Altersounds nº1

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Suplemento da revista Alterwords.

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Índice

Editorial------------------------------------------------------------------------------3

Entrevista-----------------------------------------------------------------------------4

Crítica musical---------------------------------------------------------------------13

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Editorial

A arte assume-se em várias faces,

vários rostos distintos. Um dos mas

importantes é sem dúvida a música, e

foi sabendo a importância de tal arte

que aceitei o desafio de criar este

suplemento (sem meses definidos)

onde falaremos de sons. De sons que

motivam, de sons que inspiram, dos

sons dos outros que tanto nos

dizem…e teremos todo o prazer em

que o público colabore connosco

porque mais uma vez afirmo que a

revista é vossa! Por isso abrimos aqui

a sugestão e o desafio ao leitor para

que nos enviem fotos de concertos ou festivais onde estejam para dar outro “colorido”

ao suplemento.

Nestas poucas páginas teremos criticas musicais e sempre uma entrevista, tentando

“descobrir” e revelar também quem ande escondido nesta arte….

Bruno Pereira

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Entrevista

por Susana Catalão

Os ThanatoSchizO são um grupo de metal de Santa Marta de Penaguião, formado em finais de 1997. Praticantes de uma sonoridade associada ao death metal progressivo, a banda faz inúmeras incursões por outros géneros musicais como o black metal, doom

metal, world music, rock progressivo, a música ambiente e electrónica, sendo por isso genericamente referenciada no âmbito da música avant-garde. A Alterwords foi falar com Guilhermino Martins não só sobre o conceito mas uma mais prolixa visão sobre a música, em particular o metal, que se pratica no nosso país e claro está, sobre a banda e a sua história e futuro próximo.

Susana: A vossa carreira começou em finais de ’97 e algo que me tem suscitado alguma curiosidade é que, naquela época, a Internet tinha relativamente 3 anos e era portanto ainda para os privilegiados e os telemóveis eram usados por poucas pessoas, para além de que os eventos de música alternativa eram mais centralizados e existiam sobretudo nos clubes underground de Lisboa…,

Guilhermino: Sim, era mais centralizado, em Lisboa, basicamente tinhas 3 ou 4 clubes em Lisboa, 2 ou 3 no Porto e o resto do país era assumidamente paisagem.

Susana: Ia-te perguntar então como surgiu o teu interesse por este tipo de música…

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Guilhermino: O interesse em si surgiu quando tinha 13/14 anos. Lembro-me perfeitamente quando comecei a ver, quando comecei a ouvir música mais pesada… foi quando os Metallica gravaram o black álbum, foi o álbum que os fez explodir em termos comerciais e senti curiosidade para explorar aquilo. De qualquer forma, aqui em Santa Marta, não havendo Internet, era muito difícil conheceres mais alguma coisa para além daquilo que dava na televisão que naquele caso era Metallica, Nirvana, Pearl Jam e pouquíssimo mais. Mas de qualquer forma, quer eu, quer o Eduardo, quer o Paulo, sempre que passávamos férias fora de Santa Marta, íamos para a zona litoral e quando passávamos , imagina 15 dias-3 semanas de férias, vínhamos de lá com uma “carrada” de cassetes gravadas e com montes de novidades e no fundo íamos trocando isso, numa fase inicial, tínhamos 12/13/14/15 anos. Depois, numa fase mais posterior resolvemos realmente criar uma banda. A 1ª banda chamava-se Blind &Lost, que era uma banda de versões em que faziam parte eu, o Eduardo, o Paulo e o Marco que depois fez parte da primeira encarnação de Thanatos. Aos poucos começámos a sentir necessidade de fazer originais e lá está, entretanto, íamos conhecendo cada vez mais música, começámos a perceber que era possível fazer as coisas num regime do “do it yourself”, ou seja, não precisavas propriamente de uma grande editora para começar a banda, precisavas era de ensaiar muito e saber tocar no mínimo. E lembro-me que naquela primeira fase da banda (já na fase de Thanatos em ‘97/’98), passávamos horas e horas na lista telefónica à procura de bares na região. Recordo-me que encontrámos um bar em Valpaços e fomos lá tocar e toda a gente ficou a olhar para nós e a dizer “o que é isto?”, pensavam que íamos tocar covers de Deep purple ou isso, mas não, depois saiu-lhes o que saiu e não até que ponto gostaram. Também quando fomos tocar a Lamego o dono do bar pensava que íamos tocar versões e ao fim da segunda música chegou-se ao pé do nosso vocalista, da altura, e disse: “eh pah vocês não se importam de parar? Eu pago-vos já o cachet” e foi curioso, nós pronto, paramos e ele pagou o cachet. Há uma série de curiosidades dessa altura, porque era tudo tão “naive” , tão “inocente”, quer da nossa parte, quer de quem organizava os concertos que acabam por marcar, e ainda hoje nos lembrámos mais disso do que coisas que hipoteticamente poderão ter sido mais normais em termos de caminhada da banda. Mas no fundo, voltando ao início, o interesse partiu mesmo daquela curiosidade que tu sentes em ver um clip de uma banda mais pesada, mais extrema e perguntares-te se és capaz de fazer aquilo ou pelo menos parecido e como aqui em Santa Marta éramos 3/4/5 pessoas interessadas, porque a geração antes de nós, que tem agora 35/36 anos, ninguém ouvia música extrema. Acho que as coisas mais extremas que as pessoas ouviam nessa altura, provavelmente era aquele rock gótico, os Bauhaus, Joy Divison, mas ninguém ouvia metal. Por isso, no fundo fomos um bocado precursores disso e levamos a banda a ir à frente.

