BELÉM - CCB · sobre o horror da Guerra do Vietname, um dos eventos mais trágicos da segunda...

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1 BELÉM CINEMA GRANDE AUDITÓRIO GRANDE ECRÃ GRANDES CLÁSSICOS 2019/2020 APOCALYPSE NOW: FINAL CUT O RESGATE DO SOLDADO RYAN MY FAIR LADY MORTE EM VENEZA REBEL WITHOUT A CAUSE VERTIGO A CONQUISTA DO OESTE Cidade Aberta

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BELÉM CINEMA

GRANDE AUDITÓRIO GRANDE ECRÃ GRANDES CLÁSSICOS2019/2020

APOCALYPSE NOW: FINAL CUTO RESGATE DO SOLDADO RYAN MY FAIR LADYMORTE EM VENEZAREBEL WITHOUT A CAUSEVERTIGOA CONQUISTA DO OESTE

CidadeAberta

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Na Temporada 2019/2020 continuamos a recuperar no Grande Auditório do Centro Cultural de Belém os grandes clássicos da sétima arte, sendo esta uma oportunidade única para ver num grande ecrã algumas das obras mais importantes da história do cinema do século XX, em versões restauradas.

Não podíamos, por isso, deixar de assinalar os 40 anos da estreia de Apocalypse Now, de Francis Ford Coppola, com a exibição da versão definitiva, supervisionada pelo próprio realizador.

Não vai também querer perder grandes clássicos de Steven Spielberg, George Cukor, Luchino Visconti, Nicholas Ray, Alfred Hitchcock, John Ford, Henry Hathaway, George Marshall e Richard Thorpe.

Apocalypse Now: Final Cut de Francis Ford Coppola

O Resgate do Soldado Ryan de Steven Spielberg

My Fair Lady – Minha Linda Senhora de George Cukor

Morte em Veneza de Luchino Visconti

Rebel Without a Cause – Fúria de Viver de Nicholas Ray

Vertigo – A Mulher Que Viveu Duas Vezes de Alfred Hitchcock

A Conquista do Oeste de John Ford, Henry Hathaway, George Marshall e Richard Thorpe

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Uma análise feroz e sombria do absurdo da guerra. Apocalypse Now continua a ter o poder de chocar e impressionar, quatro décadas depois.THE GUARDIAN

No ano em que se celebram 40 anos da estreia de Apocalypse Now, o seu realizador, Francis Ford Coppola, supervisionou uma nova montagem e um restauro digital em 4K, com um profundo trabalho sobre o som, e assumiu esta como sendo a versão definitiva do seu mais mítico filme.

A versão de estreia em 1979 tinha 147 minutos. Em 2001, Coppola pôde repor uma série de cenas que tinha sido obrigado a retirar para encurtar o filme e estreou então a versão Redux, com 202 minutos. E agora, o realizador apresenta a Final Cut, de 183 minutos, desta obra de arte visual, surreal e alucinatória, e que é um incontornável épico sobre o horror da Guerra do Vietname, um dos eventos mais trágicos da segunda metade do século XX.

Inspirado na trama de Coração das Trevas (Heart of Darkness) do escritor britânico de origem polaca Joseph Conrad, Apocalypse Now conta a história da subida do rio

20 OUT 2019DOMINGO

APOCALYPSE NOW: FINAL CUT (1979)DE FRANCIS FORD COPPOLACOM MARLON BRANDO, MARTIN SHEEN, ROBERT DUVAL

16H / M/16GRANDE AUDITÓRIODURAÇÃO: 183 MINUTOSVERSÃO RESTAURADA EM 4K, NOVA E DEFINITIVA MONTAGEMDCP

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Nung pelo capitão Benjamim Willard (Martin Sheen) com a perigosa e alucinante missão de executar o coronel Walter E. Kurtz (Marlon Brando) que, no vizinho Camboja, se tornou um déspota incontrolável venerado pelas tribos locais.

