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2753 A SOCIEDADE INTERNACIONAL CONTEMPORÂNEA E SEUS IMPACTOS SOBRE OS DIREITOS DA PERSONALIDADE THE INTERNATIONAL SOCIETY CONTEMPORARY AND ITS IMPACTS ON THERIGHTS OF THE PERSONALITY Wagner Menezes Vanessa Iacomini RESUMO A preocupação com a proteção dos direitos individuais especialmente com enfoque sobre os direitos da personalidade não é tema novo, mas remonta, ao longo da história, os trabalhos teóricos, o pensamento filosófico e os movimentos políticos em diversos contextos. A internacionalização dos Direitos Humanos a partir do discurso das Nações Unidas no plano internacional, e a atuação coordenada de organismos internacionais, aliada a um conjunto de documentos protetivos, a adoção de políticas públicas e normativas voltadas para a proteção dos direitos individuais levam num primeiro momento a adoção de uma releitura constitucional pelos Estados e, por conseguinte, de todo corpo normativo que compõe o sistema. Os direitos da personalidade surgem a partir de uma concepção eminente privatista que se redefine e se redescobre a partir do fim da segunda Grande Guerra Mundial, sofrendo forte influencia do Direito Internacional, dos direitos Humanos e do Direito constitucional.Nesse esteio é que, não só no plano local, mas principalmente no contexto de uma sociedade global que permeia a concepção de um cenário contemporâneo pós-moderno é que se fragmentam os conceitos, valores, e princípios dificultando assim, a determinação do conceito da personalidade nesse processo e exige um amplo enfoque multidisciplinar. Além de que, a sociedade humana, agora mais universal, volta-se para um contexto em que os pluralismos normativos e filosóficos expõem novos campos de abordagem, novas perspectivas, e novos elementos a impulsionar e a rediscutir os conceitos até então absolutos e que agora são mutáveis, ajustáveis e passíveis de redefinição e realocação doutrinária nesse cenário. PALAVRAS-CHAVES: PALAVRAS-CHAVE: DIREITOS DA PERSONALIDADE. DIREITOS HUMANOS. DIREITO INTERNACIONAL. DIREITO CONSTITUCIONAL. ABSTRACT The concern with the protection of individual rights with particular focus on the rights of the personality is not new issue, but dates back over the history, theoretical work, the Trabalho publicado nos Anais do XVII Congresso Nacional do CONPEDI, realizado em Brasília – DF nos dias 20, 21 e 22 de novembro de 2008.

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A SOCIEDADE INTERNACIONAL CONTEMPORÂNEA E SEUS IMPACTOS SOBRE OS DIREITOS DA PERSONALIDADE

THE INTERNATIONAL SOCIETY CONTEMPORARY AND ITS IMPACTS ON THERIGHTS OF THE PERSONALITY

Wagner Menezes Vanessa Iacomini

RESUMO

A preocupação com a proteção dos direitos individuais especialmente com enfoque sobre os direitos da personalidade não é tema novo, mas remonta, ao longo da história, os trabalhos teóricos, o pensamento filosófico e os movimentos políticos em diversos contextos. A internacionalização dos Direitos Humanos a partir do discurso das Nações Unidas no plano internacional, e a atuação coordenada de organismos internacionais, aliada a um conjunto de documentos protetivos, a adoção de políticas públicas e normativas voltadas para a proteção dos direitos individuais levam num primeiro momento a adoção de uma releitura constitucional pelos Estados e, por conseguinte, de todo corpo normativo que compõe o sistema. Os direitos da personalidade surgem a partir de uma concepção eminente privatista que se redefine e se redescobre a partir do fim da segunda Grande Guerra Mundial, sofrendo forte influencia do Direito Internacional, dos direitos Humanos e do Direito constitucional.Nesse esteio é que, não só no plano local, mas principalmente no contexto de uma sociedade global que permeia a concepção de um cenário contemporâneo pós-moderno é que se fragmentam os conceitos, valores, e princípios dificultando assim, a determinação do conceito da personalidade nesse processo e exige um amplo enfoque multidisciplinar. Além de que, a sociedade humana, agora mais universal, volta-se para um contexto em que os pluralismos normativos e filosóficos expõem novos campos de abordagem, novas perspectivas, e novos elementos a impulsionar e a rediscutir os conceitos até então absolutos e que agora são mutáveis, ajustáveis e passíveis de redefinição e realocação doutrinária nesse cenário.

PALAVRAS-CHAVES: PALAVRAS-CHAVE: DIREITOS DA PERSONALIDADE. DIREITOS HUMANOS. DIREITO INTERNACIONAL. DIREITO CONSTITUCIONAL.

ABSTRACT

The concern with the protection of individual rights with particular focus on the rights of the personality is not new issue, but dates back over the history, theoretical work, the

Trabalho publicado nos Anais do XVII Congresso Nacional do CONPEDI, realizado em Brasília – DF nos dias 20, 21 e 22 de novembro de 2008.

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philosophy and political movements in various contexts. The international human rights discourse from the United Nations in the international plan, and coordinated action from international agencies, combined with a set of protective documents, the adoption of public policies and regulations directed towards the protection of individual rights leads to a first time adoption of a constitutional rereading the States and therefore the entire legislative body that makes up the system. Thus, the rights of personality emerge from an eminent private design which resets and is rediscovered from the end of the Second World War suffering strong influence of International Law, human rights and constitutional law. In this bond is that, not only locally but mainly in the context of a global society that permeates the design of a contemporary post-modern scenario is that if the fragment concepts, values, and principles making it hard, the determination of the concept of personality in this process and requires a comprehensive and multidisciplinary approach. Beyond that, human society, more universal, is back for a context in which the normative pluralism and philosophical approach expose new fields, new perspectives and new elements to push the concepts and rediscuss concepts so far absolute and which are now mutable, adjustable and capable of redefining and doctrine relocation in that scenario.

KEYWORDS: KEYWORDS: RIGHTS OF THE PERSONALITY. HUMAN RIGHTS. INTERNATIONAL LAW. CONSTITUTIONAL LAW.

1. Introdução

A preocupação com a proteção dos direitos individuais especialmente com enfoque sobre os direitos da personalidade não é tema novo, mas remonta, ao longo da história, os trabalhos teóricos, o pensamento filosófico e os movimentos políticos em diversos contextos.