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Susana: Ia perguntar também se houve alguma banda que servisse de “catalisador” para que vocês começassem também a querer criar as vossas músicas, a exemplo dos Moonspell que ficaram muito influenciados pelos Bathory…

Guilhermino: Não há propriamente uma banda que possa dizer que marcou e que nós dissemos assim “ bem, a partir de agora vamos tentar fazer um som mais ou menos nesta onda”, mas lembro-me que quando começámos precisamente a fase de originais de Thanatos, havia duas referências, que entretanto, na altura eram praticamente desconhecidas, mas que explodiram em termos de sucesso mediático e são hoje em dia bastante conhecidas, e nós naquela altura tínhamos a convicção que podíamos fazer algo parecido com essas duas bandas , apesar do nosso som não ter mesmo nada a ver com elas, nós éramos realmente “inocentes” , mas eram duas bandas que dissemos” bem, estas duas bandas são mesmo porreiras” . Eram os Tool e os Kyuss que são coisas que ainda hoje gostamos, na altura pouquíssima gente os conhecia e lembro-me que o Paulo tem uma bateria Ludwig, marca que todas as bandas de stone rock, Kyuss , aquela geração toda que o rock tem e recordo-me que ele comprou logo o Aenima dos Tool porque se passou com os videoclips e durante uns meses ele ouvia aquilo todos os dias, porque era algo realmente de novo. Mas lá está, apesar de servir para nós dizermos que talvez pudéssemos ir por esse caminho, na prática as nossas músicas não tem absolutamente nada a ver com aquilo. Provavelmente, porque nós não tínhamos capacidade técnica para sequer fazer parecido. É claro que essa capacidade foi amadurecendo e hoje se quiséssemos até podíamos fazer algo nessa onda, mas se calhar até foi melhor assim porque nos demarcámos e começamos logo a fazer uma coisa, mais ou menos original, à nossa maneira.

Susana: E quando é que sentiram realmente que a banda se estava a tornar num caso sério, que se estava a afirmar?

Guilhermino: A afirmar realmente em termos de fãs e de imprensa senti isso a partir do momento em que lançámos o InsomniousNightLift . até aí , a própria imprensa especializada olhava para nós com um bocado, sei lá, eu tinha a sensação que as pessoas da imprensa nos olhavam como “ah, aqueles rapazitos ali de Vila Real ou de Santa Marta, ah coitaditos e tal” e não nos davam realmente a importância que nós achávamos que realmente poderíamos vir a ter . Quando lançámos o InsomniousNightLift, nessa altura lançámos com uma editora inglesa, que no momento estava a criar um certo impacto na cena europeia e que entretanto descobriu uma série de bandas que hoje em dia são também bastante conhecidas: os Cult o

f Luna, os Anaal Nathrak. Sentimos que a voz da imprensa ficou subitamente em cima de nós, o que foi positivo. Em termos de público, também. Ainda hoje, temos 4 álbuns, um EP… ainda hoje há muita gente que, quando lhe perguntámos qual o álbum preferido continua a achar que é o InsomniousNightLift , provavelmente porque na altura marcou e serviu para chamar a atenção.

