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Estudo sobre o impacto na saúde pública sociedade e economia dos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados [A study on the public health and socioeconomic impact of substandard and falsified medical products]

ISBN 978-92-4-851343-5

© Organização Mundial da Saúde 2018

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Citação sugerida. Estudo sobre o impacto na saúde pública sociedade e economia dos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados [A study on the public health and socioeconomic impact of substandard and falsified medical products]. Ginebra: Organização Mundial da Saúde; 2018. Licença: CC BY-NC-SA 3.0 IGO.

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Printed in Switzerland

Layout by Jean-claude Fattier

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Índice

AGRADECIMENTOS .........................................................VSIGLAS E ACRÓNIMOS ....................................................VII1 INTRODuçãO E VISãO GERAL ..................................1

1.1 A necessidade de evidências ................................................11.2 Defender a atenção e o investimento ...................................21.3 Abordagem do estudo ..........................................................2

2 PRIMEIRA PARTE: REVISÃO DA LITERATURA ...............52.1 Metodologia ..........................................................................5

2.1.1 Estratégia de pesquisa .................................................52.1.2 Avaliação da qualidade ................................................62.1.3 Análise dos dados .........................................................6

2.2 Resultados .............................................................................62.2.1 Distribuição por estratégia de amostragem ................72.2.2 Distribuição por técnica de análise ..............................82.2.3 Distribuição em todos os países por nível de

rendimentos ....................................................................82.2.4 Distribuição por categorias terapêuticas .....................92.2.5 Estimativa das taxas de insucesso observadas dos

produtos médicos de qualidade inferior e falsificados....102.2.6 Estimativa dos custos de aquisição (gastos) ................10

2.3 Discussão ..............................................................................112.3.1 Impacto da metodologia dos inquéritos sobre

os resultados ...................................................................112.3.2 Impacto das várias metodologias de teste ..................112.3.3 Impacto da desigual distribuição de estudos

no terreno ........................................................................122.3.4 Estimativa da prevalência de produtos médicos de

qualidade inferior e falsificados ......................................122.3.5 Estimativa dos custos de aquisição (gastos) ................122.3.6 Impacto das definições heterogéneas .........................13

3 SEGuNDA PARTE: MODELOS DE IMPACTO ..................153.1 Modelo 1: Pneumonia infantil .............................................15

3.1.1 Introdução ....................................................................153.1.2 Metodologia .................................................................163.1.3 Resultados ....................................................................163.1.4 Discussão ......................................................................16

3.2 Modelo 2: Paludismo na África Subsariana .........................173.2.1 Introdução ....................................................................173.2.2 Metodologia .................................................................173.2.3 Resultados ....................................................................173.2.4 Discussão ......................................................................18

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4 TERCEIRA PARTE: PRINCIPAIS ÁREAS A CONSIDERAR .......194.1 Impacto na saúde pública .....................................................19

4.1.1 Mortalidade e morbilidade ..........................................204.1.2 Prevalência das doenças ..............................................204.1.3 Resistência antimicrobiana ..........................................204.1.4 Perda de confiança .......................................................21

4.2 Impacto socioeconómico ......................................................214.2.1 Custos individuais e do agregado familiar ...................214.2.2 Custos dos sistemas de saúde ......................................234.2.3 Custos socioeconómicos ...............................................23

5 CONCLuSãO .....................................................................25

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AGRADECIMENTOSCumpre-nos apresentar os nossos agradecimentos aos seguintes especialistas pelos contributos que deram para este estudo:

Grupo de Trabalho de Peritos

Dr David Evans, Consultant and Chair, Switzerland; Aria Ilyad Ahmad, Consultant and Researcher, Canada;

Dr Ricardo Cavazos, Comisión Federal para la Protección contra Riesgos Sanitarios, Mexico City, Mexico; Dr Lou Garrison, Professor Emeritus, University of Washington, Seattle, United States of America; Dr Catherine Goodman, Professor in Health Economics and Policy, London School of Hygiene and Tropical Medicine, United Kingdom; Ms Erika Mattos da Veiga, Health Regulation Expert, Brazilian Health Regulatory Agency (ANVISA), Brasília, Brazil; Dr Anban Pillay, Deputy Director General, National Department of Health, Pretoria, South Africa; Dr Tomás Pippo, Director of Health Economics, Ministry of Health, Argentina; Dr Budiono Santoso, Vice Chairman, Gadjah Mada Medical Alumni Association, Yogyakarta, Indonesia; Dr Andreas Seiter, Senior Health Specialist, World Bank, Washington DC, United States of America.

Modelos de Impacto na Saúde Pública, Sociedade e Economia

Modelo para a pneumonia pediátrica: Professor Harry Campbell, Co-Director, Centre for Global Health and WHO Collaborating Centre of Population Health Research and Training, University of Edinburgh, Scotland; Dr Evropi Theodoratou, Centre for Global Health Research, University of Edinburgh, Scotland.

Modelo para o paludismo (Plasmodium falciparum): Dr Catherine Goodman, Professor in Health Economics and Policy, Dr Shunmay Yeung, Associate Professor in Tropical Medicine; Mr David Bath, Research Fellow in Health Economics, London School of Hygiene and Tropical Medicine, United Kingdom.

Revisão de pares

Kiu Tay-Teo, Honorary Research Fellow, Melbourne School of Population and Global Health, Melbourne, Australia; Naomi van der Linden, PhD, University of Technology Sydney (UTS), Centre for Health Economics Research and Evaluation (CHERE), Sydney, Australia.

Secretariado da OMS

Dr.ª Suzanne Hill, Ms Emer Cooke, Dr Clive Ondari, Mr Michael Deats, Ms Diana Lee, Ms Pernette Bourdillon Esteve, Ms Lisa Greenough

Agradecemos também aos Estados-Membros as suas valiosas observações durante o processo de consultas.

Queremos igualmente agradecer à Administração dos EUA para os Alimentos e Medicamentos, que financiou este estudo.

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VII

SIGLAS E ACRÓNIMOSACT associação medicamentosa à base de artemisinina

ALRI infeção respiratória aguda das vias inferiores

ANRM autoridade nacional reguladora dos medicamentos

API ingrediente farmacêutico ativo

CFR taxa de casos fatais

DALY anos de vida ajustados por incapacidade

GSMS Sistema Mundial de Vigilância e Monitorização

IOM Instituto de Medicina

PBMR países de baixos e médios rendimentos

QALY anos de vida ajustados por qualidade

VR registo vital

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1 INTRODUçÃO E VISÃO GERAL

1.1 A necessidade de evidênciasA presença de produtos médicos de qualidade inferior e falsificados nos países e o seu uso pelos doentes ameaça minar os progressos realizados para se atingirem os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável. Esses produtos podem não ter a qualidade, segurança ou eficácia necessárias, ameaçando assim a saúde das pessoas que os tomam. O problema dos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados continua a agravar-se, à medida que os sistemas globalizados de fabrico e distribuição se tornam cada vez mais complexos. Essa complexidade aumenta o risco de ocorrência de erros de produção ou de degradação dos medicamentos entre a fábrica e o consumidor. A crescente procura de medicamentos, vacinas ou outros produtos médicos em quase todos os países, a juntar a uma má gestão da cadeia de abastecimento e ao crescimento do comércio eletrónico também cria oportunidades para que os medicamentos falsificados sejam introduzidos na cadeia de abastecimento.

Infelizmente, é escassa a informação fidedigna sobre o verdadeiro impacto socioeconómico e na saúde pública exercido pelos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados. Torna-se necessária uma base de evidências mais forte para ajudar a prevenir, detetar e responder a produtos médicos de qualidade inferior e falsificados e à ameaça que eles representam para a saúde pública. “A falta de conhecimento sobre os custos económicos e para a saúde pública tem frustrado os esforços desenvolvidos no sentido de argumentar que os investimentos no reforço dos sistemas reguladores são proveitosos e tem impedido os países de compreenderem e atuarem sobre o problema no seu próprio território” (1).

Para determinar a dimensão de uma doença ou desafio à saúde pública, é preciso que haja definições claras. No domínio dos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados, essas definições não têm existido. Os média, o público em geral e até alguns investigadores académicos têm usado termos como “falso” e “contrafeito”, frequentemente intercambiáveis com outros termos. A Organização Mundial da Saúde (OMS) costumava usar o termo abrangente “produtos médicos de qualidade inferior, adulterados, falsamente rotulados, falsificados e contrafeitos,” embora os vários termos fossem interpretados de maneira diferente pelos diferentes Estados-Membros (2). Era muito controverso que o termo “contrafeito” fosse, por vezes, usado em algumas jurisdições para referir medicamentos que infringiam as patentes ou outros direitos de propriedade intelectual.

Em 2012, a Assembleia Mundial da Saúde criou o mecanismo dos Estados-Membros para proporcionar a supervisão, um forte empenho e a vontade política dos Estados-Membros e da OMS nesta matéria, numa perspetiva de saúde pública. As questões da propriedade intelectual são explicitamente excluídas do seu mandato e o mecanismo dos Estados-Membros trabalha sobre atividades prioritárias acordadas e destinadas a preencher lacunas específicas de dados sobre questões técnicas, incluindo a normalização de definições. Em Maio de 2017, a Assembleia Mundial da Saúde aprovou as definições sugeridas pelo mecanismo dos Estados-Membros, que se apresentam na Caixa 1 (3). Embora essas definições sejam agora claras, só recentemente foram aprovadas e a comparação dos estudos publicados antes de se chegar a este consenso não é linear.

Caixa 1: Definições da OMS para produtos médicos de qualidade inferior, não registados/não licenciados e falsificados (3)

Durante muitos anos, a resposta a esta grave ameaça à saúde publica esteve enredada na discussão de definições complexas que tinham diferentes significados para diferentes pessoas. Como reflexo dessa complexidade, em Maio de 2017, a OMS usou o termo “produtos médicos de qualidade inferior/adulterados /falsamente rotulados/falsificados/contrafeitos” (SSFFC). O mecanismo dos Estados-Membros da OMS para os produtos médicos SSFFC foi encarregado de rever essas definições, de modo a garantir que elas fossem consideradas numa perspetiva de saúde pública, sem ter em conta preocupações de propriedade intelectual. Com base nas suas deliberações, a Assembleia Mundial da Saúde, que é o órgão diretor da OMS, adotou as seguintes definições:

Produtos médicos de qualidade inferior Também chamados de produtos “fora das especificações”, são produtos médicos autorizados que não cumprem os padrões de qualidade ou as especificações, ou ambas.

Produtos médicos não registados/não licenciados

Produtos médicos que não foram submetidos a avaliação e/ou aprovação da autoridade reguladora nacional ou regional para o mercado em que são vendidos/distribuídos ou usados, sob reserva das condições autorizadas nos termos da regulamentação e legislação nacional ou regional.

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ESTUDO SOBRE O IMPACTO NA SAÚDE PÚBLICA SOCIEDADE E ECONOMIAdos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados

Produtos médicos falsificados

Produtos médicos que indicam a sua identidade, composição ou origem de forma deliberadamente fraudulenta.