No que tange ao campo normativo, o tema toma uma amplitude maior no século XX com o desencadeamento de um processo de rediscussão da proteção da pessoa humana e a extensão de seus direitos, causando com isso, profundos impactos na concepção doutrinária que repercutem na construção normativa sobre a matéria contemporaneamente.

A internacionalização dos Direitos Humanos a partir do discurso das Nações Unidas no plano internacional, e a atuação coordenada de organismos internacionais, aliada a um conjunto de documentos protetivos, a adoção de políticas públicas e normativas voltadas para a proteção dos direitos individuais levam num primeiro momento a adoção de uma releitura constitucional pelos Estados e, por conseguinte, de todo corpo normativo que compõe o sistema.

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Além disso, nos últimos anos, como resultado de avanços científicos e tecnológicos e também face aos novos desafios da humanidade, vários temas passaram a incorporar o debate da sociedade internacional e local, substancialmente no campo dos direitos de solidariedade que ultrapassam aquela dimensão da personalidade limitada, para abarcar outras perspectivas, e com a reflexão sobre os novos conceitos indicados na agenda mundial, dentre os quais se destacam: o indivíduo, a pessoa e a família,[3] a solidariedade e a participação, a ética da espécie,[4] a integração e a universalidade, as virtudes cosmopolíticas,[5] tais como citados por André Ramos Tavares[6] ao definir este momento como o constitucionalismo do por vir e por que não de uma realidade onde a personalidade ganha uma nova roupagem e novos mecanismos para sua afirmação jurídica.

Assim o presente trabalho tem por objetivo descrever o panorama do desenvolvimento e afirmação dos direitos da personalidade, e especialmente, contextualizar debate acerca de novas perspectivas conceituais do instituto na teoria normativa contemporânea, segundo os elementos apontados aqui, buscando suas fontes e repercussões nos diversos sistemas normativos a partir das transformações operadas pelo Direito Internacional.

O método empregado para tal análise é o dialético a partir do diálogo interdisciplinar teórico entre o Direito Internacional, Constitucional, Direito Civil e Biodireito, campos que convergem em certo momento no tratamento sobre a matéria e possuem a mesma matriz e também sofrem suas influências, além de que, nesse ambiente, exsurgem novos institutos e conceitos.

Cabe esclarecer que não se pretende defender uma nova tese sobre a concepção dos direitos de personalidade, mas fazer uma análise objetiva dos elementos e idéias que estão a induzir a uma transformação amplificada do conceito e de sua concepção doutrinária, a partir de um movimento global e universalizado da defesa dos Direitos Fundamentais, calcado na Dignidade da pessoa humana e com isso fomentar o debate acadêmico sobre o tema.

2. Personalidade Civil do ser Humano: conceito e evolução

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A concepção do direito de Personalidade envolve um conjunto de direitos inatos ao indivíduo enquanto principal destinatário e sujeito da ordem jurídica estatal, que ao nascer se vincula a ela, e recebe do poder estatal, nessa relação simbiótica, uma série de prerrogativas normativas nos mais variados graus seja no plano constitucional como a nacionalidade ou mesmo no direito civil pela capacidade de exercer e reclamar esses direitos pelo fato do vínculo normativo que lhe é atribuído. Note-se que, à medida que se amadurece o debate sobre o lugar do indivíduo no sistema normativo e os valores que norteiam sua positivação é que os direitos da personalidade vão sendo ampliados.

A propósito, e como exemplo, o artigo 1º do Código Civil Brasileiro dispõe que: “Toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil”, referido preceito representa o pórtico da legislação civil dos povos modernos. Mas será que sempre foi assim? Evidentemente que não. Basta fazer uma busca histórica para visualizar no passado que nem todos os homens eram classificados como titulares de direitos. Havia grande distância em ser escravo ou homem livre. O certo é que a idéia de liberdade civil, que contemporaneamente é tão clara e natural, possuía valor secundário, e era resultado de uma situação política. Só os cidadãos de Roma ou de Atenas eram livres, mas não por serem homens, e sim por serem cidadãos. Somente aquele que tinha poderes para deliberar em Assembléia, votando e resolvendo problemas em nome da polis é que podia exercer direitos na ordem privada. O status libertatis era uma decorrência do status civitatis. Na família romana, esta representava uma entidade política na qual quem tinha poder era, tão-somente, o pater famílias. Somente ele podia livremente adquirir bens e deles dispor.

Foi por maio de longa evolução histórica que os homens foram, aos poucos, se emancipando dos grupos a que pertenciam, em verdadeira integração social. Esse processo provocou, por sua vez, a ocorrência de dois fenômenos complementares: “a atribuição progressiva de poderes autônomos e iguais aos indivíduos como tais; e a constituição de uma estrutura jurídica superior capaz de garantir essa autonomia”.[7]

Somente depois que se atinge certo grau de evolução é que se pode dar a luz a dispositivos legais que fazem expressa referência a esses conceitos. Ressalte-se que, mesmo assim, restrições são impostas, tanto no que se refere à ordem civil, quanto no que se refere aos direitos políticos. Parece-nos, nos dias atuais, absurda e aberrante uma situação como estas, mas o certo é que na Idade Média isto acontecia com freqüência. [8]

Uma vez entendido quem é sujeito de direitos, há que se acrescentar que, à exceção de entidades a que se atribui personalidade processual (massa falida, herança jacente, sociedade de fato, ets., todo sujeito de direito é também uma pessoa. É a ela que são reconhecidas as faculdades ou poderes de ação nas atividades jurídicas resultantes do convívio social.

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A palavra pessoa vem do latim persona, de personare, que significa ressoar. Persona era máscara de que se serviram os antigos atores e cuja boca, munida de lâminas metálicas, era disposta de modo a aumentar a voz, para que melhor ressoasse nos vastos anfiteatros em que se representavam os dramas na antiga Roma.[9] Assim, somente mais tarde é que o termo pessoa passou a representar o significado técnico de homem dotado de capacidade jurídica. A personalidade do homem situa-se como ser autônomo conferindo-lhe a dimensão de natureza moral. A personalidade, no plano jurídico, é o conjunto de faculdades e de direitos em estado de potencialidade, que dá ao ser humano a aptidão para ter direitos e obrigações.

3. A Teoria Jurídica da Personalidade e sua Divisão

A elaboração da teoria jurídica da personalidade é atribuída, péla doutrina tradicional, ao povo romano. Àquela época, a expressão “personalidade” dizia respeito apenas aos indivíduos que reunissem três status, quais sejam: o status libertatis, o status civitatis e o status familiae. Eram esses os requisitos da capacidade. Deveria a pessoa, para possuí-la, aglutinar esses atributos. Precisava ser livre, e não escrava; ser cidadã romana e ser, ainda, patriarca da família, o pater famílias.

