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7/30/2019 22939425 as Seis Perfeicoes Do Budismo http://slidepdf.com/reader/full/22939425-as-seis-perfeicoes-do-budismo 1/5 As seis perfeições do budismo Praticar a generosidade, a disciplina ética, a paciência, a sabedoria, o esforço entusiástico e a concentração levam a um estado de bem-estar e felicidade plenos. Saiba como trazê-las para seu dia a dia e ter mais qualidade de vida. Direção de arte • Camilla Sola Texto • Melissa Diniz Praticar a generosidade, a disciplina ética, a paciência, a sabedoria, o esforço entusiástico e a concentração levam a um estado de bem-estar e felicidade plenos. Saiba como trazê-las para seu dia a dia e ter mais qualidade de vida. Imagine como seria se cada um de nós, ao nascer, recebesse um roteiro para encontrar a tão sonhada felicidade. Nesse tal código de conduta não estaria o nome de seu par perfeito nem a profissão que você deveria seguir para ter sucesso, mas algumas atitudes capazes de afastá-la da tristeza e da dor, levando-a a um estágio de bem-estar pleno. Pois, para os praticantes do budismo, esse roteiro existe e está expresso nas seis perfeições descritas por Buda e seus discípulos. A palavra perfeição, ou paramita (em tibetano), tem como tradução literal a expressão “ir além”, ou “atravessar para a outra margem”. Segundo os preceitos do budismo, essa “travessia” é o caminho mais eficiente para quem busca se libertar de emoções perturbadoras – como a raiva, o medo e a depressão – e quer viver com mais alegria, paz e prosperidade. Na realidade, o termo perfeição, nesse contexto, é usado para simbolizar seis virtudes: generosidade, disciplina ética, paciência, esforço entusiástico, concentração e sabedoria, que juntas configuram um estilo de vida baseado na compaixão. Isso porque, no budismo, o outro vem sempre em primeiro lugar e seu contentamento funciona como uma espécie de termômetro para sabermos se estamos na trilha certa para obter nossa própria satisfação. Para divulgar essa profunda filosofia, diversos representantes e divulgadores do budismo no Brasil se reuniram na Livraria da Vila, em São Paulo, por ocasião do lançamento do livro As Seis Perfeições – Como Atingir o Bem-Estar Supremo (WMF Martins Fontes), do mestre Geshe Sonam Rinchen. Na obra, o autor – que é professor de filosofia budista em Dharamsala, cidade indiana onde vivem o dalai-lama e as principais autoridades tibetanas condenadas ao exílio – comenta as vantagens de incorporarmos essas virtudes ao nosso dia a dia. “Ao respeitarmos o outro, por meio da prática das seis perfeições, somos capazes de alcançar o que mais desejamos”, diz. Ao que acrescenta a monja Coen, fundadora da Comunidade Zen Budista de São Paulo: “Quem pega só

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As seis perfeições do budismo

Praticar a generosidade, a disciplina ética, a paciência, a sabedoria, o

esforço entusiástico e a concentração levam a um estado de bem-estar e

felicidade plenos. Saiba como trazê-las para seu dia a dia e ter maisqualidade de vida. Direção de arte • Camilla Sola

Texto • Melissa Diniz 

Praticar a generosidade, a disciplina ética, a paciência, a sabedoria, o esforço

entusiástico e a concentração levam a um estado de bem-estar e felicidade

plenos. Saiba como trazê-las para seu dia a dia e ter mais qualidade de vida.

Imagine como seria se cada um de nós, ao nascer, recebesse um roteiro para

encontrar a tão sonhada felicidade. Nesse tal código de conduta não estaria o

nome de seu par perfeito nem a profissão que você deveria seguir para ter 

sucesso, mas algumas atitudes capazes de afastá-la da tristeza e da dor,

levando-a a um estágio de bem-estar pleno. Pois, para os praticantes do

budismo, esse roteiro existe e está expresso nas seis perfeições descritas por 

Buda e seus discípulos. A palavra perfeição, ou paramita (em tibetano), tem

como tradução literal a expressão “ir além”, ou “atravessar para a outra

margem”. Segundo os preceitos do budismo, essa “travessia” é o caminho mais

eficiente para quem busca se libertar de emoções perturbadoras – como a

raiva, o medo e a depressão – e quer viver com mais alegria, paz eprosperidade.

Na realidade, o termo perfeição, nesse contexto, é usado para simbolizar seis

virtudes: generosidade, disciplina ética, paciência, esforço entusiástico,

concentração e sabedoria, que juntas configuram um estilo de vida baseado na

compaixão. Isso porque, no budismo, o outro vem sempre em primeiro lugar e

seu contentamento funciona como uma espécie de termômetro para sabermos

se estamos na trilha certa para obter nossa própria satisfação.