Durante a estreia do filme em Cannes, em 1979, Coppola afirmou que Apocalypse Now não era um filme sobre o Vietname, mas antes o Vietname, assumindo uma posição muito crítica em relação à atitude dos norte- -americanos naquela guerra onde, com acesso a dinheiro e a armas – e, portanto, poder –, se transfiguraram e entregaram à loucura e amoralidade. Mas este é também um filme sobre as profundas transformações que os horrores da guerra provocam no âmago da consciência e das emoções do ser humano.

Filmado nas Filipinas, a rodagem foi, tal como o cenário retratado no filme, verdadeiramente caótica. Coppola começou por não contar com a colaboração das Forças Armadas norte-americanas e a ter de pactuar com o ditador filipino Ferdinando Marcos para conseguir alugar os meios aéreos necessários para a cena da Cavalgada das Valquírias. Porém, estes meios eram regularmente requisitados de urgência pelo estado filipino, interrompendo as filmagens. A produção foi também suspensa por várias semanas depois de um tufão destruir o imenso cenário e arruinar milhares de dólares em equipamentos. Ao fim de uma semana de rodagem, Coppola decidiu substituir Harvey Keitel, que seria o protagonista, por Martin Sheen. Porém, Sheen sofreu um grave ataque cardíaco e, novamente, a rodagem foi suspensa durante semanas, até se aguardar a sua recuperação. Perante estas e outras inúmeras adversidades, Coppola não conseguia escrever o fim do filme, numa corrida contra o tempo, pressionado sobretudo pela disponibilidade limitada de Marlon Brando e por um orçamento que se desvanecia velozmente. Alguma imprensa, ao constatar todos estes desaires, chegou mesmo a questionar de forma jocosa – «Apocalypse when [para quando]?»

Foram 238 dias de filmagens, 250 horas de material e uma derrapagem para mais do dobro do orçamento previsto, o que obrigou Coppola a hipotecar tudo o que tinha para poder terminar o filme.

Os dois anos de montagem de Apocalypse Now resultaram numa obra gigantesca – e ainda assim

considerada um work in progress pelo realizador –, com cenas e elementos de antologia e que se tornaram memoráveis referências culturais do século XX. O famoso ataque à aldeia ao som de A Cavalgada das Valquírias, de Richard Wagner, entrou nos cânones do cinema; assim como a não menos famosa frase de um dos intervenientes – «Adoro o cheiro de Napalm pela manhã» –; ou ainda a mítica canção The End, dos The Doors.

Nesta nova e derradeira versão, Coppola não se limitou a fazer um simples restauro digital 4K. O processo técnico e criativo envolveu mais de um ano de trabalho de arquivo e conseguiu recuperar extraordinários detalhes da imagem, sobretudo nos planos noturnos, através de um novo processo de digitalização dos negativos. Ainda mais notável é o trabalho de som, feito a partir da gravação original em seis pistas, o que não só permitiu torná-lo mais límpido e recuperar os sons de baixa frequência, como refazer as misturas recorrendo às tecnologias mais modernas de pós-produção, adaptadas também às condições atuais de exibição das salas de cinema.

Em 1979, Apocalypse Now foi recebido em Cannes com um longo aplauso e venceu a Palma de Ouro. Nesse ano, foi nomeado para oito Óscares (onde ganhou nas categorias de Fotografia e Som) e arrebatou diversos Globos de Ouro e prémios BAFTA. Mais importante é o legado que Coppola deixa para a história da 7.ª Arte, com um dos maiores filmes alguma vez feito, uma obra fundamental que se tornou uma influência para inúmeros cineastas e que vem sendo revisitada e admirada de geração em geração. E que reencontra agora, nesta derradeira e restaurada versão, toda a sua magnificência.

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O melhor filme sobre guerra dos nossos tempos.NEW YORK TIMES

No ano em que se assinalam os 75 anos do desembarque da Normandia, recupera-se, duas décadas depois da sua estreia, aquele que rapidamente se tornou um clássico de Steven Spielberg, numa versão restaurada em 4K.

O Resgate do Soldado Ryan é um verdadeiro épico de guerra que transporta o espectador para as praias e aldeias da Normandia e o relembra do sofrimento e sacrifício dos jovens soldados que combateram pela libertação da Europa do jugo de Adolf Hitler.