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Susana: Relativamente ao vosso background musical, imagino que entre os elementos da banda haja certas diferenças, como é que vocês confluem, de certo modo, os gostos e as personalidades também…

Guilhermino: Sim, é um bocado difícil mas ao fim de tantos anos…estamos juntos quase há 12 anos como banda de originais, acabas por aprender a saber lidar com as pessoas. Nós já tivemos muitos conflitos na sala de ensaios, conflitos que acabaram por ser salutares, são “dores de crescimento”, mas acabas por conciliar isso e uma coisa te posso garantir, todas as músicas dos nossos álbuns só foram gravadas porque os seis elementos gostaram delas, nunca houve uma música que nós gravássemos em que houvesse um elemento que não gostasse dela. Nós somos capazes de passar dois meses a trabalhar numa música e só a acabamos quando há um consenso, quando dizemos “ok, está fixe” porque podes ter a certeza que se tivermos a fazer uma música nova, se houver um elemento mais ranhoso que esteja a dizer “eh pah isto não me está a agradar”, nós somos capazes de estar aqui mais horas até limar aquilo que essa pessoa não gosta, sem que isso prejudique os gostos das outras pessoas, ou seja, há um consenso e isso acaba por ser engraçado, acabas por ter um feeling de banda e não de um compositor ou dois compositores e o resto está a trabalhar para essa pessoa, há aqui realmente um feeling de união quando pegamos num cd nosso e sabemos que aquelas 10/11/12 músicas são de todos e não são só de uma pessoa e talvez seja isso que contribui para que sejamos tão unidos e estejamos tão unidos ao fim de tantos anos…

Susana: No que toca ao Liperske, como surgiu a ideia? Achas que foi uma necessidade de descentralizar este tipo de eventos?

Guilhermino: Acima de tudo foi a necessidade de vermos na nossa terra algo que nós gostávamos de ir ver às outras terras. Numa fase inicial da banda, lembro-me perfeitamente que fomos ver uma série de festivais a Amarante, ao Porto, a Santo Tirso, lá para baixo também, zona de Coimbra, Leiria, Lisboa…. E sentimos sempre aquele bichinho de tentar fazer alguma coisa similar aqui em Santa Marta. Felizmente houve um certo feedback da câmara, o vereador da cultura começou a ver as potencialidades que daria até à própria região e à vila porque a verdade é que nos dias de festival, os restaurantes estão cheios, há muita gente de fora que vem conhecer Santa Marta e isso cria um certo interesse em termos turísticos. E para nós é um prazer poder convidar bandas de que gostamos e tê-las a tocar à porta de casa. Basicamente foi esse o principal impulsionador da ideia.

Susana: Li recentemente na Loud! algo que disseste, que há um “genuíno interesse” de fãs de outros países pelas bandas portuguesas? Achas que há um conhecimento “overseas” pelo panorama musical português?

Guilhermino: É relativamente conhecido lá fora. Eu acho que cada vez mais as pessoas têm interesse por coisas que sejam exóticas e as bandas portuguesas são exóticas porque está toda a gente farta de bandas alemãs, inglesas, suecas e norueguesas, as pessoas cada vez mais tendem a prestar atenção a coisas mais periféricas: Portugal, o metal mediterrânico, a Grécia, a Itália, Espanha não porque infelizmente não tem uma cena muito profícua, por assim dizer, são poucas as bandas realmente com capacidade de serem exportáveis, mas sinto que muito do feedback que nos chega lá fora vem de pessoas que estão de certa forma fartas das fórmulas já gastas do metal. A nível

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mediterrânico os próprios Orphaned Land, israelitas são uma banda que cada vez mais está a conquistar público por serem exóticos e porque são exóticos? Porque apostam em melodias, em instrumentos da própria região, Israel, e eu acho que uma boa forma de tu chamares a atenção do exterior é implementares na tua música o feeling da tua região, da tua terra. Eu quando era mais miúdo achava que isso era um bocado “pacóvio” , “estar a meter, sei lá, um acordeão numa música? Será que isso não vai ficar mal?” mas depois pensando bem nas coisas, pondo-me no papel, por exemplo, de um fã alemão, que já está farto de levar com power metal e com oitavas gerações de Death metal sueco, se calhar há um certo interesse em como vai soar uma banda de metal de Santa Marta de Penaguião, e de Portugal, que tenha realmente influências de alguma coisa que a marque naquela zona, seja um violino, seja um acordeão e acho que é isso que tem chamado a atenção do público.

