David Bordwell Estudos de Cinema Hoje e as Vicissitudes Da Grande Teoria

download David Bordwell Estudos de Cinema Hoje e as Vicissitudes Da Grande Teoria

If you can't read please download the document

Transcript of David Bordwell Estudos de Cinema Hoje e as Vicissitudes Da Grande Teoria

  • especialmente as propostas por pensadores britnicos, bem mais amigvel para o pblico usurio do que a teoria da posio-subjetiva. Ante wn a escolha forada, quem no iria preferir a leitura de Raymond Williams de lacan, ou a de America de Baudrillard Rvolution dulmrguage potique de Kristeva? A proximidade do culturalismo ao "comentrio cultural", do modo que prati-cado no jornalismo e no ensasmo beletrstico, o toma atraente e acessvel, facilitando enormemente o seu ensino.

    A teoria da posio-subjetiva e o culturalismo se apresentam ambos como doutrinas criticamente engajadas: desmistificando as relaes de poder mani-festadas na mdia popular, pretendem contribuir para a destruio de forma-

    es sociais consideradas injustas. Mas os adeptos dos estudos cu lturais po-dem com certeza, a proposio de uma poltica mais prtica. Na verdade, pode-se acusar os tericos da posio-subjetiva de pessimjstas de esquerda. Para os proponentes da teoria dos anos 1970, todo e qualquer esfor-o no sentido da transformao soda! deve obrigatoriamente levar em conta os meios pelos quais os sistemas semiticos tm" desde sempre" produzido

    sujeitos submissos. Assim, por exemplo, as feministas tiveram de direcionar

    seus esforos no sentido de compreender como, dentro do patriarcado, as iden tificaes imaginrias mantm a diferena sexual. Foram foradas a a do-

    tar os sexistas Freud e Lacan, de forma estratgica, como analistas do patriar-cado. Essa teoria, elaborada na esteira das batalhas perdidas dos anos 1960,

    era mais diagnstica do que prescritiva.19 Surgiu num perodo em que expli-car por que as revolues fracassavam era muito mais importante do que mostrar como a revolta bem-sucedida poderia ocorrer.

    Os estudos culturais, embora tambm se comprometam com a transfor-mao social, oferecem um programa mais positi,o. As atividades cotidianas

    das pessoas comuns so mostradas como negociaes complexas com as foras que elas enfrentam. Esse pblico, em sua estratgia de apropriao de textos populares, considerado mais capaz de ao contrtio do que se poderia espe-rar, do que os prprios acadmicos, confinados a seus livros e bibliotecas. Alm disso, enquanto a te01ia da posio-su bjetiva exibe wn insu pcrvel rano elitista,

    o culturalismo , ao menos em muitas variantes, orgulhosamente populista.

    " Ver, por exemplo, Keith Rcade r, alld 1/ze Lt!ft iu Fra11ce >illce 1968 (Nova York: S t. Marl in's, 1987), pp. 3943; Sunil Jlutimz lize llltellectunl u{l ;, Po>tt!'nr Frnnce (New Havcn: Vale Universzty Press, 1993), pp. 1091 17; c Tony judt, Marxz::m mrd lhe French uft: Studil'o !lll J..obour a11d Politic:< i11 Fro11u, 18.10-1981 (Oxford: Clarendon Press, 1986), pp. 192-196.

    38

  • Estudo:; de ciucnrn loje e a$ icis.itudes dn graude l>ria

    Para muitos dos praticantes deste ltimo, o engajamento politico por intenn-

    dio de filmes de vanguarda bem mais improvvel do que explicaes mais

    realistas e concretas de como as "pessoas reais" lem os meios de comunicao

    de massa. No h dvidas de que o cu! ruralismo proporcionou aos acadmicos de comunicao uma sensao de fortalecimento. Por meio do estudo de filmes

    e de programas de televiso, seria possvel contribuir com as lutas polticas dos

    menos privilegiados.

    O culturalismo tambm atraiu seguidores por uma razo bem mais sim-

    ples. Por volta de meados dos anos 1980, a teoria da posio-subjetiva se tor-

    nara estril pela repetio. Ela susten tava que mecanismos nada bvios -

    semiticos, ideolgicos e psquicos- produziam efeitos especficos. E apre-

    sentava um conjunto restrito de causas ou funes: determinado filme ou

    programa de televiso invariavelmente convertiam o imaginrio em simbll-

    co ou posicionavam o indivduo como sujeito do saber e do desejo. O resto era reduzido a detalhe. A maioria dos cultura!istas se contrape a esse meca-nismo explicativo "totalizante".

    O sucesso do culturalismo decorreu em parte de sua tendncia a expli-

    caes mais abertas, dispersas e no-lineares que s dos tericos da posio-subjetiva. Um grande culturalista observa que a teoria "conceptualiza a cultu-

    ra como inseparvel das diversas prticas sociais; essas prticas, por sua vez,

    surgem como uma forma comum da atividade humana: uma prx:is humana concreta, a atividade por meio da qual homens e muJberes fazem histria" .20

    Uma tal amplitude no apenas oferece ao culturalismo um objeto de estudo

    em grande escala, assegurando sua condio de grande teoria, como tambm proporciona ao critico, terico ou historiador uma enonne variedade de ma-

    teriais para pesquisa ao proceder a estudos de caso ou investigao de micro-histrias.

    Por exemplo, outro autor suger-e que se pense no em termos deste ou

    daquele filme, mas de um "acontecimento" cinematogrfico- o conjunto das instituies, textos, atividades e agentes relacionados com o cinema. Tanto a produo como a recepo cinematogrfica abrem-se "sobre um espao cul-

    tura~ infinito[ ... ] O acontecimento cinematogrfico constitudo por um per-manente intercmbio, que no comea nem termina em nenhum ponto es-

    Stuart Hall, "Cultural Studies: Two Paradigms", em Richard Collins et ai .. Media, Culture, nml Soety: a Critcal Rtader (Londres: Sage, 1986), p. 39.

    J9

    Maler~al co11"

  • Cogl!ilil>ismo e filosrfia allalitica

    pecfico".~1 A idia de "intercmbio", no caso, parece incluir causa, efeito, fun-o e objetivo. Essa perspectiva, entretanto, pode ser criticada por apenas

    reapresentar o trusmo humanista, que nada acrescenta, de que tudo se conecta com tudo o mais. Embora tenha a vantagem institucional de validar uma

    imensa gama de projetas de pesquisa. Os cultura listas, na prtica, limiltam os seus projetos- em especial, por

    meio da utilizao das categorias raa/classe/gnero como uma heurstica para

    classificar fatores causais, ou por meio da aplicao tcita de principias intui-tivos de explicao funcional. Mas uma das razes do aspecto pluralista dos

    estudos contemporneos de cinema que o culturalismo permite que se estu-dem quase todos os perodos e que se descubra, em cada um deles, uma diversidade de coisas. Essas revelaes- casos curiosos ou divertidos; opinies

    inesperadas de agentes histricos ingnuos; exemplos de espetculos margi-

    nais, de resistncias anti-hegemnicas, dos choques da modernidade- trans-piram um charme que a teoria da posio-subjetiva, mais asctica e centrada no texto, no possua.

    Continuidades: as premissas doutrinrias

    Existe ainda outra razo para a conquista de tantos adeptos por parte

    das correntes do culturalismo, e interessante que se possa investig-la em profundidade. O culturalismo prontamente considerado como uma clara ruptura com a teoria da posio-subjetiva, em razo das expltitas

    discordncias que com ela mantm. Mas a corrente culturalista atraiu segui-dores tambm, porque, em muitos aspectos, d seguimento ao programa

    da teoria da posio-subjetiva. Obviamente, muitos acadmicos que hoje praticam a teoria e a inter-

    pretao cultural.ista eram antes partidrios da teoria da posio-subjetiva.

    "Estou migrando para os estudos culturais" virou um clich das salas de con-vivncia dos congressos. de esperar, por isso, a existncia de certas continui-dades entre as duas perspectivas. Quando um acadmico modifica suas opi-

    nies, no costuma revisar por completo as suas convices. Uma corrente

    ~ Rick Altman, "General lntroduction: Cinema as Event", em Rick Altman (org.), Sound Tl1e0ry and Proclice (Nova York: Rouiledge, 1992). p. 4.

    40

    Malenal corl"

  • Estud(>.' de cinema hoje e as rki,~

  • Coguititi~mo e' filow.fia auallirR

    ralmente construda, ento todo o pensamento e todos os costumes sociais so indefinidamente variveis e, por isso, de alguma maneira arbitrrios.

    Uma verso forte do construtivismo cultural, no entanto, termina por se auto-refutar. Se todos os sistemas de pensamento so construidos cultural-mente, tambm o a prpria teoria da construo cultural. Como ela pode, ento, reivindicar que suas descobertas sejam mais confiveis ou vlidas do que as de qualquer outra teoria? E mais: como um intelectual pode afirmar que as atividades dos outros so culturalmente construdas, e colocar-se em uma posio que pretensamente escapa a essa condio? Um raciocnio para-lelo envolve uma outra clusula relativista. Se as crenas so relativas a deter-minadas culturas, ento podemos dizer que a crena no relativismo relativa nossa cultura. Sendo assim, ento o relativismo no pode pretender que sejam verdadeiras as suas descobertas a respeito das crenas, relativas ou no, de outras culturas. At onde eu saiba, nenhum terico do cinema examinou essas autocontradies que assolam a premissa construtivista radical.