Inspirado em factos verídicos, O Resgate do Soldado Ryan conta a história da arriscada missão do Capitão John Miller (Tom Hanks) e de um pequeno pelotão de oito homens (Tom Sizemore, Edward Burns, Barry Pepper, Adam Goldbert, Vin Diesel, Jeremy Davies e Giovanni Ribisi) encarregue de resgatar o soldado James Ryan (Matt Damon), desaparecido atrás das linhas inimigas na França ocupada.

O jovem Ryan ganha o direito de regressar a casa depois de o Exército constatar que os seus três irmãos haviam perecido no desembarque nas praias da Normandia. Miller e

1 NOV 2019SEXTA-FEIRA

O RESGATE DO SOLDADO RYAN (1998)DE STEVEN SPIELBERGCOM TOM HANKS, MATT DAMON, TOM SIZEMORE, ADAM GOLDBERG, VIN DIESEL

16H / M/12GRANDE AUDITÓRIODURAÇÃO: 169 MINUTOSNOVA VERSÃO RESTAURADA EM 4KDCP

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os seus homens vão então cruzar as linhas inimigas em busca deste jovem soldado, encetando uma viagem que servirá para conhecer a força da camaradagem, a resiliência e o sofrimento e, no caso de alguns, o derradeiro sacrifício.

O Resgate do Soldado Ryan tornou-se rapidamente numa referência no seu género: os primeiros 20 minutos do filme, nos quais é retratado o terrível desembarque nas praias da Normandia (ocorrido a 6 de junho de 1944), foram considerados por muitos veteranos da Segunda Guerra Mundial como das cenas mais realísticas alguma vez recriadas em cinema e, certamente, uma das mais violentas. Ao contrário do que se possa pensar, a intenção do realizador foi a de se manter fiel às condições e situações brutais vividas pelos soldados em Omaha Beach, procurando recriá-las de forma crua, sem atenuar nem fazer da violência puro espetáculo. Para a recriação precisa do desembarque e início da invasão, Spielberg sujeitou os atores a treino militar intensivo e chamou mais de mil figurantes (muitos deles verdadeiros soldados), que rodaram o filme durante 59 dias, 25 dos quais apenas para a sequência inicial do filme. Numa produção extremamente atenta aos detalhes, foram costurados cerca de 3 mil uniformes e 2 mil botas. As armas levaram cerca de três meses para ficarem prontas e muitos dos veículos utilizados em cena foram «importados» dos Estados Unidos. Ao todo, só a rodagem do desembarque custou, em 1998, 70 milhões de dólares. As cenas de um tremendo realismo, o desempenho dos atores e a força das imagens levaram a que o filme fosse rapidamente aclamado pelo público e pela crítica especializada. Apesar de ter sido classificado para audiências restritas (por causa da violência), tornou-se rapidamente no maior êxito de bilheteira de 1998, com receitas de mais de 500 milhões de dólares.

O Resgate do Soldado Ryan foi nomeado para 11 Óscares, tendo vencido nas categorias de Melhor Realizador, Fotografia e Montagem, sendo esta última um trabalho sublime de Michael Kahn. O filme também venceu o Globo de Ouro para Melhor Filme na categoria Drama, entre outros prémios e nomeações. É desde o seu lançamento considerado uma das referências incontornáveis e essenciais do género e um filme crucial na história do cinema.

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É um grande clássico, não porque a crítica e os especialistas em cinema assim o determinaram, mas porque foi e sempre será uma experiência inesquecível.ROGER EBERT

Eliza Doolittle (Audrey Hepburn) é uma corriqueira florista que tenta ganhar a vida nas ruas de Londres. Um dia, Henry Higgins (Rex Harrison), professor e estudioso de fonética, fica sobressaltado com o terrível linguajar, pronúncia e tom de voz estridente de Eliza, quando esta lhe tenta vender flores à saída de um espetáculo. Aceita então o desafio de transformar Eliza numa eloquente senhora da alta sociedade e fazê-la passar por duquesa, num baile de Embaixada, no Palácio de Buckingham.

