e a mudana climtica. As possibilidades e eventuais problemas da produo de agrocom- bustveis devem ser estudadas, de tal maneira que prevalea o valor da pessoa humana e de suas necessidades de sobrevivn- cia. A Amrica Latina possui os aqferos mais abundantes do planeta, junto com grandes extenses de territrio selvagem, que so pulmes da humanidade. Assim se do gratuitamente ao mundo servios ambientais que no so reconhecidos econo- micamente. A regio se v afetada pelo aquecimento da terra e a mudana climtica provocada principalmente pelo estilo de vida no sustentvel dos pases industrializados. 67. A globalizao tem celebrado freqentes Tratados de Livre Comrcio entre pases com economias assimtricas, que nem sempre beneficiam os pases mais pobres. Ao mesmo tem- po, pressiona-se aos pases da regio com exigncias desmedidas
  36. 36. 41VCONFERNCIAGERAL DO EPISCOPADO LATINO-AMERICANO E DO CARIBE- aparecida -DOCUMENTO FINAL em matria de propriedade intelectual, a tal ponto que se per- mitem direitos de patente sobre a vida em todas as suas formas. Alm disso, a utilizao de organismos geneticamente manipu- lados tem mostrado qu nem sempre a globalizao contribui para o combate contra a fome, nem para o desenvolvimento ru- ral sustentvel. 68. Ainda que se tenha progredido muitssimo no contro- le da inflao e na estabilidade macro-econmica dos pases da regio, muitos governos se encontram severamente limitados para o financiamento de seu oramento pblico pelos elevados servios da dvida externa26 e interna, enquanto,por outro lado, no contam com sistemas tributrios verdadeiramente eficien- tes, progressivos e eqitativos. 69. A atual concentrao de renda e riqueza acontece prin- cipalmente pelos mecanismos do sistema financeiro. A liberda- de concedida aos investimentos financeiros favorecem o capital especulativo, que no tem incentivos para fazer investimentos produtivos de longo prazo, mas busca o lucro imediato nos ne- gcios com ttulos pblicos, moedas e derivados. No entanto, segundo a Doutrina Social da Igreja, o objeto da economia a formao da riqueza e seu incremento progressivo, em termos no s quantitativos, mas qualitativos: tudo moralmente cor- reto se est orientado para o desenvolvimento global e solidrio do homem e da sociedade na qual vive e trabalha. O desenvol- vimento, na verdade, no se pode reduzir a mero processo de acumulao de bens e servios. Ao contrrio, a pura acumulao, ainda que para o bem comum, no condio suficiente para a realizao de uma autntica felicidade humana.27 A empresa chamada a prestar uma contribuio maior na sociedade, assu- mindo a chamada responsabilidade social-empresarial, a partir dessa perspectiva. 26 Cf. TMA 51; Bento XVI, Carta Chanceler da Repblica Federal da Alemanha, ngela Merkel, 12 de dezembro de 2006. 27 Compndio da Doutrina Social da Igreja, 334.
  37. 37. 42 CELAM 70. tambm alarmante o nvel de corrupo nas econo- mias, envolvendo tanto o setor pblico quanto o setor privado, ao que se soma notvel falta de transparncia e prestao de contas cidadania. Em muitas ocasies, a corrupo est vincu- lada ao flagelo do narcotrfico ou do narconegcio, e por outro lado vem destruindo o tecido social e econmico em regies in- teiras. 71. A populao economicamente ativa da regio afetada pelo subemprego (42%) e pelo desemprego (9%), e quase a meta- de est empregada no trabalho informal. O trabalho formal, por sua vez, se v submetido precariedade das condies de em- prego e presso constante da subcontratao, que traz consigo salrios mais baixos e falta de proteo na rea da seguridade social, no permitindo a muitos o desenvolvimento de uma vida digna. Nesse contexto, os sindicatos perdem a possibilidade de defender os direitos dos trabalhadores. Por outro lado, poss- vel destacar fenmenos positivos e criativos para enfrentar tal situao por parte dos afetados, que vm estimulando diversas experincias, como por exemplo micro-finanas, economia local e solidria e comrcio justo. 72. Os homens do campo, em sua maioria, sofrem por cau- sa da pobreza, agravada por no terem acesso terra prpria. No entanto, existem grandes latifndios em mos de poucos. Em alguns pases, essa situao tem levado a populao a exigir uma Reforma Agrria, estando atentos aos males que lhes po- dem ocasionar os Tratados de Livre Comrcio, a manipulao da droga e outros fatores. 73. Um dos fenmenos mais importantes em nossos pases o processo de mobilidade humana, em sua dupla expresso de migrao e itinerncia, em que milhes de pessoas migram ou se vem foradas a migrar dentro e fora de seus respectivos pases. As causas so diversas e esto relacionadas com a situao eco- nmica, a violncia em suas diversas formas, a pobreza que afeta as pessoas e a falta de oportunidades para a pesquisa e o de-