Fonte: Apêndice 3 do Anexo ao documento A70/23, da Assembleia Mundial da Saúde de 2017

1.2 Defender a atenção e o investimentoPara estimar o verdadeiro impacto dos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados, é preciso recolher e analisar sistematicamente dados rigorosos, fiáveis e de qualidade. Para tal, o mecanismo dos Estados-Membros encomendou um estudo sobre o impacto socioeconómico e sobre a saúde pública dos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados, a realizar pela OMS. O estudo, juntamente com o relatório sobre o Sistema Mundial de Vigilância e Monitorização da OMS para os produtos médicos de qualidade inferior e falsificados, representa uma compilação abrangente de dados relacionados com produtos médicos de qualidade inferior e falsificados e faz parte de uma abordagem mais vasta que está a ser desenvolvida pela OMS e o mecanismo dos Estados-Membros, para prevenir, detetar e responder à disseminação de tais produtos. Esses relatórios, juntamente com outros documentos técnicos publicados pelo mecanismo dos Estados-Membros (ver Caixa 2), contribuem para a base de evidências mundial e apelam à atenção dos governos e ao investimento nas agências nacionais reguladoras dos medicamentos para combater o problema..

Caixa 2: Objetivos dos documentos técnicos publicados pelo mecanismo dos Estados-Membros (4)

• Identificação dos fatores que levam à emergência de produtos médicos de qualidade inferior e falsificados

• Recomendações às autoridades de saúde para detetarem e lidarem com os produtos médicos de qualidade inferior e falsificados

• Elaboração de um plano nacional de ação para prevenir, detetar e responder aos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados

• Criação de uma rede mundial de pontos focais reguladores

• Implementação de sistemas de rastreio e localização

• Compreensão das tecnologias de autenticação

• Obtenção de um entendimento comum a nível mundial sobre as definições de produtos médicos de qualidade inferior, não registados/não licenciados e falsificados

Fonte: http://www.who.int/medicines/regulation/ssffc/mechanism/en/

1.3 Abordagem do estudoOs objetivos originais do estudo, conforme definidos pelo mecanismo dos Estados-Membros, eram:

“Fornecer informação e quantificar os custos e o impacto socioeconómico dos medicamentos falsificados e de qualidade inferior, assim como determinar os potenciais custos e benefícios de reforçar os sistemas reguladores no sentido de garantir a cadeia de abastecimento dos produtos da saúde. Um segundo objetivo é sugerir um método que os países possam usar para avaliar a dimensão do problema no país, com base na experiência do primeiro objetivo. As opções de políticas para abordar quaisquer problemas identificados a nível de país estão fora do âmbito deste estudo e da competência dos países em questão” (1)..

Foi constituído um Grupo de Peritos composto por especialistas em saúde pública, regulação dos medicamentos e economia da saúde, para analisar as fontes de dados existentes e os métodos mais apropriados de recolha de dados sobre o impacto na saúde pública e socioeconómico dos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados. Reconheceu-se que cumprir os objetivos originais do estudo não era possível, devido à heterogeneidade dos dados sobre a prevalência e à ausência de informação empírica sobre custos. O âmbito foi também limitado com o objetivo de excluir considerações sobre questões de propriedade intelectual e as farmácias da Internet e incluir apenas dados do domínio público.

Para ajustar os parâmetros deste estudo, o Grupo de Peritos consultou a equipa da OMS com principal responsabilidade nesta questão. O Grupo de produtos médicos de qualidade inferior e falsificados lidera e coordena o Sistema Mundial de Vigilância e Monitorização da OMS (GSMS), um sistema internacional que fornece uma rede de pontos focais nas autoridades nacionais reguladoras dos medicamentos, com uma plataforma que lhes permite notificar e trocar informações sobre os produtos médicos de qualidade inferior e falsificados.

O relatório sobre o Sistema Mundial de Vigilância e Monitorização da OMS para os produtos médicos de qualidade inferior

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e falsificados, publicado em simultâneo com este estudo, fornece uma descrição pormenorizada da informação fornecida pelo GSMS nos seus primeiros quatro anos de funcionamento. O relatório usa estudos de casos de todo o mundo, para ilustrar as forças que movem o comércio destes produtos perigosos e apresenta uma panorâmica dos sistemas e ações que são necessários para prevenir, detetar e responder à ameaça colocada pelos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados. O Grupo de Peritos foi informado de que há produtos médicos de qualidade inferior e falsificados de todas a categorias terapêuticas, notificados por todas as regiões, incluindo por países de altos, médios e baixos rendimentos; uma percentagem significativa de casos notificados ao GSMS diz respeito a antimicrobianos, sendo os mais frequentemente notificados os antipalúdicos e os antibióticos. Assim, o foco deste estudo foi determinado por estas considerações de saúde pública, particularmente à luz da potencial ligação com a resistência antimicrobiana e infeções resistentes aos medicamentos.

O estudo implicou uma revisão da literatura e a análise de dois modelos de impacto. Os métodos, resultados e conclusões são desenvolvidos nas secções que se seguem.

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2 PRIMEIRA PARTE: REVISÃO DA LITERATURA

2.1 MetodologiaA revisão da literatura foi feita através de uma pesquisa da literatura académica, usando as bases de dados PubMed e MEDLINE. Foram identificados documentos publicados que relatavam estudos ou inquéritos efetuados no terreno sobre a qualidade dos medicamentos. À pesquisa foram adicionados termos que descreviam os produtos com alto risco de serem de qualidade inferior ou falsificados, o que aumentava a sensibilidade nessas áreas, uma vez que os documentos com interesse poderiam ter usado palavras-chave referentes a áreas terapêuticas específicas e não a títulos mais gerais.

2.1.1 Estratégia de pesquisaA pesquisa limitou-se a documentos publicados entre 1 de Janeiro de 2007 e 31 de Dezembro de 2016. O período escolhido era suficientemente longo para captar toda a documentação, mas também suficientemente curto para excluir os documentos que já não fossem relevantes. Foram excluídos os comentários e os editoriais. A estratégia de pesquisa utilizada está descrita na Caixa 3.

Caixa 3: Estratégia de pesquisa

Palavras-chave Limites(qualidade inferior OU adulterados OU falsificados OU falsos OU contrafeitos)

E (fármaco OU medicamento OU produto farmacêutico OU antibiótico OU anti-infeccioso OU antimicrobiano OU antipalúdico)

Data: 1 de Janeiro de 2007 – 31 de Dezembro de 2016

Tipo de publicação: NÃO (comentário OU editorial)

Nota: As datas indicadas representam as datas da publicação, não as datas da recolha dos dados. Muitos documentos não indicavam em que altura as amostras foram recolhidas.

A pesquisa destes termos na literatura foi efetuada em inglês. Quando os resultados apresentavam documentos noutras línguas, eles eram incluídos para serem considerados. A estratégia de pesquisa identificou algumas análises que compilavam informação acerca de documentos que pudessem caber no âmbito do estudo (5–12). Depois de compilados os documentos a considerar, foram verificados manualmente, para verificar se correspondiam aos critérios de inclusão e exclusão apresentados na Caixa 4.

Caixa 4: Critérios de inclusão e exclusão

Critérios de inclusão Critérios de exclusãoO documento deve ter sido publicado entre 1 de Janeiro

de 2007 e 31 de Dezembro de 2016

O documento ou os dados estão disponíveis no domínio público

O documento contém dados sobre a prevalência de produtos médicos de qualidade inferior e falsificados

Embora a terminologia usada no documento possa variar, devem ser assumidas as definições dadas aos termos usados, as quais devem ser mapeadas nas definições de trabalho da OMS para produtos médicos de qualidade inferior ou falsificados

O documento descreve a metodologia, incluindo o desenho da amostragem e o tamanho das amostras

O documento descreve a analise laboratorial e a farmacopeia de referência

O documento inclui considerações sobre propriedade intelectual na sua classificação

O documento é centrado na validação das tecnologias de teste e não na determinação da prevalência dos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados

As amostras foram compradas exclusivamente na Internet ou obtidas retrospetivamente na sequência da apreensão pelas autoridades policiais ou fabricantes farmacêuticos

O documento relata apenas a inspeção física do produto e/ou a embalagem, sem analisar o conteúdo

O documento relata testes em menos de 10 amostras

O documento relata resultados que já tinham sido relatados noutro local

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2.1.2 Avaliação da qualidadeOs documentos que se mantiveram no âmbito deste estudo, depois da aplicação destes critérios iniciais de inclusão e exclusão, foram submetidos a nova avaliação da qualidade. Pretendendo propor um método normalizado para conduzir uma amostragem e testagem estatisticamente válidas que pudessem fornecer números sobre a prevalência, Newton e os seus colegas propuseram uma Lista de Verificação das Orientações para a Notificação da Avaliação da Qualidade dos Medicamentos (MEDQUARG) relativamente a itens que deveriam ser incluídos nos inquéritos sobre a qualidade dos medicamentos (13). A revisão feita por Almuzaini et al. reduziu a Lista de Verificação MEDQUARG a uma classificação de dez pontos para a avaliação da qualidade (7).

Os seguintes pontos foram abrangidos pelos critérios de inclusão estabelecidos pelo Grupo de Peritos como essenciais, para corresponder ao âmbito de aplicação do estudo:

1. Referência à definição dos medicamentos de qualidade inferior ou falsificados usados 2. Descrição do desenho da amostragem e do cálculo do tamanho da amostra 3. Descrição clara das análises químicas.

O Grupo de Peritos determinou que qualquer documento que cumprisse três dos nove critérios adicionais deveria ser considerado, do ponto de vista metodológico, suficientemente rigoroso para ser incluído noutras análises. Esses nove critérios são os seguintes:

4. Tempo e localização do estudo claramente declarados5. Tipo de pontos de venda selecionados 6. Tipo e número de unidades de dosagem compradas em cada ponto de venda7. Amostragem aleatória usada 8. Informação sobre a pessoa que recolheu as amostras (compradores identificados versus compradores dissimulados)9. Avaliação da embalagem efetuada10. Análise estatística descrita11. Informações sobre a validação do método 12. Análise química efetuada com ocultação da embalagem.

2.1.3 Análise dos dadosOs documentos revistos neste estudo fornecem dados para 88 dos 194 Estados-membros da OMS. Tanto quanto possível, os dados de cada um dos documentos incluídos foram desagregados por país e tamanho da amostra correspondente. Vinte e oito dos documentos revistos incluíam dados sobre amostras recolhidas em mais de um país.

Os países foram depois agrupados por nível de rendimentos, segundo a classificação do Banco Mundial (14) (apresentados no Anexo 1). Um total de 904 amostras (menos de 2% do total da revisão) eram oriundas de estudos de vários países, que incluíam mais do que uma categoria de rendimentos e podiam ser desagregadas. Aproximadamente, dois terços dessas amostras podiam ser atribuídas à categoria “médios rendimentos”, que abrange tanto as categorias de países de rendimentos médios baixos como de rendimentos médios altos do Banco Mundial. Por isso, por uma questão de simplicidade, todas as 904 amostras dos estudos desses vários países foram incluídas na categoria de médios rendimentos, tendo sido posteriormente usadas para estimar as taxas de insucesso agregadas estimadas dos países de baixos rendimentos, segundo a classificação do Banco Mundial por nível de rendimentos .

Uma vez determinadas as taxas de insucesso agregadas observadas, os custos totais de aquisição (gastos) foram estimados, multiplicando a taxa relevante por uma estimativa do tamanho do mercado correspondente, com base nos dados disponíveis sobre a venda de produtos farmacêuticos. A Investigação BMI (Grupo Fitch) é uma firma de investigação que fornece análises macroeconómicas, industriais e financeiras dos mercados e também números sobre o total de vendas de produtos farmacêuticos na maioria das economias mundiais.