Esta adaptação do musical homónimo da Broadway, que por sua vez adapta o clássico Pigmaleão, de George Bernard Shaw, trata, de uma forma irónica e humorada, a importância que a educação e o modo de falar têm na definição das relações pessoais e sociais. Apesar da história divertida e romântica de Henry e Eliza assumir o enredo principal, há em todo o filme um subtexto de crítica à perpetuidade de uma estratificação social, que se vai cristalizando de geração em geração e que se manifesta na forma de falar e nas «boas maneiras». Para melhor apresentar

29 DEZ 2019DOMINGO

MY FAIR LADY – MINHA LINDA SENHORA (1964)DE GEORGE CUKORCOM AUDREY HEPBURN, REX HARRISON, STANLEY HOLLOWAY, WILFRID HYDE-WHITE

16H / M/6GRANDE AUDITÓRIODURAÇÃO: 170 MINUTOSVERSÃO RESTAURADA EM 4KDCP

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esta premissa, Cukor enquadra a ação na sociedade londrina, uma das mais estratificadas e antigas, onde a diferença de classes se inscreve visivelmente na normalização da linguagem verbal e não-verbal de cada estrato social. Porém, a personagem de Henry Higgins prova que esta estratificação pode ser facilmente subvertida através do ensino dos códigos sociais, evidenciando a artificialidade do status e dos consequentes preconceitos e discriminação.

No filme, Cukor procurou manter-se o mais fiel possível ao musical da Broadway, reproduzindo na íntegra os seus números musicais, devidamente integrados e costurados no argumento do filme. Cukor decidiu também atribuir o papel do Professor Higgins a Rex Harrison, que interpretara já a personagem nos palcos da Broadway. Harrison vê no filme a sua performance potenciada pelo dispositivo cinematográfico, sendo difícil ficar indiferente à sua atuação, voz e dicção impressionantes.

Audrey Hepburn tem também uma performance majestosa e inesquecível, incorporando toda a graciosidade e elegância que lhe são sobejamente reconhecidas na personagem de Eliza. Contudo, ao contrário de Rex Harrison, cujas canções foram gravadas com som direto, recorrendo à inovadora tecnologia de microfones sem fios nunca antes usada em cinema, os números musicais de Hepburn foram dobrados em pós-produção pela soprano Marni Nixon.

Com um orçamento de mais de 17 milhões de dólares, My Fair Lady foi então a produção mais cara de sempre da Warner Brothers. A receção do público e da crítica foi ao encontro das expectativas dos produtores e o filme foi nomeado para 12 Óscares, tendo vencido 8 estatuetas – Melhor Filme, Ator, Realização, Fotografia, Direção de Arte, Figurinos, Som e Música – e ainda hoje é um dos musicais mais premiados de sempre. Apenas a prestação de Audrey Hepburn teve uma receção menos calorosa por parte da indústria, mas conquistou o grande público que tem unanimemente considerado este o seu papel mais inesquecível.

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Baseado na obra homónima do escritor alemão Thomas Mann, Luchino Visconti filma a viagem a Veneza de Gustav Aschenbach (Dirk Bogarde), um compositor alemão que procura um refúgio para ultrapassar a crise pessoal e artística que o aflige. É neste cenário que procura salvar alguma da sua sanidade e esquecer as memórias que o atormentam, nomeadamente as suas últimas aparições em público, pautadas pelo fracasso. No Grande Hotel onde se instala, porém, cruza-se com Tadzio (Björn Andresen), um jovem adolescente polaco de beleza andrógena, pelo qual desenvolve uma desconcertante atração. Apesar da epidemia de cólera que se abate sobre Veneza, Aschenbach permanece na cidade para admirar o jovem, embora com consequências trágicas. Tal como a epidemia de cólera que ameaça a cidade, esta atração cativa e consome o compositor, comprometendo tragicamente todos os seus ideais.

Visconti assume neste filme a difícil tarefa de traduzir em imagens mais um clássico inestimável da literatura, desta vez privilegiando o trabalho de experimentação cinematográfica, ao construir todo o filme em torno da sua composição estética, menos interessado no aspeto narrativo, reduzidos ao mínimo os diálogos. Daí resulta uma longa- -metragem esteticamente primorosa, repleta de momentos de silêncio e contemplação, onde, tal como o protagonista, também Visconti parece perseguir os mais exímios ideais de beleza.