  38. 38. 43VCONFERNCIAGERAL DO EPISCOPADO LATINO-AMERICANO E DO CARIBE- aparecida -DOCUMENTO FINAL senvolvimento profissional. Em muitos casos, as conseqncias so de enorme gravidade em nvel pessoal, familiar e cultural. A perda do capital humano de milhes de pessoas, de profissionais qualificados, de pesquisadores e amplos setores camponeses, vai nos empobrecendo cada vez mais. A explorao do trabalho che- ga, em alguns casos, a gerar condies de verdadeira escravido. Acontece tambm um vergonhoso trfico de pessoas, que inclui a prostituio, inclusive de menores. Merece especial meno a situao dos refugiados, que questiona a capacidade de acolhida da sociedade e das igrejas. Por outro lado, no entanto, a remessa de divisas dos emigrados a seus pases de origem se tem torna- do uma importante e, s vezes, insubstituvel fonte de recursos para diversos pases da regio, ajudando o bem-estar e a mobili- dade social ascendente daqueles que conseguem participar com xito nesse processo. 2.1.3 Dimenso scio-poltica 74. Constatamos um certo progresso democrtico que se demonstra em diversos processos eleitorais. No entanto, ve- mos com preocupao o acelerado avano de diversas formas de regresso autoritria por via democrtica que, em certas ocasies, resultam em regimes de corte neo-populista. Isso indica que no basta uma democracia puramente formal, fun- dada em procedimentos eleitorais honestos, mas que neces- sria uma democracia participativa e baseada na promoo e respeito dos direitos humanos. Uma democracia sem valores como os mencionados torna-se facilmente ditadura e termina traindo o povo. 75. Com a presena da Sociedade Civil assumindo uma atitude mais protagonista e a irrupo de novos atores sociais como os indgenas, os afro-americanos, as mulheres, os profis- sionais, uma extensa classe mdia e os setores marginalizados organizados, vem se fortalecendo a democracia participativa e esto se criando maiores espaos de participao poltica. Esses grupos esto tomando conscincia do poder que tm
  39. 39. 44 CELAM nas mos e da possibilidade de gerarem mudanas impor- tantes para a conquista de polticas pblicas mais justas, que revertam sua situao de excluso. Nesse plano, percebe-se tambm uma crescente influncia de organismos das Naes Unidas e de Organizaes No-Governamentais de carter in- ternacional, que nem sempre ajustam suas recomendaes a critrios ticos. No faltam tambm atuaes que radicalizam as posies, fomentam a conflitividade e a polarizao extre- mas e colocam esse potencial a servio de interesses alheios aos seus, o que ao final pode frustrar e reverter negativamente suas esperanas. 76. Depois de uma poca de enfraquecimento dos Estados devido aplicao de ajustes estruturais na economia, por re- comendao de organismos financeiros internacionais, v-se atualmente com bons olhos um esforo dos Estados em definir e aplicar polticas pblicas nos campos da sade, educao, segu- ridade alimentar, previdncia social, acesso terra e moradia, promoo eficaz da economia para a criao de empregos e leis que favorecem as organizaes solidrias.Tudo isso mostra que no pode existir democracia verdadeira e estvel sem justia so- cial, sem diviso real de poderes e sem a vigncia do Estado de direito.28 77. Cabe assinalar, como grande fator negativo em boa parte da regio, o recrudescimento da corrupo na sociedade e no Estado, envolvendo os poderes legislativos e executivos em todos os nveis, alcanando tambm o sistema judicirio que, muitas vezes, inclina seu juzo a favor dos poderosos e gera im- punidade, o que coloca em srio risco a credibilidade das insti- tuies pblicas e aumenta a desconfiana do povo, fenmeno que se une a um profundo desprezo pela legalidade. Em amplos setores da populao, e especialmente entre os jovens, cresce o desencanto pela poltica e particularmente pela democracia, 28 Cf. EAm 56.