    Um construtivismo radical tambm limitante do ponto de vista emprico. Em nossa explicao da ao humana, as regularidades univer-

    sais, ou transculturais, podem ter importantes papis. Talvez os acadmicos ignorem as caractersticas transcultu r ais do cinema por temer que isso ve-nha a envolv-los, obrigatoriamente, com causas biolgicas ou "essencialistas". Mas essa preocupao no tem nenhum fundamento. E uma ironia que a maioria dos acadmicos da rea de cinema, que nutrem, como a maior par-te dos humanistas, uma suspeita profunda para com as cincias sociais, na verdade compartilhem com muitos d os cientistas sociais a crena de que o comportamento do ser humano quase que inteiramente determinado pelo seu meio. A conseqncia dessa premissa o exagero das diferenas entre indivduos, grupos e culturas, e uma tendncia a evitar a investigao de possveis reas de convergncia.'IJ

    2. Compreender como os espectadores interagem com os filmes requer um.a teoria da subjetividade. A idia de que o indivduo construdo como sujeito,

    Sobre esse assunto ver, do autor. o ensaio .. Convention, Construction, and Cinematic Vision". em David Bordwell & Noel Carroll (orgs.), Po>tTheory: Reconstructing Film Studirs, cil.). (N. do 0.)

    " Para uma d iscusso detalhada do modelo da plasticidade humana das cincias sociais, ver John Tooby & Leda Cosmides, "The Psychological Foundations of Culture", em jerome H. Barkow rt ai. (orgs.), Tire Adaptrd Mirrd: Et

  • E.:otudo .. .:: de nema lwjt e a!> t>icis:;iludeo da grandt tl'(Jria

    tanto social como epistemicamcnte, central para a "teoria do cinema de 1975". O sujeito, obviamente, cumpre um papel no sistema social- trabalha-dor, proprietrio, intelectual-, e a "posio" do sujeito pode ser entendida em sua relao com a luta de classes. Mais radical a tese de que o sujeito construdo como uma entidade formuladora de saber diante de uma realida-de supostamente objetiva. Tomar-se sujeito, dentro dessa perspectiva, ad-quirir a capacidade para viver experincias e sustentar crenas.

    O alvo, aqui, o chamado sujeito cartesiano, concebido como o lugar plenamente consciente de um conhecimento inquestionvel. Lacan sustentava

    que o ego cartesiano fora produto de um momento histrico especifico, e que fora desafiado pela descoberta freudiana do inconsciente. Freud, por sua vez, demonstrou que o ego (moi, ou "cu") era obtido somente por meio da repres-so. Para articular essa tese no plano filosfico, Lacan "ontologizou" Freud tra-tando o ego no como uma simples articulao psquica, mas como um elemen-to da categoria filosfica do sujeito.24 A subjetividade, produzida dentro da relao estabelecida entre as pulses e os domnios do imaginrio e do simbli-co, seria uma precondio para a atividade psquica, e, nesse sentido, uma precondio em conflito. O ego, como agente consciente unificado, seria ape nas uma parte do sujeito" dividido", fundado sobre uma falta fundamental.

    Althusser, logo a seguir, afirmou que certas instituies sociais (apare-lhos ideolgicos do Estado) elaboram ideologias que constroem e mantm um sentido de unidade e de conscincia subjetivas, reproduzindo, assim, a crena na unidade do ego e na possibilidade deste agir voluntariamente. A ideologia, portanto, se manifesta por intermdio dos sistemas de representa-o que "posicionam" os sujeitos. E a representao constri o prprio funda-mento do saber e da experincia.

    Pode at parecer curioso que o culturalismo seja herdeiro de uma com- r 1, binao to esotrica entre filosofia anti-racionalista, psicanlise no-ortodoxa e as p erspectivas sempre em transformao de um filsofo oficial do Partido

    21 "A expenncia psicanaltica ocorre integralmente na r~lao de sujeito para sujeito, significando, na verdade, que ela ret6m uma dimens.'io que irredutvel a qualquer psicologia considerada como uma objetificao de certas propriedades do tndivduo, citado em Bice Bcnvenuto & Roger Kennedy, Tire Wc>rk; of facque~ Lacau: au lnlrodurticm (Nova York: St. Ma rtin's, 1986), p. 101. Sobre a reflexo a um s tempo filosfica e psicolgica de Laca n em torno da subjetividade, ver o excclc"lc livro de David Macy, Laca" in Cnlexl$ (Londres: Verso, 1988), pp. 89-93. Na rea dos estudos de cinema, Noel Carroll foi, creio eu, o primerro a ~usten tar que a$ proposi

  • Comunista Francs. Mas o tema do sujeito persiste. Isso ocorre, em grande parte, porque a maioria dos tericos faz equiYaler as categorias do sujeito e do 'indivduo. Para os adeptos puristas da teoria de 1975, o sujeito uma categoria que possibilita a existncia do conhecimento, da identidade e da experincia

    dentro de prticas significantes-ainda que esse conhecimento seja ilusrio e que essa experincia se funde sobre a represso ou a regresso. O sujeito o fw1damento que torna possvel o sentido, a diferena e o prazer. A pessoa ou individuo, enquanto isso, uma entidade capaz de alcanar a condio de sujeito25

    Porm, difcil encontrar essa viso rigorosa mesmo nos escritos da teoria de 1975. O prprio termo posio-subjetiva levou muitos autores a tratar o sujei-to como um agente - voc, eu, um personagem, a cmera- capaz de ocupar um lugar. Ao mesmo tempo, as peculiaridades da sintaxe, que fazem do sujeito epistmico ou psicanaltico tambm o "sujeito" de uma orao, sugerem que o sujeito possa ser um agente individualizado. Desse modo, em toda a teoria da posio-subjetiva pode-se identificar uma confuso entre o sujeito entendido

    como o fundamento fi Iosfico/psicanaltico/ideolgico do conhecimento e das experincias e o sujeito entenctido como algum que conhece a experincia- o

    autor, o personagem, o analista, o terico ou qualquer outro agente personifica-do. K.aja Silverman, por exemplo, afirma que "o sujeito determinado pelos significantes", para logo a seguir sustentar que "as conexes produtoras de sen-

    tido so realizadas to-somente na mente do sujeito" _z, Tambm os escritos cu lturalistas so fundamentados pela noo de su-

    jeito-como-indivduo. Por exemplo, um crtico declara que Salaam Bombay! trabaJha para "produzir o sujeito indiano confom1e o que ditado pelos cdi-gos de representao do Ocidente" Y Em seguida, passa a in\estigar como os personagens e seu mundo so representados. Da mesma forma, Thomas

    " Steprnen Heath se posiciona contra a equivalncia en tre sujeito e indivduo em "Thc Tum of the Subject", em Cint-Tracl>, 3-4 (2), vero/ou tono de 1979, pp. 33-36. interessante que ele credi te a origem da confuso a i\lthusser. Ela pode ser encontrada tambm em Lacan. que explora um equfvo co: a concepo psicanaltica tradicional do sujeito como a pessoa sob tratamento sobreposta ao sentido filosfico do sujeito como forma de conscincia ou entidade pensante.

    "' Kaja Silverman, The Sllbject of Semiotic> (Nova York: Oxford, 1983), p. 19. Produo btitnicoind .iana de 1988, com dire.o de Mira Nair (N. do 0 .). " Poonam Arora, "The l'roduction of Third World Subjects for Firsl World Consump tion: Salaam

    Bombny and Pnramn", em Diane Carson el n/. (orgs.), Multiple Vt>ice> in feminis/ Film Criticism (Minneapol is: Universi ty of Minnesota Press, 1994), p. 294.

    44

  • [$lUdo;; de cinema hoje e IIS tcsstudes da grande teora

    Waugh sugere que no cinema gay possvel localizar um "sujeito invisvel" por trs da cmera - o produtor e o espectador- e ainda "sujeitos visveis" em personagens-tipo que representam personagens homossexuais (travestis, afennados, artistas, etc.). 28 A concepo culturalista do sujeito, no plano te-rico, tem se mostrado surpreendentemente "cartesiana" ou mesmo pr-cartesiana. 2'!

    Ao tratar os sujeitos como indivduos conscientes, que assumem papis, os culturalistas reafirmam um elemento central de sua teoria: a liberdade do agente social. O terico ps-moderno Jim Collins, por exemplo, alega que:

    [ ... ] a atividade rlo sujeito to importante quanto a atividade sobre o sujeito, embora concepes anteriores do suje ito tenham destacado to-somen te

    esta ltima. Diante do bombardeio de mensagens conflitantes, o sujeito indi-

    vidual deve se empenhar em processos d e seleo e organizao."'

    Um purista da teoria da posio-subjetiva-se que eles ainda existem -retrucaria que, somente se algum j estivesse posicionado como um sujeito da ideologia- ou seja, j constitudo como uma instncia da experincia cons-ciente - poderia selecionar, compreender e organizar as mensagens a ele dirigidas. Por fim, um crtico que fosse indiferente a qualquer das duas con-cepes do sujeito afirmaria, simplesmente, que a idia de que o agente exer-ce a escolha dentro de certos limites que lhe so impostos nada mais que um trusmo da teoria sociolgica.

    3. A recepo espectatorial do cinema funda-se na identificao. Para o te-rico da posio-subjetiva, isso implica o entendimento de que toda a comuni-cao, por ser uma interao entre o sujeito e o outro, pressupe um elemento como a identificao para que se possa verificar. Isso ocorre tanto na lingua-

    " Thomas Waugh, "The Third Body: Pauerns in lhe Construction or the Subjecl n Gay Male Narra tive Film", em Martha Gever et a/. (orgs.), Queer LDoks: Perspeclt>es 011 usban a11d Gay Film and Video (Londres: R ou lledge, 1993), pp. 141-161.