Salve-se, ainda, que, àquela época eram desconhecidas as formas protetivas da personalidade individual. Aliás, a maioria dos autores afirma que no direito romano não se cuidava da proteção aos direitos da personalidade. A sua tutela se dava através de manifestações isoladas.

Para a proteção contra a iniuria, delito que diz respeito a lesões pessoais físicas, tendo sofrido, posteriormente, inúmeras ampliações conceituais, o remédio processual era a actio iniuriarum. Posteriormente, surgiu a Lex Cornelia, promulgada em 81 aC, que tinha como escopo a proteção do domicílio. A Lex Aquilia apareceu viabilizando a ação à tutela da integridade física e a Lex Fabia afigurava-se como meio processual para a defesa de direitos inerentes à personalidade.

Destarte, a personalidade individual já possuía diversas manifestações tutelares. Prescindia-se, àquela época, do foco individualista sob o qual é hoje encarada a pessoa humana.

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O regime nazista, a segunda guerra mundial e os regimes totalitários do pós-guerra tinham uma característica comum: o desprezo pela vida humana e pela personalidade. A vida nessas condições despertou o povo alemão para uma nova realidade, no sentido de proteger, sob todos os aspectos, os valores da personalidade.

A teoria contemporânea dos direitos da personalidade volta-se justamente contra essa realidade e se explica pela reação da concepção do reconhecimento dos direitos fundamentais no plano internacional e, por ser dever reconhecido do estado nesses foros, a sua proteção através das regras constitucionais.

Reflexivamente, surgiu a partir da Lei Fundamental alemã, com a introdução pelo Tribunal Federal, também na prática alemã, o Direito Geral de Personalidade. A Lei Fundamental, em seu artigo 1º, declara a intangibilidade da dignidade do homem e o artigo 2º, por sua vez, reconhece o livre desdobramento da personalidade. Esses são direitos subjetivos, a respeito de todas as pessoas.

A teoria em tela, também denominada monista, tem campo vasto, não se traduzindo como simples proteção do indivíduo contra o Estado, concepção esta defendida pela doutrina tradicional, seguida por professores de direito público na década de cinqüenta. Afigura-se da mesma forma um preceito legítimo nas relações entre os particulares.

A dicotomia defendida pela doutrina tradicional, entre direitos de personalidade públicos e privados encontra-se superada, ao fundamento de que a noção de Estado Social não comporta esse tipo de divisão. Depreende-se, daí, que as normas emanadas da Constituição e ainda aquelas declinadas nas Constituições Internacionais, as quais, diga-se de passagem, representam fonte do direito alemão, são regras que interessam ao Estado, no que lhe diz respeito e também nas suas relações com os particulares, mas, de igual modo, aos particulares, nas suas relações entre si.

A teoria pluralista por sua vez, também chamada tipificadora, defende a existência de vários direitos de personalidade, de forma que cada um corresponda a uma necessidade ou exigência específica. Diverge, portanto, da teoria monista, ao argumentar que, em que pese ser a pessoa uma unidade, suas necessidades são distintas, fazendo-se necessária a positivação de cada uma delas.

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Gustavo Tepedino[10], propõe a separação conceitual, no plano interpretativo, entre os valores sociais e econômicos que presidem o ordenamento, além da harmonização das fontes nacionais e supranacionais para a proteção efetiva dos direitos personalíssimos, considerando que às teorias monista e pluralista, ambas tentam enquadrar os direitos da personalidade na mesma moldura tradicional dos direitos subjetivos de caráter patrimonial.

4. A internacionalização dos Direitos Humanos e seu impacto sobre a perspectiva doutrinária dos Direitos da personalidade

Acima foi realizada uma análise de como se desenvolve o conceito de Direitos da personalidade a partir de uma concepção eminentemente privatista e que passa a se internacionalizar, a receber comandos propositivos internacionais, e ser reproduzida e incorporada em textos constitucionais, com a rediscussão após o fim da segunda Grande Guerra Mundial dos Direitos Humanos.

A estruturação de uma nova ordem jurídica internacional na comunidade internacional contemporânea tendo como corolário ideológico os direitos fundamentais possui desdobramentos e repercussão de grande tonalidade no sistema jurídico contemporâneo, especialmente no direito interno dos Estados.

A consubstanciação no plano internacional dos Direitos Humanos é resultado de uma longa e lenta evolução da concepção do pensamento teleológico do próprio Direito que, ao longo de séculos de evolução de idéias, acabou por conceber como núcleo das relações jurídicas os direitos fundamentais[11], como direitos universais afetos a toda humanidade, o que ocorreu a partir de sua inserção no plano internacional.[12]

Os direitos humanos foram surgindo no seio de civilizações como um direito superior, não estabelecido pelos homens, mas ligados às divindades e mesmo às crenças religiosas[13], e vão aos poucos sendo incorporados em textos filosóficos e influenciando o pensamento de jus filosofos na concepção da construção de um direito natural inerente ao homem, à sua natureza e ao estado das coisas.

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Com o movimento de positivação do direito, várias dessas concepções foram incorporando os textos jurídicos firmados localmente, principalmente, no sentido de reconhecimento de que certos direitos individuais fossem respeitados, desenvolvendo e ampliando o seu espaço normativo.

O movimento de internacionalização dos direitos humanos não ocorreu ao acaso da história, mas por necessidade da redefinição de princípios que moldassem e fossem a premissa ideológica da sociedade internacional após a Segunda Grande Guerra Mundial. Neste contexto, os Estados vencedores renunciaram ao modelo de sociedade internacional até então existente e procuraram redefinir os princípios que seriam os ideais, que a partir dali regeriam as relações estatais e do Estado com o indivíduo.[14]

Existia o sentimento generalizado entre os países vencedores, de que a valorização excessiva do Estado em detrimento do ser humano havia possibilitado que todas as atrocidades cometidas por Hitler e os seus aliados causassem a morte de 11 milhões de pessoas, com traços de crueldade e menosprezo pela vida humana. Naquele momento era preciso então renunciar àquele modelo de sociedade, desenhado, sobretudo, pelo pensamento clássico do Direito, que privilegiava excessivamente o Estado nacional e dava um valor menor aos direitos do homem e a sua individualidade. O Estado nacional deveria deixar de ser o centro absoluto das preocupações jurídicas, ao mesmo tempo em que deveria ser reconhecida, ao homem, uma esfera de direitos inatingíveis pela ordem jurídica estatal, ao mesmo tempo em que o Estado deveria garantir sua efetividade e inviolabilidade, colocando assim, o homem como centro maior da criação do direito redimensionando os direitos de personalidade.