  40. 40. 45VCONFERNCIAGERAL DO EPISCOPADO LATINO-AMERICANO E DO CARIBE- aparecida -DOCUMENTO FINAL pois as promessas de uma vida melhor e mais justa no se cum- priram ou se cumpriram s pela metade. Nesse sentido, esque- ce-se de que a democracia e a participao poltica so fruto da formao que se faz realidade somente quando os cidados so conscientes de seus direitos fundamentais e de seus deveres correspondentes. 78. A vida social em convivncia harmnica e pacfica est se deteriorando gravemente em muitos pases da Amrica La- tina e do Caribe pelo crescimento da violncia, que se mani- festa em roubos, assaltos, seqestros, e o que mais grave, em assassinatos que a cada dia destroem mais vidas humanas e enchem de dor as famlias e a sociedade inteira. A violncia se reveste de vrias formas e tem diversos agentes: o crime or- ganizado e o narcotrfico, grupos paramilitares, violncia co- mum sobretudo na periferia das grandes cidades, violncia de grupos juvenis e crescente violncia intra-familiar. Suas causas so mltiplas: a idolatria do dinheiro, o avano de uma ideolo- gia individualista e utilitarista, a falta de respeito pela dignida- de de cada pessoa, a deteriorao do tecido social, a corrupo inclusive nas foras da ordem e a falta de polticas pblicas de eqidade social. 79. Alguns parlamentos ou assemblias legislativas apro- vam leis injustas contra os direitos humanos e a vontade popu- lar, precisamente por no estarem perto de seus representados, nem saberem escutar e dialogar com os cidados, mas tambm por ignorncia, por falta de acompanhamento e porque muitos cidados abdicam de seu dever de participar na vida pblica. 80. Em alguns pases tem aumentado a represso, a viola- o dos direitos humanos, inclusive o direito liberdade religio- sa, a liberdade de expresso e a liberdade de ensino, assim como o desprezo objeo de conscincia. 81. Ainda que alguns pases tenham conseguido acordos de paz superando dessa forma conflitos antigos, em outros conti-
  41. 41. 46 CELAM nua a luta armada com todas as suas seqelas (mortes violentas, violaes dos Direitos Humanos, ameaas, crianas na guerra, seqestros etc.), sem que se possam prever solues a curto pra- zo. A influncia do narconegcio nesses grupos dificulta ainda mais as possveis solues. 82. Na Amrica Latina e no Caribe v-se com bons olhos uma crescente vontade de integrao regional mediante acor- dos multilaterais, envolvendo crescente nmero de pases que geram suas prprias regras no campo do comrcio, dos servios e das patentes. origem comum unem-se a cultura, a lngua e a religio, que podem contribuir para que a integrao no seja s de mercados, mas de instituies civis e sobretudo de pessoas. Tambm positiva a globalizao da justia, no campo dos direi- tos humanos e dos crimes contra a humanidade, que permitir a todos viver progressivamente sob normas iguais chamadas a proteger sua dignidade, sua integridade e sua vida. 2.1.4 Biodiversidade, ecologia, Amaznia e Antrtida 83. A Amrica Latina o Continente que possui uma das maiores biodiversidades do planeta e uma rica scio-diversida- de, representada por seus povos e culturas. Estes possuem gran- de acervo de conhecimentos tradicionais sobre a utilizao dos recursos naturais, assim como sobre o valor medicinal de plan- tas e outros organismos vivos, muitos dos quais formam a base de sua economia. Tais conhecimentos so atualmente objeto de apropriao intelectual ilcita, sendo patenteados por indstrias farmacuticas e de biogentica, gerando vulnerabilidade dos agricultores e suas famlias que dependem desses recursos para sua sobrevivncia. 84. Nas decises sobre as riquezas da biodiversidade e da natureza, as populaes tradicionais tm sido praticamente ex- cludas. A natureza foi e continua sendo agredida. A terra foi depredada. As guas esto sendo tratadas como se fossem mer- cadoria negocivel pelas empresas, alm de terem sido transfor-