    " De acordo com um popular manual de estudos cullurais, o sujei lo "o sujeito pensante; o lugar da conscincia"; a conscincia, por sua vez, defin ida como "conscincia de si tuaes, imagens, sensaes ou memras" (Tm O'Sulliva n et ai., Key Concepls, cit., pp. 57, 309). Ou tro terico britnico define os estudos cullurais como contemplando "as formas histricas de conscincia ou subjetividade" (Richard johnson, "The Story so Far: and Furthe r Translormalons?", em David Punler (org.). lnlroduction lo Conlemporary Cullural Studl'es (Londres: Longman, 1986), p. 280).

    " Jim Coll ins, Uncommon Culturt$: Popular Cullure and Po;:t-Modemism (Londres: Roulledge, 1989), p. 144.

    45'

    M aterrai com direttos autorais

  • gem como na percepo. Lacan ressai ta que a identificao a base da subje-tividade, visto que o "eu" apreendidlo apenas no outro e atravs dele. A fase do espelho, em que a criana fonna uma primeira verso do ego por meio da viso do seu reflexo, o primeiro passo rumo a essa identificao fundada sobre o outro. Baseando-se em Lacan, a teoria do cinema de 1975 sustentava que os regimes de sentido socialmente estruturados, conhecidos como o do-mnio do simblico, reforam e regulam a identificao imaginria. Na dou-trina althusseriana, a ideologia constri o sujeito como um lugar de ininteligibilidade, por meio de uma "interpelao" ou convocao ("Ei, voc!") e de uma simultnea naturalizao daquilo que representado.

    Segundo essa perspectiva, os sistemas pictricos interpelam os sujeitos organizando a viso de modo que se produza um "olhar" transparente e no-problematizado. Essa percepo em estado puro constitui a origem da iluso do sujeito perceptivo que os estruturalistas acreditam ser exaltada nas filoso-fias idealista e fenomenolgica. Na verdade, porm, uma tal subjetividade seria homloga identificao e ao falso reconhecimento imaginrio identificados por Lacan na fase do espelho. essa identificao imaginria com uma instn-cia de coerncia que garante a iluso de realidade e a presena plena do sujeito.

    Supe-se, portanto, que o "posicionamento" subjetivo que o cinema produz seja fundado sobre uma srie de identificaes - com personagens, com a cmera, com um sujeito transcendental ou mesmo com uma posio subjetiva unificada. No limite, o que est implicado na concepo metziana de" enunciao" filmica a tese de que, ao identificar-se com a llistore flmica, e no com o discours enunciatrio, o espectador vive a iluso de estar, na verdade, criando o filme. Assim comenta uma psicanalista feminista: " mui-to mais fcil para o espectador de um filme pensar que est produzindo as imagens na tela do que para o leitor de uma fico literria pensar que est criando o texto".31 Em toda a teoria da posio-subjetiva, a identificao compreendida nesse limite extremo e dessa forma extremamente implausvel. (Os espectadores no gastariam seu dinheiro para ir ao cinema, se acreditas-sem ser realmente capazes de produzir imagens cinematogrficas.)

    J para o adepto dos estudos rulturais, a identificao um conceito bem mais simples e direto. Por meio da observao de caractersticas como as

    Em francs no origi nal (N. do 0.). " E. A.Jm Kaplan, " lnlroduclion: From Plalo's Cave lo Freud's Screen", em E. Ann Ka pla n (org.),

    P$yc/JCJ

  • E~tudetS de ci11emn hoje e trs t1iri~situtles dn grande teoria

    de raa, dasse, gnero ou outras categorias subculturais, o espectador se iden-

    tifica com as figuras na tela ou coo1 os compromissos culturais articulados

    pelo filme. John Fiske, por exemplo, sugere que certas mulheres, ao assisti-

    rem a filmes com personagens femininos, estabelecem com estes uma identi-

    ficao ativa. Em um processo como esse, o espectador se empenha em" com-

    p lementar o significado do personagem ou do acontecimento com base no conhecimento que tem de si mesmo. O espectador menos um sujeito da

    ideologia dominante, e mais um agente no controle do processo de identifica-o, regulando sua prpria produo de sentidos" .32 Uma vez mais, o sujeito do no au to-reconhecimento da teoria do cinema de 1975 converte-se em um

    agente social ativo e autoconsciente.

    A noo de identificao, herdada da crtica cinematogrfica anterior

    (os crticos da linha autoral mostravam como Hitchcock nos fazia "identifi-car" com os seus personagens), permanece obscura tanto no trabalho da po-

    sio-subjetiva como na abordagem culturalista. Eu assisto a um filme. Se eu simpatizar com um personagem, ou sentir empatia por ele; se eu enxergar as

    coisas pelo seu ponto de vista, ou adivinhar os contedos de sua mente, ou

    compartilhar de seu conhecimento, ou concordar com suas atitudes, juzos e valores; se eu imaginar o que faria em seu lugar, ou justapuser suas idias e as

    minhas, ou desejar, simplesmente, por razes minhas, que ele tenha sucesso-

    em todos esses casos o crtico dir que eu me identifico com o personagem. Algum poderia argumentar - e assim o fizeram Noel Carrol! e Murray Smith -que ao abranger uma variedade to grande de casos o conceito faz-se vago e

    duvidoso.33 No h por que esperar que todas essas atividades espectatoriais tenham causas ou funes semell1antes.

    Recentemente, algumas tericas feministas se basearam no conceito

    freudiano de fantasia para propor a idia da multiplicidade da identificao. Em razo dessa multiplicidade que os homens podem se identificar com os perso-

    nagens femininos, ou as mulheres com os masculinos, ou os humanos com os animais, etc.34 Mas a conduso derivada do senso comum no resolve de modo satisfatrio a questo terica - alm de no constituir novidade alguma para a

    " John Fiske. Teletision Culture (Londres: Me thuen., 1987), p. 171. " Ver Noel Carrol L T/!e Plrilosnph.v of Horror; or, Paradoxes of tlw Heart (New York: Routledge, 1990), pp.

    88,96 !edio em portugus: A filorofia do horror ou paradoxc>s do corai!o (Campinas: Papirus, 1999)]; e Murra y Smith, Engagi11g Clwrarters (Oxford : Oxford University l'ress, 1995).

    ' ' Ver Elizabeth Cowie, "Fan tas ia", em MJF. n 9, 1984.. pp. 70-71.

    47

    Material com direitos autorais

  • Cognilhismo

  • EstudO!I de cinenro hoje e as etS in Cultural Studies, 1972-79 (Londres: Hutchnson. 1980), p. 129.

    " Jbid., p. 132.

    49

    Material com direitos autorais

  • , F

    ..

    Apesar das trs dcadas de trabalho na semitica do cinema, os

    postulantes do cinema como um conjunto de" cdigos" ou" discursos" ainda no conseguiram apresentar uma defesa razovel de por que se deveria consi-derar o meio cinema- para no mencionar a percepo e o pensamento - um anlogo plausvel da linguagem.

    Continuidades: os raciocnios rotineiros

    No so apenas essas premissas doutrinais que estabelecem a continui-dade entre a teoria da posio-subjetiva e o culturalismo. Eu diria que pelo menos quatro protocolos de produo terica- no "mtodos", mas hbitos mentais, rotinas de raciocnjo - tambm percorrem os estudos de cinema das ltimas trs dcadas.

    1. A investigao de cabea pm'a bnixo. A maioria dos tericos con tem-porneos do cinema parece entender que a teoria, a crtica c a pesquisa his-trica devem ser orientadas pela doutrina. Nos anos 1970, uma das precondies para que uma formulao fosse considerada vlida era a de

    que estivesse alicerada em uma teoria explcita da sociedade e do sujeito. A ascenso do culturalismo veio intensificar essa demanda. Em lugar de for-mular uma questo, articular um problema ou deter-se sbfe um filme in-trigante, o objetivo central estabelecido pelos autores outro: o de compro-var uma posio terica oferecendo filmes como exemplos. Da teorja, o autor se move para o caso particular. Concepes feministas do corpo no cinema; anlises lvi-straussianas do western; relatos jamesonianos da ps-modernidade de Blade Runner, o caador de andrides (Ridley Scott, 1982) a

    pesquisa sistematicamente entendida como a "aplicao" de uma teoria a um filme ou a um perodo histrico especficos.

    A dificuldade aqui que, da mesma forma como "uma andorinha no faz vero", um caso isolado no pode estabelecer uma teoria. Ao projetar-se a teoria sobre dados primrios, estes se transformam em mero exemplo ilustrativo. Pode haver fora retrica no resultado, mas fontes primrias mui-tas vezes invalidam teorias e um exemplo nico no cria evidncia suficiente.

    As fon tes a que recorre a investigao "de cabea para baixo", desde o final dos anos 1960, pe1manecem surpreendentemente consistentes. Os livros c revistas, seminrios e simpsios que disseminaram a semitica, o cstruturalis-

    50

  • ( {frlf'of ' I

    E

  • Cvgniti1,:mo Jila::11Jia nua/itica

    investigao de motivos autorais recorrentes, tivesse como objetivo a dernons-trao de uma teoria da significao ou do inconsciente.

    Com o culturalismo, a ligao s idias francesas tem prosseguimento. A linha ps-modema reconhece o dbito para com Lyotard, Baudrillard e outros. Os autores sob a influncia do Centro de Bim1ingham recorrem com determinao a Foucault e a Bourdieu. E mesmo a linha frankfurtiana, de certo modo oposta francofilia, conhecida pela assimilao de aspectos da teoria francesa.