Uma vez que a prevalência foi estudada em mais pormenor nos países de baixos e médios rendimentos (PBMR), este estudo usou apenas os dados sobre as vendas de produtos farmacêuticos para este grupo de economias. Este método apenas capta os custos estimados de aquisição (gastos) de produtos médicos de qualidade inferior e falsificados e não toda a variedade de impactos socioeconómicos.

2.2 ResultadosA estratégia da pesquisa identificou 100 documentos publicados que cumpriam os critérios de inclusão para serem considerados. No total, os 100 documentos relatavam os testes e 48 218 amostras de medicamentos recolhidos em 88 países. Por outro lado, os dados de uma base de dados acessível ao público e mantida pela Farmacopeia dos Estados Unidos, conhecida como Base de Dados sobre a Qualidade dos Medicamentos (MQDB) (15), foram incluídos na revisão e representavam 13 909 das 48 218 amostras – cerca de 28,8% do total. A MQDB reúne os resultados dos testes realizados sob

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os auspícios de um programa financiado pelos Estados Unidos, que apoia os governos africanos, asiáticos e latino-americanos nos seus esforços para garantirem a qualidade dos produtos médicos que circulam na cadeia nacional de abastecimento. As amostras incluídas no conjunto de dados do presente documento foram recolhidas pelos reguladores, usando métodos não aleatórios, entre 2007 e 2013.A intenção original este estudo era incluir vacinas, kits de diagnóstico e outros produtos médicos. Mas quase todas as evidências encontradas estão relacionadas com medicamentos e, por isso, o estudo tem de centrar-se nos medicamentos. A lista de todos os documentos é apresentada no Anexo 2.

2.2.1 Distribuição por estratégia de amostragemO tamanho da amostra variava significativamente entre os estudos, oscilando entre 10 e mais de 15 000 amostras por estudo. Oitenta e cinco por cento das amostras provinham de inquéritos com mais de 500, como se ilustra na Tabela 1 abaixo. Os tamanhos grandes de amostras, obtidas usando metodologias apropriadas de amostragem, apresentam uma variabilidade muito mais baixa nos resultados. Todavia, os inquéritos que incluem tamanhos de amostras maiores são mais dispendiosos e levam mais tempo a concluir, o que poderá não ser viável em certos países ou projetos.

Tabela 1: Total de amostras por tamanho do inquérito

Tamanho do inquérito Número total de amostras incluídasMenos de 50 471

51–100 450

101–500 5 090

Mais de 500 40 893

Não especificado 1 314

TOTAL 48 218

Como se pode ver na Figura 2 abaixo, cerca de 77% de todas as amostras foram obtidas usando amostragem de conveniência e cerca de 23% usando amostragem aleatória. A amostragem de conveniência é uma “técnica de amostragem de não probabilidade baseada no critério do organizador do inquérito” e é normalmente usada para a utilização de recursos da forma mais eficiente ou baseada nos riscos (e.g., concentrando-se nos pontos de venda onde é elevado o risco de se encontrarem medicamentos de qualidade inferior e falsificados) (16). A amostragem aleatória é uma técnica de amostragem por probabilidade que apresenta estimativas confiáveis (com intervalos de confiança) da prevalência de pontos de venda de medicamentos de qualidade inferior e falsificados (16). Embora esta técnica seja ideal em termos de medição da prevalência, exige um tamanho grande de amostras e recursos adicionais, que nem sempre são possíveis para quem realiza os inquéritos.

Tabela 2: Taxas de insucesso observadas por estratégia de amostragem

Estratégia de amostragem

Total de amostras

Testes falhados Percentagem de testes falhados (95% CI)

Aleatória 11 300 2 209 19.5 (18.8–20.3)

De conveniência 36 918 2 885 7.8 (7.5–8.1)

TOTAL 48 218 5 094

IC: intervalos de confiança.

É de notar que a amostragem aleatória de determinados produtos, dentro de um determinado quadro de amostras, encontrou uma taxa de insucesso mais elevada do que as estratégias de conveniência. Para compreender as diferenças nestas taxas de insucesso, é necessário fazer análises que desagreguem toda a metodologia de amostragem, incluindo a compra aberta ou dissimulada de amostras e técnicas de análise.

Tanto quanto possível, este estudo destinava-se a desagregar amostras de diferentes tipos de pontos de venda ou pontos de inquéritos. Como se pode ver na Tabela 3 abaixo, a maioria (cerca de 60%) das amostras eram oriundas de uma combinação de pontos de venda públicos e privados, seguidos de cerca de 29% de amostras provenientes apenas de pontos de venda privados. Os tipos de pontos de venda de produtos farmacêuticos variam muito, tanto dentro de um país como entre os países. Mas esses pontos de venda podem, de modo geral, ser classificados como públicos (governamentais) e privados (licenciados/registados, i.e., privados registados com fins lucrativos ou privados sem fins lucrativos (organizações não governamentais (ONG)) (16).

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Tabela 3: Amostras recolhidas por tipo de ponto de venda/ponto de inquérito

Tipo de ponto de venda/ponto de inquérito Total de amostras

Só público 64

Só privado 14 068

Misto (público e privado) 29 172

Amostragem pela ANRM no porto de entrada 4 162

Não declarado 752

TOTAL 48 218

As amostras são desigualmente distribuídas em todas as estratégias de amostragem. As Tabelas 1 a 3 demonstram a necessidade de uma elaboração cuidadosa do protocolo do estudo, incluindo o tamanho da amostra e os tipos de pontos de venda selecionados.

2.2.2 Distribuição por técnica de análiseTanto quanto possível, o presente estudo normalizou os resultados através do escrutínio dos testes e limiares usados em cada estudo e reclassificando os seus resultados de acordo com as definições atualmente aplicáveis de produtos médicos “de qualidade inferior” e “falsificados”. Os resultados foram comparados com a farmacopeia de referência, para determinar se a amostra era considerada fora das especificações, usando uma técnica de análise apropriada. Os estudos incluídos na revisão usaram vários padrões da farmacopeia.Vale a pena notar que as amostras testadas nos estudos usando o Minilab1 tinham menos probabilidade de falhar do que as amostras dos estudos que usaram outros métodos de análise, incluindo testes de cromatografia líquida (HPLC) de alta resolução.Por outro lado, os limiares para a percentagem do ingrediente farmacêutico ativo (API) considerado “dentro das especificações “ variava conforme os autores e mesmo entre as farmacopeias: enquanto alguns consideravam uma concentração de API fora da janela dos 95% a 105% como de qualidade inferior, outras farmacopeias nacionais ou regionais, por vezes, têm uma janela mais ampla aceitável de API (por exemplo, 85% a 115% para o mesmo produto). De modo geral, não foi possível normalizar essas diferenças, porque a maioria dos documentos aprova ou reprova um determinado corte, e não a verdadeira percentagem de API detetada. A Tabela 4 mostra como a taxa de insucesso observada varia entre as diferentes estratégias de testagem.

Tabela 4: Taxas de insucesso observadas por técnica de análise

Testes Total de amostras Testes falhado Percentagem de testes falhados (95% CI)

HPLC 19 809 3 092 15.6 (15.1–16.1)

MinilabTM 20 010 1 002 5.0 (4.7–5.3)

Apenas outros testes químicos 4 705 622 13.2 (12.3–14.2)

Apenas espectroscopia/espectronomia 2 701 349 12.9 (11.7–14.2)

Métodos laboratoriais não especificados 993 29 2.9 (2.0–4.2)

TOTAL 48 218 5 094

IC: intervalos de confiança, HPLC: cromatografia líquida de alta resolução.

2.2.3 Distribuição em todos os países por nível de rendimentos Três quartos das amostras foram compradas a países da categoria de médios rendimentos. Os PBMR aparecem bastante mais do que os países de altos rendimentos nos inquéritos no terreno sobre a qualidade dos medicamentos. De notar que apenas foram incluídas 178 amostras de países de elevados rendimentos; por esse motivo, não é possível extrapolar para este grupo de países. A Tabela 5 mostra como os tamanhos das amostras variam de país para país agrupados por nível de rendimentos, segundo a classificação do Banco Mundial

1 Minilab é um kit de rastreio no terreno que usa cromatografia de camada fina e é capaz de fornecer informação semi-quantitativa sobre o API

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Tabela 5: Distribuição dos países por nível de rendimentos, segundo a classificação do Banco Mundial

Classificação do Banco Mundial dos países por nível de rendimentos

Número de países inquiridos Total de amostras

Baixos rendimentos 19 11 156

Médios rendimentos 56 36 884

Elevados rendimentos 13 178

TOTAL 88 48 218

2.2.4 Distribuição por categorias terapêuticasOs estudos que se concentram exclusivamente nos antipalúdicos, de longe os mais comuns nos 100 documentos revistos, apresentam taxas de insucesso observadas combinadas de 11,8% para as amostras de qualidade inferior e falsificadas. A prevalência mais baixa de medicamentos de qualidade inferior e falsificados foi registada nos estudos que testaram várias classes de produtos médicos, muitas vezes de várias regiões.

A maioria dos produtos testados em “outras classes únicas”, como se mostra na Tabela 6, eram medicamentos genitourinários e hormonas sexuais, em que a taxa de insucesso específica foi muito elevada: 56%. Neste mesmo subgrupo, a taxa de insucesso observada foi igualmente elevada entre 104 medicamentos anti-epilepsia testados, com uma falha de 65%. Isto poderá ajudar a explicar a elevada percentagem geral que falhou nos testes.

A Tabela 6 mostra a variação da taxa de insucesso observada dos medicamentos de qualidade inferior e falsificados em todas as categorias terapêuticas.

Tabela 6: Taxas de insucesso observadas por categoria terapêutica

Categoria terapêutica Total de amostras

Testes falhados Percentagem de testes falhados (IC 95%)

Antipalúdicos 18 764 2 219 11.8 (11.4–12.3)Antibióticos e outros produtos anti-infecciosos 12 375 895 7.2 (6.8–7.7)Várias categorias 8 094 584 7.2 (6.7–7.8)Medicamentos para a tuberculose 4 920 329 6.7 (6.0–7.4)Outras categoriasa 3 047 1 024 33.6 (31.9–35.3)Medicamentos para o VIH 1 018 43 4.2 (3.1–5.7)

TOTAL 48 218 5 094IC: intervalos de confiança

a Inclui medicamentos para a hipertensão, cancro e epilepsia, assim como analgésicos, uterotónicos e imunossupressores..

Os antipalúdicos e os antibióticos estão extremamente bem representados nos estudos: em conjunto, representam 64,5% das amostras. A preponderância destas classes de medicamentos nos estudos reflete também importantes preocupações de saúde pública, particularmente no que concerne à resistência antimicrobiana e às infeções resistentes aos medicamentos. A Fig. 1 apresenta a distribuição das amostras por categoria terapêutica, mostrando a elevada percentagem de “medicamentos antipalúdicos” e de “antibióticos e outros produtos anti-infecciosos”.

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Fig. 1: Amostras recolhidas por categoria terapêutica, mostrando a dominante representação de produtos antimicrobianos

a Inclui medicamentos para a hipertensão, cancro e epilepsia, assim como analgésicos, uterotónicos e imunossupressores

Como se referiu anteriormente, as estratégias de amostragem usadas nestes estudos raramente foram representativas de todos os pontos de venda num país e nunca representativos de todas as principais categorias terapêuticas. Especificamente, tendiam a sub-representar os pontos de venda do sector público e concentravam-se nos antimicrobianos que, normalmente, se encontram na extremidade inferior da gama de preços dos produtos farmacêuticos.