  42. 42. 47VCONFERNCIAGERAL DO EPISCOPADO LATINO-AMERICANO E DO CARIBE- aparecida -DOCUMENTO FINAL madas num bem disputado pelas grandes potncias. Exemplo muito importante nessa situao a Amaznia.29 85. Em seu discurso aos jovens, no Estdio do Pacaembu, em So Paulo, o Papa Bento XVI chamou a ateno sobre a de- vastao ambiental da Amaznia e as ameaas dignidade hu- mana de seus povos30 e pediu aos jovens um maior compro- misso nos mais diversos espaos de ao.31 86. A crescente agresso ao meio-ambiente pode servir de pretexto para propostas de internacionalizao da Amaznia, que s servem aos interesses econmicos das corporaes inter- nacionais. A sociedade panamaznica pluritnica, pluricultu- ral e plurirreligiosa. Nela, cada vez mais, se intensifica a disputa pela ocupao do territrio. As populaes tradicionais da regio querem que seus territrios sejam reconhecidos e legalizados. 87. Alm disso, constatamos o retrocesso das geleiras em todo o mundo: o degelo do rtico, cujo impacto j est se ven- do na flora e fauna desse ecossistema; tambm o aquecimento global se faz sentir no estrondoso crepitar dos blocos de gelo rtico que reduzem a cobertura glacial do Continente e que re- gula o clima do mundo. Profeticamente, h 20 anos, desde a fronteira das Amricas, Joo Paulo II assinalou: Desde o Cone Sul do Continente Americano e frente aos ilimitados espaos da Antrtida, lano um chamado a todos os responsveis de nosso planeta para proteger e conservar a natureza criada por Deus: no permitamos que nosso mundo seja uma terra cada vez mais degradada e degradante.32 29 A Amaznia pan-americana ocupa uma rea de 7,01 milhes de quilmetros quadra- dos e corresponde a 5% da superfcie da terra, 40% da Amrica do Sul. Contm 20% da disponibilidade mundial de gua doce no congelada. Abriga 34% das reservas mundiais de florestas e gigantesca reserva de minerais. Sua diversidade biolgica de eco-sistemas a mais rica do planeta. Nessa regio se encontram cerca de 30% de todas as espcies da fauna e flora do mundo. 30 Bento XVI, Mensagem aos jovens no Pacaembu 2; Brasil, 10 de maio de 2007. 31 Ibid. 32 Joo Paulo II, Homilia na Celebrao da Palavra para os fiis da Zona Austral do Chile 7; Punta Arenas, 4 de abril de 1987.
  43. 43. 48 CELAM 2.1.5 Presena dos povos indgenas e afro-americanos na Igreja 88. Os indgenas constituem a populao mais antiga do Continente. Esto na raiz primeira da identidade latino-ameri- cana e caribenha. Os afro-americanos constituem outra raiz que foi arrancada da frica e trazida para c como gente escravizada. A terceira raiz a populao pobre que migrou da Europa a par- tir do sculo XVI, em busca de melhores condies de vida, e o grande fluxo de imigrantes de todo o mundo a partir de meados do sculo XIX. De todos esses grupos e de suas correspondentes culturas se formou a mestiagem que a base social e cultural de nossos povos latino-americanos e caribenhos, como j o reco- nheceu a III Conferncia Geral do Episcopado Latino-americano celebrada em Puebla, Mxico.33 89. Os indgenas e afro-americanos so, sobretudo, ou- tros diferentes que exigem respeito e reconhecimento. A socie- dade tende a menosprez-los, desconhecendo o porqu de suas diferenas. Sua situao social est marcada pela excluso e pela pobreza. A Igreja acompanha os indgenas e afro-americanos nas lutas por seus legtimos direitos. 90. Hoje, os povos indgenas e afros esto ameaados em sua existncia fsica, cultural e espiritual; em seus modos de vida; em suas identidades; em sua diversidade; em seus territ- rios e projetos. Algumas comunidades indgenas se encontram fora de suas terras porque estas foram invadidas e degradadas, ou no tm terras suficientes para desenvolver suas culturas. Sofrem graves ataques sua identidade e sobrevivncia, pois a globalizao econmica e cultural coloca em perigo sua prpria existncia como povo diferentes. Sua progressiva transformao cultural provoca o rpido desaparecimento de algumas lnguas e culturas. A migrao, forada pela pobreza, est influindo pro- fundamente na mudana de costumes, de relacionamentos e in- clusive de religio. 33 DP 307, 409.