É neste contexto que Flávia PIOVESAN assevera:

“[...] se desenha o esforço de reconstrução dos direitos humanos, como paradigma e referencial ético a orientar a ordem internacional contemporânea. Se a 2ª Guerra significou a ruptura com os direitos humanos, o Pós-Guerra deveria significar a sua reconstrução”.[15]

Neste sentido, o primeiro movimento que enseja uma internacionalização dos Direitos Humanos é reconhecido com a criação da ONU, em 1945, na Carta das Nações Unidas, que já em seu preâmbulo deixa claro a decisão dos Estados em “reafirmar a fé nos direitos fundamentais do homem, na dignidade e no valor do ser humano, na igualdade de direito dos homens e das mulheres.” Os Direitos Humanos aparecem no artigo 1º, 3, como propósito da ONU. Tal propósito é reforçado no artigo 55, que estabelece a cooperação internacional econômica e social. Com o fim de criar condições de estabilidade e bem-estar, as Nações Unidas se comprometem também a promover o

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respeito universal e efetivo dos direitos humanos e das liberdades fundamentais para todos, sem distinção de raça, sexo, língua ou religião. Além disso, aparece por várias vezes nos demais dispositivos, menção direta ou indireta ao compromisso com o respeito aos Direitos Humanos.

A concretização do propósito preconizado pelas Nações Unidas vem logo a seguir, com a edição em 10 de dezembro de 1948, da Declaração Universal dos Direitos Humanos, que representa o marco maior do processo de redimensionamento dos Direitos Humanos como um princípio universal. A Declaração sintetiza e é expressão de todo o processo de construção histórica da esfera individual de direitos fundamentais inerentes ao homem, caracterizando de forma universal e indivisível a concepção contemporânea dos Direitos da personalidade.

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Assim, os Estados, conscientes de que o desprezo e o desrespeito pelos direitos do homem resultaram em atos bárbaros praticados na segunda guerra, e considerando os Direitos Humanos como essências à própria convivência da sociedade internacional, decidem protegê-los sob o império da lei, como um ideal comum a ser atingido por todos os povos, através de medidas progressivas de caráter nacional e internacional.[16]

Outro importante impacto causado pela internacionalização dos Direitos Humanos, especialmente no campo do Direito privado, é que começa a existir na sociedade internacional um processo de produção de normas em foros internacionais e sua derivação para os foros internos, sem aqueles mecanismos de recepção do Direito Internacional Clássico, muitos absorvidos pela constituição outros pela legislação ordinária pertinente.

Flávia PIOVESAN observa com exatidão a repercussão da Declaração Universal dos Direitos do Homem no cenário internacional:

“Com efeito, a Declaração se impõe como um código de atuação e de conduta para os Estados integrantes da comunidade internacional. Seu principal significado é consagrar o reconhecimento universal dos direitos humanos pelos Estados, consolidando um parâmetro internacional para a proteção desses direitos. A declaração ainda exerce impacto nas ordens jurídicas nacionais, na medida em que os

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direitos nela previstos têm sido incorporados por constituições nacionais. Internacionalmente, a Declaração tem estimulado a elaboração de instrumentos voltados à proteção dos direitos humanos e tem sido referência para a adoção de resoluções no âmbito das Nações Unidas”.[17] (Grifo nosso)

A respeito desse impacto das normas de Direitos Humanos, sobre as ordens jurídicas nacionais, à medida que foram sendo incorporados pelos ordenamentos constitucionais acabaram gerando um novo paradigma no sistema jurídico-político internacional, conforme descreve José Joaquim Gomes CANOTILHO:

“[...] os traços caracterizadores desse novo paradigma emergente são os seguintes: (1) alicerçamento do sistema jurídico-político internacional, não apenas no clássico paradigma das relações horizontais ente estados (paradigma hobbesiano/westfalliano, na tradição ocidental), mas no novo paradigma centrado nas relações entre Estado/povo (as populações dos próprios estados); (2) emergência de um jus cogens internacional materialmente informado por valores, princípios e regras universais progressivamente plasmados em declarações e documentos internacionais; (3) tendencial elevação da dignidade humana a pressuposto ineliminável de todos os constitucionalismos”.[18]

O mais interessante é que, fugindo à prática convencional de recepção formal de normas internacionais, mesmo se tratando de uma resolução, os Estados não as incorporam formalmente, mas reproduzem literalmente dispositivos da Declaração em seus ordenamentos legais constitucionais. E ainda mais, as normas foram inseridas como dispositivos fundamentais dos Estados e, sendo assim, no vértice dos ordenamentos jurídicos legais dos Estados, produzindo desdobramentos normativos em todo o sistema jurídico estatal. Observe-se ainda a elevação dos direitos da personalidade que passaram a ter um tratamento diferenciado e constitucional, como uma garantia fundamental do Estado.

As décadas seguintes foram marcadas pela releitura constitucional, no âmbito dos Estados ocidentais, no sentido de incluírem dentre o rol de direitos consagrados nacionalmente o maior número possível de direitos humanos. No plano internacional, organizações internacionais, aos moldes das Nações Unidas, fomentaram a multiplicação de tratados internacionais protetivos, sempre com o intuito de assegurar ao indivíduo, onde quer que esteja, o mínimo de direitos e garantias, consideradas universais, para a segurança mundial, a paz e o desenvolvimento da humanidade em decorrência disso no plano interno, e por ser uma obrigação moral dos Estados, são absorvidas regras constitucionais e que passam a iluminar todo o sistema normativo e principiológico da concepção dos direitos da personalidade pelos Estados.

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5. Biodireito e ética da espécie: Um passo adiante na redefinição dos Direitos de Personalidade

O processo de transformação ocorrido no plano internacional e que produziu impactos nos sistemas constitucionais, especificamente na tutela dos direitos de personalidade, influenciou também o Direito Civil, que frente às transformações da sociedade, superou o modelo do liberalismo clássico, mas conservou como objetivo básico, a tutela de uma esfera de autonomia reconhecida ao particular, como expressão de seu valor como pessoa.