2.2.5 Estimativa das taxas de insucesso observadas dos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados

Como se explica na introdução e na secção 2.2.3, as estimativas das taxas de insucesso observadas apenas se podem aplicar aos países de baixos e médios rendimentos. Para além disso, os dados que estão sistematicamente disponíveis em todos os documentos revistos e que podem ser comparados com base na desagregação explicada na Secção 2.1.3, apenas permitem uma estimativa da taxa de insucesso observada, com base na taxa de insucesso das amostras testadas. Com base na Tabela 5, as estimativas das taxas de insucesso agregadas observadas nos PBMR, segundo a classificação do Banco Mundial dos países por nível de rendimentos, estão indicadas na Tabela 7.

Tabela 7: Estimativas das taxas de insucesso agregadas observadas nos PBMR, segundo a classificação do Banco Mundial dos países por níveis de rendimentos

Classificação do Banco Mundial dos países por nível de rendimentos

Amostras testadas Amostras falhadas Percentagem da taxa de insucesso (IC 95%)

Países de baixos rendimentos 11 156 1 166 10.5 (9.9 –11.0)

Países de médios rendimentos 36 884 3 906 10.6 (10.3–10.9)

IC: intervalos de confiança

• A taxa de insucesso agregada observada das amostras testadas de medicamentos de qualidade inferior e falsificados nos países de baixos e médios rendimentos é de, aproximadamente, 10,5%.

2.2.6 Estimativa dos custos de aquisição (gastos)O total estimado das vendas de produtos farmacêuticos publicado pela Investigação BMI (17), agrupado segundo a classificação do Banco Mundial dos países por nível de rendimentos, está resumido na Tabela 8.

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Tabela 8: Total de vendas de produtos farmacêuticos (2014), segundo a classificação do Banco Mundial dos países por nível de rendimentos

Classificação do Banco Mundial dos países por nível de rendimentos

Total estimado de vendas de produtos farmacêuticos (milhares de milhões de US$) (dados BMI)

Baixos rendimentos 4.61

Médios rendimentos 283.92

Uma das finalidades deste estudo foi tentar estimar a atual despesa dos países em produtos de qualidade inferior e falsificados. Contudo, os únicos dados publicamente disponíveis relativamente ao total estimado de vendas de produtos farmacêuticos estratificado por países de baixos e médios rendimentos são limitados: não são desagregados por classe terapêutica e, portanto, não permitem estimativas rigorosas sobre os custos.

No entanto, se tivéssemos de usar as estimativas combinadas não ponderadas do tamanho do mercado para os países de baixos e médios rendimentos (quase US$ 300 mil milhões) e as taxas de insucesso observadas (aproximadamente 10,5%), para calcular a possível despesa desses países, o total estimado resultante é da ordem dos US$ 30,5 mil milhões.

Mesmo que isto esteja apenas aproximadamente correto, fica sublinhada a urgente necessidade de abordar este problema e também a necessidade de dados mais rigorosos sobre a despesa a nível de país, para permitir uma estimativa mais aproximada do fardo económico que esses países suportam.

2.3 DiscussãoOs resultados acima referidos dependem muito da natureza intrínseca dos documentos revistos. As secções que se seguem tratam de algumas das limitações que devem ser consideradas em combinação com os resultados acima apresentados e sugerem outras áreas de investigação. Uma importante limitação deste estudo é que só poderia usar informação que fosse do domínio público (por exemplo, as estimativas sobre o tamanho do mercado disponíveis no domínio público não desagregam os dados com base nas categorias terapêuticas para todos os países). Para além disso, a pesquisa da literatura foi efetuada em inglês, o que limitava ainda mais a possibilidade de reunir dados para interpretação. Continua a existir a necessidade de métodos normalizados para produzir estimativas rigorosas e significativas sobre o impacto dos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados no seio dos sistemas de saúde e nas populações.

2.3.1 Impacto da metodologia dos inquéritos sobre os resultados “Os inquéritos apresentam uma panorâmica da situação da qualidade dos medicamentos; porém, o rigor, a fiabilidade e a interpretação dos dados obtidos dependem da concepção do inquérito, organização da recolha das amostras e dos recursos disponíveis” (16). A representatividade de uma amostra depende de duas coisas: a base de amostragem de onde os produtos (ou, no caso da vigilância das doenças, os doentes) são selecionados; e o método usado para selecionar amostras da referida base.

Os resultados só podem ser extrapolados com confiança, quando o método de amostragem é aleatório e o tamanho da amostra suficientemente grande. No entanto, é também importante referir que os resultados da amostragem aleatória apenas são representativos dos tipos de locais incluídos na base de amostragem. A prevalência de comprimidos de paracetamol de qualidade inferior e falsificados, calculada a partir de amostras aleatórias obtidas em dispensários dos hospitais públicos, não pode, por exemplo, ser extrapolada para vendas de paracetamol em farmácias ou mercados de rua. Inversamente, mesmo que a base de amostragem represente todos os pontos de venda do paracetamol a nível nacional, a extrapolação não é possível, se os produtos forem selecionados não aleatoriamente nesses pontos de venda, por exemplo, escolhendo marcas mais baratas, para minimizar o número de amostras recolhidas dentro do orçamento do estudo.

“É urgentemente necessário obter dados com um tamanho de amostra suficiente e com um desenho de amostragem aleatória para estimar corretamente a prevalência de medicamentos de má qualidade” (18). No entanto, deve reconhecer-se que as limitações de recursos pode tornar difícil a consecução desse objetivo para os investigadores

2.3.2 Impacto das várias metodologias de testeCompreender a prevalência (e, por extensão, o provável impacto) dos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados depende não apenas do modo como as amostras são selecionadas, mas também do tipo de testes efetuados. As tecnologias e os testes variam significativamente em termos de custo e sofisticação, assim como de função. A escolha dos testes usados depende do objetivo específico de um estudo, assim como dos recursos financeiros e técnicos disponíveis. Se o objetivo for determinar os efeitos de um medicamento sobre a saúde, os testes serão dirigidos para o conteúdo de API, assim como os testes de dissolução que afetam a biodisponibilidade. Se o objetivo for identificar os medicamentos de qualidade inferior, em particular, os testes poderão incidir sobre outras impurezas que possam constituir um sinal de degradação. As inspeções destinadas a identificar a falsificação colocarão maior ênfase na identidade ou fonte do produto, incluindo as indicações nas embalagens

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As diferenças das tecnologias de testes podem limitar a comparabilidade dos estudos, mesmo quando estes se destinam a medir a mesma coisa, nomeadamente, a presença e concentração do API declarado. Na extremidade mais sofisticada do espectro da análise química está a HPLC, combinada com a espectrometria de massa. As infraestruturas, os equipamentos e as competências técnicas necessárias para usar estas técnicas são consideráveis. Certas técnicas, tais como a cromatografia em camada fina estão mais generalizadas. Alguns dos outros métodos usados conseguem identificar a presença ou ausência de um API, mas não quantificá-lo com rigor. Por isso, não é possível ajustar as estimativas da prevalência dos medicamentos que contêm muito pouco ou demasiado API para prováveis desvios introduzidos por diferentes metodologias de teste.

As tecnologias desenvolvidas, principalmente, para serem usadas no terreno, são geralmente mais adequadas ao rastreio de aprovação ou reprovação. O GPHF-Minilab™, por exemplo, é um kit portátil que fornece orientações e equipamento (incluindo reagentes) para testes rápidos e fiáveis de 85 API, mostrando se o ingrediente correto está ou não presente (19). Nas Referências, são apresentadas várias revisões das diferentes tecnologias (3, 5, 20-22). Uma dessas revisões, feita por Kovacs et al. apresenta um útil resumo da finalidade, custos e aplicação de várias tecnologias de detecção física e química no terreno (21). Os autores realçam igualmente a necessidade urgente de melhores capacidades para testes de elevado volume, especialmente nos países e regiões de maior risco.

2.3.3 Impacto da desigual distribuição de estudos no terrenoOs produtos médicos de qualidade inferior e falsificados poderão estar desigualmente distribuídos nas categorias terapêuticas e nas regiões geográficas. Eles tendem a agrupar-se em zonas ou situações em que são elevados os fatores de risco que favorecem o fabrico ou a venda desses produtos. Um relatório sobre o Sistema de Vigilância e Monitorização da OMS para os produtos médicos de qualidade inferior e falsificados, publicado juntamente com este estudo, indica que isso acontece muitas vezes, quando as limitações de acesso a produtos seguros, de preço acessível e de qualidade coincidem com sistemas de má governação, incluindo práticas imorais e corrupção, e/ou capacidades técnicas deficientes para uma garantia de qualidade durante o fabrico e a distribuição. Essa coincidência poderá levantar suspeitas numa determinada categoria de produtos ou região geográfica.

Os autores do estudo adotam frequentemente uma abordagem baseada nos riscos, escolhendo investigar as zonas geográficas ou de produtos que acreditam serem vulneráveis aos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados. Determinados produtos poderão despertar também um interesse especial, devido à sua importância para a saúde pública ou à sua relevância para programas específicos de doenças. Nos documentos revistos para o presente estudo, o fardo das doenças da população-alvo, assim como o acesso aos medicamentos e seu impacto sobre a saúde pública, foram frequentemente referidos como fatores que contribuíram para decidir que categorias terapêuticas deveriam ser selecionadas. No entanto, os dados oriundos da vigilância baseada nos riscos não podem ser extrapolados para produtos noutros locais. A provável sub- ou sobre-representação que pode ser introduzida por essa desigual distribuição deve ser considerada no contexto deste estudo.

2.3.4 Estimativa da prevalência de produtos médicos de qualidade inferior e falsificadosA forma mais rigorosa de avaliar a prevalência de produtos médicos de qualidade inferior e falsificados seria testar uma amostra aleatória de todos os produtos médicos adquiridos numa amostra de pontos de venda nacionalmente representativa – desde os hospitais até às farmácias, desde os mercados de rua até à Internet. A informação sobre a natureza pública versus dissimulada da recolha de amostras também teria de ser disponibilizada. Dada a vasta dimensão e complexidade do mercado farmacêutico, a diversidade de produtos e os custos dos testes laboratoriais, esta estratégia não seria viável (nem sequer sensata) na maioria dos países ou mercados .

Nesta fase, com os dados disponíveis, apenas é possível estimar as taxas de insucesso agregadas observadas dos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados nos PBMR, o que poderá fornecer contributos para modelar ou, de outra forma, informar o trabalho futuro. Como os métodos são tão heterogéneos, não é possível realizar testes estatísticos sobre as diferenças entre as médias. As taxas de insucesso observadas são calculadas como percentagem das amostras reprovadas nos testes em cada categoria. Os autores preferiram usar o tamanho total da amostra como número básico, em vez do documento publicado como unidade de medida, de modo a mitigar o efeito dos vários tamanhos dos estudos no terreno.

2.3.5 Estimativa dos custos de aquisição (gastos)O impacto económico foi estimado apenas para os PBMR de onde foram retirados os dados de prevalência. Reconhece-se que existem alguns outros modelos que avaliam o impacto económico dos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados. No entanto, esses modelos não podem ser aplicados aos PBMR, devido à significativa diferença de rendimentos, quadros reguladores, acesso aos medicamentos e a existência de várias outras técnicas de medição. Vale a pena reiterar que um dos principais desafios deste documento era que os dados de prevalência estão principalmente disponíveis para os PBMR, que têm quantidades diferentes de dados económicos, e os dados económicos pormenorizados estão disponíveis para países de elevados rendimentos – para os quais existem dados limitados sobre a prevalência..