  44. 44. 49VCONFERNCIAGERAL DO EPISCOPADO LATINO-AMERICANO E DO CARIBE- aparecida -DOCUMENTO FINAL 91. Os indgenas e afro-americanos emergem agora na so- ciedade e na Igreja. Este um kairs para aprofundar o en- contro da Igreja com esses setores humanos que reivindicam o reconhecimento pleno de seus direitos individuais e coletivos, serem levados em considerao na catolicidade com sua cosmo- viso, seus valores e suas identidades particulares, para viverem um novo Pentecostes eclesial. 92. J, em Santo Domingo, os pastores reconhecamos que os povos indgenas cultivam valores humanos de grande signifi- cado;34 valoresqueaIgrejadefende...diantedaforadominado- ra das estruturas de pecado manifestas na sociedade moderna;35 so possuidores de inumerveis riquezas culturais, que esto na base de nossa identidade atual;36 e, a partir da perspectiva da f, esses valores e convices so fruto de sementes do Verbo, que j estavam presentes e operavam em seus antepassados.37 93. Entre eles podemos assinalar: abertura ao de Deus pelos frutos da terra, o carter sagrado da vida humana, a valori- zaodafamlia,osentidodesolidariedadeeaco-responsabilida- denotrabalhocomum,aimportnciadocultual,acrenaemuma vida ultra-terrena.38 Atualmente, o povo tem enriquecido am- plamente esses valores atravs da evangelizao e os tem desen- volvido em mltiplas formas de autntica religiosidade popular. 94. Como Igreja que assume a causa dos pobres, estimula- mos a participao dos indgenas e afro-americanos na vida ecle- sial. Vemos com esperana o processo de inculturao discerni- do luz do magistrio. prioritrio fazer tradues catlicas da Bblia e dos textos litrgicos nos idiomas desses povos. Neces- sita-se, igualmente, promover mais as vocaes e os ministrios ordenados procedentes dessas culturas. 34 SD 245. 35 Ibid. 243. 36 Mensagem da IV Conferncia aos Povos da Amrica Latina e do Caribe, 38. 37 SD 245. 38 Ibid. 17.
  45. 45. 50 CELAM 95. Nosso servio pastoral vida plena dos povos indge- nas exige que anunciemos Jesus Cristo e a Boa Nova do Reino de Deus, denunciemos as situaes de pecado, as estruturas de morte, a violncia e as injustias internas e externas e fomen- temos o dilogo intercultural, interreligioso e ecumnico. Jesus Cristo a plenitude da revelao para todos os povos e o cen- tro fundamental de referncia para discernir os valores e as defi cincias de todas as culturas, incluindo as indgenas. Por isso, o maior tesouro que podemos oferecer a eles que cheguem ao encontro com Jesus Cristo ressuscitado, nosso Salvador. Os in- dgenas que j receberam o Evangelho, como discpulos e missio- nrios de Jesus Cristo, so chamados a viver com imensa alegria sua realidade crist, a explicar a razo de sua f em meio a suas comunidades e a colaborar ativamente para que nenhum povo indgena da Amrica Latina renegue sua f crist, mas ao con- trrio, sintam que em Cristo encontram o sentido pleno de sua existncia. 96. A histria dos afro-americanos tem sido atravessada por uma excluso social, econmica, poltica e sobretudo racial, onde a identidade tnica fator de subordinao social. Atual- mente, so discriminados na insero do trabalho, na qualidade e contedo da formao escolar, nas relaes cotidianas e, alm disso, existe um processo de ocultamento sistemtico de seus valores, histria, cultura e expresses religiosas. Permanece, em alguns casos, uma mentalidade e um certo olhar de menor res- peito em relao aos indgenas e afro-americanos. Desse modo, descolonizar as mentes, o conhecimento, recuperar a memria histrica, fortalecer os espaos e relacionamentos inter-cultu- rais, so condies para a afirmao da plena cidadania desses povos. 97. A realidade latino-americana conta com comunidades afro-americanas muito vivas que participam ativa e criativa- mente na construo deste continente. Os movimentos pela recuperao das identidades, dos direitos dos cidados e con-
  46. 46. 51VCONFERNCIAGERAL DO EPISCOPADO LATINO-AMERICANO E DO CARIBE- aparecida -DOCUMENTO FINAL tra o racismo e os grupos alternativos de economias solidrias, fazem das mulheres e homens negros sujeitos construtores de sua histria e de uma nova histria que se vai desenhando na atualidade latino-americana e caribenha. Essa nova realidade se baseia em relaes inter-culturais onde a diversidade no significa ameaa, no justifica hierarquias de um poder sobre outros, mas sim dilogo a partir de vises culturais diferentes, de celebrao, de inter-relacionamento e de reavivamento da esperana. 