Por outro lado, a partir de então, tal processo se somou a um conjunto de novos temas decorrente dos avanços científicos com a manipulação dos genes humanos. Assim, não é possível olvidar que, diante das mudanças sofridas no estudo do Direito Civil e dos direitos de personalidade, através da ampliação do conceito dos direitos individuais, um passo adiante nessa panacéia foi o surgimento do Biodireito como novo objeto de estudo do tema e que produz repercussão sobre sua concepção doutrinária.

O ser humano vive em um tempo em que o progresso acelerado da tecnologia e da ciência o coloca quase diariamente diante de novas descobertas. E Isso vem acontecendo em graus tão acentuados, a ponto de o indivíduo não mais manifestar grande espanto ou admiração diante delas. Algumas novidades são de tal forma marcantes, que não há quem lhes possa ser indiferente, e representam um alento e esperança em face da descoberta da cura de alguma doença até então considerada incurável, ou dos novos métodos cirúrgicos de transplante de órgãos humanos e da iminente clonagem de seres humanos.

Especialmente em relação às experiências genéticas, os genes da vida, os seres humanos vêm sendo expostos a todo tipo de experiência chegando até mesmo a comercialização do corpo e de partes dele, levando agora ao questionamento sobre os limites do respeito dos direitos individuais, especificamente a dignidade humana e aos direitos da personalidade no contexto das variadas experiências que atentem contra a identidade e aos direitos elementares da personalidade.

Francis Bacon, em sua obra “A grande renovação”, escreve que:

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“Uma advertência geral eu dirijo a todos: que considerem quais os verdadeiros fins da ciência, e que não a busquem para o prazer do espírito ou para a discussão ou para a superioridade sobre os outros, mas sim para vantagem e proveito da vida; e que a aperfeiçoem e a administrem no amor ao próximo... Podem surgir auxílio para o ser humano e uma descendência de invenções, que de alguma forma podem superar as necessidades e misérias da humanidade... Pois a tarefa à nossa frente não é a mera felicidade da especulação, mas sim o verdadeiro negócio e bem do gênero humano e todo o poder da ação... E assim aqueles fins geminados, ciência humana e poder humano, na realidade resultam em uma coisa só” [19]

A idéia que deve permanecer diante do estudo dos direitos de personalidade e o surgimento do Biodireito é o de uma ética comum, voltada para a preservação eda espécie humana e o resguardo de seus direitos elementares, como bem ressalta Elio Sgreccia:

“A ética não pode ser vivida apenas na rede das relações interpessoais, deve sê-lo também nos fatos estruturais e nos mecanismos socioeconômicos. Ela não pode permanecer num livro de sonhos ou numa contínua divisão entre exigências das pessoas e mecanismos perversos”[20].

A ética de espécie que desponta do referido debate envolve a órbita dos direitos da personalidade e guarda com ele relação estreita, pois o que se coloca em jogo é a própria identidade do ser humano enquanto ser humano. Assim, o Biodireito é o ramo do Direito que se refere aos fatos e eventos que surgem a partir das pesquisas das ciências da vida, que surgem do “aumento do poder do homem sobre o próprio homem que acompanha inevitavelmente o progresso técnico, isto é, o progresso da capacidade do homem de dominar a natureza e os outros homens – ou criar novas ameaças à liberdade do indivíduo, ou permitir novos remédios para as suas indigências.”[21]

O Biodireito atua junto com os direitos fundamentais, tendo em vista sua visível conexão aos direitos à vida, à dignidade e à privacidade dos indivíduos, “representando a passagem do discurso ético para a ordem jurídica, não podendo, no entanto, representar uma simples formalização jurídica de princípios estabelecidos por um grupo de sábios, ou mesmo proclamados por um legislador religioso ou moral. O Biodireito pressupõe a elaboração de uma categoria intermediária, que se materializa nos direitos humanos, assegurando os seus fundamentos racionais e legitimadores.” [22]

Cabe aqui ressaltar a grande necessidade da efetividade do direito junto às questões das biotecnologias, considerando-se que são novos valores a merecer tutela jurídica,

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tentando-se evitar violações de direitos, eis que é possível visualizar tal preocupação. O professor Francisco Amaral afirma tratar-se de,

“...nada mais do que um fértil processo de mudanças jurídicas, impostas pelos problemas da sociedade tecnológica, que tornou extremamente complexo o relacionamento social e impôs crescentes desafios às estruturas herdadas do século XIX. A resposta a esses desafios exige dos juristas e, particularmente, dos nossos civilistas um esforço de reflexão epistemológica que lhes permita, a partir do conhecimento do direito brasileiro na sua gênese e evolução, elaborar novos modelos que atendam às necessidades crescentes da sociedade contemporânea”.[23]

O Biodireito pode ser visto como conjunto de normas esparsas que têm por objeto regular as atividades e relações desenvolvidas pelas biociências e biotecnologias, com o fim de manter a integridade e a dignidade humana frente ao progresso, benefício ou não, das conquistas científicas em favor da vida.

Os avanços na interpretação das regras de Direitos humanos ainda não foi capaz de desenvolver nos indivíduos um sentido ético e coletivo de consciência quanto a sua responsabilidade universal em relação às transformações cientificas e o estabelecimento de um marco ético que posso estabelecer limites para os experimentos com o corpo humano, com o material genético, sua exploração econômica e com a própria perspectiva de experiências brutais que criem seres híbridos, como já vem sendo feito com as plantas, ou mesmo a uma eugenia liberal.

Já existem casos relatados e documentados nas mais variadas partes do planeta sobre a comercialização de material genético para fins de experimentos científicos, e experiências em embriões humanos já vem sendo feitas há algum tempo. Toda essa discussão, os avanços científicos e a discussão sobre o papel a responsabilidade de cada um com o todo no sentido de proteger os direitos individuais, vem gerando um debate que nos leva a uma reflexão universalista enquanto a observação da ética no âmbito dos direitos de personalidade frente aos avanços científicos.

A propósito o mapeamento genético humano traz consigo importantes elementos para autocompreensão da identidade humana e para os direitos da personalidade: primeiro somos absolutamente todos iguais, de uma única espécie humana, negros, árabes, judeus católicos muçulmanos, aqueles que vivem nos Alpes ou os que moram em barracos de barro na áfrica ou em inglus no pólo norte; segundo, comportamos características presentes em gens que nos fazem seres diversos na cor do cabelo, no comportamento, na melanina na pele, etc., que são determinados pela nossa herança genética e pelo meio

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social e é essa diversidade e essa mescla de diversidade que mantém a riqueza da vida dos seres humanos por todos esses milhares de anos.