Os dados sobre a despesa dos sistemas de saúde com as diferentes classes de medicamentos estão disponíveis para muitos países. As despesas pessoais estão muito menos documentadas. Embora os números globais estejam disponíveis a partir dos dados dos inquéritos às famílias em muitos países, estes muito raramente discriminam os dados por categoria terapêutica.

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Apesar de tudo, existem dados sobre os preços dos medicamentos um pouco mais acima na cadeia de abastecimento (antes de chegarem aos doentes) fornecidos por várias empresas de análise de dados. Esses dados são, frequentemente, apresentados sob a forma de “vendas totais de produtos farmacêuticos” e podem, na realidade, refletir o preço grossista da mercadoria. Para estimar os custos de aquisição (gastos) de medicamentos de qualidade inferior e falsificados, este estudo presume que os preços cobrados pelos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados são os mesmos que os preços cobrados por uma alternativa de qualidade garantida. Os dados sobre os custos de aquisição (gastos) da Investigação BMI (17) usados neste estudo estão disponíveis ao público e não desagregam as estimativas por categoria terapêutica e por país ou nível de rendimentos.

2.3.6 Impacto das definições heterogéneasMuitos dos documentos revistos pra este estudo usam terminologia diferente ou usam definições para os termos “de qualidade inferior” e “falsificados” que não correspondem às novas definições da OMS. Como anteriormente se referiu, há um grande número de estudos que, por exemplo, apenas medem o nível de API como indicador para se determinar se um produto médico está fora das especificações. No entanto, é mais raro que os investigadores verifiquem a fonte ou os excipientes do produto e muito poucos têm capacidade para determinar a causa profunda para o facto de um produto não cumprir as especificações.

São poucos os estudos que relatam a autenticação dos registos dos produtos junto dos fabricantes. É, portanto, possível que muitos produtos classificados como de qualidade inferior sejam, de facto, falsificados. Os produtos falsificados que não indicam a sua verdadeira origem ou contêm, pelo menos, alguns dos API corretos, poderão passar em algumas formas de análise. Embora esses produtos sejam falsificados, os dados que permitem essa classificação não estão, normalmente, disponíveis, existindo por isso o risco de poderem ter sido mal classificados como produtos de qualidade inferior

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3 SEGUNDA PARTE: MODELOS DE IMPACTOComo foi referido na Primeira Parte, os estudos feitos no terreno sobre a qualidade dos produtos médicos não fornecem sistematicamente informação pormenorizada sobre a extensão do desvio dos resultados respeitantes às amostras analisadas em relação ao conteúdo (teor) de API esperado, nem testam sistematicamente a dissolução ou desintegração. Estes parâmetros são necessários para uma melhor avaliação do impacto de uma menor disponibilidade de API sobre a saúde dos doentes.

Apenas um dos documentos revistos neste estudo descrevia uma tentativa sistemática para estimar o impacto sobre a saúde dos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados relativamente a uma única doença, o paludismo (23). Mesmo com mais informação, o impacto sobre a saúde de um determinado limiar de API é, provavelmente, diferente em todas as categorias de doenças. Esse facto, juntamente cm a variação na prevalência de produtos médicos de qualidade inferior e falsificados em todas as classes terapêuticas, significa que estimativas rigorosas do impacto sobre a saúde exigiriam uma modelação separada para muitas das principais doenças – algo que ainda não se fez. Para além disso, não existem orientações metodológicas gerais para ajudar na tarefa de atribuir impactos sobre a saúde aos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados.

Isso significa que não é possível retirar conclusões gerais sobre o provável impacto na saúde dos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados, em geral. Num esforço para começar a colmatar essa lacuna na informação, o Grupo de Peritos solicitou que fossem elaborados dois modelos para estimar o impacto desses produtos sobre a saúde. Os modelos incidiam especialmente sobre a pneumonia infantil e o paludismo na África Subsariana e foram elaborados para a OMS pela Universidade de Edimburgo (modelo da pneumonia infantil) e pela Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres (modelo para o paludismo na África Subsariana). Os relatórios completos relativos a cada modelo são apresentados nos Anexos 3 e 4.

3.1 Modelo 1: Pneumonia infantilUma equipa da Universidade de Edimburgo foi mandatada pela OMS para investigar o impacto do uso de antibióticos de qualidade inferior e falsificados no tratamento da pneumonia infantil2. Este modelo fornece uma primeira estimativa do potencial impacto dos referidos antibióticos sobre as mortes por pneumonia entre as crianças de 0 a 5 anos

3.1.1 IntroduçãoEste modelo considera o potencial impacto sobre o tratamento da pneumonia infantil, uma das principais causas da mortalidade infantil em todo o mundo (24) e uma importante razão para se utilizarem os serviços de saúde (25) e a prescrição de antibióticos a nível mundial.

A falta de dados de boa qualidade na maioria dos PBMR significa que as primeiras estimativas dependerão muito da modelação dos dados. O presente modelo inspira-se em modelos já existentes para estimar a morbilidade e mortalidade por pneumonia infantil em todo o mundo (25– 27), nos dados de inquéritos alargados efetuados nos PBMR, que tentam estimar o nível de utilização de antibióticos no tratamento das infeções respiratórias em crianças pequenas e nos dados disponíveis de artigos de revisão publicados sobre a prevalência de medicamentos de qualidade inferior e falsificados. Essas fontes de informação foram usadas para se fazer uma primeira aproximação ao potencial impacto dos medicamentos de qualidade inferior e falsificados sobre a mortalidade por pneumonia infantil

Os objetivos do estudo foram:

• Receber da OMS estimativas sobre a prevalência do uso de medicamentos de qualidade inferior no tratamento da pneumonia infantil e estimar o seu impacto sobre a mortalidade por pneumonia; e

• Fornecer as primeiras estimativas aproximadas do aumento da mortalidade, por região da OMS e em todo o mundo, que pudesse estar associada ao seu uso

2 Pneumonia neste modelo refere-se a infeção respiratória aguda das vias inferiores em crianças com 0–5 anos

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3.1.2 MetodologiaA estimativa do impacto dos antibióticos de qualidade inferior e falsificados sobre a mortalidade de crianças por pneumonia tem sido abordada numa perspetiva mundial e a nível de dois grandes grupos de países “industrializados” e “em desenvolvimento” e também em dois cenários – em contexto hospitalar e comunitário. Presume-se que todas as crianças internadas com pneumonia grave recebem tratamento com antibióticos, mas que apenas uma pequena parte das crianças com pneumonia grave que não são internadas recebe tratamento com antibiótico. Por fim, foram considerados três níveis diferentes de prevalência mundial de antibióticos de qualidade inferior e falsificados usados no tratamento da pneumonia infantil (1%, 5% e 10%) e concluiu-se que estes resultam num aumento das taxas de casos fatais (CFR):i. Ou a duplicação do aumento consistente com a menor atividade do antibiótico /menor eficácia dos antibióticos de

qualidade inferior e falsificados;ii. Ou a quadruplicação do aumento consistente com uma atividade/eficácia nula dos antibióticos de qualidade inferior e

falsificados.

A literatura disponível sugere que o primeiro cenário (duplicação do aumento) é o mais plausível. O modelo acima foi depois usado para estimar o excesso de mortes que resultam do aumento das CFR associadas ao uso de antibióticos de qualidade inferior e falsificados. As estimativas consideraram dados do ano 2010.

3.1.3 ResultadosA Tabela 9 resume os resultados sobre o excesso de mortes causadas por pneumonia grave devido a antibióticos de qualidade inferior e falsificados, a níveis de prevalência de antimicrobianos de qualidade inferior e falsificados de 1%, 5% e 10% (presumindo que o uso de medicamentos de qualidade inferior e falsificados resulta num aumento duplicado ou quadruplicado das CFR).

Tabela 9: Resultados sobre o excesso de mortes causadas por pneumonia grave devido a antibióticos de qualidade inferior e falsificados em contexto hospitalar e comunitário

Prevalência de produtos de qualidade inferior e falsificados (%)

Número de mortes em excesso no cenário mais provável

(aumento duplicado da CFR)

Número de mortes em excesso num cenário alternativo

(aumento quadruplicado da CFR)

1 8 688 18 372

5 37 018 85 438

10 72 430 169 271

A Tabela 9 mostra uma variação muito grande entre:

A hipótese de um aumento duplicado da CFR (cenário mais provável)• 8 688 mortes, se a prevalência de antimicrobianos de qualidade inferior e falsificados for 1%, para 72 430 mortes a uma

prevalência de 10%;• o número de mortes associadas a um aumento de 1% na prevalência de medicamentos de qualidade inferior e falsificados

é de 7 082

A hipótese de um aumento quadruplicado da CFR (cenário alternativo)• 18 372 mortes, com 1% de prevalência de antimicrobianos de qualidade inferior e falsificados, para 169 271 mortes

com 10% de prevalência;• o número de mortes associadas a um aumento de 1% na prevalência de medicamentos de qualidade inferior e

falsificados é de 16 766.

Com base em 10% de prevalência de antibióticos de qualidade inferior e falsificados, este modelo estima que: • Até 72 430 mortes por pneumonia infantil podem ser atribuídas ao uso de antibióticos de qualidade inferior e

falsificados, se houver uma menor atividade do antibiótico • Este aumento vai até 169 271 mortes, se os antibióticos de qualidade inferior e falsificados não tiverem qualquer

atividade

3.1.4 DiscussãoEste modelo fornece a primeira estimativa aproximada do potencial impacto dos antimicrobianos de qualidade inferior e falsificados no tratamento da pneumonia infantil, uma das principais causas da prescrição de antimicrobianos e das mortes de crianças em todo o mundo. A falta de dados de boa qualidade sobre a prevalência do uso de antimicrobianos de qualidade inferior e falsificados nas crianças a nível mundial e sobre a percentagem de crianças pequenas com pneumonia que são tratadas com antimicrobianos significa que só é possível fornecer estimativas com base numa série de pressupostos fundamentados nas revisões publicadas (7, 10, 12, 28).

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O modelo integral (ver Anexo 3) descreve as limitações dos dados disponíveis e a abordagem de modelação adotada. Os limites dos níveis de parâmetros explícitos e a direção provável dos desvios são apresentados juntamente com estas estimativas, para promover uma revisão crítica e orientar a interpretação. O uso de produtos de qualidade inferior e falsificados tem impactos mais vastos sobre a saúde e a economia que não foram considerados neste exercício. Por conseguinte, as estimativas do modelo poderão sub-representar o verdadeiro impacto sobre a saúde do uso destes produtos no tratamento da pneumonia infantil. Isso merece uma atenção prioritária nos programas mundiais e nacionais de luta contra a pneumonia, uma vez que estas mortes são evitáveis.

Espera-se também que este trabalho encoraje a intensificação de esforços na recolha e notificação de dados, de forma normalizada, e o desenvolvimento subsequente de melhores estimativas.

3.2 Modelo 2: Paludismo na África Subsariana Uma equipa da Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres foi mandatada pela OMS para investigar os custos para a saúde e para a economia do uso de produtos médicos de qualidade inferior e falsificados no tratamento de primeira linha do paludismo por Plasmodium falciparum não complicado na África Subsariana.

3.2.1 IntroduçãoA análise baseia-se num modelo de árvore de decisão sobre doença febril que segue os casos de paludismo desde o diagnóstico e tratamento iniciais até ao resultado final.