26 JAN 2020DOMINGO

MORTE EM VENEZA (1971)DE LUCHINO VISCONTICOM DIRK BOGARDE, ROMOLO VALLI, MARK BURNS, NORA RICCI

16H / M/12GRANDE AUDITÓRIODURAÇÃO: 125 MINUTOSNOVA VERSÃO RESTAURADA EM 4KDCP

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Poucas vezes uma cidade foi retratada de maneira tão sublime e Veneza é aqui filmada por Visconti que, com o diretor de fotografia Pasqualino De Santis, conseguiu criar uma atmosfera melancólica, decadentista e, simultaneamente, transcendental. A mestria da câmara do realizador italiano levou a que muitos críticos considerassem que alguns dos planos do jovem Tadzio poderiam ser transpostos para um museu de arte renascentista.

Este filme é também uma subtil homenagem a Gustav Mahler, o que explica a mais relevante alteração feita por Visconti ao livro original de Mann. Se no livro o protagonista é escritor, no filme do mestre italiano é compositor, e a própria caracterização de Dirk Bogarde é toda feita em invocação de Mahler. Em pano de fundo, e indesligável do filme, o melancólico Adagietto da Quinta Sinfonia do compositor abre e encerra o filme e vai pontuando os ápices sentimentais ao longo da história, conferindo-lhe uma aura inigualável.

Visconti fez de Morte em Veneza uma obra propositadamente ambígua e filosófica que, no seu jogo entre temporalidades, procura explorar o tema da velhice e da aproximação da morte, associadas à busca incessante de um estado puro e indelével, que aqui é encarnado na beleza ideal e inacessível daquele jovem adolescente.

Embora seja um dos filmes mais admirados do mestre italiano, Morte em Veneza foi também alvo de algumas críticas. Desde logo pela referida subversão do romance de Mann e ainda por parecer conferir um teor sexual à relação de Aschenbach com o jovem polaco. Visconti, segundo alguns detratores, ignorou as subtilezas do texto de Mann, que sugeria que Tadzio representava sim um ideal de beleza e não simplesmente um objeto de desejo.

Contudo, a crítica mais feroz veio daqueles que receberam com estranheza o movimento de Visconti no sentido de apresentar um cinema mais centrado na imagem e numa câmara-pincel. Porém, se há uma característica que faz de Visconti um realizador ímpar, é a sua capacidade de metamorfosear a sua técnica cinematográfica, do Neorrealismo de que é considerado um dos pais, ao cinema pleno de simbologia e domínio estético.

Não obstante, Morte em Veneza, amplamente premiado nos BAFTA e no Festival de Cannes, é hoje considerado unanimemente como o mais excecional filme de Visconti e uma das mais belas experiências cinematográficas alguma vez proporcionada.

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Um filme excecional. Com o domínio absoluto da personagem, James Dean faz uma intensa e provocadora interpretação.HOLLYWOOD REPORTER

O filme que tornou James Dean num ícone do cinema norte-americano, e o mais intemporal filme de Nicholas Ray, é um mítico retrato da juventude americana do pós-guerra, uma geração marcada pela solidão, raiva e frustração. Jim Stark (James Dean) é um jovem turbulento cujos pais tentam desesperadamente pôr no bom caminho. Na chegada a Los Angeles, Jim apaixona-se por Judy (Natalie Wood), mas este amor terá de ser disputado com Buzz (Corey Allen). A irreverência e necessidade de afirmação dos jovens arrastarão esta rivalidade até às mais trágicas consequências.