    Ser preciso lembrar que a vida intelectual francesa estimula suas cele-bridades a a dotarem posies controversas, por vezes at mesmo caricatas, e sujeitas a imprevisveis reviravoltas? De modo geral, o pensamento humanstico francs muito mais dominado pelo modismo e pela celebrizao de seus expoentes do que o dos pases de lngua inglesa. Sem nenhuma ironia aparen-te, um semanrio parisiense dirigido a um pblico mdio pode muito bem lanar uma edio especial intitulada "O pensamento francs hoje", estam-pando em sua capa uma foto do pensador de Rodin debruado sobre a pir-mide do Louvre, e anw1ciando artigos como "As palavras-chave", "As escolas e crculos", "Os novos temas", "Quem pensa o qu?" e "Quem quem nos 45 nomes de ponta" .40 Um socilogo observou, certa vez, que essa pomposa e narcisstica frivolidade precisamente o resultado das circunstncias sociais nas quais se realiza o trabalho intelectual na Frana.41

    O apelo to freqente teoria continental implica ainda o problema da incompetncia involuntria. So poucos os acadmicos da rea de cinema a dominar as lnguas europias em que esses tericos escrevem, e por isso os estudos contemporneos de cinema dependem enormemente de tradues. Mas a sociologia e a psicologia alems do cinema, a teoria do cinema do Leste Europeu, e as semiologias italiana e escandinava permanecem sem traduo, e por essa razo os estudos de cinema anglo-americanos contemporneos pou-co se detm sobre elas. Comparados a outras disciplinas acadmicas, os estu-dos de cinema se mostram extremamente provincianos.

    Mesmo com respeito s bibliografias mais traduzidas se verificam defa-sagens surpreendentes. Os estudos de cinema no podem ser acusados de

    Em L'ltnmrnt, n 201, 814 de seten~bro de 1988. Por s inal, a lista dos 45 " leading men (chefo de file) inclui apenas uma mulher: Franoise Dolto, lembrada por seu trabalho em psicanlise infantil.

    " Ver Raymond Boudon, "Thc FreudianMarxianStructuralis t (FMS) Movement n France: Va:riations on a 111eme by Sherry Turkle'", em Tire Tocqllftllle Re11iew, 2 (1), inverno de 1980, pp. 523.

    52

    Malcnal CDIT' direitos autorais

  • E. ticis.

  • Cogniliti.ical Repro du ction'", em Hannah Arendt (o rg .). lllumillnliOIIS, trad. Mary Sc:hnackenberg Cattani -(Amherst: Urversity of Massachusetts Press, 1990) !edio em poriUj,'lls: "A obra de arte na poca de suas tcnicas de reproduo'", em Walter Bna-min et ui., Ttxlo.< IO'COiiridO$, Coleo Os Pensador-es (So Paulo: Abril Cult ural, 1975)1. Benamin ci ta Rlegl e Wickhoff como tendo "chegado a co11d uses" sobre a organizao da pe rcepo no sculo V com base em algumns obras de arte. Isso no suficiente para sustentar a tese de Benamjn de que "no decorre r d os g randes pe rodos histricos. com relao ao meio de vida da s comun idad es humanas, v-se, igualmente, modficarse o seu modo de sentir e percebe r" (p. 14). O tcrn1o bricolagcm, do franc-s bricolagdbricolcr, j est no lxico portugus. Em seu sen,jdo estrito designa improvisao e preca riedade na fei tura d e pequenos trabalhos manuas (N. do 0 .).

    54

    Material com direitos autorais

  • Estudos dt C'int nra !lojt e as t1itissitudts da graHde troria

    e a uma infinidade de outros. Longe de ser um sistema coerente, essa teoria era uma miscelnea de idias, que podiam ser alteradas ou removidas quando

    "recentes progressos", como era costume chamar, as colocavam em questo. O resultado era o que Jonathan Re denominou a nouveau mlange.4S

    Embora os culturalistas por vezes ataquem fontes especificas da teoria

    da posio-subjetiva, o culturalismo to edtico quanto esta em sua inspira-o. Qualquer manual de estudos culturais oferece exemplos disso. Graeme

    Turner, por exemplo, apresenta uma bricolagem de Propp, Lvi-Strauss, Todorov, Mulvey e Will Wright, tratando as obras de todos esses autores como contribuies a uma perspectiva dos estudos culturais sobre narrativas.46

    O procedimento de Turner tambm emblemtico em um outro sentido. Ao construir sua teoria da narrativa, ele no menciona o fato de que Propp e Lvi-

    Strauss declararam serem suas teorias incomensurveis. Incompatibilidades como

    essa, porm, produzem um risco permanente de elaborao de snteses incoe-rentes. extremamente difcil tambm conciliar a insistncia de Lvi-Strauss nas categorias inatas do pensamento humano com a idia de que a subjetividade imposta a partir de fora. A reelaborao lacaniana da lingstica de J akobson, por

    sua vez, no mnimo to profunda como a reelaborao althusseriana de Lacan. E um termo retirado tradio formalista .russa pode ser encontrado lado a lado com uma invocao do conceito hegeliano do outro. Por fim, o olhar passa de Kojeve a Sartre, de Sartre a Lacan, e de Lacan teoria do cinema, retematizado a cada uma das vezes. 47 O risco de extrair, seletivamente, elementos de teorias dis-

    tintas que falte ao acadmico precisamente o conhecimento dos trechos de uma

    fonte que contradizem as proposies das outras. Mas esse ecletismo apresenta seus limites- dentro do esprito da teoria

    da posio-subjetiva, isso poderia ser considerado o seu recalcado. O marco terico do posicionamento-subjetivo mostrava uma intensa seletividade- na verdade, arbitrariedade- na composio de suas teorias. costume entre os acadmicos do cinema valer-se de Althusser em funo de sua anlise dos aparelhos ideolgicos de Estado, ignorando, porm, seu projeto de demarca-

    " jonathan Re, "'Marxist Modos"', em Radical PltiiO$Oplly Rtada (Londres: Verso, 1985), p . 338. " Craeme Turner, Flm a$ Social Pradice (Lond res: Rou tlcdge, 1993). pp. 6793. " Para uma d iscusso detalhada de como o olhar foi repensado, ver Martin )ay, Downcast Eyes: tl!e

    Dmigration of Vision in Twenlietlr-Century Fmrdr Tlrougtrt (Berkeley: Unve rs il) of Califomia Press, 1993), capihr los 5-7. O capitulo 8 examina a apropriao seletiva de Lacan realizada pelos tericos do cinema franceses.

    55

    M ateria! com direitos autorais

  • Coguithi>m ~ jilrN.>fiA analtica

    \ o de uma "cincia". Os tericos fazem uso das intervenes de Lacan ares-peito do imaginrio e do simblico, permanecendo ignoradas suas discusses sobre o Real, para no mencionar suas desconcertantes incurses na topologia e na teoria do n.4s

    Tambm surpreende que esses mesmos tericos, que atribuem lin-guagem um papel to central na determinao da subjetividade, tenham ig-norado quase que por completo os dois mais importantes desenvolvimentos contemporneos da teorialingstica: a gramtica generativa transformacional e a teoria dos princpios e parmetros, de Chomsky. O silncio claramente estratgico. 01omsky sustenta que, nos seus aspectos mais relevantes, a es-trutura da linguagem biolgica, e que os aspectos centrais da linguagem envolvem no variaes culturais, mas regularidades universais. No seria correto pensar que a linguagem impe uma noo de subjetividade cultural-mente construida sobre o indivduo biolgico, caso houvesse boas razes para compreender a estrutura lingstica como parte da dotao biolgica huma-na. J>orm, nenhum terico do cinema jamais apresentou uma explicao so-bre por que as teorias de Saussure, mile Benveniste ou Bakhtin - comparati-vamente mais informais - so superiores ao paradigma chomskiano.49 Por mais de duas dcadas, os tericos do cinema tm se manifestado a respeito da linguagem sem se ocupar de seu maior rival terico na rea.

    3. O raciocfnio associativo. Guy Rosolato, um terico da psicanlise, con-versa com Raymond Bellour, um terico do cinema. Rosolato observa que, para falar em detalhe a respeito de um filme, seria preciso analis-lo congelan-do a imagem. Bellour responde: "Quer dizer que, se no pudermos re-ver um filme dessa forma, na prtica ele no existe?". Em seguida, Bellour comenta que certos processos formais do cinema despertam a emoo, apresentando o retrocesso como exemplo:

    Pouco importa o que o retrocesso de fato reconta, de sua natureza prduzir

    um choque emocional extremamente violento, pelo simples fato de remeter

    ao passado. Um amigo meu, certa poca, tinha uma relao um pouco per-

    " Ver, do autor, "H:is torio l Pue tics of Cinem~", cm R. Barton Pa lmer (o rg.), Tire Ciuematc Text: Melhnd$ and Approacllrs (Nova York: AMS, 1989), pp. 385392.

    '' Nessa linha, uma d ~~ poucas crticas teoria da posiosubjetiva foi a de Will1am Cadbury & Leland Poague, Film Critiet.

  • E...'tud~ de cinema llojr e a::: vicissitude:: da graude teoria

    turbada com o seu passado, e os retrocessos tinham sobre ele um efeito quase

    que automtico; pode-se diz.er que era a sua forma, em si, que o fazia chorar."'