3.2.2 MetodologiaA prevalência de antipalúdicos de qualidade inferior e falsificados baseou-se numa revisão dos estudos sobre a qualidade dos antipalúdicos na África Subsariana, usando uma amostragem aleatória e publicados entre 2001 e 2016 (10 estudos, 17 países). A percentagem de amostras com API inferiores a 85% foi estimada em 7,6% para a associação medicamentosa à base de artemisinina (ACT) e 10,4% para outros antipalúdicos (não ACT). A análise modelou o impacto incremental dessa prevalência de antipalúdicos de qualidade inferior e falsificados na eficácia do tratamento, comparando a atual prevalência com um cenário ideal hipotético, em que todos os antipalúdicos continham níveis de API acima de 85%. A redução da eficácia dos antipalúdicos foi calculada para a percentagem de casos que receberam um nível de API abaixo de 85%. O nível de API consumido foi calculado como produto de qualidade medicinal e a quantidade de dose tomada (i.e., adesão do doente ao tratamento).

O impacto sobre a saúde foi avaliado em termos de mortes e anos de vida ajustados por incapacidade (DALY) e o impacto sobre a economia em termos de custos com o doente e o prestador de cuidados relacionados com o prolongamento do tratamento e dos cuidados por ter falhado tratamento inicial. Os resultados foram estimados para um coorte hipotético de 1 milhão de casos de paludismo que procuraram tratamento, contendo uma combinação de casos em contextos de baixa transmissão (<10% de parasitemia em doentes que se apresentavam com febre) e de elevada transmissão (>10% de parasitemia). O impacto total sobre a saúde e a economia dos antipalúdicos de qualidade inferior e falsificados na África Subsariana foi também modelado, com base nas estimativas de casos de paludismo anuais.

Os parâmetros do modelo, incluindo a probabilidade de progressão da doença relativamente aos doentes que não recebiam tratamento eficaz e a probabilidade de doença grave conducente à morte, com ou sem cuidados adicionais, foram retirados da literatura disponível. O modelo de casos de base parametrizada dá uma CFR global de 0,79% para os casos de paludismo que procuraram tratamento e 1,04% para todos os casos de paludismo. Um “caso ajustado por CFR” foi também calculado, em que as estimativas para a progressão da doença e mortalidade foram ajustadas de modo a gerar uma CFR global de 0,45% para todos os casos de paludismo – consistente com a CFR usada pela OMS para modelar a mortalidade por paludismo

3.2.3 ResultadosA análise de casos de base estimou mais 529 mortes (caso ajustado por CFR: 230 mortes) por 1 milhão de casos de paludismo que procuraram tratamento, como resultado da menor eficácia dos antipalúdicos de qualidade inferior e falsificados. Com base em dois conjuntos diferentes de estimativas sobre casos de paludismo anuais (do Relatório Mundial sobre o Paludismo e da Iniciativa Clinton para o Acesso à Saúde), a análise de casos de base estimou que os antipalúdicos de qualidade inferior e falsificados contribuíram com mais 72 000–267 000 mortes (caso ajustado por CFR: 31 000–116 000 mortes) anualmente na África Subsariana. O total do impacto anual sobre a economia (caso de base) devido à procura de tratamento e cuidados adicionais foi estimado entre US$ 12,1 milhões e US$ 44,7 milhões (caso ajustado por CFR: US$ 10,4 milhões e US$ 38,5 milhões). A Tabela 10 resume estes resultados.

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Tabela 10: Impacto sobre a saúde e a economia devido a uma menor eficácia dos produtos antipalúdicos de qualidade inferior e falsificados

Aumento do impacto sobre a saúde (mortes) Aumento do impacto sobre a economia (uSD 2017)

Casos do WMR Casos da CHAI Casos do WMR Casos da CHAI

Caso base 72 000 (40 000 –98 000)

266 906 (147 000 –364 000)

$12 100 000 (6 700 000 –16 500 000)

$44 700 000 (24 800 000 –60 800 000)

Caso ajustado por CFR

31 000 (17 000 –43 000)

116 000 (64 000 –158 000)

$10 400 000 (5 800 000 –14 200 000)

$38 500 000 (21 400 000 –52 400 000)

CFR: taxa de casos fatais. WMR: Relatório Mundial sobre o Paludismo. CHAI: Iniciativa Clinton para o Acesso à Saúde

Tanto para o caso base como para o caso ajustado por CFR, estima-se que o aumento de mortes na África Subsariana devidas a antipalúdicos de qualidade inferior e falsificados compreenda:• Aproximadamente, 2,1% a 4,9% do total de mortes por paludismo ou• Aproximadamente, 3,8% a 8,9% de mortes por paludismo relacionadas com casos que procuraram tratamento

3.2.4 DiscussãoO modelo realçou uma considerável incerteza relativamente à análise e advertiu que os resultados deveriam ser considerados apenas provisórios e ilustrativos. Dadas as limitações dos dados disponíveis, é provável que os resultados desde modelo sub-representem todo o impacto dos produtos antipalúdicos de qualidade inferior e falsificados sobre a saúde e a economia. Em particular, as estimativas da prevalência de antipalúdicos de qualidade inferior e falsificados basearam-se num número limitado de estudos que poderão não ser passíveis de generalização ao mais vasto contexto da África Subsariana. O estudo não considerou o impacto da dissolução, uma característica importante mas negligenciada da qualidade dos medicamentos, devido ao número muito limitado de dados disponíveis. O impacto dos eventos medicamentosos adversos relacionados com os antipalúdicos de qualidade inferior e falsificados também não foi modelado pelas mesmas razões. As estimativas do impacto económico consideraram o aumento dos custos com os cuidados do prestador e do doente necessários como resultado do insucesso do tratamento inicial, mas não incluíram despesas de viagem, nem o impacto económico sofrido devido à perda de produtividade. Havia também grandes incertezas nas estimativas do número de casos de paludismo na África Subsariana em que se basearam as estimativas do impacto dos antipalúdicos de qualidade inferior e falsificados na África Subsariana, em geral. Apesar dessas limitações, o modelo demonstra que os antipalúdicos de qualidade inferior e falsificados têm um impacto considerável, tanto em termos de saúde como em termos económicos, esperando-se que fundamente e encoraje novas investigações, para melhor se entender a natureza e o impacto dos antipalúdicos de qualidade inferior e falsificados na África Subsariana e não só.

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4 TERCEIRA PARTE: PRINCIPAIS ÁREAS A CONSIDERAR

Esta secção apresenta algumas das principais áreas que precisam de ser aprofundadas para se obterem estimativas mais precisas. Este estudo é apresentado como documento de advocacia, representando o primeiro passo no sentido de compreender melhor o impacto (resumido na Fig. 2) socioeconómico e na saúde pública dos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados. Mas há mais a fazer.

Fig. 2: Impacto dos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados

4.1 Impacto na saúde públicaO estudo visava apurar o que se sabe acerca do impacto dos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados na saúde pública. Para alcançar este objetivo, seria desejável estimar a proporção desses produtos médicos potencialmente prejudiciais para a saúde. Falar de impactos na saúde é falar, nomeadamente, de morte, de incapacidade e/ou aumento da doença a nível individual, com implicações mais vastas ao nível dos sistemas de saúde.

Os métodos para estimar a mortalidade e morbilidade estão muito bem definidos, por exemplo, relativamente aos anos de vida perdidos. As medidas que resultam da aplicação destes métodos incluem o seguinte:

• Anos de vida perdidos: trata-se de uma forma simples de medição da mortalidade atribuível a doença ou patologia.

• Anos de vida ajustados pela qualidade (QALY) e anos de vida ajustados por incapacidade (DALY): Uns (QALY) e outros (DALY) destinam-se a medir os anos de vida vividos ajustados ao estado de saúde. Desta forma, estas medições conjugam a mortalidade (anos não vividos devido à doença) com a morbilidade (anos vividos com saúde deficitária) num único número. Embora as tecnicidades sejam algo diferentes, na prática, cada uma das medidas expressa o inverso da outra. Os QALY representam anos de vida saudável ganhos na ausência de uma doença, enquanto os DALY estimam os anos de vida saudável perdidos com a existência de uma doença.

Para além da medição da mortalidade, da morbilidade e da qualidade de vida, são possíveis outras medições para captar o impacto dos medicamentos de qualidade inferior ou falsificados sobre a saúde pública..

• Prevalência da doença: encontram-se devidamente estabelecidos métodos para estimar a prevalência da maioria das doenças infecciosas. Embora possam diferenciar-se por doença, as estimativas da prevalência tendem a basear-se, em grande medida, nos métodos de vigilância.

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• Resistência antimicrobiana: Apesar de baseadas nos dados gerados por sistemas de vigilância da saúde pública, as estimativas da resistência antimicrobiana são mais complexas, dado que são apenas válidas para determinadas combinações de fármacos e agentes patogénicos. Após estudos de caso, as melhores medições associando medicamentos de qualidade inferior e falsificados à resistência antimicrobiana resultam assim de modelos matemáticos. Contudo, a utilidade destes modelos depende inteiramente da fiabilidade das suas premissas e da qualidade dos dados inseridos (29). Por esta razão, tais modelos concentram-se frequentemente em categorias terapêuticas e populações-alvo muito restritas.

Estes métodos e medições são difíceis de utilizar, dado que os produtos médicos podem ser de qualidade inferior ou falsificados por variadas razões, nomeadamente, irregularidades relacionadas com a identificação, composição ou proveniência, podendo todas elas ter implicações muito diferentes na saúde pública. É, portanto, necessário que exista informação suficiente para tirar ilações plausíveis sobre a distribuição dessas dificuldades específicas dentro da categoria mais ampla dos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados.

4.1.1 Mortalidade e morbilidadeQualquer produto que contenha um contaminante perigoso (incluindo níveis perigosamente elevados de API) representará um perigo imediato para o indivíduo que o tome. Os doentes podem morrer ou passar por um surto mais prolongado da doença, se o seu problema de saúde não for tratado porque o “medicamento” que tomam não contém qualquer API ou este se encontra em concentrações subterapêuticas. No entanto, o limiar no qual os produtos subterapêuticos se tornam uma ameaça para a saúde não está bem definido e provavelmente varia consoante os produtos. Quando os profiláticos (as vacinas, por exemplo) são de qualidade inferior ou falsificados, podem deixar as pessoas sem defesas contra a doença no futuro.

4.1.2 Prevalência das doençasQuando as doenças infecciosas não são prevenidas, porque os produtos profiláticos são de qualidade inferior ou falsificados, ou quando as infeções não são curadas ou controladas, a prevalência de doenças provavelmente aumentará. Um maior número de pessoas infetadas aumenta a probabilidade de posterior transmissão da doença, elevando o risco para as comunidades mais alargadas: no mundo globalizado de hoje, no qual os micróbios percorrem longas distâncias com os seus hospedeiros humanos, tal envolve a propagação rápida de doenças a regiões não endémicas.

Um antipalúdico ou um contracetivo de emergência, por exemplo, que, a olho nu, pareçam iguais aos produtos autorizados, mas são compostos de amido de batata ou de milho, podem não causar uma reação tóxica, mas não conseguirão tratar o paludismo ou prevenir a conceção. Os sistemas de saúde que apresentam lacunas a nível das capacidades reguladoras, incluindo a farmacovigilância e a vigilância após a introdução no mercado, podem deparar-se com o atraso ou falha total na captação de sinais da falta de eficácia inesperada de um produto. Embora nem todos esses casos possam ser atribuídos a medicamentos de qualidade inferior ou falsificados, eles podem resultar em incidentes epidemiológicos negligenciados, contribuindo para o aumento da prevalência da doença.