O que está em jogo não é simplesmente o futuro da humanidade, os conflitos entre os diferentes povos, e sim, no cenário que se desenha, é a própria manutenção da espécie humana. A sua identidade genética de espécie.

O homem ainda não se autocompreendeu, pois o dogmatismo religioso, o capitalismo sufocante e obnobilaram sua visão, não permitindo mais que nos identificássemos como pessoa, não nos deixando enxergar enquanto seres da espécie, do homem enquanto universalidade antropológica de ser único e o mesmo em toda a parte do planeta.

Relatando um conjunto de casos científicos já em curso HABERMAS chama atenção para a autocompreensão humana de uma ética da espécie, quando se está diante de um conjunto de transformações que colocam o homem diante da liberdade de se dispor livremente da vida humana para fins de seleção, ao estabelecer tal discussão ele enxerga que se está cada vez mais sujeito à tecnicização da natureza humana, o que deve naturalmente gerar a uma moralização da sua natureza que apresenta-se como um sinal da rigidez dos mundos da vida quase totalmente modernizados, que perderam o apoio das garantidas metassociais e não podem mais reagir a uma nova ameaça da sua consistência sociomoral com outros impulsos de secularização e sobretudo, com uma cognição moral e cognitiva do dogmatismo religioso.[24]

Esse mecanismo de identificação de uma ética de espécie vem inserta na idéia de uma autocompreensão que não permite mais que dela se deduzam argumentos que suplantem as pretensões de uma moral universal a ser validada para todos os povos, mas, uma primazia do justo em relação ao bom, sem perder de vista o fato de que a moral abstrata da razão, pertencente ao discurso dos direitos humanos, apóia-se por sua vez numa autocompreensão de ética de espécie compartilhada por todas as pessoas morais.[25]

Agora no cenário contemporâneo, o desenvolvimento da tecnologia e do mapeamento genético mostram outras dimensões de nós mesmos, dimensões não conhecidas de imagens construídas no espelho ao longo de nosso processo de amadurecimento civilizacional, ao longo da evolução humana e que nos coloca mais perto de nós, de nosso semelhantes, para um caminho de compreensão de um universalismo que compartilha as identidades individuais, os direitos elementares da personalidade e que se agregam a ela e a sua teoria normativa e doutrinária.

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6. A contemporaneidade como ambiente para ampliação do conceito de personalidade

A sociedade contemporânea se caracteriza pela ampla inter-relação dos vários atores internacionais, que se traduz na intensificação das interações transnacionais, supranacionais ou cosmopolitas, através de práticas interestatais, de caráter público ou privado, nas práticas capitalistas globais, ou interações sociais e culturais entre os povos.

A partir da Segunda Guerra Mundial ocorre uma ruptura com o sistema anterior e uma readequação do Estado na sociedade internacional, que vai buscar, em foros conjuntos de discussão, respostas para seus problemas, bem como se estabelecem novos princípios basilares que passam a nortear, a partir dali, as relações internacionais. Todos esses fatores acima descritos foram potencializados com o desencadeamento do processo de globalização, que representou a conjunção amplificada desses elementos com outros de ordem política, tecnológica, científica, cultural e econômica, em uma coincidência histórica que constitui, neste panorama, a sociedade internacional contemporânea.

A propósito destas transformações, Octávio IANNI consegue consubstanciar com clareza esta nova realidade ao enfatizar que:

“As transformações que estão ocorrendo no mundo na Segunda metade do século XX, anunciando o XXI, podem ser encaradas como manifestações de uma ruptura histórica mais ou menos drástica e geral, com implicações práticas e teóricas fundamentais. São transformações repentinas e lentas, parciais e totais, visíveis e invisíveis, surpreendendo uns e outros em todos os lugares, continentes, ilhas e arquipélagos. Ocorrem em nível local, nacional, regional e mundial, envolvendo as condições sociais, econômicas, políticas e culturais de indivíduos, famílias, grupos sociais, classes sociais, coletividades, povos, nações e nacionalidades. A geografia e a história parecem entradas em novo ciclo, adquirindo movimentos inesperados e dimensões surpreendentes. Realidades geográficas e históricas que pareciam estáveis ou ultrapassadas ressurgem de repente, ao mesmo tempo que se desenham novos mapas do mundo. São cartografias desesperadas destinadas a redesenhar os espaços e os tempos fugidos dos seus lugares inesperados. Também ideais e projetos individuais e coletivos são abalados, ou envelhecem repentinamente, quando ressurgem antigas nostalgias e criam-se novas utopias. Tudo parece continuar no mesmo lugar, inabalado, mesmo ou evidente, quando tudo se abala, se transforma, desmorona ou recria de tal maneira que o mundo adquire outros movimentos, diferentes configurações. Abalam-se os quadros sociais e mentais de referência gerando impasses e aflições, ou crises e conflitos, tanto quanto perspectivas e horizontes. Sob muitos

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aspectos, as transformações que estão ocorrendo no mundo no fim do século XX, sugerindo os primeiros lineamentos do XXI, são manifestações de uma ruptura de amplas proporções, por suas implicações práticas e teóricas. Inicia-se outro ciclo da história, talvez mais universal que os outros, cenário espetacular de outras forças e outras lutas sociais.[26]

O Estado, como era concebido naquele tempo, torna-se um instrumento cada vez mais inadequado em nosso tempo, desenquadrado do mundo, démodé, que não possui mais a centralidade do controle de certas prerrogativas que até então eram inalienáveis da esfera de sua competência, ao mesmo tempo se fortalece a partir da concepção dos Direitos Humanos a proteção aos direitos individuais, paradoxalmente derivados das cartas constitucionais desses mesmos Estados que se autolimitam e se colocam como um instrumento para proteção desses direitos.

Neste sentido, Boaventura de SOUZA SANTOS comenta:

“O Estado-nação parece ter perdido a sua centralidade tradicional enquanto unidade privilegiada de iniciativa econômica, social e política. A intensificação de interações que atravessam as fronteiras e as práticas transnacionais corroem a capacidade do Estado-nação para conduzir ou controlar fluxos de pessoas, bens, capital ou idéias, como o fez no passado”.[27]

De qualquer forma, este enfraquecimento não significa o fim do Estado, que deve continuar existindo por muito tempo e sendo o detentor do comando normativo aos seus jurisdicionalizados através de textos constitucionais. Também não significa o sepultamento da soberania, que continua a ter sua importância como instrumento de organização da sociedade, representando limites geográficos entre os povos e determinando, em certo grau, as normas de seus jurisdicionados, contudo, não mais como poder absoluto que antes detinha, conforme concebido pelo sistema westefaliano. Agora, abrem-se fissuras, poros, por onde a transnacionalidade social, normativa, cultura e econômica, opera e se fortalece em razão disso a proteção aos direitos individuais, especialmente a esfera da personalidade humana.