Nicholas Ray teve neste filme uma visão clara do espírito de desfasamento e desordem que se apoderara da juventude norte-americana dos anos 1950 e queria que as suas personagens e história fossem absolutamente realistas e fiéis ao contexto social que retratavam. Fúria de Viver parte, por isso, de um ensaio de Robert Linder que tratava a história real de um jovem delinquente recorrentemente detido na Pensilvânia. No entanto, Ray optou por moldar a história deste caso, adaptando-a à eficiente premissa de um Romeu e Julieta para, assim, a extrapolar para a história de um casal

22 MAR 2020DOMINGO

REBEL WITHOUT A CAUSE — FÚRIA DE VIVER (1955)DE NICHOLAS RAYCOM JAMES DEAN, NATALIE WOOD, SAL MINEO, DENNIS HOPPER

16H / M/12GRANDE AUDITÓRIODURAÇÃO: 111 MINUTOSVERSÃO RESTAURADA EM 4KDCP

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adolescente de famílias abastadas que se apaixonam ao tentar escapar de relações familiares conflituosas. Ray queria tratar precisamente esta turbulência e desilusão que só podia fervilhar no seio de famílias abastadas e com uma vida de aparente conforto e estabilidade.

Apesar de Marlon Brando ter chegado a fazer testes para o papel de Jim Stark, a escolha recaiu sobre James Dean, um jovem e, na altura, desconhecido ator que acabava de ter uma interpretação muito apreciada no filme A Leste do Paraíso, de Elia Kazan, e que impressionou muito Nicholas Ray. O realizador e o ator desenvolveram uma estreita relação na preparação do filme, com Ray a aproveitar esta cumplicidade para melhor se imiscuir no seio do espírito e angústias da juventude que queria retratar. Ciente do talento de Dean e da sua paixão pelo método do Actors Studio (que privilegia o trabalho psicológico e emocional dos atores na interpretação de uma personagem), Nicholas Ray confiou e entregou-lhe o controlo criativo das cenas, passando a ser Dean a ditar o seu tom e ritmo, com uma grande margem para improvisação. Dean incorporou de tal forma o espírito da personagem que chegou a ferir-se realmente nas cenas mais violentas, a ponto de Nicholas Ray ter de interromper as filmagens para que Dean fosse assistido, ainda que contra a vontade do ator.

A intensa e lendária interpretação de Dean, que levou a Warner Brothers a oferecer-lhe um contrato a longo termo antecipando-lhe uma carreira estrondosa, foi ainda mais exponenciada quando James Dean, que era um apaixonado por automobilismo, morreu tragicamente aos 24 anos num despiste de automóvel, a um mês da estreia de Fúria de Viver.

A forma tão intensa como viveu e morreu, e que tão bem espelhou na sua interpretação de Jim Stark, elevaram James Dean a ícone da juventude irreverente e incompreendida e fizeram deste filme uma referência incontornável na história do cinema e da cultura popular do século XX.

Alavancado pelo trágico desaparecimento de Dean, a receção de Fúria de Viver foi efusiva e tornou-se no segundo filme mais visto de 1955, com inúmeras nomeações para os Óscares e BAFTAs desse ano. Sessenta e cinco anos depois

da sua estreia, e pelo seu tema intemporal, ainda hoje ocupa lugares cimeiros nas inúmeras listas dos melhores filmes de todos os tempos, e desde 1990 que integra a National Film Registry, o arquivo da Biblioteca do Congresso Americano, que distingue e preserva obras cinematográficas de reconhecido valor cultural, estético e histórico.

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Vertigo é o triunfo artístico do grande mestre do mistério.NEW YORK TIMES

James Stewart interpreta Scottie, um ex-detective acrofóbico, contratado para seguir Madeleine (Kim Novak), a mulher suicida de um velho amigo. Depois de a salvar uma primeira vez, Scottie fica cada vez mais obcecado com a bela e perturbada jovem. Porém, a fobia de Scottie vai impedi-lo de salvar Madeleine novamente, e assiste inconsolável ao seu suicídio. Pouco depois conhece Judy, em quem revê obsessivamente Madeleine. As enigmáticas e inquietantes semelhanças entre as duas mulheres vão acabar por revelar um terrível segredo…

Com Vertigo, Hitchcock adapta a obra D’Entre les Morts, dos franceses Pierre Boileau e Thomas Narcejac, escrito em Paris no decorrer da Segunda Guerra Mundial. O realizador François Truffaut chegou a insinuar que os autores teriam escrito este livro já com a intenção de o apresentar a Hitchcock e, o que é certo, é que a Paramount Pictures contactou os autores ainda antes de existir uma edição inglesa do romance. Na adaptação, Hitchcock e a sua equipa de argumentistas transpuseram a ação do livro para a cidade de São Francisco e alteraram um pouco a sequência de eventos, nomeadamente a revelação do segredo por