Susana: Contactas frequentemente com fãs de outros países?

Guilhermino: Sim, tenho imensos contactos lá fora. Gosto de saber o que é que as pessoas acham, gosto de saber o que é que as pessoas ouvem. Normalmente é a primeira coisa que eu pergunto quando sou contactado por pessoal de fora que nos congratula pelo álbum e que nos dá os parabéns. A primeira coisa que costumo perguntar é o que é que elas ouvem, de certa forma para contextualizar os gostos da pessoa em relação aquilo que nós fazemos teres um conhecimento do mercado e saberes como é que as pessoas te descobriram, se foi por um mero download ocasional na internet que depois chamou interesse, se foi por indicação de alguém, se foi pelo Lastfm, pelo myspace, é sempre interessante….

Susana: Não achas que ainda existe o estigma de que lá fora só os Moonspell é que são conhecidos?

Guilhermino: Isso acaba por ser o reflexo da mentalidade portuguesa porque de facto os Moonspell são a banda portuguesa mais conhecida lá fora e são a maior em termos de projecção, isso é inegável. Agora que há muitas bandas de Portugal com capacidade e que realmente são conhecidas lá fora há e a prova disso é que cada vez mais há bandas portuguesas a fazerem tournées lá fora além dos Moonspell por isso, quer-me parecer que essa mentalidade mais, chamemos-lhe “pequenina” dos portugueses acabará por ser aniquilada por uma nova forma de pensar.

Susana: Vocês também são apreciadores de outras formas de arte como a literatura, o cinema, até que ponto isso vos influencia musicalmente?

Guilhermino: Aquilo que eu noto é quer o Eduardo, quer a Patrícia, escrevem sempre. No caso do Eduardo, ele é capaz de ler um livro ou ver um filme e depois escrever uma letra que não tem necessariamente de ser uma reprodução fiel do que leu mas que acaba

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por ser uma interpretação muito própria daquilo que ele acabou de ler ou do filme que ele viu por outras palavras num texto que acaba por ser a letra dele. Tudo influencia: veres um filme, ires na rua e ouvires as pessoas a falar, tudo te influencia porque no fundo quando eu pego numa guitarra e estou a gravar qualquer coisa, é tudo tão instintivo, que tu não podes determinar “ok ele está a tocar aquilo porque ouviu aquilo num álbum dos x ou dos y” e esse instinto acaba por ser o que tu és, acaba por ser as influências que tu apanhas de tudo o que está à tua volta.

Susana: Consegues recordar-te de algo muito caricato que já tenha acontecido num dos vossos concertos?

Guilhermino: Bem, há tanta coisa caricata que nos tem acontecido nos concertos! Há um momento que eu costumo comentar muitas vezes, aconteceu em 98’ em que foi a única vez em que fomos tocar a um local e não nos pagaram aquilo que estava combinado e o concerto em si foi bizarro aliás, eu já tive oportunidade de meter esse extracto do concerto (concerto que durou 7 minutos!) num site similar ao youtube. No fundo foi engraçado porque nós subimos ao palco e o técnico de som estava aos berros a dizer que era o melhor técnico de som de Portugal e que até agora a única pessoa que fazia melhor som do que ele era o técnico de som dos Pink Floyd, isto em Lamego em 98. O técnico tinha um PA, aquilo era uma banda pimba portanto ele meteu lá as colunas da banda pimba e começou aos berros a alegar que era o supra-sumo do conhecimento do som. Eu parei ao fim de 1 minuto de música, pousei a guitarra, desci do palco e fui falar com ele e disse: “meta a guitarra mais baixo, ponha o baterista a ouvir a guitarra” dei-lhe umas indicações e o homem começa-me a insultar sem mais nem menos e eu fui outra vez ao palco e comuniquei ao resto da banda e nós tocámos mais dois minutos ou três porque era impossível estarmos a tocar com um som tão terrível e o técnico ainda se vangloriar que era o melhor em Portugal. Isso é uma das muitas situações caricatas já aconteceu tanta coisa que acabamos por, no fundo, só nos lembrar delas de vez em quando. Mas essa é uma que eu ultimamente tenho falado muitas vezes porque como tenho aqui uma banda de Lamego a gravar costumo referir isso.

