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Titulo original: Modernity andSelf-Identity: Self and Society in the Late Modern Age Tradu<;:ao autorizada da edi<;:aoinglesa publicada em1999, porPolity Press, de Oxford, Inglaterra Copyright daedi<;:aoem lingua portuguesa © 2002: Jorge Zahar Editor Ltda. rua Mexico 31 sobreloja 20031-144 Rio de Janeiro, RJ tel.: (21) 2108-0808 /fax: (21) 2108-0800 e-mail: jze@zahar.com.br site:www.zahar.com.br Todos os direitos reservados. A reprodu<;:aonao-autorizada desta publica<;:ao,no todo ou emparte, constitui viola<;:ao de direitos autorais. (Lei 9.610/98) CIP-Brasil. Cataloga<;:ao-na-fonte Sindicato Nacionaldos Editores de Livros, RJ. Giddens, Anthony, 1938- G385m Modernidade e identidade / Anthony Giddens; tradu<;:ao, PlinioDentzien. - Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2002. Tradu<;:ao de: Modernityand self-icfentity: self and society in the late modern age ISBN978-85-7110-669-7 1. Estrutura social. 2. Identidade(Psicologia). 3. Self (Psicologia). 4. Civiliza<;:ao moderna- Aspectos psicologicos. 1. Titulo. CDD: 155.2 CDU: 159.923.2 1. Os contornos da alta modernidade 17 I--;.·o eu: seguranc;:a ontol6gica e ansiedade existencial L 3. A trajet6ria do eu 70 4. Destino, risco e seguranc;:a 104 S. A segregac;:ao da experiencia 135 6. Tribulac;:6es do eu 168 7. 0 surgimento da polrtica-vida 193 Agradecimentos 7 Apresenta~ao 9 Notas 213 Glossdrio de conceitos 221 fndice 224

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Titulo original:Modernity and Self-Identity:

Self and Society in the Late Modern Age

Tradu<;:aoautorizada da edi<;:aoinglesapublicada em 1999, por Polity Press,

de Oxford, Inglaterra

Copyright da edi<;:aoem lingua portuguesa © 2002:Jorge Zahar Editor Ltda.rua Mexico 31 sobreloja

20031-144 Rio de Janeiro, RJtel.: (21) 2108-0808 / fax: (21) 2108-0800

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Todos os direitos reservados.A reprodu<;:aonao-autorizada desta publica<;:ao,no todo

ou em parte, constitui viola<;:aode direitos autorais. (Lei 9.610/98)

CIP-Brasil. Cataloga<;:ao-na-fonteSindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ.

Giddens, Anthony, 1938-G385m Modernidade e identidade / Anthony Giddens; tradu<;:ao,Plinio Dentzien.

- Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2002.

Tradu<;:aode: Modernity and self-icfentity: self and society in the late modernage

ISBN 978-85-7110-669-7

1. Estrutura social. 2. Identidade (Psicologia). 3. Self (Psicologia). 4. Civiliza<;:aomoderna - Aspectos psicologicos. 1.Titulo.

CDD: 155.2CDU: 159.923.2

1. Os contornos da alta modernidade 17I--;.·o eu: seguranc;:a ontol6gica e ansiedade existencial

L 3. A trajet6ria do eu 70

4. Destino, risco e seguranc;:a 104

S. A segregac;:ao da experiencia 135

6. Tribulac;:6es do eu 168

7. 0 surgimento da polrtica-vida 193

Agradecimentos 7

Apresenta~ao 9

Notas 213

Glossdrio de conceitos 221

fndice 224

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4. Destino, risco e segurans;a

Viver no universo da alta modernidade e viver num ambiente de oportunida-de e risco, concomitantes inevidveis de urn sistema orientado para a domina-c;:aoda natureza e para a feitura reflexiva da historia. Sina e destino nao ternpapel formal a desempenhar em tal sistema, que opera (por principio) atravesdo que chamarei de controle humano aberto dos mundos natural e social. 0universo dos eventos futuros esd. aberto para ser moldado pela intervenc;:aodohomem - dentro de limites que, tanto quanto posslvel, sao regulados pelaaferic;:aodo risco. Mas as noc;:oes de sina e destino de maneira nenhumadesapareceram nas sociedades modernas, e uma investigac;:aosobre sua nature-za tern muitas e ricas implicac;:oes para a analise da modernidade e da auto-identidade.

Embora a afirmac;:ao possa parecer radical, pode-se dizer com algumaseguranc;:a que nao ha cultura nao-moderna que nao incorpore em algumsentido, como parte central de sua filosofia, as noc;:oesde sina e destino. 0mundo nao e visto como uma sucessao de eventos sem direc;:ao,em que asunicos agentes ordenadores sao as leis naturais e os homens, mas como algo

que tern uma forma intrinseca que relaciona a vida individual a acontecime~-tos cosmicos. 0 destino de uma pessoa - a direc;:aoque sua vida deve segUir

- e especificada pela sina dessa pessoa, 0 que 0 futuro the reserva. Ainda queexista uma grande variedade de crenc;:asque podem ser agrupadas so~ esse~dois termos, na maioria delas 0 ponto de conexao entre 0 destino e a s:na ~amorte. No pensamento grego, a sina (moira) era portadora da conden~c;:aoe. 0

. d d .. malS antlgmorte, e era conslderada urn gran e po er - malS annga que 0

dos deuses. \ h .e aDada a natureza da vida social e da cultura modern as, tendemos 0)J11a

. cA'.! .derada ucontrapor a sma e a abertura dos eventos luturos. sma c conSl Masforma de determinismo pre-ordenado, ao qual se opoe a visao mode~nt enreembora 0 conceito de sina tenha a conotac;:ao de um futuro parc\a: des'"determinado", tambem envolve normalmente uma concepc;:ao moral e

rino e ~ma visao esoterica dos eventos cotidianos - onde "esoterico" significaque os eventos saG experimentados nao so em termos de sua relac;:aocausal,mas em termos de seu significado cosmico. Nesse sentido, a sina tern pouco aver com 0 fatalismo do modo como este termo e entendido hoje. Fatalismo ea recusa da modernidade - 0 repudio a uma orientac;:ao de controle emrelac;:aoao futuro em favor de uma atitude que deixa que os eventos venhamcomo vierem.

Um importante ponto de conexao entre ideias preexistentes de sina e as doperiodo pos-medieval era 0 conceito de fortuna, que deriva originalmente donome da deusa romana da "fortuna", e que mantinha uma diflcil tensao comas crenc;:ascristas dominantes. A ideia da Divina Providencia era claramenteuma versao da sina mas, como observou Max Weber, 0 cristianismo introdu-ziu urn papel mais dinamico para os homens nesta Terra do que aquele quecaracterizava as religioes tradicionais da Grecia e de Roma.2 A deusa eradesdenhada pela Igreja, po is a ideia de "fortuna" implicava que se poderiaalcanc;:ara grac;:asem precisar trabalhar como instrumento de Deus no mundo.Ainda assim a ideia de fortuna continuou importante e chegava a superar arecompensa da providencia na outra vida como caracterlstica das crenc;:asculturais locais. 0 usa que Maquiavel faz de fortuna marca uma transic;:aosignificativa entre 0 uso tradicional da noc;:aoe 0 surgimento de novos modosde atividade social de que a sina e exclulda. Em 0 principe ele diz:

Muitos acreditavam, e ainda mantem a opiniao, que as coisasdeste mundo sao,de cerra maneira, controladas pela fortuna e por Deus, que os homens em suasabedoria nao podem controla-Ias, e, ate mesmo, que os homens nao podemremedia-las; e por essa razao podem julgar que nao precisam gastar muito suornessas quest6es, mas deixar que sejam governadas pela sina... Acredito que eve~dadeque a fortuna e 0 arbitro de metade de nossas a<j:6es,mas que ainda nosdelXa0 controle da outra metade, ou quase isso... Digo que vemos urn principeprosperar hoje e arruinar-se amanha sem que 0 tenhamos visto mudar seu caraterou qualquer de seus tra<j:os... urn principe que seap6ia completamente na fortunase arruinara tao logo ela mude; tambem acredito que 0 homem que adapta seucurso de - , d ' b d'd d .a<j:aoa natureza os tempos sera em-suce I 0 e, a mesma manelra,~ue 0 homem que determina seu curso de a<j:aofora de tom com 0 momentoaverade lamenrar-se.3

no ~ao surpreende que 0 estudo da polltica fornec;:aa area inicial na qual as~Oes d .\re-Ias e sma se transform am, po is embora a propaganda das nac;:oespossa

_ n Como conduzidas pela sina a urn destino espedfico, a pratica da pollticaPOdeo COntexto moderno - supoe a arte da conjectura. Pensar como as coisas

III acontecer casa seja seguido urn determinado curso de ac;:ao,e comparar

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isso com as alternativas, e a essencia do jUlzo politico. Maquiavel e celebradocomo 0 iniciador da estrategia polltica, mas sua obra apresenta outras inova-yoes mais fundamentais. Ele prenuncia urn mundo em que 0 risco e 0 dlculodo risco ultrapassam a fortuna em praticamente todos os domlnios da ativida-de humana. Parece que nao havia uma palavra generica para 0 risco ao tempode Maquiavel; a nOyaOaparece no pensamento europeu aproximadamente umseculo mais tarde. (Em ingles, ate 0 seculo XlX a palavra era usada em SUaversao francesa, risque. Durante certo tempo 0 termo Frances continuou a serusado ao lado na nova palavra anglicizada, que foi utilizada em primeiro lugarem relayaO aos seguros. 0 termo risque, significando uma piada que podeofender, ainda apresenta a grafia anterior.)4

"" A nOyao de risco se torna central numa sociedade que esta deixando 0

passado, 0 modo tradicional de fazer as coisas, e que se abre para urn futuroproblematico. Essa afirmayao se aplica tanto a ambientes de risco institucio-nalizado quanto a outras areas. Os seguros, como vimos no capItulo 1, sacurn dos elementos centrais da ordem economica do mundo moderno - sacparte de urn fenomeno mais geral relacionado ao controle do tempo a quechamarei de colonizayao do futuro. A "abertura" das coisas por vir expressaa maleabilidade do mundo social e a capacidade que os homens tern de darforma aos ambientes f1sicosde sua existencia. Ainda que se saiba que 0 futuroe intrinsecamente imprevislvel, e como ele e cada vez mais segregado dopassado, esse futuro se torna urn novo terreno - urn territorio de possibili-dades contrafactuais. Sendo assim, tal terreno se presta a invasao colonialpelo pensamento contrafactual e pelo dlculo do risco. Este, como mencioneiantes, nunca pode ser completo, pois mesmo em ambientes de risco relativa-mente confinados ha sempre resultados nao intencionais e imprevistos. Emambientes em que a sina desapareceu, toda ayao, mesmo a que se atem apadroes fortemente estabelecidos, e em principio "calculavel" em termos derisco - alguma especie de estimativa geral do risco pode ser feita parapraticamente todos os habitos e atividades, em relayaO a resultados espedfi-cos. A intromissao dos sistemas abstratos na vida cotidiana, junto com anatureza dinami-Gi do-Conhecimento, significa que a consciencia do~ sei~Hltra nas ayoes-de quase qualquer urn. - - - - .--'Uma discussao mais ampla do risco e de sua relayao com a auto-identl-

dade sera apresentada em breve. Antes, podm, e necessario apresentar uma

ou duas outras nOyoes ligadas a de sina. E necessario dizer algo mais sobr~ ~fatalismo, urn termo que, como mostramos, tern mais a ver com a vida soc;modern a do que com culturas mais tradicionais. Fatalismo, como 0 enten 0

aqui, difere de estoicismo, uma atitude de forya em face dos impasse~ etribulayoes da vida. Vma posiyao fatalista e uma posiyao de aceitayao reslg-

nada de que se deve deixar que as coisas sigam seu curso. E uma posiyaonutrida pelas principais orientayoes da modernidade, embora se oponha aelas.

o fatalismo deve ser separado de uma SenSayaOde fatalidade dos eventos.Acontecimentos ou circunsrancias decisivos sac aqueles que tern conseqiien-cias particulares para urn indivlduo ou grupo.5 lncl uem os resultados naodesejados que se enfrenta no que chamei de riscos de alta conseqiiencia,riscos que afetam grande numero de pessoas de maneira potencialmenteameayadora da vida, mas eles tambem figuram ao nivel do indivlduo. Mo-mentos decisivos sac aqueles em que os individuos sac chamados a tomardecisoes que tern conseqiiencias particulares para suas ambiyoes ou, emtermos mais gerais, para suas vidas no futuro. Sao de alta conseqiiencia parao destino de uma pessoa.

Momentos decisivos podem ser entendidos como os trayos mais amplosdas atividades portadoras de conseqiiencias que urn individuo leva consigo navida cotidiana e no curso de sua existencia. Boa parte da vida cotidiana, no quediz respeito ao indivlduo, nao tern conseqiiencias, e nao e vista como particu-larmente decisiva para os objetivos gerais. No entanto, alguns tipos de ativida-de sac geralmente pensados pela pessoa em questao como tendo mars conse-qiiencias para ela do que outros - como a atividade que se desenrola na esferad b lh C'd f, Ad" " " d "o tra a o. onsl eremos 0 enomeno 0 tempo morto ou mata 0 ,

analisado com brilho caracterfstico por Goffman.6 0 tempo que se deve"matar" e tambem - e isso e interessante - muitas vezes chamado de tempo"livre" - e urn tempo que sobra, nos intervalos dos setores mais conseqiientesda vida. Se uma pessoa descobre que tern meia hora entre urn compromisso eo proximo, ela pode decidir gastar esse tempo flanando ou lendo 0 jornal, emvez de usa-lo de uma maneira "util". 0 tempo matado esta fora dos limites davida do individuo e (a menos que aconteya algo inesperado) nao tern conse-qiiencias para ela.

Em claro contraste, muitas atividades mais conseqiientes da vida sac~otinizadas. A maioria daquelas "ligadas ao tempo" - no setor formal ou noInformal da vida - nao e problematica, ou so 0 e em term os do manejoordinario das tarefas consideradas. Em outras palavras, decisoes difkeis po-dem vir a ser tomadas, mas elas sac manejadas por estrategias desenvolvidaspara lidar com elas como parte das atividades correntes em questao. As vezes,porem, uma situayao ou episodio particular pode ao mesmo tempo ser proble-ll1atico e ter muitas conseqiiencias - sac esses episodios que constituem osll1omentos decisivos. Eles sac momentos em que os eventos se reunem de talll1aneira que 0 indivlduo fica como se estivesse na encruzilhada da vida; ou em

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que uma pessoa recebe informac;:6es com conseqliencias fatais.7 Mo'd ", , ' d illentosdecisivos incluem a decisao e casar, a propna cenmoma 0 casaillent'~ d' 0 o-emais tarde talvez, a decisao de separar-se e e partir, utros exeillpl _, , Ossao.

submeter-se a exames escolares, optar por certo aprendlzado ou cu .. rso deestudos, entrar ~m greve, troca~ urn emprego por outro, ouvlr 0 resultado deurn exame medICo, perder mUlto numa aposta, ou ganhar grande SOillaloteria. Muitas vezes os momentos decisivos acontecem devido a coisas quena

I. . Seabatem sobre 0 individuo, quer e e quelra ou nao; mas tals momentos sactambem construidos como, por exemplo, quando uma pessoa decide reunir atotalidade de suas economias para comec;:arurn negocio. Ha, e claro, mOillen_tos decisivos na historia das coletividades como nas vidas dos individuos. Saofases em que as coisas saem dos eixos, quando urn estado de coisas e repentina_mente alterado por alguns eventos-chave.

Momentos decisivos, ou aquela categoria de possibilidades que urn indi-viduo define como decisivas, man tern uma relac;:aoparticular com 0 risco. Saoos momentos em que 0 apelo da fortuna e forte, momentos em que emambientes mais tradicionais, os oraculos teriam sido consultados ou as forerasdivinas invocadas. Especialistas sac freqlientemente cham ados quando seaproxima urn momento decisivo ou quando uma decisao fatal deve ser toma-da. E muito comum que 0 conhecimento seja 0 velculo atraves do qual umacircunsrancia e declarada decisiva - por exemplo, no caso de urn diagnosticomedico. Mas ha relativamente poucas situac;:6esem que uma decisao sobre 0

d d I . I' A informa-que fazer se torna clara como resulta 0 a consu ta ao especla Ista.d . d ., d risco mas ec;:aoderivada dos sistemas abstratos po e aJu ar na estlmatlva 0 , al

d . D' ~ Ct' sao em ger ,o individuo em questao que eve correr os nscos. eClsoes ra.als ble-quase que por definic;:ao, diflceis de se tomar por causa da mlstura de promas e conseqliencias que as caracteriza. d C de

It r que erenMomentos decisivos sac ameac;:adores para 0 casu 0 prote 0" , taO. d " d bem que ea seguranc;:aontologica do individuo, porque a atltu e tu 0 eIll

d H' momentoSimportante para 0 casulo e inevitavelmente atravessa a. a d oUd d cisao coma a,que 0 individuo deve lanc;:ar-sea algo novo, saben 0 que a. e 'I u pdo

, d ~ °d I'd de Irreverslve , °o especlfico curso e ac;:aosegul 0, tern uma qua I a ° s Mornen-menos que sera dificil, a partir de entao, voltar aos velhos camlOho babilidadetos decisivos nao significam necessariamente enfrentar uma alta prb°-rdades de

'd' d'" ~ altas proba I Idede que as cOlsas eem erra 0, IStOe, sltuac;:oescom f: ota 0° d ° d'f:' 'I de ser en re ';0perder. 0 que tende a tamar 0 amblente e nsco I ICI d declsa

, ' d coma ° a ;0antes a escala das penalidades em conseqliencla e se ter "d qUe sad' 'ndivi uO,errada, Momentos decisivos revelam gran es nscos para 0 I

compadveis aos que caracterizam a atividade coletiva.

ametros do riscoOs par

° risco e tentativas de estimativa do risco sac tao fundamentais para aCorn~ rao do futuro, 0 seu estudo pode nos dizer muito sobre elementosolonlZay .' 0 ~c . da moderOldade. Dlversos fatores fazem parte dlsso: a reduc;:aodos

centralS 'd d . d' 'd .., ° d ~ d. ue ameac;:ama VI a 0 10 IVI uo, como consequencla a expansao arlSCos q d 'd' 'd I' b

ranra na ativida e cotl lana garantl a pe os sistemas a stratos; a constru-segu

y d"·' I fi d '; de ambientes e nsco IOstltuclOna mente con lOa os; 0 mOOltoramento:0risco como aspecto-chave da reflexividade da modemidade; a criac;:aodeiscos de alta conseqliencia resultantes da globalizac;:ao;e a operac;:aode tudo

~ssocontra 0 pano de fundo de urn "clima de risco" inerentemente instavel.A preocupac;:!o_com 0 risco_na vida social modema nao tern nada aver

diretamente com a prevalencia de perigos para a vida. Ao nivel da existenciado individuo,-em termos da expectativa de vida e do grau de liberdade emrelas:aoa doenc;:aseria, ~s p~oas nas~~ ~.:~envolvidas estao numa_

1

si ao . 0 ais segura do q~e~_m~i~ia em epocas anteriores. No fim doseculoXIX na Inglaterra, entao a sociedade economicamente mais avanc;:adadomundo, epidemias mortais que matavam centenas de mil hares de pessoascram lugar-com urn. Uma proliferac;:ao de doenc;:asendemicas teve de ser su-portada, mesmo que nao fossem necessariamente fatais. Muitos puderamobservar:8

A exaustao,a febre e os larnentos,Aqui, onde os hornens estao e se ouvern gerner,Onde a paralisiafaz estrerneceros ultirnos e tristes cabelos brancos,o d 'n e a Juventude ernpalidece, e definha, e rnorre,

di Foi,S6a partir do comec;:odo seculo XX que estatisticas suficientes ficaramSP°ntvels - I . - d Cr I para mapear com a gum a precisao as mu anc;:asque aretaram

esu tados de . ameac;:a ores. Urn estudo que tomou 0 ana de 1907 como pontopartida most - I "d "earn . rou que naque e tempo os recem-nasci os entravam num

rnui;o illlnado"9 (embora as taxas de mortalidade infantil tivessem sidoapro~ reduzidas em comparac;:ao ao seculo anterior). Num grafico de 1907,COntrilladamente um de cada sete morria no primeiro ana de vida, emL. aste Com d"iSe d um em ca a sessenta e sete num gdfico de 1977 tornado comoa'lfanro

ecomparac;:ao. A lista a seguir registra alguns dos mais importantes

T s na red - d '907-197 ~c;:ao e nscos, avanc;:osrelevantes para a saude durante os anos1977.7- ISto e, os anos que abarcavam a vida de alguem com 70 anos

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• agua tratada• esgoto sanitario• pteparac;:ao higienica da comida• leite pasteurizado• refrigerac;:ao• aquecimento central• ampla aplicac;:aode princfpios cientificos de nutric;:ao• am pia aplicac;:aode princfpios cientificos de higiene pessoal• erradicac;:ao das principais doenc;:ascausadas por parasitas, inclusive a malaria• controle de insetos e de roedores• aperfeic;:oamento continuo dos cuidados pre-natais e pos-natais• aperfeic;:oamento continuo da atenc;:ao a bebes e crianc;:as• aperfeic;:oamento continuo do tratamento das doenc;:asinfecciosas• aperfeic;:oamento continuo do tratamento cirurgico• aperfeic;:oamento continuo da anestesia e dos cuidados intensivos• ampla aplicac;:aode princfpios cientificos de imunizac;:ao• generalizac;:ao da transfusao de sangue• organizac;:ao de unidades de terapia intensiva nos hospitais• expansao e aperfeic;:oamento continuos dos procedimentos de diagnostico• aperfeic;:oamento continuo do tratamento do cancer• aperfeic;:oamento continuo do tratamento das doenc;:asarteriais• disponibilidade crescente de metodos de planejamento familiar• metodos aperfeic;:oados e legais de interrupc;:ao da gravidez• ampla aceitac;:aoda seguranc;:ano trabalho• cintos de seguranc;:a obrigatorios nos automoveis• metodos continuamente aperfeic;:oados de preservac;:ao dos dentes, da visao e

da audic;:ao• reconhecimento dos efeitos nocivos para a saude do furno, obesidade, pressao

aha e vida sedentaria.10

Nao se pode dizer ate que ponto cada urn dos itens dessa lista afetou asmudan<;:as destacadas na compara<;:ao entre 1907 e 1977, po is 0 impacto totalde alguns deles, ou mesmo de muitos, s6 podera. ser sentido pelas gera<;:oesfuturas. Contra essas mudan<;:as que reduzem os riscos, porem, precisamosmencionar urn numero consideravel de influencias negativas. Duas guerrasmundiais, envolvendo maci<;:a destrui<;:ao de vidas, ocorreram durante a exis-tencia da gera<;:ao de 1907. 0 risco de morte ou de ferimentos graves emacidentes de autom6vel aumentou durante a maior parte do perfodo. Desde adecada de 1930 ate 0 final da de 1960, essa gera<;:ao consumiu muitos medica-mentos que, pelos padroes de hoje, foram testados de maneira inadequada

antes de terem sido postos a disposi<;:ao. Os membros dessa gera<;:ao beberammuito alcool e fumaram milh6es de cigarros antes que os efeitos t6xicos

fosseminteiramente percebidos; a polui<;:ao ambiental, que muitos medicosespecialistas acreditam aumentar a suscetibilidade a doen<;:as de varios tipos,aumentou drasticamente; e por grande parte de suas vidas comeram alimentoscontendo muitos aditivos e tratados com fertilizantes qufmicos cujas conse-qiiencias para a saude sac na melhor das hip6teses desconhecidas e, na pior,podem ajudar a produzir algumas das principais doen<;:as mortais.

Em term os da-.:eguran<;:a)jsica da vida, de qualquer ~aneira, os elemen-toS reautores do risco parecem superar substancialmente os novos riscos. Havarias maneiras de avaliar essa afirma<;:ao. Vma e calcuIar como a coorte de1907viveu em compara<;:ao a como teria vivido caso os principais riscos a vidaque existiam naquele ana tivessem continuado a prevalecer durante toda avida dos que nele nasceram - urn calculo especulativo, mas que pode ser feitocom razoavel base estatfstica. Esse calculo nao indica diferen<;:as, em termos deporcentagens de sobrevivencia, ate os vinte anos. Depois dessa idade, a curvareal de sobrevivencia come<;:a a se distanciar para cima de maneira progressivaem rela<;:aoa curva correspondente aos novos dados projetados.