    Presume-se que os interlocutores desse dilogo queriam ser levados a srio. (Afinal de contas, publicaram o dilogo.) Mas a discusso ininteligvel, porque as conexes entre as idias no satisfazem a nenhum padro de inferncia razovel. Rosolato afirma que, para que se possa discutir um filme com preciso, ele deve ser estudado cuidadosamente: que elementos isso for-nece para a estupenda concluso de Bellour de que, portanto, talvez o filme no exista? Bellour diz ter um amigo que chorava durante retrocessos; mas por que inferir disso que os retrocessos obrigatoriamente provocam violentas con-vulses emocionais em todos os espectadores?51

    Nesse dilogo, h uma verdadeira brincadeira de pegar, jogada com idias, e que exemplifica mais um dos hbitos mentais comuns nos estudos de cine-ma. Tanto os tericos da posio-subjetiva como os culturalistas demonstram um imenso pavor do raciocnio indutivo, dedutivo ou abdutivo, apelando a formas de associao livre surpreendentes.

    Como a anlise do fluxo de um .argumento exige um certo tempo, me limito a apresentar um exemplo ilustrativo. Joan Copjec inicia seu ensaio so-bre Pacto de sangue [Double lndemnity, Billy Wilder, 1945]52 afirmando haver "algo que no satisfaz" (p. 168) na invocao das estatsticas atuariais, feitas por Keyes, o investigador da companhia de seguros, para explicar por que ele duvida que Diedrichson tenha cometido suicdio. O espectador que no con-sidera problemtica a intuio de Keyes duvidar da tese inicial de Copjec, mas suponhamos que outros compartilhem da inquietao da autora. Ela pros-segue com as perguntas: "Por que um recurso estatstica considerado um raciocnio incontestvel? [ ... J Em ltima anlise, o que tm os nmeros a ver com a atividade de investigao?" (p. 168). As duas questes no so idnti-cas, porque a primeira diz respeito aos elementos de prova necessrios a um

    "' Raymond Bellour & Cuy Rosola to, "Dialogue: Rememberng (fhs Memory of) a Film", em E. Ann Kaplan (org.), Psychoarralysis and Cinema, cit., pp. 199. 212.

    ~ Talvez Rosolato d iscorde sutilmen te de Belloui, pelo estranho salto, ao responder: "O retorno ao passado tambm pode ser agradvel" (ibidenr). Se Rosolato estiver certo, algumas vezes a experin-cia dos retrocessos poderia ser agradvel - nes te caso, nada do que (oi dito entre ambos escla rece coisa a lguma.

    " "The Phenomenal Nonphenomenal: Private Space in Film Noir", em Joan Cop)cc (org.), S/JadtS of Noir (Londres: Verso, 1993), pp. 167-197. As pginas das citaes esto entre parnteses no texto.

    57

    Ma lena! com dire1tos autorais

  • raciocnio, enquanto a segtmda envolve uma gama bem mais ampla de rela-es possveis entre "nmeros" (c no apenas a estatstica) e "atividade de investigao" (e no um raciocnio). H wna associao de idias (estatstica ~ nmeros, raciocnio~ atividade de investigao) governando a interpretao do crtico.

    Copjec busca a resposta nas origens da literatura policial. (A razo pela qual a relao entre estatstica e raciocnio, ou entre nmeros e atividade de investigao, pode ser mais bem esclarecida por uma busca s origens no explicada.) Copjec prope "ligar" a literatura policial ao "advento do racionalismo" (p. 168). uma Ligao um tanto elstica, pois Copjec identifica o racionalismo com Descartes, morto em 1650, e a maioria dos historiadores localiza o surgimento da novela policial modema nos anos 1840. Alm disso, Descartes funda seu sistema em um mtodo puramente dedutivo, enquanto

    Sherlock Holmes e outros detetives empregam a induo (e no, como Copjec espantosamente declara, idias n priori, p. 169).

    Copjec constri ainda ou tra ligao - en tre o surgimento da literatura policial e uma produo sem precedentes de estatsticas, "uma avalanche de nmeros" (p. 169). Mas ela no estabelece nenhuma conexo causal entre a publicao dos contos de Poe e a descoberta dos mtodos estatsticos. Ela se baseia, em vez disso, em associaes metafricas. O advento das burocracias estatsticas criou" as naes modernas como grandes companhias de seguro" -uma "conexo" mnemnica com Pacto de sangue (p. 170). A estatstica tor-nou os cidados mais conscientes do grau de difuso do assassinato (outra ligao associativa com Pac/o de sangr~e) . E a estatstica fez com que se acredi-tasse na possibilidade de clculo do risco. Copjec conclui afirmando que a novela policial um produto do clculo estatstico. "A crena ficcional do s-culo XIX na possibilidade de soluo do crime foi uma expectativa estritamen-te matemtica[ ... ] Antes da estatstica a existncia desse tipo de expectativa era rigorosamente impossvel, e assim o era tambm, eu diria, a literatura polidal" (p. 170).

    No h linha alguma de racionio que no tenha sequer comeado a articular essa deslumbrante proposio. Ainda que a literatura policial hou-vesse- sido criada a partir dos procedimentos estatsticos, essa con tingncia no serviria de suporte inferncia de que a literatura policial antes disso fosse in1possvel (para no dizer rigorosamente impossvel). Como se isso no bastasse, quase nunca a literatura policial emprega o raciocnio estatstico. E,

    58

  • E.:~tudos de cinema hoje e''~ vicissitudts do gmndt toorio

    de qualquer maneira, h obras anteriores que tm como pressuposto que um crime passvel de soluo, como, por exemplo, The Strange Case of Oedipus Rex.53

    O artigo segue articulando conceitos, segundo esse modo associativo. A quantidade de nformaes oferecidas em uma novela policial motiva a con-

    vocao, pela autora, dos conceitos foucaultianos de vigilncia e poder disciplinador, os quais, por sua vez, conduzem a um estudo recente sobre o surgimento do romance realista. As conexes envolvem no a causalidade ou a conseqncia, mas a conotao e a semelhana. ("Neste ponto possvel observar uma certa similaridade entre o projeto racionalista e o do novo histericismo", p. 171). Copjec conclui que a atividade investigativa "verdadei-ramente constitui as pessoas com quem ela entra em contato". A literatura policial "ligada" ao clculo estatstico e, ao contar as pessoas, a estatstica "as criou. Devidamente categorizadas, as pessoas reais adquiriram existncia" (p. 171). Se a atividade investigativa e as categorias numricas so capazes de fazer as pessoas reais adquirirem existncia, as leis da gentica devem estar precisando de uma drstica reviso.

    O exemplo ilustra de forma modlelar como o raciocnio associativo da teoria contempornea do cinema capaz de criar toda uma bricolagem de paralelos, de saltos interpretativos e de concluses perspicazes, sem nenhuma fundamentao. Essa espcie de pensamento associativo combina perfeita-mente com o jogo de termos, de nomes e de referncias apregoado pela estra-tgia da bricolagern.

    4. O impulso hermenutico. O anseio por "aplicar" teoria, juntamente com a exigncia de que a teoria se mostre especfica e acessvel, estimulou os autores anglo-americanos interpretao de filmes como exemplos demons-trativos de categorias e de proposies tericas. Inmeros so os exemplos desse processo em ao. Desde os anos 1960, a interpretao tem se revelado central para estudos acadmicos de cinema, e tanto o trabalho terico como o histrico tm estado subordinados a ela. Hoje, como na poca da teoria do autor, e mesmo antes dela, a maior parcela dos estudos de cinema composta do comentrio crtico a respeito de filmes especficos.

    " Embora a novela policial modtmo surja com Poe, h toda uma srie de antigos en igmas envolvendo a soluo d e crimes. Alco> do dipo, h tambenn os contos de Bel e de Susanna nas Escrituras Apcrifos. Ver Dorothy L. Sayers (org. ), TIJe Omnibu; of Crimt (Gardcn Ci ty: Garden City, 1929), pp. Sl-55.

    59

    M atenal com direttos autorais

  • Para a teoria da posio-subjetiva, talvez tenha sido inevitvel essa op-o pelas formulaes "de cabea para baixo". Imbudos de um grande des-dm pelo "empiricismo", os tericos resistiram aos cticos que se propunham, por exemplo, a desafiar a verso lacaniana da formao do sujeito levando em conta dados disponibilizados por estudos sobre o desenvolvimento da crian-a. Em parte, essa resistncia conseqncia da hostilidade e do desconheci-mento mostrados por muitos humanistas com relao pesquisa cientifica.54

    Mas a recusa em fornecer evidncias comprobatrias tambm uma das ca-ractersticas da reelaborao indiscriminada de Freud empreendida pela teo-ria contempornea do cinema.

    Sandy Flitterman-Lewis, por exemplo, em um relato recente da teoria da posio-subjetiva, afirma ser a metapsicologia de Freud um "modelo conceitua!" que "resiste verificao emprica".55 No entanto, Freud assim escreveu com respeito sua meta psicologia:

    No se deve supor que estas id ias muito gerais sejam pressuposies

    das quais depende o trabalho da psicanlise. Pelo contrr io, so suas

    concluses mais recentes e esto "abertas reviso" . A psicanlise est

    firm emente alicerada na observao dos fatos da vida mental, e por

    essa mesma razo sua superestrutura terica ainda est incompleta e su-

    jeita a constante alterao. 56

    Freud apresenta sua meta psicologia como especulativa, no-fundacional e aberta refutao emprica. Flitterman-Lewis transforma as especulaes de Freud em pressupostos para o estudo do posicionamento-subjetivo no ci-nema e sustenta que esse aJicerce decididamente no-emprico.