3 MAI 2020DOMINGO

VERTIGO — A MULHER QUE VIVEU DUAS VEZES (1958)DE ALFRED HITCHCOCK COM JAMES STEWART, KIM NOVAK, BARBARA BEL GEDDES, TOM HELMORE, HENRY JONES

16H / M/12GRANDE AUDITÓRIODURAÇÃO: 128 MINUTOSNOVA VERSÃO RESTAURADA EM 4KDCP

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trás de Judy, pois Hitchcock considerava que a cadência dos acontecimentos no romance tornava o enredo menos apelativo.

Uma das razões que colocou Vertigo na história do cinema foi o inovador efeito visual que ficou eternizado como o vertigo effect (ou Dolly Zoom). Trata-se de um efeito original obtido pelo gradual afastamento ou aproximação da câmara em relação ao objeto que está em primeiro plano, enquanto que, em simultâneo, uma lente faz zoom num movimento inverso sobre esse mesmo objeto. Sem nunca se alterar o tamanho nem a relação do objeto no quadro do plano, a perspetiva do fundo da imagem distorce-se, parecendo achatar-se ou ganhar mais profundidade. É este o efeito de imagem usado quando Scottie olha para baixo desde o topo da torre, para acentuar a altura e reproduzir o efeito de atordoamento de uma vertigem. Além de se tornar uma imagem de marca de Hitchcock, o Dolly Zoom tornou-se um dos efeitos visuais mais recorrentes no cinema.

O filme combina o talento de Hitchcock para criar tensão psicológica com uma estética inconfundível. Tal como tantos dos seus filmes, Vertigo é dominado pelo voyeurismo constante, construído num exercício permanente do olhar: o olhar escondido que persegue, tenso, atento aos detalhes, que deduz cenários e explicações e que transforma a verdade na ilusão daquilo que se quer ver. É esta a pulsão de Scottie, sempre oscilante entre a lucidez e a insanidade, entre a culpa e a inocência, que guia o espectador ao longo do filme e que, por isso, o torna cúmplice e testemunha de toda a história.

Em Vertigo, Hitchcock joga também com o espectador quando deixa em aberto o seu final, num mise-en- -abyme da queda da torre, terminando com Scottie a olhar para baixo, para o corpo de Judy, na vertigem da repetição da queda de Madeleine. É nesta repetição e paralelismo entre as situações que Hitchcock deixa espaço para a especulação e imaginação do espectador e assim permite que seja ele a dar continuidade à história narrada.

Em 1958, a receção de Vertigo não foi tão calorosa como de outros filmes de Hitchcock, recebendo críticas negativas pela fragilidade do enredo e do argumento. Conseguiu apenas duas nomeações para os Óscares (Melhor Som e Direção de Arte). Contudo, o tempo e as reposições

do filme foram sublinhando a sua originalidade técnica e estética que inscreveram Vertigo na história do cinema como um dos filmes mais definidores da obra de Hichcock.

Não é, por isso, de surpreender que, passados tantos anos, Vertigo continue a ser considerado por muitos a obra- -prima de Hitchcock e a ser uma referência recorrente nas listas dos melhores filmes de sempre, como a que a revista britânica Sight and Sound organizou em 2012, onde Vertigo foi eleito como o melhor filme de todos os tempos por mais de centena e meia de críticos de todo o mundo.

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É e será sempre a maior e mais espetacular representação do mito da conquista do Oeste AmericanoNEW YORK TIMES

A Conquista do Oeste é uma saga épica que acompanha as aventuras de várias gerações de uma família de pioneiros rumo ao Oeste, atravessando episódios marcantes da história e expansão da América como a corrida ao ouro, a Guerra Civil e a construção das linhas férreas. Este périplo inicia-se na década de 1830, no canal de Erie (Nova Iorque) e termina na costa leste do continente americano cinco décadas depois, sendo constituído por cinco segmentos que delineiam o percurso da família Prescott, ligados pela narração de Spencer Tracy.