Susana: Impões mais metas a nível musical? Quer dizer, vocês já foram considerados a segunda melhor banda portuguesa e já foste considerado um dos melhores músicos, o que é que ainda falta afinal?

Guilhermino: Há muita coisa que ainda falta, aliás, se já nos sentíssemos completos em termos musicais provavelmente a banda já não existia. A banda só existe porque há um ímpeto de fazer qualquer coisa melhor, porque se não qual seria o objectivo de gravar outro álbum se esse álbum para nós não fosse melhor do que o anterior? Tem que haver sempre um objectivo de nos ultrapassarmos a nós próprios. Há muita coisa que ainda sinto que podemos fazer, o facto de nós agora estarmos num formato ligeiramente mais calmo e acústico, também é um desafio para nós, mais do que fazer com que haja mais interesse em relação à banda, é pegar nas músicas e torná-las em algo tão acústico e tão calmo e acho que o próximo objectivo, falando a curto/médio prazo, é mesmo gravar um álbum nessa toada acústica e tentar fazer o melhor possível nessa reprodução das músicas destorcidas para acústico. Portanto, enquanto houver uma meta, a gente vai continuar de certeza absoluta.

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Susana: Relativamente ao disco acústico, queria-te perguntar se foi algo que já tinham pensado há muito tempo ou surgiu, quase como que “acidentalmente”?

Guilhermino: Sempre que gravamos um álbum, as nossas editoras dizem sempre “eh pah, vocês vejam se vão tocar às fnacs, a apresentação dos álbuns na fnac é sempre engraçado e é sempre uma boa jogada de marketing mas em Portugal as únicas bandas que podem realmente tocar metal nas fnacs são os Moonspell, aliás a única banda. Porque o pessoal das fnacs é sempre muito púdico, não quer distorção, não quer “barulho” e então a única forma que nós arranjamos de combater isso, no fundo essa “censura” foi desde o segundo álbum fazer uma reprodução acústica de todos os temas, ou seja, nós tínhamos , imagina , o InsomniousNightLift original e nós depois fazíamos a versão acústica e apresentávamos na fnac, o Turbulence a mesma coisa, a versão pesada está no cd, a acústica era o que apresentávamos na fnac e este ano fizemos a mesma coisa com o zoom code. No fundo, acabou por ser uma coisa natural, começámos a pensar “então e se agora pegássemos naquilo que nos achamos que foram as melhores reproduções acústicas de todos os álbuns e lançássemos um cd novo ?” e a ideia agradou a toda a gente era uma meta que a gente achava ser engraçado, um bom desafio e então avançámos para isso. Fizemos uma prospecção de editoras, se havia alguma interessada e realmente havia e pronto vamos gravar isso a qualquer momento.

Susana: Se calhar é um bocado ambicioso mas como classificarias e descreverias a vossa música?

Guilhermino: Se me pedes termos técnicos, ao estilo doom, death progressivo, trash, death, eu não te sei dizer. aquilo que eu acho é que a melhor definição que alguma vez ouvi em relação a nós é que somos música com bom gosto e enquanto assim for acho que estamos no bom caminho.

Susana: Achas que surgiu agora uma espécie de «boom»relativamente a novas bandas de rock e metal em Portugal?

Guilhermino: Em Portugal e no resto do mundo. Houve uma fase realmente negra em termos de metal, nós apanhamos essa primeira fase do metal em ter uma banda de metal, como era o nosso caso, éramos um bocado olhados por não sermos a típica banda colorida das roupas largas e dos saltinhos e havia pouquíssima gente a ouvir metal e nós sentimos isso. Depois houve um certo ressurgimento que fez com que o pessoal agora da nova geração, o pessoal que vai dos 17 aos 20 e muitos já encare o metal como uma coisa absolutamente normal mas, lá está, há realmente um ressurgimento do som mais pesado e tu notas isso até nas próprias bandas de pop, não sei se já reparaste, mas se comparares o pop actual com o pop dos anos 90, o pop actual tem distorção, ou seja, quer dizer que hoje em dia usares uma guitarra distorcida acaba por ser uma coisa normalíssima, já não é o “bicho-papão” de outros tempos e já acaba por ser encarado como uma coisa banal. Portanto, as mentalidades vão evoluindo, o ouvido humano evolui, a primeira vez que ouvi alguém a fazer guturais eu assustei-me e não conseguia perceber nada do que ele dizia, hoje em dia se ouvir, é uma coisa perfeitamente natural para mim e se calhar até consigo perceber claramente o que essa pessoa está a cantar. Portanto, o ouvido humano treina-se. Se as pessoas desde novas levarem com bandas de metal, de boa qualidade preferencialmente, acabam por chegar a uma idade adulta e para elas o metal é uma coisa absolutamente natural.