Para divulgar essa profunda filosofia, diversos representantes e divulgadoresdo budismo no Brasil se reuniram na Livraria da Vila, em São Paulo, por 

ocasião do lançamento do livro As Seis Perfeições – Como Atingir o Bem-Estar 

Supremo (WMF Martins Fontes), do mestre Geshe Sonam Rinchen. Na obra, o

autor – que é professor de filosofia budista em Dharamsala, cidade indiana

onde vivem o dalai-lama e as principais autoridades tibetanas condenadas ao

exílio – comenta as vantagens de incorporarmos essas virtudes ao nosso dia a

dia. “Ao respeitarmos o outro, por meio da prática das seis perfeições, somos

capazes de alcançar o que mais desejamos”, diz. Ao que acrescenta a monja

Coen, fundadora da Comunidade Zen Budista de São Paulo: “Quem pega só

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para si não percebe que faz parte de um todo e que beneficiando os outros

também será beneficiado”.

Aplicação e disciplina

De acordo com Rinchen, enquanto a prática da generosidade, da disciplina

ética e da paciência é direcionada ao benefício dos outros, a concentração e a

sabedoria são importantes para o desenvolvimento pessoal. Já o esforço

entusiástico é necessário em ambos os casos.

Mesmo com o roteiro de Buda em mãos, alcançar o bemestar pleno exige

dedicação. Rinchen afirma que somente com a prática constante e diária,

mesmo nas situações mais simples da vida, é possível desenvolver essas

virtudes.

Essa é também a opinião da lama Tsering Everest, coordenadora do centro de

budismo tibetano Odsal Ling, em São Paulo: “A mudança de hábitos somente é

alcançada com a prática. Você pode usar as seis perfeições no ato de ouvir, ao

arrumar a cama ou ao servir uma xícara de chá, mas o principal é saber que

tudo o que fazemos deve ter como base não o eu, mas o todo”. Dadas as

explicações, está na hora de saber como as seis perfeições podem ajudá-la a

ser plena e equilibrada. Conheça um pouco mais sobre cada uma delas a

seguir.

1. Generosidade

Uma das principais práticas da filosofia budista é também sinônimo de doação.

Mais do que abrir mão dos bens materiais e de consumo, ela implica

disposição para dar algo ao outro de maneira espontânea e de boa vontade.

O primeiro passo para você alcançá-la em plenitude é superar o apego.

“Pensar na transitoriedade das coisas, inclusive do corpo, diminui nossa

ligação excessiva a tudo que nos rodeia. Dê o possível agora e deseje

intensamente ser capaz de se desapegar daquilo de que é mais difícil

renunciar”, aconselha Geshe Sonam Rinchen.

O exercício de tal atitude e a compreensão da transitoriedade das coisas

evitam que soframos exageradamente na ausência de objetos, pessoas ou

posses que consideramos importantes. Ele recomenda: “Não adie uma ação

generosa. Aproveite cada oportunidade que surgir na vida, pois possuir muito é

inútil e, quanto maior a doação, mais recursos virão em nossa direção”. Do

ponto de vista do budismo, o excesso de bens materiais, além de não trazer areal felicidade para a vida, gera concentração de riqueza de um lado e miséria

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do outro. Já a divisão dos recursos é capaz de criar prosperidade para todos.

Vale lembrar mais uma vez que a generosidade só tem valor quando é sincera,

feita com alegria e sem esperar nada em troca.

2. Disciplina ética

Formado pela junção de duas qualidades igualmente importantes e profundas,

esse preceito se manifesta de três maneiras diferentes: a coibição do mal, a

criação da virtude e o trabalho voluntário pelo próximo.

Para o budismo, o mal se expressa por meio de toda atitude física e verbal que

possa prejudicar os outros e a nós mesmos. Por isso, um dos papéis da

disciplina ética é justamente evitar a impulsividade, o arrependimento e levar à

consciência plena das palavras e dos atos diários.

“O primeiro passo para ter essa virtude é reconhecer e admitir os pensamentos

e ações faltosos como tais”, diz Rinchen. Depois vem a necessidade de

transformar suas atitudes: “Você está fazendo o que sempre fez, não é de

surpreender que as coisas estejam na mesma. Se quiser que elas sejam

diferentes, terá de mudar de hábitos”, orienta.