Tambem se podem fazer compara<;:oes entre 0 grafico de 1907 e 0 de 1977conrrastando a expectativa de vida do primeiro grupo com a expectativaprevista para a gera<;:aodo segundo. E isso mostra uma divergencia substancial,come<;:ando no primeiro ana de vida e ate idade avan<;:ada, a favor da coorte de1977 (embora, e claro, nao tenhamos maneira de saber que fatores adicionaispodem influenciar os riscos para a vida dessa gera<;:ao nos pr6ximos anos).

o risco se refere a acontecimentos futuros -ligados as praticas presentes- e portanto a coloniza<;:ao do futuro abre novas situa<;:oes de risco, algumasdas quais institucionalmente organizadas. Em contextos relativamente menosimportantes tais situa<;:oes sempre existiram, por exemplo no caso cultural-mente generalizado do jogo. Ocasionalmente existiram ambientes organiza-dos de risco em culturas nao-modernas para os quais nao ha formas institucio-nais equivalentes na vida social moderna. Assim, Firth des creve urn tipoinstitucionalizado de tentativa de suicfdio entre os Tikopia.11 E uma praticaaceita que a pessoa com alguma queixa va sozinha para 0 mar numa canoa.Como as aguas sac trai<;:oeiras, ha grande chance de que 0 indivfduo naosobreviva a experiencia; a chance de sobrevivencia depende da rapidez comque os outros na comunidade notam a ausencia da pessoa e reagem a ela.£mbora esse empreendimento de risco apresente claramente semelhan<;:asCom 0 risco nas tentativas de suicfdio em ambientes modernos, neste caso faltao elemento institucionalizado.12

~a maioria, contudo, situa<;:oes de risco institucionalmente estrutura-das sac ~~is importantes nas sociedades modern as do qu~ pre-modernas.

alS sistemas institucionalizados de risco afetam praticamente qualquer urn,

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f: 1 ou nao parte desses sistemas como "jogador" - mercados competiti_aera e ed' ,

d odutos de forra de trabalho, de investimentos ou e capitals sao osvos e pr , y, " , • •

exemplos mais significativos. A dlferenera entre esses sistemas mStlt.uclOnahza_

d outrOS parametroS de risco e que des sac constituidos pdo nsco, nao seos e b' ."

tratando de uma situaerao em que de e acidental. Am len.tes mStltu~lOnaliza_dos de risco ligam riscos individuais e coletivos de mUltas man~lras - asoportunidades individuais d~ vida, por exemplo, es~ao, agora dlre~amen:eamarradas a economia capitahsta global. Mas em rdaerao a presente dlscussaoesses ambientes sao mais importantes pdo que revdam sobre a forma de

colonizaerao do futuro.Consideremos a bolsa de valores. Ela e urn mercado regulado que oferece

uma gama de aeroes que os tomadores emitem e os poupadores detem, criandouma escolha de maneiras de estruturar os riscos de firmas e poupadores em seuobjetivo de obter ganho financeiro. Possui tambem 0 efeito de val?rizar asaeroes em rdaerao a seus rendimentos esperados, levand~ em conta .os nscos dosinvestidores.13 Poupadores e tomadores tern uma vanedade de mteresses fi-nanceiros. Alguns poupadores que rem acumular dinheiro a longo prazo, en-quanto outrOS procuram ganhos de curto p,ra~o e pode,m estar prepa~a~os paraassumir riscos consideriveis com seus capitals com vistas a esse obJetlvo. Ostomadores normalmente querem dinheiro a tango prazo, mas e inevitavelcerto risco de perda por parte dos que emprestam. Na bolsa de valores, osinvestidores podem escolher entre uma variedade de riscos e modos de cober-tura contra eles, enquanto os tomadores podem procurar ajustar os ~~rm~s docapital que recebem aos riscos dos empreendimentos para que 0 utlhzarao. Abolsa de valores e urn dominio teorizado de reflexividade refinada - um

, . d' d de poupar e tomarfenomeno que mfluenCla Iretamente a natureza os azaresd 'd' - ganhos parece

emprestado. Assim, os estu os m Icam que a. razao preero,s-. Ai u-predizer mal os ganhos subsequentes ou 0 creSClmento de dlvldendos. g

, 'd " bid valores veem isso comomas teonas aphca as ao mvestlmento em 0 sas e'd 'fi ' presas que

evidencia de que a bolsa de valores nao pode I entl Icar quais as em 1-, ' . f: " fi' escassos para cautilizarao de manelra mals satls atona recursos mancelros , - dos

, , ' d d 0 tAm que a reteneraocular as estrateglas de nsco a equa as. utras man e do

'fi " I' f: to e de mOganhos mais outrOS fatores especi IcavelS, exp Icam esse a, l' d de

, ,. d'L V dida da comp eXI acorrespondente ado tam estrateglas llerentes. ma me 'd teW

f: d " olftlcas e rereflexiva dessa situaerao e dada pelo ato e.que as pro~nas p 14

rao provavdmente sac influenciadas pdo tlpO de teona adota~a.. l' do,y b' d' 't tUClOna Iza

V I As bolsas de valores, como outros am lentes e nsco ms I'd Isso e__ . " " , - colonlza o.

us am ativamente 0 risco para cnar 0 futuro que e enta? _ d'sso e abementendido peios participantes. Uma das melhores I1ustraeroes I ,as e- d L r. das as poupany

existencia espedfica de merca os a termo, ruturos, 0

emprestimos criam possiveis mundos futuros peia mobilizaerao do risco. Masmercados de futuros hipotecam 0 futuro de maneira direta, assegurando umabase adiante no tempo que oferece uma seguranera particular para cenos tiposde romadores de emprestimos.

o monitoramento reflexivo do risco e intrfnseco a sistemas institucionali-zados de risco. Em relaerao a outros parametros de e extrfnseco, mas naomenos fundamental para as oportunidades de vida e para 0 planejamento davida. Vma parte significativa do pensamento especializado e do discursopublico de hoje e feita da analise de perfis de risco - a analise de qual e, noestado corrente do conhecimento e nas condieroes correntes, a distribuierao dosriscos em dados ambientes de aerao. Como 0 que e "corrente" em cada umdesses aspectos esti constantemente sujeito a mudanera, tais perfis devem ser

Permanentemente revisados e atualizados. ( - .~ .., ~Considere-se "do que morremos" - representando os principais riscos

associ ados a mortalidade.15 0 estudo dos perfis de risco das principais doenerasque ameaeram a vida mostra grandes difereneras entre a virada do seculo XIXpara 0 XX e os dias de hoje nos paises desenvolvidos. Por volta de 1940 asdoeneras infecciosas como tuberculose, nefrite e difteria ji nao faziam parte dasdez principais causas de morte. As mortes atribuidas as doeneras do coraerao eao cancer passaram para primeiro e segundo lugares depois de 1940, e aificaram. Hi quem pense que a principal causa dessa mudanera e a maiorproporerao de pessoas que vivem ate os 50 an os ou mais, mas essa visao econrestada por outros que a atribuem a fatores ambientais e alimentares. Valenotar que os conceitos us ados para identificar as principais causas de mortemudaram substancialmente desde 1900. 0 que na virada do seculo era cha-mado d "1 -' 'd' I " "e esoes mtracramanas e ongem vascu ar , tornou-se lesoes vascula-res afetando 0 sistema nervoso central" nos anos 1960, e des de entao mudoupara "doenps vasculares cerebrais". Essas mudaneras sao mais do que modis-mos: refletem alteraeroes na visao medica sobre as patologias em questao.

Acredita-se que aproximadamente dois tereros da populaerao acima dos 30anos de idade em paises com altas taxas de doeneras cardiac as coronarianas,COmo a Inglaterra e os Estados Unidos, tern algum estreitamento em suasatterias ' , b -' , .coronanas, em ora nao 0 suficlente para provocar smtomas patol6gl-Cos disti t' did' .n IVOSou mu aneras no e etrocar IOgrama, A cada ano, aproxlmada-mente u d"C ma pessoa em ca a oltenta aClma dos 35 anos tern um ataque cardia-eO, e~bora apenas uma proporerao desses ataques seja fatal. A doenera cardiac adim~ls ~omum nos homens do que nas mulheres, embora a disrancia esteja1.1 mlnulDdo. Nos Estados Unidos e em um ou dois outros paises, depois deIII cresc' d'card' Imento constante urante muitos anos, a taxa de mones por doenera

laca coronariana comeerou a cair. Ha muito debate sobre por que isso

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ocorreu; pode ser devido a mudanc;:as na dieta, aperfeic;:oamento dos servi<;:osde emergencia, diminuic;:ao do fumo ou maior participac;:ao de a~ultos ernexerefcios regulares. Ha em geral urn consenso de que fatores de estI10 de vidade urn ou de outro tipo influenciam fortemente 0 risco de contrair doen<;:asdocorac;:ao.Ha bastante evidencia comparativa sobre a questao. Assim, 0 Japaotern a menor taxa de doenc;:asdo corac;:aode todas as sociedades industrializa_das. Os filhos e netos de imigrantes japoneses nos Estados Unidos, porern,tern taxas comparaveis as deste pais e nao as do Japao. Mas nao e de todo claroque influencia a diet a, por contraste com outros aspectos do esti~ode vi~a, ternna etiologia das doenc;:asdo corac;:ao.A Franc;:a,por exemplo, reglstra balxa taxade mortes por doenc;:as coronarianas, embora a dieta francesa seja rica emsubsrancias que sao tidas por muitos como suas causadoras.

o cancer nao e uma so doenc;:a,pelo men os com relac;:aoao risco de morteassociado a ele. A partir da virada do seculo X1X para 0 XX, as diferentes formasda doenc;:a seguiram caminhos divergentes. Por exemplo, houve urn cresci-mento continuado na taxa de morte por cancer do pulmao desde aproximada-mente 1930, provavelmente devido aos efeitos adiados da ampla popularidadedo cigarro ate aproximadamente 0 fim dos anos 1960. Por ~utro.lado, houveuma queda regular em alguns outros tipos de cancer. Os pentos dlscord~m e~relac;:aoa explicac;:ao.Tambem discordam sobre se a dieta ou fatores amblentalsdesempenham urn papel no comec;:oda doenc;:a.

o monitoramento regular e detalhado dos riscos para a saude, em relac;:aoa informac;:oes como as que acabamos de descrever, oferece urn excelenteexemplo, nao apenas da reflexividade rotineira em relac;:aoao risco extr~nseco,mas da interac;:ao entre sistemas especializados e 0 comportamento lelgo emrelac;:aoao risco. Especialistas medicos e outros pesquisadores produzem os

. . . d . - d d fi d . co Mas esses perfismatenals a partir os quais saD estu a os os per IS e ns . .d d . A I - I sra consCientenao sao mais urn segre 0 os pentos. popu ac;:aoem gera e

. d . d f: d' ina e outrasdeles ainda que mUltas vezes e manelra vaga, e e ato a me 1C, I' asagencias se dao ao trabalho de por suas descobertas ao alcance dos elgos. I. . d pe aestilos de vida seguidos pela populac;:ao como urn todo sao IOfluenCia os _

I . d' f, ras de clasrecepc;:aodessas descobertas, embora norma mente eXlstam I eren, .

_ d - d pos profissionals ese na alterac;:aodos pa roes e comportamento, com os grud ., - . f, ada - se

mais educados na lideranc;:a. Mas 0 consenso a oplOlao 10 orm . deexistir tal consenso _ pode mudar mesmo enquanto as mudanc;:asde esnl

os-

. .' d d t das Nao noS evida que provocaram antenormente esnverem sen 0 a 0 a· dquec;:amos de que 0 habito de fumar foi alguma vez defendido por seto

res. :

I d· . Iha a mantelgprofissao medica como re axante; e se IZlaque a carne verme ,eo creme eram importantes para construir corpos saudaveis.

as conceitos e terminologias medicas mudam a medida que as teorias saorevisadas ou descartadas. Alem disso, a qualquer momenta ha desacordosubstancial, as vezes radical, dentro da profissao medica sobre os fatores derisco e tambem sobre a etiologia dos maiores perigos para a saude. Mesmo emcaso de doenc;:astao serias como as doenc;:ascardiacas coronarianas e 0 cancerha muitos praticantes de medicinas alternativas - alguns dos quais sao hojelevados mais a serio pelos especialistas medicos ortodoxos do que anterior-mente - que discordam das posic;:oesdominantes. A avaliac;:aodos riscos paraa saude esta misturada ao "quem tern razao" nessas disputas. Pois embora urnperfil de risco desenvolvido em qualquer momento no tempo possa parecerobjetivo, a interpretac;:ao do risco para urn individuo ou para uma categoria deindividuos depende de terem ou nao sido feitas mudanc;:as de estilo de vida, ede essas mudanc;:as se basearem em suposic;:oesvalidas. Uma vez estabelecido,urn setor do estilo de vida - digamos, uma dieta particular - pode ser muitodificil de ser rompido, porque provavelmente estara integrado a outros aspec-tos do comportamento da pessoa. Todas essas considerac;:oes influenciam aadoc;:aoreflexiva pelos leigos de padmetros de risco filtrados pelos sistemasabstratos. Diante de tal complexidade, nao e de surpreender que algumaspessoas deixem de confiar em praticamente todos os praticantes da medicina,quem sabe consultando-os apenas em momentos de desespero, e atendo-se aoshabitos estabelecidos formados por elas mesmas.

Em contraste com os perigos para a saude, os riscos de alta consequenciaestao ,ror definic;:ao distantes do agente individual, embora - outra vez pordefimc;:ao- interfiram diretamente nas oportunidades de vida de cad a indi-vidu~. Seria claramente urn equivoco supor que as pessoas que vivem emcod - .. d hn Ic;:oessocials mo ernas ten am sido as primeiras a temer as terriveiscatastrofes que poderiam assolar 0 mundo. Visoes escatologicas eram muitoc?muns na 19ade Media, e houve outras culturas que- viam 0 mundo comoelv~do de gran des perigos. Mas a experiencia e a natureza dessas visoes dopengo sao, em alguns aspectos, muito diferentes da consciencia dos riscos deaha co .. A • d h' T" .d'-- ~~ uenc!a e o)e. lalS nscos SaD0 resultado de turbulentos processos :>e globahzac;:ao, e nem mesmo meio seculo atras a humanidade chegou a

sofrer 0 mesmo tipo de ameac;:a.d ~sses riscos fazem parte do lado escuro da modernidade, e eles, ou fatorese nsco comparaveis, estarao presentes enquanto durar a modernidade -

en~uanto a raeidez da mudanc;:a social e tecnologica continuar a produzirConseqiiA' - • Ri d. enclas nao previstas. scos e alta conseqiiencia tern uma qualidade

IStlntiv Q . I . . .a. uanto mals ca amltosos os pengos envolvldos menor a nossa~ . 'p,enencia real do risco que corremos - pois se as coisas "derem errado", jasera t d d . Car e emals. ertos desastres deixam 0 sabor do que po de acontecer-

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como 0 acidente nuclear de Chernobyl. Como em re!ac;:aoa muitas de taisquestoes, os especialistas nao estao inteiramente de acordo sobre os efeitos delongo prazo da radiac;:aoque vazou naquele acidente para as populac;:6es dospalses que afetou. Em geral, acredita-se que e!a aumentou 0 risco de certostipos de doenc;:as no futuro, e sem duvida teve consequencias devastadoraspara as pessoas mais diretamente afetadas na Uniao Sovietica. Mas inevitave1_mente nao passa de adivinhac;:aoa estimativa das consequencias de urn desastrenuclear maior - para nao falar de urn conflito nuclear, mesmo que de

I J ,pequena esca a. __ +" ;

Empreendimentos de aferic;:aode risco, no caso de riscos de alta conse-quencia, devem ser considerave!mente diferentes dos que lidam com riscoscujos resultados podem ser regularmente observados e monitorados - embo-ra essas interpretac;:oes devam ser constantemente revisadas e atualizadas a luzde novas teorias e informac;:oes. A tese de que a propria aferic;:aodo risco einerentemente arriscada e muito bem ilustrada na area de riscos de alta conse-quencia. Urn metodo comum usado na tentativa de dlculo dos riscos deacidentes com reatores nucleares e 0 projeto de uma arvore de erros. Umaarvore de erros e projetada listando todos os caminhos conhecidos para umafalha POSSIVe!do reator, especificando depois os caminhos posslveis para essescaminhos, e assim sucessivamente. 0 resultado final e supostamente umaindicac;:ao razoavelmente precisa do risco. 0 metodo vem sendo utilizado emestudos da seguranc;:a de reatores nos Estados Unidos e em diversos palseseuropeus, Mas nao contempla varios imponderaveis.16 E imposslve! fazer urndlculo confiave! do risco de erro humano ou de sabotagem. 0 desastre deChernobyl foi resultado de erro humano, como tambem foi, num periodoanterior, 0 incendio em uma das maiores plantas nucleares do mundo, emBrown's Ferry, nos Estados Unidos. 0 fogo comec;:ou porque urn tecni~outilizou uma vela para verificar urn vazamento de ar, em clara desobedienClaaos procedimentos de seguranc;:aestabelecidos, Alguns caminhos para 0 desas-tre potencial podem nao ser notados, Foram esquecidos em muitas ocasioesem situac;:oes de risco menor, e no caso dos riscos de alta consequencia asperigos muitas vezes so foram percebidos pe!as revisoes retroativas de dados ehipoteses, Isso aconteceu numa situac;:ao hipotetica quando urn estudo daAcademia Nacional de Ciencias dos Estados Unidos foi solicitado para deter-

, , . b' d I' d guerrammar os nscos para 0 a asteclmento e a Imentos em caso e umanuclear de certa intensidade, 0 grupo que dirigiu 0 estudo concluiu que aresultante reduc;:ao da camada de ozonio da Terra nao ameac;:aria os recursos

I, b ' ' numaa Imentares dos sobreviventes, pois muitos produtos que so revlvenamatmosfera de crescente radiarao ultravioleta continuariam a ser cultivad~s,.,. dla-Nenhum dos membros da equipe percebeu, pof(~m, que 0 aumento da ra

c;:aotornaria praticamente imposslvel trabalh ar no campo para I'produtos,I7 cu tlvar esses

Riscos de alta conseqiiencia constituem urn se d ." I' d ' " gmento 0 generallZ dc Ima e nsco caracteristico da modernidad t d' , a 0

d Ie ar la - que se caractenzamu anc;:asregu ares nas reivindicaroes ao saber medl' d I' por'I' d C b .,. a as pe os sistemas espCiaIza os, omo 0 serva Rabinovitch' "U d' 'b e-, ' ' m la OUVlmosso re 0 perigo dmercuno, e corremos a jogar fora latas de at d 1 ' 0'. Urn e nossas prate elfas' d'segumte a c~~l1da a evitar pode ser a manteiga, que nossos avos conside~:vamlacomo 0 maximo para a s 'd· d 'dh b d au e, e epOls evemos raspar a tinta a base de

c urn 0 e nossas paredes H ' , ,, . ole 0 pengo esprelta nos fosfatos de nossodetergente favonto; amanha 0 dedo apont ' "dh' 1 a os msetici as, que eram saudadosa a guns anos como salvadores de milhoes de vidas d fc d dd d ' a orne e a oenc;:a As

am_eac;:ase morte, a msanidade e - talvez ainda mais temlvel _ do ca~cerestao em tudo 0 que comemos e tocamos "18 I fc' 'h"d d - ' SSO 01 escnto a vlnte anos'es e entao, Outros trac;:oscontaminados foram db', d d esco ertos no atum alguns~p~~ e etergentes considerados seguros no inlcio dos anos 1970 fod:n~u:s;:nqua,nto ~g~n~ medicos dizem que e mais saudave1 comer mant:~~recomend::raasrcmoams0 eprafclx~s:eores de gordura, que eram antes amplamente

e envelS,A questao nao e que a vida cot'd' , h ' ,

da do que' '-r I lana sep ole merentemente mais arrisca-em epocas antenores .t que d' - d 'para os I ' '.' nas con Ic;:oes a moderllldade, tanto

de risco e~geosStl~mUaatnl'to Pdara~s per~tos em campos espedficos, pensar em termosvas e nsco c urn e ' 'carater e em ' , xerclClOquase que permanente, e seu

reJac;:aoa vast part~ lI~ponde,raveJ. Vale lembrar que somos todos leigos ematividades d' ,a.ma~na ~~s sistemas especializados que interferem em nossasdas institui ~anas, pro I erac;:aode especializac;:oesanda junto com 0 avanc;:oc;:aoparece ~:smOlde~na~,e ~ crescente estreitamento das areas de especializa-SeCOncentra resu ta ~ II~evI:aveldo desenvolvimento tecnico. Quanto maisem Ue m as,es~eC1aIzac;:oes,tanto menor em termos re!ativos 0 cam 0

vida~le ~~:;~uer mdlvld~o po de reivindicar competencia; em outras areas ~aana mesma sltuarao que tod d 'Mquais os 'h .,. os os emalS, esmo em campos nos

pentos c egam ao con dsaber m d fc' senso, por causa a natureza cambiante doo erno, os e eltos de "ret "bserao amb' I' orno so re 0 pensamento e pratica leigos

Iguos e comp Icados 0 r d 'd 'te para todo'" . c Ima e rISCO a moderllldade e inquietan-s, nmguem escapa,

COl'1:ei .Jar atlvamente 0 risco

I:claro q h' d'fcue a I erenc;:asentre 'qUefazem p d j" os nscos que se carre voluntariamente e aquelesarte as Imltac;:6esda vida social ou de urn padrao de estilo de vida

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a que se aderiu. Ambientes institucionalizados de risco geram algumas situa_c;:oesdentro das quais os individuos podem escolher arriscar recursos escassos,inclusive suas vidas - como em esportes perigosos ou atividades similares. Noentanto, a distinc;:ao entre riscos que sac assumidos voluntariamente e riscosque afetam 0 individuo de uma maneira menos intencional e muitas vezesconfusa, e simplesmente nem sempre corresponde a divisao entre ambientesextrinsecos e ambientes institucionalizados de risco. Os fatores de risco quefazem parte de uma economia moderna, como ja foi dito, afetam a quasetodos, independente de se 0 indivfduo e diretamente ativo dentro da ordemeconomica. Dirigir automovel e fumar sac outros exemplos. Dirigir e emmuitas situac;:oes uma atividade voluntaria; mas ha certos contextos ondecompromissos com estilos de vida ou outras limitac;:oespodem tornar 0 ato dedirigir urn carro quase uma necessidade. Pode-se comec;:ara fumar voluntaria-mente, mas uma vez que se torna urn vleio, passa a ter urn carater compulsivo,como 0 consumo de alcool.I9

Abrac;:arativamente certos tipos de risco e parte importante do clima derisco. Nguns aspectos ou tipos de risco podem ser valorizados em si mesmos- a euforia que pode provir de dirigir em alta velocidade ou de maneiraperigosa lembra a emoc;:aooferecida por certos empreendimentos institucio-nalizados de risco. Comec;:ara fumar diante dos riscos conhecidos para a saudepode demonstrar certa bravata que 0 indivfduo talvez considere psicologica-mente satisfatoria. Se isso for verdade, tais atividades podem ser entendidasem termos de dimensoes de "risco cultivado" que serao mais discutidas adian-te. Mas, a aceitac;:ao passiva dos perigos de certas praticas como dirigir o~fumar por amplos setores da populac;:ao deve ser interpretada, em parte c~nsl-deravel, de maneira diferente. Dois tipos de interpretac;:ao tern sido oferecldas.Vma e que as grandes corporac;:oese outras agencias poderosas conspiram paraenganar 0 publico sobre os verdadeiros niveis de risco, ou usam a propagan~ae outros metodos de condicionamento para assegurar que uma proporc;:ao

substancial da populac;:ao se envolva nesses habitos de risco. A outra sugere quea maioria dos leigos nao e sensivel ao risco individualmente distribufdo o,uadiado - ainda que reajam fortemente a desastres coletivos ou a riscos malS

"visiveis". Ambas as explicac;:oestendem a dar enfase consideravel a compo-, . 'd - N h d I particular-nentes aparentemente IrraclOnals a ac;:ao, en uma e as parece ~

:ne~te convincen,te, embor~ sem ~uv,ida am~as .ap~n~em par~ fatoresv;;;a~mtelramente desntufdos de ImportanCia. As pnnclpals mfluenCias en,vol d Sprovavelmente derivam de certas caracteristicas do planejamento da Vidae ahabitos do estilo de vida. Como as praticas espedficas sac ordinariamented' . 'd "d d h 'b' d 'I d'd 'divfduosIngl as a urn conJunto mtegra 0 e altos e estl 0 e VI a, os III ,

I' . oltenSnem sempre, e quem sabe nem mesmo em geral, ava lam os nscos com

separad~s, cada urn em seu proprio dominio. 0 planejamento da vid ." "d' a cons 1-dera urn pacote e nscos, em vez de calcular as implicaroes de

y setoresdistintos de comportamento de risco. Em outras palavras, assumir cenosriscos na busca de urn certo estilo de vida e aceito como dentro dos "Iim'. "d Itestoleravels 0 pacote como urn todo.

Os individuos pro~uram coloni~ar 0 futuro para si mesmos como paneintegrante de seu planejamento da VIda. Como no caso dos futuros coletivoso grau em que 0 dominio futuro pode ser invadido com sucesso e limitado ~sujeito as diversas incenezas da aferic;:aodo risco. Todos os individuos monra:num demonstrativo de estimativas de risco, que podem ser mais ou menosarticuladas, bem informadas e "abertas"; ou, alternativamente, inerciais. Pen-sar em termos de riscos se torna mais ou menos ineviravel e a maioria daspessoas tambem esta consciente dos riscos da recusa a pensar desta maneira,ainda que decidam ignorar tais riscos. Nas complexas situac;:oesreflexivas daalta modernidade, viver no "piloto auto matico" se torna cada vez mais difleile se torna tambem mais diflcil proteger qualquer estilo de vida, por mai~firmemente estabelecido que seja, do clima geral de risco.