    " Uma excelente crtica sobre esse estado de coisas a de Paul R. Gross & Norman Levitt. Hig!Jer Super;tilion: l/te Academic uft and its Quarrels Wit/1 Sciem:.t (Baltimore: John Hopkins Unjversity Press, 1994 ).

    " Sandy flitterman-Lewis, "Psychoanalysis", em Robert Stam e/ ai., New Vocabularie< irt Film Semiolics: Stmcluralism. Post-Struclllfalism, and Beyortd (Nova York: Routledge. 1992), p. 124. O vocabulrio de FlittermanLewis parece derivar de Laplanche & Pontalis. Vocabuldrio do psicanlist, cit., mas, em lugar de sua proposio de que "A me tapsicologia constTi um conjunto de modelos conceituo is que se encontram mai$ ou men otJra~ p~kolgic'as completas dr Sigmrmd rm,d, vol. XX (Rio de janeiro: Imago, 1977). pp. 304-305].

    60

    Material com direitos autorais

  • E.'itudos dt cinema hoj~ t M. tdcissitudts do graudr tooria

    Mas ela vai alm de Freud ao declarar: "Uma vez que so o inconscien-te e seus mecanismos que estabelecem a descontinuidade fundamental da vida psquica, no h como se ter absoluta certeza a respeito da observao emprica" .57 Em primeiro lugar, observe-se que a referncia a "absoluta cer-teza" uma pura estratgia diversionista. Nenhum pesquisador srio, em rea alguma, reivindica absoluta certeza para as suas observaes. Noel Carroll aprofunda essa discusso no artigo "Prospects for Film Theory: A Personal Assessment". E, em segundo lugar, como esto a indicar as palavras de Freud, de modo algum ele afirmai;ia que a psicanlise converte a observao em algo incerto. Ele pensava, afinal de contas, estar fundando uma cincia mdica, e o diagnstico dos sintomas apresentados pelos pacientes e a ob-teno da cura dependem, conforme ele declara, da "observao dos fatos da vida mental".58

    Contudo, os tericos do cinema no tinham pacientes com que se preo-cupar, podendo afirmar com tranqilidade que a teoria da posio-subjetiva era invulnervel objeo emprica. Doravante, a teoria seria escrita como bricolagem de outras teorias, no escapando jamais ao charmoso crculo de conexes associativas e das ltimas novidades do mundo intelectual. Mas es-crever o qu? A opo mais corriqueira era a de simplesmente elaborar relatos das doutrinas do posicionamento-subjetivo. As snteses aparentemente inter-minveis dos pensamentos de Lacan, Metz, Oudart, Mulvey e outros esto a confirmar o fascnio exercido por essa alternativa. Opcionalmente se podia dissecar a teoria da posio-subjetiva do ponto de vista lgico. Sendo essa uma tarefa difcil, no surpreende que a quantidade de teoria "pura" escrita durante os anos 1970 seja bastante reduzida.

    A maior parte dos acadmicos de cinema fez uma opo relativamente distinta. Da teoria da posio-subjetiva originou-se uma quantidade imensa de interpretaes de filmes individuais. Em outro lugar sugeri que os criticos de cinema se utilizavam das idias tericas de um modo que se adequasse s

    " Sand y Fliuerman-Lewis, "Psychoanalysis", cit. Ver NoiH Carroll, "l'rospects for Film Theory: a Personal Asscssmenl", em David Bordwcll & No!

    Carro LI (orgs.), Post-Theory: Reco>r$lructi>rg Film Sludics, c ii. (N. do 0.). "' Considere-se esla definio: "A psicoanlise um procedimento mdico que visa cura de certas

    formas de doena nervosa (as neuroses) alia vs de uma tcnica psicolgica" ('The Oaims of Psycho-Analysis lo Scientfic ln teres!", em Ernst )ones (org.), Stu>rdurd Edition of Complete Psychnlogical Wor~ of Signrund Freud, vol. 13 11913-1914}, cil., p. 165}. Para uma discusso das pretenses dentiflcas da metapsicologia de Freud, ver Patrcia Kitcher, Freud's Dreum: Complete l>rterdispli>rury Scma of Mnd (Cambridge: MIT Press, 1992).

    6 1

    M atenal com dire1tos autorais

  • Cognitiri~mo

    tradies da interpretao literria. 59 Alm do mais, a idia de empregar teoria para "ler" filmes encontra precedentes na prpria tradio do pensamento da posio-subjetiva. Freud por vezes aplicava a psicanlise a textos literrios, e Sartre utilizou exemplos literrios para explicar suas elucubraes filosficas. Mais significativo ainda que, enquanto Freud caracteristicamente baseava suas especulaes em dados colhidos na experincia clnica ou pessoal, Lacan seguidamente ilustrava suas doutrinas com comentrios detalhados de textos literrios. Com um tal estmulo, no surpreende que a maior parte do traba-lho do posicionamento-subjetivo tenha-se concentrado em "aplicar teoria" durante o ato da interpretao.

    Desse modo, os tericos da posio-subjetiva fizeram da interpretao o substituto para a dimenso emprica por eles desprezada. Para a maioria dos acadmicos, uma teoria adquiria plausibilidade quando propiciava uma leitu-ra inovadora de algum filme. Se no houvesse assim demonstrado que podia ser" aplicada", a teoria da posio-subjetiva provavelmente no teria conquis-tado tantos adeptos.

    Tambm a corrente culturalista tem se mostrado decididamente

    hermenutica. Por vezes uma questo de ler espectadores em lugar de fil-mes, como no caso das interpretaes semi-etnogrficas de pblicos, ofereci-das pelos adeptos dos estudos culturais. Em uma outra abordagem, o culturalista recolhe criticas jornalsticas e as interpreta como evidncia de" cons-telaes de leitura" ou processos de re-cepo.60 A perspectiva culturalista, ge-ralmente, to centrada no texto quanto a teoria da posio-subjetiva, produ-zindo leituras praticamente indistinguveis da espcie de comentrio que se tomou corrente nos anos 1970. Por exemplo, um ensaio na linha dos estudos culturais apresenta uma leitura sintomtica, bastante tradicional, da mulher dourada da seqncia de abertura de 007 contra Goldfinger [Goldfinger, Guy Hamilton, 1964):

    Sedutora, tentadora, to desejve l como o ouro da cano-tema e, logo a

    seguir, deitada de costas em uma demonstrao cabal do poder flico de

    Bond, ela ao mesmo tempo extremamente incmoda e ameaadora para

    " Ver David Bordwel~ Malring Mf'lrrirrg: /rrfmmce and Rhetoric irr 1/rr /rrlerpretatiorr of Cinema (Carnbrdge: Harvard Unversity Press, 1989), pp. 97-104 .

    ., Um exemplo a obra de Janet Staiger, /rrterprtli"g Film~: Studif:' in lhe Hi~torical Reception of Anruican Cinema (Prince ton : Princeton Universi ty Press, 1992).

    62

    M aterrai com dirertos autorais

  • Fll of Cinema, cit., pp. 29 42, 201204, 215223, 252254.

    " Um t>Studo muito til nesta linha o de Vrncent Descoml>es, Modern fmoclr Plulo;oJIry, trad. L. Scott / Fox & J. M. Harding (Cambridge: Cambndge Universlly Press, 1980). Ver tambm )udoth P. Butler,

    63

  • f'l/a 11

    acredita-se, fluem dessas teorias, constituindo-se em exemplos para anlises j contempladas pelas doutrinas abstratas.

    Paralelamente ao desenvolvimento da teoria da posio-subjetiva e do culturalismo, no entanto, outra corrente despontava. Essa tendncia, mais prxima da atividade acadmica tradicional, tem concentrado seus esforos na pesquisa em profundidade. o que poderamos chamar de uma pesquisa "nvel-mdio", que prope questes com implicaes tanto empricas quanto tericas. Ou seja, contrariamente ao que pensam muitos dos expositores da grande teoria, ser emprico no elimina a possibilidade de ser terico.65

    As reas mais representativas da pesquisa nYel-mdio so os estudos empricos de diretores, de gneros cinematogrficos e de cinemas nacionais. Essa tradio tem sido enriquecida p elo a porte das perspectivas feminista, gay e lsbica, ps-colonial e das minorias. Os pesquisadores se lanaram ao resgate de filmes, diretores e cinematografias do Terceiro Mundo, h muito ignoradas pela historiografia ortodoxa do cinema."" As prprias questes co-locadas pelos tericos do cinema fora m matizadas e complexificadas pela disponibilizao de um corpus mais abrangente de filmes e de informaes

    Subj~ria;:vr. ,,, Htgtl 111 Tit't'lllitr/1-Cmtury Frmra (lthaca: Comell University l' r"" 19RR).

    "' Muatos adeptos da grande teoria confundem mvesttgao t-:;'ir::J com c"'l'irici>mo. Empiricsmo a dPnominao de uma tradio filowfica que concentra sua ~n..ta,.> pnmaria sobre a expNincia ao procurar explicar a produo humana de conhcctmento. O ,;;:npmchmo. histoncamente, adolOu seguidamente perspectivas de que a mente um receptarulo passl\o e de que os conceitos podem ser reduzidos a agregados de impresses dos sentidos. No h ningu~ no~ estudos de Ci nema que sub;;creva a uma posio empirictsta. Uma inves tigao enzpiri(a e aquela qu" bu~ra re"postas s suas questes com base em evidncia d isponve l fora dos limites da mente do observador. A histria do cinema emprica precisamente nesse sentido; ass1 m lambem o so todas as espcieS de critica ci nematogrfica que formulam suas interpretaes a partir de evidncia intersubjctivamcnte d ispon-vel nos textos. E a maior parte da teoria do cinema, de :.1nsterberg a :.Htry, tem sido empnca. Apenas a grande teoria alega ser no-emprica. (Entretanto, como a afirmez no texto, a sua aplicao na interpretao parect>ria lhe conferir pelo menos alguma substncia empnca.) Essa distino explorada em detalhe por Koel Carroll em ~Prospects for Film Theory: a Perwnal As~~m~nt", cit_ amportante recordar que a pesquasa "nivelmdio", que stou abordando aqui. a um s tempo tenca e emprica, sem ser empiricsta.