André-Jean ARNAUD comenta esta alteração, lembrando a importância da reformulação nos mecanismos jurídicos como forma de regular a sociedade contemporânea:

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“Em suma, os Estados-nações continuam indispensáveis para desempenhar o papel de guardas, de ‘gendarmes’ de uma ordem internacional que não pode mais ser objeto de uma regulação pelo direito internacional clássico sem todavia, questionar a natureza consensual do direito internacional em si. Ainda se diz. “a fraqueza do sistema jurídico internacional, hoje, é largamente um reflexo da fraqueza do sistema internacional no seu conjunto. “enquanto se espera uma reforma em profundidade da regulação internacional, são os Estados que continuam a ser os produtores de direito e também os encarregados de sua aplicação.[28]

O fator determinante que deve ser observado para o estabelecimento de novos paradigmas jurídicos do Direito Internacional está, na realidade que se avista, nas transformações que o cenário internacional contemporâneo tem sofrido, e seu impacto sobre o direito dos Estados e de seus jurisdicionados e as respostas que está a reclamar do direito como instrumento de regulação social.

Este vasto universo de fatos e de atos internacionais, ampliados pelo surgimento de novos sujeitos e canais de inter-relação no cenário internacional, exigem uma remodelação do próprio direito, especificamente no caso dos Direitos Humanos que amplia seu alcance e se utiliza das Cartas constitucionais nesse sentido.

Há, por assim dizer, no atual cenário contemporâneo, um pluralismo jurídico[29], sobretudo pela interpenetração dos direitos. Tal pluralismo, segundo esclarece André-Jean ARNAUD[30] “é oriundo da fragmentação das soberanias”; tanto pelos modos de regulação do direito, como das fontes desta regulação, absorvendo mecanismos de regulação alternativa não estatal; dando origem a um pluralismo de racionalidades, e que produz, no campo do direito, lógicas estilhaçadas, pela flexibilização e diversificação de produção normativa que se multiplicam a todo o tempo.

Os direitos internos vão sendo produzidos de acordo com a adequação de regras produzidas no plano internacional e isso, sem dúvida, leva a uma internacionalização dos direitos, não só como regra material, mas também porque influencia o próprio sistema central e ideológico do Direito do Estado.[31] O Direito interno dos Estados, com o processo de internacionalização, tende a adquirir características de uniformidade ainda maior, desenvolvendo-se inclusive consenso quanto aos dogmas que se espalham pelos vários universos jurídicos. O Direito nacional, cada vez mais influenciado pelo que ocorre no plano internacional, vai se amoldando a ele. Aliás, Hans KELSEN já havia enunciado que “não existe nenhuma fronteira absoluta entre o direito nacional e o direito internacional, prova disso é a influência dos Direitos Humanos sobre a concepção contemporânea dos direitos de personalidade.”[32]

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Assiste-se assim, a standartização de direitos elementares que são absorvidos pelos Estados. Surgem a partir de discussões dos Estados em Organismos internacionais e também por instrumentos jurídicos de transposição normativa e acabam sendo absorvidos pelos ordenamentos jurídicos internos como um direito estatal, uma norma nacional inserta nos mais variados ramos do direito.

Não se pode deixar de mencionar aqui, como forma de aprofundar a discussão, a observação feita por Guido Fernando Silva SOARES, que chama a atenção para o mesmo fenômeno ao comentar:

[...] existe um outro fenômeno digno de nota: no momento em que um ramo do direito interno torna-se internacional, perdem relevância suas fontes internas, ganha ele métodos de hermenêutica diferentes dos vigentes no ordenamento interno, e as regras de sua vigência no espaço e no tempo são distintas daquelas das normas domésticas.[33]

No contexto de um processo de internacionalização de normas internas, faz-se necessário que o operador do direito tenha um amplo conhecimento do Direito Internacional, inclusive das fontes normativas que influenciaram na produção dessas regras reproduzidas a partir de foros internacionais, para que possa, efetivamente, debater e argumentar sobre a natureza e finalidades desta regra perante os tribunais de seu Estado, buscando o verdadeiro sentido teleológico-normativo daquele direito, não se pode portando deixar de lado essa premissa ao se deparar com os direitos de personalidade.

Nas palavras de Jungen HABERMAS, reinaugurando, assim, um novo cosmopolitismo com “um sistema de leis para um conjunto de povos”[34].

Existe hoje, portanto, “um processo de internacionalização de toda a vida jurídica”[35], estabelecendo novos paradigmas para o pensamento do próprio direito interno, que não mais pode ser ignorado pelos Estados e indivíduos, a influência crescente no exercício da ordem internacional na produção normativa, sob pena de pecar pela ignorância, seja através da subtração de direitos, seja pela possibilidade de não exercício deles.

7. Conclusão

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Os direitos da personalidade surgem a partir de uma concepção eminente privatista que se redefine e se redescobre a partir do fim da segunda Grande Guerra Mundial, sofrendo forte influencia do Direito Internacional, dos direitos Humanos e do Direito constitucional.

É no plano internacional que os debates de multiplicação dessas concepções estatais tomam corpo e se reproduzem com os canais de diálogos abertos no âmbito das Nações Unidas e da definição de uma agenda global que prioriza a proteção dos Direitos Humanos.

Por sua vez, são os Direitos Humanos que fortalecem e ampliam o conceito dos direitos individuais, a partir de uma perspectiva de retomada do pensamento humanista em detrimento de uma visão imitada dada pelo sistema privado, redimensionando assim seu objeto e conceito.

Como os Estados se comprometeram com o discurso sobre os Direitos Humanos em foros internacionais no âmbito da manifestação de sua vontade e soberania, a introdução dessas regras nos sistemas jurídicos internos se dá através da absorção pela norma constitucional, iluminando todo o sistema normativo dentro de certos paradigmas normativos.