. E ~reciso ~ompreender bem 0 argumento neste ponto. Boa parte daestl:nanva de nsco se da ao nivel da consciencia pratica e, como indicaremosabalxo,.o casulo protetor da confianc;:a basica bloqueia a maioria dos eventos~ot~nClalmente perturbadores que interferem nas circunsra.ncias da vida domdlviduo. Estar "a vontade" no mundo e certamente problematico na era da:lt~ ~~dernidade, em que 0 referencial de "atenc;:ao"e 0 desenvolvimento dehlstonas compartilhadas" com os outros sac realizac;:oesbasicamente reflexi-

v~s:Mas tais historias muitas vezes criam situac;:oesem que a seguranc;:aonto-loglca s~ Sustenta de maneira nao problematica, pelo menos em fases espedfi-cas da VIdade urn individuo.

Risco, confians:a e 0 casulo protetor

o mundo das "p A • '" ., d' ,. ,a arenClas normals , Ja 0 Isse e mals do que slmplesmenteurn 'b' - '

a e~1 urao mutuamente sustentada de interac;:ao que os indivfduos fazementre Sl.As r t' , d' 'd ,. ,es 0 mas que os m IVI uos seguem, a medlda que seus cammhos no

pac;:o-tempo se cruzam nos conrextos da vida diaria, constituem essa vidaenquanto " I"" " I"norma e prevIslve . A normalidade e manejada em fino detalhenas tessituras d "d d . I ', a atlVI a e socia - ISSOtambem se aplica ao corpo e aart1culac;:aodos I . 'd . d' , " , 'e, envo Vlmentos e proJetos 0 m IVlduo. 0 mdlvlduo precisaStar la em ca 20 " ,

P , rne e osso, e a carne que e 0 eu corporeo deve ser crOnIcamenteroteglda e 'd . d' 'd d '-' , .socorn a - na Ime Ian a e de cad a sltuac;:ao condlana asslm

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como no planejamento da vida que se estende no tempo e no espaero.0 corpoesta em certo sentido permanentemente em risco. A possibilidade de ferimen_to corporal esra sempre presente, mesmo no mais familiar dos ambientes. Acasa, por exemplo, e urn lugar perigoso - grande proporyao dos ferimentosserios sac provocados por acidentes no meio domestico. "Urn corpo", Comodiz concisamente Goffman, "e uma pep de equipamento conseqiiente, e seu

, d I' h" 21dono esta sempre manten 0-0 na m a.Sugeri no capitulo 2 que a confianera basica e fundamental para as cone-

xoes entre as rotinas diarias e as aparencias normais. Dentro das circunstinciasda vida cotidiana, a confianera basica se expressa como urn parentese em tornode possiveis eventos ou questoes que poderiam, em certas circunstincias,causar sobressaltos. 0 que out~ssoas parecem fazer, e quem elas parecemser, e geralmente aceito como 0 qu~s realmente fazem e quem realmentesao. Consideremos, porem, 0 mundo do espiao que, no interesse da autopre-

~vaerao, nao pode aceitar 0 ambito das aparencias normais da mesma manei-ra que as outras pessoas geralmente 0 fazem. 0 espiao suspende parte daconfianera generalizada que e geralmente depositada nas "coisas como elassao", e sofre ansiedades torturantes sobre 0 que em outras circunstinciasseriam acontecimentos mundanos. Para a pessoa comum urn engano telefoni-co pode ser uma irritaerao menor, mas para 0 agente disfarerado isso pode serurn sinal perturbador, que causa urn sobressalto. . A'

Uma sensaerao fisica e psiquica de estar a vontade nas C1rc~~stanClasrotineiras da vida cotidiana, como foi destacado antes, so e adqUinda comgrande esforero.Se em geral parecemos menos frageis do que realmente somosno contexte de nossas aeroese por causa de processos de aprendizado de longo

.. - . d . bilizadas Aprazo atraves dos quais ameaeras potenclals sac evlta as ou Imo ... . . h ,. I' - com obJetoS,aerao mals simples como camm ar sem calr, eVltar a co Isao

, f: f:' d prendidas ematravessar a rua ou usar a raca e 0 gano, tlveram e ser a " _. A' .. I ' h - d 'I 'vas 0 carater naoclrcunstanCias que ongma mente tin am conotaeroes eCls. , da

d .. "d b d'd 'd' , I d d ma atenrao tremaeCIslvo e oa parte a VI a COtl lana e resu ta 0 e u ")' d

que so 0 estudo prolongado produz, e e crucial para 0 casulo protetor que to a

aeraoregular supoe. T T. It deb I' d d - de urnwe

Esses fenomenos podem ser em ana Isa os usan 0 a noerao. d' 'duos e

Goffman urn nucleo de normalidade (realizada) com que os m lVI, I, una,grupos se cercam,22 A noerao se origina do estudo do comportamento an rnOS

O . , A 'b'l'd d 'f' ' . cundante ern ters animals tern uma sensl I I a e para a area ISlca clr ,red 'b'l'd d vana ent

das ameaeras que podem emanar dela. A area e sensl I I a, e heirosdiferentes especies. Alguns tipos de animais sac capazes de sennr sons" c , a

d d· A'S anlrnalS,e movimentos a muitos quilometros e IstanCla; para outrOextensao da Urnwelt e mais limitada.

No caso dos homens, a Umwelt inclui mais que as cercanias fisicas imedia-taS. Ela se estende por poreroes indeterminadas do tempo e do espaero, ecorresponde ,ao sist~m~ ~e releva~ci~s" para usar 0 termo de Schutz, queernoldura a vida do mdlvlduo. Os IndlVlduos estao quase sempre alertas paraoS sinais que relacionam as atividades aqui e agora a pessoas ou eventosespacialmente distantes que Ihes digam respeito e a projetos de planejamentoda vida de alcance temporal variado. A Umwelt e urn mundo de normalidade"ern movimento" que 0 individuo transporta de situaerao para situaerao, embo-ra esse feito dependa de outros que confirmem esse mundo ou tomem parteem sua reproduerao. 0 individuo cria, como se fosse, uma "barreira move! derelevancia" que ordena os eventos contingentes em relaerao ao risco e alarmespotenciais. Movimentos no espaero e no tempo - a mobiJidade fisica docorpo a cada situaerao - centram a preocupaerao do individuo nas proprieda-des fisicas do contexto, mas os perigos contextuais sac monitorados em re!aeraoa outras Fontes mais difusas de ameaera. Nas circunstancias globalizadas dehoje, a Umwelt inclui a consciencia dos riscos de aha conseqiiencia, querepresentam perigos de cujo alcance ninguem consegue escapar completa-mente.

Nas situaeroes da modernidade, das quais a fortuna esta basicamenteausente, 0 individuo ordinariamente divide a Umwelt em acontecimentosprojetados e acidentais. Os acidentais formam urn pano de fundo para asrelevancias com as quais 0 individuo cria urn fluxo de aerao.A diferenciaeraotambe~ permite que a pessoa ponha entre parenteses todo urn conjunto deaco~teclmentos reais e potenciais, confinando-os a urn dominio que aindaprecisa ser monitorado, mas com minimos cuidados. 0 corolario disso e que~ad~ pessoa numa situaerao de interaerao supoe que muito do que e!a faz eIndl~erente para os outros - em bora a indiferenera ainda deva ser manejadaem sltuaeroespublicas de co-presenera, na forma de codigos de desatenerao civil.

Ao contrario do paranoico, 0 individuo comum e assim capaz de acreditarque momentos que sac decisivos para sua vida nao sac resuhado da sina. Asane eo' d Ique precisamos quan 0 contemp am os uma aeraoarriscada, mas e!atem uma c - ' I b ' . ,. onotaerao mals amp a, tam em, como melO de reiaclOnar a oportu-nldade e a f I'd d ( b ') . . -. ata I a e como oa ou ma sorte . Como a dlstlnpo entre 0 que eaCidentale -,. .id'L-·ld 'se . 0 que nao e, mUltas vezes, c:: IIICI e traerar,porem, podem surglr

rtas tensoes quando os eventos ou atividades sac "mal interpretados" -Como dC ,quan 0 urn evento que afeta a outro e considerado parte de umaonsPlrara -,. dC ")'0, mas nao 0 e, ou vice-versa. A escoberta de conspiraerao pode ser

dausa para alarme - urn marido e levado a suspeitar de infidelidade quandoescob£ ' re que urn encontro casual de sua mulher com urn ex-amante afinal nao

01 tao I' A h" d ficasua aSSlm, Ipotese e con lanya generalizada que 0 reconheci-

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menta de acontecimentos acidentais envolve diz respeito tanto a antecipa<;:6edo futuro quanto a entendimentos interpretativos correntes. Na maioria da:situa<;:oes de intera<;:ao, urn indivfduo supoe que os outros presentes nao usaraoseu relacionamento corrente com ele como base para atos de malevolencianum momento futuro. A explora<;:ao futura de situa<;:oes correntes, porem, esempre uma area de vulnerabilidade potencial.

o casulo protetor e a cobertura de confianfa que torna possivel Sustentaruma Umwelt vidvel. Esse substrato de confian<;:a e condi<;:ao e result ado danatureza rotinizada de urn mundo "sem incidentes" - urn universo de even_tos reais e possfveis que cercam as atividades e projetos do indivfduo para 0

futuro, em que 0 grosso do que acontece nao tern consequencias para a pessoade que se trata. Nesse sentido, confian<;:a incorpora eventos reais e possfveis nomundo fisico, e tambem encontros e atividades na esfera da vida social. Vivernas circunsrancias das institui<;:oes sociais modernas, em que 0 risco e reconhe-cido como tal, cria certas dificuldades espedficas para 0 investimento genera-lizado de confian<;:a em "possibilidades descontadas" - possibilidades que sacpostas entre parenteses como irrelevantes para a auta-identidade e objetivosdo indivfduo. A seguranc;:a psicologica que concep<;:oes de sina podem ofereceresra exclufda de antemao, da mesma forma que a personaliza<;:ao de eventosnaturais na forma de espfritos, demonios e outras entidades. A intromissaocronica e constitutiva dos sistemas abstratos na vida cotidiana cria problemasadicionais influenciando a rela<;:aoentre a confian<;:a generalizada e a Umwelt,

Nas condi<;:oes sociais modern as, quanto mais 0 indivfduo procura forjarreflexivamente uma auto-identidade, tanto mais estara consciente de que aspraticas correntes moldam os resultados futuros. Na medida em que as con-cep<;:oes de fortuna sac completamente abandonadas, a aferi<;:ao do risco - ouo equilfbrio entre risco e oportunidade - se torna 0 elemento central dacoloniza<;:ao pessoal de domfnios futuros. Mas uma parte psicologicamente

crucial do casulo protetor e 0 desvio das perigosas consequencias ~ue ~d· - C 'I' d fis de rISCOepensamento em termos e rISCOsupoe. omo a ana Ise os per .

d b b'I'd d d dlferen-parte central da modernidade, 0 conhecimento as pro a I I a es, ~ detes tip os de atividades ou eventos constitui urn dos meios pelos quais ISSO~o Iser realizado. 0 que pode "dar errado" e posto de lado por ser tao improvave ~

" '- 'd d L . uradetranSVlapr de aVlao e geralmente consl era 0 como a lOrma mals seg ,_, . " . 'd 'd te de aVlaO,porte em termos de vanos cntenos. 0 rISCO e morrer num aCI en

h" ' , I'd 'damente urn ernpara as compan las aereas comerClalS regu ares, e e aproxlma 'osb 'd d' 'd' d ' t tal de VIage850.000 por viagem - numero 0 tl 0 IVI 10 00 numero 0 , 'rnaS

de passageiros num determinado perfodo de tempo pelo numero de V,dtl oa23 • d' senta 0de acidentes durante 0 mesmo perfodo. As vezes se IZ que estar do

poltrona de urn aviao a oito quilometros de altitude e 0 lugar mais seguro

mundo, tendo em vista ~ numero de acidentes que acontecem em casa, notrabalho e em outros amblentes comuns. Mas muitas pessoas Continuam commedo de voar, e certa minoria que tern os recursos e a oportunidade de via'ar

'- L A I N- . d Jde aVlao recusa-se a laze- o. ao conseguem tlrar e suas mentes como seria seas coisas dessem errado.

E interessante que algumas dessas pessoas aceitam viajar pelas estradas semrnuita preocupa<;:ao, ainda que provavelmente estejam cientes de que os riscosde ferimentos graves e de morte sejam maiores. 0 peso do contrafactualparece ser muito importante nisto - por horrfveis que os acidentes na estradapossam ser, talvez nao evoquem 0 mesmo grau de terror do cenario de urnacidente de aviao.

o adiam~nto ~o t~mpo e a disrancia no espa<;:o sac tambem fatores quepodem, reduzIr a mqul,eta<;:ao que a consciencia do risco como risco podeproduZIr. Uma pessoa Jovem de boa saude pode estar bem consciente dos~isco~ de fumar" mas confinar os perigos potenciais a urn tempo que parecemfimtamente ~Ista~te no fut~ro -.quando chegar aos 40 - e assim apagareficazmente tals pengos. Os nscos dlstantes dos contextos cotidianos da vidado. indivfduo - como os riscos de alta consequencia - tambem podem serd_e,xados.de fora da Um.we1t.Os peri?os que apresentam, em outras palavras,sa~ c~ns,derados s~fic,entemente dlstantes dos envolvimentos praticos da~ropna pessoa e asslm nao devem ser seriamente contemplados como possibi-lidades.

Mas a ideia de sina se recusa a desaparecer de vez, e e encontrada em~stra.nha combina<;:ao com no<;:oes de risco de tipo secular e com atitudes deatahsmo. Uma cren<;:a na natureza providencial das coisas e uma das maneiras

~m que uma concep<;:ao de fortuna aparece - fenomeno importante conecta-o c?m c~r~as caracterfsticas basicas da propria modernidade. Interpretaroes

provide d h' " I ")'_ nClals a Istona eram e ementos importantes na cultura iluminista e

nao surpreende 'd' d . 'que seus resl uos am a sepm encontrados em mod os depensar n'd 'd' A' d

a VI a COtl Iana. tltu es em rela<;:ao a riscos de alta consequenciaprovave!mente m .tAL ,Pod . UI as vezes retem lOrtes tra<;:os de uma visao providencial.

emos Vlver num m d I" d' dgl b ' " un 0 apoca IptlCO, lante e uma serie de perigos

o als; e 0 mdlvfduo d' . , .e '. po e Imagmar que os govern os, Clentlstas ou outrossPeclallstas te' - d d

I 0 CnICos serao capazes e ar os passos apropriados para enfrenta-Os u t- " d' en ao sente que tu 0 vai dar certo no fim".

Alternativamente e 'd d ' L ' .ta ' ' ssas atltu es po em calf no latallsmo, Urn etos fatalls-e Uma resposta ge al 'I Itod r posslve a uma cu tura secular de risco. Ha riscos que

ltI Os enfrentamos mas em re!a<;:aoaos quais, enquanto individuos _ e talvezesmo coletivame t - h ' '

a n e - nao a mUlto que possamos fazer. As coisas queCOntecem na vida, urn defensor de tal orienta<;:ao pode dizer, sac afinal

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resultados do acaso. Portanto, bem podemos decidir que "0 que tiver de setsed." e deixar as coisas como estao. Dito isso, seria dificil ser fatalista em toda~as areas da vida, dadas as pressoes que hoje nos impelem a uma atitude ativa einovadora em relacrao a nossas circunsra.ncias pessoais e coletivas. 0 fatalismoem contextos espedficos de risco tende a evoluir para as atitudes mais abran_gentes do que em outro lugar chamei de "aceitayao pragmatica" ou "pessimis_mo dnico". A primeira e uma atitude de lida generalizada - aceitar cada diacomo vier - e 0 ultimo repele as ansiedades com urn humor cansado domundo.24

Ha muitos eventos nao buscados que podem atravessar 0 manto protetorda segurancra ontologica e provocar sobressaltos. Estes aparecem de todas asformas e tamanhos, desde 0 aviso de quatro minutos do Armagedom ate 0

proverbial escorregao na casca de banana. Alguns sao sintomas ou falhascorporais, outros sao ansiedades provocadas pelo fracasso real ou previsto deurn projeto acalentado, ou por eventos inesperados que invadem a UmweLt. Assituacroes mais dificeis para 0 individuo dominar, porem, sac aquelas em queo sobressalto coincide com mudancras consequenciais - momentos decisivos.Neles, 0 individuo provavelmente percebe que enfrenta urn conjunto alteradode riscos e de possibilidades. Em tais circunsrancias, e levado a questionarhabitos rotineiros de especies relevantes, as vezes ate mesmo aqueles maisfortemente integrados a auto-identidade. Varias estrategias podem ser adota-das. Uma pessoa pode, por qualquer razao, simplesmente prossegui~ com osmodos estabelecidos de comportamento, escolhendo talvez desconslderar seeles se adaptam ou nao as novas demandas da situacrao. Em algumas situacroes,no entanto, isso e impossivel - por exemplo, alguem que se separou. doconjuge nao pode continuar da mesma maneira que quando casado. MultoS

d .. , . b . . d· 'd 0 a mudar demornentos eCIslvospor sua propna natureza 0 ngam 0 m IVI uhabitos e a reajustar projetos.

. . "" . d· 'd as vezesMomentos decIslvoS nem sempre acontecem aos m IVI uos - .d b· ... hzadossac cultivados ou deliberadamente procura os. Am lentes mstltUClOna

de risco, e outras atividades de risco mais individualizadas, fornecen: um2~. . d· - f l·d d ' tl· mente cnada.Importante categona e sltuacroes em que a ata I a e e a va .'T. . 'I ·b· - d d'· h b·l·d de capaCldade elalS sltuacroes torn am posslve a eXI Icrao e au aCla, all a , .

I . d· s envolv1-perseverancra, onde as pessoas estao c aramente consclentes os nsco ,. . ue faha asdos no que estao fazendo mas os usam para cnar uma mcerteza q .

circunsrancias rotineiras. A maioria dos ambientes institucionalizados de r1S~. I· d A· - • - esparos em queco, Inc uSlve os 0 setor economlco, sac competlcroes - T d

risco coloca os individuos frente a frente, ou contra obstaculos no mun a. d·f, en-ffsico. Competicroes requerem uma acraocomprometida e oportunlsta 1 er er

" " I· A - e podern ste da das situacroes de puro azar , como a otena. s emocroes qu

atingidas no risco ~~ltivado dependem da exposicrao deliberada a incerteza, eerrnitem que a atlvldade em questao se destaque das rotinas da vida com urn.

~s ernocroespodem ser buscadas no alto risco, imediatamente como especta-dor de esportes ou em atividades onde 0 nivel real de risco para a vida e para 0

corpo e pequeno, mas onde situacroes perigosas sac simuladas (como umacorrida de patins). A emocrao das atividades de risco, como diz Balint, envolvediversas atitudes discerniveis - consciencia da exposicrao ao perigo, exposicraovoluntaria a tal perigo, e uma expectativa mais ou menos confiante de supera-10.26 as parques de diversoes imitam a maioria das situacroes em que asemocroes sac procuradas em outros lugares, mas de uma maneira controladaque Ihes subtrai do is elementos-chave: 0 dominio ativo do individuo; e aincerteza que clama por aquele dominio e permite que ele seja demonstrado.

Goffman observa que alguem fortemente inclinado a assumir riscos -como urn jogador inveterado - e capaz de discernir oportunidades para aintervencrao da sorte em muitas circunsrancias que outros tratariam comorotineiras e tranquilas. Descobrir tais angulos, podemos acrescentar, e umamaneira de gerar possibilidades para 0 desenvolvimento de novos modos deatividade em contextos familiares. Pois onde a contingencia e descoberta, oufabricada, situacroes que pareciam fechadas e pre-definidas podem pareceroutra vez abertas. 0 cultivo do risco converge aqui com algumas das orienta-croesmais basicas da modernidade. A capacidade de perturbar a fixidez dascoisas, de abrir novos caminhos e assim colonizar urn segmento de urn futuronovo e parte do carater desestabilizador da modernidade.

Poderfamos dizer que 0 cultivo do risco representa urn "experimento com~ confiancra" (no sentido da confiancra basica) que consequentemente ternImplicacr6es para a auto-identidade do individuo. Poderfamos redefinir a "ex-pectativa confiante" de Balint como confiancra - confiancra em que os perigosque sao deliberadamente cortejados serao superados. Dominar tais perigos eurn ato de autojustificacrao e uma dernonstracrao, para 0 eu e para os outros, deque se pode sair de circunsrancias dificeis. 0 medo produz a emocrao, mas e 0

medo que e redirecionado em forma de dominio. A emocrao do risco cultivadoSenutre daquela "coragem de ser" que e caracteristica da primeira socializacrao.A Coragem e demonstrada no risco cultivado precisamente como uma quali-~ade que e posta em julgamento - 0 individuo se submete a urn teste deIntegridade mostrando capacidade de perceber 0 lado "de baixo" dos riscos(u: corre, e segue em frente apesar de tudo, mesmo nao sendo obrigado adaze-lo. A procura da emocrao ou, de maneira mais s6bria, da sensacrao dedo~inio que vem com 0 enfrentamento deliberado do perigo, sem duvidaenva em parte de seu contraste com a rotina. Mas tambem toma combustivel

Psicol6gico do contraste com satisfacroes adiadas e mais ambiguas que surgem

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de outros encontros com 0 risco. No risco cultivado, 0 encontro com 0 pe 'I

~ ~'d . 'd d ngoe sua reso u<;:aoestao reum os na mesma anvi a e, enquanto em OUtrsitua<;:oes0 resultado das estrategias adotadas pode nao ser conhecido sen:

s, ao

anos depOls,

Os sistemas abstratos da modernidade criam gran des areas de seguran<;:arela-tiva para a continuidade da vida cotidiana. Pensar em termos de riscos certa-mente tern aspectos inquietantes, como foi sugerido antes, mas tambem e urnmeio de procurar estabilizar os resultados, urn modo de colonizar 0 futuro. 0ritmo mais ou menos constante, profundo e rapido da mudan<;:acaracterfsticadas institui<;:oesmodernas, juntamente com a reflexividade estruturada, signi-fica que ao nfvel da pratica cotidiana, e tambem da interpreta<;:ao filos6fica,nada pode ser tido como certo. 0 comportamento aceitavel/apropriado/reco-mendado de hoje pode ser considerado de maneira diferente amanha a luz decircunsrancias alteradas ou de novos conhecimentos. Mas ao mesmo tempo,no que diz respeito a muitas transa<;:oesdiarias, as atividades sac rotinizadascom sucesso atraves de sua recombina<;:ao no tempo e no espa<;:o.

Consideremos alguns exemplos. J~heiro oderno e urn sistema abs-trato de extraordinaria complexidade, Importante [Iustra<;:aode urn -sistemasiinb61ico que conecta processos verdadeiramente globais as trivialidadesmundanas da vida diaria. A economia monetaria ajuda a regularizar a provisaoae muitiS necessidades diarias, mesmo para os estratos mais pobres nas socie-dades desenvolvidas (ainda que muitas transa<;:oes,incluindo algumas de natu-

\; reza puramente economica, sejam manejadas em termos nao monetarios). 0dinheiro se mistura a muitos outros sistemas abstratos nas arenas globais e naseconomias locais. A existencia do cambio monerario organizado torna possi-

, «, d' A ." ( ) d e dependevels os contatos e trocas a IstanCla no tempo e no espa<;:o e quesse entrela<;:amento de influencias globais e locais, Em conjunto com u,m,ad" d b Ih did d Ih' 'rio ro

nnl-IVlsao 0 tra a 0 e comp exi a e seme ante, 0 sistema moneta d

. ~ db' ," 'd 'd' A variedade eza a provisao os ens e servI<;:osnecessanos a VI a con lana. 'dobens e comidas disponiveis para qualquer indivfduo nao s6 e muito malar, over-que nas economias pre-modernas, mas essa disponibilidade nao e m

alSg -

d~ d' I'd'" d I AlimentOS sa7,ona a tao Iretamente pe as 1 lOsslllcraslas e tempo e ugar. e, I ' do ana,

nals, por exemplo, hoje podem ser obtidos em qua quer epoca jaO

d' " au reg

pro utos que slmplesmente nao podem ser culnvados em cerro paispodem ser regularmente obtidos nele,

Trata-sede u~: coloniza<;:aodo tempo, e de u Qrge~mento do espa<;:o

Uma vez que provisoes para 0 futuro tornam-se desnecessarias para 0 ". . ~ , consuml-

dor individual. De fato na~ ~a va~tagem em empilhar estoques de comida-embora alguns possam decidu faze-lo, considerando riscos de alta cons .. A, .' equen-cia _ para a Vidacomum numa economla monetana que funciona com '" ' .' vigor,Tal pranca au~entana os custos, pOlS comprometeria renda que de outramaneira p~dena ser.usada para outros fins. A acumula<;:aode qualquer forma~ao. ~oden~ ser malS do q~e uma est~ategia de curto-prazo, a men os que 0

IOdlvlduo nvesse desenvolvldo a capacldade de fornecer sua pr6pria alimenta-s:ao.Enquanto a pessoa confiar no sistema monetario e na divisao do trabalhoos dois sistemas p~rmitem maior seguran<;:ae previsibilidade do que poderi~.,Lser obtido por qualsquer outros meios. I

Como .outra ilus,tra<;:a.o,consideremos 0 fornecimento de agua, de energia~ara aqueclmento e dumllla<;:ao, e de servi<;:osde saneamento de esgotos. TaisSistemas, e 0 saber de que dependem, atuam para estabilizar muitas dassitua<;:oesda vida cotidiana - ao mesmo tempo que com d' h ., ' 0 0 In euo, astra,nsformam ra~lcalmente em rela<;:aoaos modos de vida pre-modernos. Nospal~es desen:olvldos, p~ra a maior parte da popula<;:ao, a agua s6 depende deabnr a t~rnel,ra, 0 aqueclmento e a ilumina<;:aotambem estao a mao, eo esgotop~ssoal e rapldamente eliminado por descarga de agua. 0 encanamento orga-nl~a~o da ~gua reduziu substancialmente uma das maio res incertezas queafllg~am a vida em muitas sociedades pre-modernas, 0 carater inconstante dosupnmento de' 27 A ' d. agua. agua encana a, prontamente disponfvel nas casastornou possfvels os padroes de limpeza e higiene pessoais que tanto contribui~r~m para a melhora da saude. A agua corrente tambem e necessaria para osSistemas moder de' .nos e esgotos, e portanto IOIlmportante para a contribuis:aoque 0 saneamento trouxe 'd A I "d ds61'd para a sau e. e etnci a e, 0 gas e os combustfveis

I os tambem . did ~en' ~Ju am a regu ar pa roes de conforto corporal, fornecendoergla para co hTod A ,Zlll ar e para a opera<;:ao de muitos apare!hos domesticos.

tor as tern a~blentes regulares de atividade dentro e fora da casa. A luz e!etricanou POSSIVe!a colonizarao d . 28 N 'd' 'gover d I ,T a nOlte. 0 melO omestlco, as rotlllas sao

de d' na as,pe a necessldade de sono diario regular e nao mais pe!a alternanciala e nolte qu dcres " e po e ser atravessada sem qualquer dificuldade. Fora do larcente numero d '~' 'A ' ~ e orgamza<;:oesopera vlllte e quatro horas por dia.