    "' Exemplos influentes de pesquisa gay/lsb!Ca oncluem Vito Russo, Tht Crlluloid CftNI. Hl>nttl$e.YIIalzty 111 IIII' Ml>tits (edio revista. Nova York: Harpe r, 1987); e Richard Dyer . . \'ow )1lu Sre 11 (Nova York: Routledge, 1990). Sobre a redescoberta das mulheres cineastas, ver Barbara Koenrg Quart, W1>nwz Dir~C'IOr$: tlze Enurgence of a New Cinema (Nova York: Praeger, 1988); Threse Lama r tine, Elles: cinn; le> ad lib 1895-1981 (Quebec: Rem ucMnagc, 1985); e Catherine Portuges, Screeu Memories: ll1e Htmgarian Cinema of Mrla MszrO$ (Sloomtngton: Ind iana University Press, 1993). O livro de G. Willi~m Jones, Black C11ema Trensure.< Losl and Fourzd (Denton: Universlty of North Texas l'ress, 1991 ), assina la uma nova era na pesquisa de arquivos sobre o cinema afroamNicano. Entre os muitos exemplos de anlise histrica p6scolonial, destaco Randal JohtlSO!l, Tlte Film IIJdustr.~ in

    64

  • Estudos de cint mo Jroje e as 'llicisstudes da grandt teoria

    sobre outras culturas nematogrficas. A relao entre os filmes africanos e as tradies nativas de relato oral, por exemplo, um caso paradigmtico de tema passvel de uma pesquisa "nvel-mdio".67

    Outros exemplos incluem as correntes historiogrficas que surgiram em meados dos anos 1970 e originaram uma onda de trabalho "revisionista" nos anos 1980. A histria do nema como inquietao acadmica de origem ainda mais recente do que a prpria teoria e critica cinematogrficas. Embora histrias do nema de flego consider vel tenham sido publicadas j a partir de 1920, a maior parte delas era baseada em fontes secundrias ou em peque-nos corpus de filmes. As histrias de maior utilidade foram escritas por aficio-nados, arquivistas e pesquisadores independentes.68 E, em sua maioria, as obras de histria de nema foram levantamentos de alcance nacional ou internacio-nal, em lugar de trabalhos monogrficos em profundidade.

    A introduo dos estudos de nema na academia, ao final dos anos 1960,

    veio oferecer condies para um trabalho de pesquisa mais sist.emtico. Muitos dos jovens pesquisadores j haviam sido introduzidos na metodologia historiogrfica, e tambm os historiadores profissionais se mostraram mais in-

    teressados em trabalhar com cinema. Esse influxo de novos pesquisadores se verificou precisamente quando esses profissionais, atuando em arquivos e bi-bliotecas (muitos deles familiarizados com a pesquisa em histria e nema), principiavam a reconhecer o valor tanto dos filmes como do material produzi-do em funo deles. Acervos importantes de documentos foram microfilmados. Colees significativas de filmes foram disponibilizadas. No principio dos anos 1980, vrios arquivos j dispunham de moviolas para pesquisadores assistirem aos filmes. Os arquivos europeus tomaram-se mais acessveis. Acadmicos da rea de nema passaram a atentar para a importncia de revistas sindicais e jornais especializados, casos judiciais e outros materiais impressos produzidos

    Brazil: Culturc and tllt Stalt (Pittsburgh: University of Pinsburgh Press, 1987): Sumi ta S. Chakravarty, National ldtnlily in Jndian Popular Cinema, 1947-1987 (Austin: Univcrsity o f Texas Press, 1993); Lizbelh Malmus & Roy Armes, Arab and African Filmmaking (Londres: Zed, 1991); Keyan Tomasclli, The Cinema of Aparlheid: RDce and C/ass in Soullr Afriarn Filnr (Nova York: Smyma/lake View, 1988); e Nwachukwu Fran k Ukadlke, Black African Cinema (Berkeley: Univers ity of California Prcss, 1994).

    "' Ver Andr Cardies & Pie rre Hafner, Regards $ UT le cinma ngro-africain (Bruxelas: Ocic, 1987); Mantla Diawara, "Oral Literature and African FUm: Narratology in Wend Kurmi", em jim Pines & Paul Wi llemen (orgs.), Queslons of Third Cinema (Londres: British Film lnstilute, 1989), pp. 199-212; Tradilion ora/e et norweaux nrdie:< (Bruxelas: Ocic, 1989); e Nwachukwu Frank Ukadike, Black Afrcan Cinema, cit.

    "' So exemplos as obras de Georges Sadoul. Jean Mitry, Lewis jacobs e )ay Leyda.

    65

    M atenal com dire1tos autorais

  • Cogrlitivsnw e filoscfia analitica

    pela indstria cinematogrfica. Para se ter uma idia das possibilidades abertas pela infra-estrutura acadmica aos jovens historiadores de cinema dos anos 1970, basta lembrar que Georges Sadoui e Jean Mitry escreveram suas minuciosas histrias com o recurso de arquivos e bibliotecas pessoais.

    V rias espcies de "novas histrias do cinema" surgiram na poca. Uma delas oferecia um exame criterioso - neste sentido sem precedentes - dos aspectos empresariais da indstria cin ematogrfica. Como a maior parte da documentao disponvel em colees era relacionada com o cinema hollywoodiano, apareceram estudos sistemticos da estrutura e dos procedi-mentos das companhias cinematogrficas. Os pesquisadores indagavam so-bre os modos de influncia dos interesses econmicos e princpios gerenciais sobre as instncias da produo, distribuio e exibio. As respostas vieram demonstrar a importncia da integrao vertical das companhias, da proprie-dade de ati vos, da assimilao de novas tecnologias, da diviso do trabalho e do planejamento estratgico em funo de um mercado intemacionalizado.69

    Esses programas de pesquisa continuam a produzir resultados, muitas vezes por extenso s indstrias instaladas em outros pases.711

    Outro conjunto de indagaes envolvia as prticas de exibio cinema-togrfica. Os historiadores se propuseram a reconstituir como era o cinema nos bairros de Manhattan ou de Chicago, por exemplo.71 Os professores ensi-navam o mtodo historiogrfico aos alunos solicitando-lhes a elaborao de histrias locais da exibio.n Surgiram debates sobre temas como a composi-

    '" Ver Tino Ba lio, United Artists: tiJe Company Built by tltr Stars (Madison: University of Wisconsin Prcss, 1976); United Artists: IIJt Company Tirai Clranged lht Fifm Industry (Madison: Universlty of Wisconsin Press, 1987), e os trabalhos reunidos Cm sua antolog.ia. Tht Am!Titan Film lndustry (2 ed. Madison: Universty of Wisconsin Press, 1985). Ver tambm Douglas Gomery, Tire Conrng of Sormd to tire Am!Ticarr Cinenra: a History of tht Transition of an lndustry, dissertao d e doutorado (Madison: University of Wisconsin, 1975); Robert C. Allen, Vaudetillt and Film 1895-1915: a Study in Media Interactio11 (Nova York: Arno Press, 1980); )allet Staiger, Tire Hollywood Mode of Prodllctio11: The Constru~tio11 of Di11ided Labor irr lhe Film lrrdustry, dissertao de doutorado (Madison: University of Wisconsin, 1981); Kristin Thompson .. Erportirrg E11tertairrmerrt: Americn irr tlrt World Film Market. 1907-1934 (Londres: British Film lnstitute, 1985); c David Bordwcll et a/., Tlte Classical Hollywod Cirrema: Film Sty/e arrd Modt of Productiorr to 1960 (Nova York: Columbia University Press, 1985).

    ,. Ver, por exemplo, Richard Abel, FmrciJ Cintnra: tire First Wat.,, 19151929 (i'rinceton: Princeton University Press, 1984); e Colin Crisp, The Cla>'Sic Frerrclr Cinema, !930.1960 (Bioomington: Indiana University Press, 1993).

    n Para discusso desse tema, ver Vance Kepley )r., "Whose Apparatus? Problems of Film Exhibition and History", em Noel Carrol & David BordweH (orgs.), Po$1-Theory-Recorrstrllctirrg Filnr Stlldics, cit.

    " Uma exposio sobre como isso pode ser fei to encontra-se em Robert C. Allen & Douglas Gomery, Film History: Tlleory arrd Practice (Nova York: Knopf, 19115). pp. 193212.