4.1.3 Resistência antimicrobianaA resistência antimicrobiana é, em parte, acionada por agentes patogénicos que são expostos a doses subterapêuticas de tratamento, o que pode ser causado pela administração de antimicrobianos de qualidade inferior ou falsificados. Em muitos casos, os níveis de API são tão reduzidos ou inexistentes que o tratamento se revela ineficaz. A resistência antimicrobiana acontece mais eficazmente quando a concentração de API é suficientemente elevada para matar uma quantidade de agentes patogénicos suscetíveis suficientemente significativa para conferir uma vantagem reprodutiva em variantes mutantes, não sendo entretanto suficientemente elevada para exterminar eficazmente as variantes mutantes – uma série conhecida como “janela de seleção de mutantes” (30, 31). Não está claramente determinado quais os limites de concentrações de API que se integram na janela de seleção de mutantes, a qual provavelmente varia de acordo com cada agente patogénico, doente ou produto. O conjunto de micróbios remanescentes, alguns dos quais podem incluir mutações que conferem resistência contra o medicamento utilizado, enfrenta menos competição e consegue reproduzir-se mais rapidamente. Dessa forma, podem ser estabelecidas colónias de agentes patogénicos resistentes ao medicamento em causa e a subsequente propagação é facilitada. As pessoas que desenvolvem infeções resistentes devido a medicamentos de qualidade inferior ou falsificados num dado país podem facilmente viajar para outro país e transmitir a infeção mutante.

Os esforços para quantificar a ligação entre medicamentos de qualidade inferior e falsificados e a resistência antimicrobiana têm sido simultaneamente episódicos e estatísticos, embora centrados predominantemente na investigação sobre antipalúdicos. Com base em inquéritos efetuados no terreno, por exemplo, Dondorp e os seus colegas demonstraram que 53% das amostras de antipalúdicos colhidas no Sudeste Asiático continham níveis incorretos de API (31). “Medicamentos antipalúdicos de qualidade inferior causam resistência aos medicamentos e um tratamento inadequado, o que constitui uma grave ameaça para as populações mais vulneráveis e põe em causa os progressos e investimentos na luta contra o paludismo” (9).

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Num outro estudo, Lubell e os seus colegas modelizaram os custos humanos e económicos associados à resistência aos tratamentos antipalúdicos em mais de 116 000 mortes por ano (32)3. Para além disso, apesar de os medicamentos antipalúdicos e antibióticos serem geralmente pouco dispendiosos, quando comparados com outros tipos de medicamentos, são vendidos em grandes quantidades, através de uma grande variedade de pontos de venda.

Por fim, os elevados níveis de resistência antimicrobiana fazem também crescer o perigo ao tratar doenças não transmissíveis como o cancro ou quando se realizam cirurgias de rotina, situações em que os antibióticos são usados profilaticamente.

4.1.4 Perda de confiançaUm outro potencial efeito dos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados é a perda da confiança na medicação e nos sistemas de saúde por parte do público. As desconfianças em relação à qualidade dos medicamentos, ao manterem as pessoas afastadas de determinadas unidades de saúde, recusando a vacinação dos seus filhos e não cumprindo tratamentos conforme prescrito, podem prejudicar a sua saúde.

Os produtos médicos de qualidade inferior e falsificados podem, além disso, contribuir para uma perda de confiança, se os doentes e famílias começam a desconfiar e suspeitar dos profissionais de saúde, do sistema de saúde ou mesmo de outras instituições públicas. Isto pode resultar, por exemplo, na renúncia completa dos doentes aos tratamentos ou mesmo no recurso a medicamentos alternativos obtidos através de pontos de venda e/ou prestadores de cuidados de saúde não regulamentados. Diversas partes interessadas, desde académicos a responsáveis políticos, chamaram a atenção para esta questão pelas significativas consequências que ela pode ter para os sistemas de saúde (5, 18, 33). Muitas das evidências basearam-se em estudos ou inquéritos a doentes, constatando-se a necessidade de métodos padronizados para a produção de estimativas precisas e significativas do impacto dos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados neste contexto.

4.2 Impacto socioeconómicoSe os dados sobre a prevalência são dispersos e incompletos, os estudos dos impactos na saúde e na economia são praticamente inexistentes. A lacuna de informação mais pertinente nesta área prende-se com a atribuição. Não faltam aos economistas da saúde métodos fiáveis para estimarem o custo e o impacto económico de uma doença ou as poupanças que podem ser acumuladas com uma intervenção. No entanto, para utilizar esses métodos, eles terão de poder atribuir um resultado de saúde a um agente patogénico ou fator de risco. Neste caso, o “fator de risco” é um produto médico fora das especificações. Embora um conjunto de trabalhos em torno da farmacocinética possa fornecer indicações úteis sobre os impactos da dosagem subterapêutica na saúde, haveria necessidade de continuar a trabalhar para compreender plenamente as suas implicações na saúde, que seriam diferentes de um tratamento para outro.

São de destacar duas formas de medir o custo direto dos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados. A primeira é o montante gasto em tais produtos pelas pessoas e pelos sistemas de saúde. A outra é o montante perdido pelos fabricantes (e outros intervenientes na cadeia de abastecimento), uma vez que os doentes ou fornecedores compraram produtos sem garantia de qualidade. Apesar de semelhantes, estas medições não são o inverso uma da outra. Ambas lançam desafios de medição bem diferentes. Independentemente dos custos de produção dos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados, é preciso que o preço para o comprador calcule com precisão o impacto económico4. Apesar disso, o preço de qualquer produto médico no local de prestação de cuidados de saúde, no final da cadeia de abastecimento, varia consideravelmente entre países e dentro dos países

4.2.1 Custos individuais e do agregado familiarO custo mais direto dos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados para os doentes e respetivas famílias é o dinheiro que gastam em produtos médicos que lhes causam danos ou que não atuam. Produtos que são tóxicos ou que não curam, nem previnem novas doenças, representarão certamente um esforço financeiro desperdiçado. Toxicidade, insucesso do tratamento ou infeções resultantes de profilaxias falhadas poderão conduzir igualmente a gastos adicionais em serviços de saúde e novos produtos médicos.

Estimar os custos diretos a nível do agregado familiar requer, por isso, informação sobre o eventual impacto para a saúde da má produção, degradação e falsificação por classe de medicamentos, conforme descrito acima. Isto tem de ser conjugado com informação sobre o preço dos medicamentos em cada categoria e a quantidade de produtos médicos de qualidade inferior e falsificados que foram pagos pelos orçamentos familiares, o que varia muito de país para país. Os seguros de saúde e outros sistemas que garantem a cobertura universal dos cuidados de saúde estão bem implantados em muitos países de elevados rendimentos, reduzindo as despesas com a saúde nos orçamentos familiares (os denominados “gastos pessoais”). Estes tipos de sistemas encontram-se também em franca expansão em diversos países de médios rendimentos, bem como 3 Estas conclusões são também sustentadas por dados clínicos. A Rede Mundial de Resistência aos Antipalúdicos, por exemplo, associa e analisa dados

de milhares de doentes com paludismo em todo o mundo e concluiu que as doses subterapêuticas estavam associadas a tempos de eliminação dos parasitas significativamente mais longos, maiores taxas de reaparecimento dos parasitas e prevalência acrescida da resistência ao paludismo por Plasmodium falciparum (11).

4 A forma como os fabricantes estabelecem os preços é complexa e influenciada por uma série de outros fatores, entre eles, a escala de produção, o cenário comercial, a dimensão do mercado, a situação da patente, o tipo de medicamentos e o comportamento do consumidor, entre outros.

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em alguns países de baixos rendimentos. Isto levou a uma queda moderada na percentagem de gastos pessoais com a saúde. A queda foi mais notória nos países de baixos rendimentos, como mostra a Fig. 3. Mas nos países de rendimentos médios baixos (PRMB) os indivíduos e as famílias ainda suportam a carga mais elevada dos gastos com a saúde – representando cerca de 37% das despesas, em comparação com 14% nos países de elevados rendimentos (34). Se a análise se restringir apenas às despesas com medicamentos, a proporção gasta pelos agregados é superior, uma vez que os medicamentos constituem uma percentagem maior dos gastos das famílias com a saúde do que a despesa nacional.

Fig. 3: Gastos pessoais em percentagem das despesas totais com a saúde, de acordo com a classificação dos países por nível de rendimentos estabelecida pelo Banco Mundial

Fonte: Banco Mundial (34)

No seu estudo, Niens e os seus colegas consideram que procurar acesso a medicamentos pode constituir um risco significati-vo de empobrecimento nos países de baixos e médios rendimentos (35). Como pode ser visto na Figura 3, este risco atravessa múltiplas regiões do mundo e afeta 84% da população mundial (14, 34)

Fig. 4: Distribuição geográfica dos países de baixos e médios rendimentos, segundo a classificação dos países por nível de rendimentos, estabelecida pelo Banco Mundial, indicando onde vive 84% da população mundial

Fonte: Banco Mundial (14, 34)

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4.2.2 Custos dos sistemas de saúdeOs produtos médicos que não são pagos pelos orçamentos familiares geralmente representam custos para o sistema de saúde, inclusivamente para os prestadores de seguros de saúde. Os sistemas e as seguradoras de saúde suportam, assim, uma parte dos custos com produtos médicos de qualidade inferior e falsificados que provocam falha ou toxicidade no tratamento ou profilaxia.

Análises complementares, tratamento e cuidados absorvem recursos, profissionais e infraestruturas por todo o sistema de saúde, sobrecarregando ainda mais recursos que geralmente já se encontram desgastados. Quando incidentes envolvendo produtos médicos de qualidade inferior ou falsificados causam alarme público que compromete o uso de programas com boa relação custo-eficácia, como o da vacinação, o efeito multiplica-se (36,37).

Os efeitos adversos (incluindo a ausência de eficácia) causados por produtos médicos de qualidade inferior e falsificados pode levar a despesas adicionais por repetição do tratamento com medicamentos de qualidade garantida, assim como custos adicionais com cuidados de saúde associados a reações adversas ou infeções que não teriam ocorrido, tivesse o produto original sido seguro e eficaz. Dado que os agentes patogénicos resistentes aos medicamentos são frequentemente os suspeitos nos casos de insucesso do tratamento, aqueles custos podem incluir o pagamento de testes de suscetibilidade, bem como o custo de dispendiosos antimicrobianos de uma classe superior.

No caso das doenças infecciosas, os sistemas de saúde podem também ter de suportar os custos associados à prevalência mais elevada da doença devida à transmissão acrescida que resulta do insucesso do tratamento. Quando os medicamentos de qualidade inferior ou falsificados contêm doses subterapêuticas de antimicrobianos que contribuem para a disseminação das infeções resistentes aos medicamentos, também esses custos ficarão a cargo do sistema de saúde. Isto pode levar a um acréscimo ainda maior de custos, sobretudo se forem necessárias novas terapêuticas. Wertheimer e Norris dão-nos o exemplo da resistência a tratamentos antipalúdicos de primeira linha, que exigem o desenvolvimento de novas alternativas, provavelmente mais dispendiosas (36). Onde os recursos são mais escassos, o seu uso irracional comporta um custo de oportunidade, com potenciais consequências para a saúde de outras pessoas. Para além disso, quando o produto em questão é um antimicrobiano, mudar para outro medicamento pode levar ao uso desnecessário de classes de antimicrobianos que devem ser usados muito parcimoniosamente, a fim de evitar o desenvolvimento de resistência e preservar a sua eficácia (38).