Cada segmento foi realizado por alguns dos mais relevantes realizadores de westerns norte-americanos: Henry Hathaway, mentor do projeto, realizou os segmentos Rios, Planícies e Os Fora-da-Lei; John Ford dirigiu o segmento da Guerra Civil Americana; George Marshall ficou encarregue do segmento Estrada de Ferro; e, apesar de não creditado, Richard Thorpe foi o responsável pelas sequências históricas que fazem de separador dos vários segmentos.

7 JUN 2020DOMINGO

A CONQUISTA DO OESTE (1962)DE JOHN FORDHENRY HATHAWAYGEORGE MARSHALLRICHARD THORPE COM JOHN WAYNE, JAMES STEWART, HENRY FONDA, DEBBIE REYNOLDS

16H / M/6GRANDE AUDITÓRIODURAÇÃO: 164 MINUTOSDCP

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Em termos narrativos, o filme não acrescenta propriamente nenhuma novidade ao género. Pelo contrário, é uma antologia e revisitação das histórias e temas cliché, locais lendários, personagens estereótipo de meio século de história de westerns norte-americanos, conduzidos num desfile de lendários atores como Henry Fonda, James Stewart, Gregory Peck, Carrol Becker, George Peppard, Debbie Reynolds, entre tantos outros.

Porém, em termos técnicos, A Conquista do Oeste foi pioneiro. Foi o primeiro, mas também o último filme narrativo feito em Cinerama, uma tecnologia inovadora que conjugava três faixas de imagem filmada em 35mm por três câmaras em simultâneo, para gerar uma imagem extremamente panorâmica e que exigia, também na projeção, a utilização de três projetores e de um ecrã curvo para criar essa imagem única do filme. Esta tecnologia foi desenvolvida nos anos 1950 com os exóticos travelogues, os filmes de viagem que transportavam os espectadores para partes do mundo nunca vistas, numa experiência imersiva que tentava preencher todo o espectro da visão periférica do espectador e dar quase uma sensação de tridimensionalidade.

A estética de A Conquista do Oeste, em certo sentido, não difere muito da destes travelogues, revisitando as paisagens e lugares icónicos que os westerns norte- -americanos eternizaram. É difícil imaginar um tema ou um género cinematográfico que, como o western, pudesse tão bem aproveitar as características desta tecnologia. Porém, a complexidade, limitações e recursos exigidos para filmar neste suporte ditaram imediatamente a sua obsolescência.

Apesar da deslumbrante definição da imagem, com uma profundidade de campo praticamente infinita e perfeitamente focada, do pormenor em primeiro plano ao recorte da paisagem no fundo da imagem, o dispositivo necessário para filmar A Conquista do Oeste foi demasiado complexo. A câmara de Cinerama pesava mais de 400 quilos e, ainda que conseguisse ser impressionantemente ágil num eixo frontal, não conseguia uma performance aceitável quando se tratava de panorâmicas ou movimentos laterais, o que limitou muito as escolhas dos realizadores. Por outro lado, era necessário estar constantemente a disfarçar as zonas de junção de cada uma das três imagens,

fosse pela colocação estratégica de obstáculos, ou pela minuciosa coreografia dos atores e figurantes para que nunca transpusessem nenhuma destas linhas.

Não obstante, o domínio e aproveitamento técnico nesta prodigiosa produção são notáveis e fazem de A Conquista do Oeste uma experiência cinematográfica impressionante.

A receção comercial do filme não podia ter sido melhor, tendo estado em exibição contínua por mais de 120 semanas e conseguido o segundo melhor resultado de bilheteira de 1963. Das oito nomeações para os Óscares, venceu nas categorias de Melhor Argumento, Montagem e Som. Acima das premiações e reconhecimentos recorrentes, A Conquista do Oeste é um marco incontornável na indústria do cinema de entretenimento e um documento essencial para compreender a colonização da América do Norte.

Page 17: BELÉM - CCB · sobre o horror da Guerra do Vietname, um dos eventos mais trágicos da segunda metade do século XX. Inspirado na trama de Coração das Trevas (Heart of Darkness)

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