. lnterven<;:aotecnol6 i'd'SIStem b g ca na natureza e con I<;:aodo desenvolvimento deas a stratos como esses 'I b'aspecto d 'd' ' mas e c aro que tam em afeta muitos outros

I. s a VI a social mod A'" I' ~ d " 'IZarU' erna. socia lza<;:ao a natureza aJudou a estabi-ma vanedade de' fl A' beram . III uenclas so re 0 comportamento humano que anteslrregulares ou j '" 0lllent ' mpreVlSlvelS. controle da natureza era urn empreendi-o lmportante em ep 'd .ocas pre-mo ernas, especlalmente nos gran des esta-

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dos agrarios, em que esquemas de irrigayao, a derrubada de florestas eb L" d h OUtromodos de manejo da natureza para enenclo 0 omem eram lug s. , , ares-co

muns. Como destacou Dubos, a Europa p entrou no penodo moderno c -urn ambiente amplamente socializado, formado por varias gerayoes de Ca °mo

A •• '29 M f,' mpo_neses a partir das florestas e pantanos ongmals. as 01 nos ultimos d .OIS Ou

tr<~sseculos que 0 processo de intervenyao human a na natureza se intensificd· I"" Oumaciramente alem ISSO,nao se Imlta mals a certas areas ou regioes

T' , . ' mascomo outros aspectos da modermdade se tornou globahzado. Muitos aspectosda atividade social se tornaram mais seguros como resultado desses desenvol_vimentos. Viajar, por exemplo, tornou se mais regular e seguro com a constru_yaOdas estradas modernas, e dos trens, navios e avi6es. Como aconteceu comtodos os sistemas abstratos, enormes mudanyas na natureza e alcance dasviagens se associam a essas inovayoes. Mas e facil hoje, para quem quer quetenha os recursos financeiros necessarios, encarar casualmente jornadas que h:idois seculos s6 seriam enfrentadas pelos mais intrepidos, e teriam tornadomuitissimo mais tempo.

Ha mais seguranya em muitos aspectos da vida cotidiana - mas tambeme preciso pagar urn certo preyo por esses avanyos. Sistemas abstratos ~epen-dem de confianya, mas nao trazem nenhuma das recompensas morals quepodem ser obtidas da confianya personalizada, ou de que se disp~nha ~mambientes tradicionais a partir dos quadros morais dentro dos quais a vidacotidiana se desenvolvia. Ademais, a penetraayao geral dos sistemas abstratos

, 'd' .. . d' 'd - tra nas melhoresna vida cotl lana cna nscos que 0 10 IVI uo nao se encon .f . d I ..A' m nesta categona.condiyoes para en rentar; os nscos e a ta consequencla cae

.. dA" d . I - d . t mas globalmenteMalOr mterdepen enCla, ate 0 ponto e mc usao e SISe d. "fi' I b'I'd d d orrem eventoS es-mdependentes, slgm ICamalOr vu nera I I a e quan 0 oc d

d r; tece com to osfavoraveis afetando esses sistemas como urn to o. co que acon . r. d . 0 d' h . pessoa pOSSUI,poos exemplos menclOna os aClma. 10 euo que uma mo

, " . 'I - d I'aglobal que nem mespouco que seJa, esta sUJelto a OSCIayoes a econom. 'rio. diU tema monetaa mais poderosa das nayoes sena capaz e reso ver. m SIS h na

a Aleman alocal pode entrar em completo colapso, como aconteceu com I nao

• A' mentO ta veZdecad a de 1920 - em algumas cucunstanClas, que no mo , I bal corn

, . . d' 'dem monetana go,possamos Imagmar, ISSOpo era acontecer a or I ada, OUA • d b'lh- d Uma seca pro ongconseqilenclas esastrosas para I oes e pessoas. , ezeSter

I· d d a odem as voutros problemas com os sistemas centra Iza os e gua, p dernos oSd' , dos pre-mo dresultados mais perturbadores 0 que tlveram em peno I ado e

. , 'd' d' I aCI'onamento pro ongraclOnamentos peno ICOS e agua; e qua quer r. f, . 'd d d'" d d' mero de pessoas. , a-energla a eta as ativi a es or manas e gran e nu , bstanOV

.. f, '1 -' ificatlva e su deA natureza soclahzada ornece uma I ustrayao sign 'bilida '. de plaus,mente muito importante. McKibben argumenta, com gran

. ter~enyao humana no mundo natural foi tao profunda e abrangenteue a In Lid "fi d " A . I'q h'e podemos fa ar 0 1m a natureza. natureza socia Izada e muito

que oJ do antigo ambiente natural, que existia separado dos afazeres huma-diferente . d fi d I' " I "E'Ihes fornecla urn pano e un 0 re atlvamente Imutave . como anos. e atureza que produz seus efeitos at raves daquilo que concebemos comoannga n

os naturais (chuva, vento, calor), mas nao oferece nenhum consolo-Process . A •

c. do mundo humano, urn senti do de permanenCla, ou mesmo de eterni-a rugad "30 .

da e. 'd' d' M K'bb . ., IA natureza no senti 0 antigo, IZ c I en, era lmprevlslve : tempesta-des podiam chegar sem aviso, maus veroes podiam destruir safras, enchentesdevastadoras podiam decorrer de chuvas inesperadas. A tecnologia e 0 sabermodern os tornaram possivel urn melhor monitoramento das condiy6es dotempo, e 0 manejo aperfeiyoado do ambiente natural permitiu a superayao deperigos existentes ou pelo menos a minimizayao de seus impactos. Mas anatureza socializada e sob certos aspectos menos confiavel que a "antiga natu-reza",porque nao podemos estar seguros de como a nova ordem natural vai secomportar. Tomemos a hip6tese do aquecimento global, fenomeno que, seestiver de fato ocorrendo, provocara 0 caos em todo 0 mundo. McKibbenconclui que a evidencia disponivel ap6ia a visao de que 0 "efeito estufa" e real,e de fato argumenta que os processos envolvidos ja estao muito adiantadospara poderem ser controlados eficazmente a curto ou medio prazo. Talvezesteja certo. A questao e que, no momento em que escrevemos, ninguem podedizer com certeza que nao esta acontecendo. Os perigos gerados pelo aqueci-menta global sao riscos de alta conseqilencia que enfrentamos coletivamente,mas sobre os quais uma estimativa precisa do risco e praticamente impossivel.

Seguran~a, desqualifica~ao e sistemas abstratos

Os sistemas b d I'fi 't d a stratos esqua I Icam - nao so no local de trabalho, mas emc~t'°d~os S~tores da vida social que atingem. A desqualificayao da vida social

I Iana e urn f, A I' f .,Ali enomeno a lenante e ragmentador no que dlZ respelto ao eu.enante porque' '- d' b . I '""a a Intromlssao os sistemas a stratos, espeCia mente os slste-<., s esp 'l"

preex' eCla lzados, em todos os aspectos da vida cotidiana solapa as formasria d~:teJ1t~Sde controle local. Na vida muito mais fortemente local da maio-habilid s~cled~des pre-modernas, todos os indivfduos desenvolviam muitas\'idas c: ,~,e tlPOSde "saber local", no sentido de Geertz, relevantes para suasIllodos tl, l,anas. A sobrevivencia dependia de integrar tais habilidades em~ do prba.t1cosde organizar as atividades nos contextos da comunidade local

am lent f"e ISICO.Com a expansao dos sistemas abstratos, porem, as

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condic;:oes da vida diaria se transformam e recombinam em porc;:oes maio res d, d etempo e espac;:o, e tais processos de desencalxe sac processos e perda. Masseria errado ver essa perda como a transferencia de poder de alguns individuosou grupos para outros. Transferencias de poder.ocorrem dessa ~~neira, masnao sao exaustivas. Por exemplo, 0 desenvolvlmento da medlcma levou aexclusao do saber e das habilidades curativas outrora possuidos por leigos. Osmedicos e outros tipos de peritos derivam poder das reivindicac;:oes ao saberque seus codigos de pratica incorporam. Mas como a especializac;:ao inerenreao saber significa que os peritos sao leigos na maior parte das situac;:oes, 0

advento dos sistemas abstratos constitui modos de influencia social que nin-guem controla diretamente. E justamente esse fenomeno que esra por baixo

do surgimento dos riscos de alta conseqiiencia.Braverman estava enganado ao supor que, na esfera do trabalho, aconrece

um processo de desqualificac;:ao em mao unica. No local de trabalho, saGconstantemente criadas novas qualificac;:oes, que sac em parte desenvolvldaspor aqueles cujas atividades for,a~ desqua~ificadas. ~go PAare~ido e ~erdadeem muitos outros setores da atlvldade social onde a mfluencla dos sistemasabstratos se fez sentir. A reapropriac;:ao do saber e do controle por parte dosleigos e um aspecto basico do que as vezes chamo de "dialetica do con~role",Por mais qualificac;:oes e formas de saber que os leigos percam, ele~ ~ontmu:mqualificados e competentes nos contextos de ac;:aoem qu~ suas atlvI~ades ternlugar _ contextos que, em parte, essas atividades reconstltu~m contmuame~-te. A qualificac;:ao e a competencia cotidianas mantem assln: uma c?nexaodialetica com os efeitos expropriadores dos sistemas abstratos, mflu~n:la~do ereformulando continuamente 0 impacto de tais sistemas sobre a eXlstenCla no

dia-a-dia. ., - tas Clrcuns-o que esta envolvido nao e apenas a reapropnac;:ao mas, em certancias e contextos, 0 empoderamento. Juntamente com 0 desencaixe, a expan-

, 'd d d der de podersao dos sistemas abstratos cna quanti a es crescentes e po - dd

. I C ondiroes eque os homens tem de alterar 0 mun 0 matena e tranSlOrmar as c , ,

" _ ' - d d C oportunidades gene-suas propnas ac;:oes.A reapropnac;:ao esse po er Olerece ,, _ d' " h' " 'E se empoderamento encas nao Isp0nlvels em eras Istoncas antenores, s , '

, " I' b I - t e ses dois nivels seJatanto mdlvldual quanto co etlvo, em ora as re ac;:oesen re s Imuitas vezes emaranhada e dificil de elucidar, tanto pelo analista quanto pe 0

leigo no nivel da vida cotidiana, deA profusao de sistemas abstratos esra diretamente li,gada aos panoramas ha

escolha que confronram 0 individuo na atividade diana. De um lado,, " I ' I' de fazer as

multas vezes uma selerao a ser felta entre manelras ocals ou elgas ,, - ecoisas e procedimentos oferecidos a partir dos sistemas abstratos. Isso naO I, f d" d" I" d no embora taslmplesmente um con ronto 0 tra IClOna com 0 mo er ,

, ra~ seja bastante comum. Como resultado de processos de reapropriaraoSltUa, .' ' ,abre-se um num~ro mdetermmado de espac;:os entr~ a crenc;:a e a pratica leigas

a esfera dos sistemas abstratos. Em qualquer sltuac;:ao, se os recursos de;empo e outros requ.isitos _estiver:m dispo~iveis, 0 individuo tem a possibili-dade de uma requallficac;:ao parcial ou mals completa em relac;:ao a decisoesespedficas ou cursos de ac;:aocontemplados.

Empoderamento e dilemas do saber

Consideremos, por exemplo, uma pessoa com dor nas costas. Que deveriafazer para procurar tratamento? Se estivesse na Inglaterra, poderia ir a urnc1inico geral ligado ao Servic;:o Nacional de Saude. 0 clinico geral talvez aencaminhasse a urn especialista, que poderia fazer recomendac;:oes ou oferecerservic;:osque a satisfizessem. Mas tambem poderia acontecer que ela descobris-se que nada do que 0 especialista tivesse sugerido of ere cia qualquer ajuda noalivio da condic;:ao que a afligia. 0 diagnostico de problemas de dores nascostas e notoriamenre problematico, e a maioria das formas de tratamentod.is~oniveis sac controversas dentro e fora da proflssao medica. Alguns espe-claltstas, por exemplo, recomendam a cirurgia de hernias de disco. Mas haestudos indicando que pacientes com 0 referido problema de disco tem tantachance de recuperar-se sem cirurgia como com ela. Ha grandes diferenc;:asent~e os paises em relac;:ao a questao. Assim, 0 numero de pacienres por milhabltantes para quem sao recomendadas cirurgias de disco e dez vezes maise1evado nos Estados Unidos do que na Inglaterra, e a diferenc;:a representa,entre Outras coisas, uma variac;:ao nas f1losofias gerais sobre a melhor forma detratar dores n d' , S d 'd" . ,, as costas entre os OIS palses, e eCI Ir mvestlgar mals, nossopacle~t~ descobriri que em drculos medicos orrodoxos ha enormes diferenc;:as~e 0~1111aosobre tecnicas de operac;:ao, ainda que haja acordo sobre a tecnicaInVaSlva com Ih " P I I ' '- C, , ,orne or estrategJa. or exemp 0, a guns clrurglOes prelerem all11crocIrUrgla em I - d' , " , "re ac;:aoa proce Imenros clrurglCos mals convenClOnalS paraa coluna.

Apr~fundando sua investigac;:ao, 0 pacienre descobriri que ha disponivelu;na vanedade de outros metodos de terapia da coluna, cujos proponentesallrmam s' h" d d'erVIr para ernlas e ISCOe para outros problemas, transitorios oupermanent E 'd'Cof, es. ssas terapJas lJerem nao so nas fOl'mas de tratamento que

erecem mas I - " - cd' d d, em re ac;:ao a mterpretac;:ao que lazem as ongens as ores epatologias da c I A 'b' ,,' d' C d Io unas. osteopatla se asela em pnnClplOS llerentes aque esqueoq' ,c. 'I' Cdulrogral1co uti lza. a a uma dessas orientac;:oes contem ainda escolasem competic;:ao, Outras formas disponiveis de tratamento da coluna incluem

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fisioterapia, massagens, acupuntura, exerdcios, reflexologia, sistemas de ajustepostural como 0 Metodo Alexander, terapias com drogas, dietas, imposi<;:aodas maos - e tambem outros metodos terapeuticos. Uma escola de pensa-mento aflrma que a grande maioria dos problemas da coluna, inclusive algunsde natureza muito seria, tern sua origem em disturbios psicossomaticos, edevem portanto ser tratados remediando as Fontes da tensao, sem concentra_<;:aodireta nas proprias costas. Segundo tais escolas, psicoterapia, medita<;:ao,ioga e outros modos de relaxamento, ou uma combina<;:ao deles, fornecem 0

melhor modo de tratamento.A essa altura, 0 paciente pode, de modo muito razoavel, chegar a conclu-

sao que ja chega e resolver informar-se sobre a natureza de s~a q~eixa e ospossiveis remedios. Estao disponiveis no mercado popular mUltos livros naotecnicos sobre a coluna. A maioria faz uma interpreta<;:ao do estado geral dosaber medico sobre 0 assunto e tenta fornecer urn guia informado das terapiasdisponiveis. Ha certamente consenso entre as autoridades (que em out~osaspectos discordam) sobre a anatomia estrutural do corpo. Nao demora mult?ate que 0 paciente alcance urn entendimento basico dos problemas estruturalsque afetam sua coluna. A requalifica<;:ao/apropria<;:ao seria prontamente possf-vel em rela<;:ao ao aprendizado das linhas gerais dos diferentes trata~e~tosdisponfveis e como estes se comparam com aqueles sugeridos pelo espeCl~listaoriginal. Decidir sobre qual escolher se~a mais di~fcil, porque 0 pac~ent~precisara comparar as varias afirma<;:6es feltas pelas dlferentes escola~. N~o haautoridade maxima a quem recorrer - dilema caractedstico da mUltas sltua-

<;:6esnas condi<;:oes da alta modemidade.Mas se essa pessoa se dedica apropriadamente a requalifica<;:a~, uma esco-

Iha razoavelmente informada pode ser feita. Tais escolhas nao sao slmplesmen-. d I b ativa da auta-te op<;:6es comportamentals - ten em a vo tar-se so re a narr ..

.. b ' . d diU d' - ntre a medlCWaIdentldade, que tam em aJu am a esenvo ver. ma eClsao e _

I . I ' , t uma questaoconvencional e a de alta tecno ogla, por exemp 0, e so em par eI b' "d' I isa" sobre 0de escolha informada - normal mente e a tam em IZ a guma co

. .c. ' d' 'd 'eguindo urnestilo de vida da pessoa. Pode slgnmcar que 0 In IVI uo esta sb I 'd I . to com cer-padrao de comportamento razoavelmente esta e eCl 0, ta vez Jun .

I 0 elfnleotas formas de deferencia. Isso pode acontecer se a pessoa consu tar. ue 0geral e depois 0 especialista recomendado, e simplesmente segulr

0 q fi-b d d s da pro IS

segundo sugere, em deferencia a ambos como mem ros estaca ~ deC d d" I ' eClalmente

sac medica. Optar por uma IOrma e me Icma a ternatlva, esp. " . d' I' I 'sobre cerrasuma das vanedades mals esotencas, po e sma Izar a gum a COisa .

decisoes de estilo de vida que a pessoa tama, e de fata contribuir para IS:O~deNa maioria de rais decisoes, provavelmenre se misturam concep<;:oe s

. 'd Comoofortuna, fatalismo, pragmarismo e risco consclentemente assuml O.

eritos discordam com tanta frequencia, mesmo profissionais no centro de~m determinado campo de conhecimento podem se encontrar em posi<;:aomuito semelhante a do leigo diante de decisao analoga. Num sistema semautoridades definitivas, mesmo as cren<;:as mais acalentadas subjacentes aossisternas especializados estao abertas a revisao, e muito comumente sac altera-das de maneira regular. 0 empoderamento esta disponfvel rotineiramentepara 0 leigo como parte da reflexividade da modernidade, mas muitas vezes haproblemas sobre como esse empoderamento se traduz em convic<;:6es e ema<;:ao.Urn certo elemento de fortuna, ou de fatalismo, permite assim que apessoa chegue a uma decisao que so pode ser parcialmente garantida a luz dainforma<;:ao local e especializada disponivel.

Foi destacado anteriormente que ninguem pode se livrar completamente dossistemas abstratos da modernidade - essa e uma das consequencias de vivernum mundo de riscos de alta consequencia. Mas e claro que os estilos de vidae setores do estilo de vida podem ser ajustados para navegar entre as diferentespossibilidades oferecidas num mundo reconstituido pelo impacto dos siste-mas abstratos. A confian<;:a em alguns ou em muitos dos sistemas que rotinei-ramente ou de maneira esporadica interferem com a vida do indivfduo podeser s~spensa. Seria muito diflcil, se nao impossfvel, retirar-se completamented~ sistema monetario modemo. Mas 0 individuo po de escolher manter seusatlvos na forma de bens ou de propriedade pessoal; e pode reduzir ao minimosuas rela<;:6es com bancos e outras organiza<;:6es financeiras. Muitas nuancespossfveis de ceticismo ou de duvida podem ser conciliadas com uma atitudepra " I:'gmatlca ou latalista em rela<;:ao aos sistemas abstratos que afetam nossaschances de vida.

?utros podem tomar decisoes sobre estilos de vida que os levam de voltana dlrerao d 'd d . d" . 0 C d I' I' .)' as auton a es malS tra IClOnaiS. IUn amenta Ismo re IglOso,Pbor exemplo, oferece respostas c1aras sobre 0 que fazer numa epoca quea andono 'd d d c. . . .d ' . u as auton a es el1llltlvas - que podem ser novamente conJura-uas pela lllvoca<;:ao das antigas formulas da religiao. Quanto mais "inclusiva"c::a de~erminada denomina<;:ao religiosa, mais ela "resolve" 0 problema dec 1110Vlver num mundo de multiplas op<;:6es. Formas mais atenuadas deren<;:a 1"to re Iglosa, entretanto, tambem podem oferecer apoio imporrante nal11ada de d . - ',. .c. .eClsoes vitals slgnlllCatlVas.

tadaA maio ria desses dilemas torna-se parricularmente aguda, ou e experimen-Como tal, durante os momentos decisivos da vida do indivfduo. Como os

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momentos decisivos, por definic;:ao, sao de alta conseqiiencia, 0 individuo sesente numa encruzilhada em termos de seu planejamento geral da vida. Mo-mentos decisivos sao fases em que as pessoas podem resolver recorrer a autori-dades mais tradicionais. Nesse sentido, podem procurar refugio em crenc;:aspreestabelecidas e em modelos familiares de atividade. Por outro I~do, mo-mentos decisivos muitas vezes tambem marcam perfodos de requahficac;:ao eempoderamento. Sao pontos em que, independente de quao reflexivo 0 indi-viduo possa ser na formac;:ao de sua auto-identidade, ele deve parar paraperceber as novas demandas e tambem as novas possibilidades. Em tais mo-mentos, quando a vida precisa ser vista com urn novo olhar, nao surpreendeque as tentativas de requalificac;:ao sejam parricularmente imporrantes e muitoprocuradas. No que diz respeito a decisoes de alta conseqiie~cia, os i~~iv{duossao muitas vezes estimulados a devotar 0 tempo e a energla necessanos paragerar maior dominio das circunsd.ncias que enfrentam. Momentos decisivossao pontos de transic;:ao que tern implicac;:oes nao so para a conduta futura doindividuo, mas para a auto-identidade. Pois as decisoes de conseqiiencia, umavez tomadas, refazem 0 projeto reflexivo da identidade pelas conseqiiencias

que ocasionam para 0 estilo de vida. . . .' ,Porranto, nao surpreende que nos momentos decIslvoS os lOdlVlduos

tendam a encontrar sistemas especializados centrados precisamente na recons-truc;:ao da auto-identidade - analise ou terapia. A decisao de submeter-se aterapia pode gerar empoderamento. Ao mesmo tempo, vale acres~entar, .taldecisao nao e de natureza diferente de outras decisoes relativas ao estllo de vidatomadas em situac;:oes de modernidade. Que tipo de terapia seguir, e porquanto tempo? Como mostra 0 livro Autoterapia, talvez seja ?ossivel para 0

individuo reorientar efetivamente sua vida sem consultar dlretamente urnespecialista ou profissional. Por outro lado, muitos terapeutas sustentam quesem contato regular com urn analista nao ha esperanc;:a real de mudanc;:a

". 'd ' I d· 'd d d . todas afirmandopessoal. EXlste hOJe uma consl erave Iversl a e e teraplas,

d bl C I do desacordotratar uma gama semelhante e pro emas. omo exemp 0

. 'I· I'· ca corn aentre as diferentes escolas, podemos comparar a pSlCana Ise c assld" . H ' "t s terapeutas

terapia comporramental baseada no con lClonamento. a mUI 0 . 'Ii-que obedecem aos prinefpios basicos estabelecidos por Freud para a pSlcanMa

A" d d eles asse e formulam seus procedimentos terapeutlCoS e acor 0 com . I"

, fi sicana Isealguns proponentes da terapia do comportamento a Irmam que a P "

d . AI ' d· sso eXlstecarece inteiramente de validade como modo e terapla. em I , I

. . " - "'I" I" d d'· d outras escO asuma vanedade de subdivisoes na pSlcana Ise, a la as a UZlas e _fl . "rnaS espe

de pensamento e tecnica diferentes. 0 encontro re eXlvo com slste"I" d d " " to alguns dos di1ernas

cia Iza os que aju am a reconstltulr 0 eu express a portancentrais que a modernidade faz surgir.