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Susana: Em termos de festivais de Verão, pelo menos Portugal no ano passado foi um bocado bipolar, se por um lado haviam bons exemplos como o Rock in Rio ou Maia act (etc), por outro, haviam também tentativas completamente goradas como o Alliance fest ou o Lagoa Burning festival. Como explicas isto?

Guilhermino: Sim, mas isso vai acontecer sempre. É inevitável que, neste género em particular haja sempre a tal questão do “do it yourself” que muitas vezes acaba por sair frustrado. A melhor coisa em termos de festivais é serem organizados ou por pessoal de bandas, porque nada melhor do que uma banda para saber aquilo que as outras bandas vão precisar, ou ser organizado por entidades , como há diversas em Portugal, que já tenham um certo calo para saber tratar das coisas, porque um festival não é só espalhar os cartazes e convidar as banda, tu precisas de fazer uma série infindável de contactos, tens que tirar as licenças, tens que programar que possa haver feridos e tens que falar com os bombeiros, tens que arranjar o som, tens que arranjar o palco, tens que, no caso de bandas internacionais, arranjar alguém que as vá buscar ao aeroporto, programar quem as vai levar ao aeroporto, a que horas pô-las a dormir no hotel, saber o que elas querem no catering, ou seja, há uma série infindável de coisas que não são pensadas com antecedência e então é por isso que muitas vezes coisas muito boas como o caso do RIR, que gostes ou não, acaba por ser uma estrutura profissional em que nada falha e depois tens coisas que realmente dão para o torto.

Susana: Relativamente a 2009 que expectativas tens relativamente a festivais, concertos…

Guilhermino: Eu hoje em dia, não sou propriamente adepto de festivais, aquela tendência que tinha de ir a festivais e estar encolhido a ver as minhas bandas preferidas, já passou um bocado essa febre. Aquele tipo de concertos que mais gosto de ver são concertos em clubes ou em salas como o Sá da Bandeira, o Hard Club, em que vês a tua banda mais ou menos à vontade. Eu posso dizer que este ano o primeiro concerto que vou vai ser Anathema no Porto, a questão dos festivais, eu gosto muito de Faith No More, apesar de não gostar muito deles terem regressado agora, é a minha banda preferida e ponderaria ir vê-los ao Optimus Alive! se realmente se confirmasse eles tocarem lá. Não tenho a certeza se realmente iria. Mas aquela febre tresloucada de ir a festivais de Verão já me passou um bocado.

Susana: Consideras que não há aquele ambiente mais intimista com o público, quando se trata de festivais?

Sim, acima de tudo isso e o facto de teres de estar horas e horas de pé, as condições também não são tão boas como numa sala em que imagina, o Sá da Bandeira, até posso jantar em casa, meto-me no carro e vou ver o concerto e três horas depois ou duas horas e meia depois estou em casa. A questão dos festivais implica uma certa mentalidade mais rebelde, que eu respeito e que também já a tive, mas que hoje em dia já não me cativa propriamente, a não ser que fosse realmente uma banda que gostasse imenso e aí esquecia um bocado este lado mais sisudo e ia também como é o caso de Faith No More. Hoje em dia é mais apelativo ver concertos em salas mais pequenas, acabas por ter uma melhor percepção da banda, tens a banda a tocar à tua frente e não está a tocar a 50 metros de ti ou mais e é muito mais atractivo esse lado mais introspectivo dos concertos.

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Susana: E o que é que podemos esperar mais da banda após este disco acústico?