    66

    M atenal com dire1tos autorais

  • Estudos de ti11emn hoje e as 11icissitudes da gra11dt teoria

    o do pblico do "cinema das origens" ou o predomnio de mulheres entre o

    pblico que sustentava certos gneros. Outros pesquisadores renovaram o interesse pcla histria estilstica do cine-

    ma. A partir dos anos 1920, um certo modelo de "evoluo da linguagem cinema-

    togrfica" sempre dominara a maioria das discusses. Ahistria do cinema era relacionada a urna paulatina manifestao do poder da "sintaxe cinematogrfi-ca", de Mlies, Porter e Griffith at o expressionismo alemo, os clssicos soviti-cos e a vanguarda internacional. Desenvolvendo a decupagem, o primeiro plano,

    os efeitos ticos e os movimentos de cmera, o cinema mudo teria supostamente

    aprendido a dominar urna forma narrativa especificamente cinematogrfica. Bazin e seus contemporneos da nouvelle critique opuseram-se a essa perspectiva, mas sua defesa de Jean Renoir, de Orson Welles e dos neo-realistas no acabou servin-do para estimular os historiadores a uma reviso da histria-padro, mas to-somente para dilatar o cnone.73

    No final dos anos 1960, entretanto, a crescente reputao da vanguarda

    contempornea vinha sugerir que a trilha da continuidade narrativa era ape-

    nas um dos rumos que o cinema das origens poderia tomar. Warhol fez a

    cmera esttica de Lumiere parecer mais interessante; Tom, Tom the Piper's Son, de Ken Jacobs (1969)- uma intenreno sobre um filme da American Mutoscope e da Biograph -,revelou a riqueza da cenografia "primitiva". As cinematecas e os distribuidores mais ousados ofereceram ao pblico um corpus de filmes de propores at ento incUtas. Porter, agora, parecia menos ino-

    vador, Grillith parecia atpico, e o cinema japons dos anos 1930 adquiriu enorme importncia.74 A partir de meados dos anos 1970, historiadores do

    estilo produziram histrias mais complexas e minuciosas da trnica cinema-togrfica?5 Projetos de pesquisa sobre iluminao e cenografia, sobre o

    73 Discuto esse prO

  • Cognitivi$nti> I!' filosajn ana/itica

    surgilmento do cinema sonoro e sobre a esttica do cinemascope se mostra-ram possveis graas a uma hbil explorao de material de arquivo.76 O estu-do do cinema de vanguarda, por fim, foi particularmente beneficiado pela proposio, por crticos e historiadores, de questes sobre estilstica passveis

    de operacionalizao.77

    Essas variedades de pesquisa "nvel-mdio", por serem guiadas por problemas e no por doutrinas, permitem aos pesquisadores a possibilidade de combinar esferas tradicionalmente distintas de investigao. As indaga-es "nvel-mdio" parecem dissolver os limites tradicionais entre esttica, instituies e recepo cinematogrfica. Lea Jacobs, por exemplo, estudou como os mecanismos internos de censura em Hollywood levaram a repre-sentaes negociadas da mulher no plano da imagem e da narrativa.78 Em particular, a ampla investigao internacional sobre o cinema anterior a 1920 levantou questes que tratam a indstria, o pblico, a narrativa e o estilo conjuntamente.

    Essa irrupo revisionista na historiografia do cinema no o nico indicativo do crescimento da pesquisa nvel-mdio. O que Noel Carroll de-nomina "teoria do prato avulso" ("piecemeal theory") compe uma estrat-gia comparvel: de construir no teorias da subjetividade, da ideologia ou da cultura em geral, mas, em vez disto, de fenmenos particulares. (Estes, ao serem examinados, terminam sempre por se revelar suficientemente difceis de compreender.) Assim, por exemplo, vrios filsofos da arte em-preenderam investigaes sobre o horror, o suspense, a expressividade emo-cional, os gneros cinematogrficos e as questes especficas do femi-nismo. 79 Estudos monogrficos sobre ponto de vista, gneros

    (Lomd res: British fi lm Ins titute, 1990); Ben Brewster, "Traffic in Souls': an Experiment in Featme Length Narrative Con.struction", em Cinema Journal, I (31), outono de 1991, pp. 37-56; e David Bordwell, et a/., C/assical Hollywood Cinema, cit. , pp. 155-308, 341364.

    "' Ver Lea Jacobs, "Belasco, DeMille, and the Deve.lopmenl of Lasky Lghting", em Film History, 5 (4), 1993; e John Belton, Wide-Screeu Cinema (Cambridge: Harvard Uni versity Press, 1992).

    " Ver especialmente o trabalho realizado no Departamento de Estudos de Cinema da New York University durante os anos 1970. O lvro de P. Adams Sitney, Visionary Flm: lhe Arnerica,. Ataul Carde, 1943-1978 (Nova York: Praeger, 1974), associa-se a essa tendncia,

    "' Lea Jacobs, Tiro Waglry of Film: F.pistemology, Outology. AesllretiC!' (Nova York: Rou lldgc, 1988); e Cynthia Freeland & Thomas Wart.enberg (orgs.), Plrilosol'lr!J aud Film (Nova York: Routledge, 1995).

    68

    Matenal cot'l dtrettos autorats

  • Estudt~ tlr li"ema hoje tas t1icissiludes da grar1dt teoria

    cinematogrficos e fenmenos afins j resultaram em posies diversas e em produtivos debates. 50 Anarratologia do cinema outra rea promiissora da pesquisa nvel-mdio.81 Hipteses especficas sobre a atividade espectatorial tm desafiado as fundaes tanto do modelo do posicionamento-

    subjetivo como do culturalismo.82

    Em todas essas frentes, a tradio nvel-mdio de pesquisa experimen-tou avanos significativos. O maior testemunho da pujana desses programas de pesquisa talvez seja a determinao com que os adeptos da teoria da posi-o-subjetiva e do culturalismo se utilizaram dos seus resultados com vistas ao alcance de seus prprios objetivos.83 A questo que permanece, porm, a de saber em que medida essas escolas estabelecidas de pensamento so capa-zes de um efetivo comprometimento com as discusses introduzidas pelo revisionismo histrico e pela teorizao" avulsa".

    Para ser mais especfico: os programas de pesquisa "nvel-mdio" de-monstraram que uma reflexo pode ser, a um s tempo, vigorosa e funda-mentada em evidncia, sem o apelo a procedimentos como a bricolagem te-rica ou a associao de idias. Mostraram, ainda, que os filmes no se prestam

    apenas interpretao, e, em especial, que para a compreenso de um filme no necessrio projet-lo em campos semnticos "privilegiados" desta ou daquela teoria. Esses programas de pesquisa provaram, sobretudo, que no preciso uma grande teoria de todas as coisas para produzir um trabalho rev.elador em determinado campo de estudo. Uma investigao das prticas empresariais

    "' Ver, por exempl04 Edward Branigan, Poiut of Vir,w in Citttma (Nova York: Mouton, 1984) (1\esta coletnea, volwne D, Edward Branigan, "O plano-ponto-de-vista"]; e Rick Altman, The Amrrie::au Filnr Mll$ical (Bioomington: Indiana University Press, 1987).

    ~ Ver Seymour Chatman, Story aud Discour>e: Na rratite Structure ilr Fiction and Film (lthaca: Cornell I.Jniversity Press, 1978), e Coming to Term~: the kheloric of Narratite ln l'iction and l'ilm (lthaca: Cornell University Press, 1990); George M. Wilson, Narration in Liglrt: Studie:: in Cinematic Poiut ~( Vie11> (Baltimore: John Hopkins University Press,. 1984); David Bordwell, Narration in lhe Fiction Film (Madison: University of Wisconsin Press, \9S.5); Sarah Kozloff, lmi$ible Storylelltrs: Voice-Over Narrati(TII n American Fiction Film (Berkeley: University of California Press, \988); e Edward Branigan, Narrative Comprehension and Film (Londres: Routledge, 1992).

    "' Ver, por exemplo, Stephen Prince & Wayne Hensley, "The Kuleshov Effect: Recreating the Classic Experiment", em Cinema jounral, 31 (2), inverno de 1992, pp. 59-75. Eu proponho uma outra maneira de pensar sobre espectatorialidade em "A Case for Cognitivism", em ris, n 9, primav~ra de 1989, pp. 114.0, e "A Case for Cogntivism: Furthe r Refle:ctions", em /ris, n 11, vero de 1990, pp. 107-112.

    "' Por exemplo, a obra de Mike Cormack. ldeology and Cincmatography in Hollywood, 193039 (Nova York: St. Marlin's Press, 1994), no se utiliza de documentao primria para suas proposies hist-ricas e simplesmente absorve a pesquisa de Balio, Bordwcll, Burch, Gomery, Ma ltby, Roddi

  • Coguitivifia analiliCJI

    da United Artists, das mulheres no pblico cinematogrfico do chamado" ci-nema das origens", ou da padronizao da decupagem clssica, independe de qualquer pressuposto filosfico sobre subjetividade ou cultura, ou de qual-quer pressuposio metafsica, poltica, epistemolgica (em resumo, de qual-quer comprometimento com grandes teorias).

    Ricas tradies de pesquisa se desenvolveram na histria da arte, nos estudos literrios, na musicologia e em tantas outras disciplinas, anteriormen-te apario da grande teoria. No entanto, no caso dos estudos de cinema, estes mal haviam dado indo investigao em profundidade, quando os te-ricos da posio-subjetiva e os culturalistas assumiram a hegemonia. Caso alguns poucos historiadores criativos e tericos rigorosos no houvessem des-prezado as acusaes de "positivismo" e de" empiricismo" a eles dirigidas, a maior parte das promissoras perspectivas que hoje se encontra aberta na rea simplesmente no existiria. Na era da ps-teoria, a investigao verticalizada e focada cm temas espeficos desponta como nossa melhor aposta para a cons-truo de um debate acadmico que promova o efetivo avano do conheci-

    /e r I' mente sobre cinema. As grandes teorias vo e vm, mas a pesquisa e o conhe-

    cimento persistem.

    70

    25262728293031323334353637383940414243444546474849505152535455565758596061626364656667686970