3. Paciência

Mais do que a simples calma, a paciência representa a capacidade de

permanecer com a mente serena em qualquer situação, aceitando

voluntariamente as adversidades e confiando que, aconteça o que acontecer,

será para seu bem. Ela seria, em linhas gerais, uma compilação da tolerância,

da resignação e da fé. Mas é preciso, entretanto, diferenciar a paciência da

supressão da raiva, alerta Rinchen. “Quando a raiva simplesmente submerge,

persiste como ressentimento, e a paz e a harmonia não são possíveis

enquanto houver mágoa”, diz. A paciência seria então o contrário da raiva, a

possibilidade de perceber as dificuldades e defeitos dos outros e decompreendê-los, sem julgar, criticar ou condenar. Algo que não é fácil, é claro,

mas que pode ser conquistado pouco a pouco. Outro alicerce dessa virtude é a

esperança. “Assim como o dia é seguido pela noite e a noite pelo dia, bons e

maus períodos se sucedem. Quando houver maus períodos, tome coragem e

pense que o sofrimento não durará para sempre”, sugere.

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4. Sabedoria

Raiz de todas as qualidades, essa é uma virtude importante para a prática de

todas as outras. Sem ela, a generosidade, a disciplina ética, a paciência, o

esforço entusiástico e a concentração se tornam cegos. Para Rinchen, é ela

que faz com que cada virtude se torne mais forte.

 Até mesmo para ser generoso, é preciso ser sábio, dizem os especialistas. “O

inferno está cheio de boas intenções, por isso é importante sabermos quem e

como ajudar para não acabarmos prejudicando quem recebe”, explica Enio

Burgos, fundador da Associação Meditar, em São Paulo. O simples ato de dar 

dinheiro a uma criança de rua, por exemplo, pode parecer uma boa ação, mas

corre o risco de contribuir para o mal, caso ele seja usado para a compra de

drogas. Essa visão mais abrangente das causas e consequências de nossos

atos é a sabedoria, virtude que pode ser adquirida com estudo, observação darealidade e fortalecimento de um olhar mais profundo sobre a existência

humana.

Buda disse: “Muitos problemas do mundo têm raiz na ignorância”. Na visão

budista, negar que não fazer o bem aos outros nos prejudica explica, em parte,

o caos que vivemos. O inverso também é verdadeiro: o bem que fazemos volta

para nós. “Se percebêssemos a vida como uma oportunidade de nos tornarmos

pessoas melhores e enxergássemos no outro um igual, não haveria tanto

sofrimento”, diz Burgos.

5. Concentração

Você tem o hábito de fazer mil coisas ao mesmo tempo e de estar sempre

preocupada com problemas que ainda não aconteceram? Para o budismo,

esse comportamento demonstra que sua mente não está tranquila, pois foi

dominada pelo medo e pela ansiedade, emoções contrárias à felicidade. A

melhor maneira de combater esses sentimentos, diz Rinchen, é se esforçar 

para manter a atenção no aqui e agora, vivenciando cada momento por vez,

com total concentração, sem perder o foco, haja o que houver. “Precisamos

estar mais presentes em cada ato de nossa vida”, afirma o escritor Enio

Burgos. “Vejo pais tão apressados ao buscarem os filhos na escola que mal

esperam a criança entrar no carro para acelerar. Sabemos que todos têm uma

vida corrida, mas, se não temos tempo em quantidade, que possamos dar pelo

menos qualidade às pessoas que convivem conosco.”

Para aprimorar a concentração, os budistas usam a meditação, que acalma os

pensamentos e evita que possíveis problemas, reais ou imaginários, desviem

nossa atenção do que realmente importa: o agora.

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6. Esforço entusiástico

Todas as conquistas ganham sabor especial quando alcançadas com esforço.

Para o budismo, não é somente o bom resultado que nos alegra, mas o

caminho que percorremos para consegui-lo. Na visão do autor, ainda que uma

pessoa não alcance o que deseja, se tiver se dedicado a isso, ficará feliz no

final, pois sabe que fez o seu melhor. Essa junção de prazer e dedicação é o

esforço entusiástico, virtude capaz de tornar menos espinhosas até mesmo as

tarefas mais difíceis. Ela pode se manifestar na forma de determinação para

enfrentar um obstáculo, caso de um atleta que não poupa esforços para

superar seus limites, na satisfação em fazer o que é certo e no trabalho em

favor do próximo. Para entender isso, basta lembrarmos de pessoas que, em

casos de desastres, largam tudo para socorrer os amigos e vizinhos e sentem-

se muito felizes com isso. “Todos nós enfrentamos na vida adversidades as

quais não podemos controlar, mas os grandes mestres nos mostraram outradimensão de felicidade, relacionada ao fato de sermos íntegros o tempo todo,

dando nosso melhor em todas as tarefas que fazemos, sejam elas para nós ou

para os que convivem conosco”, afirma a lama Tsering.

FONTE: Revista Bons Fluidos, nº 128, novembro 2009.