5. A segrega~ao da experiencia--------

Diz-se freqiientemente que a enfase dominante da modernidade esta no con-trole - a subordinac;:ao do mundo ao dominio do homem. A afirmac;:ao ecertamente correta, mas apresentada dessa forma precisa de consideravel ela-borac;:ao. Urn dos significados do controle e a subordinac;:ao da natureza aospropositos do homem, organizados pela via da colonizac;:ao do futuro. Esseprocesso parece a primeira vista uma extensao da "razao instrumental" - aaplicac;:aodos prinefpios humanamente organizados da ciencia e da tecnologiaao controle do mundo natural. Olhando mais de perro, contudo, 0 que vemose a surgimento de urn sistema internamente referido de conhecimento epoder. E nesse sentido que devemos entender a expressao "fim da natureza".Tiveram lugar uma acelerac;:ao e urn aprofundamento marcados do controle danatureza pelo homem, que estao diretamente envolvidos com a globalizac;:aoda atividade social e economica. 0 "fim da natureza" significa que 0 mundo~atural se tornou em grande parte urn "ambiente criado", que consiste emSl~temas humanamente estruturados cujo poder e dinamica derivam de reivin-dlcac;:oes ao saber socialmente organizadas e nao de influencias exogenas aatividade dos homens.

.Como 0 ambiente natural parece tao distinto do universo da atividadesocial' "d, e preciso estacar que a natureza torna-se urn sistema internamentereferido 1: I " . L' ·1 ' ··d . I .. a vez sep malS laCI ver que a propna VI a socia se torna lOterna-tnente referida, junto com a mobilizac;:ao da auto-identidade. Ora, a refe-rencialidade intern a da vida social modern a muitas vezes e confundida comUtna disti - "" d d"" "d· dt n?a~ entre socle a e e natureza; e, e manelra correspon ente,al referenclahdade muitas vezes e pensada como intrfnseca a todos os sistemas

sociais e na-o ,"". - d d ·d d M· " ".' apenas as InStltUlc;:oes a mo erOl a e. as os sistemas SOClalSSo se t "ornam lOternamente referidos, pelo menos numa base continuada, al11edida qu " " . I fl " . d'

lese tornam InStltuclona mente re eXlVOSe asslm amarra os aCo "

a on~zac;:aodo fururo. Na medida em que a vida social e organizada segundotradlra I h 'b" .. Ifat .,. 0, pe 0 alto rotlOelro ou pe 0 ajuste pragmatico a natureza exogena

d ta-lhe aquela referencialidade interna fundamental a dinamica da moderni-ade. A evaporac;:ao da moralidade e crucial a esses processos, particularmente

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a medida que as perspectivas morais sac integradas de maneira segura a pea.ticacotidiana. Pois os principios morais sac contrarios ao conceito de risco e amobiliza<;ao da dinamica do controle. A moralidade e extdnseca no que dizrespeito a coloniza<;ao do futuro.

A diferen<;a do mero habito, a tradi<;ao sempre tem um carater normativo"vinculante". "Normativo" por sua vez implica urn componente moral- naspraticas tradicionais, a obrigatoriedade das atividades expressa preceitos sobrecomo as coisas devem ou nao ser feitas. As tradi<;oes de comportamento ternsua pr6pria carga moral, que resiste especificamente ao poder tecnico deintroduzir algo novo. A fixidez da tradi<;ao nao deriva de sua acumula<;ao dosaber passado; melhor dizer que a coordena<;ao do passado e do presente ealcan<;ada pela adesao aos preceitos normativos que a tradi<;ao incorpora.Como comenta Shils:

a tradi<;:aoe assim muito mais que uma recorrencia estatisticamente freqiiente,numa sucessao de gera<;:6es,de cren<;:as,de pra.ticas, de institui<;:6es e de obrassemelhantes. A recorrencia e resultado das conseqiiencias normativas - e asvezes da inten<;:aonormativa - da apresenta<;:ao e da aceita<;:aoda tradi<;:aocomonormativa. E essa transmissao normativa que liga as gera<;:6esdos mortos com asgera<;:6esdos vivos na constitui<;:ao de uma sociedade ... os mortos ... sao objetos decompromisso, mas 0 que e mais significativo e que suas obras e as normascontidas em suas praticas influenciam as a<;:6esde gera<;:6esposteriores que nemao menos os conhecem. 0 centro normativo da tradi<;:aoe a for<;:ainercial quemantem a sociedade numa forma dada ao longo do tempo. I

o desenvolvimento de sistemas sociais internamente referidos esra na origemdo projeto reflexivo do eu. A cria<;ao de uma vida internar.lente referida foiinfluenciada decisivamente por uma serie de mudan<;as sociais concorrentes.Cada uma del as atua para separar a vida como uma trajet6ria distinta efechada de outros eventos das seguintes maneiras:

1 A vida surge como urn segmento separado do tempo, distanciado do ci.clo

da vida das gera<;oes. A ideia do "ciclo da vida", de fato, nao tern muito sentldouma vez que as conexoes entre a vida individual e 0 intercambio das gera<;oesforam rompidas. Como as observa<;oes de Shils destacam de maneira adequa-da, a tradi<;ao e a continuidade das gera<;oes estao inerentemente ligadas entresi. Diferen<;as geracionais sac essencialmente um modo de lidar com 0 tempOnas sociedades pre-modernas. Vma gera<;ao e uma coorte ou ordem distinta de

parentes~o que. coloca a vida do indivlduo dentro de uma seqUencia derransi<;oes coletlvas. Nos tempos modernos, contudo, 0 conceito de "gera<;ao"cad a vez mais s6 faz sentido contra 0 pano de fundo do tempo padronizado.Falamos, em outras palavras, da "gera<;ao dos anos 50", da "gera<;ao dos 60" eassim por diante. A sucessao temporal nesse sentido retem muito pouco daressonancia dos processos coletivos de transi<;ao caractedsticos de eras anterio-res. Em contextos tradicionais, 0 "ciclo da vida" carrega fortes conota<;oes derenova<;ao, pois 'cada gera<;ao em grande parte redescobre e revive modos devida de seus predecessores. A renova<;ao perde muito de seu significado nassitua<;6es da alta modernidade onde as praticas sac repetidas apenas se foremreflexivamente justificaveis. 2

2 A vida se separa das eXE~rn~lidades do lugar, enquanto que 0 pr6prio lugare so apado pela expansao dos mecanismos de desencaixe. Na maioria dasculturas tradicionais, nao obstante as migra<;6es de popula<;oes que eramrelativamente comuns e as longas discancias as vezes percorridas por alguns, amaior parte da vida social era localizada. 0 principal fator que alterou essasitua<;ao nao esta no aumento da mobilidade; melhor dizer que 0 lugar einteiramente atravessado pelos mecanismos de desencaixe, que recombinamas atividades locais em rela<;oes espa<;o-temporais de amplitude cada vez~aior. 9 lugar se tor~ fantasmag6rico.3 Embora os ~eios em que as pessoasVlvem permane<;am como Fontes de liga<;6es locais, 0 lugar nao constitui 0

arametro da experiencia; e nao oferece a seguran<;a do sempre familiar,~ar~tedstica dos lugares tradicionais., A intensifica<;ao da experiencia transmi- /)tl ~ d. .tlda ela mldia tambem desempenha um papel aqui. A familiaridade (com os t "1-1\

eventos sociais e com as pessoas, e tambem com os lugares) nao mais dependea enas, ou meslT!o principalmente, dos meios locais.

o lugar tor~a-se assim muito menos significativo do que costumava serComo ~ferente externo da vida do indivlduo. A atividade espacialmentelocalizada fica cada vez mais envolvida com 0 projeto reflexivo do eu. Onde apessoa vive, pelo menos a partir do inkio da vida adulta, e uma questao deescolha 0 d '. IorgaOlza a pnnclpa mente em termos do planejamento da vida dapess~a. E claro que, como em todos os processos do tipo, formas dialeticas derea<;ao sao ,. --r . 'd . °d ° I Iposslvels. lentatlvas atlvas e reencalxar a VI a no mew oca I

eodem ser empreendid~varias maneiras. Algumas como 0 cultivo de umsentido de lh ° ,. - I'd ° IIorgu 0 comuOltano, sac provave mente vagas emals para recap-turar mais I' d . 0 ., dque urn ampe)o 0 que eram antlgamente. reencalxe so po eocorrer d " 'f!' f:es . . e manelra SlgOl Icatlva se lOr posslvel ajustar as praticas regulares adi~,e~lficldades do lugar - mas nas condi<;6es da alta modernidade isso e

Icd de conseguir.

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3 A vida passa a ser cada vez mais livre das externalidades associadas com osla<;:ospreestabelecidos com outros ~nd!vf~uos e grupos. La<;:osde parente~?o ~evarios tipos eram c1aramente as pnnClpals ancoragens externas da expenenclade vida do indivfduo na maioria dos contextos pre-modernos. Rela<;:oesdeparentesco ajudavam a determinar e em muitos casos ~efiniam completamen-te as decisoes-chave que afetavam 0 curso dos aconteclmentos durante toda avida do indivfduo. Decisoes sobre quando casar e com quem, onde viver,quantos filhos deseja ter, como cuidar dos fiI,hos, como passar a velhice saDalguns dos exemplos mais 6bvios. As externalidades de lu?ar e de, pare~tesconormalmente se ligavam de perto. A transmissao da propnedade, inclusive depe<;:asde heran<;:ae de moradias familiares, tambem desem~~nhavam p~pelimportante. Nas condi<;:oes sociais modernas, grupos faml1l,ares sucesslvosraramente continuam a viver no mesmo predio. Em areas rurals, ou entre unspoucos grupos aristocraticos remanescentes, ainda existem casas que foramhabitadas pelos membros da mesma famflia por lon~os perfodos, ate mes.moseculos. Mas para a massa da popula<;:ao urn tal fenomeno se torna p.ratlca-mente desconhecido e a no<;:aode "ancestrais", tao importante para as vldas demuitos em situa<;:oespre-modernas, se torna difusa e diffcil de recuperar.

Sem as referencias extern as fornecidas pelos outros, a vida mais uma vezsurge como uma trajet6ria relacionada acima de tud.o aos projetos, e pl~nos doindivfduo. Os outros sempre figuram nesse planepmento da vida, e c1~ro,desde os membros da famflia de orienta<;:ao ate os subsequentes parcelrosfamiliares, filhos, amigos, colegas e conhecidos. Novas esferas de intin:i~adecom algumas dessas pessoas tornam-se elementos cruciais dos referenCials deconfian<;:a desenvolvidos pelo indivfduo. Mas devem ser mobilizados peloordenamento reflexivo da vida como urn fenomeno isolado e internamentereferido.

d "I" b d xperien-4 A vida passa a ser estruturada em torno e Imlares a ertos e e ,. " , ' I' dO' ' ' I' ma referenclaCia, e nao mals de passagens ntua Iza as. propno ntua e u "

, " d I' 'd t' 'dades ntualSexterna e mUltos observadores p apontaram 0 ec InIO as a IVI ,em rela<;:aoas principais transi<;:oesda vida - nascimento, adolescenCla, casa-

I' A' d 'I t OCI'ai'smodern os,mento e morte. Are atlva ausenCla 0 ntua nos contex os s , d" ' ' I" ra a capaCida ealguem sugenu, remove uma Importante escora PSICOoglca pa

que 0 indivfduo tern de enfrentar essas transi<;:oes.Seja esse ou nao 0 caso -k', ' 'f d b t om Malinows 1pOlS,afinal, Radcliffe-Brown sugenu, em seu amoso e a e c , " I

" d' d d de a!Ivla- asobre a questao que 0 ntual multas vezes pro uz anSle a e em vez ,, 'd'" equenClas

_ 0 que e importante para a nossa dlscussao IZ respelto as cons _, " , f d ' - d a tornar

para a tomada de decisao do IndlVlduo, Cada ase e transl<;:aoten e, ' d' 'd b disso porse uma crise de identidade - e mUltas vezes 0 In IVl uo sa e

reflexao.4 A vida de fa~oe constru~da em termos da necessidade antecipada deenfrentar e resolver tals fases de cnse, pelo menos onde a consciencia reflexivado indivfduo for altamente desenvolvida.

Falar da vida como internamente referida nao e 0 mesmo que argumentar apartir das premissas do individualismo metodol6gico. A ideia de urn "indivf-duo auto-suficiente" certamente surgiu de modo substancial como uma res-posta as institui<;:oesda modernidade que come<;:avama se desenvolver. Mas talposi<;:aometodol6gica nao faz parte da analise elaborada neste livro. Nem sesegue, do que foi dito acima, que 0 indivfduo fique separado dos contextosmais amplos dos eventos sociais. Ate certo ponto, eo contrario: 0 eu estabeleceuma trajet6ria que s6 pode tornar-se coerente pelo usa reflexivo do ambientesocial mais amplo. 0 fmpeto para 0 controle, engatado a reflexividade, lan<;:ao eu no mundo externo de uma maneira que nao tern paralelo claro emtempos anteriores, Os mecanismos de desencaixe invadem 0 cora<;:aoda auto-identidade; mas nao "esvaziam" 0 eu: simplesmente removem apoios anterio-res em que se fundava a auto-identidade. Melhor: permitem (em prindpio)que 0 eu alcance maior domfnio sobre as rela<;:oese contextos sociais incorpo-rados reflexivamente na forja da auto-identidade do que era previamentepossfve!.

A orienta<;:aoda modernidade para 0 controle em rela<;:aoa reprodu<;:ao sociale,~ a~to-identidade tern certas consequencias caracterfsticas ao nfvel da expe-nenCia moral. Referir-me-ei a essas consequencias genericamente como segre-?a<;:aoda experiencia. 0 fenomeno esti diretamente ligado com 0 caraterJnternamente referido da vida social e do eu. Com 0 amadurecimento damodernidade, os sistemas abstratos desempenham urn papel cada vez maisabrangent d - d " d 'd d'" "P b "e na coo ena<;:ao os vanos contextos a VI a lana. ertur a<;:oesexternas a tais sistemas reflexivamente organizados saDminimizadas.d' Podemos descobrir a origem desses desenvolvimentos por referencia adIVersosconjuntos de influencias, estabelecidas durante a fase de decolagemo ,perfodo moderno, mas que tornam-se cada vez mais acentuadas com a

radlcalizar- I b I' - d ' " d A" d, ,ao e ago a Iza<;:ao as InstltUl<;:oesmo ernas, pnmelra, e e certamanelra mal' . , - d d d'" ds Importante, e a extensao 0 po er a mlnlstratlvo provoca aP~I~acelera<;:aodos processos de vigilancia,5 A expansao das capacidades deVlgtlancia 1. 0 ' , I'd I d "d d ' I ' , ,A '. c pnnclpa mew e contra e a ativi a e socia por mews socials.

Vlgtlancia faz surgirem particulares assimetrias de poder, e consolida em

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graus variados a dominac:;:aode certos grupos ou classes sobre outros. Mas e U!l1

erro concentrar-se demais nesse aspecto. Muito mais importante e a intensifi_cac:;:aodo controle administrativo mais geral, urn fenomeno nao inteiramenteconduzido por alguem em particular porque afeta as atividades de todos. Avigilancia sempre opera em conjunto com a reflexividade institucional, mes-mo em sistemas pre-modernos. Ela e condic:;:aoda reflexividade institucional eao mesmo tempo, ate certo ponto, seu resultado, expressando assim de umaforma institucional espedfica aquela recursividade caracteristica de toda re-produc:;:aosocial. Entretanto, em sistemas em que a vigilancia e altamentedesenvolvida, as condic:;:6esde reproduc:;:ao social tornam-se cada vez maisautomobilizadas.

De maneira particular sob a forma da codificac:;:aoda informac:;:aoou doconhecimento envolvidos na reproduc:;:aodo sistema, os mecanismos de vigi-lancia separam os sistemas sociais de seus referentes externos ao mesmotempo em que permitem sua extensao para setores cada vez mais amplos doespac:;:o-tempo.Vigilancia mais reflexividade significa "aplainar as diferenc:;:as"de tal forma que 0 comportamento nao integrado num sistema - isto e, quenao faz parte dos mecanismos de reproduc:;:aodo sistema - torna-se alheio eisolado. Quando tais externalidades se reduzem a zero, 0 sistema torna-seinteiramente urn sistema internamente referido. Isso nao quer dizer que taissistemas sejam consensuais ou livres de conflitos; ao conwirio, podem serinternamente contraditorios e assolados por confrontos cronicos. Contudo,esses conflitos saD organizados em termos de prindpios do sistema por seusdiversos potenciais de transformac:;:aoe nao em relac:;:aoa criterios ou deman-das externas.

Na pratica ha muitos conflitos provocados pela tensao entre a reproduc:;:aode sistemas reflexivos e a inercia do habito ou as externalidades da tradic:;:ao.0caso da tradic:;:aoe complicado, de qualquer maneira, porque os apelos aosslmbolos ou praticas tradicionais podem ser reflexivamente organizados, fa-zendo parte do conjunto internamente referido de relac:;:6essociais em ~ez de

I d d· - d ". d " blentesopor-se a e e. A quesrao e se a tra Ic:;:aopo e ser remventa a em amI'd" . d d'da nessesque tornaram-se comp etamente pos-tra IClOnalS eve ser enten I

termos. A observac:;:aose aplica nao so as conex6es humanas envolvidas emrelac:;:6essociais mas tambem aos artefatos materiais. Assim, nos debates co~-tempotaneos em arquitetura sobre 0 pos-modernismo e a volta do romantlS-

" d . " tentammo, a questao-chave e saber se as reac:;:6escontra 0 mo erntsmo suselementos dos modos tradicionais extrlnsecos, ou se alternativamente ficaram. . I 'd ., L'd S te ultimoIntelramente envo VI os num sistema Internamente reien o. e esfor 0 caso, as tentativas de reviver os estilos tradicionais provavelmente dege-nerarao rapidamente no kitsch.

A segregas:ao da experiencia / IId

L _... I' \ I 141 [5f.A segun a tranSlOrmac:;:aomstituclOna Importante que afeta a refe-

encialidade interna e ~<ienam~nto dos_dQJ:!lI' publico e privado. Esse~en6meno pode ser parcial mente entendido em termos da criac:;:aode esferas aOCle ade civil que nao existiam em sistemas pre-modernos. 0 estabelecimen-socia"soci~de civil se liga diretamente com 0 surgimento da forma modern a~o Estado, sendo assim referencialmente ligado a ele. Nos Estados tradicio-nais, a maior parte da vida do dia-a-dia, pelo menos nas areas rurais, estavafora do alcance do poder administrativo do Estado. A comunidade local eraem grande parte autonoma em termos de suas tradic:;:6ese modos de vida, e amaioria das formas de atividade pessoal ficavam completamente intocadaspelo aparato administrativo. Mas essa area externa nao era a sociedade civil.Representava em vez disso a persistencia de modos de vida extrlnsecos a ordemreflexiva do centro politico.

Nas formas sociais modernas, 0 Estado e a sociedade civil se desenvolvemem ~~mo processos interligados de transformac:;:ao.A condic:;:aoparaisso e paradox;Im:~nte a capacidade que 0 Estado tern de influenciar muitosaspectos do comportamento diario. A soci~~ civil e estruturada como 0

"outro lado" da penetrac:;:aodo Estado na vida diaria. Tanto 0 Estado como asociedade, em uma palavra, saD internamente referidos dentro dos sistemasreflexivos estabelecidos pela modernidade. 0 que vale para a distinc:;:aoEsta-do/sociedade civil tambem vale para a distinc:;:aopublico/privado. A esfera doprivado se op6e a do publico em do is sentidos, ambos fortemente influencia-dos, se nao inteiramente provocados, pelas mudanc:;:asassociadas ao desenvol-vimento da modernidade. A diferenciac:;:aode Estado e sociedade civil marcauma dessas oposic:;:6es.0 domlnio publico e 0 do Estado, enquanto que 0

privado e 0--9.ueresiste a mvasao das atividades de vigilancia do Estado. Comode e 0 guardiao da lei, 0 privado nesse sentido e em parte uma questao dedefinic:;:aolegal. Nao e simplesmente 0 que fica de fora da competencia do~stado, tendo em vista que ele tambem ajuda a definir os direitos e prerroga-tlVasprivados de manei.ra positiva.. . cle.l, 1.Q c. (. ) I' r ~ ) •• I( -¥

Num segundo sentldo, a 0poslc:;:aopnvado/publtco separa 0 que e mantl-do oculto dos outros daquilo que Ihes e abertamente revel ado. Outra vez seria~m equlvoco interpretar 0 aumento da privacidade (e a necessidade da intimi-ade) em termos da erosao de uma esfera publica que costumava existir em

~om~l2!dades mais tradicionais. Tal sugestao esta contida nas primeiras obras. Richard Sennett. ')Ele observa que as palavras "publico" e "privado" saD

Cttac:;:oesdo periodo moderno. "Publico" se origina num sentido emergente de~ropriedade e de bens possuldos em comum e "privado" vem dos privilegiosOs estratos dominantes. No seculo XVIII, os termos vieram a adquirir 0

sentido que rem hoje. "Publico" passou a ser idenrificado com 0 eleitorado-

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no sentido de "0 publico" - e com areas da vida abertas aos olhos de todos Oucom 0 domfnio do bem com urn. A esfera do "privado" tornou-se a area da

I vida especificamente exclufda do domfnio publico.? Sennett argumenta que afase inicial da modernidade assistiu ao surgimento da ordem publica, centrada

\

na vida cosmopolita das cidades, que mais tarde entrou em decadencia sob 0

impacto de mudan<;:associais subsequentes.I as a tese nao e i!:Iteiramente onvince!!!.<:.:0 que Sennett chama de vida

publica faz parte tanto dos ambientes urbanos mais tradicionais como daque-les caracterfsticos da vida social moderna. As cidades pre-modernas ja dispu-nham de uma florescente cultura cosmopolita. Nessas cidades, as pessoas jaencontravam estranhos de maneira regular. Mas a maioria dos encontros~urbanos preservava urn carater colegiado e era dominada por intera<;:6escom'os pares ou parentes. 0 privado ainda nao se tornara urn domfnio inteiramen~te oculto ou separado, como a obra de Elias deixa claro.s publico so sedistin ue i te'ramente do 12ovado quando a sociedade dos estran as se esta-v - ~,....."

• 6elece em ,sentido pleno, isto e, quando a no<;:aode "estranho" perde seus~ntido. Desse momenta em diante, a indiferen<;:acivil, que e 0 mecanismoCleengate da confian<;:apublica generalizada, se diferencia quase completamentedo domfnio privado, e particularmente da esfera das rela<;:6esfntimas.

A privacidade, e as necessidades psicologicas associadas a ela, foi quasecertamente condicionada por uma separa<;:ao adicional, a da infancia emrela<;:aoa vida adulta. Nos tempos pre-modernos, certam'ente na Europa e semduvida tambem na maioria das outras culturas nao modernas, a crian<;:adesdemuito cedo vivia num ambiente coletivo em intera<;:aocom os adultos emlugares domesticos assim como em outros lugares. 0 surgimento de umaprovfncia separada para a "infancia" demarca a experiencia de crescer emrela<;:aoa outras arenas de atividade. A infancia passa a ser oculta e domestica-da, e tambem sujeita a influencia principal da escolaridade formal. Como ainfancia e separada das atividades dos adultos, ou pelo menos moldada demaneiras distintas, ela constitui uma area de oculta<;:aodentro da qual saoestruturadas as experiencias privadas. A educa<;:aoe num certo sentido umaatividade publica, pois funciona fora de casa. Mas permanece para os alunosurn ambiente segregado distinto do mundo adulto do trabalho e de outrOS

envolvimentos. A oculta<;:aogradual de varios atributos do desenvolvimento,inclusive aspectos importantes da sexualidade, eo resultado desses processosde segrega<;:ao.9Esse e urn fator importante que explica as rela<;:6esproximasentre 0 surgimento da terapia e 0 foco no aprendizado infantil em rela<;:aoaOsobjetivos terapeuticos. A infancia como esfera separada torna-se uma "infra-estrutura" da personalidade. Isso nao implica aceitar a equa<;:aoda modernida-de com 0 aumento da repressao psicologica, visao que nao esra de acordo com

a posi<;:aom~n~~da~e~te livr,o.Ao contrario',a reconstru<;:ao terapeutica sobre a 1/base da expenencla mfannl torna-se posslvel por causa do surgimento denOVOS"campos de aprendizado" derivados da "inven<;:ao"da infancia.

Nos dois sentidos distinguidos acima - a privacidade como 0 "outrolado" da penetra<;:ao do Estado e a privacidade como 0 que pode nao serrevelado - ~_ e uma cria<;:aodo publico! e vice-versa; cada urn fazparte de sistemas emergentes de referencialidade interna. Essas mudan<;:assaoparte fundamental do quadro geral da transforma<;:ao da intimidade.