Guilhermino: A seguir ao disco acústico não temos planos até porque nós programamos as coisas passo a passo. Não vamos é fazer um segundo álbum acústico, se vires na nossa carreira, nunca nos repetimos por isso dificilmente voltaremos a fazer um na mesma toada. É mesmo uma grande incógnita, porque quando nós encaramos a composição dos álbuns é tudo mesmo muito intuitivo, as músicas normalmente ou saem de jam sessions que a gente faz, às vezes sem estarmos todos, imagina, eu e o Eduardo somos capazes de estar aí uma semana a compor riffs ou então mesmo jams com o pessoal todo, lá está, é a tal intuição musical que faz com que as músicas apareçam, não há uma certa programação do estilo “agora vamos fazer um álbum mais death metal” ou “mais trash”, “mais black”, “mais whatever”, é mesmo estarmos aqui os seis e aquilo que sair sai e depois gravamos aqui na sala de ensaios e depois tentamos perceber se aquilo tem cabeça tronco e membros para continuar ou se é preciso voltar a fazer tudo de novo, mas lá está, é tudo muito intuitivo.

Susana: Para quem não vos conheça, o que poderás dizer sobre a banda? Quais os motivos para que a oiçam?

Guilhermino: Acho que se as pessoas têm certa curiosidade em ouvir música mais, bem chamemos-lhe metal , que seja minimamente original e que não se confine a um nicho, acho que nós somos um óptimo ponto de partida , inclusivamente para muita gente começar a ouvir outras bandas de metal. Conheço imensas pessoas que começaram a ouvir metal precisamente através de ThanatoSchizO, é mesmo curioso porque acaba por ser uma ponte para o resto do mundo que anda aí de música extrema. Acho que é curioso porque nós abarcamos tantas coisas diferentes, nós temos elementos de vários tipos de metal, temos elementos que nem são metal e é curioso porque, havendo interesse, havendo curiosidade, acaba por ser relativamente simples a quem não ouve música mais extrema, conseguir entrar no nosso mundo e conseguir perceber e depois daí provavelmente até ir para coisas mais extremas ou menos extremas, é completamente indiferente. Mas é engraçado perceber que há muita gente que começou a ouvir música mais pesada connosco.

Susana: Só mesmo para finalizar, se eu te pedisse para escolheres uma música, ou um disco do vosso repertório o que é que escolherias?

Guilhermino: Neste momento diria a “L”, porque é a música do Zoom Code que mais me agrada, mas como eu estou a pensar um bocado mais à frente e sei aquilo que provavelmente vai acontecer no álbum acústico, tenho quase a certeza que daqui por meio ano, a minha música preferida vai ser a “RawVoid” que é uma mistura da “Raw” do Schizo Level, “Void” do Turbulence e que vai estar no álbum acústico como uma única música, tenho quase a certeza que essa vai ser a minha música preferida.

Mais info:

http://www.thanatoschizo.com/

http://www.myspace.com/thanatoschizo

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Crítica musical

Khoma: The Second Wave Expansivo, fabuloso e devastador Khoma é uma das presentes e mais veementes bandas a emergir da Suécia, adversando o então tão postulado Death Metal que é para muitos o alicerce da música alternativa neste país. Umea, a região de onde surge esta peculiar banda, é conhecida por ter luz permanente durante metade do ano e opacidade no resto. Da

música que abre este cd “The Guillotine” parece-nos que a banda hiberna durante dias de “midnight Sun” progredindo para uma escuridão que eiva todo o resto do álbum. Deste a primeira corda que dedilha, o guitarrista de Cult of Luna ,Johannes Persson, marca a sua presença no álbum, incapaz de fazer algo que possa ser nomeado como ‘pequeno’. Essencialmente, Khoma tem destilado o estilo épico dos Cult of Luna, dando-lhe raízes mais fundas, emoção e maviosidade, enquanto o vocalista Jan Jamte nos brinda com uma voz não dissimilar a Tom Yorke de Radiohead, com tons delicados e inteligentemente abrilhantando as elegantes letras da banda. O clímax é atingido em músicas como “One Of Us Must Hang” que combina catadupantes riffs e uma iridescente entoação que nos deixa estupefactos até que as notas tenham desaparecido completamente.

Susana Catalão

Hans Zimmer: The Last Samurai Soundtrack Uma viagem espiritual Uma mistura de tranquilidade, nobreza e sonho, capaz de transporter o ouvinte até ao longínquo tempo dos samurais. Com a mestria a que Hans Zimmer já acostumou os seus fãs, somos transportados, neste

álbum, directamente para o interior do filme. Torna-se possível reviver cada momento, as reflexões, as batalhas, o estrondoso clímax de uma grande luta pela liberdade. Uma composição maravilhosa, ao nível dos melhores trabalhos do seu criador, e uma banda sonora destinada a ficar na memória dos tempos.