Aliada a isso, a revolução tecnológica trouxe novos elementos e novos objetos de disciplinamento normativo, e um novo olhar sobre estes direitos, ampliando a leitura do conceito de direito fundamental para abraçar a proteção ao meio ambiente, ao patrimônio genético e cultural, à democracia e aos novos direitos especialmente no campo das biotecnologias o biodireito.

Nesse esteio é que, não só no plano local, mas principalmente no contexto de uma sociedade global que permeia a concepção de um cenário contemporâneo pós-moderno[36] é que se fragmentam os conceitos, valores, e princípios dificultando assim, a determinação do conceito da personalidade nesse processo e exige um amplo enfoque multidisciplinar. Além de que, a sociedade humana, agora mais universal, volta-se para um contexto em que os pluralismos normativos e filosóficos expõem novos campos de abordagem, novas perspectivas, e novos elementos a impulsionar e a rediscutir os conceitos até então absolutos e que agora são mutáveis, ajustáveis e passíveis de redefinição e realocação doutrinária nesse cenário.

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[1] Professor Doutor (USP) com pós-doutorado na Universidade de Pádova- Italia. [email protected]

[2] Professora Mestre (PUCPR) [email protected]

[3] John Rawls. O Direito dos Povos. São Paulo: Martins Fontes, 2004.

[4] Jürgen Habermas. O Futuro da Natureza Humana. São Paulo: Martins Fontes, 2004.

[5] Otfried Hoffe. A Democracia no Mundo de Hoje. São Paulo: Martins Fontes, 2005.

[6] André Ramos Tavares. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2002.

[7] REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 1988, p. 225.

[8] Nesse sentido a primeira premissa que podemos extrair é a de que somente o ser humano é capaz de direitos e obrigações. Foi-se o tempo em que se processava um animal, ou se apurava a responsabilidade das coisas.

[9] LIMA, João Franzen. Curso de direito civil brasileiro. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1955, p. 140.

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[10] TEPEDINO, Gustavo. A tutela da personalidade no ordenamento civil-constitucional brasileiro. In: Temas de direito civil. Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p.47.

[11] Norberto BOBBIO ensina que: “a afirmação dos direitos humanos é ao mesmo tempo universal e positiva. Universal no sentido de que os destinatários dos princípios nela contidos não são mais apenas os cidadãos deste ou daquele Estado, mas todos os homens e positiva no sentido de que põe em movimentos um processo em cujo final os direitos do homem deverão ser não mais apenas proclamados ou apenas idealmente reconhecidos, porém efetivamente protegidos até mesmo contra o próprio Estado que os tenha violado.” BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos, p. 30.

[12] ALVES. José Augusto Lindgren. A arquitetura internacional dos direitos humanos, p. 323.

[13] É impossível deixar de reconhecer que em muitas passagens da doutrina cristã existem elementos dos direitos humanos.

[14] “A importância dos direitos do homem é tal que se pode verdadeiramente afirmar que, com eles, com o reconhecimento e o início da usa realização, a sociedade humana deu um salto qualitativo em frente. Em todo o caso, os direitos do homem representam um elemento novo no desenvolvimento da humanidade, na vida da sociedade humana que marca o fim de um período e o princípio de uma nova era nas relações internacionais.” SZABP, Imre. Fundamentos históricos e desenvolvimento dos direitos do homem, p. 55.

[15] PIOVESAN, Flavia. Sistema Internacional de Proteção dos Direitos Humanos: inovações, avanços e desafios contemporâneos, p. 57.

[16] Declaração Universal dos Direitos do Homem.

[17] PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional, p. 152.

[18] CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição, p. 1276.

[19] Do prefácio da “The Great Instauration”, As frases citadas encontram-se em Bacon nesta ordem, mas em distâncias maiores. Para dar uma idéia da crítica direta de Bacon à teoria clássica, acrescenta-se mais esta citação: “No tocante ao seu valor e utilidade, deve-se dizer que aquela sabedoria que nós recebemos sobretudo dos gregos representa apenas a meninice do conhecimento e possui a propriedade típica do mesmo: pode falar, mas não testemunhar, pois é fecunda em disputas mas árida em obras”.

[20] SGRECCIA, Elio. Manual de Bioética - Fundamentos e ética Biuomédica. Edições Loyola.: São Paulo,1998.

[21]BOBBIO, Norberto. O positivismo jurídico: lições sobre filosofia do direito. Trad. Márcio Pugliesi. São Paulo: Ícone, 1995.

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[22] BARRETO, Vicente de Paulo. Bioética, biodireito e direitos humanos. In: MELLO, Celso de Albuquerque et al. Teoria dos direitos fundamentais. Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p.410.

[23] AMARAL, Francisco. Apud Regina Luvia Fiuza Sauwen, in “Da Persona ao Clone - a Visão do Biodireito -prelo dos anais do Encontro Regional do Conpendi - e I Simpósio de Bioética e Biodireito - realizados em Londrina/PR de 25 a 27 de maio de 1997, fls 12.

[24] HABERMAS, Jurgen. O futuro da natureza humana: a caminho de uma eugenia liberal?; tradução de Karina Jannini; revisão da tradução Eurides Avance de souza_São Paulo: Martins Fontes, 2004.

[25] idem

[26] IANNI Octávio. A Era do globalismo, p. 17-18.

[27] SOUZA SANTOS, Boaventura de. A globalização e as ciências sociais, p. 36.

[28] ARNAUD, André-Jean. O Direito entre modernidade e globalização: lições de filosofia do direito e do estado, p. 179.

[29] MELLO, Celso de Albuquerque. Curso de direito internacional público, p. 114.

[30] ARNAUD, André-Jean. O Direito entre modernidade e globalização: lições de filosofia do direito e do estado, p. 214-215.

[31] NICKLAS LUHMANN observa inclusive uma internacionalidade de métodos de pesquisa aplicáveis aos diversos ordenamentos jurídicos. LUHMANN, Nicklas. La differenziazione del Diritto. p. 59.

[32] KELSEN, Hans. Teoria Geral do Estado e do Direito, p. 463 e Teoria Pura do Direito, p. 437.

[33] SOARES, Guido Fernando Silva. Direito internacional do meio ambiente: emergência, obrigações e responsabilidades, p. 33.

[34] HABERMAS, Jungen. Facticidad y validez sobre el derecho y el Estado democrático de derecho en términos de teoria del discurso, p. 28.

[35] MELLO, Celso de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Público, p. 113.

[36] .Zygmunt Bauman. O Mal Estar da Pós-modernidade, Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1998.