Terceiro, uma con sequencia psicologica dos dois amplos processos descri-toS e a crescente redominancia _da vergonha sobre a culpa, em rela<;:aoaauto-identic!.~de: A culpa depende essencialmente de mecanismos extrfnseco~aos sistemas internamente referidos da modernidade. A cuipa tern a conota<;:aode transgressao moral - e a ansiedade que deriva de nao ter sido capaz desatisfazer certas formas de imperativo moral no curso da conduta pessoal. Euma forma de ansiedade que atinge importancia maxima em tipos de socieda-de onde 0 comportamento social e governado segundo preceitos morais esta-belecidos, inclusive os formulados e sancionados pela tradi<;:ao.A vergonhaesta mais direta e extensamente relacionada com a confian<;:abasica do que aculpa, porque a culpa diz respeito a formas espeefficas de comportamento oucogni<;:aoem vez de amea<;:ar0 eu enquanto tal. Diferentemente da culpa, avergonha corroi diretamente a sensa<;:aode seguran<;:atanto no eu como nosmeios sociais circundantes. Quanto mais internamente referida torna-se aauto-identidade, tanto mais a vergonha passa a desempenhar urn papel funda-mental na personalidade adulta. 0 indivfduo nao vive mais em fun<;:aodepreceitos morais extrfnsecos mas atraves da organiza<;:aoreflexiva do eu. Esse eurn ponto importante, pois segue-se dele que a civiliza<;:aomoderna nao sefunda, como pensava Freud, na renuncia ao desejo.

Em suas obras, Freud usa "civiliza<;:ao"num senti do muito amplo - naoesta falando simplesmente da modernidade. 10 Civiliza<;:aoe qualquer forma deorganiza<;:ao social ou cultural que vai alem do mero "primitivo". E umaordem social progressiva, que implica em crescente complexidade da vidasocial. 0 pre<;:opago por essa complexidade, assim como pelas "mais altasrealiza<;:6esculturais" que a vida civilizada torna possfveis, e a crescente repres-~aoe, portanto, a culpa. A civiliza<;:aodeve supor a priva<;:aocorporal porque oslmpulsos que de outra maneira levariam a urn investimento erotico desviadoem dire<;:aode estranhos, ou a uma agressividade inaceitavel em rela<;:aoa eles,devem ser mantidos sob controle. A vida civilizada, Freud aceita, e em geralmais segura que a dos "seres primitivos". Tal seguran<;:a, por outro lado, etrocada por severas restri<;:6esa tendencias humanas arraigadas. Desse angulo,ponanto, a civiliza<;:aoe urn empreendimento mais moral que formas anterio-

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res de ordem social que ela suplanta de maneira crescente. A agressividadereprimida pela civilizac;:ao,em conjunto com os impulsos e~~ti~os, sac canali_zados de volta para 0 ego na forma de uma dura consclencla moral. Essesuperego produz urn sentido difuso ~e culpa. A civi.lizac;:a,?e urn for~e supere_go, "como uma guarnic;:ao numa C1dadela conqUistada , andam Juntos. Aculpa, conclui Freud, e "0 problema mais importante no des~n.v?lvimento dacivilizac;:ao";"0 prec;:oque pagamos por nosso avanc;:oem clvlhzac;:aoe uma

d 'd d I" IIperda da felicidade pela intensificac;:ao esse senti 0 e cu pa .Se fizermos a equivalencia entre "civilizac;:ao"e modernidade, e olharmos

para seu periodo inicial de desenvolvimento, tern sentido a conex,ao ~om culpae consciencia. Se a interpretac;:ao que Max Weber faz da assoclac;:aoentre 0

puritanismo e 0 surgimento do capitalismo for correta, podemos ver ummecanismo de formac;:aode consciencia.12 Afinal, 0 capitalista, segundo des-crito por Weber, fornece 0 impeto para 0 surgimento das instituic;:oes moder-nas renunciando as satisfac;:oesque a riqueza acumulada pode trazer. Mas 0

que dizer sobre 0 depois, 0 momenta mesmo da maturac;:ao da,~oderni?a~e?Os seguidores de Freud ha muito tern dificuldad~ em reco~C1har suas ldelascom a aparente permissividade moral da modernldade tardla. Quem .sab.e,acivilizac;:aose partiu sob 0 peso de suas pr6prias demandas, dando aos 1O~I~I-duos a chance de dar vazao a seus desejos? Quem sabe urn periodo de restnc;:aomoral, por alguma razao, foi substituido por uma era de hed~nism~? Ess:sexplicac;:oesnao parecem convincentes. Por que um periodo de 1Otenslficac;:aoe globalizac;:aodas instituic;:oesmodernas produziria urn relaxamento da ~ulpa

'd" I dadese 0 aumento da culpa esta intrinsecamente aSSOCla0 a malOr c?m~ ~~l ~oda civilizac;:ao?Se descartarmos 0 teorema segundo 0 qual malS clvlhzac;:a.significa mais culpa, podemos ver as coisas sob uma luz diferente. 0 mOVI-

. , . , . . d' .die demento caracteristico da moderOidade, no Olvelda expenenCla 10 IVI ua, ..,. I I d . descntoafastamento em relac;:aoa culpa. A conSClenCla mora, ta vez 0 tlpO

. ,. ',' d ' d moder-por Weber, pode ter sido de grande ImportanCla no 100CIO0 peno 0 ,. . ., convertlamno, porque era nessa base que os Imperatlvos morals extnnsecos se

em pacametros intrinsecos de ac;:aosocializada. As crenc;:aspuritanas tornar~m-d . 'mlcosse elementos mobilizadores no descolamento os novos sistemas econo

O ,. dido umdas restric;:oesextrinsecas que os ancoravam. puntaOismo po e ter sdos instrumentos principais numa fase de "decolagem" que se estende para

, ' , ' "d I" rdenamentoalem da propna esfera economlCa - uma eco agem para u~ ~ .internamente referido da sociedade e da natureza cad a vez mals 1Ocluslvo.

, . ..' romover aEntretanto, poder-se-Ia dlzer que 0 puntaOismo, mals que p , ." d' "fi'd" , . pnmelrosbusca de novas Identidades, pro UZIUa IXI ez que permltlU aos

empreendedores explorarem novos modos de comportamento sem rom~ere~com seus habitos e convicc;:oespreestabelecidos. 0 "espectro do puritaOiSmo

ue rondava os sistemas subseqilentes.da modernidade continuou deste pOntod vista como uma Fonte de externahdades para a nova ordem social _ nao:a, como argumentaram Marcuse e muitos outros, sua forc;:aprincipal. Quan-eo mais se rompiam as am arras da tradic;:ao, e surgia no primeiro plano 0

r rojeto reflexi'vo do eu, tanto mais a din arnica da vergonha, por oposic;:aoa da~ulpa, veio a ocupar 0 centro da cena. Naturalmente, mesmo na fase da altamodernidade, os mecanismos da culpa continuam importantes, assim comoper5istem .en~olvi.mentos mor~is - pois, co~o argumentarei ~ais tarde, arepressao 1OstltuclOnal produzlda pelas ordens 10ternamente refendas da mo-dernidade esta muito menos que completa.

A orientac;:ao da modernidade para 0 controle, no contexto dos sistemasinternamente referidos, tern conotac;:6es bem conhecidas ao nivel da cultura eda filosofia. 0 pensamento positivista, de uma forma ou de outra, tornou-seum importante fio condutor na reflexividade da modernidade. 0 positivismoprocura eliminar os julgamentos morais e os criterios esteticos dos processosde transformac;:ao que ajudam a por em movimento e dos quais faz a analise ea interpretac;:ao. Em vez de concentrar-me em caracteristicas do discurso,porem, quero chamar atenc;:aopara seu correlato institucional, que e a acumu-lac;:aode processos que efetivamente limitam as influencias extrinsecas. Proces-50Sde segregac;:aoinstitucional aparecem em varias areas. Em cada caso tern 0

efeito de remover aspectos basicos da experiencia da vida, especial mente crisesmorais, das regularidades da vida cotidiana estabelecidas pelos sistemas abstra-tos da modernidade. 0 termo "segregac;:aoda experiencia" refere-se aqui aprocessos ae ocultac;:ao'que separam as rotinas da vida ordinaria dos seguintesfenomenos: loucura; criminalidade; doenc;:ae morte; sexualidade; e natureza.~m alguns casos, a segregac;:aodepende das caracteristicas mais gerais dosSiStemasinternamente referidos da modernidade. Em term os amplos, 0 argu-mento que desenvolvo e que a seguranc;:a ontol6gica que a modernidadeadquiriu, no nivel das rotinas diarias, depende de uma exclusao institucionale~ relac;:aoa vida social de questoes existenciais fundamentais que apresentamd emas morais centrais para os homens. A fim de localizar e desenvolver essetema, e necessaria cerra quantidade de material hist6rico, Se olharmos breve-mente para as origens das varias arenas de segregac;:ao,poderemos identificar~Iguns dos processos subjacentes a substituic;:ao dos criterios externos pelosInternos na constituic;:ao cIossistemas sociais da modernidade.

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A obra de Rothman, mais que a de Foucault, e relevante para a discussaodo manicomio.13 Embora a pesquisa de Rothman se concentre no surgimentodos hospitais mentais nos Estados Unidos, a analise e aplicavel em geral. Adiscussao que Foucault faz do manicomio e da prisao relaciona 0 encarcera_mento ao impulso de estabelecer a domina<;:ao da razao burguesa.14 Aquelesque tentam contestar as afirma<;:6es soberanas da razao devem ser por issoexcluldos da participa<;:ao direta na ordem social. Por sugestiva e importanteque seja, essa posi<;:ao tern grandes fraquezas. Sem entrar em detalhes, pode-sedizer que nao era tanto a "razao" que estava em questao mas 0 desenvolvimen_to da transforma<;:ao reflexiva. 0 que mais tarde seria visto como "insanidade","crime" e "pobreza" era tratado, antes do perfodo moderno, como caracterfs-tica extrfnseca da existencia humana. A loucura, 0 crime e a pobreza ainda naoeram pensados como "problemas sociais". Ate 0 seculo XVIII, a presen<;:a dessascaracterfsticas em indivlduos que mais tarde seriam colocados em uma ououtra dessas categorias nao era vista como indicador de fracasso pessoal ou dacomunidade.

As atitudes em rela<;:ao a pobreza sao reveladoras. 0 uso do termo "pobre"no come<;:o do seculo XVIII abrangia uma variedade de condi<;:6es sociais. Asdiscuss6es e a legisla<;:ao sobre os pobres inclulam viuvas, 6rfaos, doentes,velhos, deficientes e insanos sem fazer clara diferencia<;:ao entre eles. A neces-sidade moralmente definida, em vez das circunsrancias especiais que a pro-duziam, era a caracterfstica identificadora. Uma lei de Massachusetts, quevirou modelo para outros Estados norte-americanos, dizia que a pobrezaocorre "quando acontece que qualquer pessoa care<;:anaturalmente de en ten-dimento, de modo a ser incapaz de sustentar-se".15 Essa atitude ja era umamudan<;:a de perfodos anteriores na Europa. Pois a pobreza nesse estagiocome<;:ava a ser pensada como algo que precisava de aten<;:ao da comunidade,nao sendo mais inteiramente uma caracterfstica extrfnseca das circunsranciasda vida social.

Ate que ponto essas atitudes ainda se ligavam a considera<;:6es extrlnSecas,contudo, e demonstrado pelo tratamento da criminalidade - ou mais acura-damente, a vagabundagem - nos Estados Unidos do seculo XVIII. A vaga-bundagem, como a pobreza em term os mais gerais, era vista como amplamen-te endemica. Estava cercada por urn conjunto indeterminado de transgress6esmorais, a que se ligava.

Os colonos consideravam desviante uma ampla gama de comportamentoS, des-cobrindo as implicac;:6es mais graves mesmo nas menores of ens as. Sua exteOos3

• Sdefinic;:ao era em geral de origem religiosa, identificando pecado e erllne.. ecodigos penais puniam of ens as religiosas, como idolatria, blasfemia e bruxarJ3,

os c1erigos dec1aravam que as inti -c rac;:oes contra pessoas e . d

orensas a Deus. Misturando livre d . propne ades eram. I'" mente as uas categonas os 1

vlam uma Ista !ncnve!mente long d "d d . : co onos proscre-d a e atlVI a es. A Identlficar- d d

com 0 peca 0 tornava difIcil para I . I d . . )"ao a esordemos egIs a ores e mlOlstros d" .

samente entre infraC;:6es maiores e A d IstIngulr cuidado-_ rnenores. s uas testernunh d

c;:aonatural do hornern e 0 poder d d A' '. avarn a eprava-d . 0 emomo - SInalS seguros d c

se estlnava a ser uma ameara pub!" d d 6 e que 0 orensor)" Ica e urn ana 0 pecador.1

A ideia de urn corretivo secular s6 surgl'u d'gra atJvamente e deve d'dcomo parte de processos mais amplos l' ser enten I a

pe os quaIs os mundos soci 1 1passaram a ser vistos como transfor ,. _ a e natura1

. 1" mavelS e nao meramente dado 0"e socIa portanto nao era prima . . s. COntro-

. namente urn melO de 1 fcpreexIstentes de comportamento d' 0 " Contro ar ormas

1 . esvlante. desvio" era de. dpe os Imperativos derivados da t fc _ d e lato cna 0

rans orma<;:ao as condi - 1oferecidas em condi<;:6es maneJ'a . A _ <;:oesnatura mente

vels. segrega<;:ao dos louc d '.se acelerou quando essas cate ' fc os e os cnmlnosos

d gonas oram separadas da p b 1quan 0 se passou a acreditar que tod 1 '. 0 reza em gera, e1 as e as eram Intnnsec da tera<;:ao. Construir urn ambo . 1 amente capazes e

. lente especla para os d' fc .mews de integrar 0 tratame t' eSVlantes ornecla os

n 0 corretlvo com a - dregular sobre os ambientes da v'd d'" did manuten<;:ao e controle

. ,. I a lana 0 a 0 de fora.A Idela de que os homens podem ser sub 'd

sariamente envolvida _ d metJ os a corre<;:ao estava neces-com a no<;:ao e que a p' "d . 1

mudan<;:a radical 0 '. fc ropna VI a SOcIa esta aberta a. s pnmeJros re ormadores d . -

muitos soci610gos profissionais _ r as pnsoes - como, mais tarde,levavam ao co . . p ocuravam mostrar que as condi<;:6es que

mportamento cnmJnoso deriv d 'd .pessoas em comu 'd d fc avam as VI as mlseraveis que as

nl a es menos a ortunad b' dessas condir6 d' as eram 0 nga as a levar. Mudard T es po la ao mesmo tempo . d 1

aque1es qu aJU ar a a terar 0 comportamentoe amea<;:avam as propried d d .

social", com C"," a es omJnantes. "Os vlcios da vidad.< 0 um runclOnano dlzla de u " .

ccada de 1840 ". m pnslOneJro na Pennsylvania naA ' anunCiavam a rulna de su fc dexistencia d ' a ortuna e e suas esperanras." 17h 0 cnme apontava nao I' T

umana mas . .' para e ementos Intrataveis da natureza, ' para a IncapaCidade de a 'd d d

crlar uma cidad . , comuO! a e esempenhar sua tarefa deP , anla responsavel Urn . d d

fIada livraria 0 . , . a socle a e organizada de maneira apro-r d s cnmJnosos potenciai d -e uziria as situa<;:6es ue I ~.a tenta<;:ao ao mesmo tempo em queo {m g evassem a atJvldade criminosa.

ali peto que levou ao estabe1eci d . _ . .O1entado por consl'd _ . mento as pnsoes era ongJnalmente

n era<;:oesmora Ad' . !'~ prisao deveriam cIS. ISCIP Ina e a arregimenta<;:ao da vida

Crl . ser uma IOrma de ed - 1t ~Inoso da depravas:ao d u~as:ao .mora gue, removendo 0enclaria se tornaria urn lab: seu, e~t~rno, ten~ efeltos reabilitadores. A peni-

ratono e aperfels:oarnento social. As rotinas da

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vida na prisao, entretanto, imitavam de forma exagerada aquelas estabeleci_das nos ambientes sociais da modernidade como urn todo. A prisao assimtornou-SC urn laborat6rio no mesmo sentido em que todos os demais Con_textos da modernidade 0 saD - urn ambiente em que a organiza<;:ao e amudan<;:a social saD reflexivamente construldas, tanto como pano de fundopara a vida individual quanto como meio para a reconstitui<;:ao da identidadeindividual.

ambiente que corrigiria metodicamente as deficiencias da comunidade socialmais ampla. Outra vez era claramente aparente a dimensao moral da reformada personalidade afligida. Como na prisao, a maximiza<;:aoda vigilancia, emconj~nto com 0 es~abele,cimento de rotinas regulares, eram os meios paraatingIr esses fins. A msamdade, como a loucura, era ativamente definida emtermoS de incapacidade social- a incapacidade, ou falta de vontade, de vivero tipo de vida requerida no mundo exterior.

o que e not.ave! sobre 0 manicomio, em comum com a prisao, e tudo 0

que ele compartJlha com os ambientes sociais mais amplos da modernidade.Foucault esta errado em atribuir essa semelhan<;:a a disciplina como tal; 0

confisco de .varios tipos de direitos sociais e pessoais daque!es encarcerados afor<;:anas pnsoes e nos manicomios e certamente central para seu carater. Maso que eles tern em comum com os quadros mais amplos da modernidade e atentativa de de~env.olver 0 autocontrole reflexivo mesmo entre minorias quepodem parecer mtnnsecamente recalcitrantes. 0 componente moral nos doiscasos logo cedeu a primazia a outros imperativos, 0 que contava como "cura"perdeu a maioria de suas caracteristicas extrinsecas, passando a ser medidopela capacidade e pela vontade da pessoa de funcionar de maneira satisfat6riano ambient~ social mais amplo. Em outros aspectos, a simples cust6dia virouo tra<;:odommant.e: 0 drc~re serve pelo menos para proteger aqueles que estaon~ m~ndo extenor das Irregularidades inalteraveis no comportamento damInona.

o "desvio" passou a ser "inventado" como parte dos sistemas internamen-t: referidos da modernidade. As questoes extrlnsecas e aque!as que a crimina-IIdade e a insanidade poem para a popula<;:ao em geral saD assim minuciosa-men~e reprimidas. Mas trata-se de uma repressao institucional e nao pessoal-=- nao supoe uma intensifica<;:aoda "consciencia". E uma exclusao de ques-toes, valores e modos de comportamento potencialmente perturbadores dasarenas centrais da vida social. As questoes assim reprimidas saDclaramente denatureza moral e 't . IE·" eXISenCia. m comportamentos agora classIficados comodoenra ment I" I' - I ', .'" a , por exemp 0, VIsoes a ternatIvas do que passa por realidade

C~tI~Iana sao afastadas das preocupa<;:oes da vida diaria. Estabelecido 0 mani-COmlOpoucas '., pessoas en tram em contato com 0 Insano de maneIra regular.As conexoes que alg I' "b" 'd' ,. uma vez Igaram a po reza no senti 0 antigo a preceltosmorals e tradiroes extrI'n ' " 'A '- 'A •. .,. secos se tornam mVIsIveIs. s pnsoes e os manIcomlOSrapIdament d ' df: ' e per em a malOr parte aquela qualidade ex6tica que desde cedoaZIam delas t' I d' ,espe acu os para 0 mun 0 exterIor. Em vez dISSO,tornam-se

ambientes d -" . de corre<;:aotecmca, OrIenta os para as rela<;:oestransformadoras damodernidade.

A hist6ria do manicomio envolve tendencias de desenvolvimento semelhan-tes. Como a criminalidade, a loucura era considerada em epocas anteriores urnresultado da vontade de Deus, os loucos sendo urn grupo entre outros que eradigno de receber algum cuidado da comunidade. A imagem de Pinel remo-vendo as correntes do louco pode ser tida como representativa do impulso damodernidade como urn todo, Na verdade, a imagem de Prometeu libertado,que tanto inspirava Marx, e urn retrato da liberta<;:aodas algemas da tradi<;:aoedo costume que reaparecera muitas vezes a partir do Iluminismo em diante. Ainsanidade passou a ter urn horizonte "aberto" em comum com todos osdemais aspectos do comportamento e da rela<;:aosocial estabelecidos. A medi-caliza<;:aoda insanidade como "doen<;:amental" e apenas parte desse fenome-no. A insanidade era l,lma doen<;:aflsica, mas acreditava-se que a maioria dasformas de insanidade derivava de circunsrancias sociais, e 0 controle do com-portamento certamente era urn dos principais meios de produzir supostascuras. De fato, muitos dos primeiros psiquiatras ligavam as origens etiologicasda doen<;:amental a fatores sociais, inclusive a pr6pria "civiliza<;:ao".

De grande importancia, contudo, foi 0 aparecimento da ideia de que. adoen<;:amental, como a criminalidade, sob circunsrancias espedficas, pod~aafetar qualquer urn na popula<;:ao.Depois de ser considerada uma caracterlstI-ca especial, embora nao claramente distingulvel, da pobreza, e portanto con-centrada em torno dos grupos menos favorecidos, a doen<;:amental passou_aser vista como urn dos riscos que a vida moderna acarretava. "A insanidade naoe peculiar a qualquer estado na vida. Nao ha ninguem tao alto que esteja alem

r dade seu alcance ... ela destronou 0 monarca, e aprofundou a melanco Iachoupana."I8

o prop6sito inicial dos manicomios era a cura. 0 encarceramento pretewdia restaurar a saude mental pelo pr6prio ambiente, e nao s6 pelos remedios etratamentos nele administrados. Supunha-se que 0 manicomio criasse urn

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A segrega~ao da doen~a e da morte

O h' h mos hospital so gradativamente se diferenciou das organi_que 0Je c ama 'd " b "

zac;:oesmais antigas que tentavam lidar com 0 Imp~c:o ,a po rez~ . Os"h .." coram os antecessores das prisoes e manlcomlOS, e tambem dasospltalS que [I I d

, ~ edicas modernas misturavam exatamente aque a gama e pes-orgal11zac;:oesm , 'd C

soas mencionadas nos paragrafos anteriores. 0 surglme~to ble umaf,e:rer:d d to medico focado em pessoas com pro emas ISICOSsepara a e tratamen, , . _

d" 'te dos mesmfssimos processos que cnaram outras orgal11zac;:oesIst111toS,e parcarcerarias. " .

O d I· t do hospl'tal em seu sentido moderno esta 1l1tlmamen-esenvo Vlmen 0 ,te ligado a profissionalizac;:ao da medicina. 0 hospital e urn amblen~e onde a

I· 'd' de ser concentrada e 0 saber medico desenvolvldo. E notecno ogla me lca po ., 'I dentanto, como os manicomios e prisoes, 0 hospital tam~e~ e urn u?~r on eaqueles que foram desqualificados da p~rticipac;:ao nas atJVldades SOCIalSorto-doxas saGsegregados, e tern conseqiienClas semelh~~tes, em term os da oculta-c;:aoda visao geral, as de outras experiencias ~ruclals -, a doenc;:ae a morte.Como dissemos no capftulo anterior, nas sOCledades pre-modernas a doenc;:acronica era parte da vida de muitas pessoas e 0 contato com a m~rte era umacaractedstica quase de lugar-comum da experiencia de todos. ~lt~s obser:~~que a obra de Aries sobre 0 tema provavelmente apresenta uma Vlsaourn tadistorcida da morte no mundo pre-moderno. Aries diz que, como a morteainda nao tinha sido escondida, as pessoas podiam encontrar seu fim de umamaneira serena, cercadas por seus entes queridos. Com~ diz Elias, atres~~~:dos outros em torno do leito de morte nao era necess~name~te con orta elos_ de fato as vezes os moribundos eram escarneCldos e 1l1sultados P 'd

' d d b orte possa ter Sl 0sobreviventes.19 Qualquer que seja a ver a e, e em ora a m A

" ~ ~ m fenomeno acercada por medos e ansiedades essenClalS, nao era entao u

ocultar. . ., I a vista,A questao nao e so que, hoje, a morte seja rot1l1elramente. ocu~tad' da

- " determ1l1arao elxaAlem disso, a morte tornou-se uma questao teCl11ca,sua _T de decidirnas maos da profissao medica; 0 que a morte e torna-se uma questao 'd ernem que momenta uma pessoa deve ser tratada como tendo mor.n 0, er

, , d f - . A morte cont1l1ua a srelac;:aoa cessac;:aode vanos tlpOS e unc;:oescorporals, 'd antO, d' A • h 'ao pode ser traZI a enquo grande fator extnnseco a eXlstencla umana, n 'd d Mas" f, idos da modern 1 a e.tal para dentro dos sistemas Internamente re er _ I .dos

. I' t e os que estao envo VItodos os tipos de aconteClmentos que evam a mor e urnd " rados A morte torna-seno processo de morrer po em ser aSSlm 1l1corpo. olem que 0 contrponto zero - e nem mais nem menos ~u~ 0 mon:ento e

humano sobre a existencia encontra urn lrmlte extenor.

A hlstoria da pena de morte serve para testemunhar 0 impulso de conver-" " C F Icer a morte num puro evento. omo mostraram oucau t e outros, em

arnbiences pre-modernos a pena de morte, muitas vezes combinada comoutras maneiras de infligir dor ao corpo, era freqiientemente urn espetaculocoletivo. Com 0 aparecimento da prisao, a punic;:ao "desaparece de vista" eassume a forma disciplinar. 0 que Foucault nao investiga, embora seja consis-tente com sua analise, saGas mudanps que afetam a pena de morte dentro daprisao. Formas publicas de execuc;:aomuitas vezes nao so eram dolorosas, mascambem ruidosas e prolongadas. Todo 0 peso do desenvolvimento posterior sedirigiu a reduzir a execuc;:aoa urn processo tao "silencioso" quanto possivel. 20

Na Inglacerra, por exemplo, tomou-se grande cuidado para assegurar que 0condenado passasse sua ultima noite numa cela muito proxima do lugar daexecuc;:ao,de modo a minimizar a durac;:aodo evento final. Vma sucessao demodificac;:oestecnicas, projetadas para tornar 0 aparato da execuc;:aoeficientee silencioso, foi introduzida. A morte deveria ser, em outras palavras, instanra-nea e discreta. Desde entao, a pena de morte foi abolida em muitos paises -reforma feita por motivos humanirarios, mas que tambem reconhece que aexecuc;:aofinalmente coloca 0 individuo alem da possibilidade de controlesocial.