Carla Ribeiro

Mono: You are there O flamejante post-rock japonês Muitas vezes o post-rock é propenso a tornar-se entediante, sem sentido e demasiado snobe. Contudo, o quarteto japonês ‘Mono’ é exemplar no seu vivificante e urgente – oceano de ideias, toada e beleza. - Steve Albini produz este magnífico álbum, que tem

prolixa criatividade, que sem reinventar o seu estilo, nem dar um passo demasiado desmedida, se fez sem dúvida um dos seus melhores álbuns da banda. Com um deslumbrante ideário, um horizonte longínquo de excelência e inflamantes guitarras, Mono consegue com “You are there” um impacto espectacular, emocionante e esplendoroso.

Susana Catalão

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We are the Damned: The Shape of Hell to Come O rumo das forças infernais Uma das novas aragens lusas, os WATD, têm membros de reconhecido percurso como TwentyInchBurial (guitarra), Painstruck (bateria) e From Now On (voz), construindo um debute original e convincente (pelo que consta, em apenas oito semanas). Certamente que o facto de ter a Sofia como front-

woman, lhes dá um carisma distinto, contudo, não perde a personalidade e uma composição frenética, como notória preocupação conceptual que não deixa de ser interessante. Vale a pena ouvir estes treze temas cheios de Groove, riffagem Entombed, miscigenado de Rock ‘n Roll e headbanger, especialmente “The Nihilist”, “Hell is my Witness” e “The Inception of Evil”.

Susana Catalão

Sweeney Todd Soundtrack Vingança sublimada Quem apreciou o filme, não pode perder este álbum. É a eternização da imagem através do som, magnificamente executada pelas vozes dos actores que encarnaram as personagens desta história imortal. Através da voz de Johnny Depp, somos convidados a viver os demónios pessoais, de

Benjamin Barker, o homem que, injustamente condenado, volta para vingar o carrasco dos seus dias. E através de melodias como “A Little Priest”, “Not While I’m Around” ou “Epiphany”, somos transportados para a ambiência gótica da história e convidados a reviver os momentos do filme que nos fizeram rir, chorar ou até pensar. Imperdível.

Carla Ribeiro

Boris: Smile Os imprevisíveis Uma banda que embaralha completamente os sentidos, deixando-nos como que narcotizados, completamente distorcidos. Este repertório iridescente consegue ir desde o drone a um rock sujo, com toques psicadélicos até à energia do Stoner. Smile é um disco estranho mas absorvente, a fazer lembras o psicadelismo

dos anos 70 assim como a cultura pop japonesa. Smile é um trabalho que caleidoscópico que nos deixa definitivamente com um sorriso nos lábios.

Susana Catalão

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Ava Inferi: The Silhouette Segundo álbum dos nacionais ‘Ava Inferi’, depois de se terem preludiado ao lado de Rune Eriksen com ‘Burdens’. ‘The Silhouette’ mantém a sua toada suave e melancólica do primeiro trabalho, agora com mais enfoque a Carmen Simões que já deu expressão a projectos como Aenima e Poetry of Shadows, bem como marca a sua presença no grupo Crystal Moutain singers que

acompanha os Moonspell. A banda é completada ainda por Jaime S.Ferreira (baixo) e João Samora (bateria). Esta nova silhueta de nove faixas tem reflexos do fado, uma facção assumidamente doom, com riffs arrastados e uma ligeira expressividade gótica. “La Stanza Nera” é uma faixa bastante bem conseguida, onde o músico norueguês, Rune, arquitecta belos ambientes através da sobreposição de guitarras semi-acústicas e distorcidas.

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Ficha Técnica

Altersounds, nº1

Suplemento à Alterwords de Maio de 2009

Periodicidade: Ocasional

Direcção: Bruno Pereira

Coordenação: Carla Ribeiro

Design: Carla Ribeiro

Capa: Carla Ribeiro

Intervenientes nesta edição: Carla Ribeiro, Susana Catalão

Website: www.freewebs.com/alterwords

Contactos:

[email protected]

[email protected] (Carla Ribeiro)

[email protected] (Bruno Pereira)