4.2.3 custos socioeconómicosTodos os resultados na saúde discutidos na secção anterior (por exemplo, o insucesso dos tratamentos, a exposição à doença, morte ou doença prolongada) comportam custos para os doentes e suas famílias e, por seu turno, impõem maiores exigências aos sistemas de saúde, em geral. Para além do seu impacto na saúde pública, os produtos médicos de qualidade inferior e falsificados podem também exercer impacto socioeconómico.

Apesar de muitos custos socioeconómicos diretos e indiretos estarem associados aos medicamentos de qualidade inferior e falsificados, estes custos são de difícil medição. Em particular, é problemático identificar e quantificar todos os custos sociais, os quais podem ser difusos e indiretos. Medir o impacto socioeconómico com rigor implicaria, por exemplo, a quantificação dos efeitos que os medicamentos de qualidade inferior e falsificados teriam no desenvolvimento económico e social. Tal incluiria o produto interno bruto, esperança de vida, literacia, níveis de emprego, mobilidade social, de que forma a confiança é negociada entre o doente ou o agregado familiar e os sistemas de saúde, entre outros aspetos. Seria igualmente útil poder comparar o custo do tratamento ideal versus tratamento abaixo do ideal diretamente atribuível ao uso de medicamentos de qualidade inferior e falsificados com os dados sobre os custos indiretos que se seguem:

– perda de rendimentos devido a doença prolongada ou morte, despesas de deslocação para aceder a cuidados de saúde, em virtude de toxicidade ou insucesso do tratamento, e despesas de funeral;

– custos por perda de produtividade para os doentes e agregados familiares, por terem de recorrer a cuidados médicos adicionais, durante o período de recuperação, ou por morte prematura (39).

Os doentes podem também incorrer em custos com mais tratamentos, diagnósticos ou consultas em ambulatório. Tal pode incluir o pagamento de análises laboratoriais, exames complementares e outras formas de diagnóstico. Os custos podem ainda estar relacionados com tratamentos médicos adicionais necessários após eventuais eventos adversos ou por ausência de melhoria resultante da utilização de produtos médicos de qualidade inferior ou falsificados. Se o uso dos referidos produtos originar faltas ao trabalho, o efeito pode fazer sentir-se nas empresas e na economia em geral, como também nos próprios indivíduos e famílias. Tal pode levar os doentes, por seu turno, a um ciclo vicioso de saúde precária e pobreza.

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5 CONCLUSÃOÉ importante compreender o impacto dos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados, resumido na Caixa 5 (adaptado de Newton et al. (18))..

Caixa 5: Impacto dos produtos médicos de qualidade inferior e falsificadosImpacto na saúde

• efeitos adversos (por exemplo, toxicidade ou ausência de eficácia), devido a ingredientes ativos incorretos

• insucesso na cura ou prevenção da doença no futuro, aumentando a mortalidade, morbilidade e a prevalência da doença

• aumento da resistência antimicrobiana e das infeções resistentes aos medicamentos

• perda de confiança nos prestadores dos cuidados de saúde, nos programas e sistemas de saúde

Impacto na economia

• aumento das despesas pessoais e do sistema de saúde com os cuidados

• prejuízo económico para os doentes e suas famílias, sistemas de saúde e fabricantes (e outros intervenientes na cadeia de abastecimento) dos produtos médicos de qualidade

• desperdício de esforço humano e esforço financeiro por todo o sistema de saúde, desgastando ainda mais os recursos, o pessoal e as infraestruturas

• maior sobrecarga para os profissionais de saúde, entidades nacionais reguladoras dos medicamentos, autoridades de aplicação da lei e sistemas de justiça penal

Impacto socioeconómico

• perda de rendimentos devido a doença prolongada ou morte

• custos por perda de produtividade para os doentes e famílias por recorrerem a cuidados médicos adicionais, cujos efeitos se fazem sentir nas empresas e na economia em geral

• inexistência de mobilidade social e agravamento da pobreza

É possível quantificar o impacto socioeconómico e na saúde pública dos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados, mas para tal é necessário recorrer à utilização consistente de orientações para reduzir a variabilidade. Os estudos podem utilizar diferentes definições e estratégias de amostragem e testagem, até mesmo quando estejam a investigar categorias terapêuticas semelhantes. É frequente não ser notificada a informação que permitiria uma melhor comparação (por exemplo, as características da amostragem ou informação mais pormenorizada sobre as concentrações de API). Assim como o problema dos produtos médicos e falsificados poderá ser reduzido através de uma aplicação mais efetiva e eficaz de normas na produção e na gestão da cadeia de abastecimento, assim também o problema da base de evidências poderá ser diminuído, incrementando a utilização de normas para a recolha, análise e notificação de dados.

Além de baseadas em definições claras, as estimativas fiáveis de prevalência das doenças, comportamentos ou produtos dependem, em larga medida, de duas coisas: a amostragem deve ser representativa de populações e mercados mais vastos e a testagem deve ter uma dada sensibilidade e especificidade. Existem já algumas normas importantes – por exemplo, para a amostragem e notificação – enquanto outras, nomeadamente as relativas aos métodos de testagem, estão a ser elaboradas. O recurso consistente às orientações e outros documentos técnicos, como os listados na Caixa 6, devem, com o tempo, reduzir a variabilidade, para que futuros estudos contribuam para dados mais coerentes e comparáveis a nível mundial. Importa incentivar a utilização destes documentos técnicos, embora eles só possam ser usados, se estiverem disponíveis recursos de apoio à recolha e análise de dados.

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Caixa 6: Orientações e documentos técnicos da OMS

Tema

Definições de produtos médicos de qualidade inferior, falsificados e não registados/não licenciados

Proposta de orientações sobre testagem de produtos médicos falsificados suspeitos

Testagem de medicamentos de qualidade inferior e falsificados suspeitos

É preciso proceder-se à recolha de dados consistentes e informação estratégica. O presente estudo realçou algumas das lacunas de informação mais importantes que entravam a nossa capacidade de perceber a exata natureza e extensão da ameaça que constituem os produtos médicos de qualidade inferior e falsificados. O Anexo 5, adaptado de Pisani (29), destaca as principais fontes de dados identificados por este estudo e enumera também as fontes de dados que foram excluídas, nomeadamente porque os dados nem sempre estavam disponíveis ao público e/ou incluíam questões de proteção da propriedade intelectual. Todas têm vantagens e desvantagens, inclusive em termos dos recursos exigidos, sendo todas de grande utilidade, quando usadas conjuntamente. Mas existem fontes de dados potencialmente ricas no seio dos sistemas nacionais, regionais e setoriais, as quais, com as devidas salvaguardas, poderiam ser usadas no sentido de enriquecer o nosso entendimento quanto à magnitude, distribuição e impacto dos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados. Os dados registados regularmente pelas entidades reguladoras nacionais poderiam, se partilhados com os parceiros adequados, ajudar a identificar os padrões e as tendências regionais e mundiais. Os sistemas de vigilância após a introdução no mercado mantidos pelas autoridades reguladoras e sanitárias, organismos da saúde mundial e a indústria farmacêutica poderiam fornecer informação que permitiria conhecer melhor a prevalência. As apreensões aduaneiras proporcionam um potencial ponto de entrada para a vigilância com base nos riscos focada na saúde pública. Os sistemas de farmacovigilância podem também fornecer informação útil em termos do impacto dos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados sobre a saúde.

Neste estudo, a exclusão de estudos que testaram amostras adquiridas apenas através da Internet pode ter também reduzido a representação dos países em que as aquisições online estão generalizadas. Por exemplo, em países de elevados rendimentos, isto pode significar uma sub-representação da prevalência e dos custos no vasto mercado dos Estados Unidos, onde os consumidores suportam um fardo mais pesado de gastos pessoais com medicamentos do que os seus pares na maioria dos países da União Europeia, e onde o recurso às farmácias da Internet, que pode introduzir vulnerabilidades na cadeia de abastecimento, está bem enraízado (5, 40). A preocupação com a saúde pública relativamente às farmácias online é evidente, sobretudo porque se descobriu que muitas vendem medicamentos que não estão aprovados, que contêm concentrações erradas ou nulas de API e muitas vezes têm ingredientes tóxicos (40). A ausência de aconselhamento por parte de um profissional de saúde, um médico ou farmacêutico, levando o doente ao autodiagnóstico e à automedicação, representa um risco acrescido de eventos adversos. Entre eles, a sobredosagem, as interações medicamentosas e a administração de uma medicação e/ou dose errada. Apesar dos esforços para regulamentar as farmácias online, elas apresentam desafios específicos, que vão das questões jurisdicionais à dificuldade de rastreio da sua localização física (40, 41). O largo espectro do comércio eletrónico de produtos médicos, que vai desde as farmácias online às aplicações para smartphones, passando pelas redes sociais e plataformas empresa-a-empresa, requer conhecimentos profundos que apenas se podem alcançar através de investigação especificamente dirigida. Com o tempo, estas fontes podem contribuir para estimativas nacionais e mundiais, mas fica bem claro que será necessária maior recolha de dados primários.

A Caixa 7 enumera as áreas nas quais seria útil recolher dados que permitam construir uma imagem que seja mais completa, exata e representativa do impacto dos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados na saúde e na economia.

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ESTUDO SOBRE O IMPACTO NA SAÚDE PÚBLICAsociedade e economia dos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados

Caixa 7: Dados para uma melhor compreensão do impacto na saúde e na economia Para construir estimativas do impacto dos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados sobre a saúde, seriam úteis os seguintes dados:

• estimativas fiáveis da prevalência dos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados, por tipo de produto, distribuição geográfica e nível de ingrediente ativo;

• estimativas fiáveis do fardo das doenças e utilização dos serviços de saúde, por distribuição geográfica;

• estimativas do efeito da dosagem subterapêutica na morbilidade, mortalidade e (para os anti-infecciosos) resistência antimicrobiana, para cada par medicamento/doença.

As estimativas do impacto económico dos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados basear-se-ão, em grande medida, nestas estimativas do impacto na saúde, mas precisarão de informação adicional, nomeadamente:

• estimativas acessíveis ao público dos gastos, quer pessoais, quer do sistema de saúde, com cuidados de saúde, adequadamente desagregados por doença e por região geográfica;

• estimativas da perda de rendimentos por morte ou aumento da morbilidade;

• estimativas do impacto económico do aumento da resistência antimicrobiana nos sistemas de saúde;

• estimativas dos custos que a recolha de produtos representa para os reguladores e para a indústria, assim como de outras despesas associadas à produção de produtos médicos de qualidade inferior ou falsificados.

É amplamente reconhecido que o investimento na saúde pública gera resultados eficazes em termos de custos e contribui para uma sustentabilidade mais alargada, com vantagens económicas, sociais e ambientais (42). Juntamente com o relatório do Sistema Mundial de Vigilância e Monitorização da OMS para os Produtos de Qualidade Inferior e Falsificados, espera-se que ambas as publicações sirvam de incentivo e constituam um argumento convincente para que os governos atribuam prioridade à prevenção, deteção e resposta aos produtos médicos de qualidade inferior e falsificados como um “bom investimento” na saúde

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