A remoc;:aoda sexualidade para os bastidores e urn fenomeno da privatizac;:aoda paixao. "Paixao" foi alguma vez urn termo que se referia ao extase e adevoc;:aodo religioso. Referia-se precisamente aqueles momentos em que 0

individuo se senti a em contato com forc;:ascosmicas, num estado alem daexperiencia cotidiana. A noc;:aode paixao perdeu mais tarde essa conotac;:aoquase inteiramente, tomando-se secularizada e confinada principalmente aesfera sexual. Isso faz parte da transic;:ao por meio da qual a "sexualidade"Surgiu como fenomeno distinto, separada do erotismo mais geral e difuso queera freqiientemente ligado a estetica e a experiencias de natureza nao social i-Zada.21

Nao ha cultura conhecida em que 0 sexo tenha se realizado de maneiracompletamente aberta aos olhos de todo mundo. Mas ha evidencia suficienteque indica que, em muitas culturas nao-modernas, assim como na EuropaPre-modema, a atividade sexual nao era mantida estritamente oculta dosolhos dos outros. Em parte, tal visibilidade era inevid.vel: nos grupos socioe-conomicos mais baixos era pd.tica normal que pais e filhos dormissem no

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, d muitas vezes J'unto com outroS parentes. A atividade sexualmesmo como 0, ., .

Ie da resl'dencia tambem parece ter sldo uma ocorrencia comumeventua rora .'A privatizac:;:ao da sexualidade tamben:,po~e ser conslderada como ~ecor-

rente do surgimento de uma nova consclenCia. moral. Se?undo essa Vlsao, asexualidade tornou-se cada vez mais sujeita a antudes pudlcas q~e a condena_yam como licenciosidade. Foucault ajudou a m~s.trar como essa tnterpretac:;:aoe equivocada. Como ele diz, ela sugere uma estona segundo a qual

a sexualidade foi cuidadosamente confinada: veio para dentro do lar. A familiaconjugal a tomou sob sua custodia e a absorveu n~ ~eria funerao de rep~oduerao.Na questao do sexo, 0 silencio virou regra ... Urn un~co lugar da sexualidade foi

h'd sparo social assim como no coraerao de cada lar, mas era urnrecon eCI 0 no e.,. '. . , . .lugar util e ferril: 0 quarto de dormlr dos pais. 0 resto so nnha de con~m~ar vago;

iada evitava contato com outros corpos, e a decencla verbala postura aproprsaneava as falas.22

distinc;:ao entre .0 ~ra~er e a procriac:;:ao. Quando as novas conexoes entre asexualidade e a 10nmldade se formaram, contudo, a sexualidade foi separada

uito mais completamente da procriac:;:ao do que antes. A sexualidade tornou-: duplamente constituida, como meio de auto-realizac:;:ao e como meio prin-~ipal e expressao da .i~timi~a~e. A ~exualidade perde~ assim suas conexoesexuinsecas com tradlc:;:oes e enca mals amplas, e tambem com a sucessao dasgerac;:oes.A sexualidade continua, ou me/hor torna-se, urn foco central para a"experiencia", e a palavra "experiencia" assume urn significado particular emrelac;:aoa vida sexual. Mas essa "experiencia" tem pouco a ver com os dominiosexistenciais com os quais 0 sexo em certo sentido nos poe em contato.

N. - que em termos amplos e compadvel com a de Freud, aessa 1Oterpretac:;:ao, _ -'privatizac:;:ao da sexualidade e uma questao de repressao - a repr:ssa~ que e_0

prec:;:oque devemos pagar pe/os frutos da civilizac:;:ao. Foucault nao so se opoe

h de "hipotese repressiva" como a contrasta com outra queao que c ama rd d enasublinha a proliferac:;:ao de discursos que trazem a sexua I a e para a ar

Publica recentemente constituida. - r d de torna-seMas a tese de Foucault de que a preocupac:;:ao com a sexua I a .

.' d d nao parece malSobsessiva e mais ou menos dlfundlda no mun 0 mo erno . . p d os

II d m parte subsntulr. 0 em

convincente do que aque a que e a preten e e . . A" xualida-. 'd h" d egUinte manelra. seformular uma alternanva as uas Ipoteses a s I "foi

d tamento sexuade" no sentido moderno foi inventada quan 0 0 compo~ . prie-

." d' sexualtdade vlrou proP

ara tras dos basndores . Desse ponto em lante, a . . mO em. d OIS 0 erotlS

dade do individuo, e mais espeCificamente 0 corpo, p binac;:ao. b . ,d por uma com

conJ' unto com a culpa era progresslvamente su sntul 0 Itadio do. -' onha A ocu .,.de sexualidade, auto-idenndade e propensao a verg.. uma re-

_ ultarao PUdlCa como .._comportamento sexual nao era tanto uma oc.,. c de intl1111

. d" t para uma eSlera .constituirao da sexualtdade e seu re IreClOnamen 0 1 am assl111

.,. . f - xua pasS "dade que surgia. 0 desenvolvimento sexual e a satlS ac:;:aose xualidade

. dO" "discursos sobre a se rOa ligar-se ao projeto reflexlvo 0 eu. s vanos d d nvolvimen. plo 0 esede que fala Foucau.lt fa~em parte do espec:ro mals am 1.1'

dos sistemas reflexlvos 10ternamente refendos. " ' digo cornd·' L hmann urn CO I da

A sexualidade tornou-se entao, como ma u .,'. ais amP asc' . d om as eXlgenCiaS m d u(11a

nicativo" mais que urn lenomeno 10tegra 0 c f, . rrac:;:a a. , . h mana 23 No comportamento sexual, sempre 01eXlstenCia u .

Em cad a urn dos aspectos discutidos acima, portanto, podemos perceber urnprocesso de segregac:;:ao moral em expansao. Os principais dominios da vida,inclusive aque/es que superficialmente parecem mais "biologicos" que sociais,passam a sofrer a influencia do duplo impulso da auto-referencialidade e dareflexividade. As questoes existenciais sao institucionalmente reprimidas aomesmo tempo que sao criados novos campos de oportunidades para a ativida-de oocial eo desenvolvimento pessoal. A segregac:;:ao da experiencia e em parteo re~ultado planejado de uma cultura em que se supoe que os dominiosesteuco e moral serao dissolvidos pela expansao do conhecimento tecnico. Decerra forma, porem, e tambem 0 resultado nao intencional dos processosestruturantes endemicos da modernidade, cujos sistemas internamente referi-dos perdem . , . ,o contato com cntenos extnnsecos.

E preciso acrescentar aos processos mencionados ate aqui 0 desenvolvi-men to db' . d V' Ida 0 am lente cna o. lrou ugar-comum afirmar que as visoes centrais

l~odernidade tratam a natureza como instrumental, como 0 meio de

rea Izar os ,. h l"" . ProPOSltos umanos. 0 ocus classicus dessa posirao diz-se e nada••tals d .,., ,modena a men os que 0 pr6prio Marx. 0 suposto critico radical da vida socialdo urna ~~aba por conformar-se a algumas das caracteristicas mais arraigadas

q e CflUca A crl'tl'c' t 'I'd Me' " d . l'mo .' a e cer amente va I a. arx 101 urn cnnco 0 capita IS-, que Via como' . 1 .. 1 d . . d' .mod melO essencla mente IrraClOna e orgaOlzar a 10 ustna

erna' .futuro f: ' m,as via a expansao das forc:;:asprodutivas como a chave para urntos do .avoravel para a humanidade. Hi passagens, particularmente nos escri-Stlas r IJov_emMarx, que sugerem uma visao bem mais sutil da natureza e de•• 6 e ac:;:oesco . - h d'''lane ' . m as asplrac:;:oes umanas. Mas em seu todo 0 argumento e

llli e Instrumental e, em relac:;:ao a isso, esra mais para defensor da linhanante d 'do pensamento OCI ental do que para seu crftico.

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Nao basta, porem, deixar as quest6es como estao. 0 que esd. em discussaonao e so que, com 0 advento da modernidade, os homens tratam a natureZacomo urn conjunto inerte de fon;:as a serem atreladas para os fins humanos,pois isso ainda implica que a natureza e urn domfnio separado do da socieda_de. Como destacado anteriormente, 0 desenvolvimento do ambiente criado- ou, noutra expressao que diz a mesma coisa, a socializa<;:ao da natureza _e muito mais profundo que isso. A natureza come<;:a a "chegar ao fim" nosentido em que 0 mundo natural e ordenado cada vez mais segundo ossistemas internamente reflexivos da modernidade. Nas condi<;:6es da moderni-dade, as pessoas vivem em ambientes artificiais num duplo sentido. Primeiro,por causa da difusao do ambiente construfdo, em que vive a vasta maioria dapopula<;:ao, 0 habitat humano se torna separado da natureza, agora repre-sentada so na forma de "campo" ou "selva". Segundo, num sentido profundo,a natureza deixa literalmente de existir quando eventos que ocorrem natural-mente fazem cada vez mais parte dos sistemas determinados por influenciassocializadas.

No que diz respeito ao primeiro desses fatores, podemos dizer que a vidahumana vai se separando da natureza a medida que se desenvolve em locaiscriados pelo homem. Na cidade, a "natureza" ainda sobrevive como areasverdes cuidadosamente conservadas, mas em sua maior parte essas areas sacartificialmente construfdas - na forma de parques, areas de recrea<;:ao e assimpor diante. Criam-se jardins, cuidam-se de arvores e cultivam-se plantasdomesticas; mas tudo isso e parte do ambiente criado, e so e "natural" namedida em que depende de processos organicos e nao so da manufaturahumana. A cidade modern a e de longe a serie mais extensiva e intensivamenteartificial de cenarios para a atividade dos homens que jamais existiu. Vmavisita ao campo ou uma caminhada no bosque podem satisfazer 0 desejo deestar proximo da "natureza", mas aqui a "natureza" esta coordenada e domes-ticada social mente. A no<;:aode "selva" adquiriu imporrancia durante 0 perf~-do inicial do desenvolvimento social moderno. Alguma vez significou espeCl-ficamente uma area do mundo natural ainda inexplorada pelo Ocidente

moderno, e portanto nao conhecida por ele. As selvas de agora sao em geralareas onde, por uma ou outra razao, 0 cultivo ou a habita<;:ao nao podem semanter efetivamente, ou sac simplesmente areas deixadas a parte especial men-te para propositos de recrea<;:ao.

Num segundo sentido, a natureza e segregada do envolvimento hu~a~ode uma maneira ainda mais fundamental. A natureza esra cada vez mais sUJelta

a interven<;:ao do homem, e assim perde seu proprio carater como fon~leextrfnseca de referenciao A segrega<;:ao da natureza sob esta forma e mais sut! ,e ao mesmo tempo mais difundida do que no sentido anterior. Pois a natureza

- a alternancia dos dias e das estar6e' d .:r s,o lmpacto as condl - l' ,.

ainda parece estar "U"; ambiente ext ", 0 <;:.oesc ImatIcas_o 0 erno necessano as atIVldade h

por malS Instrumentalmente orientad 0 M s umanas,o A . . as que sepm. as essa sensa - '01 '

rIa. 0 tornar-se soclallZada a natu ' 'd I . <;:aoe I uso-, reza e atral a pe a colon - d fipelas arenas parcial mente imprevl'Sl' 0 d' 0 d lZa<;:ao 0 uturo evelS e nsco cna as pel 0 0 ._

dernas em todas as areas sob Sua l'nfl A • as InStItUI<;:oesmo-uenCla.Qual eo impacto da segrega<;:ao da experiencia:> E u

qual me estenderei em outros cap't I ' .' m problema sobre 0I u os, e so preClso de algumas b _

neste ponto. Essa segregarao e a co d' - d b I' 0 serva<;:oes:r n l<;:ao 0 esta e eClment d d

serores de seguran<;:a relativa da vl'd 'dO• 0 e gran es

a cotI lana nas condlr6 d d 'd dSeu efeito, que como vimos dev 'd d :r es a mo ernl a e.

" A 0 e ser consl era 0 em term os a Iuma consequencla nao intencional do d I 0 mp os como, esenvo Vlmento d . . 0_dernas, e reprimir urn Con °unto d 0 as .InStItul<;:oes mo-da vida humana que estaoJp ~ cOdo:ponentes o:orals e eXlstenciais basicos

_'. ' or asslln lzer, espremldos nas mar ensA repressao InstItucional que a se re a - I' g.~:'n~:::~~:~~~Ov~:i:o;i~~is~:~tela ~ao gde~e~a;e ~~~~t:;~~~:~:<;:~~o d~ ~~~::~~

as, a maneIra sugenda po FdA ' 0para repetir os mecanis d . r reu . 0 contrano,identidade, 'substituem :spa ~tverg:nha, .1Jg

lados a na:ureza "aberta" da auto-

O d I. 1 e su stanCla os mecaOlsmos da culpa

esenvo Vlmento de b' I 0 •

d . A' am lentes re atlvamente seguros da vida d'" ,e ImpOrtancla central ar _. lana e

logica. A seguranra on~olo~gal'manuten<;:ao de sentImentos de seguran<;:a onto-:r ca, em outras palavra' d' 0

mente pela propria rotina E boo s, e sustenta a pnnclpal-o . m ora a eXlstenCla di" . d ,. .

mUlto mais controlada e " I 0 ana sep e vanas maneIrasprevlslve nas co d - . .traste com as cult 'd n l<;:oesSocIalS modern as em con-

uras pre-mo ernas 0 quadro d f. A •

ontologica torna-se fragil 0 I' e re erenCIaS da seguran<;:acia das propri . . c~su 0 protetor depende cada vez mais da coeren-

as rotInas, que sac ordenad d d .Grandes areas da vl'd °d' d as entro 0 proJeto reflexivo do eu.

a cotl lana or enad 'd'seguras no senti do de M W'; b d f.as atraves os Sistemas abstratos, saca<;:ao.Mas as '0 ~ e er e 0 erecerem ambientes "calcuUveis" de

propnas rotlnas que fornece Icarecem de signifi dim ta seguran<;:a em sua maioria

Ica 0 mora e tanto pd'Cas "vazias" q I 0 0 em ser expenmentadas como prati-

uanto, a ternatlvamente das rotinas pi' po em parecer esmagadoras. Quando

, or qua quer raza - d' Idecide especificament I 0, sac r~ Ica mente rompidas, ou quando alguemtidade tend e a can~ar mal.or cOntrole reflexivo sobre sua auto-iden-

0' em a oconer cnses eXlsten " U . d' 'dPartlcularmente b d d ClalS. m In IVI uo pode sentir-se

a an ona 0 em m d "mentos os dilem . . .omentos eCISlVOS,porque em tais mo-as moralS e eXlstenclals d' -

COmo se 0 indivfd fi se apresentam e manelra urgente. EJh uo en rentasse 0 retor dIde faltam os ' 0 no 0 reca ca 0, mas provavelmenterecursos pSlqUlcos e soci 0 l"d

apresentadaso alS para I ar com as quest6es assim

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Como no caso dos outros processos de desenvolvimento social moderno,seria equivocado en tender a segrega<;:ao da. experiencia c?mo homog~nea eenvolvendo tudo. Ela e internamente complicada, faz surglrem contradl<;:6es etambem gera possibilidades de reapropria<;:ao. A segrega<;:ao, vale sublinhar,nao e urn fenomeno de uma vez por todas, e nao representa urn conjunro defronteiras sem fric<;:6es. Lugar da repressao, suas caracterfsticas excludentesnormalmente carregam conota<;:6es de diferencia<;:ao hierarquica e desigualda_de. As fronteiras da experiencia segregada estao cheias de tens6es e de for<;:asmal dominadas; ou, metaforicamente, sac campos de batalha, as vezes decarater diretamente social, mas muitas vezes se dao dentro do campo psicolo-gico do eu.

A vida social cotidiana e segregada da:

Loucura: a expressao de tra<;:osde personalidade e comportamento quetocam em experiencias "postas entre parenteses" pelas atitudes ordina-rias da seguran<;:a ontologica.

Criminalidade: a expressao de tra<;:osde personalidade e comportamen-to que podem representar "alternativas" aos cuidados e envolvi~~ntosrotineiros (obviamente nem todas as formas concretas de anvldadecriminosa caem nesta categoria).

Doenra e morte: pontos de cantato entre a vida social e criterios externosrelativos a mortalidade e a finitude.

Sexualidade: erotismo como uma forma de contato entre os indivfduose a conrinuidade das gera<;:6es.

Natureza: 0 ambiente natural como constitufdo independentemente daatividade social humana.

condi<;:6es'sociais pre-modernas. Muitas formas de arte popular sa-o e " I' . " ssenCla _

mente estonas morals em que as narrativas sac engendradas e uma ordemmoral e construfda. ~mente esses mundos de fic<;:aoem parte suplantamas da vida cotidiana. No entanto, pela linguagem e imagens da mfdia, osindivfduos tambem tern acesso a experiencias que, em diversidade e distanciavao muito alem do que poderiam ir na ausencia dessas media<;:6es. As sensibi~lidades existenciais portanto nao sac simplesmente atenuadas e perdidas; ate ")certo .~on.to podem se enriquecer a medida que se abrem novos campos deexpenenCla.

~ e certo que a experiencia atraves da mfdia favorece a segrega<;:ao \em vez de a).t:dar_a.,!upera-Ia. Urn fascfnio com 0 "realismo ficcional", comopor exemp 0 as telenovelas, exprime interesse pelas antigas moralidades davi~~ cotidiana: Mas. tais..Ereocupa<;:6es tendem a confirmar a separa<;:ao daatlVldade do dla-a-dla das externalidades em que alguma vez se encaixaram.Onde os indivfduos sac postos car a a cara com as demandas existenciais _co~o no~ momen~os decisi:os - eles provavelmenre experimentam 0 choquee a Inversao da realidade. A Inversao da realidade, em verdade, po de ser muitasvezes u~a rea<;:aopsicologica funcional que alivia as ansiedades que aparecemnessas sltua<;:6es - urn aparato neutralizador inconsciente.

Sennett: narcisismo e desordens do carciter

d ·A· , dos meiosDevemos tambem consider:ar 0 impacto a expenenCia atraves---- -- d ode ser raro,de comunica<;:ao. 0 contato com a morte e com oen<;:as graves p .

- ... I" d I -, erienCia aua-exceto para os profisslOnals especla Iza os, mas em re a<;:aoa exp'd 'do I 'b A I" d c. - sentar6es docu-yes a mila e e e em comum. Iteratura e I1c<;:aoe apre T

" h" d ' " . IAI "a a sexualidade e amentals estao c elas e matenas que retratam a VIOenc , d" d"" "d d esultado amorte. A familiaridade com os amblentes e rals an VI a es, como r

ampla influencia da mfdia de varios tipos, pode ser de fato maior que naS

As - . d .s~<;:oesantenores elxaram implfcito que 0 autodesenvolvimento na mo-

der01da~e tardia ocorre em condi<;:6es de substancial priva<;:ao moral. Segrega-do "d~ tlpos fundamentais de experiencia que relacionam as tarefas da vidacotldlana e mesmo 1" dld'd .

". ' 0 p anejamento e ongo prazo a VI a, a quest6es eXIs-tenclals 0 pro)" t fl" d' .

, e 0 re eXlvo 0 eu e posto em mOVlmento contra urn pano defundo de empobreci t I N- d "A ., . men 0 mora. ao surpreen e que nessas clrcunstanCias arecem-constltufda esfera das rela<;:6es puras possa vir a suportar urn grandepeso com' d "A" d

. 0 area e expenencla gera ora de urn meio satisfatorio para 0 desen-VO!vlmento d 'd d " d' 'd R

a VI a 0 In IVI uo. epresenta esse fenomeno urn encolhimen-to defensivo da t "d "d d d· d ""au 0-1 enn a e lante e urn mundo extenor recalcltrante?":!guns escritores certamente sugerem isso e, dada a sua influencia, suas posi-S:Oesrequerem minuciosa considera<;:ao.

Na sociedade modern a, 0 eu e fdgil, quebradi<;:o, fraturado, fragmentado- uma tal concepc;:ao e provavelmente a visao predominante nas discuss6es

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em curso sobre 0 eu e a modernidade. Algumas dessas analises estao teorica_mente ligadas ao pos-estruturalismo - assim como 0 mundo social, 0 eutambem torna-se contextualizado e disperso.24 De fato, para autores escreven_do numa linha pos-estruturalista, 0 eu efetivamente deixa de existir - 0 unicosujeito e urn sujeito descentrado, que encontra sua identidade nos fragmentosda linguagem-ou_discurso. Vma visao igualmente influente ~~foca 0 narcisis-mo. Assimf Sennett cliscute 0 surgimento de "desordens narclSlstas do carater"em relac;:ao~a:tese~obre 0 desaparecimento da vida publica. Como as esferasda atividade publica encolhem, e as cidades viram compostos de ruas em vezde lugares para encontros abertos, 0 eu e chamado a assumir tarefas que naopode enfrentar com sucesso.25

.. " .

o narcisismo, diz Sennett, nao deve ser confundldo com a Idela 1elga daauto-admirac;:ao. Enquanto desordem do carater, 0 narcisismo e uma preocu-pac;:aocom 0 eu que impede 0 individuo de estabelecer fronteiras validas entreo eu e os mundos exteriores. 0 narcisismo relaciona os eventos externos asnecessidades e desejos do eu, apenas perguntando "0 que isso significa paramim". 0 narcisismo supoe uma procura constante da auto-identidade, mas euma procura frustrada, porque a busca incansavel de "quem sou" e umaexpressao de absorc;:ao narcisista e nao uma procura realizavel. 0 narcisismo seopoe ao compromisso necessario para sustentar relac;:oes intimas; 0 comp~o-misso coloca restric;:oes as oportunidades, fazendo com que 0 individuo preClseten tar as muitas experiencias em sua busca de auto-realizac;:ao. 0 narcisismotrata 0 corpo como instrumento de satisfac;:ao sensual, em vez de relacionar asensualidade a comunicac;:ao com os outros. Sob 0 impacto do narcisismo, .asrelac;:oes intimas assim como conexoes mais amplas com 0 mund~ ~oClaltendem a ter aspectos inerentemente destrutivos. Os horizontes de atlvldadeda pessoa parecem desolados e sem atrativos a despeito da cronica bu~ca desatisfac;:ao - ou talvez por isso mesmo. Ao mesmo tempo, qualquer sentldo ~edignidade pessoal ou dever dvico tende a evaporar-se. A autenticidade SUbS:l-tui a dignidade - 0 que torna boa uma ac;:aoe que ela e autentica em relac;:aoaos desejos do individuo, e pode ser exibida aos outros como tal.

o fato de que 0 espac;:opublico esta "morto", segundo Sennett, e uma dasrazoes para a difusao do narcisismo, As pessoas procuram na vida pesso~l 0 q~e

1· ....' d sltuac;:aoIhes e negado nas arenas pub leas. As ongens lnStltuclOnalS essad 'd d d" I C - d ma cultu-residem na decadencia a auton a e tra IClOna e na IOrmac;:ao e u

. I' 1 0 . I' , 'd s que temra urbana capita Ista e secu ar. capita Ismo cna consuml ore, ,necessidades diferenciadas (e cultivadas); a secularizac;:ao tern 0 efeito de estrel-

, 'f] d 1" d' d - d -0 A "persona-tar 0 sign! lea 0 mora ate 0 Ime lato a sensac;:ao e a perc,e~c;:a , _lidade" substitui 0 "carater" natural, antiga crenc;:ado Ilumlnlsmo. A persona

" 0 eUlidade diferencia as pessoas, e sugere que 0 comportamento e a pista para

interior; no desenvolvimento da personalidade 0 que faz diferenc;:a na forma-c;:aoda auto-identidade sao os sentimentos, mais que 0 controle racional daac;:ao.A entrada da ideia de personalidade na vida social ajudou a preparar 0

terreno para 0 dominio da ordem intima. Dai em diante, as lac;:ose envolvi-mentoS pessoais recuam e favorecem a preocupac;:ao infindavel e obsessiva coma identidade social.

Hoje, a experiencia impessoal parece sem sentido e a complexidade social umaameac;:aimpossive! de manejar. Por contraste, a experiencia que parece falar sobreo eu, ajudar a defini-lo, desenvolve-lo ou muda-lo, tornou-se uma preocupac;:aoesmagadora, Numa sociedade intima, rados os fenomenos sociais, por maisimpessoais que sejam em estrutura, se convertem em quest6es de personalidadepara alcanc;:arurn significado.26

o tema do narcisismo em relac;:aoao eu moderno foi minuciosamente explo-rado por Christopher Lasch.27 Lasch relaciona 0 fenomeno especificamente anatureza apocaliptica da vida social moderna. Os riscos globais tornaram-seurn aspecto tao conhecido das instituic;:oes modernas que, no nive! do com-portamento diario, ninguem dedica muita atenc;:ao ao problema de comoevitar desastres globais. A maioria das pessoas os afasta de suas vidas e concen-tra suas atividades em "estrategias de sobrevivencia" privatizadas, apagando osriscos maio res dos cenarios. Desistindo da esperanc;:a de que 0 ambiente socialmais amplo possa ser controlado, as pessoas se retiram para preocupac;:oespuramente pessoais: para 0 auto-aperfeic;:oamento psiquico e corporal. Laschrelaciona essa situac;:ao a uma evaporac;:ao da historia, uma perda da continui-dade historica no sentido de urn sentimento de fazer parte de uma sucessao degerac;:oes que se perde no passado e se projeta no futuro. Contra esse pano defundo, as pessoas anseiam por seguranc;:a psfquica e por uma sensac;:ao _sempre fugidia - de bem-estar.