2.2 Situao de nossa Igreja nesta hora histrica de desafios 98. A Igreja Catlica na Amrica Latina e no Caribe, apesar das deficincias e ambigidades de alguns de seus membros, tem dado testemunho de Cristo, anunciado seu Evangelho e ofereci- do seu servio de caridade principalmente aos mais pobres, no esforo por promover sua dignidade e tambm no empenho de promoo humana nos campos da sade, da economia solidria, da educao, do trabalho, do acesso terra, da cultura, da habi- tao e assistncia, entre outros. Com sua voz, unida de outras instituies nacionais e mundiais, tem ajudado a dar orienta- es prudentes e a promover a justia, os direitos humanos e a reconciliao dos povos. Isso tem permitido que a Igreja seja reconhecida socialmente em muitas ocasies como instncia de confiana e credibilidade. Seu empenho a favor dos mais pobres e sua luta pela dignidade de cada ser humano tem ocasionado, em muitos casos, a perseguio e inclusive a morte de alguns de seus membros, os quais consideramos testemunhas da f. Que- remos recordar o testemunho valente de nossos santos e santas, e aqueles que, inclusive sem terem sido canonizados, viveram com radicalidade o Evangelho e ofereceram sua vida por Cristo, pela Igreja e por seu povo. 99. Os esforos pastorais orientados para o encontro com Jesus Cristo vivo deram e continuam dando frutos. Entre ou- tros, destacamos os seguintes:
  47. 47. 52 CELAM a) Devido animao bblica da pastoral, aumenta o conhe- cimento da Palavra de Deus e do amor por ela. Graas assimilao do Magistrio da Igreja e formao melhor de generosos catequistas, a renovao da Catequese tem produzido fecundos resultados emtodo o Continente, chegando inclusive a pases da Amrica do Norte, Europa e sia, para onde muitos latino-americanos e caribenhos tm emigrado. b) A renovao litrgica acentuou a dimenso celebrativa e festiva da f crist centrada no mistrio pascal de Cristo Salvador, em particular na Eucaristia. Crescem as mani- festaes da religiosidade popular, especialmente a pie- dade eucarstica e a devoo mariana. Esforos tm sido realizados para inculturar a liturgia nos povos indgenas e afro-americanos. Esto sendo superados os riscos de reduzir a Igreja a sujeito poltico, com melhor discerni- mento dos impactos sedutores das ideologias. Tm-se fortalecido a responsabilidade e a vigilncia com relao s verdades da F, ganhando em profundidade e sereni dade de comunho. c) Nosso povo tem grande estima pelos sacerdotes. Reco- nhece a santidade de muitos deles, como tambm seu testemunho de vida, seu trabalho missionrio e sua cria- tividade pastoral, particularmente daqueles que esto em lugares distantes ou em contextos de maior dificuldade. Muitas de nossas Igrejas contam com uma pastoral sacer- dotal e com experincias concretas de vida em comum e de uma retribuio do clero mais justa. Em algumas Igre- jas desenvolve-se o diaconato permanente. Contam tam- bm com ministrios confiados aos leigos e outros ser- vios pastorais, como ministros da Palavra, animadores de assemblia e de pequenas comunidades, entre elas as comunidades eclesiais de base, os movimentos eclesiais e um grande nmero de pastorais especficas. Grande es- foro se faz para a formao em nossos Seminrios, nas
  48. 48. 53VCONFERNCIAGERAL DO EPISCOPADO LATINO-AMERICANO E DO CARIBE- aparecida -DOCUMENTO FINAL casas de formao para a vida consagrada e nas escolas para o diaconato permanente. significativo o testemu- nho da vida consagrada, sua participao na ao pas- toral e sua presena em situaes de pobreza, de risco e de fronteira. Estimula a esperana o incremento de vo- caes para a vida contemplativa masculina e feminina. d) Ressalta-se a abnegada entrega de tantos missionrios e missionrias que, at o dia de hoje, tm desenvolvido valiosa obra evangelizadora e de promoo humana em todos os nossos povos, com multiplicidade de obras e ser- vios. Desse modo se reconhece o trabalho de numero- sos sacerdotes, consagradas e consagrados, leigos e leigas que, a partir do nosso Continente, participam da misso ad gentes. e) Crescem os esforos de renovao pastoral nas parquias, favorecendo o encontro com Cristo vivo, mediante diver- sos mtodos de nova evangelizao que se transformam em comunidade de comunidades evangelizadas e missio- nrias. Contata-se em alguns lugares um florescimento de comunidades eclesiais de base, segundo o critrio das Conferncias Gerais anteriores, em comunho com os Bispos e fiis ao Magistrio da Igreja.39 Valoriza-se a pre- sena e o crescimento dos movimentos eclesiais e novas comunidades que difundem sua riqueza carismtica, edu- cativa e evangelizadora. Tem-se tomado conscincia da importncia da pastoral Familiar, da Infncia e Juvenil. f) A Doutrina Social da Igreja constitui uma riqueza sem preo, que tem animado o testemunho e a ao solidria dos leigos e leigas, que se interessam cada vez mais por sua formao teolgica como verdadeiros missionrios da caridade, e se esforam por transformar de maneira efeti- va o mundo segundo Cristo. Hoje, inumerveis iniciativas 39 Cf. Puebla, 261, 617, 638, 731 e 940; Santo Domingo, 62.