Lasch concorda com Sennett que 0 narcisismo se refere tanto ao auto-odioquanto a auto-admirac;:ao. 0 narcisismo e uma defesa contra a Furia infantil,Uma tentativa de compensa-la com as fantasias onipotentes do eu privilegiado.A personalidade narcisista tern apenas urn vago entendimento das necessida-des dos outros, e os sentimentos de grandiosidade se batem com sentimentosde vazio e de falta de autenticidade. Nao tendo envolvimento pleno com osOutros, 0 narcisista depende de infusoes continuas de admirac;:ao e aprovac;:aopara estimularem urn senti do incerto de automerecimento. 0 narcisista, se-gundo Lasch, esta

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cronicamente entediado, incansavelmente 11 procura de intimidade instantanea_ de excitac;:aoemocional sem envolvimento e dependencia - ° narcisista epromfscuo e muitas vezes pan-sexual, pois a fusao dos im~ulsos pre-ge~it~is eedipianos a servic;:oda agressao encoraja a perversidade polimorfa. As mas lrna-gens que internalizou tambem fazem dele a1guemcro~icamente ~reocupado c~ma saude, e a hipocondria por sua vez the da uma afimdade especIal pela terap1a e

• A' 28por grupos e movlmentos terapeutIcos.

Longe de aliviar tais sin tomas, 0 encontro terapeutico mu.itas vezes apenasajuda a prolonga-los, porque na terapia 0 individuo e encorapdo a tornar-se 0

ponto central da reflexao e dos cuidados.o capitalismo consumidor, com seus esfors:osde padronizar 0 consumo e

formar os gostos pela propaganda, desempenha urn papel basico na difusao donarcisismo. A ideia de criar urn publico educado e perspicaz foi ha muitoderrotada pela difusao do consumismo, numa "sociedade dominada pelasaparencias". 0 consumo interpela as qualidades alienadas da vida social ~~-derna e se apresenta como a solus:ao: promete as coisas mesmas que 0 narc.lsls-ta deseja - charme, beleza e popularidade - atraves do consumo dos tlpOS"certos" de bens e servis:os. Oai que todos n6s, nas condis:oes sociais moder-nas, vivemos como que cercados de espelhos; neles procuramos a apan~ncia deurn eu socialmente valorizado, imaculado.

No nivel das relas:oes pessoais, Lasch concorda, ha uma nova busca ~aintimidade. No entanto, a intimidade torna-se inatingivel em conseqiienCladas mesmas circunsrancias que levam os individuos a ten tar consegui-la. ~incapacidade de interessar-se seriamente par qualquer coisa que n~o ~eJ,aescorar 0 eu faz da busca da intimidade urn empreendimento futil. Os In,dlvl-duos demandam das ligas:oes intimas com os outros uma satisfa?ao e~oclOnalmuito maior do que antes; por outro lado, cultivam urn ~1~tan~lament~necessario a manutens:ao das defesas narcisistas do ego. 0 narclSIsta e le~a.do

. '. 0 tempo reJ Ita 0fazer demandas exceSSlvasaos am antes e amlgos, ao mesm ,"dar-se aos outros" que iss~ impli~a. , . do

A decadencia da familia patnarcal, de fato da familia em geral, segun. d . . Elgar da velhaLasch, esta ligado de perto ao surglmento 0 narclSIsmo. m u. . '0-

"autoridade familiar", e tambem da autoridade dos lfderes e sablOs trad~cl., - . l' - arre Inre-nais, surgiu urn culto da espeClalIzas:ao. Os novos espeCla Isras sao p . "

. . S' " arernall mOgrante da cultura terapeutica do narCISlsmo. urglU urn novo p . d d

., d' d . c: . as necesslda s aem que os especlallstas e to os os tlpOS OllClam para . dd . l' - - denvatn 0populac;:ao leiga. Muitas formas modernas e especla 1zas:aonao

. . . d' em boa pahe OSatendimento a necessldades genumamente expenmenta as, d.. . 'd d c: mam satisfazer. e-novos espeClallstas Inventaram as necessl a es que aur

pendencia dos especialistas torna-se urn modo de vida. E aqui nos reencontra-moS com 0 narcisismo, porque a personalidade narcisista se origina como umadefesa da dependencia infantil. Como nas sociedades modernas a dependen-cia se estende a maioria das areas da vida adulta, 0 narcisismo se intensificacomo reas:ao aos sentimentos de impotencia assim engendrados.

Em escritos posteriores, Lasch elaborou e modificou urn tanto sua posis:aooriginal. 0 tern a da sobrevivencia, num mundo externo invasor e perturb a-dor, foi acentuado. A sobrevivencia, sublinha Lasch, e a preocupac;:ao comumdos individuos na vida do dia-a-dia, e tambem de redes sociais como osmovimentos pela paz e ecol6gicos. Na epoca contempodnea, a sobrevivenciatornou-se uma questao de suprema imporrancia; mas a pr6pria publicidade daquestao, que virou quase urn item de rotina, produz uma resposta letirgica aonivel individual. A dramatizas:ao dos riscos que a humanidade agora enfrentae urn empreendimento necessario, e algumas das pressoes e movimentossociais que ela ajudou a estimular sao nossas melhores esperans:as para 0

futuro; mas a conversa continua sobre 0 apocalipse cria uma mentalidadesitiada que amortece em vez de estimular. 0 que Lasch antes chamava de"cultura do narcisismo" passou a chamar de "cultura do sobrevivencialismo".A vida modern a passa a ser cada vez mais padronizada segundo as estrategiasdos individuos fors:ados a enfrentar situac;:oesde grande adversidade onde s6existe urn "eu minimo", defensivamente separado do mundo exterior. A apatiaem relac;:aoao passado, a renuncia sobre 0 futuro, e uma determinas:ao de viverurn dia de cad a vez - essa posic;:aoe hoje caracterfstica da vida ordinaria emcircunsrancias dominadas por influencias sobre as quais os individuos sentemque tern pouco ou nenhum controle.

As posis:oes de Sennett e Lasch foram aplaudidas por alguns e criticadas poroutros (Lasch e tambem critico de Sennett). Nao pretendo resenhar aqui essesdebates, mas apenas concentrar-me em alguns aspectos que se relacionamdiretamente com os temas ate aqui desenvolvidos neste estudo. 1a expresseirneu desacordo com que a ideia de que uma esfera publica, distinguivel nasrimeiras 2ses da modernidade, foi depois erradicada, deixando 0 individu

ex osto a urn mundo social ;;~plexo e esmagador. No todo pode-se dizer \que, em bora eivada de dificuldades e reversoes, a expansao do espac;:opublico, \junto com as possibilidades que os individuos tern de participar efetivamentedele, aumentaram com 0 amadurecimento das instituic;:oes modernas. Nao setrata de urn processo linear de desenvolvimento. 0 privatismo e sem duvida

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caracteristico de grandes areas da vida urbana moderna, consequencia dadissoluc;:aodo lugar e do aumento d~ mobilidade. Po~ outr? I~do, areas ur~a-nas modernas permitem 0 desenvolvlmento de uma vida publica cosmopolltade maneiras que nao estavam disponiveis em comunidades ~ais :radicio-nais.29 Pois os ambientes urban os modernos oferecern uma dlversldade deoportunidades de os individuos procurarem outros com int~resses sem~lhan-tes e com eles formarem associac;:oes,alem de oferecer mals oportumdadespara 0 cultivo de uma pluralidade de interesses em geral.. .

No que diz respeito a uma vida "publica" num sentldo mals amplo, .valelembrar que a massa da populac;:ao no inkio d~ .periodo mod~rn~ tlnhapoucos direitos de participac;:ao, Fossena esfera polItlca ou na e.conomlca. Noclassico contrato de trabalho capitalista, 0 trabalhador sacnficava todo 0

controle sobre sua forc;:ade trabalho ao atravessar 0 portao da fabrica; 0 direitoa sindicalizac;:ao e a substancial gama de capacidades tornadas possiveis pelomovimento dos trabalhadores so se desenvolveram ao longo de extenso perio-do de tempo. De modo semelhante, muitos anos de luta foram empenhadospelos direitos de participac;:ao polltica efetiva nos governos local e c:ntra~. J:mobilizac;:ao coletiva em outras esferas - em relac;:ao,por. ex~mplo, as.multl-plas organizac;:oes de auto-ajuda que agora existem na malOna das socledad~smodernas - tambem se constituiu num longo periodo de tempo, por melOde luta ativa. E claro que tudo isso tern urn outro lado, que e onde seconcentram Sennett e Lasch: 0 crescimento de grandes organizac;:oesburocra-ticas, e a influencia da produc;:ao de mercadorias, que drenam 0 ~ontroleindividual sobre a vida diaria. Mas ha resistencia a ~ssas tendenClas, e 0

"capitalismo burocratico" e internamente mais fluido_~ntraditorio do quesupoem esses autores. ,

Na obra de Lasch, e na de muitos outros que produziram diagnostlCOSb d· - . d d do agen teculturais semelhantes, pode-se perce er uma escnc;:aolOa equa a

. I . I - a forc;:ashumano. 0 individuo parece essenCla mente passlvo em re ac;:ao .d I' - .croamblentessociais externas que sac esmaga oras, e as Igac;:oesentre os ml .

da ac;:aoe influencias sociais mais abrangentes sac vistas a partir de um~d '- d d d - m relac;:aoaposic;:aoequivocada ou falsa, Vma escnc;:ao a equa a a ac;:aoe

modernidade deve cumprir tres tarefas. Ela deve reconhecer que (1) num. . d' oes externas

nivel muito geral, os agentes nunca aceltam passlvamente con IC;:I ., luz de suas

de ac;:ao,mas quase sempre refletem sobre e as e as reconstltuem a. .. II I· mdlvldua ,circunstincias particulares; (2) tanto no p ana co etlvo quanto no . _

d 'd d h" 'de apropnaacima de tudo nas condic;:oes da mo erm a e, a areas maClc;:as . I'c;:aocoletiva como consequencia do aumento da reflexividade da vida sO~la ,

. b' d ao seprn(3) nao e valido argumentar que, embora os micro am lentes a ac;: domaleiveis, os sistemas sociais mais amplos formam urn ambiente de fun

nao-co~trolado. Analisemos essas questoes de maneira urn pouco mais deta-Ihada.

Se nao enxergamos que todos os agentes ocupam uma posic;:aode apro-priac;:aoem relac;:aoao mundo social, que constituem e reconstituem em suasac;:6es,deixamos de captar num nivel empirico a natureza do empoderamentohumano. A vida social moderna empobrece a ac;:aoindividual, mas favorece aapropriac;:aode novas possibilidades; ela e alienante, mas ao mesmo tempo, demaneira caracteristica, os homens reagem contra as circunstincias sociais queacham opressivas. As instiruic;:oesmodern as tardias criam urn mundo de opor-tunidades duvidosas e riscos de alta consequencia. Mas esse mundo naoconstitui urn ambiente impermeivel que resiste a intervenc;:ao. Enquanto ossistemas abstratos penetram profundamente na vida cotidiana, as respostas atais sistemas ligam as atividades do individuo a relac;:oessociais de amplitudeindeterminada.

Varias formas de dependencia - ou, para colocar a questao de maneiramenos provocadora, connanc;:a - sac criadas pela reconstruc;:ao da vida diariapelos sistemas abstratos. Alguns desses sistemas, em suas extensoes globais,criaram influencias sociais que ninguem controla inteiramente e cujos resulta-dos sac em parte especincamente imprevisfveis. Mas sob muitos aspectos aexpansao dos sistemas especializados oferece possibilidades de reapropriac;:aomuito alem daquelas disponiveis em culturas tradicionais,

Como ilustrac;:ao, tomemos as mudanc;:as agora em curso nos modos devida familiar, associadas ao surgimento das relac;:oespuras. A obra de JudithStacey oferece uma Fonte de evidencia.30 Como ela mostra, ao experimenta-rem a desmontagem dos padroes familiares tradicionais, com todas as ameac;:ase riscos que essas mudanc;:as envolvem, os indivfduos estao sendo ativamentepioneiros num novo territorio social e estao construindo formas inovadoras derelac;:.aofamiliar. A pesquisa de Stacey se da contra 0 pano de fundo de umam~lente social perturbador e em ripida mudanc;:a - 0 Vale do Silkio, naCalifornia. Seu proprio estudo e altamente reflexivo - os individuos conside-rados estabeleceram urn dialogo condnuo com a autora, e suas opinioes sobre? material das proprias entrevistas, e sobre 0 proprio texto, constituem parteIlnpOrtante do relato da pesquisa,

A obra de Stacey se refere a duas redes de parentesco de pessoas da dassetrabalhad I d' ". b Ih "["I" ora que, como e a IZ, Vlvem, amam, tra a am e se preocupamd.te, love, work and worry"] no Vale. 0 casamento moderno, observa,II er:~temente de seu antecessor tradicional, depende de compromisso vo-Untano duradouro. Ha menos filhos a cuidar do que antes, e a divisao do

trlabalho entre os homens e as mulheres dentro e fora da casa ficou men osc ara 0 b' , 1 . d. am lente socIa em que as relac;:6esconJugals sac constltui as e

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sustentadas ficou perturbador e instavel. 0 resultado e certamenrd . " d U equemuitindivi uos se sentem sltla os e em guerra. ma preocupa<;:aocom" Os

A ." d" . I d' L h a sobrevl"vencla lana, como aque a escnta por asc, surge de maneira b -. d 'd d . d' 'd d' b aStantclara a parttr as VI as os 10 IVI uos escntos no tra alho de Stac M e

, d' d I - - I ey. as aomesmo tempo e Igno e nota que uma ta concep<;:aonao eva nece .. . ssanamen_te, ou mesmo caractenstlcamente, a uma fuga para 0 mundo fechado do

Ao contrario, Stacey mostra como os individuos estao reestrut eUd'uran 0ativamente novas formas de relacroes de genero e parentesco a partir ddetritos das formas anteriores de vida familiar. Tais reestrutura<;:oes nao s;smeramente locais e certamente nao sao triviais - tr.ata-se essencialmente d~urn processo maci<;:ode reconstituicrao institucional. "Famllias recombina_das", nao mais organizadas em termos das divisoes de genero preexistenressac criadas; em vez de constituir urn cisma entre urn modo de eXistenci~anterior e urn posterior, 0 divorcio e mobilizado como urn recurso para criarredes que aproximam novos e antigos parceiros, filhos biologicos e filhos"adotivos", amigos e outros parentes. 0 narcisismo nao e urn tra<;:oque surgecam qualquer clareza em estudos como 0 de Stacey, onde os individuos~arecem nao fugindo do mundo social exterior mas em franco envolvimen-to com ele.

Olhemos mais de perto para a caracteriza<;:aode Lasch da "personalidadenarcisista de nosso tempo". Os tra<;:osde "narcisismo patologico", diz de,aparecem em sua forma aguda "em profusao na vida cotidiana de nossaepoca".31 0 narcisismo e a "incorporacrao de imagens grandiosas como umadefesa contra a ansiedade e a culpa".32 E a formacrao de uma rea<;:aodesenvol-vida como meio de defesa contra 0 medo do abandono. 0 narcisista nao ed . d ' 'd . A •• I' d la culpa' de estaomma 0 por uma ngl a conSCIenCia mterna Iza a, ou pe '._

. ",,' I d . I" cisa de admlra~aomals para urn carater caotlco eva 0 por Impu sos que pre .. " . 'd dO' . f d" . tos difusos de vazlOemas reslste a mtlml a e. narcisista so re e sentlmen . d C

. "0 . . ..( trategla eleo-urn disturbio profundo da auto-estlma. narcisismo c uma es d. , . - , a ameacra orasiva que, na opiniao de Lasch, e adaptatlva em rela<;:aoa naturez do

. . I . I - to com 0 passado mundo moderno. Urn narcisista exc UI uma re a<;:aotan eri-fi "d . d " . . mo resposta aOSpquanto com 0 uturo, estrum o-as pSlqUicamente co

gos que 0 mundo apresenta e ao medo de que "tudo acabe". . cipai5, d' b m dos prwE surpreendente que Lasch tenha pouco a Izer so re u _ ne eu

d·d a rela~ao eOelementos do narcisismo como normalmente enten I 0 - r6pria. d . d' ., d iracao por sua P de corpo. A estona e NarcIso IZ respelto a sua a m T tipa e

A • • • d d" - d .. mo como nacro au "daparenCla, e na malOna as Iscussoes 0 narclslS I rn 51 0,

personalidade a rela<;:aodo individuo com a aparencia carporla teosidera-lope a COapropriadamente, vista como fundamental. 0 cu to ao corp , 'd de carnu(1l

<;:aode dieta, roupas, aparencia facial e outros fatores, e urna qualt a

de atividades de estilo de vida na vida social contemporinea. Ate que pontoesses cuidados representam uma forma de narcisismo? A analise formuladaneste e nos capitulos anteriores fornece a base para uma resposta. 0 corpo naopode mais ser meramente "aceito", alimentado e enfeitado segundo 0 ritualrradicional; torna-se parte central do projeto reflexivo da auto-identidade.Orn cuidado continuado com 0 desenvolvimento corporal em rela<;:aoa umaeultura de risco e assim uma parte intrfnseca do comportamento social moder-no. Como foi sublinhado antes, embora os modos de apresenta<;:aodo corpoten ham que ser desenvolvidos a partir de uma diversidade de op<;:oesde estilode vida, a decisao entre as alternativas nao e em si mesma uma op<;:aomas urndemento inerente da constru<;:aoda auto-identidade. 0 planejamento da vidaem rela<;:aoao corpo, portanto, nao e necessariamente narcisista, mas partenormal dos ambientes sociais pos-tradicionais. Como outros aspectos da refle-xividade da auto-identidade, 0 planejamento do corpo e mais freqiientementeum envolvimento com 0 mundo exterior que uma retirada defensiva dele.

Em term os clinicos, 0 narcisismo deve ser visto como uma patologia docorpo entre outras que a vida social moderna tende em parte a provocar.Como deforma<;:aoda personalidade, 0 narcisismo tem sua origem na incapa-cidade de alcan<;:ara confian<;:abasica. Isso e particularmente verdade nos casosem que a crian<;:anao con segue reconhecer satisfatoriamente a autonomia doprimeiro guardiao; e e incapaz de separar claramente suas proprias fronteiraspsiquicas. Nessas circunsrancias, sensa<;:oesde onipotencia e de automereci-mento tendem a alternar-se com seus opostos, sensa<;:oesde vazio e desespero.Levados para a vida adulta, esses tra<;:oscriam um tipo de individuo inclinadoa dependencia neurotica dos outros, especial mente para a manuten<;:ao daauto-estima, mas que nao tern autonomia suficiente para ser capaz de comu-nicar-se efetivamente com eles. Tal pessoa provavelmente nao sera capaz dedar conta de contemplar 0 risco que as circunsrancias da vida modern a envol-vem. Assim e provavel que dependa do cultivo da atra<;:aocorporal e talvez docharme pessoal, como meio de ten tar controlar os perigos da vida. A dinamicac~ntral do narcisismo, para prosseguir na discussao iniciada acima, pode serV.Istacomo vergonha em vez de culpa. Os sentimentos alternados de grandio-sldade e desimporrancia com que 0 narcisista precisa lidar sac essencialmenterespostas a uma auto-identidade fragil suscetfvel de esmagamento pela vergo-nh .

Ao estimar a prevalencia do narcisismo na modernidade tardia, devemosser cuidadosos em separar 0 mundo das imagens mercantilizadas, a que Laschfreqiientemente se refere, das respostas reais dos individuos. Na descri<;:aode

, Lasch, como observamos, as pessoas parecem em geral passivas em suas rea-<;:6s - nesse caso a urn mundo de brilhantes imagens de propaganda. Passivi-

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dade e dependencia diante das institui<;:6es do capitalismo de consumo, defato, figuram entre as principais enfases de Lasch. No entanto, por poderosasque as influencias mercantilizantes sejam, dificilmente saG recebidas de ma-neira acritica pelas popula<;:6esque afetam.

Em conclusao, voltemos brevemente a questao da terapia, vista por Lasch, adespeito de seu usa da teoria psicanalltica, principal mente de urn angulonegativo, como forma de dependencia em rela<;:aoaos especialistas. Em vez deconsiderar diretamente a visao de Lasch sobre essa quesrao, voltemo-nos aoponto de vista mais ou menos comparavel estabelecido nos conhecidos textosde Philip Rieff 33Ele relaciona 0 surgimento da terapia a seculariza<;:aoe ao queve como urn deserto moral criado pelo enfraquecimento da religiao tradicio-nal. 0 que chama de "controle terapeutico" opera para preservar urn certonivel de "funcionamento social adequado" em ambientes onde a religiao naomais fornece orienta<;:ao. Antigamente, se as pessoas se sentiam miseraveis,procuravam 0 consolo da igreja; agora, voltam-se para 0 primeiro analistadisponfvel. Por meio da rerapia, uma pessoa tenta tornar-se "urn eu saG nummundo louco, a personalidade integrada na era da fissao nuclear, a respostasilenciosa as altissimas explos6es".34 A terapia busca criar urn indivfduo con-fiante e prospero sem urn sentimento de altas moralidades; ela descarta osgrandes enigmas da vida em favor de uma sensa<;:aomodesta e duravel deb ".. " d' Ri fiE '" . c " 35em-estar. A COlsalmportante , como lZ e, e segulr em rrente .

Ha validade nessa concep<;:ao,mas ela deve ser substancialmente reform~-lada. Antes de mais nada devemos observar que a terapia nao replica a "auton-dade" de outros tempos, particularmente a autoridade religiosa. Nao ha ver-saG de terapia com tal autoridade. Quem procura terapia, como ja observa-mos, encontra-se diante de uma variedade interminavel de escolas, praticas efilosofias diferentes, muitas das quais em oposi<;:aoradical entre si. Se a psica-nalise c1assica parece ocupar uma posi<;:aopredominante nos debates intelec-tuais sobre os modos de terapia, isso e mais urn tributo ao genio de Freud doque uma aceita<;:aogeneralizada na pratica de que essa versao particular daterapia e mais legftima ou eficaz que as outras. A terapia, portanto, e ante~ u~aexpressao espedfica de dilemas e praticas relevantes para a alta modern Ida. edo que urn fenomeno que substitui formas sociais e morais mais tradicionalS.

Seria a terapia apenas urn meio de ajustar indivfduos insatisfeitoS a urnambiente social defeituoso? Seria simplesmente uma estrita substituta, a rn~-

. ., I . d' nivelSnelra secular, de urn conJunto malS profundo de envo VlmentoS lSPO

em ambientes pre-modernos? Nao ha como negar que ela pode ser umaconcessao, e talvez possa promover uma retirada narcisfstica. A maio ria dasformas de terapia toma tempo e dinheiro; ela e em parte uma diversao cultiva-da pelos privilegiados.

Mas ha muito mais que isto.36 A terapia e urn sistema especializadoprofundamente imbricado no projeto reflexivo do eu - e urn fenomeno dareflexividade da modernidade. Na forma da psicanalise, a terapia se desenvol-veu como urn meio de combater patologias da personalidade. Constituiu-seem torno de uma retorica de "doen<;:as"e "curas", e as propriedades curativasde formas diversas de terapia - inclusive a psicanalise classica - continua aser objeto de acirrado debate. Mas a sua maior importancia nas circunstanciasda modernidade tardia nao esra nessa dire<;:ao.A terapia deve ser entendida eavaliada essencialmente como uma metodologia de planejamento da vida. 0"indivfduo capaz" de hoje nao so tern urn auto-entendimento desenvolvido,mas e capaz de harmonizar preocupa<;:6es presentes e projetos futuros comuma heran<;:apsicologica do passado. A terapia nao e simplesmente urn apara-to de ajuste. Como expressao da reflexividade generalizada ela exibe plena-mente os deslocamentos e incertezas que a modernidade faz surgir. Ao mesmotempo, participa dessa mistura de oportunidade e risco caracteristica da or-dem moderna tardia. Pode provocar dependencia e passividade; mas tambempode permitir 0 envolvimento e a reapropria<;:ao.

Empreendimentos terapeuticos, de qualquer maneira, tern lugar contra 0

pano de fundo da segrega<;:aoda experiencia e dos sistemas internamentereferidos da modernidade. Nao surpreende que muitas - nao todas _tera.pias sejam orientadas principalmente para 0 controle. Elas interpretam 0

pr~Jeto reflexivo do eu em term os apenas da autodetermina<;:ao, confirmandoasslm.' e mesmo acentuando, a separa<;:aoda vida em rela<;:aoa considera<;:6esmOralSextrinsecas.