  49. 49. 54 CELAM leigas no mbito social, cultural, econmico e poltico dei- xam-se inspirar pelos princpios permanentes, pelos cri- trios de juzo e pelas diretrizes de ao provenientes da Doutrina Social da Igreja. Valoriza-se o desenvolvimento que tem tido a Pastoral Social, como tambm a ao da Critas em seus vrios nveis, e a riqueza do voluntaria- do nos mais diversos apostolados com incidncia social. Tem-se desenvolvido a pastoral da comunicao social, e mais do que nunca a Igreja tem contado com mais meios de comunicao para a evangelizao da cultura, resistin- do em parte a outros grupos religiosos que ganham cons- tantemente adeptos usando com perspiccia o rdio e a televiso. Temos rdios, televiso, cinema, jornais, inter- net, pginas de web e a RIIAL que nos enchem de espe- rana. g) A diversificao da organizao eclesial, com a criao de muitas comunidades, novas jurisdies e organismos pas- torais, permitiu que muitas Igrejas locais avanassem na estruturao de uma Pastoral Orgnica, para servir me- lhor s necessidades dos fiis. No com a mesma inten- sidade em todas as Igrejas, tem-se desenvolvido o dilo- go ecumnico. Tambm o dilogo interreligioso, quando segue as normas do Magistrio, pode enriquecer os par- ticipantes em diversos encontros.40 Em outros lugares, tm-se criado escolas de ecumenismo ou de colaborao ecumnica em assuntos sociais e outras iniciativas. Ma- nifesta-se, como reao ao materialismo, uma busca de espiritualidade, de orao e de mstica que expressa fome e sede de Deus. Por outro lado, a valorizao da tica um sinal dos tempos que indica a necessidade de superar o hedonismo, a corrupo e o vazio dos valores. Alegra-nos, alm disso, o profundo sentimento de solidariedade que 40 Cf. Congregao para a Doutrina da F, artigo de comentrio Notificao a propsito do livro do Pe. Jacques Dupuis Hacia uma teologia del pluralismo religioso, 12 de maro de 2001.
  50. 50. 55VCONFERNCIAGERAL DO EPISCOPADO LATINO-AMERICANO E DO CARIBE- aparecida -DOCUMENTO FINAL caracteriza nossos povos e a prtica de compartilhar e de ajuda mtua. 100.Apesar dos aspectos positivos que nos alegram na es- perana, observamos sombras, entre as quais mencionamos as seguintes: a) Para a Igreja Catlica, a Amrica Latina e o Caribe so de grande importncia, por seu dinamismo eclesial, por sua criatividade e porque 43% de todos os seus fiis vivem nesses locais; no entanto, observamos que o crescimen- to percentual da Igreja no segue o mesmo ritmo que o crescimento populacional. Na mdia, o aumento do clero, e sobretudo das religiosas, distancia-se cada vez mais do crescimento populacional em nossa regio.41 b) Lamentamos, seja algumas tentativas de voltar a um certo tipo de eclesiologia e espiritualidade contrrias renovao do Conclio Vaticano II,42 seja algumas leitu- ras e aplicaes reducionistas da renovao conciliar; lamentamos a ausncia de uma autntica obedincia e do exerccio evanglico da autoridade, das infidelida- des doutrina, moral e comunho, nossas dbeis vivncias da opo preferencial pelos pobres, no pou- cas recadas secularizantes na vida consagrada influen- ciada por uma antropologia meramente sociolgica e no evanglica. Tal como manifestou o Santo Padre no Discurso Inaugural de nossa Conferncia: perce- be-se um certo enfraquecimento da vida crist no conjun- to da sociedade e da prpria pertena Igreja Catlica.43 c) Constatamos o escasso acompanhamento dado aos fiis leigos em suas tarefas de servio sociedade, particular- 41 Enquanto no perodo 1974 a 2004 a populao latino-americana cresceu quase 80%, os sacerdotes cresceram 44,1% e as religiosas s 8%. Cf. Annuarium Statisticum Ecclesiae. 42 Cf. Bento XVI, Discurso aos Cardeais, Arcebispos, Bispos e Prelados superiores da Cria Romana, quinta-feira, 22 de dezembro de 2005. 43 DI 2.
  51. 51. 56 CELAM mente quando assumem responsabilidades nas diversas estruturas de ordem temporal. Percebemos uma evangeli- zaocompoucoardoresemnovosmtodoseexpresses, uma nfase no ritualismo sem o conveniente caminho de formao, descuidando outras tarefas pastorais. De igual forma, preocupa-nos uma espiritualidade individualista. Verificamos, desse modo, uma mentalidade relativista no tico e no religioso, a falta de aplicao criativa do rico patrimnio que contm a Doutrina Social da Igreja e, em certas ocasies, uma compreenso limitada do carter se- cular que constitui a identidade prpria e especfica dos fiis leigos. d) Na evangelizao, na catequese e, em geral, na pastoral, persistem tambm linguagens pouco significativas para a cultura atual e em particular para os jovens. Muitas vezes as linguagens utilizadas parecem no levar em conside- rao a mutao dos cdigos existencialmente relevantes nas sociedades influenciadas pela ps-modernidade e marcadas por amplo pluralismo social e cultural. As mu- danas culturais dificultam a transmisso da F por parte da famlia e da sociedade. Frente a isso, no se v uma presena importante da Igreja na gerao de cultura, de modo especial no mundo universitrio e nos meios de co- municao social. e) O nmero insuficiente de sacerdotes e sua no eqitativa distribuio impossibilitam que muitssimas comunida- des possam participar regularmente na celebrao da Eu- caristia. Recordando que a Eucaristia faz Igreja, preocupa- nos a situao de milhares dessas comunidades privadas da Eucaristia dominical por longos perodos de tempo. A isso se acrescenta a relativa escassez de vocaes ao mi- nistrio e vida consagrada. Falta esprito missionrio em membros do clero, inclusive em sua formao. Mui- tos catlicos vivem e morrem sem assistncia da Igreja, qual pertencem pelo batismo. Enfrentam-se dificulda-
  52. 52. 57VCONFERNCIAGERAL DO EPISCOPADO LATINO-AMERICANO E DO CARIBE- aparecida -DOCUMENTO FINAL des para assumir a sustentao econmica das estruturas pastorais. Falta solidariedade na comunho de bens no interior das igrejas locais e entre elas. Em muitas das nos- sas Igrejas locais no se assume suficientemente a pasto- ral penitenciria, nema pastoral de menores infratores e em situaes de risco. insuficiente o acompanhamento pastoral para os migrantes e itinerantes. Alguns movi- mentos eclesiais nem sempre se integram adequadamen- te na pastoral paroquial e diocesana; por sua vez, algumas estruturas eclesiais no so suficientemente abertas para acolh-los. f) Nas ltimas dcadas, vemos com preocupao, por um lado, que numerosas pessoas perdem o sentido transcen- dental de suas vidas e abandonam as prticas religiosas; e, por outro lado, quesignificativo nmero de catlicos esto abandonando a Igreja para entrar em outros grupos religiosos. Ainda que este seja um problema real em to- dos os pases latino-americanos e caribenhos, no existe homogeneidade no que se refere a suas dimenses e sua diversidade. g) Dentro do novo pluralismo religioso em nosso continen- te, no se tem diferenciado suficientemente os cristos que pertencem a outras igrejas ou comunidades eclesiais, tanto por sua doutrina como por suas atitudes, dos que fazem parte da grande diversidade de grupos cristos (in- clusive pseudo-cristos) que se tm instalado entre ns. Isso porque no adequado englobar a todos em uma s categoria de anlise. Muitas vezes no fcil o dilogo ecumnico com grupos cristos que atacam a Igreja Cat- lica com insistncia. h) Reconhecemos que, ocasionalmente, alguns catlicos se tm afastado do Evangelho, o qual requer um estilo de vida mais simples, austero e solidrio, mais fiel verdade e caridade, como tambm nos tem faltado valentia, per- sistncia e docilidade graa de prosseguir, fiel Igreja
  53. 53. 58 CELAM de sempre, a renovao iniciada pelo Conclio Vaticano II, impulsionada pelas Conferncias Gerais anteriores, e para assegurar o rosto latino-americano e caribenho de nossa Igreja. Reconhecemo-nos como comunidade de pobres pecadores, mendicantes da misericrdia de Deus, congregada, reconciliada, unida e enviada pela fora da Ressurreio de seu Filho e pela graa de converso do Esprito Santo.
  54. 54. SEGUNDA PARTE A VIDA DE JESUS CRISTO NOS DISCPULOS MISSIONRIOS